domingo, 25 de outubro de 2015

António Aleixo (Quadras)

A arte em nós se revela
sempre de forma diferente:
– cai no papel ou na tela
conforme o artista sente
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À guerra não ligues meia,
porque alguns grandes da terra,
vendo a guerra em terra alheia,
não querem que acabe a guerra.
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Após um dia tristonho
de mágoas e agonias
vem outro alegre e risonho:
– são assim todos os dias.
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A quadra tem pouco espaço
mas eu fico satisfeito
quando numa quadra faço
alguma coisa com jeito.
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A vida na grande terra
corrompe a humanidade.
Entre a cidade e a serra
prefiro a serra à cidade.
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Bate a fome à porta deles
e é lá mais mal recebida
do que na casa daqueles
que a sofreram toda a vida.
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Da música a melodia
diz, pela alma falando,
mais do que a boca diria
muitas horas conversando
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De vender a sorte grande,
confesso, não tenho pena;
que a roda ande ou desande
eu tenho sempre a pequena.
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Embora os meus olhos sejam
os mais pequenos do mundo,
o que importa é que eles sejam
o que os Homens são no fundo.
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Enquanto o homem pensar
que vale mais que outro homem,
são como os cães a ladrar,
não deixam comer, nem comem.
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Entre leigos ou letrados,
fala só de vez em quando,
que nós, às vezes, calados,
dizemos mais que falando.
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Eu já não sei o que faça
p'ra juntar algum dinheiro;
se se vendesse a desgraça
já hoje eu era banqueiro.
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Eu não sei por que razão
certos homens, a meu ver,
quanto mais pequenos são
maiores querem parecer.
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Eu não tenho vistas largas,
nem grande sabedoria,
mas dão-me as horas amargas
lições de filosofia.
__________
Faz mal o filho que mente
a seus pais, quando rapaz,
e é já tarde quando sente
o mal que a si próprio faz.
__________
Forçam-me, mesmo velhote,
de vez em quando, a beijar
a mão que brande o chicote
que tanto me faz penar.
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Gosto do preto no branco,
como costumam dizer:
– antes perder por ser franco
do que ganhar por não ser.
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Há luta por mil doutrinas.
Se querem que o mundo ande,
façam das mil pequeninas
uma só doutrina grande.
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Julgam-me mui sabedor;
e é tão grande o meu saber
que desconheço o valor
das quadras que sei fazer.
__________
Julgando um dever cumprir,
sem descer no meu critério,
– digo verdades a rir
aos que me mentem a sério!
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Mentiu com habilidade,
fez quantas mentiras quis;
agora fala verdade
ninguém crê no que ele diz.
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Nada direi, mas, enfim,
vou ter a grande alegria
de a Arte dizer por mim
tudo quanto eu vos diria.
__________
Não é só na grande terra
que os poetas cantam bem:
– os rouxinóis são da serra
e cantam como ninguém.
__________
Não sou esperto nem bruto,
nem bem nem mal educado:
– sou simplesmente o produto
do meio em que fui criado.
__________
Nos versos que se improvisem,
os poetas sabem ler,
para além do que eles dizem,
tudo o que querem dizer.
__________
Num arranco de loucura,
filha desta confusão,
vai todo o mundo à procura
daquilo que tem à mão.
__________
O mundo só pode ser
melhor do que até aqui,
– quando consigas fazer
mais p'los outros que por ti!
__________
Peço às altas competências
perdão, porque mal sei ler,
p’ra aquelas deficiências
que os meus versos possam ter.
__________
Porque o mundo me empurrou,
caí na lama, e então
tomei-lhe a cor, mas não sou
a lama que muitos são.
__________
Porque será que nós temos
na frente, aos montes, aos molhos,
tantas coisas que não vemos
nem mesmo perto dos olhos?
__________
P'ra mentira ser segura
e atingir profundidade,
tem que trazer à mistura
qualquer coisa de verdade.
__________
Pra não fazeres ofensas
e teres dias felizes,
não digas tudo o que pensas,
mas pensa tudo o que dizes.
__________
Quando não tenhas à mão
outro livro mais distinto,
lê estes versos que são
filhos da mágoa que sinto.
__________
Quando te vês mal, e dizes
que preferias a morte,
pensa que outros menos felizes
invejam a tua sorte.
__________
Quantas sedas aí vão,
quantos brancos colarinhos,
são pedacinhos de pão
roubados aos pobrezinhos!
__________
Que importa perder a vida
em luta contra a traição,
se a Razão mesmo vencida,
não deixa de ser Razão?
__________
Quem nada tem, nada come;
e ao pé de quem tem de comer,
se alguém disser que tem fome,
comete um crime, sem querer.
__________
Quem prende a água que corre
é por si próprio enganado;
o ribeirinho não morre,
vai correr por outro lado.
__________
São parvos, não rias deles,
deixa-os ser, que não são sós;
às vezes rimos daqueles
que valem mais do que nós
__________
Sei que pareço um ladrão...
mas há muitos que eu conheço
que, sem parecer que são,
são aquilo que eu pareço.
__________
Ser artista é ser alguém!
Que bonito é ser artista,
ver as coisas mais além
do que alcança a nossa vista!
__________
Talvez paz no mundo houvesse
embora tal não pareça,
se o coração não estivesse
tão distante da cabeça.
__________
Tem a música o poder
de tornar o homem feliz;
nem há quem saiba dizer
tanto quanto ela nos diz.
__________
Uma mosca sem valor
poisa, c'o a mesma alegria,
na careca de um doutor,
como em qualquer porcaria.
__________
Umas quadras são conselhos
que vos dou de boa fé;
outras são finos espelhos
onde o leitor vê quem é.
__________
Um homem quando tem notas,
pode ser perverso e falso:
– todos lhe engraxam as botas:
se as não tem, anda descalço.
__________
Vemos gente bem vestida,
no aspecto desassombrada;
são tudo ilusões da vida,
tudo é miséria dourada.
__________
Vinho que vai pra vinagre
não retrocede o caminho;
só por obra de milagre,
pode de novo ser vinho.

António Aleixo (1899 - 1949)




António Fernandes Aleixo nasceu em Vila Real de Santo António, uma pequena cidade do Algarve, sul de Portugal, na fronteira com a Espanha, 18 de fevereiro de 1899 e faleceu em Loulé/Portugal, a 16 de novembro de 1949.
            Filho de um operário tecelão, teve uma infância de dificuldades e foi obrigado a abandonar os estudos antes de completar o segundo ano de escolaridade. Sua experiência com poesia surgiu ainda aos dez anos de idade: há, no sul de Portugal, um antigo costume de grupos de crianças que vão de porta em porta, à época das festas natalinas, cantar as “janeiras”, quadras que se vão repetindo, alterando-se apenas o nome do dono da casa, que é então homenageado em troca de algum dinheiro ou prenda natalina. Como o repertório de seu grupo se esgotara, Aleixo começou a inventar, por si próprio, as quadras para o pequeno grupo de cantores populares. A vida de António Aleixo, contudo, foi de sobrevivência difícil em meio à pobreza daqueles primeiros anos do século XX: foi tecelão, como o pai; serviu o exército, onde aprenderia de fato a ler e escrever, ainda que de forma rudimentar; depois, policial; imigrou para a França, onde exerceu o ofício de pedreiro; foi depois vendedor de cautelas de loteria – ocupações que mantinha em paralelo aos improvisos em praça pública, que, em pouco tempo, se tornaram uma nova fonte de renda, pois passou a se apresentar em festas populares e romarias, ocasiões em que começou também a vender seus versos impressos. Sobre suas várias profissões, escreveu Aleixo:
Fui polícia, fui soldado,
Estive fora da Nação,
Vendo jogo, guardei gado,
Só me falta ser ladrão.
(ALEIXO, 1978, p. 16)
            Em 1942, por iniciativa de um amigo de António Aleixo, um relojoeiro da cidade de residência do poeta, Loulé, fez-se imprimir em uma gráfica local uma folha datilografada com cerca de duas dúzias de quadras do poeta que ele, o comerciante, colecionara. Joaquim de  Magalhães, à época professor do Liceu de Loulé, recebeu um exemplar da pequena coletânea e, entusiasmado pela qualidade poética que observou na despretensiosa obra, propôs-se a fazer uma compilação das quadras de António Aleixo, servindo-lhe de “secretário” para coletar material suficiente para a publicação de um volume de poesias. Sobre esse fato, escreveu Aleixo:
Não há nenhum milionário
que seja feliz como eu
tenho como secretário
um professor do liceu.
(ALEIXO, 1983, p.102)
            António Aleixo, contudo, no mesmo ano de lançamento de seu primeiro livro, descobre-se também tuberculoso como a filha e, por conta da intervenção de diversos artistas de renome a seu favor, consegue internação em um sanatório na cidade de Coimbra. Naquela cidade, conheceu outros escritores, como Miguel Torga, e produziu um segundo volume de quadras, chamado Intencionais, e duas peças teatrais de inspiração vicentina, o Auto do CURAndeiro (sic) e o Auto da Vida e da Morte. A doença, contudo, não cedeu com sua estada no sanatório de Coimbra e, em 1949, António Aleixo viria a falecer na cidade de Loulé, de tuberculose. Por conta do temor do contágio e por desconhecimento, os vizinhos que atenderam ao poeta em seus últimos dias de vida atearam fogo a alguns dos muitos cadernos nos quais Aleixo registrou, incentivado por Joaquim de Magalhães, suas quadras e poemas.
            Uma das razões formais para o sucesso das quadras de António Aleixo é o uso quase que exclusivo de versos em redondilha maior. Norma Goldstein, em seu compêndio intitulado Versos, sons, ritmos, recorda que o “verso de sete sílabas [...] é o mais simples, do ponto de vista das leis métricas” e também o “verso tradicional em língua portuguesa”, que já era “freqüente em cantigas medievais” (GOLDSTEIN, 2001, p. 27) e perenizou-se nas cantigas de roda, quadras e canções populares. Outro recurso usado intuitivamente por Aleixo é a composição de rimas alternadas – ABAB – externas e consoantes, a qual auxilia no ritmo natural da fala em língua portuguesa e oferece fácil identificação por parte do leitor. Tais elementos formais são, ainda, característicos da literatura oral e das formas cantadas de poesia popular, gêneros dentro dos quais Aleixo desenvolveu seu talento poético.
            Embora praticasse formas tradicionais de poesia, em si mesmas limitadoras – o quarteto de sentido completo e a sextilha –, Aleixo impunha a esse gênero um traço bastante peculiar de narrativa e de crônica do cotidiano. Seus temas principais oscilavam entre a crítica social, os infortúnios de uma vida miserável e os acontecimentos pontuais do cotidiano português. Curiosamente, quase nada de sua produção ecoa os temas amorosos ou o saudosismo tão presentes na poesia lusitana que o antecedeu:
Nas tuas horas mais tristes
de mágoas e desenganos,
pensa que já não existes,
que morreste há muitos anos.
(ALEIXO, 1983, p. 85)
            Considerado um dos poetas populares portugueses de maior relevo, afirmando-se pela sua ironia e pela crítica social sempre presente nos seus versos, António Aleixo também é recordado como homem simples, humilde e semi-analfabeto, e ainda assim ter deixado como legado uma obra poética singular no panorama literário português da primeira metade do século XX.
            No emaranhado de uma vida cheia de pobreza, mudanças de emprego, emigração, tragédias familiares e doenças, na sua figura de homem humilde e simples houve o perfil de uma personalidade rica, vincada e conhecedora das diversas realidades da cultura e sociedade do seu tempo. Do seu percurso de vida fazem parte profissões como tecelão, polícia e servente de pedreiro, trabalho este que, como emigrante, exerceu em França.
            De regresso ao seu Algarve natal, estabeleceu-se novamente em Loulé, onde passou a vender cautelas e a cantar as suas produções pelas feiras portuguesas, atividades que se juntaram às suas muitas profissões e que lhe renderia a alcunha de «poeta-cauteleiro».
            Faleceu vítima de uma tuberculose, a 16 de novembro de 1949, doença que tempos antes havia também vitimado uma de suas filhas.
            Poeta possuidor de uma rara espontaneidade, de um apurado sentido filosófico e notável pela «capacidade de expressão sintética de conceitos com conteúdo de pensamento moral», Aleixo tinha por motivos de inspiração desde as brincadeiras dirigidas aos amigos até à crítica sofrida das injustiças da vida. É notável em sua poesia a expressão concisa e original de uma "amarga filosofia, aprendida na escola impiedosa da vida".
            A sua conhecida obra poética é uma parte mínima de um vasto repertório literário. O poeta, que escrevia sempre usando a métrica mais comum na língua portuguesa (heptassílabos, em pequenas composições de quatro versos, conhecidas como "quadras" ou "trovas"), nunca teve a preocupação de registrar suas composições. Foi o trabalho de Joaquim de Magalhães, que se dedicou a compilar os versos que eram ditados pelo poeta no intuito de compor o primeiro volume de suas poesias (Quando Começo a Cantar), com o posterior registro do próprio poeta tendo o incentivo daquele mesmo professor, a obra de António Aleixo adquiriu algum trabalho documentado. Antes de Magalhães, contudo, alguns amigos do poeta lançaram folhetos avulsos com quadras por ele compostas, mais no intuito, à época, de angariar algum dinheiro que ajudasse o poeta na sua situação de miséria que com a intenção maior de permanência da obra na forma escrita.
            Estudiosos de António Aleixo ainda conjugam esforços no sentido de reunir o seu espólio, que ainda se encontra fragmentado por vários pontos do Algarve, algum dele já localizado. Sabe-se também que vários cadernos seus de poesia, foram cremados como meio de defesa contra o vírus infeccioso da doença que o vitimou, sem dúvida, um «sacrifício» impensado, levado a cabo pelo desconhecimento de seus vizinhos. Foi esta uma perda irreparável de um patrimônio insubstituível no vasto mundo da literatura portuguesa.
            A opinião pública aceitou a primeira obra de António Aleixo com bom agrado, tendo sido bem acolhida pela crítica. Com uma tiragem de cerca de 1.100 exemplares, o livro esgotou-se em poucos dias, o que proporcionou ao Poeta Aleixo uma pequena melhoria de vida, contudo ensombrada pela morte de uma filha sua, com tuberculose. Desta mesma doença viria o poeta a sofrer pelos tratamentos que a vida lhe foi impondo, tendo de ser internado no Hospital – Sanatório dos Covões, em Coimbra, a 28 de junho de 1943.
            Em Coimbra começa uma nova era para o poeta que descobre novas amizades e deleita-se com novos admiradores, que reconhecem o seu talento, de destacar o Dr. Armando Gonçalves, o escritor Miguel Torga, e António Santos (Tóssan), artista plástico e autor da mais conhecida imagem do poeta algarvio, amigo do poeta que nunca o desamparou nas horas difíceis. Os seus últimos anos de vida foram passados, ora no sanatório em Coimbra, ora no Algarve, em Loulé.
            A 27 de maio de 1944 recebeu o grau de Oficial da Ordem de Benemerência.
Fontes:
– Robertson Frizero Barros . “Perdão, porque mal sei ler” – apresentando António Aleixo, poeta popular português. In Revista Nau Literária. PPG-LET-UFRGS – Porto Alegre – Vol. 03 N. 02 – jul/dez 2007
https://pt.wikipedia.org/wiki/António_Aleixo

sábado, 24 de outubro de 2015

Rosimeire Leal de Mota (1969)




.          Rosimeire Leal da Motta nasceu no município de Vila Velha/ES, em 1969. Professora, Técnica em Contabilidade e Secretária. Casada. Portadora de deficiência auditiva, faz leitura labial. Começou a escrever aos 15 anos, seguindo o exemplo da mãe, que usava a escrita como uma maneira de expressar seus problemas pessoais. A outra influência foi a leitura, pois por ser tímida, passou a maior parte da minha adolescência lendo. Seu primeiro trabalho literário foi "MEU IDEAL DE POESIA" (prosa), escrito aos 15 anos.

            Desenvolve o estilo Simbolismo, onde a vida interior é revelada por meio de símbolos. Existe a postura romântica, centralizada no "eu", explorando as camadas mais profundas do subconsciente e inconsciente... interioridade... poesias endereçadas à emoção... romantismo... ideias envoltas em sombra, em névoa..

   Nas palavras da poetisa:
            “O mais gratificante na arte de escrever é poder espalhar nossos pensamentos ao mundo, transmitindo uma parte de nós aos demais; sim, porque aquilo que uma pessoa escreve revela muito sobre si mesmo. É gratificante quando escrevo um texto e observo que ali está muito de mim, foi uma parte da minha individualidade que doei aos demais.
Eu sinto a poesia como se fosse um pedaço da alma, um ser vivo que transmite um sentimento. Ler uma poesia é como abrir um frasco de perfume e aspirar seu aroma... A fragrância é totalmente absorvida por nosso íntimo. Penso que a realização do poeta se faz na alma, pois ele já nasce com este dom, ou seja, não há como participar de um curso para se tornar um profissional da poesia... Ele poderá se inscrever num curso para aperfeiçoar a escrita com base na gramática e somente isto. Ser poeta é um dom que a pessoa tem, que a torna capaz de transformar letras em sentimento.”
            Participou de dezoito Antologias de Poesias, quatro de Contos e cinco de Crônicas.
 LIVROS PUBLICADOS:
- "Voz da Alma", 2005 (Poesia e Prosa);"Eu Poético" , 2007 (Poesia e Prosa.); "O Cair da Tarde", 2012 (Poesia e Prosa)

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Sérgio Corrêa Miranda Filho (Caderno de Trovas)

A glória não mais me acena...
Mas, por amor à ribalta,
eu sou artista que encena,
mesmo se o público falta!…
Ao ver, com creme vermelho,
da esposa o rosto emplastado,
teve impressão o Botelho
de que entrou no inferno errado!
A vida nada me entrega...
mas quando durmo, a teu lado,
sonho ter o que ela nega
sempre que sonho acordado!!!
Carteiro, que se desculpa
por frustrar o meu anseio,
esquece... Tu não tens culpa
se a carta dela não veio!…
Celular eu não tolero
desde um pré-pago que eu tinha,
que tocou "Mamãe eu quero..."
no velório da vizinha!
Comprovo, num pranto mudo,
após a espera frustrada,
que o depois promete tudo
mas não cumpre quase nada!
Depois de um sonho frustrado
que a própria vida desfez,
insiste... volta ao passado
e sonha tudo outra vez!…
"Depois", disseste... E apreensivo,
lembrando o amor de nós dois,
hoje eu sinto que só vivo
porque espero esse depois!
Depois... muralha inclemente
que insiste em nos separar
do sonho de amor que a gente
não pode ainda alcançar!…
Desde o namoro ao casório,
a sogra foi sentinela.
E hoje, enfim, no seu velório,
sou eu quem "segura a vela"!…
Envelhecemos... Nós dois...
E hoje é que voltas, por fim...
Não pensei que o teu "depois"
fosse tão depois assim…
Falta-me a fé...e, na estrada
onde sigo, não me iludo,
pois não me faltando nada
eu sei que me falta tudo!…
Feitos de instantes tristonhos,
se os meus dias são banais,
não é porque faltam sonhos,
mas porque há mágoas demais!…
Fico ante a vida calado,
sem pergunta... sem proposta...
- Meu sonho já está cansado
de ouvir 'não" como resposta!
Meu sonho, num louco intento,
quis o céu e, em gesto aflito,
prendeu-se à pipa que o vento
despedaçou no infinito!…
Na campa do tal rapaz
que no batuque era um bamba,
em vez de pôr: – "Aqui jaz"...
alguém gravou: – "Aqui samba"…
Na espera a angústia me invade...
E depois, num devaneio,
vejo chegar a saudade,
trazendo alguém que não veio!…
Na festa de caridade,
Zé, com cara de tragédia,
tirando a média de idade,
foi parar na Idade Média!
Nas cavalgadas que eu faço
quando a insônia não aceito,
apanho os sonhos a laço
e arrasto o sono a meu leito!…
Nas horas de desencanto,
não me falta um bom amigo
que, se não seca o meu pranto,
ao menos, chora comigo!…
Num sonho envolto em ternura,
de tua ausência hoje farto,
viajo à tua procura,
sem deixar o nosso quarto!…
O candidato: - Em quem votas?
- Em você!, diz, sem engodos...
E explica: - Dos idiotas,
prefiro o maior de todos…
O Pacote é bom, Batista?
- Pra mim é, pois dá dinheiro...
- Ah, o amigo é economista?
q Não, senhor... sou pipoqueiro!
O Zé segue o enterro... E ao ver
seu rosto, um verme diz, sério:
– Quando esse "troço" morrer,
eu fujo do cemitério!…
Piada foi quando o Augusto
entrou no armário, apressado,
e quase morreu de susto
quando alguém disse: - Ocupado!
"Procuro amor"... deixo escrito
no meu sonho... mas, quem vê,
se eu ponho este anúncio aflito
num jornal que ninguém lê?!
Quando um cão grã-fino olhou
sua cadela, de esguelha,
meu cão pulguento ficou
"com a pulga atrás da orelha"!
Se estás num sonho indagando
se te adoro, e eu digo sim,
crê, amor, mesmo sonhando,
no que o sonho diz por mim!
Sempre que a vida me assalta,
eu luto com tanto empenho,
que é quando a força me falta
que eu meço a força que tenho!
Se o meu sonho vem errado,
acordo... e, insone, bendigo
poder sonhar acordado
um sonho inteiro contigo!…
Silêncio!  Dorme a saudade
e acordá-la não convém...
Já é demais a ansiedade
para esperar quem não vem!
Tudo alcancei, com ardor...
E, hoje, a mágoa que me assalta
é sentir falta de amor
quando mais nada me falta!…
Velório estranho, comadre,
o da sogra do Miranda...
em vez de chamar um padre
ele chamou uma banda!

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

José Feldman (Algumas Dicas de Trovas para Concursos ou Não)



Seguem algumas trovas de trovadores que usaram palavras incorretamente, o que poderá prejudicar uma boa trova e desclassificá-las em concursos:
Vendo este mundo de dor,
com violência, sem Norte
peço sempre ao Salvador:
– Paz, amor e boa sorte.
         Se não for vendedor/a, não utilizar vendo como no primeiro verso, a não ser que queira vender o mundo, e atualmente até de graça tem que pensar muito.
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A neve desce, flutua,
cai sobre tudo e se espalha
sobre a estrada imensa e nua
como uma branca toalha.
    Esta é para os comilões. No quarto verso, como, se a intenção não era comer a toalha branca, preste muita atenção ao utilizar esta palavra.
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Alguns anos atrás, quando ainda estava engatinhando na trova, fiz a trova abaixo (depois corrigi, claro)
Como a Gralha Azul que voa
cultivando o Paraná,
a trova, a Terra povoa,
espalhando o seu maná.
         Agradeço ao povo paranaense, ao IBAMA, etc. por ter entendido que não estava mal intencionado, foi ignorância minha em algumas questões da trova, se não já teria sido linchado por comer a Gralha Azul, símbolo do Paraná.