segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Hélio Pólvora (A Chuva, Sol e Grilo Falante)



Veio a chuva e disse:

— Amigo, você anda triste, mas aqui estou para lhe dar firmeza. Deite, durma e esqueça tudo. Esqueça que árabes e israelenses se matam, não pense no Iraque devastado, esqueça as crianças mutiladas no Pará, as balas perdidas, o desemprego, as drogas, os assaltos, o roubo quase institucionalizado.

E a chuva companheira se pôs a cair no telhado e a pingar no cimento com o leve rumor doce de fonte escorrendo no prado.

— Ora essa, Chuva, você promete firmeza e, mal o sol surge em Salvador, você desaba outra vez. É chuva de mais para as minhas lavouras. Mas, sendo pessoa de ordinário cordata, eu lhe digo: obrigado, Chuva, você chove dentro de mim, lava minhas nódoas, que são poucas, e renova minhas purezas, que são muitas e sem valia.

— Não tem de que, amigo. Chovo porque você merece chuvas novas e antigas, grossas e finas, especialmente sem trovões, para serem bem melodiosas — chuvas mozartianas, que tal? Chuvas são para adiar, imaginar e criar, sonhar, recriar, conhecer falsas condessas e ciganas esquivas. Vamos, feche esses olhos e vá dormir, amanhã é outro dia e talvez você acorde num Brasil rico, direito e decente.

Acordei horas depois com o sol ardendo nos olhos e me queimando a cara inteira. E o Sol me disse, zangado:

— Levante, endireite a vida, você já pensou demais, quando é que resolve botar a cartucheira e empunhar o fuzil? Seus amigos já estão todos no campo de batalha.

— Bom dia, Sol. Sou da guerrilha e não sei atirar. Hay que pelear, pero sin perder la ternura. Você fala igual ao meu pai, que me mandava arar muito cedo para garantir no futuro minha cabeça de vento. Muito tenho laborado, quarenta, cinqüenta anos, sei lá, em repartições e jornais, dando aulas, redigindo, emendando prosa alheia, fazendo discursos para ministros. Pois é, acho que aprendi a escrever, o que já é alguma coisa, também a beber e traduzir,.e respirei na cidade grande o gás venenoso dos ônibus. Agora eu lhe pergunto, amigo Sol: adiantou?

— Adiantou, sim. Então você não vê que o trabalho de que tanto fala é falso, aparente e vão, servindo somente de base para o outro trabalho, o verdadeiro, do seu íntimo, do seu interior?

Fiquei comovido, mas não convencido. O sol tirou um reflexo da vidraça.

— É isso aí, filho. Você tem crescido com nossa ajuda de muitos sóis, luas e chuvas. Parabéns por sua riqueza.

— Eu, rico? Não tenho um décimo da aposentadoria de um desembargador.

— Rico, sim senhor. Veja as minas que você explora dentro de si. Você é uma África do Sul em diamantes, e sem apartheid. E agora, contista, com licença, tenho de ir ao Iguatemi conversar com os escritores que acordam sempre cedo e arregimentam forças para a Academia.

E o Sol sumiu. Pela janela avistei apenas os mares da baía, que pareciam anoitecidos em plena manhã. O Grilo Falante saudou-me então com sua voz estridente:

— Não acredite nessas falas de sonhos embalados pela chuva, nem em promessas de diamantes de metáfora. São miragens, meu velho, miragens de sol no deserto. Para encher os seus dias de riqueza deveras substancial, maior que a dos cantores de trio elétrico e dos auditores corruptos, basta ler Turgueniev em francês.

A essa altura, irritei-me com tanto conselho desatinado, pois afinal o sol arde demais no Nordeste calcinado, a chuva chove em demasia nas terras úmidas do sul, e Grilo Falante eu só conheço de contos da carochinha. O Grilo saltou. Gritou-me que ia dar um piparote na cabeça da ministra Benedita da Silva. Subi a Ladeira da Barra por entre levas de pivetes, pedintes e bandidos armados, e lá em cima Franz Kafka de roupa preta me piscou um olho, enquanto Joyce me acusava aos berros de nunca ter lido o Ulisses inteiro.

Fonte
http://www.jornaldecontos.com/cronica_achuvasolegrilofalante.htm

Monteiro Lobato (O Saci)



A rotação da terra produz a noite; a noite produz o medo; o medo gera o sobrenatural: – divindades e demônios têm a origem comum da treva

Quando o sol raia, desdemoniza-se a natureza. Cessa o Sabá. Satã afunda no Inferno, seguido da alcatéia inteira dos diabos menores.

A bruxa reveste a forma humana. O lobisomem perde a natureza dupla. Os fantasmas diluem-se em névoa. Evaporam-se os duendes. Os gnomos subterrâneos mergulham no escuro das tocas. A caipora deixa em paz o viajante. As mulas sem cabeça reincabeçam-se e vão pastar mansamente. As almas penadas trancam-se nas tumbas. Os sacis param de assobiar e, cansados duma noite inteira de molecagens, escondem-se nos socavões das grotas, no fundo dos poços, em qualquer couto onde não penetre a luz, sua mortal inimiga. Filhos da sombra, ela os arrasta consigo mal o Sol anuncia, pela boca da Aurora, o grande espetáculo em que a Luz e sua filha a Côr esplendem numa fulgurante apoteose.

A treva, batida de todos os lados, refoge para os antros onde moram a coruja e o morcego. E nessas nesgas de escuro apinha-se a fauna inteira dos pesadelos, tal qual as rãs e os peixinhos aprisionados nas poças sem esgoto, quando após as grandes enchentes as águas descem. E como nas poças verdinhentas a atraíra permanece imóvel e a rã muda, assim toda a legião dos diabos se apaga. Inutilmente tentaríamos surpreender unzinho sequer.

O saci, por exemplo.

Abundante à noite como o morcego, nunca se deixou pilhar de dia. Metido nas tocas de tatú, ou nos ocos das árvores velhas, ou alapado à beira-rio em solapões de pedra limosa com retrança de samambaias à entrada, o moleque de carapuça vermelha sabe como ninguém o segredo de invizibilizar-se. Não colhesse ele, todos os anos, nas noites de São João, a misteriosa flor da samambaia!…

Mal, porém, o sol afrouxa no horizonte e a morcegada faminta principia a riscar de vôos estrouvinhados o ar cada vez mais escuro da noitinha, a “saparia” pula dos esconderijos, assobia o silvo de guerra – Saci-pererê! – e cai a fundo nas molecagens costumadas.

As primeiras vítimas são os cavalos. O saci corre aos pastos, laça com um cipó o animal escolhido – e nunca errou laçada! – trança-lhe a crina para armar com ela um estribo e dum salto monta-o à sua moda. O cavalo toma-se de pânico, e deita a corcovear pelo campo afora enquanto o perneta lhe finca os dentes numa veia do pescoço e chupa gostosamente o sangue. Pela manhã o pobre animal aparece varado, murcho dos vazios, cabeça pendida e suado como se o afrouxasse uma caminheira de dez léguas beiçais.

O sertanejo premune-o contra esses malefícios pendurando-lhe ao pescoço um rosário de capim ou um bentinho. É água na fervura.

Farto, ou impossibilitado daquela equitação vanpírica, o saci procura o homem para atenazá-lo.

Se encontra na estrada algum viajante tresnoitado, ai dele! Desfere-lhe de improviso um assobio ao a ouvido escarrancha-se-lhe à garupa – e é uma tragédia inteira o resto da jornada. Não raro o mísero perde os estribos e cai sem sentidos à beira do barranco.

Outras vezes diverte-se o saci a pregar-lhe peças menores: desafivela um lóro, desmancha o freio, escorrega o pelego, derruba-lhe o chapéu e faz mil outras picuinhas brejeiras.

O saci tem horror à água. Um depoente no inquérito demonológico do “Estadinho” narra o seguinte caso típico. Havia um caboclo morador numa ilha fluvial onde nunca entrara saci, porque as águas circunvolventes defendiam a feliz mansão. Certa vez, porém, o caboclo foi ao “continente” de canoa, como de hábito, e lá se demorou até à noite. De volta notou que a canoa vinha pesadíssima e foi com enormes dificuldades que conseguiu alcançar o abicadouro da margem oposta. Estava a ‘maginar no estranho caso – um travessio que fora fácil de dia e virara osso de noite – quando, ao firmar o varejão em terra firme, viu saltar da embarcação um saci às gargalhadas. O malvado aproveitara o incidente do travessio a deshoras para localizar-se na ilha, onde, desde então, nunca mais houve sossego entre os animais nem paz entre os homens.

Nos casebres da roça há sempre uma pequena cruz pendurada às portas. É o meio de livrar a vivenda do hospede não convidado. Mesmo assim ele ronda a moradia, arma peças a quem se aventura a sair para o terreiro, espalha a farinha dos monjolos, remexe o ninho das poedeiras, gora os ovos, judia das aves.

Se a casa não é defendida, é lá dentro que ele opera. Estraga objetos, esconde a massa do pão posta a crescer, esparrama a cinza dos fogões apagados em cata de algum pinhão ou batata esquecidos. Se encontra brasas, malabariza com elas e ri-se perdidamente quando consegue passar uma pelo furo das mãos. Porque, além do mais, tem as mãos furadas, o raio do moleque…

As porteiras, como as casas, são vacinadas contra o saci. Rara é a que não traz uma cruz escavada no macarrão. Sem isto o saci divertir-se-ia fazendo-a ringir toda a noite ou abrindo-a inopinadamente diante do transeunte que a defronta, com grande escândalo e pavor deste, pois adivinharia logo o autor da amabilidade e o repeliria com esconjuros.

Os cães apavoram-se quando percebem um saci no terreiro, e uivam retransidos.

Refere um depoente o caso da Dona Evarista. Morava esta excelente senhora numa casinha de barro, já velha e buraquenta, em lugar bastante infestado. Certa noite ouviu a cachorrada prorromper em uivos lamentosos. Assustada, pulou da cama, enfiou a saia e, tonta de sono, foi à cozinha, cuja porta abria para o quintal. E lá estarreceu de assombro: um saci arreganhado erguia-se de pé na soleira da porta, dizendo-lhe com diabólica pacholice: Boa noite, dona Evarista! A veha perdeu a fala e desabou na terra-batida, só voltando a si pela manhã. Desde então nunca mais lhe saiu das ventas um certo cheirinho a enxofre…

Se fossem só essas aparições…

Mas o saci inventa mil coisas para azoinar a humanidade. Furta o piruá da pipóca deixado na peneira, entorna vasilhas d’água, enreda a linha dos novelos, desfaz os crochês, esconde os roletes de fumo.

Quando um objeto desaparece, dedal ou tesourinha, é inútil campeá-lo pela casa inteira. Para reavê-lo basta dar três nós numa palha colhida num rodamoinho e pô-la sob o pé da mesa. O saci, amarrado e imprensado, visibilizará incontinente o objeto em questão para que o libertem do suplício.

Rodamoinho… A ciência explica este fenômeno mecanicamente, pelo choque de ventos contrários e não sei mais que. Lérias! É o saci que os arma. Dá-lhe, em dias ventosos, a veneta de turbilhonar sobre si próprio como um pião. Brincadeira pura. A deslocação do ar produzida pelo giroscópio de uma perna só é que faz o remoinho, onde a poeira, as folhas secas e as palhinhas dançam em torno dele um corrupio infrene. Há mais coisa no céu e na terra do que sonha a tua ciência, Ganot!

Nessas ocasiões é fácil apanhá-lo. Um rosário de capim, bem manejado, laça-o infalivelmente. Também há o processo da peneira: é lançá-la, emborcada, sobre o núcleo central do rodamoinho. Exige-se, porém, que a peneira tenha cruzeta…

A figuração do saci sofre muitas variantes. Cada qual o vê a seu modo. Existem, todavia, traços comuns em relação aos quais as opiniões são unânimes: uma perna só, olhos de fogo, carapuça vermelha, ar brejeiro, andar pinoteante, cheiro a enxofre, aspecto de meninote. Uns têm-no visto de camisola de baeta, outros de calção curto; a maioria o vê nu.

Quanto ao caráter, há concordância em lhe atribuir um espírito mais inclinado à brejeirice do que à malvadez. Vem daí o misto de medo e simpatia que os meninos peraltas revelam pelo saci. É um deles – mais forte, mais travesso, mais diabólico; mas é sempre um deles o moleque endemoniado capaz de diabruras como as sonha a “saparia”.

A curiosidade despertada pelo inquérito do “Estadinho” denota como está generalizada entre nós a crendice. Raro é o brasileiro que não traz na memória a recordação da quadra saudosa em que “via sacis” e os tinha sempre presentes na imaginação exaltada. Convidados agora para falar sobre o duendezinho, todos impregnam seus depoimentos da nota pessoal das coisas vividas na infância. Referem-se a ele como a um velho conhecido que a vida, a idade e o discernimento fizeram perder de vista, mas não esquecer…

E – dubitativos uns, cépticos outros, afirmativos muitos – a conclusão de todos é a mesma: o Saci existe!…

- Como o Putois, de Anatole France?

Que importa? Existe. Deus e o Diabo ensinaram-lhe essa maneira subjetiva de existir…

Fontes:
http://contosdocovil.wordpress.com/2008/05/15/o-saci/
Imagem = http://brincandonaescola.blogspot.com

Dicionários e sua Utilidade



Fonte de informação de uso freqüente e generalizado, o dicionário é extremamente útil. É a primeira obra de consulta a que recorremos para saber o significado de uma palavra, para checar sua ortografia e para conferir sua pronúncia exata ou sua categoria gramatical

Consulta ao dicionário enciclopédico

No dicionário enciclopédico é possível encontrar informações sobre os principais assuntos científicos, humanísticos e artísticos e também sobre a vida dos mais ilustres personagens das ciências e das artes, tudo organizado por ordem alfabética. Nomes de pessoas devem ser procurados pelo último sobrenome conhecido. Exemplo: Fernando Pessoa deve estar no verbete Pessoa, Fernando. No caso de pseudônimos, como Molière (Jean-Baptiste Poquelin), deve-se procurar pelo pseudônimo. Na lombada de cada volume existe geralmente a primeira e a última palavra tratada em cada tomo.

Alguns elementos permitem localizar a informação que procuramos num livro:
– Sumário ou índice geral, em que estão indicados os capítulos e subtítulos do livro, pela ordem em que aparecem
– Prólogo ou introdução, com dados e comentários sobre o autor e a obra. Às vezes convém ler o prólogo após a leitura do livro, para evitar que a opinião do comentarista influencie demasiadamente a nossa
– Índices (temático, de autores, de topônimos, de ilustrações). Geralmente eles se encontram no final do livro e permitem localizar alfabeticamente aquilo que procuramos, dando indicação da página
– Bibliografia, também ordenada alfabeticamente, indica outros textos em que o assunto foi tratado

Definição

O dicionário é uma obra que reúne por ordem alfabética e explica, de maneira ordenada, o conjunto de vocábulos de uma língua ou os termos próprios de uma ciência ou arte. Há também dicionários que explicitam o significado das palavras e a sua correspondência em outros idiomas. Esses livros especiais classificam-se de acordo com seus objetivos didáticos e finalidades a que se propõem.

Origens dos dicionários

Os dicionários existem desde os tempos antigos. Os gregos e romanos já recorriam a eles para solucionar dúvidas e esclarecer termos e conceitos. Esses primeiros dicionários não eram organizados alfabeticamente. Apenas reuniam definições de conteúdos lingüísticos ou literários. Só no final da Idade Média foi que começaram a aparecer dicionários e glossários organizados alfabeticamente. Quando as glosas desses manuscritos latinos ficaram muito numerosas, os monges passaram a ordená-las alfabeticamente para facilitar sua localização. Nasceu aí uma primeira tentativa de dicionário bilíngue latim-vernáculo. A invenção da imprensa, no século XV, deu novo impulso à difusão e ao uso dos dicionários.

Variedade

Há diferentes tipos de dicionário. Entre os mais comuns destacam-se:

Dicionários gerais da língua: em versão extensa ou adaptada a usos escolares. Contêm um grande número de palavras, definidas em suas várias acepções ou significados.
Dicionários etimológicos: trazem a origem de cada palavra, sua formação e evolução.
Dicionários de sinônimos e antônimos: definem o significado das palavras, apresentando as que são equivalentes ou afins –palavras sinônimas – e as de significados opostos – palavras antônimas.
Dicionários analógicos: reúnem as palavras por campos semânticos, ou por analogia a uma idéia. Não costumam ser organizados por ordem alfabética.
Dicionários temáticos: reúnem o vocabulário específico de determinada ciência, arte ou atividade técnica: Dicionário de Comunicação, de Astronomia e Astronáutica.
Dicionários de abreviaturas: muito úteis, facilitam a comunicação, principalmente nesta época repleta de abreviaturas e siglas.
Dicionários bilíngües ou plurilíngües: explicam o significado dos vocábulos estrangeiros e sua correspondência com os vocábulos nativos.

Há outros tipos de dicionário, que atendem às mais diversas finalidades: de dúvidas e dificuldades de uma língua, de frases feitas, de provérbios.

Os dicionários no Brasil

O Vocabulário Português, de Raphael Bluteau, lançado entre 1712 e 1728, é considerado a primeira tentativa bem-sucedida de edição de um dicionário da língua portuguesa. Entre os pioneiros destaca-se, porém, o Dicionário da Língua Portuguesa, de Antônio Moraes Silva. Publicado em Lisboa, em 1789, é reconhecido como o melhor e o mais completo dicionário da língua. A segunda edição desse Dicionário, enriquecida e publicada em 1813, é considerada a produção definitiva de Moraes Silva.

Entre os dicionaristas de produção mais recente sobressaem: Francisco Caldas Aulete (1823-1878), autor do Dicionário Caldas Aulete; Carolina Michaëlis de Vasconcelos (1851-1925), que escreveu Lições de Filologia Portuguesa; José Rodrigues Leite e Oiticica (1882-1957), autor de Estudos de Fonologia. Na segunda metade do século XX, destaca-se o trabalho de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1910-1989), que lançou a primeira edição do Novo Dicionário da Língua Portuguesa em 1975. A segunda edição revisada e ampliada é de 1986. A grande difusão dessa obra popularizou tanto o autor que seu nome tornou-se sinônimo de dicionário: Você me empresta um aurélio?

Organização dos dicionários

Remissões: em algumas palavras aparece ao final um V, abreviatura de Ver Também, que remete o leitor a outra palavra do dicionário.
Etimologia: origem da palavra, vem normalmente entre parênteses.
Significados especiais: são aqueles relativos às linguagens específicas.
Verbete: conjunto de informações, acepções e exemplos que dizem respeito a um vocábulo.
Acepções: cada palavra tem vários ou diferentes significados, as chamadas acepções. Elas especificam-se conforme a ordem escolhida em cada dicionário: a partir das acepções mais antigas ou por sua importância e uso mais freqüente. Pequenos números separam os diversos significados.
Categoria gramatical ou morfologia: aparece sempre abreviada.

Alguns exemplos de línguas especiais

Linguagem jurídica e administrativa

O campo do direito é muito amplo. Existe o direito civil, o penal, o administrativo, o mercantil, o canônico, o processual, entre outros. Essa diversificação resulta em um vocabulário muito variado e específico:

Características da linguagem jurídica
– Objetividade: é extremamente importante, pois a subjetividade dificultaria sua função social
– Amplitude: é necessário legislar para todos os cidadãos
– Clareza e concisão: ela precisa ser compreendida por todos os interlocutores

Terminologia jurídica e administrativa
– Palavras obtidas da linguagem cotidiana: extrajudicial, decreto-lei
– Palavras e expressões latinas: ab initio (desde o princípio); ipso facto (por isso mesmo); usufruto
– Termos arcaicos: débito (em vez de dívida)
– Fórmulas: em virtude do acordado...
– Abundância de apartes e citações

Linguagem bancária

O sistema bancário, dedicado a negociar dinheiro e realizar outras operações comerciais e financeiras, tem um léxico próprio:

Léxico bancário
– Investimento: aplicação de capitais em títulos
– Crédito: empréstimo de dinheiro
– Juros: valor pago pelo empréstimo recebido
– CDB: Certificado de Depósito Bancário

Linguagem da informática

A informática é um campo de atividade que se ocupa do tratamento da informação em um meio físico automatizado, o computador. Sua linguagem, bastante específica, vem-se incorporando com rapidez à língua cotidiana:

Léxico da informática
– Computador: aparelho eletrônico de processamento de dados
– Hardware: conjunto de componentes físicos do computador
– Software: conjunto de programas do computador
– Programa: conjunto de instruções de uma linguagem de computador que permite solucionar um tipo determinado de problema
– Caracteres: símbolos utilizados para escrever dados e programas
– Bit: é o menor elemento de armazenamento de informação
– Byte: é a unidade mínima que representa um caractere ou número composto por 8 bits
– Programa-fonte: programa escrito pelo programador em linguagem simbólica: Assembler, Cobol, Fortran, Basic
– Entradas: dados e programas que podem ser colocados no computador
– Saídas: informação que o computador pode nos dar depois de processar os dados
– Memória: dois tipos de memória: ROM (Read Only Memory) – armazena a informação que controla o funcionamento do computador – e RAM (Random Access Memory) – pode-se ler e atualizar a informação por meio dos programas instalados no computador

Linguagem do cinema e da teledramaturgia

Os métodos e técnicas empregados no cinema e na teledramaturgia possuem uma linguagem variada e bastante característica:

Léxico do cinema e da teledramaturgia
– Tema e argumento: mensagem do filme, apresentada em seqüências e cenas
– Roteiro cinematográfico: apresenta os diálogos, situações dos personagens, movimentos das câmeras, planos, iluminação e sons
– Planos:
Grande plano geral (GPG) – enquadramento geral da paisagem
Plano geral (PG) – apresentação dos personagens no local da ação
Primeiro plano (PP) – a câmera destaca apenas uma parte do assunto; no caso de personagens, enquadra somente ou rosto ou as mãos
Primeiríssimo plano (PPP) – tomada bem próxima, isolando um detalhe. Também chamado plano de detalhe
Plano americano – enquadramento dos personagens a meio-corpo; utilizado nos diálogos
– Pausas dramáticas: fundido em preto (a câmera se fecha numa mancha preta para passar de uma seqüência a outra), encadeamento (junção de cenas) e corte (separação de duas cenas)
– Ângulo da câmera: posição da câmera em relação ao tema

Linguagem publicitária

Tem por objetivo informar o público consumidor sobre as características e utilidades de um determinado produto, com o objetivo de induzi-lo ao consumo. Além dos cartazes e folhetos, que são seus meios próprios, a imprensa, o rádio e a televisão são os canais de divulgação privilegiados dessa linguagem:

Características da linguagem publicitária

A mensagem publicitária deve ser:
– Visível: para tanto lança mão das fotografias, do jogo de cores, da variedade de letras e símbolos
– Fácil de lembrar: por meio de jogos de palavras e slogans fáceis de memorizar
– Legível
– Impactante

Uso dos dicionários

Todo dicionário tem sua organização e suas finalidades explicadas em um prólogo. É importante lê-las para saber como aproveitar todas as possibilidades da obra. Embora as informações sobre a língua em seu conjunto sejam objeto dos dicionários gerais – de palavras e enciclopédicos –, vários dicionários especializados podem trazer um enfoque lingüístico (dicionários de sinônimos, analógicos, etimológicos) ou enciclopédico (dicionários de psicologia, de informática, de cinema, de literatura). Os dicionários, além disso, geralmente trazem como apêndice, no começo ou no final, uma lista das abreviaturas utilizadas e dos sinais de pontuação específicos. Conhecê-los também facilita o manuseio.

Funções dos dicionários gerais

Suas principais funções são:
– Definir o significado das palavras e sua representação ortográfica.
– Informar a etimologia das palavras, explicando se elas se originam do latim, do grego, do árabe, de alguma outra língua antiga ou se é o caso de empréstimo de alguma língua estrangeira moderna.
– Informar a categoria gramatical da palavra (substantivo, verbo, pronome etc.) e outros aspectos gramaticais (gênero, número).
– Auxiliar, como instrumento de estudo de uma língua estrangeira.
– Ajudar a uniformizar e manter a unidade da língua.

Fontes
http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=dicionarios/docs/origemdicionario
http://www.klickeducacao.com.br

Lima Barreto (O Número da Sepultura)



Que podia ela dizer, após três meses de casada, sobre o casamento? Era bom? Era mau? Não se animava a afirmar nem uma coisa, nem outra. Em essência, "aquilo" lhe parecia resumir-se em uma simples mudança de casa.

A que deixara não tinha mais nem menos cômodos do que a que viera habitar; não tinha mais "largueza"; mas a " nova" possuía um jardinzito minúsculo e uma pia na sala de jantar.

Era, no fim de contas, a diminuta diferença que existia entre ambas.

Passando da obediência dos pais, para a do marido, o que ela sentia, era o que se sente quando se muda de habitação.

No começo, há nos que se mudam, agitação, atividade; puxa-se pela idéia, a fim de adaptar os móveis à casa "nova" e, por conseguinte, eles, os seus recentes habitantes também; isso, porém, dura poucos dias.

No fim de um mês, os móveis já estão definitivamente " ancorados", nos seus lugares, e os moradores se esquecem de que residem ali desde poucos dias.

Demais, para que ela não sentisse, profunda modificação, no seu viver, advinda com o casamento, havia a quase igualdade de gênios e hábitos de seu pai e seu marido.

Tanto um como outro, eram corteses com ela; brandos no tratar, serenos, sem impropérios, e ambos, também, meticulosos, exatos e metódicos. Não houve, assim, abalo algum, na sua transplantação de um lar para outro.

Contudo, esperava, no casamento alguma coisa de inédito até ali, na sua existência de mulher: uma exuberante e contínua satisfação de viver.

Não sentiu, porém, nada disso.

O que houve de particular na sua mudança de estado, foi insuficiente para lhe dar uma sensação nunca sentida da vida e do mundo. Não percebeu nenhuma novidade essencial...

Os céus cambiantes, com o rosado e dourado de arrebóis, que o casamento promete a todos, moços e moças; não os vira ela. O sentimento de inteira liberdade, com passeios, festas, teatros, visitas — tudo que se contém para as mulheres, na idéia de casamento, durou somente a primeira semana de matrimônio.

Durante ela, ao lado do marido, passeara, visitara, fora a festas, e a teatros; mas assistira todas essas coisas, sem muito se interessar por elas, sem receber grandes ou profundas emoções de surpresa, e ter sonhos fora do trivial da nossa mesquinha vida terrestre. Cansavam-na até! No começo, sentia alguma alegria e certo contentamento; por fim, porém, veio o tédio por elas todas, a nostalgia da quietude de sua casa suburbana, onde vivia à négligé e podia sonhar, sem desconfiar que os outros Lhe pudessem descobrir os devaneios crepusculares de sua pequenina alma de burguesia, saudosa e enfumaçada.

Não era raro que também ocorresse saudades da casa paterna, provocadas por aquelas chinfrinadas de teatros ou cinematográficas. Acudia-lhe, com indefinível sentimento, a 1embrança de velhos móveis e outros pertences familiares da sua casa paterna, que a tinham visto desde menina. Era uma velha cadeira de balanço de jacarandá; era uma leiteira de louça, pintada de azul, muito antiga; era o relógio sem pêndulo, octogonal, velho também; e outras bugigangas domésticas que, muito mais fortemente do que os móveis e utensílios adquiridos recentemente, se haviam gravado na sua memória.

Seu marido era um rapaz de excelentes qualidades matrimoniais, e não havia, no nebuloso estado d'alma de Zilda, nenhum desgosto dele ou decepção que ele lhe tivesse causado.

Morigerado, cumpridor exato dos seus deveres, na seção de que era chefe seu pai, tinha todas as qualidades médias, para ser um bom chefe de família, cumprir o dever de continuar a espécie e ser um bom diretor de secretaria ou repartição outra, de banco ou de escritório comercial.

Em compensação, não possuía nenhuma proeminência de inteligência ou de ação. Era e seria sempre uma boa peça de máquina, bem ajustada, bem polida e que, lubrificada convenientemente, não diminuiria o rendimento daquela, mas que precisava sempre do motor da iniciativa estranha, para se pôr em movimento.

Os pais de Zilda tinham aproximado os dois; a avó, a quem a moça estimava deveras, fizera as insinuações de praxe; e, vendo ela que a coisa era do gosto de todos, por curiosidade mais do que por amor ou outra coisa parecida, resolveu-se a casar com o escriturário de seu pai. Casaram-se, viviam muito bem. Entre ambos, não havia a menor rusga, a menor desinteligência que lhes toldasse a vida matrimonial; mas não existia também como era de esperar, uma profunda e constante penetração, de um para o outro e vice-versa, de desejos, de sentimentos, de dores e alegrias.

Viviam placidamente numa tranqüilidade de lagoa, cercada de altas montanhas, por entre as quais os ventos fortes não conseguiam penetrar, para encrespar-lhe as águas mortas.

A beleza do viver daquele novel casal, não era ter conseguido de duas fazer uma única vontade; estava em que os dois continuassem a ser cada um uma personalidade, sem que, entanto, encontrassem nunca motivo de conflito, o mais ligeiro que fosse. Uma vez, porém.. Deixemos isso para mais tarde... O gênio e a educação de ambos muito contribuíam para tal.

O marido, exato burocrata, era cordato, de temperamento calmo, ponderado e seco que nem uma crise ministerial. A mulher era quase passiva e tendo sido educada na disciplina ultra-regrada e esmeriladora de seu pai, velho funcionário, obediente aos chefes, aos ministros, aos secretários destes e mais bajuladores, às leis e regulamentos, não tinha assomos nem caprichos, nem fortes vontades. Refugiava-se no sonho e, desde que não fosse multado, estava por tudo.

Os hábitos do marido eram os mais regulares e executados, sem a mínima discrepância. Erguia-se do leito muito cedo, quase ao alvorecer, antes mesmo da criada, a Genoveva, levantar-se da cama. Pondo-se de pé, ele mesmo coava o café e, logo que estava pronto, tomava uma grande xícara.

Esperando o jornal (só comprava um), ia para o pequeno jardim, varria-o, amarrava as roseiras e craveiros, nos espeques, em seguida, dava milho às galinhas e pintos e tratava dos passarinhos.

Chegando o jornal, lia-o meticulosamente, organizando, para uso do dia, as suas opiniões literárias, científicas, artísticas, sociais e, também, sobre a política internacional e as guerras que havia pelo mundo.

Quanto à política interna, construía algumas, mas não as manifestava a ninguém, porque quase sempre eram contra o governo e ele precisava ser promovido.

Às nove e meia, já almoçado e vestido, despedia-se da mulher, com o clássico beijo, e lá ia tomar o trem. Assinava o ponto, de acordo como regulamento, isto é, nunca depois das dez e meia.

Na repartição, cumpria religiosamente os seus sacratíssimos deveres de funcionário.

Sempre foi assim; mas, após o casamento, aumentou de zelo, a fim de pôr a seção do sogro que nem um brinco, em questão de rapidez e presteza no andamento e informações de papéis.

Andava pelas bancas dos colegas, pelos protocolos, quando o serviço lhe faltava e se, nessa correção, topava com expediente em atraso, não hesitava: punha-se a "desunhar".

Acontecendo-lhe isto, ao sentar-se à mesa, para jantar, já em trajes caseiros, apressava-se em dizer a mulher — Arre ! Trabalhei hoje, Zilda, que nem o diabo ! — Porque ? — Ora, porque? Aqueles meus colegas são uma pinóia...

— Que houve ? — Pois o Pantaleão não está com o protocolo dele, o da Marinha, atrasado de uma semana? Tive que o pôr em dia...

— Papai foi quem te mandou? — Não; mas era meu dever, como genro dele, evitar que a seção que ele dirige, fosse tachada de relaxada. Demais não posso ver expediente atrasado...

— Então, esse Pantaleão falta muito? — Um horror ! Desculpa-se com estar estudando direito. Eu também estudei, quase sem faltas.

Com semelhantes notícias e outras de mexericos sobre a vida íntima, defeitos morais e vícios dos colegas, que ele relatava à mulher, Zilda ficou enfronhada no viver da diretoria em que funcionava seu marido, tanto no aspecto puramente burocrático, como nos da vida particular e famílias dos respectivos empregados.

Ela sabia que o Calçoene bebia cachaça; que o Zé Fagundes vivia amancebado com uma crioula, tendo filhos com ela, um. dos quais com concurso e ia ser em breve colega do marido; que o Feliciano Brites das Novas jogava nos dados todo o dinheiro que conseguia arranjar que a mulher do Nepomuceno era amante do General T., com auxílio do qual ele preteria todos nas promoções, etc., etc.

O marido não conversava com Zilda senão essas coisas da repartição; não tinha outro assunto para palestrar com a mulher.Com as visitas e raros colegas com quem discutia, a matéria da conversação eram coisas patrióticas: as forças de terra e mar, as nossas riquezas naturais, etc.

Para tais argumentos tinha predileção especial e um especial orgulho em desenvolvê-los com entusiasmo. Tudo o que era brasileiro era primeiro do mundo ou, no mínimo, da América do Sul. E — ai! — de quem o contestasse; levava uma sarabanda que resumia nesta frase clássica: — É por isso que o Brasil não vai para adiante. O brasileiro é o maior inimigo de sua pátria.

Zilda, pequena burguesa, de reduzida instrução e, como todas as mulheres, de fraca curiosidade intelectual quando o ouvia discutir assim com os amigos, enchia-se de enfado e sono; entretanto, gostava das suas alcovitices sobre os lares dos colegas...

Assim ela ia repassando a sua vida de casada, que já tinha mais de três meses feitos, na qual, para quebrar-lhe a monotonia e a igualdade, só houvera um acontecimento que a agitara, a torturara, mas, em compensação, espantara por algumas horas o tédio daquele morno e plácido viver. É preciso contá-lo.

Augusto — Augusto Serpa de Castro — tal era o nome de seu marido — tinha um ar mofino e enfezado; alguma coisa de índio nos cabelos muito negros, corredios e brilhantes, e na tez acobreada. Seus olhos eram negros e grandes, com muito pouca luz, mortiços e pobres de expressão, sobretudo de alegria.

A mulher, mais moça do que ele uns cinco ou seis anos, ainda não havia completado os vinte. Era de uma grande vivacidade de fisionomia, muito móbil e vária, embora o seu olhar castanho claro tivesse, em geral, uma forte expressão de melancolia e sonho interior. Miúda de feições, franzina, de boa estatura e formas harmoniosas, tudo nela era a graça do caniço, a sua esbelteza, que não teme os ventos, mas que se curva à força deles com mais elegância ainda, para ciciar os queixumes contra o triste fado de sua fragilidade, esquecendo-se, porém, que é esta que o faz vitorioso.

Após o casamento, vieram residir na Travessa das Saudades, na estação.

É uma pitoresca rua, afastada alguma coisa das linhas da Central, cheia de altos e baixos, dotada de uma caprichosa desigualdade de nível, tanto no sentido longitudinal como no transversal.

Povoada de árvores e bambus, de um lado e outro, correndo quase exatamente de norte para sul, as habitações do lado do nascente, em grande número, somem-se na grota que ela forma, com o seu desnivelamento; e mais se ocultam debaixo dos arvoredos em que os Cipós se tecem.

Do lado do poente, porém, as casas se alteiam e, por cima das de defronte, olham em primeira mão a Aurora, com os seus inexprimíveis cambiantes de cores e matizes.

Como no fim do mês anterior, naquele outro, o segundo término de mês depois do seu casamento, o bacharel Augusto, logo que recebeu os vencimentos e conferiu as contas dos fornecedores, entregou o dinheiro necessário à mulher, para pagá-los, e também a importância do aluguel da casa.

Zilda apressou-se em fazê-lo ao carniceiro, ao padeiro e ao vendeiro; mas, o procurador do proprietário da casa em que moravam, demorou-se um pouco. Disso, avisou o marido, em certa manhã, quando ele lhe dava uma pequena quantia para as despesas com o quitandeiro e outras miudezas caseiras. Ele deixou o importe do aluguel com ela.

Havia já quatro dias que ele se havia vencido; entretanto, o preposto do proprietário não aparecia.

Na manhã desse quarto dia, ela amanheceu alegre e, ao mesmo tempo apreensiva.

Tinha sonhado; e que sonho ! Sonhou com a avó, a quem amava profundamente e que desejara muito o seu casamento com Augusto. Morrera ela poucos meses antes de realizar-se o seu enlace com ele; mas ambos já eram noivos.

Sonhara a moça com o número da sepultura da avó — 1724; e ouvira a voz dela, da sua vovó, que lhe dizia: "Filha, joga neste número ! " O sonho impressionou-a muito; nada, porém, disse ao marido. Saído que ele foi para a repartição, determinou à criada o que tinha a fazer e procurou afastar da memória tão estranho sonho.

Não havia, entretanto, meios para conseguir isso. A recordação dele estava sempre presente ao seu pensamento, apesar de todos os seus esforços em contrário.

A pressão que lhe fazia no cérebro a 1embrança do sonho, pedia uma saída, uma válvula de descarga, pois já excedia a sua força de contenção. Tinha que falar, que contar, que comunicá-lo a alguém...

Fez confidência do sucedido à Genoveva. A cozinheira pensou um pouco e disse: — Nhanhã: eu se fosse a senhora arriscava alguma coisa no "bicho".

— Que "bicho" é ? — 24 é cabra; mas não deve jogar só por um lado. Deve cercar por todos e fazer fé na dezena, na centena, até no milhar. Um sonho destes não é por aí coisa à toa.

— Você sabe fazer a lista? — Não, senhora. Quando jogo é o Seu Manuel do botequim quem faz " ela". mas a vizinha, Dona Iracema, sabe bem e pode ajudar a senhora.

— Chame " ela" e diga que quero lhe falar.

Em breve chegava a vizinha e Zilda contou-lhe o acontecido.

Dona Iracema refletiu um pouco e aconselhou: — Um sonho desses, menina, não se deve desprezar. Eu, se fosse a vizinha, jogava forte.

— Mas, Dona Iracema, eu só tenho os oitenta mil-réis para pagar a casa. Como há de ser? A vizinha cautelosamente respondeu: — Não lhe dou a tal respeito nenhum conselho. Faça o que disser o seu coração; mas um sonho desses...

Zilda que era muito mais moça que Iracema, teve respeito pela sua experiência e sagacidade. Percebeu logo que ela era favorável a que ela jogasse. Isto estava a quarentona da vizinha, a tal Dona Iracema, a dizer-lhe pelos olhos.

Refletiu ainda alguns minutos e, por fim, disse de um só hausto: — Jogo tudo.

E acrescentou: — Vamos fazer a lista - não é Dona Iracema? — Como é que a senhora quer? — Não sei bem. A Genoveva é quem sabe.

E gritou, para o interior da casa: — O Genoveva! Genoveva! Venha cá, depressa! Não tardou que a cozinheira viesse. Logo que a patroa lhe comunicou o embaraço, a humilde preta apressou-se em explicar: — Eu disse a nhanhã que cercasse por todos os lados o grupo, jogasse na dezena, na centena e no milhar.

Zilda perguntou à Dona Iracema: — A senhora entende dessas coisas? — Ora! Sei muito bem. Quanto quer jogar? — Tudo ! Oitenta mil-réis ! — É muito, minha filha. Por aqui não há quem aceite. Só se for no Engenho de Dentro, na casa do Halavanca, que é forte. Mas quem há de levar o jogo? A senhora tem alguém? — A Genoveva.

A cozinheira, que ainda estava na sala, de pé, assistindo os preparativos de tão grande ousadia doméstica, acudiu com pressa: — Não posso ir, nhanhã. Eles me embrulham e, se a senhora ganhar, a mim eles não pagam. É preciso pessoa de mais respeito.

Dona Iracema, por aí, lembrou : — É possível que o Carlito tenha vindo já de Cascadura, onde foi ver a avó... Vai ver, Genoveva! A rapariga foi e voltou em companhia do Carlito, filho de Dona Iracema. Era um rapagão dos seus dezoito anos, espadaúdo e saudável.

A lista foi feita convenientemente; e o rapaz levou-a ao "banqueiro".

Passava de uma hora da tarde, mas ainda faltava muito para as duas. Zilda lembrou-se então do cobrador da casa. Não havia perigo. Se não tinha vindo até ali, não viria mais.

Dona Iracema foi para a sua casa; Genoveva foi para a cozinha e Zilda foi repousar daqueles embates morais e alternativas cruciantes, provocados pelo passo arriscado que dera. Deitou-se já arrependida do que fizera.

Se perdesse, como havia de ser? O marido... sua cólera... as repreensões... Era uma tonta, uma doida... Quis cochilar um pouco; mas logo que cerrou os olhos, lá viu o número — 1724. Tomava-se então de esperança e sossegava um pouco da sua ânsia angustiosa.

Passando, assim, da esperança ao desânimo, prelibando a satisfação de ganhar e antevendo os desgostos que sofreria, caso perdesse — Zilda, chegou até à hora do resultado, suportando os mais desencontrados estados de espírito e os mais hostis ao seu sossego. Chegando o tempo de saber "o que dera" , foi até à janela. De onde em onde, naquela rua esquecida e morta, passava uma pessoa qualquer.

Nesse ínterim, surge o Carlito a gritar: — Dona Zilda! Dona Zilda! A senhora ganhou, menos no milhar e na centena.

Não deu um "ai" e ficou desmaiada no sofá da sua modesta sala de visitas.

Voltou em breve a si, graças às esfregações de vinagre de Dona Iracema e de Genoveva. Carlito foi buscar o dinheiro que subia a mais de dous contos de réis. Recebeu-o e gratificou generosamente o rapaz, a mãe dele e a sua cozinheira, a Genoveva. Quando Augusto chegou, já estava inteiramente calma. Esperou que ele mudasse de roupa e viesse à sala de jantar, a fim de dizer-lhe: — Augusto: se eu tivesse jogado o aluguel da casa no "bicho". — você ficava zangado? — Por certo! Ficaria muito e havia de censurar você com muita veemência, pois que uma dona de casa não...

— Pois, joguei.
— Você fez isto, Zilda? — Fiz.
— Mas quem virou a cabeça de você para fazer semelhante tolice? Você não sabe que ainda estamos pagando despesas do nosso casamento? — Acabaremos de pagar agora mesmo.
— Como? Você ganhou? — Ganhei. Está aqui o dinheiro.
Tirou do seio o pacote de notas e deu-o ao marido, que se tornara mudo de surpresa. Contou as pelejas muito bem, levantou-se e disse com muita sinceridade. abraçando e beijando a mulher..

— Você tem muita sorte. É o meu anjo bom.

E todo o resto da tarde, naquela casa, tudo foi alegria.

Vieram Dona Iracema, o marido, o Carlito, as filhas e outros vizinhos.

Houve doces e cervejas. Todos estavam sorridentes, palradores; e o contentamento geral só não desandou em baile, porque os recém-casados não tinham piano. Augusto deitou patriotismo com o marido de Iracema.

Entretanto, por causa das dúvidas, no mês seguinte, quem fez os pagamentos domésticos foi ele próprio, Augusto em pessoa.

Fontes:
- Revista Sousa Cruz. Rio de Janeiro. maio 1921.
- Imagem = http://profiles.friendster.com

Robert Frost (O Poeta no Papel)



A ESTRADA NÃO TRILHADA

Num bosque, em pleno outono, a estrada bifurcou-se,
mas, sendo um só, só um caminho eu tomaria.
Assim, por longo tempo eu ali me detive,
e um deles observei até um longe declive
no qual, dobrando, desaparecia...
Porém tomei o outro, igualmente viável,
e tendo mesmo um atrativo especial,
pois mais ramos possuía e talvez mais capim,
embora, quanto a isso, o caminhar, no fim,
os tivesse marcado por igual.
E ambos, nessa manhã, jaziam recobertos
de folhas que nenhum pisar enegrecera.
O primeiro deixei, oh, para um outro dia!
E, intuindo que um caminho outro caminho gera,
duvidei se algum dia eu voltaria.
Isto eu hei de contar mais tarde, num suspiro,
nalgum tempo ou lugar desta jornada extensa:
a estrada divergiu naquele bosque – e eu
segui pela que mais ínvia me pareceu,
e foi o que fez toda a diferença.
––––––––––––––
A FAMÍLIA DA ROSA

A rosa é uma rosa
E sempre foi rosa.
Mas hoje se usa
Crer que a pêra é rosa
E a maçã vistosa
E a ameixa, uma rosa.
Pergunta a amorosa
Que mais será rosa.
Você, claro, é rosa –
Mas sempre foi rosa.
––––––––––––––
NUM CEMITÉRIO EM DESUSO

O vivos vêm pisando a grama,
vêm ler no morro as inscrições;
o cemitério ainda os atrai;
os mortos é que não vêm mais.
Os versos nele se repetem:
“Aqueles que hoje vivos vêm
a ler as pedras e se vão
mortos é que amanhã virão.”
Certas da morte as lousas rimam,
mas não sem deixar de notar
que nenhum morto já não vem.
Do que é que os homens medo têm?
Seria fácil ser esperto
e lhes dizer: "Eles detestam
a morte, e já não entram nela."
Talvez caíssem na esparrela.
––––––––––––––
EM WOODWARD’S GARDENS

Por mera conjetura, um menino acercou-se
certa vez de uma jaula e expôs a dois macacos
uma lente de aumento – objeto que macacos
não podem compreender, nem podem ser levados
a compreender, por mais que se empreguem palavras
ou que se diga que tais lentes são capazes
de concentrar num ponto as radiações do sol.
Mas, para lhes mostrar a arma em funcionamento,
ele fez um pontinho em cima do nariz
do primeiro macaco e, após, do outro, gerando
uma névoa de espanto em seus olhos perplexos,
que piscadela alguma alcançou dissipar.
De braços dados junto às grades, os macacos,
com grande confusão, olhavam para a vida.
Um levou ao nariz uma mão pensativa,
como se recordasse – ou como se estivesse
parado a alguns milhões de anos de alguma idéia.
Atingiram-se os nós de seus rosados dedos.
O já sabido foi outra vez confirmado
por meio dessa experiência psicológica.
E então a descoberta acabaria nisso,
não houvesse o menino, em suas conjeturas,
se demorado tanto e aproximado tanto.
Como um relâmpago de braço, houve um puxão,
e agora era do símio o que foi do menino.
Correram, num tropel, para o fundo da cela
e deram logo início a uma investigação
por conta própria e sem a intuição necessária.
Perscrutaram o gosto, a mordiscar a lente;
destroçaram o cabo e a argola que o prendia.
E, não mais sábios, desistiram em seguida.
E eis que, ocultando-a sob a palha onde dormiam,
na ampla modorra de outro dia de prisão,
voltaram novamente às grades, com secura,
a si mesmos dizendo: E quem disse que importa
o que os macacos compreendem, e o que não?
Podem não compreender o vidro que incendeia.
Podem não compreender a luz do próprio sol.
Saber o que fazer das coisas é que conta.
––––––––––––––
UM PÁSSARO MENOR

Quis, de fato, que o pássaro voasse
E próximo ao meu lar não mais cantasse.
Cheguei à porta para afugentá-lo,
Por sentir-me incapaz de suportá-lo.
Penso que a inteira culpa fosse minha,
E não do pássaro ou da voz que tinha.
O erro estava, decerto, na aflição
De querer silenciar uma canção.

(Tradução de Renato Suttana)
––––––––––––––
MURO REMENDADO

Alguma coisa existe que não aprecia o muro,
Que enfia bojos de terra gelada por baixo,
E derrama as pedras superiores ao sol,
E faz buracos onde até dois podem passar abraçados.
O trabalho dos caçadores é outra coisa:
Eu cheguei depois deles e fiz a reparação
Onde não deixaram pedra sobre pedra,
Mas conseguiram pôr a lebre fora do esconderijo,
Para deleitar cães latidores. As brechas, quero dizer,
Ninguém as viu fazer ou as ouviu fazer,
Mas na época primaveril dos arranjos encontramo-as lá,
faço o meu vizinho saber para lá da colina;
E um dia encontramo-nos para percorrer a linha
E assentarmos o muro outra vez entre nós.
Mantemos o muro entre nós enquanto avançamos.
A cada um as pedras que caíram para cada um.
E algumas são formas e outras são tão como bolas
Que temos de usar um feitiço para as equilibrar:
"Fica onde estás até voltarmos as costas!"
Ficamos com os dedos ásperos de as manipular.
Oh, somente outro género de jogo ao ar livre,
Um de cada lado. Mas vai mais longe:
Aí onde se encontra, nós não precisamos de muro:
Ele é todo pinheiros e eu sou um pomar de maçãs.
As minhas macieiras nunca atravessarão
Para comer os cones sob os seus pinheiros, digo-lhe eu.
Ele só me diz, "Boas cercas fazem bons vizinhos."
A primavera instiga-me e pergunto-me
Se lhe posso despertar a razão:
"Porque razão fazem bons vizinhos? Isso não é
Onde existem vacas? Mas aqui não há vacas.
Antes de construir um muro eu inquiriria para saber
O que estaria a incluir ou a excluir,
E a quem era suposto ofender.
Alguma coisa existe que não aprecia o muro,
Que o quer no chão”. Poderia dizer-lhe "duendes",
Mas não são duendes exactamente, e eu prefiro
Que ele o diga a si próprio. Vejo-o por ali,
A agarrar uma pedra com firmeza pelo topo
Em cada mão, como um antigo selvagem armado de pedras.
Move-se na escuridão e parece-me,
Não apenas a das florestas e a da sombra das árvores.
Ele não irá atrás do dito de seu pai,
Gosta de ter pensado naquilo tão bem
E diz novamente, "Boas cercas fazem bons vizinhos."
––––––––––––––

Robert Frost (1874 - 1963)


Robert Lee Frost (San Francisco, Califórnia, 26 de março de 1874 - 29 de janeiro de 1963) foi um dos mais importantes poetas dos Estados Unidos do século XX. Frost recebeu quatro prêmios Pulitzer.

O pai bebia, jogava e era excêntrico e irascível. A mãe era o oposto: religiosa e culta, foi quem apresentou ao filho o mundo da literatura. Com a morte do pai em 1885, a família muda-se para a Nova Inglaterra, região à qual Frost e sua poesia seriam permanentemente associados no futuro (embora o poeta também tenha passado longas temporadas em Michigan e na Flórida).

Em 1890, publica seu primeiro poema, começa a dar aulas e realiza pequenos serviços em fazendas e moinhos. A vida que levava nesse período moldou sua personalidade poética: Frost foi um dos poetas norte-americanos que melhor combinou em seus versos o popular e o moderno, o local e o universal.

Em 1895, inicia-se uma nova fase em sua vida: casa-se com Elinor White em 19 de dezembro; o primeiro filho nasce no ano seguinte (teria seis ao todo), e passa a envolver-se cada vez mais com a vida no campo: em 1901 já administra sua própria fazenda. Adquire o hábito de escrever seus poemas à noite, na mesa da cozinha. A partir de 1906, quando começa a lecionar em tempo integral na Pinkerton Academy, a vida profissional de Frost não se dissociaria mais do ramo das letras. Começa a proferir palestras e conferências, atividade que não abandonaria até a morte.

Entre 1912 e 1915 viveu na Inglaterra, país onde publicou seus dois primeiros livros de poemas, A Boy’s Will (1913) e North of Boston (1914). Os livros foram bem recebidos pela crítica européia, e Frost é apresentado a poetas famosos, como Ezra Pound, Ford Madox Ford e W. B. Yeats.

Em 1915 volta aos Estados Unidos, e no mesmo ano publica em seu país natal seus dois primeiros livros. Com a carreira literária cada vez mais sólida, recebe o Pulitzer em duas ocasiões (1924, por New Hampshire, e 1931, por Collected Poems).

A morte da esposa em 1938 e o suicídio da filha Carol em 1940 causaram um impacto tremendo em sua estabilidade emocional. Em 1941, muda-se para Cambridge, onde viveria pelo resto da vida, o tempo todo assessorado por sua secretária Kathleen Morrison (logo em seguida à morte da esposa, Frost a pedira em casamento, mas Kathleen recusou).

As viagens como conferencista incluíram uma visita ao Brasil (Rio de Janeiro e São Paulo) em agosto de 1954. Em 1957 volta a visitar a Europa, ocasião em que conhece grandes nomes da literatura da época: W. H. Auden, E. M. Forster, Cecil Day Lewis, Graham Greene. Plenamente reconhecido como um dos maiores poetas norte-americanos do século, Robert Frost morre em 29 de janeiro de 1963.

Obras

A produção literária de Frost é variada e abundante. Sua poesia inclui sonetos, poemas em forma de diálogo, poemas curtos, poemas longos. Escreveu três peças teatrais (A Way Out, In an Art Factory e The Guardeen). São numerosíssimos os registros de suas conferências. A correspondência, os ensaios e as histórias merecem o mesmo comentário. Frost tem a capacidade de dar um tratamento simples e ao mesmo tempo profundo a temas elementares (fogo, gelo, natureza), tirando verdadeiras "lições de moral" de suas observações do mundo natural (lições nem sempre otimistas, como se pode notar em Nothing Gold Can Stay). Tal traço, aliado à modernidade de sua linguagem (Frost era um defensor do uso da linguagem vernácula nas obras literárias), fez com que Frost jamais deixasse de figurar entre os escritores prediletos dos norte-americanos, ao lado de nomes como Whitman, Emerson e Thoreau. Seu poema The Road Not Taken é peça obrigatória em qualquer antologia poética de língua inglesa. Prova adicional de sua popularidade são as várias referências em filmes como Sociedade dos Poetas Mortos e Daunbailó. Um de seus poemas está no prefácio do livro Eclipse, de Stephenie Meyer, o terceiro livro da série Crepúsculo.

Fonte:
wikipedia

Dan Brown (Anjos e Demonios)



Anjos e Demônios é um romance policial do escritor Dan Brown que conta a primeira aventura de Robert Langdon. É públicado pela editora Sextante.

Robert Langdon, um respeitado professor de simbologia de Harvard, recebe uma ligação de Maximilian Kohler, diretor do CERN, a organização européia para pesquisa nuclear, pedindo para que ele venha investigar a morte do fisíco Leonardo Vetra.

Robert Langdon aceita o convite e vai para a sede do CERN em Genebra,na Suíça.
Leonardo Vetra estava desenvolvendo um estudo sobre as anti-partículas, uma fonte de energia não poluente e que não contêm radioatividade. No entanto, as anti-partículas são instáveis e não podem entrar em contato com nada, nem mesmo com o ar.

Leonardo Vetra era religioso e acreditava que ciência e religião poderiam existir juntas e que o big-bang provaria o genesis na Bíblia.

Leonardo Vetra foi assassinado e sua invenção foi roubada e a marca dos Illuminati, uma fraternidade inimiga da igreja católica extinta a quatrocentos anos, foi gravada com ferro em brasa em seu corpo.

Robert Langdon conhece Vittoria Vetra, a filha de Leonardo Vetra, e ingresa em uma caçada para achar o experimento de Leonardo Vetra antes que os Illuminati usem-o para destruir a cidade do vaticano.

PERSONAGENS

ROBERT LANGDON
Robert Langdon é um fictício professor de simbologia de Harvard e o personagem princípal que é chamado por Maximilian Kohler para investigar a morte de Leonardo Vetra.

Quando chegou ao CERN, conheceu Vittoria Vetra, filha adotiva de Leonardo Vetra. Ao ver o corpo de Leonardo Vetra, ele fica chocado com o ambigrama dos Illuminati em seu peito. Esse seria um sinal de que os Illuminati ainda existem.

VITTORIA VETRA
Vittoria Vetra é a filha adotiva de Leonardo Vetra.

Ela foi abandonada por seus pais quando criança. Morava em um orfanato católico. Ela conheceu Leonardo Vetra, um jovem padre que tinha um interese por fisíca. Vittoria Vetra foi adotada por ele. Quando Leonardo Vetra recebeu um convite para trabalhar no CERN, eles se mudam para Genebra na Suiça.

MAXIMILIAN KOHLER
Maxmilian Kohler é o diretor do CERN. Perdeu o movimento das pernas e se locomove com uma cadeira de rodas.

Ele é conhecido como "Der König"que significa "o rei" em alemão

A Invalidez de Kohler deu-se de uma forma triste, explicando seu ódio por religiões. Kohler adoeceu gravemente quando criança, e seus pais não o deixavam ser assistido pois achavam que Deus o iria curar. Kohler quase morreu, não fosse um médico o ajuda-lo as escondidas.

CAMERLENGO VENTRESCA
Carlo Ventresca é o camerlengo em atividade quando ocorre a crise no Vaticano. Ventresca tinha um grande amor por sua mãe, Maria, a quem chamava de Bendita. Um dia na Igreja, Carlo distanciou-se dela para ver umas Imagens e uma bomba terrorista a atingiu. A partir daí ele foi adotao por um bispo, futuro papa, ingressou no exercito e no seminário. Ventresca é o vilão da história, se passando por um mestre Illuminatti ele planeja destruir a Igreja, pois descobriu que seu mentor, o PAPA, era seu verdadeiro pai. Ventresca o matou e bolou um plano diabólico para acabar com a Igreja.

FATOS

O CERN existe de fato e sua sede realmente fica em Genebra. O CERN foi responsável pela criação da Word Wide Web, a Internet.

A energia das anti-partículas é real. Ela pode ser o combustível do futuro, pois não é poluente e não contém radioatividade. As anti-partículas são instáveis e podem liberar uma energia de 20 quilotons, a mesma energia da bomba atômica. Isso a torna muito perigosa..

A fraternidade dos Illuminati realmente existiu. Era uma organização formada por intelectuais que discordavam das idéias da igreja.

Fonte:
wikipédia

Dan Brown (1964)



(Exeter, 22 de Junho de 1964) é um escritor norte americano. Seu maior sucesso foi o polêmico best-seller O Código da Vinci, mas seus outros três livros também tiveram uma grande vendagem. É um dos escritores mais famosos no globo atualmente, tendo seus livros traduzidos e vendidos em grande escala em diversos lugares do mundo. Entre seus grandes feitos, está o de conseguir colocar seus quatro primeiros livros simultaneamente na lista de mais vendidos do The New York Times. Atualmente, encontra-se desenvolvendo um novo projeto, um livro ainda sem prazo para lançamento, The Solomon Key.

Nascido no estado de Nova Hampshire, sendo o mais velho de três filhos. Sua mãe Constance (Connie) foi uma musicista profissional, tocando órgão na igreja. Seu pai, Richard G. Brown, ensinava matemática para o Ensino Médio na Phillips Exeter Academy, um colégio interno particular, e escreveu o didático best-seller matemático Advanced Mathematics: Precalculus with Discrete Mathematics and Data Analysis, que foi muito utilizado no país.

Professores do colégio foram requisitados a viver no campus por diversos anos, então Brown e seus irmãos literalmente foram criados na escola. Na maior parte, o ambiente social foi o cristão. freqüentou a escola dominical, cantando no coro da igreja, e passou seus verões no acampamento da igreja. Seu próprio estudo foi em escolas públicas em Exeter até a 9ª série, até matricular-se em Phillips Exeter, assim como seus irmãos mais novos Valerie e Gregory quando chegaram suas vezes.

Após a graduação na Phillips Exeter em 1982, Brown entrou para o Amherst College, onde foi membro da Fraternidade Psi Upsilon. Durante seu primeiro ano em Amherst, foi à Europa para estudar História da Arte na Universidade de Sevilha, Espanha, onde começou a estudar seriamente os trabalhos de Leonardo Da Vinci, que mais tarde teriam importância crucial em um de seus romances.

Fonte:
wikipedia

sábado, 29 de agosto de 2009

Lucilene Machado (Sequência de Sonho)



Por hoje, bastava-me uma garrafa de vinho para embriagar-me. Espírito dionísico para beber um sonho. Mas o cálice da realidade impede-me conquistar a eternidade do céu de uma boca ou de qualquer paraíso feito de suspiros e palavras. A razão não compreende a emoção. Embates e embustes. A paixão vale pelo silêncio que engloba. Vale por tudo que não conseguimos dizer, por tudo que não conseguimos perguntar, porque muitas vezes as perguntas não são possíveis.

Debruço-me sobre o parapeito de uma janela que não me pertence. Nada me pertence. Poucas pessoas no mundo são tão despidas quanto eu. Tenho uma nudez que fere. Uma nudez que quer ser dividida. É sublime doar um pedaço de si. Uma mutilação que constrói sonhos. Quantos sonhos seriam necessários para desvendar o mistério de um homem? Talvez nenhum. Pode-se desintegrar os átomos de um homem com atitudes. Com algum impulso de sangue latino pode-se brindar belas descobertas. Mas amor é outra coisa. Amor é o nome que eu persigo e pelo qual me perdi algumas vezes. Fui infeliz em todas as felicidades. Minha alma é uma capela vazia esperando por um anjo. Um anjo cheio de pecados a fazer-me confissões.

A lua rasteja o futuro por caminhos inexplorados. Quero estar suficientemente viva para trafegar com meus sonhos por esses desígnios. Já não estarei confinada num canto do mundo com essa sobrecarga de imagens. Já não estarei precisando pensar, precisando concentrar-me na amarração do texto que toma corpo de crônica. Isso estica minha angustia. Queria pensar sem formas, mas já não posso. Tudo acaba padronizado. O medo de decepcionar, o medo de não ter medo... Toda palavra tem seu preço. Sou vítima de um sistema coletivo de encadeamento de idéias. Até o amor tem suas terminologias. Até o amor tem suas ciências. Mas hoje estou incurável. Quero um amor de botequim. Amor sem pressa e sem causa. É porque é, porque tem de ser. Um amor sem história, acontecendo ao acaso, como se eu nunca tivesse sonhado isso.

De verdade, quando se vive milhares de noites, já não se pode precisar em que noite antiga, muito antiga, se plantou o sonho. Deve ser quando raspei as pernas pela primeira vez, calcei sapatos de salto e todo mundo percebeu, "Essa menina cresceu, tá virando mulher". Estava concluído um ciclo. Nunca mais voltei ao sótão para brincar de bonecas. Voltei sim, para ver das alturas o destino que subia da terra. O destino tinha corpo e cheiro de homem. Senti vergonha do meu sentimento sem pudor. Vergonha dos meus pensamentos ousados. Meu corpo era um mar que precisava de muitos rios para satisfazê-lo. Era assim mesmo? Puberdade, ouvi na aula de ciências. Só não falaram da necessidade de simbiose de espírito. Mas, instintivamente iniciei a busca pelo amor real. Raramente o vivi por inteiro. Queria alcançar com a mão aquilo que está à altura da inteligência.

Mas essa memória afetiva me cansa! Poderia dizer que hoje estou pronta para o desafio, mas o amor tem viés que desconheço. Mal posso falar da anatomia. Tanta beleza em uma só. Tanto pecado num mesmo pecado. Resgate, remissão... Eros, Ágape, Fileu... gravitar em torno do outro... melhor mergulhar numa taça de vinho e lamber a emoção altruística (ou seria egoística?) de ter escrito esta página.

Fontes:
http://www.lunaeamigos.com.br/lucilene/indice.htm

Joao Silverio Trevisan (Dois Corpos que Caem)



Por simples acaso, dois desconhecidos encontraram-se despencando juntos do alto do Edifício Itália, no centro de São Paulo.

- Oi - disse o primeiro, no alvoroçado início da queda. - Eu me chamo João. E você?

- Antônio - gritou o segundo, perfurando furiosamente o espaço.

E, só pra matar o tempo do mergulho, começaram a conversar.

- O que você faz aqui? - perguntou Antônio.

- Estou me matando - respondeu João. - E você?

- Que coincidência! Eu também. Espero que desta vez dê certo, porque é minha décima tentativa. Há anos venho tentando. Mas tem sempre um amigo, um desconhecido e até bombeiro que impede. Você afinal está se matando por quê?

- Por amor - respondeu João, sentindo o vento frio no rosto. - Eu, que amava tanto, fui trocado por um homem de olhos azuis. Infelizmente só tenho estes corriqueiros olhos castanhos…

- E não lhe parece insensato destruir a vida por algo tão efêmero como o amor? - ponderou Antônio, sentindo a zoada que o acompanhava à morte.

- Justamente. Trata-se de uma vingança da insensatez contra a lógica - gritou João num tom quase triunfante. - Em geral é a vida que destrói o amor. Desta vez, decidi que o amor acertaria contas com a vida!

- Poxa - exclamou Antônio - você fez do amor uma panacéia!

- Antes fosse - replicou João, com um suspiro. - Duvidoso como é, o amor me provocou dores horríveis. Nunca se sabe se o que chamamos amor é desamparo, solidão doentia ou desejo incontrolável de dominação. O que na verdade me seduz é que o amor destrói certezas com a mesma incomparável transparência com que o caos significante enfrenta a insignificância da ordem. Não, o amor não é solução para a vida. Mas é culminância. Morrer por ele me trouxe paz.
Ante o vertiginoso discurso, ambos tentaram sorrir contra a gravidade.

- E você, como se sente? - perguntou João a Antônio.

- Oh, agora estou plenamente satisfeito.

- Então por que busca a morte?

- Bom - respondeu Antônio - me assustou descobrir um fiasco primordial: que a razão tem demônios que a própria razão desconhece. Daí, preferi mergulhar de vez no mistério.

- Sim, da razão conheço demasiados horrores. Mas que mistério é esse tão importante a ponto de merecer sua vida?

- Não sei - respondeu Antônio. - Mistério é mistério.

- Mas morto você não desvendará o mistério! - protestou João.

- Por isso mesmo. O fundamental no mistério é aguçar contradições, e não desvendar. Matar-me, por exemplo, é bom na medida que me torna parte do enigma e, de certo modo, o agudiza. Tem a ver com a fé, que gera energias para a vida. Ou para a história, quem sabe…

- Taí um negócio que perdi: a fé. Deus para mim… - e João engasgou.

- Ora - revidou Antônio vivamente. - A fé nada tem a ver com Deus, que se reduziu a uma pobre estrela anã de energias tão concentradas que já nem sai do lugar. Deus desistiu de entender os homems, e virou também indagador. Sem Deus nem Razão, a única fé possível é mergulhar neste abismo do mistério total.

- Mas para isso é preciso ao menos saber onde está o mistério - insistiu João com os cabelos drapejando ao vento.

- Ué, o mistério está em mim, por exemplo, que me mato para coincidir comigo mesmo. Mas há mistério também em você: seu morrer de amor é o mais impossível ato de fé. Graças a ele, você participa do mistério. Porque se apaixonou pelos abismos. João olhou com olhos estatelados, ao compreender. E Antônio, que já faiscava na semi-realidade da vertigem, gritou com todas as forças:

- Há sobretudo este mistério maior de estarmos, na mesma hora e local, cometendo o mesmo gesto absurdo e despencando para a mesma incerteza, por puro acaso. Além de cúmplices, a intensidade deste mergulho nos tornou visionários. Você não vê diante de si o desconhecido? É que já estamos perfurando a treva.

E como tudo de fato reluzia, João também ergueu a voz:

- Sim, sim. É espantoso o brilho do absurdo.

- E agora - disse Antônio bem diante do rosto de João - falemos um pouco da permanência. Você gosta dos meus olhos azuis?

Foi quando os dois corpos se estatelaram na Avenida São Luiz.
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Sobre o Autor
João Silvério Trevisan (Ribeirão Bonito, 23 de junho de 1944) é um escritor, jornalista, dramaturgo, tradutor, cineasta e ativista GLBT brasileiro. Até setembro de 2005 atuava como diretor da oficina literária do SESC. Assina uma coluna mensal na revista G Magazine.
Em Literatura = Testamento de Jônatas Deixado a David (1976); As Incríveis Aventuras de El Cóndor' (1980); Em Nome do Desejo (1983); Vagas Notícias de Melinha Marchiotti (1984); Devassos no Paraíso (1986); O Livro do Avesso (1992); Ana em Veneza (1994); Troços & Destroços (1997); Seis Balas num Buraco Só: A Crise do Masculino (1998); Pedaço de Mim (2002).
Roteiro (adaptação)= Doramundo, obra de Geraldo Ferraz e direção de João Batista de Andrade (1º tratamento, 1977) - aclamado com o prêmio de melhor filme, cenografia e diretor no Festival de Gramado de 1978; A mulher que inventou o amor, de Jean Garrett (1981)
Teatro = Heliogábalo & Eu; Em Nome do Desejo; Troços & Destroços; Hoje é dia do Amor

Fontes:
http://mscamp.wordpress.com/category/contos-lendas/
http://pt.wikipedia.org
Foto Montagem = José Feldman

Literatura Africana



A África possui uma rica e variada literatura que foi se desenvolvendo através dos tempos. Sua literatura escrita esteve sempre em débito com a literatura oral, na qual se incluem os contos populares, frutos da imaginação popular cujos personagens mais famosos são a tartaruga, a lebre e a aranha, difundidos por todo o continente e também no Caribe, Estados Unidos e Brasil, como resultado do tráfico de escravos africanos.

A primeira literatura escrita aparece no norte da África e, assim como as obras do teólogo cristão Santo Agostinho e do historiador islâmico do século XIV Ibn Khaldun, apresenta fortes vínculos com as literaturas latina e árabe.

As primeiras obras escritas da África ocidental datam do século XVI e são fruto do trabalho de eruditos islâmicos sudaneses como Abd-al Rahman al-Sadi e Mahmud Kati. A primeira poesia escrita era de caráter religioso e o poeta mais relevante foi AbdulAh ibn Muhammed Fudi.

Na África oriental também nota-se a influência dos modelos árabes. Uma historia anônima da cidade-estado Kilwa Kisiwani, escrita por volta de 1520 em árabe, é o primeiro exemplo conhecido desta literatura. A primeira obra conhecida em swahili é o poema épico Utendi wa Tambuka (História de Tambuka), que data de 1728. Em torno do século XIX, a poesia swahili abandonou os temas árabes e adotou formas bantos como as canções rituais.

Os principais poemas escritos em swahili datam dos séculos XIX e XX. O poema religioso mais conhecido, Utendi wa Inkishafi (O despertar das almas), foi escrito por Sayyid Abdallah ibn Nasir. A tradição oral a respeito de Liyongo é retratada no poema épico Utendi wa Liyongo Fumo (Epopéia de Liyongo Fumo), escrito em 1913 por Muhammad ibn Abubakar.

Na África do Sul surgiram diversos poetas e romancistas de prestigio. Samuel E. K. Mqhayi é autor de uma abundante obra em língua e romancistas como Thomas Mofolo e Solomon T. Plaatje escreveram textos denunciando a ditadura dos brancos. Outros exilaram-se, como Peter Abrahams e Ezekiel Mphahlele.

Outros autores importantes são A. C. Jordan, o poeta zulu R. R. R. Dhlomo, Alex La Guma, Bloke Modisane, Lewis Nkosi e Dennis Brutus.

Os brancos sul-africanos cultivam uma longa tradição literária, tanto em africâner como em inglês. Entre os escritores figuram poetas como D. J. Opperman, Breyton Breytenbach, J. M. Coetzee, Olive Schreiner, Alan Stewart Paton, Doris Lessing, Nadine Gordimer — prêmio Nobel de Literatura em 1991 — e Athol Fugard.

A poesia tem sido a forma literária dominante entre os escritores africanos em língua francesa, como Léopold Sédar Senghor, Briago Diop e David Diopos, mas os romancistas em francês da África ocidental figuram entre os mais brilhantes do continente, como o guineano Camara Laye e os camaroneses Mongo Beti e Ferdinand Oyono. Entre os autores em língua inglesa destacam-se os nigerianos Amos Tuotola, Gabriel Okara, John Pepper Clark, Chinua Achebe, Wole Soyinka — agraciado com o prêmio Nobel de Literatura em 1986 —, William Conton (de Serra Leoa), o ganense Kofi Awoonor e Ayi Kwei Armah.

A literatura contemporânea da África oriental inclui importantes autores como os quenianos Josiah Kariuki, R. Mugo Gatheru, James Ngugi, Jean Joseph Rabearivelo (de Madagascar) e Shaaban Robert (nascido em Tanganica, atual Tanzânia). Uma das obras mais lidas na África oriental continua sendo curiosamente Júlio César, de Shakespeare, traduzida para swahili em 1966 pelo então presidente de Tanzânia Julius Nyerere.

Fontes:
Portal Literário
Imagem = Professor Paulinho

Edgar Allan Poe (Al Aaraaf)


Parte I

Oh! nada de terrestre além da luz
do olhar (que em cada flor se reproduz)
da Beleza, tal como em jardins, onde o dia
de gemas circassianas se desata;
oh! nada de terrestre, além da melodia
trêmula do regato dentre a mata;
ou (música de apaixonado peito)
o canto de um prazer suavemente desfeito
de que o eco há de, eterno, perdurar,
como vive na concha a saudade do mar;
nenhuma dor terrena, alanceante;
porém toda a beleza e cada flor
que o bosque enfeita e escuta o nosso amor,
é que adornam o mundo tão distante
daquela estrela errante.

Para Nesace era esse um tempo abençoado,
pois de quatro brilhantes sóis bem perto
o seu mundo oscilava no ar dourado...
Repouso efêmero... Oásis num deserto
de venturas... e longe, longe, em meio
a um luminoso mar, em que se alaga
de fulgores do Empíreo o espírito liberto...
a custo abrindo (tão espessa é a vaga)
a estrada dos destinos celestiais,
ela, de tempo em tempo, se encaminha
a orbes distantes, e hoje ao nosso veio,
favorito de Deus. Porém, rainha
de reino bem mais firme, atira o cetro a um lado,
deixa o leme e por entre hinos espirituais
banha em quádrupla luz seu corpo imaculado.

Será ela mais feliz, na terra suave e doce,
distante, onde nasceu a "Idéia da Beleza"
(caída em espirais da estrelada surpresa,
qual trança feminil de pérolas cercada
para em montes aqueus ter eterna morada)?
Olhou para o Infinito... e ajoelhou-se.
Nuvem linda à sua volta se recurva
- zimbório que seu mundo reproduz -
vista só na beleza e que não turva
outra visão tão bela, a cintilar na luz...
grinalda que entre os atros espirala
e a enlaçá-los colore o ar de opala.

Em flores ajoelhou-se, avidamente:
lírios como os que a fronte erguiam, de alabastro
sobre o Cabo Deucato e, de repente,
irromperam do chão, para encobrir o rastro
fugitivo da que - soberba rara -
morreu, tão-só porque um mortal amara;
e a Sefálica, que de abelhas mil se inunda,
ergue a haste purpurina e os joelhos lhe circunda;
e a flor preciosa, a que um engano dava
de Trebizonda o nome e que, habitando
outrora os mais longínquos atros, quando
tudo quanto era belo suplantava,
dos céus seu mel dulcíssimo esparzia
(o néctar dos pagãos) no orvalho que caía
sobre o jardim do pária em Trebizonda e sobre
a flor que a imita e que de sol se cobre,
tão semelhante à sua irmã da altura
que, hoje ainda, atormenta a abelha que a procura,
com sonhos e loucuras desvairadas;
no céu, perto do céu, da bela planta
a flor e as folhas onde, desoladas,
e sua fronte, de dor, não se levanta,
- remorso. das loucuras já passadas
o seio de ar balsâmico a lhe inflar,
bela que errou, e que é mais casta e linda;
e ao pefurmar a noite ela receia ainda
as Nictantes sagradas perfumar;
E Clítia, pensativa entre sóis numerosos,
a face a rorejar de prantos invejosos;
e a magnífica flor que na terra nasceu
e morreu, mal a vida começara,
rasgando o seio redolente, para
que dos jardins de um rei sua alma fosse ao céu,
e o lótus valisnério, que a torrente
do Ródano atirou, após luta inclemente.
e teu perfume rubro e encantador, ó Zante
"Isola d`oro! Fior di Levante!"
E do Netuno a flor, que ao deus do amor conduz
a boiar sempre sobre o rio santo;
flores magas a que é dado, em perfume, o canto
da Deusa transmitir ao céu de luz.

"Deus! Espírito, que habitas
lá onde, no céu profundo,
o que é belo e o que é terrível
na beleza se assemelham;
para além da linha azul
que marca um limite à estrela,
mas quem à vista se desvia
da barreira que lhe ergueste,
da barreira ultrapassada
pelos cometas lançados
de seu orgulho e seu trono
para até o fim ser escravos,
para conduzir o fogo
vermelho, que arde em seu peito,
incansáveis, em carreira
sempre e sempre dolorosa;
Tu, que vives (bem sabemos)
na eternidade (e o sentimos),
que espírito há de mostrar
a sombra de tua fronte?
Embora tua mensageira,
Nesace, encontrasse seres
que à sua medida e imagem
Teu Infinito sonhassem,
tua vontade, ó Deus, foi feita!
A estrela pairou, na altura,
entre imensas tempestades,
sob o teu olhar ardente;
e hoje, a ti, em pensamento
(pois só o pensamento pode
ascender a teu império
e partilhar de teu trono)
pela Fantasia alada
minha mensagem envio,
até o dia em que o segredo
se revele junto aos céus."

Calou-se e mergulhou a face ardente e bela
entre os lírios, humilde, a procurar
abrigar-se do ardor de seu olhar;
porque treme, ante Deus, a própria estrela.
Nem respira, imóvel, pois ouvia
uma voz, dominando as amplitudes quietas,
um rumor de silêncio, que aturdia
o ouvido e que, em seus sonhos, os poetas
"musica das esferas" denominam.
O nosso mundo é feito de mil termos
e chamamos "Silêncio" à quietude dos ermos,
a mais vã das palavras existentes.
A Natureza inteira fala e os entes
imaginários, mesmos, disseminam
sombras de sons das asas de ficção;
mas, ah! tal não se dá no reino alto e fulgente
onde perpassa a voz de Deus, eternamente,
e o vento rubro murcha na amplidão.

"Que importa, nesses mundos apagados,
a um pequeno sistema e a um sol ligados,
seja loucura meu amor a multidão
minha cólera veja no trovão
em tormentas, tremor de terra, iras do mar
(por que vêm meu caminho irado assim cruzar?);
que importa se, com um sol somente, em tais planetas,
se extinguem, a correr, do Tempo as ampulhetas?
Teu é meu resplendor; recebe-o e leva
o meu segredo ao céu que mais se eleva.
Voa, deixa deserto o cristal de teu lar,
vai com tua corte pelo céu lunar
(e apartando-vos, como, em noite siciliana,
os pirilampos), leva em sua asa
a outros mundos, a luz que agora de ti emana.
Os mistérios a ti confiados revelam
a cada mundo que a soberba abrasa;
e por barreira os corações te tomem,
barreira e maldição, para que a estrela
não vacile perante os crimes do homem."
Pôs-se a virgem de pé na noite amarelada
de um só lua! Aqui, na Terra, é só adorada
uma lua e só de um amor fica a alma presa;
não o possuía mais o berço da Beleza.
Como a estrela nascida em horas de alvorada,
ergueu-se a virgem da florida alfombra
e por montes de luz e planícies de sombra
seguiu, sem, entretanto, abandonar ainda
sua morada teraseana e linda.

Parte II

Num cume de montanha em flor, alcantilada,
tal como a que o pastor, imerso no seu leito
de imensa pradaria, satisfeito,
vê, atônito, erguendo a pálpebra pesada
e "espero ser perdoado" então murmura,
sob a luz que paira, há muito, na ampla altura;
num cume cor-de-rosa, que se erguia
no éter iluminado e recebia,
à tarde, a última luz dos sóis morrentes:
sobre esse cume, em plena noite, quando
mais bela e estranha a lua vai dançando,
é que se ergue um palácio; resplendentes
colunas riem, cintilam no leve ar
e o mármore de Paros, a faiscar,
ri de novo, bem longe, sobre vaga
que no abismo reflete essa montanha maga.
É sua base de estrelas em fusão
como, no ébano do ar, as que tombam e vão
prateando, ao morrer, a mortalha que as veste,
para assim adornar a morada celeste.
A abóbada, que ao céu prende radiosa tela,
nas colunas, de leve, a coroá-las, se deita.
Redonda, de um diamante, apenas, feita,
olha o espaço purpúreo uma janela.
E a luz vinha da mão de Deus, atravessando
a cadeia meteórica, abençoar
toda aquela beleza, a não ser quando,
entre o Empíreo e esse liame, sacudia
algum espírito a asa impaciente e sombria.
Dos pilares tombou, dos serafins, o olhar
nas trevas deste mundo; e as verdes cores graves
e plúmbeas, que costuma a Natureza
preferir para a tumba da Beleza,
contornaram cornijas e arquitraves.
E cada querubim, ali em volta esculpido,
que olhava de seu lar marmóreo, comovido,
parecia terrestre, em seu nicho, à penumbra,
como estátua da Acaia, em região que deslumbra.
Ó frisas de Balbec, Persépolis, Tadmor,
da Gomorra de encantos abissais,
oh, a onda hoje a vós se veio sobrepor
e é, para vos salvar, tarde demais!
Gosta o som de brincar nas noites de verão;
testemunha-o o rumor do entardecer cinéreo,
que em Eiraco escutava, outrora, em seu mistério,
quem contemplasse os astros da amplidão,
e que ouve sempre quem, perdido ao longe o olhar,
vê numa nuvem fusca a treva se adensar.

Não possui forma e voz mais palpável, sonora,
Mas, que é isto? Alguém chega e traz, consigo, agora,
um rumor musical... bater de asas parece...
silêncio... e o som depois se arrasta e desvanece.
Nesace está de novo em sua linda morada.
O esforço da veloz carreira alucinada
fá-la ofegar e as faces lhe enrubesce;
e a faixa que rodeia os seios virginais
rompeu-se com o bater do coração.
Parou, a descansar, no centro do salão,
sob a mágica luz, que lhe beijava
o cabelo dourado, e que aspirava
repousar, porém só podia brilhar mais!

Cada flor jovem a outra flor e cada
árvore a outra, em doce melodia
suspirava, feliz, na noite iluminada.
E a música, a gemer dentre as fontes, caía
sobre bosques, que a luz das estrelas recobre,
vales vestidos de lua; mas sobre
as belas flores, as cascatas de ouro
e asas de querubins, o silêncio imperava;
e só o som a irromper do espírito era o coro
da encantada canção que a donzela cantava:

"Sob lianas, campânulas
e sebes de mata
que abrigam quem sonha
dos raios da lua,
erguei-vos, ó seres
de luz, que pensais
nos atros, que atônitos
dos céus extraístes
para, dentre as sombras,
sobre vós descerem,
como o olhar da virgem
que agora vos chama.

Erguei-vos dos sonhos
por entre violetas,
cumprindo os deveres
desta hora estrelada.
Sacudi das tranças
pesadas de orvalho
o hálito dos beijos
que o repouso embalam!
(sem ti, Amor, seriam
felizes os anjos?),
beijos de amor puro
que o repouso embalam!
Sacudi das asas
tudo que as detém:
que o orvalho da noite
os vôos retarda.
E as doces carícias
deixai-as de parte!
São plumas nas tranças,
mas chumbo no peito.
Ligéia! Ligéia!
Tu, que és a mais bela
e a mais rude idéia
exprimes em música,
será teu desejo
na brisa embalar-te?
Ou, calma, em descanso,
como os albatrozes
na noite estendidos
(tal ficas nos ares),
vigiar, encantada,
a harmonia célica?

Ligéia, por onde
surgir tua imagem,
que magia pode
soltá-la da música?
Prendeste os olhares
num sono de sonhos,
mas erguem-se sempre
cantos protetores
de tua vigília:
o ruído da chuva
que salta nas flores
e volta dançando
no ritmo das gotas;
e o rumor que brota
da relva crescendo,
música das coisas,
não passam de cópias.
Corre, então, querida,
às fontes mais claras
que jazem ao luar...
ao lago ermo, rindo
num sonho de morte,
às ilhas de estrelas
que o seio lhe adornam,
e onde as flores toscas
misturam as sombras,
lá dorme, nas margens,
multidão de virgens.
Algumas, deixando
a fria clareira,
repousam com a abelha.
Desperta-as, ó virgem,
na várzea e no prado.
Sussurra, em seu sonho,
de leve, no ouvido,
o ritmo cantante
que esperam, dormindo.
Pois nada desperta
mais rápido os anjos,
que assim adormecem,
sob a luz fria,
do que o doce encanto
nunca superado
do ritmo cantante
que embala o repouso."

Anjos vieram, e espíritos alados,
mil serafins cortaram os espaços,
sonhos jovens aspirando em vôos estonteados...
Seres que sabem tudo, exceto a Ciência, aquela
luz que, ó Morte, caiu, refratada em teus laços,
longe, do olhar de Deus, sobre a distante estrela.
Doce era essa ignorância; e essa morte, mais doce.
Doce era essa ignorância: em NÓS, o próprio alento
da Ciência embaça o espelho da alegria.
para eles, um simum arrasador seria.
Que lhes adiantaria o atroz conhecimento
de que a Verdade é Engano e a Ventura é Má Sorte?
Era doce sua morte e, para eles, morrer
de um vida saciada era o enlevo final;
para além dessa morte inexiste o imortal,
mas o sono que pesa é do "Não-Ser".
Possa minha alma, exausta, ali habitar do eterno
Céu distante, e também tão distante do Inferno.
Que espírito culpado, em seu bosque trevoso,
não ouviu, daquele hino, o apelo clamoroso?
Dois só; caíram, pois o céu não dá perdão
a quem só ouve o bater do próprio coração.
A angélica donzela e o seráfico amado...
Mas onde estava o Amor, o cego amor
sempre fiel ao Dever austero? (Esforço vão
e buscá-lo na célica amplidão.)
Sem guia, o amor, caiu, desnorteado,
por entre "prantos de perfeita dor".

Tombou: que belo espírito era esse!
Vagueava pelas fontes que a hera veste
a contemplar a luz da abóbada celeste,
junto de seu amor, sonhando ao luar.
Cada estrela não é qual doce olhar
que sobre as tranças da Beleza desce?
E elas, e as fontes, tudo era sagrado
para seu coração, de amor povoado
e de melancolia. A noite foi achar
Ângelo, o jovem (noite de pesar)
junto a escarpado monte, numa penha
erguida sob o céu solene a que desdenha
os mundos estelares a seus pés.
Sentou-se com sua amada, o negro olhar,
qual de águia, o firmamento a pesquisar.
Para ela se voltou depois e, novamente,
até a Terra desceu, tremulamente.

"Que débil luz, não vês, querida Iante?
Como é delicioso olhar tão longe assim!
Bem diversa, naqueles outono, para mim
era ela, quando à tarde abandonei,
sem lastimar, seu paço fulgurante,
ó tarde que jamais esquecerei!
Beijava o sol morrente, em Lemnos, com magia
o arabesco salão dourado em que jazia,
os tapetes sem conta, os meus olhos fechados,
sob o peso da luz na noite mergulhados,
e antes cheios de amor, das flores, da neblina,
que no seu Gulistan evoca o persa Saadi.
Mas essa luz!... Dormi... E a Morte invade
os meus sentidos, na ilha peregrina,
tão de leve, que nem sequer pressente
o adormecido, que ela está presente.

"O último ponto então por mim pisado
foi Parthenon, o templo sublimado.
Suas colunas são de maior maravilha
do que a beleza que em teu seio brilha;
e quando o Velho Templo soltar veio
minhas asas, alcei meu vôo, alcei-o
como águia que da torre se alcandora,
vendo fugirem séculos numa hora.
Enquanto assim nos ares me embalava,
metade do jardim terreno se mostrava
a meus olhos, tal como um mapa aberto,
com sua ermas cidades do deserto.
E tanta era a beleza, Iante, ali presente,
que quase desejei ser homem novamente."

"- Meu Ângelo! E por que a eles voltar,
se aqui possuis mais luminoso lar,
campos mais verdes que nesse mundo afastado,
carinhos feminis... e amor apaixonado?

"- Mas ouve, Iante! Quando o ar me faltou,
tão suave, e a alma às alturas se lançou,
talvez numa vertigem, cuidei ver
o mundo, que eu deixara, a abismar-me num caos,
turbilhonando, ao léu de ventos maus,
rolando em chamas no ígneo firmamento.
Querida, então julguei que, em lugar de ascender,
eu caía, num lento movimento
oscilante, através de luminosa estrada,
até pousar em áurea estrela: nesta!
Mas foi rápido o tempo da descida,
pois era a tua estrela a menos distanciada...
Terrível astro! a vir, numa noite de festa,
como um Dédalo rubro, à Terra comovida."

"-Viemos... Só os da terra... mas não nós...
da deusa podem discutir a voz:
viemos de toda parte, meu amor,
pirilampos alegres, em revoada,
não indagues por quê; basta que o visse impor,
num gesto angelical, ELA, por Deus mandada.
Jamais o velho tempo, Ângelo, se deteve,
sobre mundo mais velo a abrir a asa de neve!
O olhar dos anjos, do pequeno e baço
globo não via mais que o fantasma, no espaço,
quando Al Aaraaf lançou-se a atravessar,
para alcança-lo, o mar que se constela!
Mas quando sua glória aos céus veio pompear,
como a Beleza, exposta a olhar terreno, brilha,
detivemo-nos, ante a humana maravilha,
e, tal como a Beleza, estremeceu a estrela."

Os amantes assim falavam e escorria
a noite, a declinar, sem que trouxesse o dia.
Caíram: porque os Céus esperanças não dão
a quem só ouve o bater do próprio coração.
––––––––––-

sexta-feira, 28 de agosto de 2009