sábado, 16 de agosto de 2008

Paraná em Trovas

Paquerador, mas casado,
da aliança faz segredo.
Sai por aí, o safado,
com um “bandeide” no dedo...
Adilson de Paula (Joaquim Távora)

Embora nos cause mágoa,
a lágrima é um grande bem.
– Nada fazemos sem água,
e é dela que tudo vem!
Antonio Facci (Maringá)

"Guardai-vos!", diz o bom senso;
"Namorai!", diz a paixão.
- Cada vez mais me convenço
de quão sábio é o coração!
A. A. de Assis (Maringá)

Se vais namorar, não leves
relógio nem celular...
São bons momentos tão breves,
que exigem total vagar.
A. A. de Assis (Maringá)

Nas costas, leva a criança
seus livros, numa sacola;
nos olhos leva a esperança
como colega de escola!
A. A. de Assis (Maringá)

Regai o amor e a alegria
no coração das crianças.
- É ali que a cidadania
se abastece de esperanças!
A. A. de Assis (Maringá)

A mágoa sufoca, aperta,
traz doença, mal-estar.
Desse mal só se liberta
quem aprende a perdoar.
Arlene Lima (Maringá)

O amor, para muita gente,
é diversão perigosa.
Quem não sabe ser prudente
transforma em espinho a rosa.
Arlene Lima (Maringá)

A sorte tem seus encantos,
seus agrados, seus engodos;
às vezes agrada a tantos,
mas jamais agrada a todos!
Amália Max (Ponta Grossa)

Se me deixas por vontade...
se vais para não voltar...
O que é que eu digo à saudade
amanhã, quando acordar?
Amália Max (Ponta Grossa)

Relógio, fique parado!
Não deixe o tempo passar...
Eu quero ser enganado
quando a velhice chegar!
Amália Max (Ponta Grossa)

Nas noites de paz eterna,
vigiando a escuridão,
toda estrela é uma lanterna
que um anjo leva na mão!
Amália Max (Ponta Grossa)

Laranjais de minha infância,
frutos que alegre colhi,
hoje olho para a distância
e choro porque cresci!
Amália Max (Ponta Grossa)

A ermida à beira da estrada
plange seu sino de um jeito,
que eu sinto a corda amarrada
na saudade do meu peito...
Amália Max (Ponta Grossa)

Depois do enxerto a coitada,
que quis o rosto alisar,
agora vive assustada...
Seu rosto só quer sentar!
Amália Max (Ponta Grossa)

Qualquer destroço encontrado
numa estrada percorrida,
são restos do meu passado;
ruínas da minha vida!
Alberto Pacco (Maringá)

Pobre sogra... pobre luso...
pobre vizinho... Eles são
pobres vítimas do abuso
dos pobres de inspiração!
Antônio da Serra

A pecar não me provoque
nem destrua o que semeio.
Não se atreva àquele toque,
pois desejo não tem freio
Cecim Calixto (Tomazina) +

Mesmo tachado de antigo,
ainda espalho esperança
ao mundo sincero e amigo
do coração da criança.
Dari Pereira (Maringá)

O tempo passa, e as lembranças
dos sonhos da mocidade
vão transformando esperanças
em desengano e saudade...
Déspina Athanásio Perusso (Londrina)

Sei que os motivos são poucos,
sei que as razões também são,
mas este amor nos põe loucos
e os loucos não têm razão!
Gerson Cesar Souza (São Mateus do Sul)

A espera é aquele momento
em que a saudade dispara
e o relógio fica lento,
fica lento e quase pára...
Gerson Cesar Souza (São Mateus do Sul)

O perdão, embora escasso,
é a cola mais indicada
para unir cada pedaço
de uma promessa quebrada.
Gerson Cesar Souza (São Mateus do Sul)

Sou feliz por um segundo
quando o amor encurta espaços
e a fronteira do meu mundo
toma a forma dos teus braços.
Gerson Cesar Souza (São Mateus do Sul)

As lembranças de nós dois
fui guardando nas caixinhas...
para descobrir, depois,
que em verdade...eram só minhas!
Istela Marina Lima (Bandeirantes)

Na resposta, que não veio,
certeza e desilusão;
você não quis que o correio
fosse cúmplice de um não!
Istela Marina Lima (Bandeirantes)

Se a resposta à sua prece
demora tanto a chegar,
não pense que Deus esquece,
tudo tem tempo e lugar!
Istela Marina Lima (Bandeirantes)

Do trem-fantasma descendo,
o luso muito espantado,
pra cachopa sai dizendo:
Pegamos o bonde errado!"
Istela Marina Lima (Bandeirantes)

Ante o fogo, até me exponho
e, se eu perder a batalha,
há de nascer outro sonho
das cinzas que o vento espalha!
Janete de Azevedo Guerra (Bandeirantes)

Voltei. Cabisbaixa eu vinha,
com o orgulho lá no chão...
Melhor do que estar sozinha
e coberta de razão!
Jeanette de Cnopp (Maringá)

Nem sempre a felicidade
vem da vitória ou da fama:
pode estar numa saudade
ou nos sonhos de quem ama!
Jeanette de Cnopp (Maringá)

Tu fazes lindos castelos
com areia do jardim.
-- Criança, os sonhos mais belos
são feitos também assim!
Jeanette de Cnopp (Maringá)

O tempo, veloz, avança,
consumindo nossos anos.
Vamos perdendo esperança
e colhendo desenganos...
José Corrêa Francisco (Ponta Grossa)
.
Tantos passos caminhei
por labirintos incertos.
Hoje com a trova achei,
como vencer os desertos.
José Feldman (Ubiratã)
.
No teu corpo perfumado,
no brilho de teu olhar,
têm um castelo encantado,
Castelo do eterno amar.
José Feldman (Ubiratã)
.
No Dia dos Namorados,
tenho saudade no peito
daqueles tempos passados
de tanto amor e respeito.
Lairton Trovão de Andrade (Pinhalão)

Num certo 12 de junho,
vi caracteres gravados:
Meu nome escrito em teu punho,
pois, éramos namorados!
Lairton Trovão de Andrade (Pinhalão)

Os abraços das chegadas
e os abraços das partidas,
com tantas datas marcadas,
vão marcando as nossas vidas!
Lucília Ap. T. De Carli (Bandeirantes)

Nem sempre vamos vencer
nessa ou naquela disputa...
O que importa é não perder
a coragem para a luta!
Lucília Ap. T. De Carli (Bandeirantes)

De volta, naquela viagem,
carregando o olhar tristonho,
via de perto a paisagem,
mas bem distante o meu sonho...
Lucília Ap. T. De Carli (Bandeirantes)

O amor, atrás das vidraças,
num peito que não se cansa,
faz descerrar, quando passas,
as cortinas da esperança...
Maria Helena Oliveira Costa (Ponta Grossa)

Mais que ouro, fama, respeito...
Mais que honraria, abastança,
é trazer dentro do peito
simplesmente uma esperança!
Maria Farias Inocêncio (União da Vitória)

Naquela mesa de bar,
nem nos tocamos, por medo...
Mas o amor em nosso olhar
era maior... que o segredo!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

De ilusões eu fui vivendo...
e a esperança, disfarçada,
via os meus sonhos morrendo,
mas nunca me disse nada!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Sempre voltas... E eu, magoada,
querendo dizer-te não,
enfeito a porta da entrada
com as flores... do perdão!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Na altivez deste meu porte,
de rainha em pedestal...
existe a mulher que é forte
e a outra... que é de cristal!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Jovem, se você me ouvisse,
daria aos velhos bom trato...
por entender que a velhice
é o seu futuro retrato!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Lavrador, por tuas mãos,
que Deus dotou de magia,
faz-se o milagre dos grãos,
dando o pão de cada dia!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Minha vida hoje é um legado
de sonhos, renúncia... enfim,
por eu ter acreditado
mais nos outros... do que em mim!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Os meus natais de criança,
hoje eu sei, tinham magia.
Tios, pais, avós, festança...
tinham tudo e eu não sabia!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Saudade, esperança morta,
que ao coração não dá trelas...
Se a gente lhe fecha a porta,
ela arrebenta as janelas!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

No meu velho travesseiro,
com as nossas iniciais,
teu amor breve e fagueiro
bordou lembranças... demais!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Quem sofre uma desventura
não pode deixar de crer
que, após uma noite escura,
brilha a luz do alvorecer!
Maria Lúcia Daloce Castanho (Bandeirantes)

Jovens estão temerosos?
Estimule-os a aprender,
tornando-os bem poderosos
com o domínio do saber.
Maria Stinglin (Curitiba)

Trovadores... luz... ribalta!
No cenário: a poesia.
Trova nasce... verso salta...
na maior coreografia.
Maria Stinglin (Curitiba)

Vem na natureza... em cota!
O dom de ser escritor...
Muitas vezes ninguém nota,
e o texto está numa flor!
Maria Stinglin (Curitiba)

Lá fora, nada me importa
e esqueço da vida ingrata,
quando você fecha a porta
... e tira o nó da gravata!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Sorrateiro, sem fumaça,
arrasador, inclemente,
é aquele fogo que passa...
queimando os sonhos da gente!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Não tema os dias futuros,
pise firme e siga adiante;
olhe a praia, que, sem muros,
escora o mar, que é gigante!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Esperança é um galho torto
numa floresta esquecida:
por fora, parece morto;
por dentro, cheio de vida!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Quanta energia perdida
ao longo de uma jornada,
de quem passou pela vida,
teve tempo... e não fez nada!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Na igrejinha abandonada,
Deus não se sente sozinho:
nas mãos da imagem quebrada
um sabiá fez o ninho!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Os agrados de verdade
que você me prometeu
me fazem sentir saudade
do que não aconteceu!...
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

A esperança que castiga,
por mais distante que esteja,
é qual cirurgia antiga:
-- de vez em quando... lateja!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

O caixão do aposentado
era curto, e ele, comprido:
na vida... foi "apertado";
na morte... foi "espremido"!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Nossa mesa, lá na roça,
fica cheia de requintes
quando o rádio, na palhoça,
diz: "Bom-Dia, Meus Ouvintes"!
Neide Rocha Portugal (Bandeirantes)

Neste frio, os namorados,
já reunidos "tete a tete",
cada vez mais agarrados...
Este inverno compromete!
Nei Garcez (Curitiba)

O namoro é uma viagem
que nos leva ao paraíso,
mas quem for comprar passagem...
Na bagagem leve juízo.
Nei Garcez (Curitiba)

Todo dia um novo amor
é tão fácil de encontrar.
O difícil, sim senhor,
... sempre o mesmo conquistar!
Nei Garcez (Curitiba)

No meu tempo de namoro
compromisso era casar.
Hoje, rindo ou com um choro,
compromisso é só ficar.
Nei Garcez (Curitiba)

Quem namora a vida inteira,
com a mesma namorada,
numa mão tem a bandeira
e na outra a sua amada.
Nei Garcez (Curitiba)

Quando o amor fica em ruína,
sem chão, paredes... ou teto,
o alicerce nos ensina
que só o carinho é concreto.
Olga Agulhon (Maringá)

As dores e os desencantos,
lancem ao pó das estradas...
– Façam dos lares recantos
que lembrem contos de fadas!
Olga Agulhon (Maringá)

No colo do solo bruto,
se a semente é bem tratada,
por prêmio colhe-se o fruto
da esperança ali plantada.
Olga Agulhon (Maringá)

Mira a “boneca” o “pendão”
que a contempla lá de cima...
– É o milho em fecundação
pra safra que se aproxima!
Olga Agulhon (Maringá)

Não há fronteira na vida
que separe um grande amor,
quando a ponte foi erguida
pelas mãos do Criador.
Olga Agulhon (Maringá)

De nada vale uma imagem
de Cristo em sua parede,
se você nem tem coragem
de dar água a quem tem sede.
Olga Agulhon (Maringá)

De viver, não tenha medo;
todo receio é bobagem...
Dessa receita, o segredo
é a pitada de coragem.
Olga Agulhon (Maringá)

Coragem: medo vencido...
Fé em Deus, em nós, na lida.
Nunca nada está perdido,
se há amor em nossa vida.
Olga Agulhon (Maringá)

Fechamos o coração
por medos e razões várias,
sem percebermos que são
barreiras imaginárias.
Olga Agulhon (Maringá)

O homem do barro nasceu...
A mulher, de uma costela.
Mas ele sobreviveu
porque estava ao lado dela.
Olga Agulhon (Maringá)

A chuva benze a semente,
que o homem planta no chão;
e Deus permite que a gente
transforme o trigo no pão.
Olga Agulhon (Maringá)

Era uma estrada deserta,
com muito barro... atolamos.
Não me lembro a data certa;
lembro o quanto nos amamos!
Olga Agulhon (Maringá)

Resisti enquanto pude,
mas não houve solução...
-- Abandonando a virtude,
entreguei... o coração!
Olga Agulhon (Maringá)

Nessa entrega louca, insana,
descobri que sou assim:
-- Tenho a alma de cigana
e fogo dentro de mim.
Olga Agulhon (Maringá)

Confessar? Não sei se devo,
tenho muito o que contar...
Mas prefiro quando escrevo,
sem ver censura no olhar!
Olga Agulhon (Maringá)

No coração trago a estrada
e, no olhar, terras sem fim...
Mas a rotina, malvada,
fez cercas no meu jardim.
Olga Agulhon (Maringá)

Companheiro, estenda a mão,
que nem um bom cavalheiro,
ao colega, amigo, irmão...
porém lave a mão primeiro!
Oswaldo Reis (Maringá)

“Tem quantas partes o crânio?”,
pergunta a mestra à piazada.
Responde unzinho, instantâneo:
“Depende da cacetada!”
Oswaldo Reis (Maringá)

Menininha no quintal,
tadinha, brincando só,
faz algo que lhe faz mal:
cata cocô de cocó...
Oswaldo Reis (Maringá)

Mostra o sábio, o que destaca
do burro a paca, e sussurra:
- é que o burro sempre empaca
e a paca jamais emburra...
Oswaldo Reis (Maringá)

Se a fé em Deus te acompanha
na andança de déu em déu,
podem barrar-te na Espanha,
nunca na porta do céu!
Oswaldo Reis (Maringá)

Nos mistérios deste outono,
as folhas caindo ao chão,
tecem colchas de abandono
que envolvem minha ilusão! ...
Sônia Mª. Ditzel Martelo (Ponta Grossa)

Que imenso mundo se esconde
na pena de intenso brilho
que torna em sábio Visconde
um sabuguinho de milho...
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba)


Velha torre escura, ao longe...
O seu perfil me insinua
a idéia de um velho monge
tomando conta da lua.
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba)

Num dos lances mais astutos
que a vida tem me inspirado,
eu mostro os olhos enxutos
e escondo o lenço molhado...
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba)

Quem crê não teme o fracasso
e nunca segue sozinho,
pois, quando quer dar um passo,
Deus já prepara o caminho.
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba)

O pinheiro nas encostas,
galhos erguidos ao léu,
lembra um homem de mãos postas,
em silencio, olhando o céu.
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba)

Na fantasia que usava,
de "Brasil", no Carnaval,
volta e meia ela mostrava
o "distrito federal".
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba)

Amor, um santo remédio,
que revitaliza e cura.
Livra-nos de qualquer tédio,
também nos leva à loucura.
Vânia Ennes (Curitiba)

Meu jogo, audaz e exigente,
encara a carta que der,
mas com você, frente a frente...
jogo charme de mulher!
Vânia Ennes (Curitiba)

Causador da minha insônia,
motivo do meu sorriso,
sem nenhuma cerimônia,
vou contigo ao paraíso!
Vânia Ennes (Curitiba)

Fazer da vida uma festa
é atitude que fascina.
Vamos rir! A hora é esta!
O bom humor contamina.
Vânia Ennes (Curitiba)

Eu não mudo de país,
nem de cidade ou estado,
porque aqui sou bem feliz...
exatamente... ao teu lado!!!
Vânia Ennes (Curitiba)

Dormi... e sonhei contigo
na praia, com lua cheia!
Foi delírio, hoje prossigo
te procurando na areia!
Vânia Ennes (Curitiba)

Reconheço que a razão
me exerce extremo fascínio,
mas, se acerta o coração...
perco o rumo e o raciocínio!
Vânia Ennes (Curitiba)

Afinal, eis a questão:
achei um rico alimento...
Somos gêmeos na emoção:
teu amor é o meu sustento.
Vânia Ennes (Curitiba)

Um mar de esperanças novas
magicamente brotou
na ternura dessas trovas
que o teu carinho inspirou!
Victorina Sagboni (Curitiba)

Depois de uma aurora linda,
sigo o momento que avança
e, quando a tarde se finda,
renovo minha esperança!
Wanda Rossi de Carvalho (Bandeirantes)

Usando o adubo da fé
em Vila Capivari,
o povo, ao plantar "café",
fez nascer "Jambeiro" ali!
Wandira Fagundes Queiroz (Curitiba)

O jambo é tão brasileiro,
não por seu sabor apenas:
deu também nome a Jambeiro
e "cor" às nossas morenas!
Wandira Fagundes Queiroz (Curitiba)

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

A. A. de Assis (Estudar é Preciso)

O poeta nasce feito?...Quase. Nasce com uma competência natural, o que geralmente chamamos "dom". Esse "dom" distingue-o como uma pessoa especial, criativa, capaz de utilizar a palavra como matéria-prima da arte. O poeta precisa, entretanto, ajudar a natureza, complementando o "dom" com as ferramentas proporcionadas pelo estudo e pelo treinamento. O estudo lhe fornece a indispensável bagagem cultural; o treinamento lhe permite aprimorar a técnica. Isso siginifica que ninguém fará poesia de boa qualidade sem que se empenhe num constante e diciplinado exercício de aprendizagem.

Consulta freqüente a bons manuais de linguagem e de versificação, leitura de livros e mais livros de poemas (principalmente livros e mais livros de Trovas); aprofundamento na história da literatura; participação em oficinas, seminários, congressos, concursos, festas literárias, etc; permanente troca de idéias com outros poetas, sobretudo produção intensa de poesia. Porque o poeta ou se entrega para valer, e apaixonadamente, à sua arte, ou jamais passará de um fazedor de versinhos. Toda arte exige dedicação. A poesia mais do que qualquer outra, e mais ainda a poesia na modalidade Trova. Muito estudo. Treinamento incessante. "Dom", cultura e técnica somados.

Se você aceita o desafio, parabéns para todos nós, candidatos que somos a leitores dos seus belos versos.

Fonte:
Boletim Nacional da União Brasileira dos Trovadores
Agosto 2008 - numero 481. p.1.

Rafael Castellar das Neves (Era uma vez uma Novidade)

Ah, como é delicioso o sabor de uma novidade! Aquela novidade de algo surpreendente introduzido em nossas vidas e que nos rouba toda a atenção. Que nos faz dedicarmo-nos de maneiras improváveis e questionáveis. Que derruba valores, conceitos e definições. Que nos faz agir como inconseqüentes, passando por cima de tudo, de todos e até de nós mesmos, apenas para estarmos próximos. Que nos tira a concentração de todo um dia. Que não sai dos pensamentos, ou melhor, que é nossos pensamentos, e exige nossas presenças, ações e olhares. Como é bom viver a novidade, carregá-la no bolso do paletó, para cima e para baixo, exibindo-a a todos, com orgulho e arrogância. Aquela novidade que nos faz rever todos nossos conceitos, nossas atitudes, nossos sentimentos, nossos objetivos, nós mesmos.

Novidades assim nos fazem mudar, construir, destruir e, inclusive, nos enganar, simplesmente para tê-las plenamente em nossas entranhas. Dão-nos razão para um despertar alegre, para um dia entusiasmado, para um adormecer pueril. Fazem com que nossos corações batam empolgados, com que tenhamos o corpo inquieto por sentimentos intensos, com que as rédeas da razão sejam soltas para que possamos sentir o vento tocando nossos rostos enquanto somos tomados por uma sensação de paz em um galope sem destino, em uma praia qualquer, de braços abertos e peitos cheios.

Ah, melhor ainda é ser novidade! Ser desejado, ser perseguido, ser cobrado pela ausência, ser quisto no amanhecer, durante o dia, no tarde da noite. Ser pensamento de quem busca inutilmente o sono. Ser mantido no coração, ser fonte se sonhos de uma vida, ser motivo de felicidade buscada, ser alvo de destino manipulado, ser tido como o escolhido que nunca foi achado. Como é bom ser especial, ser buscado, ser cuidado, ser porto-seguro, ser afago, receber sorrisos de bom-dia.


É, mas a vida tem um senso de humor doente. Brinca conosco de forma cruel: sem que ao menos percebamos, transforma a novidade em algo comum. Aquela novidade se transforma em algo corriqueiro que não merece mais tanta atenção, dedicação e, nem ao menos, desperta aquela inquietude que tanto nos motivara. Desvaloriza-se e perde a prioridade em nossas vidas. Sai do bolso e vai para a estante, onde será vista vez ou outra quando passarmos sem pressa e, talvez, vez ou outra, trará aos nossos pensamentos algumas lembranças ternas do tempo em que ainda era novidade, mas sem aquela intensidade com que foi concebida. Na estante, faz parte da nossa paisagem, estará sempre lá e acreditamos que isso é suficiente. Que nada necessita ser feito, pois, se preciso for, basta apenas esticar os braços para ter a antiga novidade – novo algo comum.

Dizem que é assim que caminham as vidas. Que assim são as coisas. Mas não posso admitir isso, não posso admitir a estante. Não posso admitir que tenhamos o direito de tornar comum algo que nos faz incomum. Deixar de lado, sem mais nem menos apenas acreditando que está intrínseco e dispensa afagos. Uma planta que não é regada cuidadosamente todos os dias não nos mostra suas flores; ela seca!

Quero descobrir como se faz para passar por entre os acontecimentos rotineiros, os problemas, as prioridades, as dificuldades e sair do outro lado ainda como uma novidade. Mesmo não sendo uma novidade nova, mas que ainda seja novidade, eterna. Quero aprender como regar minhas plantas todos os dias para que, ao invés de secarem, continuem a florir minha vida.

Não quero ser paisagem, me nego a terminar em uma estante, empoeirado.

Fonte:
http://descemaisuma.blogspot.com

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Ascenso Ferreira (1895 - 1965)

artigo de Semira Adler Vainsencher, da Fundação Joaquim Nabuco, em Recife, 9 de dezembro de 2003.

Na rua dos Tocos, em Palmares, Pernambuco, na madrugada do dia 9 de maio de 1895, nascia um futuro grande poeta. Seu pai era o comerciante Antônio Carneiro Torres e sua mãe a professora Maria Luísa Gonçalves Ferreira, cujo apelido era Dona Marocas.

Em 1917, aquele menino, que fora registrado como Aníbal Torres, decidia mudar o seu nome para Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira. E, no futuro, ficava conhecido, apenas, como Ascenso Ferreira.

Ascenso passou toda a sua infância em Palmares. Aprendera a ler e a escrever graças aos esforços de Dona Marocas, uma dedicada professora de escola pública, porque aos 6 anos de idade ficara órfão de pai.

Aos 13 anos, devido à carência de recursos materiais, aquele jovem tinha que trabalhar 10 horas por dia: havia se empregado como balconista na loja A Fronteira, de propriedade de Joaquim Ribeiro, seu padrinho de batismo. Aprenderia muito na vida vendendo meias quartas de carne seca, bicadas de aguardente, cuias de farinha e meias garrafas de querosene.

Portanto, foi através do povo que ele adquiria conhecimentos sobre as mulas-sem-cabeças, os lobisomes e demais personagens do folclore do Nordeste do Brasil. Ainda adolescente, Ascenso já publicava as primeiras poesias, onde ressaltava os elementos típicos regionais: a cana-de-açúcar, o carro de boi, os folguedos, as lendas, em suma, a cultura popular. Tornava-se conhecido, então, como "o filho da professora metido a poeta".

No ano de 1916, juntamente com outros poetas, Ascenso fundava a sociedade "Hora Literária". Mas, por defender o abolicionismo, ele passava a ser perseguido politicamente. Mais tarde, sobre essa fase da vida, o poeta escreveria:

Mamãe foi demitida com 25 anos de serviço! Tivemos a casa pichada; fui vaiado um dia na rua; corrido acintosamente pela polícia; ameaçado de prisão... O estabelecimento de meu padrinho, devido a sua morte, entrara em liquidação. Fiquei sem emprego e sem ter ninguém em Palmares que me quisesse aproveitar os serviços, pois todos tinham receio de desagradar os senhores da situação.

Quando veio residir no Recife, aos 24 anos de idade, Ascenso conseguiu um emprego administrativo, indo trabalhar como escriturário do Tesouro do Estado de Pernambuco. Como poeta, entretanto, ele era lançado pelos estudantes da Faculdade de Direito do Recife, que o obrigaram, em certa ocasião, a declamar seus versos no palco do Teatro Santa Isabel.

Ascenso possuía um aguçado sentido de ritmo. Através dos seus poemas, conseguia fazer com que as pessoas ouvissem, por exemplo, o trem de Alagoas correndo sobre os trilhos:

[...] Mangabas maduras,
mamões amarelos,
mamões amarelos
que amostram, molengos,
as mamas macias
pra gente mamar...
Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar[...]

Em 1921, no Recife, Ascenso Ferreira se casa com a jovem palmarense Maria Stela de Barros Griz, filha do poeta Fernando Griz. No ano seguinte, publicava seus poemas nos jornais Diario de Pernambuco e A Província. Tornava-se um grande amigo de Luís da Câmara Cascudo, Joaquim Cardozo, Souza Barros e Gouveia de Barros.

Ascenso participava de muitos recitais e escrevia o seu primeiro poema modernista: Lusco-Fusco. Em 1927, incentivado por Manuel Bandeira, ele publicava o seu primeiro livro: Catimbó.

No ano seguinte, saía no Recife a segunda edição do seu livro, que já tinha sido lançado no Rio de Janeiro e em São Paulo. Nesta cidade, o poeta dava um recital no Teatro de Brinquedos, sendo muito aplaudido, e fazia amizade com vários intelectuais e artistas do sul do País: Mário de Andrade, Cassiano Ricardo, Anita Malfatti, Eugênia Alvaro Moreira, Oswald de Andrade, Olívia Penteado, Afonso Arinos de Melo Franco e Tarsila do Amaral.

Ascenso publicava o livro Cana caiana, em 1939, com as ilustrações de Lula Cardoso Ayres. Nessa época, tornara a viajar para o Rio de Janeiro, onde conhecia Cândido Portinari, Sérgio Milliet, Osvaldo Costa, entre outras personalidades.

No início da década de 1940, Ascenso se aposentava como diretor da Receita do Tesouro do Estado de Pernambuco e, já um homem maduro, vem a se apaixonar por uma jovem adolescente - Maria de Lourdes Medeiros - indo viver em sua companhia. Em 1948, nasceria a sua filha Maria Luíza. Esta menina foi a sua maior fonte de preocupação na fase final da vida, porque ele temia não viver mais tanto tempo e ter que deixá-la, ainda bem nova, órfã de pai.

Uma outra obra de Ascenso, intitulada Poemas e xenhehém, era lançada em 1951. Dessa vez, ele viajava para o Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, por um período de três meses, para realizar conferências, gravações e dar recitais. No Congresso de Escritores, ocorrido em Goiânia, ele se tornava amigo do célebre Pablo Neruda.

O poeta assinava um contrato com José Olympio Editora, em 1956, para uma nova edição dos seus poemas. Pouco tempo depois, lançava um álbum duplo de discos com as suas obras completas "64 poemas escolhidos e 3 historietas populares", com a apresentação de Câmara Cascudo. Além do mais, ele seria o quarto poeta brasileiro a ter a sua voz gravada para a Biblioteca do Congresso, em Washington.

Ascenso tinha quase 2m de altura, usava um chapéu de palha na cabeça, adorava comer e fumava sempre um grande charuto. Um de seus amigos lembrava que, certa tarde, depois de tomar banho no rio Passarinho, o guloso poeta almoçou três pratos fundos de sarapatel, com farinha de mandioca e pimenta malagueta, bebeu um litro de aguardente com mel de abelha, e, de sobremesa, ainda comeu a metade de uma jaca mole. Quando chegara em casa, à noite, disse à esposa que estava sem fome e, por isso, se contentava com um prato de pirão de leite e um pedaço de carne de sol.

Sobre o poeta, Manuel Bandeira escrevia:

Ascenso Ferreira tem uma estatura gigantesca, que, a princípio, assusta. No entanto, basta ele abrir a boca, para dissipar todos os terrores: é um sentimentalão, e sentimentalmente compreendeu e cantou o drama doloroso do matuto a quem ama [...] Os seus poemas são verdadeiras rapsódias nordestinas, onde se espelhou fielmente a alma ora brincalhona, ora pungentemente nostálgica das populações dos engenhos.

Por sua vez, Luís da Câmara Cascudo ressaltava: “Ascenso Ferreira, Ascensão, Ascenso Grandão, voz grossa de sapanta-boiada, chapelão imenso de carro de bois no alto do metro e noventa de estatura, coroando mais de cem quilos bem pesados.”

Transcreve-se a seguir, um dos mais belos poemas criados por Ascenso Ferreira.

História Pátria

Plantando mandioca, plantando feijão,
colhendo café, borracha, cacau,
comendo pamonha, canjica, mingau,
rezando de tarde nossa Ave-Maria,
Negramente...
Caboclamente...
Portuguesamente...
A gente vivia.
De festas no ano só quatro é que havia:
Entrudo e Natal, Quaresma e Sanjoão!
Mas tudo emendava num só carrilhão!
E a gente vadiava, dançava, comia...
Negramente...
Caboclamente...
Portuguesamente...
Todo santo dia!
O Rei, entretanto, não era da terra!
E gente pra Europa mandou-se estudar...
Gentinha idiota que trouxe a mania
de nos transformar
da noite pro dia...
A gente que tão
Negramente...
Caboclamente...
Portuguesamente...
(E foi um dia a nossa civilização tão fácil de criar!)
Passou-se a pensar,
passou-se a cantar,
passou-se a dançar,
passou-se a comer,
passou-se a vestir,
passou-se a viver,
passou-se a sentir,
tal como Paris
pensava,
cantava,
comia,
Sentia...
A gente que tão
Negramente...
Caboclamente...
Portuguesamente...
Vivia!

Em outra poesia, intitulada Filosofia, Ascenso registrava:

Hora de comer – comer!
Hora de dormir – dormir!
Hora de vadiar – vadiar!
Hora de trabalhar?
-Pernas pro ar que ninguém é de ferro!


Uma outra poesia sua que merece ser transcrita é a seguinte:

Minha Escola

A escola que eu freqüentava era cheia de grades como as prisões.
E o meu Mestre, carrancudo como um dicionário;
Complicado como as Matemáticas;
Inacessível como Os Lusíadas de Camões!
À sua porta eu estacava sempre hesitante...
De um lado a vida... – A minha adorável vida de criança:
Pinhões... Papagaios... Carreiras ao sol...
Vôos de trapézio à sombra da mangueira!
Saltos da ingazeira pra dentro do rio...
Jogos de castanhas...
- O meu engenho de barro de fazer mel!
Do outro lado, aquela tortura:
"As armas e os barões assinalados!"
- Quantas orações?
- Qual é o maior rio da China?
- A 2 + 2 A B = quanto?
- Que é curvilíneo, convexo?
- Menino, venha dar sua lição de retórica!
- "Eu começo, atenienses, invocando
a proteção dos deuses do Olimpo
para os destinos da Grécia!"
- Muito bem! Isto é do grande Demóstenes!
- Agora, a de francês:
- "Quand le christianisme avait apparu sur la terre..."
- Basta.
- Hoje temos sabatina...
- O argumento é a bolo!
- Qual é a distância da Terra ao Sol?
- ? !!
- Não sabe? Passe a mão à palmatória!
- Bem, amanhã quero isso de cor...
Felizmente, à boca da noite,
Eu tinha uma velha que me contava histórias...
Lindas histórias do reino da Mãe-d’Água...
E me ensinava a tomar a benção à lua nova.

No dia 5 de maio de 1965, poucos dias antes de completar 70 anos de idade, Ascenso Carneiro Gonçalves Ferreira, o magnífico poeta dos engenhos, das casas-grandes, da cana-de-açúcar, dos vaqueiros, dos cangaceiros, do bumba-meu-boi, do carnaval, dos cegos violeiros, falecia no Hospital Centenário, no Recife.

Para homenageá-lo, a Prefeitura da Cidade mandou colocar seu busto na rua do Apolo, no bairro do Recife, local onde o poeta gostava muito de perambular. E, no pedestal do busto, mais um de seus belos versos foi gravado:

Sozinho, de noite,
nas ruas desertas
do velho Recife, que atrás do arruado
deserto ficou,
criança , de novo,
eu sinto que sou.

Fontes:
Fundação Joaquim Nabuco.
http://www.fundaj.gov.br/

Ascenso Ferreira (Filosofia - Os engenhos de minha terra - Trem de Alagoas)

Filosofia
A José Pereira de Araújo - "Doutorzinho de Escada"

Hora de comer, - comer!
Hora de dormir, - dormir!
Hora de vadiar, - vadiar!

Hora de trabalhar?
-Pernas pro ar que ninguem é de ferro!
********************
Os engenhos de minha terra

Dos engenhos de minha terra
Só os nomes fazem sonhar:

- Esperança !
- Estrela d'Alva !
- Flôr do Bosque !
- Bom-Mirar !

Um trino… um trinado… um tropel de trovoada…
e a tropa e os tropeiros trotando na estrada:

- Valo!
- Êh Andorinha !
- Ê Ventania !
- Ê...

"Meu Alazão é mesmo bom sem conta !
Quando ele aponta tudo tem temor…
A vorta é esta: nada me comove !
Trem, outomove, seja lá que for…"

"Por isso mesmo o sabiá zangou-se !

Arripiou-se foi cumer melão…
Na bananeira ela fazia: piu !
Todo mundo viu, não é mentira não…"
- Bom dia, meu branco !
- Deus guarde suasenhoria, Capitão !
......................................................................
Dos engenhos de minha terra
Só os nomes fazem sonhar:

- Esperança !
- Estrela d'Alva !
- Flôr do Bosque !
- Bom-Mirar !
********************************************

Trem de Alagôas

O sino bate,
o condutor apita o apito,
Solta o trem de ferro um grito,
põe-se logo a caminhar…

- Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Mergulham mocambos,
nos mangues molhados,
moleques, mulatos,
vêm vê-lo passar.

Adeus !
- Adeus !

Mangueiras, coqueiros,
cajueiros em flor,
cajueiros com frutos
já bons de chupar...

- Adeus morena do cabelo cacheado !
Mangabas maduras,
mamões amarelos,
mamões amarelos,
que amostram molengos
as mamas macias
pra a gente mamar

- Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Na boca da mata
ha furnas incríveis
que em coisas terríveis
nos fazem pensar:

- Ali dorme o Pai-da-Mata
- Ali é a casa das caiporas

- Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Meu Deus ! Já deixamos
a praia tão longe…
No entanto avistamos
bem perto outro mar...

Danou-se ! Se move,
se arqueia, faz onda...
Que nada ! É um partido
já bom de cortar...

- Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Cana caiana,
cana rôxa,
cana fita,
cada qual a mais bonita,
todas boas de chupar...

- Adeus morena do cabelo cacheado !

- Ali dorme o Pai-da-Matta !
- Ali é a casa das caiporas

- Vou danado pra Catende,
vou danado pra Catende
vou danado pra Catende
com vontade de chegar...

Fonte:
Fundação Joaquim Nabuco. http://www.fundaj.gov.br/

Poesias Soltas ao Vento IV

Dudu Gemmal (Reflexões)
Dudu Gemmal (Suspiro)
Nadir A D'Onofrio (Deusa Mãe)
Vinicius de Moraes (Ausência)
Vinicius de Moraes (Música das almas)
Vinicius de Moraes (Poema nº três em busca da essência)
Hilda Hilst (Cantares de Perda e Predileção)
Hilda Hilst (Cantares do Sem Nome e de Partidas)
***************************

Dudu Gemmal (Reflexões)

... E então já se vai mais um dia perdido
A noite se torce
Até se tornar do avesso
Até contrair-se ao extremo
Até retornar ao começo

E, então, lá se vai; mais um dia usado
Bateu o último segundo
Caiu-se a última gota
Esgota-se o tônus (a meta está morta)
Assim como o faz a paciência do mundo

Se então, onde estará o amanhã?
Se só à tarde me bate a aurora
Se o cão negro me late o agora
Se estico a coleira com poesia vã

Se, então, por latidos me devo acordar
Farei dos ouvidos um lar
Farei do amanhã o presente
E cada último segundo... farei deste o sempre.

------------//------------

Dudu Gemmal (Suspiro)
A voz de alento refere-se
Ao forte tormento que fere
A minha consciência partida

A voz de alento transfere-se
Ao sopro do vento e esvai-se
No eterno seguir dos segundos

A voz de alento suspira
Em meu ouvido atento e transpira
O poro que a escuta e secreta
A gota secreta que escorre e refresca
A conclusão que elucida
------------//------------
Nadir A D'Onofrio (Deusa Mãe)
Na fé inabalável do sertanejo
Aprendizado de paciência
Tempo de esperar
Deixar o sol calcinar a terra.

Na roda do tempo
Esperar o momento propício
Nuvens carregadas e trovão
Chuva solta pelo chão...

Ora torrencial
Formando aluvião
Outrora calma e serena
Infiltrando leve nesse torrão.

O sertanejo exulta
Nas mãos calejadas
Leva a riqueza
Hora do plantio...
Esperança do porvir...

Semblante sofrido, mas esperançoso!
Nos lábios sorriso esboçado
Os pés nos sulcos da terra
Cobrem o pequeno embrião...

À Deusa Mãe
Receptiva fecundada
Só resta aguardar seu tempo...
Completar o ciclo da colheita.

Ao sertanejo...
A certeza do fervor a oração
Pedir a São José...que chova no seu dia...
Cumprindo assim a profecia
De uma boa plantação...

------------//------------

Vinicius de Moraes (Ausência)
Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

------------//------------

Vinicius de Moraes (Música das almas)"Le mal est dans le monde comme un esclave qui fait monter l’eau."
Claudel

Na manhã infinita as nuvens surgiram como a Ioucura numa alma
E o vento como o instinto desceu os braços das árvores que estrangularam a terra...
Depois veio a claridade, o grande céu, a paz dos campos...
Mas nos caminhos todos choravam com os rostos levados para o alto
Porque a vida tinha misteriosamente passado na tormenta.

------------//------------

Vinicius de Moraes (Poema nº três em busca da essência)
Do amor como do fruto. (Sonhos dolorosos das ermas madrugadas acordando…)
Nas savanas a visão dos cactos parados à sombra dos escravos – as negras mãos no ventre luminoso das jazidas
Do amor como do fruto. (A alma dos sons nos algodoais das velhas lendas…)
Êxtases da terra às manadas de búfalos passando – ecos vertiginosos das quebradas azuis
O Mighty Lord!
Os rios, os pinheiros e a luz no olhar dos cães – as raposas brancas no olhar dos caçadores
Lobos uivando, Yukon! Yukon! Yukon! (Casebres nascendo das montanhas paralisadas…)
Do amor como da serenidade. Saudade dos vulcões nas lavas de neve descendo os abismos
Cantos frios de pássaros desconhecidos. (Arco-íris como pórticos de eternidade…)
Do amor como da serenidade nas planícies infinitas o espírito das asas no vento.
O Lord of Peace!

Do amor como da morte. (Ilhas de gelo ao sabor das correntes…)
Ursas surgindo da aurora boreal como almas gigantescas do grande-silêncio-branco
Do amor como da morte. (Gotas de sangue sobre a neve…)
A vida das focas continuamente se arrastando para o não-sei-onde
– Cadáveres eternos de heróis longínquos
O Lord of Death!
------------//------------
Hilda Hilst (Cantares de Perda e Predileção)
Eu amo Aquele que caminha
Antes do meu passo
É Deus e resiste.
Eu amo a minha morada
A Terra triste.
É sofrida e finita
E sobrevive.
Eu amo o Homem-luz
Que há em mim.
É poeira e paixão
E acredita.
Amo-te, meu ódio-amor
Animal-Vida.
És caça e perseguidor
E recriaste a Poesia
Na minha Casa.
(XXIII)
* * *
Vida da minha alma:
Um dia nossas sombras
Serão lagos, águas
Beirando antiqüíssimos telhados.
De argila e luz
Fosforescentes, magos,
Um tempo no depois
Seremos um só corpo adolescente.
Eu estarei em ti
Transfixiada. Em mim
Teu corpo. Duas almas
Nômades, perenes
Texturadas de mútua sedução.

------------//------------
Hilda Hilst (Cantares do Sem Nome e de Partidas)
Que este amor não me cegue nem me siga.
E de mim mesma nunca se aperceba.
Que me exclua do estar sendo perseguida
E do tormento
De só por ele me saber estar sendo.
Que o olhar não se perca nas tulipas
Pois formas tão perfeitas de beleza
Vêm do fulgor das trevas.
E o meu Senhor habita o rutilante escuro
De um suposto de heras em alto muro.
Que este amor só me faça descontente
E farta de fadigas. E de fragilidades tantas
Eu me faça pequena. E diminuta e tenra
Como só soem ser aranhas e formigas.
Que este amor só me veja de partida.
===============
Fontes:
-
http://abcdaliteratura.blogspot.com/
- MORAES, Vinicius de. Anologia Poética. Rio de Janeiro: Editora A Noite, 1935
- HILST, Hilda. Cantares de Perda e Predileção. São Paulo: Massao Ohno & M. Lydia Pires e Albuquerque Editores, 1983.
- HILST, Hilda. Cantares do Sem Nome e de Partidas. São Paulo: Massao Ohno, 1995

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Concurso Centenário de José Barrros Vasconcellos (Porto Alegre-RS)

Âmbito nacional - Tema João de Barro

Vencedores:

Construtor de propriedade,
João- de- Barro, arquiteto,
Sem cursar a faculdade,
Cria e monta o seu projeto.
Nei Garcez (Curitiba - PR)
------------------------------------------
João de barro, um engenheiro,
Que jamais leu apostila.
Seu ninho é quase um mosteiro,
- poema feito de argila-
Francisco Neves Macedo (Gramoré - Natal)
-------------------------------------------
O João- de -Barro é um exemplo,
Pode não saber gorjear,
Com tão pouco faz um templo,
Ao erguer seu próprio lar
Cláudio de Cápua (Santos - SP)
--------------------------------------------
João de Barro, o construtor,
Usa a terra com nobreza,
O que faz, faz por amor
Não agride a natureza.
José Guarany Rodrigues (São Paulo - SP)
--------------------------------------------
Na casa do joão-de-barro
não tem tevê nem mobília;
não tem quadros, não tem jarro...
tem, no entanto, uma família!
Antônio Augusto de Assis (Maringá - PR)
--------------------------------------------
Menções Honrosas:

João -de- Barro nos ensina
Com seu talento exemplar,
Que com barro e palha fina
Pode se fazer um lar.
Miguel Russowsky (Joaçaba - SC)
-----------------------------------------
Na mansão, quanto egoísta
Vive distante da paz,
Que o João- de-Barro conquista
Na casa humilde que faz...
Regina Célia de Andrade (Magé - RJ)
--------------------------------------------
Deus, que ao homem fez de barro
E ainda o intenta amoldar,
Lembra e inspira o João- de -Barro,
Que transforma barro em lar...
Josafá Sobreira da Silva (Rio de Janeiro -RJ)
--------------------------------------------
Que saudade matadeira,
Das coisas que aqui não há,
João de Barro na paineira,
No terreiro um sabiá.
Campos Sales (São Paulo - SP)
----------------------------------------
João -de -Barro, o arquiteto,
Aos homens dá belo exemplo:
Com amor, constrói seu teto,
Mais que um lar... será seu templo!
Alba Helena Corrêa (Niterói - RJ)
----------------------------------------------

Menções Especiais:

João -de -Barro, em verdade,
Envolto em desilusão,
Emparedei a saudade
No ninho do coração!
Antônio Juraci Siqueira (Belém - Pará)
--------------------------------------------------
Tu voltas arrependido
E eu, mesmo só, quase morta,
Qual João de Barro traído,
Para ti ... fechei a porta!...
Marina Bruna (São Paulo - SP)
-----------------------------------------
De longe, eu posso escutar
Esse grito de louvor...
João de Barro o teu cantar
Leva mensagens de amor!...
Rodolpho Abbud (Nova Friburgo - RJ)
--------------------------------------------
João-de-Barro - desolado -
Maldiz o fogo daninho,
Ao ver, no tronco queimado,
Os escombros do seu ninho!!!
Maria Madalena Ferreira (Magé - RJ)
----------------------------------------------------------
João de Barro, esse seu canto,
Eu sei, é saudade dela!
Faça outro ninho no canto
Aqui da minha janela...
Almira Guaracy Rebelo (Belo Horizonte - MG)

Fonte:
Colaboração de Antonio Augusto de Assis (Maringá - PR)

Marcelino Freire (1967), por ele mesmo

Eu nasci no ano de 1967 em uma cidade chamada Sertânia, alto sertão de Pernambuco. Vivo em São Paulo, vindo do Recife, desde 1991. Escrevi, entre outros, "Angu de Sangue" (Contos, 2000), "eraOdito" (Aforismos, 1998 - 2002) e "BaléRalé" (Contos, 2003), todos publicados pela Ateliê Editorial, São Paulo.

Sou também editor, tendo idealizado e lançado, em 2002, a "Coleção 5 Minutinhos" (eraOdito editOra), com livros inéditos, distribuídos gratuitamente, de nomes como Moacyr Scliar, Glauco Mattoso, Valêncio Xavier e Manoel de Barros.

Em 2003, lancei a segunda versão da Coleção, desta vez destinada às crianças e reunindo autores como Luis Fernando Verissimo, Ignácio de Loyola Brandão, Haroldo de Campos e Tatiana Belinky.

Sou um dos editores da revista de prosa "PS:SP", lançada, em número único, no ano de 2003.

Participei das antologias "Geração 90 - Manuscritos de Computador" (2001) e "Os Transgressores" (2003), organizadas por Nelson de Oliveira para a Boitempo Editorial e que reúnem "Os melhores contistas brasileiros surgidos na última década do século XX".

Participei também de algumas importantes antologias no Brasil e no Exterior, como a "Ficções Fraternas" (editora Record, 2003), a "Dentro de um Livro" (Casa da Palavra, 2005) e a "Putas", lançada em Portugal (Quasi Edições, 2002).

Alguns de meus contos foram adaptados com sucesso para teatro no Recife, São Paulo e Rio de Janeiro, e interpretados, em especiais na TV, por atores como Beatriz Segall e Walmor Chagas. Alguns, idem, foram publicados em revistas e jornais no México, França, Estados Unidos e Itália.

Em 2004, idealizei e organizei a antologia "Os Cem Menores Contos Brasileiros do Século" (Ateliê Editorial e eraOdito editOra), reunindo 100 autores, como Dalton Trevisan, Millôr Fernandes, Marçal Aquino, Raimundo Carrero, João Gilberto Noll, em microcontos inéditos de até 50 letras. Ainda em 2004, idealizei e organizei para a editora paulistana Alaúde a "Série Paralelepípedos", em que autores de cada uma das 27 capitais brasileiras apresentam, para o público infantil e adolescente, a cidade em que nasceram ou onde vivem.

Representei o Brasil no III Encontro de Novos Narradores da América Latina e da Espanha, realizado no final de 2003 em Bogotá, Colômbia. Também em 2005 participei da Feira Internacional do Livro, acontecida no Paraguai. Fui um dos destaques da Jornada Literária de Passo Fundo, RS, edição de 2003. E um dos escritores convidados para a segunda edição da Festa Literária Internacional de Paraty, a FLIP, que aconteceu em julho de 2004, sendo apontado, pela imprensa em geral, como uma das "revelações" da Festa.

Em julho de 2005, lancei o "Contos Negreiros", meu primeiro livro pela editora Record. Escrevi o meu primeiro romance, intitulado "Gonza-H", publicado pela editora Record. E também organizo, ao lado do escritor Santiago Nazarian, a antologia de contos gays, em dois volumes, intitulada "Contos para Ler Fora do Armário". Preparo, ainda, o lançamento do programa literário de TV, o "SÁideira", idealizado por mim, com apresentação do escritor e jornalista Xico Sá e realização da Tereré Cinema.

Fonte:
http://www.foresti.locaweb.com.br/03_eraOdito/marcelino.html
Foto: J. R. Duran

Lançamento do Livro Rasif, de Marcelino Freire


A Editora Record e o b_arco convidam para o lançamento do livro de contos Rasif: mar que arrebenta, de Marcelino Freire, gravuras de Manu Maltez, com abertura da exposição "Anjos e Urubus".
Lançamento em São Paulo
Dia 14 de agosto, quinta-feira, a partir das 19 horas, no Centro Cultural b_arco. Rua Dr. Virgilio de Carvalho Pinto, 426 (transversal da Rua Artur de Azevedo), Pinheiros - São Paulo.
Lançamento no Recife
Dia 29 de agosto, sexta-feira, a partir das 17 horas, na Livraria Cultura.
Fonte:
Biblioteca Comunitária Prof. Waldir de Souza Lima

Marcelino Freire (Rasif: mar que arrebenta)

“Eu quero que o leitor tenha a sensação de que está com o fim do mundo nas mãos”. Quem expressa esse desejo apocalíptico é o escritor Marcelino Freire, radicado em São Paulo desde os anos 90, mas natural de Sertânia, cidade do Sertão distante 316 Km do Recife. Autor de Angu de Sangue, Navio Negreiro e outros sucessos de crítica e público, ele é uma das atrações principais deste final de semana da 6ª Bienal Internacional do Livro, que desde ontem ocupa diversos espaços do Centro de Convenções.

Rasif transforma em realizade um sonho antigo de Marcelino Freire: o de publicar algo acompanhado por ilustrações. “Eu semprei gostei das coisas que Caribé fazia para os livros de Jorge Amado ou dos desenhos de Santa Rosa para Vidas Secas. Aí conheci o trabalho de Manu Maltez no Degrau, um bar da Vila Madalena. Esse cara, além de músico, é um ilustrador portentoso!”. O novo livro traz figuras de urubus, corujas, ossos e outros elementos.
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Para Iemanjá
Oferenda não é essa perna de sofá. Essa marca de pneu. Esse óleo, esse breu. Peixes entulhados, assassinados. Minha Rainha.

Não são oferenda essas latas e caixas. Esses restos de navio. Baleias encalhadas. Pingüins tupiniquins, mortos e afins. Minha Rainha.

Não fui eu quem lançou ao mar essas garrafas de Coca. Essas flores de bosta. Não mijei na tua praia. Juro que não fui eu. Minha Rainha.

Oferenda não são os crioulos da Guiné. Os negros de Cuba. Na luta, cruzando a nado. Caçados e fisgados. Náufragos. Minha Rainha.

Não são para o teu altar essas lanchas e iates. Esses transatlânticos. Submarinos de guerra. Ilhas de Ozônio. Minha Rainha.

Oferenda não é essa maré de merda. Esse tempo doente. Deriva e degelo. Neste dia dois de fevereiro. Peço perdão. Minha Rainha.
Se a minha esperança é um grão de sal. Espuma de sabão. Nenhuma terra à vista. Neste oceano de medo. Nada. Minha Rainha.
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Se em Contos negreiros, o escritor Marcelino Freire questionava a noção de igualdade racial no Brasil (a cordialidade como produto de uma síntese feliz e festiva entre índios, negros e brancos estrangeiros), Rasif, mar que arrebenta, sua nova antologia de contos, busca outros territórios. O título rascante do livro carece de alguma explicação.

Recife vem do árabe, Rasif: terreno de lajes, estrada composta de rochedos. Já Pernambuco, origina-se no tupi-guarani, paranã-puca: “onde o mar se arrebenta”. Deste violento embate entre pedra e mar, emerge Rasif, mar que arrebenta.

Dezessete contos, ou melhor, “cirandas, cirandinhas” (assim o autor as nomeou no índice) compõem Rasif, um desnorteio de ritmos bem traduzido na linguagem lírica e ríspida, dura e sutil, bela e grotesca, deste autor que embaralha ainda mais os limites da narração. Cada palavra é ponderada, valendo sílaba a sílaba, aspirando a poemas. Pensemos, por isso, a pertinência da denominação “ciranda” para os contos. Na origem do termo está sarand, palavra hispano-árabe que em sua evolução rumo à forma portuguesa conheceu as formas zaranda e çaranda. Para um livro que mira o oriente, mas que tem Recife, Pernambuco como ponto de partida para pensar o mundo, ciranda aponta para um volteio de temas, escolha, união, dança e embate. Isto porque “ciranda” dá nome a uma peneira grossa, mas também define o canto e a dança de roda adulta ou infantil (e lembremos a profusão de crianças que abarca esta obra).

O livro vai além dos limites de Recife e Pernambuco, já que as fronteiras dos contos se distendem para novos territórios. Partindo da etimologia de Recife, surgem contos que tematizam conflitos e põem em pauta uma Arábia sem mistificação, sem orientalismo. Aqui e lá vivem amores, desejos, estilhaços, guerras, explosões. As Arábias são mais um motivo para olhar o mundo que se vê invadido, que se sente deslocado num mundo cada vez mais vertiginoso. Os árabes invadem Rasif até mesmo na dedicatória (“para Asfora, Benuthe, Hatoum, Nassar, Nazarian, Salomão e Snege”), mas alarga-se em contos como “O meu homem-bomba”, “We speak English”, e está implícita no desejo assassino de menino de “Maracabul”, cujo sonho maior é possuir uma arma. Os estilhaços ferozes e infelizes da violência e da guerra estão também em “Amor cristão” e “Da paz”.

Do mesmo modo que o árabe, a “língua indígena” vai dar no intérprete que traduz, no conto “Tupi-guarani”, as reivindicações dos índios que, furiosos, invadem o teatro Amazonas. As palavras ameríndias guiam o autor, com sua sonoridade, e vão dar numa proliferação de toponímia, nomes de bichos, lugares, costumes e sons, num livro entranhado em contos que dialogam e distendem-se como no conto que abre o livro, “Para Iemanjá”. Nele, o mar (e as águas) é leitmotiv de Rasif e além de ser um canto de louvação à orixá-senhora das águas, denuncia a dessacralização da natureza, o desrespeito e a ação assassina do homem. O lirismo de “Para Iemanjá” é dos mais imensos: “Oferenda não é essa perna de sofá. Essa marca de pneu. Esse óleo. Esse breu. Peixes entulhados. Assassinados. Minha Rainha (...) Não são para o teu altar essas lanchas e iates. Esses transatlânticos. Submarinos de guerra. Ilhas de Ozônio. Minha Rainha. /Oferenda não é essa maré de merda. Esse tempo doente. Deriva e degelo” (...) (p.21).

Muitos reconhecerão no livro a dicção coloquial e urbana dos narradores; o tema da violência; a obsessão pelo solilóquio repleto de ambigüidades. Trata-se de uma linguagem que busca aproximar-se da letra de canção; canção que, na modernidade, vai se irmanar ao sample e ao canto-desafio do rap: “O medo, aqui, não é brinquedo, pode crer. / Pá-pá-pá. / Gostoso roubar e sumir pelos buracos do barraco. Pelo rio e pela lama. Gritar um assalto, um assalto, um assalto. Cercado de PM por todos os lados. Ilhado na Ilha do Maruim. Na boca do guaiamum. /Papai Noel vai entender o meu pedido. Quero um revólver comprido, de cano longo. /Socorro! /Socorro!” (“Maracabul”, p.41).

Marcelino Freire trabalha com uma frase quebrada, que em estilhaços se faz quase versejada, já que se encontra posta no martelo do cordel, sincopada na récita do repente: “Saudades da bernúncia. Saudades da zabumba. Do Zé do Vale e Zé Pereira. Do Zé Limeira. Saudades do violão e da viola. Saudades da graviola. Pitanga, umbu. Cajá, maracujá. /Saudades da Lia. Da lua de Itamaracá. Saudades do Cariri, Sertão do Pajeú. (...)” (“O futuro que me espera”, p. 122).

Em Rasif estão presentes as personagens que se constroem ao narrarem-se. São travestis, pedófilos, miseráveis indignados, assassinos militantes, gays passionais, pais indignados, crianças cruéis, todos unidos (ao lado de outros) para novos cantares. Afasta-se do clichê, da pobreza sofrida e explorada, seus personagens não revidam o que enfrentam, revelam suas carências, são impiedosos e cínicos. Marcelino Freire os constrói por meio da ironia (figura central em sua “poética” do desmascaro), por isso podem ser lidos de formas distintas.

Para traduzir estas personagens, o autor faz uso das “falas-drama” que mimetizam tanto o universo interior quanto o exterior pelo “modo” que elas (aparentemente) diriam-se, conquistado o direito à voz. São “personalidades” que se convertem em trama ao executar o enredo de si mesmas. “Enredar-se”, neste sentido, adquire também o significado de “logro”. Não bastasse isto, o autor – cuja literatura se constrói à revelia do bom gosto e do politicamente correto - elege personagens marginais, seres de exceção, figuras cujo olhar viciado (da sociedade contemporânea) as converteu em “tipos”, “estereótipos”. Marcelino Freire assume o risco de traduzi-las de uma perspectiva interna, modus operandi experimentado (não sem algum constrangimento) por escritores de peso como Graciliano Ramos. A adesão de Marcelino Freire é, contudo, desapaixonada, oposta à perspectiva empática efetuada por João Guimarães Rosa. Adotando a ironia, a contradição, o paradoxo, ele desestabiliza as certezas, inserem singularidade para destroçar a visão pré-concebida. Estigmatizadas pela ordem social, suas personagens humanizam-se pela complexidade de sua paisagem interior. Sua estratégia é o foco narrativo em primeira pessoa, diálogos mais próximos de solilóquios, de monólogos interiores que se alteram para um fluxo de consciência no qual sobressai, pelo não-dito, “personalidades” que ao se contradizerem, revelam-se.

O que poderia resultar numa estratégia narrativa de curto alcance, pelo risco de esgotar-se pela repetição (neste sentido, “Maracabul” é dentre todas a mais fraca, pelo curto alcance da configuração psicológica de menino; o mesmo podendo se dizer do discurso de “We speak English”, reduzido à sátira estilisticamente bem construída), resulta, por vezes, em excelentes contos. “I-no-cen-te”, talvez a narrativa mais arriscada do livro, é exemplo da força desta técnica. Sua trama constrói-se sub-repticiamente, por meio de um depoimento no qual o não-dito configura o crime, um discurso que pretensamente busca a conversão do réu em vítima. “I-no-cen-te”, em sua ambígua, irônica, e amoral tecitura, busca a afirmação e comprovação da inocência do criminoso diante da perversidade de sua vítima: “Aí o povo vai comentar: que é coisa pura. Uma nudez de candura. A maldade está no meu olhar. Eu é que não enxergo. Vejo além. Vejo desonesto. Vejo o que não está. Tenho um coração feio, que não se contém. Algo em mim precisa se exorcizar. Miolo mole, que não bate bem” (p.89).

Rasif possui um tom mais melancólico e satírico do que as obras anteriores; em parte, por trazer personagens ainda mais isolados, desconfortáveis no lugar onde estão. Trata, igualmente, da perda de um olhar ingênuo sobre o mundo, e de falas soltas, incompreendidas, uma algaravia não-comunicativa. O melhor exemplo é “Chá”, sátira corrosiva que põe à roda da mesa, os imortais da academia de Letras cada vez mais surdos e senis. Entre xícaras de chá e torradinhas, eles discutem o destino da cadeira recentemente vaga de um “imortal” gagá: “(...) Deu derrame. A bolacha. Passa. Ficou caduquinho. Tira a roupa. O quê? Não estou ouvindo. Dizem que fica nuzinho. Nu? Nuzinho. Hum, hum. Deve ficar uma graça. Nuzinho. Só tem osso. De quê? Camomila. Hã? Não ouço. Ca-mo-mi-la. Obrigado. É a vida. (...)” (p. 81).

Mesmo abrindo-se ao humor e ao nonsense, Marcelino Freire não arrefece em explicitar, com a ferocidade denunciadora das obras precedentes, que vivemos num mundo mal, atolado em injustiças das mais diversas esferas. Rasif é tudo isso, mas é também um livro de amor, um amor particularíssimo, selvagem, como explicitado no conto-vinheta “Amor cristão”: “Amor é a mordida de um cachorro pitbull que levou a coxa da Laurinha e a bochecha do Felipe. Amor que não larga. Na raça. Amor que pesa uma tonelada. Amor que deixa. Como todo grande amor. A sua marca. (...)” (p. 77).

O nonsense em Rasif comparece em contos como “Junior”, que traz um bebê que surpreende fascinado o pai com um travesti na cozinha de casa; em “Meu último natal”, apresenta-se apenas no insólito desfecho da narrativa sobre um menino, cujo propósito feroz é assassinar e roubar o Papai Noel. Este nonsense pode chegar a extremos de melancolia, como no beckettiano “Ponto.com.ponto”, que traz um sujeito num banco de praça, à espera (cega e interminável) de um possível amor agendado pela internet. As frases curtas, picotadas (ponto a ponto), procuram traduzir ao leitor esperança, impotência e crescente frustração do protagonista: “(...) O meu peito ziguezagueia. Cada passo da cidade de São Paulo. Sinto. Ela não vem. Depois de tanto tempo. Um, dois, três. Marcamos o encontro. Dentro da tarde, neste terceiro banco. A gente vai ser feliz. Depois de tanto tempo, meu amor. No computador. Marcamos. Este encontro real. (...)” (p. 116).

Marcelino Freire esmera-se em tornar mais complexos os enredos de alguns contos de Rasif. “Os atores”, trama que mistura melodrama, suspense e tragédia, ilustra o tema da representação. No conto, um velho ator encena um crime passional. Protagonizando a peça ao lado de seu jovem amante, ele decide substituir a pistola falsa por outra verdadeira, tudo para que o rapaz, o mate diante da platéia. A narrativa inicia com a descrição da cena clímax da peça, seguindo em marcações, rubricas, pontuando intenções: “A última cena é assim: ele tira o revólver da gaveta, dispara à queima-roupa. E eu caio. Como um rei cairia. Ou a Petra. Ou a Phedra. Depois, Leocádio sopra um monólogo sem fim. E chora e ri. As cortinas fecham o espetáculo. E voltamos abraçados para os aplausos” (p. 67).

Amalgamando lirismo e crueza (a exemplo do trecho anterior), Marcelino Freire dá vazão em Rasif a um estranho saudosismo da ingenuidade perdida, da infância, de uma natureza não-corrompida, de uma modernidade sem a vertigem do consumo. É o que se lê no diálogo indignado do motorista de “Sinal fechado”: “- A Guerra na Arábia Saudita, na Conchinchina, sei lá. A culpa é do carro. Do combustível. Do petróleo. Do gás. Da gasolina. (...) - Da guerra. Sim, da guerra. Da carnificina. Por que é que eles brigam, meu caro? Por causa do carro. Entendeu? A roda nos fodeu. Antes a gente vivesse no tempo do jumento. Até o jumento virou moto. Não viu? Um dia saiu na televisão” (p. 109).

Em Rasif estão ainda presentes as zonas de conflitos dos afetos, os campos minados dos desejos; mas há, pela primeira vez nos enredos, finais felizes, saídas para o amor como se os personagens já pudessem aspirar a um futuro possível, menos torpe. É o caso de “Roupa suja”, em que uma empregada de lavanderia narra a uma amiga suas idas e vindas num terreiro feitas para conquistar o cliente executivo pelo qual se apaixonou. Num tom entre o obsceno e humorístico, a narrativa excede em referências ao universo do trabalho da narradora: “(...) Cheiroso, nem olhou para o meu alvoroço. Nem sequer um pensamento. Leve. Ele, dentro de uma bolha. Eu, tão rastejante. Nada, a partir daquela manhã, foi a mesma coisa. (...) Amor, Maria, amor./Sabe o que é isso?/Fragrância de flor. (...)” (p.57).

Apaixonado pela sonoridade das palavras, o autor joga com som e sentido para enredar significados e efeitos novos na expressão. Isto faz com que por vezes, a trama seja o próprio discurso, tornando ainda mais difícil a classificação “contos” para textos como “Para Iemanjá”, “We speak English”, “Amor cristão” e “O futuro que me espera”. Estes funcionariam, à maneira de um álbum musical, como vinhetas para introdução de novos temas, outros andamentos. Isto por que Marcelino Freire deixa circular (cirandar) com rigor, elementos que unificam tematicamente Rasif e fazem ressoar um conto no outro: “Mamãe, este ano eu fui um bom menino, mas ano que vem eu quero ficar rico. Ter um carro-forte, um carro do ano. /Juro que não estou brincando”. (“Maracabul”, p. 43), “Aí o Leco resolveu matar o Papai Noel. De verdade. Dar uma pedrada na cabeça dele assim que ele chegasse. Não pela chaminé, que não havia. Pela janela do barraco.(...)” (“Meu último Natal”, p. 45).

Contraditoriamente, faz uso do “lugar-comum”, de personagens estigmatizados, marginais que põe em primeiro plano e que, ao se expressarem, singularizam-se, ganhando em complexidade psicológica. Humaniza-os, assim, sem escamotear suas falhas de caráter, seus desvios morais, suas obsessões sexuais. Sua perspectiva é interna (daí o uso freqüente da primeira-pessoa), não-distanciada. Não se trata, porém, de uma adesão amorosa (à maneira de um Guimarães Rosa), tampouco amoral (sem julgamento explícito, como num Rubem Fonseca). Eles expressam e em seu próprio discurso explicitam ambiguamente suas contradições.

Como o desfecho em que paisagens, nomes, paladares (termos predominantemente indígenas) fecham o livro com uma declaração de amor a Pernambuco, ao sertão, ao Brasil sem dor. Neste desfecho, há ecos de poemas do poeta Manuel Bandeira (cujos versos fecham o livro), textualmente citado no conto “Amigo do rei”, narrativa de um garoto cuja amor pela poesia faz aflorar o horror homofóbico do pai: “(...)Um pesadelo! Eu mato esse menino. Ah! Se mato. Que desgraça! Ele e esse tal de Manuel Bandeira. Suados e abraçados, em campo. (...)”(p. 98)

Rasif retoma o tom poético em seu desfecho com “O futuro que me espera”, aspiração que soçobra os desencantos com a cidade grande, dissolve angústias, acena para uma felicidade futura resgatada do passado (interiorano?) quando a paz não se fazia reles discurso: “Saudades de tantas coisas. Que eu costurei a mala, levantei as paredes da caixa. Disse olhando os prédios de São Paulo. E a fumaça. Vou-me embora agora mesmo, de hoje não passa. Aqui nunca foi a minha terra”. (p. 123)

Completando este salto, estão as ilustrações de Manu Maltez, gravuras em água forte que não ilustram os contos, mas que traduzem a fluidez do traçado desconcertante do artista, com figuras que oscilam num premente movimento, alterando-se de figuras humanas clássicas a animais e formas grotescas: impuros seres convertidos em mãos, feras míticas, aves que se convertem em onda, como a que ilustra a capa. Fortes águas, vozes de arrebentação. Rasif traz narrativas e formas que não se contém quietas, que precisam saltar, ganhar espaço no mundo.

Rudes e acérrimos, subversivos, bailarinos, radicalmente negros (na contra-corrente da literatura noir), os contos de Marcelino Freire em Rasif, mar que arrebenta não se prestam ao limite do papel. Assentam mal, parecem não pertencer à classe da literatura que se imprime impunemente em nossos dias. Inquietantes, vertem sangue, dançam, batucam, aspiram o trânsito, o salto para fora do objeto-livro que os contêm. Por isso mesmo, faz-se válida a afirmação do autor de que seus contos são para serem lidos em voz alta.

Acatemos essa voz, cantemos e cirandemos, sem pudor, nas águas fortes de Rasif.
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Amor cristão

Amor é a mordida de um cachorro pitbull que levou a coxa da Laurinha e a bochecha do Felipe. Amor que não larga. Na raça. Amor que pesa uma tonelada. Amor que deixa. Como todo grande amor. A sua marca.

Amor é o tiro que deram no peito do filho da dona Madalena. E o peito do menino ficou parecendo uma flor. Até a polícia chegar e levar tudo embora. Demorou. Amor que mata. Amor que não tem pena.

Amor é você esconder a arma em um buquê de rosas. E oferecer ao primeiro que aparecer. De carro importado. De vidro fumê. Nada de beijo. Amor é dar um tiro no ente querido se ele tentar correr.

Amor é o bife acebolado que a minha mulher fez para aquele pentelho comer. Filhinho de papai. Lá no cativeiro. Por mim ele morria seco. Mas sabe como é. Coração de mãe não gosta de ver ninguém sofrer.

Amor é o que passa na televisão. Bomba no Iraque. Discussão de reconstrução. Pois é. Só o amor constrói. Edifícios. Condomínios fechados. E bancos. O amor invade. O amor é também o nosso plano de ocupação.

Amor que liberta. Meu irmão. Amor que sobe. Desce o morro. Amor que toma a praça. Amor que de repente nos assalta. Sem explicação. Amor salvador. Cristo mesmo quem nos ensinou. Se não houver sangue. Meu filho. Não é amor.

(Extraído do livro “RASIF – Mar que Arrebenta”, de MARCELINO FREIRE, Editora Record, 2008)

Fontes:
http://www.bienalpernambuco.com/
http://www.cronopios.com.br/

O Escritor em Xeque (Entrevista com Marcelino Freire)

Marcelino Freire nasceu em 20 de março de 1967 na cidade de Sertânia, Sertão de Pernambuco. Vive em São Paulo desde 1991. É autor de EraOdito (Aforismos, 2ª edição, 2002), Angu de Sangue (Contos, 2000), BaléRalé (Contos, 2003) publicados pela Ateliê Editorial, e Contos Negreiros (Contos, 2005) pela Record, livro que venceu o prêmio Jabuti. Em 2002, idealizou e editou a Coleção 5 Minutinhos, inaugurando com ela o selo eraOdito editOra. É um dos editores da PS:SP, revista de prosa lançada em maio de 2003, e um dos contistas em destaque nas antologias Geração 90 (2001) e Os Transgressores (2003), publicadas pela Boitempo.

MARCELINO FREIRE diz que escreve para se vingar. Seu novo petardo, chama-se Rasif: Mar que Arrebenta, quarto livro de contos e o primeiro desde que ganhou o prêmio Jabuti. Nesta entrevista exclusiva para Verbo21, ele fala um pouco de seu passado com a Geração 90, a moda da literatura árabe, guerras, Movimento Armorial, Mangue Beat e outros quiprocós.

Lima Trindade – Você vem publicando contos com certa regularidade. De 2000 para cá, Rasif: Mar que Arrebenta é o seu quarto livro do gênero. Como costuma ser o seu processo de gestação de um novo trabalho? Você planeja tudo, se cobra horários ou trabalha de forma livre?

Marcelino Freire – Livro meu, pode verificar, eu publico de três em três anos. O Contos Negreiros, por exemplo, é de 2005. Entre um livro outro, faço outros projetos, me envolvo em baladas literárias [Freire criou o evento Balada Literária, que reúne todo ano mais de uma centena de escritores nacionais e internacionais pelas ruas do bairro paulistano da Vila Madalena] e antologias. Nesses três anos, escrevo um conto e outro, vou juntando material. Aí vejo o que há de comum neles, que linha os une. Qual temática eu quero provocar, sei lá. Escrevo, inclusive, alguns contos especialmente para o livro que eu imaginar. E, sobre como eu trabalho, é o mais desleixadamente possível. Não tenho horários, não bato ponto para a literatura. Escrevo quando estou com vontade. Fico guardando uma frase no meu juízo por um bom tempo. Aí escrevo a partir daquela frase que fiquei matutando. Uma vez, tentei anotar o que eu ia ouvindo, o que eu ia colhendo pelas ruas. Não deu certo. Eu perdia o caderninho. Senti que eu estava “burocatrizando” o cotidiano. Desisti. Agora deixo a frase ficar perdida na memória. Até eu encontrá-la de novo.

LT – Uma característica marcante dos seus textos, a meu ver, está na escolha em retratar um universo de párias, excluídos e marginalizados, sem, no entanto, reduzir essas personagens à questão da miserabilidade existencial. O que podemos esperar de Rasif? Há uma linha-mestra conduzindo os contos?

MF – Na verdade, não são temas escolhidos por mim. Não sei bem dizer. É a forma de eu enxergar. Esse mundo pobre, doente, em que vivemos, sobrevivemos. É o mundo que temos. E a minha literatura não consegue fugir disto. A minha literatura está afetada por isto. Eu queria muito tratar de outros assuntos. Mas, quando vejo, um personagem vem gritar no meu ouvido. Sangrar à minha porta. Eu costumo dizer que eu escrevo para me vingar. De uma saudade, de um governo, de uma família. Eu preciso exorcizar alguma coisa. Não consigo ser um escritor frígido. Adoraria, um dia, escrever uma história passada no Planeta Vermelho, por exemplo. Na Cochinchina. Aguardemos... No meu novo livro, o Rasif, é a vez das guerras. Particulares e nucleares. Sempre tem alguém fodendo alguém no meu novo livro. Algum conflito sendo travado. Eu quero que o leitor, ao pegar o Rasif, tenha a impressão de estar com o fim do mundo nas mãos. É um livro quente. Fervente. Sem contar, faço questão de ressaltar e louvar, as gravuras presentes no livro. Rapaz, está bem bonita a edição. Por causa, sobretudo, da participação de Manu Maltez [artista paulistano]. Meu livro vem com as gravuras apocalípticas do Manu. Cheias de corujas, anjos nus, asas e urubus. Valerá a pena conferir. Formamos nós dois uma duplinha demoníaca, você vai ver...

LT – O título (belíssimo) é também uma clara homenagem a Recife. De que modo a cidade aparece no livro? Há nele algum traço de evocação memorialística ou você traça outros caminhos?

MF – Sim. Há uma referência recifense. E pernambucana. O nome “Recife” vem de “Arrecife”. Mas ambas palavras vêm do árabe: “Rasif” e “Arrasif”. Gostei quando soube disto. Quem me contou foi a amiga Adrienne Myrtes [também escritora, autora do livro de contos “A Mulher e o Cavalo”]. Porque eu estava falando para ela que o meu próximo livro tinha homem-bomba, tinha Afeganistão, Cabul, Sertânia [a cidade em que Freire nasceu]. Aí ela me contou isto. Eu não sabia. Adorei. Sem contar que eu quero muito ganhar dinheiro com este livro. Os livros árabes não estão vendendo feito quibe? Pois eu tenho a minha Árabia própria e nada mais justo que eu ganhe uns trocados com ela. Eu também quero colocar a minha pipa para voar. Enfim. Eu quero fazer essa provocação. E me animei com estas ligações malucas. Descobri, por exemplo, que “ciranda” é uma palavra árabe. Aí fui lá na música da lenda-viva que é a cantora Lia de Itamaracá: “estava na beira da praia / ouvindo as pancadas das ondas do mar”. Isso. Pancadas, chutes, cuspes para todo lado. Aí lembrei também do Manuel Bandeira, “num torpedo-suicida / darei de bom grado a vida”. É isso aí. Meu livro quer explodir. E tem mais: meu livro tem um subtítulo, Mar que Arrebenta. O nome “Pernambuco” vem do tupi-guarani, que quer dizer “onde o mar arrebenta”. Então vai ser isto: um livro que se lasca, se arrebenta, se lança lá do alto. E acaba sendo também um livro sobre minha terra, de forma truncada. Um livro escrito por alguém que não está mais no seu lugar de origem. Que fala outra língua. Que se sente um estrangeiro, sempre. É um livro também que coloca a questão da língua que falamos. Se entendemos mesmo o que falamos e o que ouvimos, sei lá.

LT – Tenho a impressão que todos os seus contos nasceram para serem lidos em voz alta. Você os concebe com essa intenção?

MF – Eu escrevo em voz alta, sim. Gosto da palavra falada. Como lhe disse, escrevo a partir de uma primeira frase que ouvi por aí. Não tenho história para contar. Tenho um som para rimar. Vou construindo a história a partir de um mote. O que faço é música, costumo dizer. Embolada. E eu comecei a minha trajetória escrevendo para teatro. Gosto muito do teatro. Quando escrevo, imagino sempre um ator em cena. Eu penso muito nisso. Na palavra lançada, dita para ser ouvida. E eu leio e releio muito o que escrevo. Em voz alta, pela casa. Quando algo não está claro, o ouvido denuncia. E aí eu mudo, modifico o parágrafo. Eu adoro ler os meus contos em público. Ah! Nos livros, nunca chamo meus contos de contos. Sempre os chamo de cantos, de improvisos. Agora, no Rasif, eles são cirandas, cirandinhas. É assim que os contos do Rasif soaram para mim. Cirandas à beira do mar. E o mar arrebenta, grita. E o mar está morrendo. Mas, antes de morrer, ele vai matar muita gente. Já está matando, não vê?

LT – Contos Negreiros foi encenado, não? Alcançou êxito? É verdade que Rasif terá uma montagem simultânea ao lançamento do livro?

MF – Rapaz, essa história da encenação do Contos Negreiros começou na FLIP [Festa Literária Internacional de Parati] de 2005. A cantora Fabiana Cozza, minha amiga, estava fazendo um show na cidade. E aí resolvi dar uma canja lendo um dos meus contos. Deu supercerto. Daí, a gente pensou em um espetáculo juntos. E até hoje a gente se apresenta. Sempre que convidam a gente. Já fizemos no Recife, várias vezes em São Paulo. Em Salvador, pelo interior, etc. E o espetáculo ganhou a participação do maravilhoso cantor baiano Aloísio Menezes, que você bem conhece. Lotamos a casa várias vezes aqui em São Paulo. E o Rasif – Mar que Arrebenta ganhou uma peça homônima, sim. Estreia lá no Recife no dia 30 de agosto. É com o mesmo grupo que encenou o Angu de Sangue [livro de contos publicado em 2000]. A montagem do Angu foi muito premiada e elogiada por onde passou. Os atores são muito bons [um deles é a atriz Hermila Guedes, premiada pelo filme “O Céu de Suely”]. Causaram grande impressão no ano passado no Festival de Curitiba. É uma turma da pesada. Estou supercurioso para ver o que eles aprontaram com os meus contos sobre o final dos tempos. Ah! Também tem o ator e dançarinho recifense Kleber Lourenço, que encenou o Contos Negreiros. Brilhante, brilhante. Eu fico feliz pra caralho quando vejo meu trabalho encenado. É uma forma de eu voltar aos palcos. Eu que sempre quis ser ator. Fico, neste caso, menos frustrado...

LT – Quando morou em Recife, chegou a travar conhecimento com o pessoal do Movimento Armorial? Como você avalia a importância dessa expressão artística para a contemporaneidade?

MF – Coincidentemente, na semana passada, a convite de Antonio Nóbrega, eu fui participar da homenagem que fizeram a ele aqui em São Paulo. Fui um dos oradores do evento. O cabra ganhou o título de Cidadão Paulistano, heróica e merecidamente. Nóbrega é a única ligação, indireta, que eu tenho com o Movimento Armorial. Meu primo, Wilson Freire, é parceiro do Nóbrega faz tempo. Também já estive algumas vezes com o Ariano [Suassuna]. Eu gosto mais do Nóbrega e do Ariano onde eles são mais universais. Não importa o som e a palavra que criam. Não gosto muito dessa coisa “radical”, purista, digamos. Acho um saco toda aquela discussão armorial, raízes da terra, coco genuíno, sei lá. Tenho preguiça. Embora ache divertido o discurso do Ariano. Por exemplo, quando ele fala mal do Michael Jackson. Hilário! Mas não acho graça quando, de alguma forma, alguns artistas do Recife são escanteados por lá se pensam, digamos, mais “desarmorial”. Conhece o poeta Jomard Muniz de Brito? Ele está com 70 anos e foi quem conseguiu peitar essa “ditadura armorial” no Recife. Jomard foi quem inventou o Tropicalismo, sabia? Foi conversando com o Jomard que Gilberto Gil teve a idéia tropicalista. Mas enfim. Também acho meio sacal essa coisa do Tropicalismo, Gosto mais das bananas do que da Carmen Miranda. Ah! Mas vamos mudar de assunto...

LT – E o Mangue Beat, você curte? Tem preferência por gêneros musicais? Costuma escrever ouvindo música?

MF – Não consigo escrever ouvindo música. Atrapalha-me qualquer ruído que não seja o da palavra. Eu tenho a concentração problemática. Nunca faço duas coisas ao mesmo tempo. Cagar e ler é o máximo que faço. Sobre o Mangue Beat, adoro, cabra. Festejei a chegada do Chico Science. Lembro quando ele chegou à cena no Recife. Demorou uns dez anos para estourar no Brasil. Aquela vitalidade, aquela lado caranguejo. Tomado emprestado de João Cabral de Melo Neto, de Josué de Castro. Gostava e gosto disto. Uma vez, me chamaram de “Chico Science da Literatura”. Fui ao delírio. Foi o máximo. Fiquei superarrasado com a morte do Chico. Eu teria cruzado com ele, com certeza, aqui em São Paulo. Uma pena! Sou amigo de vários companheiros dele, que continuam compondo, produzindo. E lembra como o lado armorial do Ariano caiu em cima do Chico, à época? É isso o que eu falo: há um patrulhamento que me irrita. Porém, acho que agora isso está mais calmo pelas bandas de lá. O Mangue Beat tratou de calar um pouco esse exagero feito de barro-barroco, sei lá.

LT – Recebeu estímulo artístico na casa da sua infância? Lembra do primeiro livro lido?

MF – O estímulo foi o silêncio. Explico: minha família não ficava enchendo o meu saco, perguntando demais o que eu fazia. Eu me trancava no quarto para ler Manuel Bandeira e eles me deixavam “morrer” por lá. Uma vez ou outra, minha mãe perguntava se eu estava bem, se não estava doente, enfim. Mas era mais preocupação do que censura. E eu tinha facilidade para leitura, para a escritura. Aí eu escrevia as cartas para a família inteira. E era eu quem lia as bulas de remédio. Muito pequeno, com nove anos, resolvi fazer teatro na escola. Minha mãe não sabia bem do que se tratava. Mas deixou. E ela ia ver as peças, toda entusiasmada, toda orgulhosa. Foi no teatro que tomei contato, pela primeira vez, com o texto criativo. E foi lá que conheci a atriz Ilza Cavalcanti, já falecida. Foi ela quem primeiro me deu fôlego. Quem me disse para eu continuar a escrever. Falou que eu tinha futuro, digamos. Não tenho do que reclamar. Eu me enchia de ânimo. E sempre segui à revelia. Nem adiantava a família ser contra, tenho certeza de que continuaria a fazer o que eu queria. Meu primeiro livro lido foi o Estrela da Vida Inteira, do Bandeira. O primeiro livro em prosa foi o romance São Bernardo, de Graciliano Ramos.

LT – E quando pensou seriamente na possibilidade de ser um escritor pela primeira vez? Já morava em São Paulo?

MF – Eu só vim, na verdade, me tocar para isto, seriamente e verdadeiramente, quando conheci, em São Paulo, o crítico literário João Alexandre Barbosa. Foi ele quem me disse que o meu Angu tinha tempero. Conheceu o meu livro, indicou-me para publicação na Ateliê Editorial, assinou o prefácio do Angu de Sangue, publicou este prefácio na revista Cult. Sem contar as conversas demoradas que tínhamos. Ele me chamou a atenção para a feitura de um livro, a organização, o jeito, a força que um livro deve ter, sei lá. Outro que também me alertou foi o poeta mato-grossense Manoel de Barros. Leu uns contos meus, me chamou a um canto da sua casa, em Campo Grande, e falou: “você está fodido. Você é um escritor”. Isso foi sintomático para mim. Vi que a coisa não era brincadeira. Aí comecei a prestar mais atenção. E a me foder de vez.

LT – E seu contato com a Geração 90? Guarda alguma lembrança saudosa desse tempo? Imaginava que fossem chegar aonde chegaram (muitos em grandes editoras, recebendo prêmios, etc.)?

MF – Engraçada esta pergunta. Por causa do adjetivo “saudoso”. Por causa do “chegar aonde chegaram”. Sempre digo que estou construindo ainda um trabalho. E estou muito novo ainda para sentir saudades, digamos, tão grandes. Claro que tenho idéia do caminho que foi trilhado, mas há ainda muita coisa para fazer. Não posso me sentir realizado completamente. Sempre alguém chega e me fala: “você agora é um Jabuti”. Mas eu não posso me sentir um Jabuti. Nunca. Repito: estou ainda trilhando, arregaçando o cabaço. E preciso escrever muito. Escrever, escrever. Vejo alguns poucos companheiros desta “Geração” já falando cheio de boçalidade. Dá-me nos nervos. O que esse cara pensa que é? Em um país como o nosso. O cara acredita que é o dono-da-cocada. Meu Cristo! Não estou aqui querendo posar de humilde. Mas jamais posarei de rei. Argh! O melhor é a cerveja que bebo hoje. Se aprendi a beber cerveja, foi com essa “Geração”. Eu já bebia algumas, mas não o tanto que bebo agora. E olha: foi fundamental o trabalho que fez o Nelson de Oliveira quando organizou as duas antologias da Geração 90. Somos estudados aqui dentro e fora do país. Foi a porta de entrada, sim. Mas essas antologias não fizeram de ninguém escritor. Cada um que continuasse a acreditar. Escrever, escrever. E nunca perder o foco. Comparo a vida literária a futebol americano. É o cara com aquela bola dura na mão, correndo em direção a não-sei-onde. Empurram os ombros dele, dão porradas no seu capacete, mas ele não perde o foco. Agarrado à bola dura. Sigamos, sigamos.

LT – Acredita ser ainda possível hoje o aparecimento de escritores como Dalton Trevisan, distanciados do público e encarando o ofício da escrita como reclusão irrestrita?

MF – Eu não conseguiria. Adoraria ficar trancado em casa, mas sempre batem à nossa porta: via internet, via correios, por telefone. Antes de eu escrever um conto, tenho de checar os e-mails, escrever no blog [www.eraodito.blogspot.com]. Esse isolamento eu não consigo mais. Até porque essa história de autor em redoma me cansa um pouco. Acho o Dalton genial, genial! Já travei uns contatos com ele. Dalton está no tempo dele, fiel ao seu esconderijo. Nesse sentido, estou fodido. Isolo-me, sim, na hora da criação. Mas, na hora de o livro sair, eu quero berrar para o mundo a cria que eu pus na roda, ora. E eu gosto dessa circulação. De ver pessoas, de beber. Se estou em casa, escrevendo um conto, e toca o telefone e é o Joca [Reiners Terron], o Xico Sá me chamando para beber, eu largo o conto e vou beber. Mais importante que escrever é beber. Escritor em redoma, sempre falo, só serve para peidar. Eu é que não vou ficar cheirando sozinho o meu peido. Vou compartilhá-lo com os amigos. Se é para feder, que fedamos todos juntos, pode crer.

LT – Seu olhar nunca esteve reduzido exclusivamente ao eixo Rio-São Paulo, mas, de certa forma, basta ler o seu blog para constatar isso, você parece estar sempre em contato com escritores periféricos dos lugares mais diversos. Como você julga que está o Brasil em termos de produção literária?

MF – Gosto desta movimentação toda. Gosto de fazer parte dela. Sem culpas. Aí dizem que eu devia parar um pouquinho. Parar para morrer? Porra! Gosto deste furação o tempo inteiro. De saber o que anda acontecendo. Gosto de conhecer novos escritores. É claro que, um dia, vou precisar descansar um pouco. A idade não vai deixar meu juízo se movimentar tanto. Enquanto isto, estou aproveitando a putaria que aí está. Acho que sempre foi assim. Mesmo os escritores hoje recolhidos faziam parte de uma agitação medonha. Sem contar a turma que se reunia em torno de Vinicius de Moraes, por exemplo. Todos festeiros. Aí enchem o saco da gente perguntando “mas quem vai ficar dessa turma toda?”. Ora, eu sei que a gente vai ficar, sim, durinho no caixão. Todo mundo. Se querem a posteridade, fiquem com ela. Eu quero é o agora, o já. Por enquanto, está bem divertido. Quando não estiver, pulo fora, sem problemas.

LT – Por último, em que pé ficou a prometida antologia homoerótica Contos para Ler Fora do Armário? Será publicada em dois volumes? Por que uma demora tão grande para o projeto?

MF – O livro será publicado em um volume único. Vai sair só no ano que vem. Eu estou lançando o Rasif no dia 14 de agosto em São Paulo. Santiago Nazarian, que faz a antologia comigo, vai publicar livro novo também neste semestre. Resolvemos, em comum acordo, deixar a antologia gay para o ano que vem, em março. Numa boa. É bom que ela vai sair mais porreta do que estava. Estamos tendo novas idéias. Vai ser uma festa quando sair. Demoramos porque saiu uma antologia antes, lançada pelo Ruffato [Luiz Ruffato]. Aí houve uma polêmica. Mas eu estou cansado agora para comentá-la. O negócio é ir para frente. Sempre para frente. Que atrás não vem ninguém. Só o Chocottone [suposto namorado de Freire], é claro.

Fontes:
http://www.verbo21.com.br/
http://www.cronopios.com.br/

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Sinopse de Obras Literárias III

Corrida pela herança (Sheldon, Sidney)
Este é mais para o público infanto-juvenil. O magnata Samuel Stone gostava mais de sua fortuna do que do seus herdeiros. Quem quiser se apossar das riquezas do falecido terá que desvendar pistas misteriosas e enfrentar perigos inimagináveis, nesta complicada caça ao tesouro. A viúva vaidosa, o sobrinho ganancioso, o advogado interesseiro e o primo bondoso irão se meter nas mais incríveis situações e recorrer à métodos bastante estranhos para se livrar dos adversários.

Os doze mandamentos (Sheldon, Sidney)
Moisés desceu da montanha com suas tábuas de pedra nas quais estavam os dez mandamentos da lei de Deus, conta a história sagrada. Mas o escritor viaja ao passado para revelar um segredo: na verdade seriam doze os mandamentos. E, ao contrário da punição de quem não cumpre essas leis, os personagens recebem grandes recompensas, tornando-se ricos, famosos e felizes.

Os quatrocentos (Sheppard, Stephen)
Inverno 1872. Quatro jovens aventureiros americanos arquitetam e, mais tarde, executam um grande golpe para lesar o Banco da Inglaterra, em milhares de libras. O desenrolar da história leva o leitor de um continente a outro causando muita ansiedade em querer adivinhar o seu final.

Carta a meu juiz (Simenon, Georges)
Por amor, ou antes, por paixão, um médico sai de seu confortável círculo de valores e se envolve com um lado da vida que desconhecia. Fica muito envolvido, a ponto de cometer um crime, como explica e justifica a longa carta a seu juiz.

Os quatro dias de um pobre homem (Simenon, Georges)
A história deste livro mostra dois momentos distintos da vida de seu personagem central. O pobre homem porém, é o mesmo. Não pode e parece não querer fugir ao seu destino. Não pode modificá-lo e tem consciência do que será o fim de sua trajetória. O autor apoia-se nas lembranças e no rumo que tomou a vida de seu personagem e oferece uma análise psicológica das motivações e da fatalidade de um autêntico pobre homem.

O testamento maldito (Simenon, Georges)
A saga da família Donadieu começa com o desaparecimento do armador Oscar Donadieu e após alguns dias, seu corpo é encontrado boiando junto ao cais. Em La Rochelle, a importante e abastada família é tida como referência na cidade e todos observam seguem seus passos. A exumação do cadáver, a surpresa do testamento e as suspeitas sobre a morte do armador são algumas das muitas passagens reservadas por George Simenon para “O testamento maldito”.

O xangô de Baker Street (Soares, Jô)
Sherlock Holmes vem ao Império do Brasil investigar um crime. E, mesmo tendo vindo a negócios, também passeia no país dos papagaios num carnaval interpretado por Sarah Bernhardt.

Álbum de família (Steel, Danielle)
Romance que conta a carreira e a vida particular de uma atriz, desde sua juventude, quando ainda solteira e depois de seu casamento com um playboy milionário. Relata a vida dos seus filhos, suas alegrias e também suas grandes tristezas.

Viajando com Charley (Steinbeck, John)
Aos 60 anos, John Steinbeck partiu à descoberta de sua terra natal. Para esta viagem batizou seu veículo de Rocinante e levou como companheiro seu poodle francês Charley. Partiram de Nova York e percorram cerca de 40 estados americanos. O livro descreve não só essa aventura, mas também a descoberta que de certo modo vive no coração de todos os homens, principalmente dos que não podem mais fazê-la.

As vinhas da ira (Steinbeck, John)
A trajetória da família Joad, de fazendeiros estabelecidos a quase escravos na Califórnia, nos anos da Depressão. Um clássico americano, em que se juntam o social, o econômico e o humano – que se recusa a ceder.

Lendas do deserto (Tahan, Malba)
Trinta e nove histórias com um mundo moral bem definido, que derivam de lendas árabes, hindus e persas trazendo sempre, em cada uma delas, uma lição de vida e fé.

Inocência (Visconde de Taunay)
Romance de amor passado em meados do século XIX, num lugarejo no interior do Brasil. Inocência, já prometida pelo pai a Manecão, tem um romance com Cirino, amor totalmente impossível. Conflito entre o modo de vida rural e o urbano.

A retirada da Laguna (Visconde de Taunay)
Episódio da Guerra do Paraguai. Narrativa da expedição brasileira em operações no sul de Mato Grosso, no recuo efetuado desde Laguna, na fronteira do Paraguai, até o rio Aquiduana, em território brasileiro. “Trinta e nove léguas percorridas em 35 dias de dolorosa recordação”.

Ciranda de pedra (Telles, Lygia Fagundes)
Infância e adolescência de uma jovem que ao descobrir sua verdadeira origem paterna, torna-se uma pessoa problemática. Suas angústias são contadas, assim como seus amores e suas tristezas.

Venha ver o pôr-do-sol e outros contos (Telles, Lygia Fagundes)
Conto que dá título ao livro – Ricardo é um rapaz misterioso, com idéias mórbidas, que leva sua namorada Raquel para ver o pôr-do-sol no cemitério e o melhor local para isso seria sobre o túmulo da família de Ricardo onde estava sua prima.

O Senhor dos Anéis – I – A Irmandade do Anel (Tolkien, J.R.R.)
Primeira parte da grande obra de ficção fantástica do autor. Esta história cresceu conforme foi sendo contada, até se tornar uma história da Grande Guerra do Anel, incluindo muitas passagens da história ainda mais antiga que a precedeu. Em grande parte, esta obra trata de hobbits, e através de suas páginas o leitor pode descobrir muito da personalidade deles e um pouco de sua história.

A herdeira veneziana (Tomizza, Fulvio)
Romance histórico que se passa no século XVIII. Relato verídico da vida de Paulina Rubi, baseado no livro “Privadas desventuras de uma mulher de verdadeiro espírito” escrito por seu pai, o Conde Gian Rinaldo Carli, que depois de editá-lo, mandou queimar todos os exemplares, menos um , que ficou guardado em uma caixa blindada sob a guarda da Biblioteca de Lucca.

Topázio (Uris, Leon)
1962: a crise dos mísseis em Cuba. Espiões russos infiltrados entre os ministros do General De Gaulle. Agentes secretos norte-americanos e franceses tentando provar a instalação de mísseis, na pequena ilha do Caribe, pelo governo da Rússia. Homens fortes e mulheres apaixonadas lutam desesperadamente para selar o destino das nações. Baseado em fatos reais.

Banana brava (Vasconcelos, José Mauro de)
Aventura de um jovem que pretende ser garimpeiro e se embrenha pelo caminho difícil que leva ao garimpo de Banana Brava. Uma vida mesclada de traição e vingança, de amizade e solidariedade.

O garanhão das praias (Vasconcelos, José Mauro de)
O livro tem como cenário o Araguaia, junto a uma aldeia Xavante, onde em torno de um posto de saúde do serviço de proteção ao índio, desenrola-se toda a história, tendo como protagonista Canário, o garanhão das praias. A explicação dada pelo próprio autor dá idéia da real característica da narrativa:
“O leitor não encontrará neste livro apenas um sentido de diversão. Ao contrário, o livro é de uma aridez doentia, de um desânimo acachapante e sobretudo, de uma contínua solidão mesclada de constantes desencontros”.

Os cavalinhos de platiplanto (Veiga, José)
Dada a simplicidade de sua linguagem, a fluência de sua narrativa e a singularidade dos entrechos que inventa, Veiga é escritor de leitura constante nas escolas. Mas sua ficção não é simplesmente pedagógica. Sua literatura invade o terreno do fantástico, do mistério e do absurdo, e algo característico que talvez explique esse sucesso, é a sua predileção pelos personagens infantis.

Ana Terra (Veríssimo, Érico)
Romance pacifista e humanista em que o autor inclui vários elementos do folclore gaúcho, onde os personagens imaginários misturam-se com personagens reais da história do Rio Grande do Sul. A família Terra, descendente dos tropeiros vindos de São Paulo, se estabelece na antiga província de São Pedro, na segunda metade do século XVIII e início do século seguinte. A protagonista Ana Terra é uma das pioneiras do povoado de Santa Fé, dominado pela família Amaral.

Incidente em Antares (Veríssimo, Érico)
Romance político. Ambientado na fictícia cidade de Antares, no interior do Brasil, esta obra centra-se na defesa dos direitos humanos e na denúncia do fanatismo ideológico.

Olhai os lírios do campo (Veríssimo, Érico)
Romance que conta a vida de um jovem pobre que, a custa de muito sacrifício, forma-se em Medicina. Muito ambicioso, faz um casamento frustrado com uma moça da alta sociedade. Tarde demais dá-se conta do seu verdadeiro amor.

O resto é silêncio (Veríssimo, Érico)
Romance. Numa praça, no centro de Porto Alegre, uma moça cai do alto de um edifício. Das pessoas que assistem a cena, sete interpretam o fato de maneira diversa. Mais importante que a história da suicida é o relato da vida dessas sete pessoas.

O analista de Bagé (Veríssimo, Luis Fernando)
Vinte e sete hilariantes histórias do impagável analista gaúcho, freudiano, machista, que costuma tratar seus pacientes a tapa.

Comédias para se ler na escola (Veríssimo, Luis Fernando)
Textos curtos, fáceis e divertidos, onde o autor, com originalidade e humor, revela suas obsessões, mergulha em lembranças de infância e adolescência, preocupa-se com o social e o ético.

As mentiras que os homens contam (Veríssimo, Luis Fernando)
Luis Fernando Veríssimo, observador bem-humorado do cotidiano brasileiro, reúne um repertório divertido sobre “As mentiras que os homens contam”. O livro traz crônicas do autor sobre o tema, espalhadas em vários de seus livros ou publicadas nos jornais. Este é o primeiro da série de relançamentos da obra completa de Verissimo.

A vida é pra valer (o diário de Fabiana) (Vilela, Antonio Carlos)
Fabiana é uma adolescente que, com a morte dos pais, vê sua vida e de sua irmã gêmea, dar uma grande virada. O livro fala do amadurecimento, de aprender a ter responsabilidade e a direcionar a afetividade. Fabiana passa a viver separada de Mariana, mas faz novos amigos e estes vão lhe dar forças para enfrentar as suas dificuldades.

A cor púrpura (Walker, Alice)
Estuprada pelo padrasto, uma adolescente negra tenta desabafar escrevendo cartas para Deus e para sua irmã que julga morta.

Fonte:
http://www.vestibular1.com.br