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sábado, 20 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 85 -

Oração Celta

Que jamais, em tempo algum, o teu coração acalente ódio.

Que o canto da maturidade jamais asfixie a tua criança interior.

Que o teu sorriso seja sempre verdadeiro.

Que as perdas do teu caminho sejam sempre encaradas como lições de vida.

Que a música seja tua companheira de momentos secretos contigo mesmo.

Que os teus momentos de amor contenham a magia da tua alma eterna em cada beijo.

Que os teus olhos sejam dois sóis olhando a luz da vida em cada amanhecer.

Que cada dia seja um novo recomeço, onde tua alma dance na luz.

Que em cada passo teu fiquem marcas luminosas de tua passagem em cada coração.

Que em cada amigo o teu coração faça festa, que celebre o canto da amizade profunda que liga as almas afins.

Que em teus momentos de solidão e cansaço, esteja sempre presente em teu coração a lembrança de que tudo passa e se transforma, quando a alma é grande e generosa.

Que o teu coração voe contente nas asas da espiritualidade consciente, para que tu percebas a ternura invisível, tocando o centro do teu ser eterno.

Que um suave olhar te acompanhe, na terra ou no espaço, e por onde quer que o imanente invisível leve o teu viver.

Que o teu coração sinta a presença secreta do inefável!

Que os teus pensamentos e os teus amores, o teu viver e a tua passagem pela vida, sejam sempre abençoados por aquele amor que ama sem nome.
Aquele amor que não se explica, só se sente.

Que esse amor seja o teu acalento secreto, viajando eternamente no centro do teu ser.

Que este amor transforme os teus dramas em luz, a tua tristeza em celebração e os teus passos cansados em alegres passos de dança renovadora.

Que jamais, em tempo algum, tu esqueças da Presença que está em ti e em todos os seres.

Que o teu viver seja pleno de Paz e Luz!

sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 84 =

Autor Desconhecido

A AMIZADE

Meus amigos são todos assim: metade loucura, outra metade santidade. 

Escolho-os não pela pele, mas pela pupila, que tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. 

Escolho meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta. Não quero só o ombro ou o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. 

Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. 

Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos. Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. 

Não quero amigos adultos, nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice. Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto, e velhos, para que nunca tenham pressa. 

Tenho amigos para saber quem eu sou, pois vendo-os loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a normalidade é uma ilusão boba e estéril.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 83 -


Clarice Lispector
(Chaya Pinkhasivna Lispector)
Chechelnyk/Ucrânia, 1920 – 1977, Rio de Janeiro/RJ

DIVAGANDO SOBRE TOLICES

Depois de esporádicas e perplexas meditações sobre o cosmos, cheguei a várias conclusões óbvias (o óbvio é muito importante: garante certa veracidade). Em primeiro lugar concluí que há o infinito, isto é, o infinito não é uma abstração matemática, mas algo que existe. Nós estamos tão longe de compreender o mundo que nossa cabeça não consegue raciocinar senão à base de finitos.

Depois me ocorreu que se o cosmos fosse finito, eu de novo teria um problema nas mãos: pois, depois do finito, o que começaria? Depois cheguei à conclusão, muito humilde minha, de que Deus é o infinito. Nessas minhas divagações também me dei conta do pouco que sabia, e isso resultou numa alegria: a da esperança. Explico-me: o pouco que sei não dá para compreender a vida, então a explicação está no que desconheço e que tenho a esperança de poder vir a conhecer um pouco mais.

O belo do infinito é que não existe um adjetivo sequer que se possa usar para defini-lo. Ele é, apenas isso: é. Nós nos ligamos ao infinito através do inconsciente. Nosso inconsciente é infinito.

O infinito não esmaga, pois em relação a ele não se pode sequer falar em grandeza ou mesmo em incomensurabilidade. O que se pode fazer é aderir ao infinito. Sei o que é o absoluto porque existo e sou relativa. Minha ignorância é realmente a minha esperança: não sei adjetivar. O que é uma segurança. A adjetivação é uma qualidade, e o inconsciente, como o infinito, não tem qualidades nem quantidades. Eu respiro o infinito. Olhando para o céu, fico tonta de mim mesma.

O absoluto é de uma beleza indescritível e inimaginável pela mente humana. Nós aspiramos essa beleza. O sentimento de beleza é o nosso elo com o infinito. É o modo como podemos aderir a ele. Há momentos, embora raros, em que a existência do infinito é tão presente que temos uma sensação de vertigem. O infinito é um vir-a-ser. É sempre o presente, indivisível pelo tempo. Infinito é o tempo. Espaço e tempo são a mesma coisa. Que pena eu não entender de física e matemática para poder, nessa minha divagação gratuita, pensar melhor e ter o vocabulário adequado para a transmissão do que sinto.

Espanta-me a nossa fertilidade: o homem chegou com os séculos a dividir o tempo em estações do ano. Chegou mesmo a tentar dividir o infinito em dias, meses, anos, pois o infinito pode constranger muito e confranger o coração. E, diante da angústia, trazemos o infinito até o âmbito de nossa consciência e o organizamos em forma humana simplificada. Sem essa forma ou outra qualquer de organização, nosso consciente teria uma vertigem perigosa como a loucura. Ao mesmo tempo, para a mente humana, é uma fonte de prazer a eternidade do infinito: nós, sem entendê-lo, compreendemos. E, sem entender, vivemos. Nossa vida é apenas um modo do infinito.

Ou melhor: o infinito não tem modos. Qual a forma mais adequada para que o consciente açambarque o infinito? Pois quanto ao inconsciente, como já foi dito, este o admite pela simples razão de também sê-lo. Será que entenderíamos melhor o infinito se desenhássemos um círculo? Errei. O círculo é uma forma perfeita mas que pertence à nossa mente humana, restrita pela sua própria natureza. Pois na verdade até o círculo seria um adjetivo inútil para o infinito. Um dos equívocos naturais nossos é achar que, a partir de nós, é o infinito. Nós não conseguimos pensar no existo sem tomarmos como ponto de vista o a partir de nós.

Para falar a verdade, já me perdi e nem sei mais do que estou falando. Bem, tenho mais o que fazer do que escrever tolices sobre o infinito. É, por exemplo, hora do almoço e a empregada avisou que já está servido. Era mesmo tempo de parar.

(em Clarice Lispector. A Descoberta do Mundo. 
Publicado originalmente em 1967)

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 82 –

George Abrão 
Maringá/PR

AMIGOS

Nosso grande poeta Vinicius de Moraes escreveu: “E eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!”

E eu, na minha pequenez, afirmo: A nossa família Deus determina; os nossos amigos são irmãos com os quais Ele nos presenteia!

Desde que nascemos, temos a necessidade de amar e sermos amados, isso é primordial para a nossa existência. Então, nossos pais e nossos irmãos - se por felicidade tivermos - cercam-nos de carinho e afeto. Conforme vamos crescendo e outros horizontes abrindo-se para nós, encontramos na nossa vida escolar, na nossa vida social, outras pessoas com as quais convivemos em nosso dia a dia. Algumas delas passam com o tempo, mas outras ficam para todo o tempo, são os irmãos recebidos de Deus, são os irmãos recebidos da vida.

E esses amigos, muito embora e em muitas vezes, por contingências diversas separam-se de nós, do nosso convívio, ficam sempre presentes em nossa mente e em nosso coração, pois nem o tempo, nem a distância conseguem fazer com que nos olvidemos de uma amizade, de um amor verdadeiro!

E quando em uma ou outra ocasião nos reencontramos nos parece que o tempo não passou tamanha é a alegria que nos cumula o espírito. E a nossa convivência parece-nos que não sofreu um parêntese onde só restava a saudade. 

Amo os meus amigos e não tenho pejo em afirmar ou em lhes dizer isso, como não tenho pejo em lhes demonstrar o meu carinho, pois não existe amor mais puro e desinteressado que o amor fraterno, amor que sobrepuja todas as adversidades que a vida impõe. E sempre torço pelos seus sucessos; e sempre vibro quando algo de bom lhes acontece; e sempre choro quando, por uma ou outra razão, eles sofrem.

Na vida não se consegue fazer amigos, se ganha!

Fonte> George Roberto Washington Abrão. Momentos – (Crônicas e Poemas de um gordo). Maringá/PR, 2017. Enviado pelo autor.

segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 81 –

Clarice Lispector
(Chaya Pinkhasivna Lispector)
Chechelnyk/Ucrânia, 1920 – 1977, Rio de Janeiro/RJ

INSÔNIA INFELIZ E FELIZ
 
De repente os olhos bem abertos. E a escuridão toda escura. Deve ser noite alta. Acendo a luz da cabeceira e para o meu desespero são duas horas da noite. E a cabeça clara e lúcida. Ainda arranjarei alguém igual a quem eu possa telefonar às duas da noite e que não me maldiga. Quem? Quem sofre de insônia? E as horas não passam. Saio da cama, tomo café. E ainda por cima com um desses horríveis substitutos do açúcar porque Dr. José Carlos Cabral de Almeida, dietista, acha que preciso perder os quatro quilos que aumentei com a superalimentação depois do incêndio. E o que se passa na luz acesa da sala? Pensa-se uma escuridão clara. Não, não se pensa. Sente-se. Sente-se uma coisa que só tem um nome: solidão. Ler? Jamais. Escrever? Jamais. Passa-se um tempo, olha-se o relógio, quem sabe são cinco horas. Nem quatro chegaram. Quem estará acordado agora? E nem posso pedir que me telefonem no meio da noite pois posso estar dormindo e não perdoar. Tomar uma pílula para dormir? Mas e o vício que nos espreita? Ninguém me perdoaria o vício. Então fico sentada na sala, sentindo. Sentindo o quê? O nada. E o telefone à mão.

Mas quantas vezes a insônia é um dom. De repente acordar no meio da noite e ter essa coisa rara: solidão. Quase nenhum ruído. Só o das ondas do mar batendo na praia. E tomo café com gosto, toda sozinha no mundo. Ninguém me interrompe o nada. É um nada a um tempo vazio e rico. E o telefone mudo, sem aquele toque súbito que sobressalta. Depois vai amanhecendo. As nuvens se clareando sob um sol às vezes pálido como uma lua, às vezes de fogo puro. Vou ao terraço e sou talvez a primeira do dia a ver a espuma branca do mar. O mar é meu, o sol é meu, a terra é minha. E sinto-me feliz por nada, por tudo. Até que, como o sol subindo, a casa vai acordando e há o reencontro com meus filhos sonolentos. 

domingo, 14 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 80 –

Guilherme de Almeida
(Guilherme de Andrade e Almeida)
Campinas/SP, 1890 – 1969, São Paulo/SP

ESTA VIDA

Um sábio me dizia: esta existência,
não vale a angústia de viver. A ciência,
se fôssemos eternos, num transporte
de desespero inventaria a morte.
Uma célula orgânica aparece
no infinito do tempo. E vibra e cresce
e se desdobra e estala num segundo.
Homem, eis o que somos neste mundo.

Assim falou-me o sábio e eu comecei a ver
dentro da própria morte, o encanto de morrer.

Um monge me dizia: ó mocidade,
és relâmpago ao pé da eternidade!
Pensa: o tempo anda sempre e não repousa;
esta vida não vale grande coisa.
Uma mulher que chora, um berço a um canto;
o riso, às vezes, quase sempre, um pranto.
Depois o mundo, a luta que intimida,
quadro círios acesos : eis a vida

Isto me disse o monge e eu continuei a ver
dentro da própria morte, o encanto de morrer.

Um pobre me dizia: para o pobre
a vida, é o pão e o andrajo vil que o cobre.
Deus, eu não creio nesta fantasia.
Deus me deu fome e sede a cada dia
mas nunca me deu pão, nem me deu água.
Deu-me a vergonha, a infâmia, a mágoa
de andar de porta em porta, esfarrapado.
Deu-me esta vida: um pão envenenado.

Assim falou-me o pobre e eu continuei a ver,
dentro da própria morte, o encanto de morrer.

Uma mulher me disse: vem comigo!
Fecha os olhos e sonha, meu amigo.
Sonha um lar, uma doce companheira
que queiras muito e que também te queira.
No telhado, um penacho de fumaça.
Cortinas muito brancas na vidraça
Um canário que canta na gaiola.
Que linda a vida lá por dentro rola!

Pela primeira vez eu comecei a ver,
dentro da própria vida, o encanto de viver.

sábado, 13 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 79 -

Cláudio de Cápua
São Paulo/SP, 1945 – 2021, Santos/SP

A ARTE E A CRIATURA

Tudo o que a retina humana fotografa é registrado com mais ou menos força no cérebro. A contemplação de uma paisagem, por uma pessoa de sensibilidade, pode criar sensações, inexplicáveis, em sua alma, e essa mesma paisagem, vista por outra criatura menos sensível, pode passar completamente despercebida.

A Arte é magia que penetra na alma e povoa a mente das criaturas.

É o despertar das ideias mais elevadas do ser humano.

E claro que, dependendo da categoria a que pertença esta criatura, as visões de um tema, ao invés de propiciar pensamentos sublimes, pode também contribuir para estimular pensamentos ruins.

Diante de tal questão, é desejável que a Arte caminhe sempre de mãos dadas com a moral, dentro de objetivos que, através da sensibilidade, consiga entusiasmar a criatura, atingindo subjetivamente sua inteligência. 

Segundo a filosofia, o homem, antes de pensar, sente.

O pensamento nasce como fatal consequência do sentimento e desvela pensamentos, que fazem nascer diferentes estados da alma.

Quando se sente oprimida, a criatura humana, por ideias ácidas e tormentosas refia-se na literatura, na poesia, na música ou na contemplação de uma obra de Arte.

Diante da influência benéfica da Arte, o espírito ferido encontra o bálsamo milagroso.

Se a Arte em geral desperta sentimentos bons, estimulando novas ideias, fortalecendo a inteligência, não resta dúvidas de que é saudável estabelecer ligações permanentes com as variadas formas de beleza encarnadas pela Arte.

(In Cláudio de Cápua. Retalhos de Imprensa. São Paulo: EditorAção, 2020. Enviado pelo autor)

sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 78 -

Jaqueline Machado
Cachoeira do Sul/RS

Devaneios

 Nas paredes da casa do meu “eu”, estão plasmadas em placas de muitas letras, as histórias de todas as minhas experiências. E elas revelam as múltiplas faces de mim mesma. Nelas, estão vestígios hereditários, vícios, virtudes, dores e alegrias não contadas...

E tudo que existe em mim também existe em você.

Fico inquieta em meus devaneios a pensar... Nós, humanos, somos tão pequenos. E ao mesmo tempo, seres verdadeiramente hábeis, férteis, grandiosos, filhos da imensidão...

Mas tem algo que frequentemente me sobressalta a mente: como podemos ser tão inteligentes e, por vezes, tão débeis?

Já fomos capazes de pintar a Santa Ceia, de criar o avião, criar vacinas capazes de erradicar males terríveis e, mesmo assim, também capazes de entregar nosso bem maior, o coração, para quem não o deseja.  E ainda vermos graça nisso...

É ... Somos incríveis e também bestiais... Mas não será justamente essa mistura de sensatez com loucura que nos torna seres humanos de fato?

Eis o eterno dilema do  “ser ou não ser”, fazer ou deixar de fazer sem entendermos bem o porquê de toda essa confusão...

Acho que escolhas certas e erradas fazem parte do caminhar. Não há como evitá-las. E o dia que houver, deixaremos de ser gente para nos tornarmos em robôs...

Somos verdadeiros paradoxos em pequenos frascos de perfume onde o ciúme da vida vem nos acariciar.

Somos feitos de todos os aromas, de todas as somas do caos e do equilíbrio dessa existência maravilhosamente louca, vaidosa, cheia de delírios...

Queria ser um querubim, um serafim, talvez... Mas acho que sou apenas um anjo decaído, de asas cortadas, a buscar pela própria redenção por meio de preces faladas, rezas cantadas, dirigidas aos céus...

E veja que curioso: quando estou a rezar, por alguns instantes, crio asas e diante dos reflexos do passado, do presente e do futuro, insisto em me perguntar: Afinal, quem sou? Uma réplica viva do pecado ou sinônimo de amor? E no interior de mim, a voz misteriosa da Grande Mãe sussurra em meu ouvido: – Você é uma mescla de tudo isso e mais um pouco, a minha mais bela criação!

quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 77 -

Cecy Barbosa Campos
Juiz de Fora/MG

PRESENÇA

Aprendi, com você, que é sempre bom voltar para casa. Até mesmo, quando em período de férias, aproveitando momentos de lazer e achando que seria bom prolongar aquele período de relaxamento, eis que o retorno ao nosso espaço de intimidade total, surpreendentemente, torna-se agradável ao atravessarmos o umbral da porta.

Até hoje, permanece em mim este sentimento. Ao chegar do trabalho, ou de alguma viagem, sinto aquele impulso de alegria ao virar da chave na fechadura e ao adentrar no meu espaço.

Naquele momento, sinto que você está ali. Rapidamente, percorro a casa, presto atenção aos ruídos que me enganam. Às vezes, são os estalidos da madeira que geme ao abraço do sol. Procuro, em cada cômodo, atrás das portas, fico em dúvida, olho outra vez. Você pode estar escondido em qualquer canto, tentando surpreender-me alegremente, com seu olhar matreiro e afetuoso.

De repente, penso tê-lo visto e estendo os braços ansiando por um abraço. Só o vazio encontro... Percebo, então, que, ali, a busca é inútil, porque é em meu coração que você está presente.

(in Cecy Barbosa Campos. Recortes de Vida. Varginha/MG: Ed. Alba, 2009. Livro enviado pela autora.)

quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 76 -

Luiz Poeta
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

FILHA DO TUDO E DO NADA

Por que chegaste sem convite, poesia?
Ferindo o dia com teus líricos mistérios?
Traçando rotas sem pedir meus hemisférios,
Iluminando o meu amor com a fantasia?

Por que vieste sem palpites, inspirada,
filha do nada que há no tudo dos amores?
...trouxeste a lírica angústia que há nas dores,  
e a sedução que há na  pessoa apaixonada.

Ah, qual Cupido, me tornaste sonhador, 
mas fui flechado na emoção  mais colorida, 
e fiz de ti, poesia, a alma de uma vida,
tão dividida entre a lida e o meu amor. 

Por que é que partes para os olhos mais carentes
de ler meus sonhos, como se eles fossem seus
e meus silêncios  - que nem sei se ainda são  meus -
que alimentas, com teus versos convincentes?

A emoção, filha do amor dos sonhadores
da qual te apossas todas vezes que ela vem,
liricamente se transporta para alguém 
que, como eu, busca silêncios sedutores.

Ouve o que dizem os amores, poesia,
planta, no dia, o teu melhor, liricamente, 
deixa, de mim, esta alegria que só  sente
o coração que; com teus sonhos... se inebria.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 75 –

 Cecília Meireles
Rio de Janeiro/RJ, 1901 – 1964

CANÇÃO

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

domingo, 7 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 74 -

 
Auta de Souza
Macaíba/RN, 1876 – 1901, Natal/RN

AO CAIR DA NOITE

Não sei que paz imensa
Envolve a Natureza,
Ness’ hora de tristeza,
De dor e de pesar.
Minh’ alma, rindo, pensa
Que a sombra é um grande véu
Que a Virgem traz do céu
Num raio de luar.

Eu junto as mãos, serena,
A murmurar contrita,
A saudação bendita
Do Anjo do Senhor;
Enquanto a lua plena
No azul, formosa e casta,
Um longo manto arrasta
De lúrido esplendor.

Minhas saudades todas
Se vão mudando em astros...
A mágoa vai de rastros
Morrer na escuridão...
As amarguras doidas
Fogem como um lamento
Longe do Pensamento,
Longe do Coração.

E a noite desce, desce
Como um sorriso doce,
Que em sonhos desfolhou-se
Na voz cheia de amor,
Da mãe que ensina a Prece
Ao filho pequenino,
De olhar meigo e divino
E lábio aberto em flor.

Ah! como a Noite encanta!
Parece um Santuário,
Com o lindo lampadário
De estrelas que ela tem!
Recorda-me a luz santa,
Imaculada e pura,
Da grande noite escura
Do olhar de minha mãe!

Ó noite embalsamada
De castas ambrósias...
No mar das harmonias
Meu ser deixa boiar.
Afasta, ó noite amada,
A dúvida e o receio,
Embala-me no seio
E deixa-me sonhar!

sábado, 6 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 73 –

Natali Cristiane dos Santos Silva
Sorocaba/SP

TROCADOS

Esqueça de me perguntar se ainda há amor em mim!

Não é justo depois de tanto tempo você forçar os meus olhos a te verem aqui! Sentado na chuva esperando meu SIM!

Não, Não, repito Não, o meu amor já chegou ao limite e você nem notou, aliás, nada nunca notou.

Quantas vezes você se perguntou como eu estava nestes últimos 3 anos?

Como eu estaria depois daquele maldito dia?

Como estariam minhas feridas que por anos lambi na escuridão do meu quarto, rindo da minha ignorância, afinal eu me enganei e deixei que você me enganasse.

Não tenho mágoas, nem isto você merece!

Ainda não tenho rumo, mas NUNCA, NUNCA mais permitirei que os meus pés confusos, mas hoje sóbrios, caminhem em ruas onde eu possa encontrar os teus dedos finos e longos, mas encardidos de desamor.

Vá, tome seu rumo, nunca houve um abrigo para mim no teu peito, e hoje eu me recuso a te dar o meu.

Tenho hoje um farol, não igual ao teu, por que este sim me ilumina.

Não, Não, nunca te troquei, não me chame de infiel.

Apenas não houve amor, houve dependência, como uma droga que só vicia, mas no meu caso foi imoral e com o tempo descobri que foi fatal.

Fatal para as mais puras raízes da minha alma, da minha história, mas como diz aquela música, "Valeu, valeu, valeu demais".

Me levantei em meio ao pó sob os aplausos da minha dor.

Foi a minha vez de caminhar e não olhar pra trás.

Jurei, jurei para mim e para o meu espírito que nunca mais OLHARIA PRA TRÁS.

E não seria nesta madrugada tão triste em que vejo seu corpo magro e maltratado pelo tempo que falharia com a minha promessa, nem comigo.

Aceite estes trocados, aceite minhas migalhas, isto eu posso te dar, afinal foi isto que recebi de ti, e embarque no próximo trem.

Isto não é um conselho por que nem eu mesma aceito isto de ninguém, mas volte para sua terra, talvez exista alguém ainda lá ansiando a tua volta.

Eu repito, não estava lhe esperando.

Vá, junte seus trapos e embarque, a minha vida continua e tenho a impressão que cheguei atrasada para a festa.

Um dia lhe mandarei flores, não como um sinal de homenagem, mas de luto, como sinal da minha morte, na tua vida.

"O amor é claro, mas também sombrio, a escolha é sua"

sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 72 –

Manuel Bandeira
Recife/PE, 1886 – 1968, Rio de Janeiro/RJ

A DAMA BRANCA

A Dama Branca que eu encontrei,
Faz tantos anos,
Na minha vida sem lei nem rei,
Sorriu-me em todos os desenganos.

Era sorriso de compaixão?
Era sorriso de zombaria?
Não era mofa nem dó. Senão,
Só nas tristezas me sorriria.

E a Dama Branca sorriu também
A cada júbilo interior.
Sorria querendo bem.
E todavia não era amor.

Era desejo? – Credo! de tísicos?
Por história… quem sabe lá?…
A Dama tinha caprichos físicos:
Era uma estranha vulgívaga*.

Ela era o gênio da corrupção.
Tábua de vícios adulterinos.
Tivera amantes: uma porção.
Até mulheres. Até meninos.

Ao pobre amante que lhe queria,
Se lhe furtava sarcástica.
Com uns perjura, com outros fria,
Com outros má,

– A Dama Branca que eu encontrei,
Há tantos anos,
Na minha vida sem lei nem rei,
Sorriu-me todos os desenganos.

Essa constância de anos a fio,
Sutil, captara-me. E imaginai!
Por uma noite de muito frio
A Dama Branca levou meu pai.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
* Vulgívaga = que se vulgariza, se prostitui.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa - 71 -

Carlos Drummond de Andrade
Itabira/MG (1902 - 1987) Rio de Janeiro/RJ

A UM AUSENTE

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.

Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste. 

terça-feira, 2 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa – 70 –

Clarisse da Costa 
Biguaçu/SC

Simplesmente Mulher Guerreira

Eu sou do jeitinho que sou. Pra mim não tem essa de ser normal. O ser diferente é mais legal, até mesmo porque nunca quis ser igual a todos. Já digo logo, eu sou chata quando quero ouvir a melhor música. Eu pareço um disco arranhado ouvindo a mesma melodia.

Não consigo terminar o dia sem uma boa música. Eu tenho aquele sorriso de canto. Outras vezes aquele sorriso frouxo que sorri junto com os olhos. E faço as pessoas sorrirem sem intenção alguma. Gosto da alegria que me rodeia. Claro, nem tudo é flores, às vezes eu choro, nem sempre sou fortaleza, mas ninguém vai me ver pra baixo, abro aquele sorriso e passo o meu batom vermelho. E como dizem, sigo o baile. Eu sou menina, outras vezes mulher.

Vivo a vida como Deus quer. Eu sou sentimento e ousadia. Pego o meu andador e enfrento a vida. Quando amo é por inteiro, já até chorei no meu travesseiro. Não sei fingir, muito menos fugir. Sinto e pronto. Eu enfrento as batalhas da vida sozinha. Não deixo o medo me dominar. 

Sou guerreira, não paro de lutar. Sofro preconceito. Tentam me colocar pra baixo, mas não deixa de sonhar. Eu sou uma mulher que não para de acreditar no melhor.