quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A. A. de Assis (Revista Virtual de Trovas "Trovia" n. 141 setembro 2011)



Revista virtual de trovas
Ano 12 n. 141 setembro de 2011


Inesquecíveis

Já que tens alma de artista,
vive teus sonhos em paz;
mas que não percas de vista
o feio mundo em que estás!
Archimimo Lapagesse

A dor é o caro pedágio
que é pago na ponte erguida
de um estágio a outro estágio
na travessia da vida.
Clóvis Maia

Todo o teu corpo estremece
se te falo – que doidice!
Que dirá se eu te dissesse
aquilo que eu não te disse...
Djalma Andrade

Deixa a criança correr
descalça pelos caminhos!
Ela precisa aprender
a pisar sobre os espinhos...
José Maria M. de Araújo

Quero falar... retrocedo...
pois tenho um pavor medonho
de que ao contar meu segredo
você destrua o meu sonho!
Luiz Otávio

E’ tanto o amor que me invade
quando em seus braços estou,
que cada instante é saudade
do instante que já passou!
Newton Meyer

O tradicional Almanaque Santo Antônio, da Editora Vozes, edição de 2012, mais uma vez prestigia os trovadores. Traz duas páginas cheinhas de trovas.

Brincantes

Minha dívida eu não nego,
mas eu não posso pagar;
e vou deixá-la no prego
até você perdoar.
Ademar Macedo – RN

Pensei ter do teu carinho
um tico ao menos enfim.
Nem tico nem ticozinho,
que bobo afinal sou mim...
Arnaldo Ari – RJ

Da chuva não corro mais!
Não pago esse mico, ó gente:
correr dos pingos de trás
pra me molhar nos da frente?
Josafá Sobreira da Silva – RJ

Vou pondo no paletó
as lembranças do meu fado.
Acho que as boas – que dó! –
coloco em bolso furado...
José Fabiano – MG

Casou... sofrimento louco:
a esposa não lhe dá folga.
E, como se fosse pouco,
lhe gruda nos pés a “solga”...
Osvaldo Reis – PR

O “pulgo” ficou cismando
quando viu, pelo caminho,
sua pulga passeando
no cachorro do vizinho...
Renato Alves – RJ

Se é verdadeiro que é o cão
maior amigo da gente,
amigo de comilão
deve ser “cachorro quente”!
Selma Patty Spinelli – SP

Ao vê-la, sente que a odeia,
fica tenso e encolhe a pança...
Todo dia a briga é feia
entre um gordo... e uma balança!
Therezinha Brisolla – SP

Líricas e filosóficas

No instante em que é concebida,
entra na história a criança.
Negar-lhe o direito à vida
é um crime contra a esperança.
A. A. de Assis – PR

Meu pai, muito te agradeço
por tudo que me ensinaste.
Não existe nenhum preço
pelo tanto que me amaste.
Agostinho Rodrigues – RJ

Repare que nossa alma
rende-se sempre bem mais
por um olhar que se espalma
que por ouvir tristes ais.
Amilton Monteiro – SP

Um dia, mesmo te amando,
meu coração se calou
e eu passo a vida chorando
a audácia que me faltou!
Arlindo Tadeu Hagen – MG

Liberdade, não me iludo,
somente a terei, enfim,
quando eu livre for de tudo,
de todos... e até de mim!
Carolina Ramos – SP

Madrugada. A lua sonda
minha rede e, sem vacilo,
entregue à exaustão da ronda,
se deita, para um cochilo...
Darly O. Barros – SP

Quando parte quem amamos
fica um vazio entre nós:
– é quando então reparamos
como é triste estarmos sós!
Diamantino Ferreira – RJ

Quando, em momentos incertos,
eu penso em dizer adeus,,
teus olhos, bruxos espertos,
deitam feitiço nos meus...
Divenei Boseli – SP

Poeta mantém acesa
a chama do amor fecundo,
minimizando a tristeza
e as dores cruéis do mundo.
Djalma Mota – RN

Revejo o passado e penso,
sem surpresa e sem espanto,
que o tempo, às vezes, é o lenço
com que Deus me enxuga o pranto.
Domitilla Borges Beltrame – SP

Montanha cheia de neve
que se desfaz no degelo,
diga ao sol que também leve
a neve do meu cabelo!
Dorothy J. Moretti – SP

Velho amor da mocidade,
que ao tempo não se curvou,
minha musa tem a idade
do poeta que ainda sou!
Edmar Japiassú Maia – RJ

A saudade, em cantilenas,
como se fosse um ator,
até hoje rouba as cenas
de meus delírios de amor!
Eduardo A. O. Toledo – MG

A saúde, sim, tem leis
e é muito certo dizer
que para viver comeis,
não viveis para comer.
Élbea Priscila – SP

Às vezes menina ainda;
outras, mulher revelada.
Em tudo o que a vida brinda,
segue sempre apaixonada!
Eliana Jimenez – SC

A riqueza é, justamente,
o multiplicar do amor:
– dar amor a toda a gente
seja lá qual gente for!
Elisabeth Souza Cruz – RJ

O espelho, em alguns instantes,
parece que ri... mas chora,
procurando traços de “antes”
na realidade de “agora”...
Ercy Marques de Faria – SP

Na minha amada a pensar,
passo noites sem dormir,
com medo até de sonhar,
e ela em sonho me trair...
Euclymar Barreto Porto – RJ

Meu coração é barato,
é cedido a qualquer preço;
basta mantermos contato
que o levo ao seu endereço.
Evando Marinho Salim – RJ

Abaixo a guerra entre irmãos!
Plantemos a paz somente.
– Quem tem sementes nas mãos
não tem granadas na mente.
Flávio Stefani – RS

Nosso casebre é de palha,
de pau a pique a parede.
O amor que aqui se agasalha
dorme comigo na rede!
Francisco Garcia – RN

O bom Deus, na sua ânsia
em ser justo, Ele predisse:
– Dou sorriso para a infância
o saber dou à velhice!
Francisco Pessoa – CE

Caíste, amigo? Ergue o peito.
Esconde o pranto. Levanta!
E’ ao cair do seu leito
que o rio mais forte canta.
Gilvan Carneiro da Silva – RJ

Meus lábios apaixonados
bebem o orvalho dos teus,
desses teus lábios molhados
que sonham com os lábios meus!
Gislaine Canales – SC

As rosas, como as estrelas,
Deus semeou para ti;
assim saberás, ao vê-las,
que Ele passou por aqui.
Héber Salvador de Lima – GO

Tornou-se a vida um aprisco
porquanto Deus assim quis,
enviando ao mundo Francisco,
o cordeirinho de Assis.
Humberto Del Maestro – ES

Seria a vida mais doce
e as dores bem mais amenas,
se toda lágrima fosse
um pingo de orvalho apenas...
Jaime Pina da Silveira – SP

Que tu estejas presente,
junto a mim, é o que desejo,
inda que seja somente
o tempo exato de um beijo!
Jeanette De Cnop – PR

Comprimido pelo tédio,
teu elixir foi meu mal.
És para mim, do remédio,
o efeito colateral.
J. B. Xavier de Oliveira – SP

Bendito o irmão que na roça
puxa a enxada e planta o grão,
tirando da terra a nossa
diária alimentação.
Jorge Fregadolli – PR

Tanta gente em si perdida
entre sombras se escondendo.
Cada dia é outra vida
que em disfarces vai morrendo…
José Feldman – PR

Uma das melhores formas de aprender a fazer boas trovas
é ler, tanto quanto possível, as trovas dos demais autores.

Deus sabe, mas não diz onde
se encontra a chave perdida
do mistério que se esconde
no lado oposto da vida.
José Lucas de Barros – RN

No meu livro de amarguras
desta vida “pós-você”,
há páginas tão escuras,
que nem a saudade lê.
José Ouverney – SP

O sonho que idealizo
tem na sua imensidade
o tamanho do sorriso
de quem mata uma saudade!
José Messias Braz – MG

Enquanto a chuva, lá fora,
escorre pela vidraça,
choro meu pranto, que embora
passando a chuva, não passa.
Laérson Quaresma – SP

Do simples pó eu procedo,
sei que a ele hei de voltar;
a vida não tem segredo:
é um eterno retomar.
Luiz Carlos Abritta – MG

Debruçada sobre o berço
do seu querido filhinho,
busca a mãe, com o seu terço,
indicar-lhe um bom caminho.
Luiz Hélio Friedrich – PR

Nunca mostres apatia
diante da luta na vida,
mas brinda com simpatia
e a inércia será vencida!
Mª Luíza Walendowski – SC

Entre um trovador e um santo, / que diferença hei de achar? /
Um reza a Deus no seu canto, / outro canta em seu rezar. (Brasil dos Reis)

Quem entra em meu coração
fica lá por toda a vida.
Ele é igual a um alçapão:
não tem porta de saída!
Maria Madalena Ferreira – RJ

Senhor: um medo infinito
ao ter que julgar me assusta,
premida pelo conflito
entre ser boa e ser justa!
Maria Nascimento – RJ

Há quem fale de mulher
com menosprezo profundo,
sem mesmo pensar, sequer,
em quem o trouxe a este mundo.
Mª Thereza Cavalheiro – SP

No adeus da tua partida
meu coração, infeliz,
ganhou enorme ferida
e não parou... por um triz!
Maurício Friedrich – PR

Xeroquei a sua imagem
e guardei na minha mente;
sempre na minha abordagem
é você que está presente.
Neiva Fernandes – RJ

Sei que é bom mudar o rumo
dos meus passos na jornada...
Mas só achamos o rumo
no final da caminhada.
Olga Agulhon – PR

No jardim da minha vida,
um perfume sobressai:
o que lembra a despedida
de um amor que não se esvai...
Olivaldo Júnior - SP

Na estação do meu anseio,
nos perdemos de nós dois...
– Não foi o trem que não veio:
fui eu que cheguei depois!...
Pedro Mello – SP

Ao ler uma bela trova / depois que pronta ficou, / quem calcula
a dura prova / por que o poeta passou? (J. G. de Araújo Jorge)

A tristeza em minha casa
está num quarto vazio:
de dia a saudade abrasa,
à noite mata de frio.
Roberto Acruche – RJ

Um coração congelado
pega fogo de repente,
quando o amor, fósforo alado,
risca faíscas na gente!
Roza de Oliveira – PR

Mulher de rara beleza
não deve, jamais, pintar-se,
pois obra da natureza
não necessita disfarce.
Ruth Farah – RJ

O chão batido,... a porteira,...
o teu semblante... e o destino...
são os marcos da fronteira
entre a saudade... e um menino!
Sérgio Ferreira da Silva – SP

Ante os golpes do destino
jamais curve sua fronte.
Olhe o pinheiro, menino,
tão altivo no horizonte !...
Sônia Ditzel Martello – PR

O parque reflete os brilhos
oriundos de mil cores,
das sementes em vidrilhos,
tecendo a colcha de flores.
Vanda Alves da Silva – PR

É tão vazia a paisagem,
e nem um vulto se vê...
Mas, sem ver qualquer imagem,
consigo enxergar você!
Vanda Fagundes Queiroz – PR

Ponha no cálice o vinho;
no seu coração, amor.
Toque a vida com carinho,
como a abelha toca a flor.
Vidal Idony Stockler – PR

Dizia o bom Luiz Otávio, / e ao dizê-lo ele sorria: /
– Solte o talento, destrave-o, / faça uma trova por dia! (aaa)

Visite: www.falandodetrova.com.br

Fonte:
Revista enviada por Assis

Ialmar Pio Schneider (Dia do Blog)


– 31 de agosto – Soneto Hendecassílabo

Salve o Dia do Blog que se comemora
em 31 de agosto no mundo inteiro;
eu tenho imenso prazer em ser blogueiro
e mensagens enviar a qualquer hora...

Bem sei que ele é o mais fiel companheiro
para quem ama ou o abandono deplora,
e leva os sentimentos espaço afora,
sempre útil, prestimoso e verdadeiro.

Diversas crônicas, contos e poesias,
publicamos em suas páginas nobres;
todavia, além de tudo, é um calendário

em que seguimos marcando nossos dias,
quer sejamos ricos, quer sejamos pobres,
representa um democrático diário.

31 de agosto de 2011

Fonte:
Texto enviado pelo autor

terça-feira, 30 de agosto de 2011

A. A. de Assis (Trovas Ecológicas) - 7


Fonte da Imagem = http://alucard.weebly.com/

Rafael Castellar (Carta Ao Meu Eu-Passado)


Caro Eu-Passado,

Não é por falta de interesse e nem por descaso que não pergunto como lhe vão as coisas, mas por muito bem já as saber. Sei também que, por se encontrar em profunda perdição de si, incrédulo de tudo e todos que passam a lhe rondar, inclusive de si mesmo, muito lhe custa a esta carta ler, mas é por ela que lhe trago boas-novas!

Digo-lhe que por aqui as coisas muito têm melhorado, que muitas das nossas dúvidas e dificuldades têm, desde então, se resolvido e novos rumos tomado, diferentes dos que aí está a pensar. Por incrível que possa lhe parecer, e sei que muito lhe parecerá, nossa vida tornou-se novamente iluminada e, de uma forma nova e curiosa, saborosa. Os amanheceres não são mais torturantes e temidos, mas confortáveis e amenos, alguns até muito prazerosos. Os dias têm passado com fluidez e tranquilidade – desprezemos, contudo, aqueles inevitáveis aborrecimentos da vivência coletiva. As noites continuam a serem impacientemente aguardadas, mas não mais pelo refúgio concedido e sim pelo divertimento ou pelo simples relaxamento do lar, nelas sempre contidos. E são as madrugadas que mais me prazem, pois agora, ou nelas chegamos ou por elas passamos descuidados num profundo desmaio regenerador, que sei que há muito não tem.

Confesso que os fantasmas ainda assombram, mas não com a tempestuosidade e vivacidade que você tão bem conhece, mas cá estão e isso não posso e nem devo lhe negar. Mas também confesso que não é de todo mal que, vez ou outra, ainda apareçam. É preciso que algo nos lembre do que fomos e pelo que passamos – e isso eles fazem muito bem, bem até demais, lhe confidencio –, pois o esquecimento é fácil e a ansiedade e a espontaneidade de reviver cegam e ensurdecem. Devemos nos lembrar, eu e você, ao menos assim podemos nos postar matreiros diante do que está por vir, mas sem perder a doçura de viver. E estas são as lembranças que me fizeram perceber que eu, justamente eu, também havia me esquecido de você.

Enfim, lhe escrevo para contar que por aqui os dias estão mais claros, as cores mais vivas e paira a vontade de viver; por isso, aguente firme, ele dependerá de nós. E lembre-se: você não está sozinho, quando as coisas apertarem, olhe para dentro de si e me verá!

São Paulo, 13 de setembro de 2010.

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

Ialmar Pio Schneider (Poema de Amor em Forma de Soneto)


Quero inventar palavras que nunca disse a outra mulher, para falar do amor que despontou, enfim, em nossa vida num momento qualquer e veio transformar nossos destinos assim...

Quero inventar palavras que te agradem e sintas por mim tudo o que teu desejo de sensação romântica puder, enquanto eternamente tua paixão me quiser...
E que nosso bem-querer continue até o fim...

Quero inventar palavras de esperança e ternura que nos permitam uma convivência tranquila embora sabendo que nem tudo são apenas flores.

Mas, se mais tarde nos visitar um pouco de amargura saibamos com discernimento e paciência distingui-la e saber que também faz parte de todos os amores...

Fonte:
Texto enviado pelo autor

Olivaldo Junior (Marias do Brasil)


Sempre é dia de lavar roupa. Sempre há roupa pra lavar. Sempre é hora de um poema desaguar. Junto dele, vai-lhe uma canção de Vanessa da Mata, A força que nunca seca. O poema abaixo é uma homenagem às meninas da Cia. de Teatro Parafernália. Assisti a uma apresentação delas sábado passado. Às lavadeiras da arte, meus poéticos abraços.

Olivaldo Júnior
Moji Guaçu, São Paulo


MARIAS DO BRASIL

Às atrizes da Cia. de Teatro Parafernália Cultural, Andréia, Silvana e
Viviane, pela apresentação da peça
de Almir Pugina, Maria Lavadeira

São “Marias lavadeiras”,
que na beira desse rio
iluminam as ribeiras
que contornam todo rio...

São mulheres brasileiras
que no leito desse rio
imaginam as maneiras
que confortam o Brasil...

São Brasis de benzedeiras,
que na cheia desse rio
dão Antonio às lavadeiras,
às Marias do Brasil!

São Marias brasileiras
que, sem beira pra encostar,
dão razão às corredeiras
que só correm para o mar...

São correntes traiçoeiras
que, sem leito pra sonhar,
iluminam as roseiras
que, amarelas, vão corar...

São coristas lavadeiras
que, sem cheia, vão minguar
uma a uma as companheiras,
lua a lua o seu penar.

São peninhas voadeiras,
corações de amor, ardil,
que “Marias lavadeiras”
lavam mágoas nesse rio.

29/08/2011

Fonte:
Texto e imagem enviados pelo autor

Bernardo Guimarães (O Nariz Perante os Poetas)


Cantem outros os olhos, os cabelos
E mil cousas gentis
Das belas suas: eu de minha amada
Cantar quero o nariz.

Não sei que fado mísero e mesquinho
É este do nariz,
Que poeta nenhum em prosa ou verso
Cantá-lo jamais quis.

Os dentes são pérolas,
Os lábios rubis,
As tranças lustrosas
São laços sutis
Que prendem, que enleiam
Amante feliz;
É colo de garça
A nívea cerviz;
Porém ninguém diz
O que é o nariz.

(As faces são tintas
De rosa e de liz,
Ou já têm de jambo
Mimoso matiz;
São cor de safira
Os olhos gentis
E a cor do nariz
Ninguém vo-la diz.)ii

Beija-se os cabelos,
E os olhos belos,
E a boca mimosa,
E a face de rosa
De fresco matiz;
E nem um só beijo
Fica de sobejo
P’ro pobre nariz;
Ai! pobre nariz,
És bem infeliz!

Entretanto, — notai a sem-razão
Do mundo, injusto e vão: —
Entretanto o nariz é do semblante
O ponto culminante;
No meio das demais feições do rosto
Erguido é o seu posto,
Bem como um trono, e acima dessa gente
Eleva-se eminente.

Trabalham sempre os olhos; mais ainda
A boca, o queixo, os dentes;
E — míseros plebeus — vão exercendo
Ofícios diferentes.

Mas o nariz, fidalgo de bom gosto,
Desliza brandamente
Vida voluptuosa entre as delícias
De um doce far-niente.

Sultão feliz, em seu divã sentado
A respirar perfumes,
De bem-aventurado ócio gozando,
Não tem inveja aos numes.

Para ele produz o rico Oriente
O cedro, a mirra, o incenso;
Para ele meiga Flora de seus cofres
Verte o tesouro imenso.

Amante fiel sua, a mansa aragem
As asas meneando
Anda p’ra ele nos vergéis vizinhos
Aromas apanhando.

E tu, pobre nariz, sofres o injusto
Silêncio dos poetas?
Sofres calado? não tocaste ainda
Da paciência as metas?

Nariz, nariz, já é tempo
De ecoar o teu queixume;
Pois, se não há poesia
Que não tenha o seu perfume,
Em que o poeta às mãos cheias
Os aromas não arrume,
Por que razão os poetas,
Por que do nariz não falam,
Do nariz, p’ra quem somente
Esses perfumes se exalam?

Onde, pois, ingratos vates,
Acharíeis as fragrâncias,
Os balsâmicos odores,
De que encheis vossas estâncias,
Os eflúvios, os aromas
Que nos versos espargis;
Onde acharíeis perfume,
Se não houvesse nariz?
Ó vós, que ao nariz negais
Os foros de fidalguia,
Sabei, que se por um erro
Não há nariz na poesia,
É por seu fado infeliz,
Mas não é porque não haja
Poesia no nariz.

Atenção pois aos sons de minha lira,
Vós todos, que me ouvis,
De minha bem-amada em versos d’ouro
Cantar quero o nariz.

O nariz de meu bem é como... oh! céus!...
É como o quê? por mais que lide e sue,
Nem uma só asneira!...
Que esta musa está hoje uma toupeira.

Nem uma idéia
Me sai do casco!...
Ó miserando,
Triste fiasco!!

Se bem me lembra, a Bíblia em qualquer parte
Certo nariz ao Líbano compara;iii
Se tal era o nariz,
De que tamanho não seria a cara?!...

E ai de mim! desgraçado,
Se o meu doce bem-amado
Vê seu nariz comparado
A uma erguida montanha:
Com razão e sem tardança,
Com rigores e esquivança,
Tomará cruel vingança
Por essa injúria tamanha.

Pois bem!... Vou arrojar-me pelo vago
Dessas comparações que a trouxe-mouxe
Do romantismo o gênio cá nos trouxe,
Que p’ra todas as cousas vão servindo;
E à fantasia as rédeas sacudindo,
Irei, bem como um cego,
Nas ondas me atirar do vasto pego,
Que as românticas musas desenvoltas
Costumam navegar a velas soltas.

E assim como o coração,
Sem ter corda, nem cravelha,
Na linguagem dos poetas
A uma harpa se assemelha;
Como as mãos de alva donzela
Parecem cestos de rosas,
E as roupas as mais espessas
São em verso vaporosas;

E o corpo de esbelta virgem
Tem feitio de coqueiro,
E só com um beijo se quebra
De tão franzino e ligeiro;

E como os olhos são flechas,
Que os corações vão varando;
E outras vezes são flautas
Que de noite vão cantando;

P’ra rematar tanta peta
O nariz será trombeta...

Trombeta o meu nariz?!! (ouço-a bradando)
Pois meu nariz é trombeta?...
Oh! não mais, Sr. poeta,
Com meu nariz s’intrometa.

Perdão por esta vez, perdão, senhora!
Eis nova inspiração me assalta agora,
E em honra ao teu nariz
Dos lábios me arrebenta em chafariz:

O teu nariz, doce amada,
É um castelo de amor,
Pelas mãos das próprias graças
Fabricado com primor.

As suas ventas estreitas
São como duas seteiras,
Donde ele oculto dispara
Agudas flechas certeiras.

Em que sítios te pus, amor, coitado!
Meu Deus, em que perigo?
Se a ninfa espirra, pelos ares saltas,
E em terra dás contigo.

Estou já cansado, desisto da empresa,
Em versos mimosos cantar-te bem quis;
Mas não o consente destino perverso,
Que fez-te infeliz;
Está decidido, — não cabes em verso,
Rebelde nariz.

E hoje tu deves
Te dar por feliz
Se estes versinhos
Brincando te fiz.

Fonte:
Bernardo Guimarães. Humorísticos e irônicos. 1884. disponível em www.dominiopublico.gov.br

Bernardo Guimarães (1825 – 1884)


Bernardo Joaquim da Silva Guimarães, nasceu em Ouro Preto, Minas Gerais, em 15 de agosto de 1825. Filho de João Joaquim da Silva Guimarães e Constança Beatriz de Oliveira, foi magistrado, jornalista, professor, romancista e poeta. É o patrono da Cadeira nº 5 da "Academia Brasileira de Letras", por escolha de Raimundo Correia.

Dos seus quatro anos, até um momento da adolescência não fixado pelos biógrafos, viveu em Uberaba e Campo Belo, impregnando-se das paisagens que descreveria com predileção nos seus romances. Antes dos 17 anos, estava de volta a Ouro Preto, onde terminou os preparatórios, matriculando-se tardiamente, em 1847, na Faculdade de Direito de São Paulo, onde se tornou amigo íntimo e inseparável de Álvares de Azevedo e Aureliano Lessa, com os quais chegou a projetar a publicação de uma obra que se chamaria Três Liras. Fundaram os três, com outros estudantes, a "Sociedade Epicuréia", a que se atribuíram "coisas fantás-ticas", que ganharam fama no meio paulistano. Sempre mau estudante, se bacharelou em 2ª época no começo de 1852, depois de um qüinqüênio ruidoso de troças, patuscadas, orgias e irreverência. Já então o distinguiam pela sua indisciplina, pelas alternativas de bom humor e melancolia, pelo coração bondoso e completa generosidade. Juiz municipal de Catalão, Província de Goiás, em 1852-1854 e 1861-1863, foi, de permeio, jornalista no Rio, de 1858 a 1860 ou 61.

Magistrado descuidado e humano, promoveu no segundo período de judicatura um júri sumário para libertar os presos, pessimamente instalados, e, intervindo motivos de conflito com o presidente da província, sofreu processo, do qual saiu triunfante. Depois de nova estadia no Rio, fixou-se a partir de 1866 na cidade natal, onde casou no ano seguinte e foi nomeado professor de retórica e poética no Liceu Mineiro. Casou-se no ano seguinte com Teresa Maria Gomes, tendo posteriormente, oito filhos. Uma das duas filhas foi Constança, falecida aos 17 anos, quando noiva de seu primo, o poeta Alphonsus de Guimaraens, que a imortalizou na literatura como a que "se morreu fulgente e fria".

Extinta a cadeira, foi nomeado em 1873, professor de latim e francês em Queluz, atual Lafayette, onde morou uns poucos anos. Também esta cadeira foi extinta, e Basílio de Magalhães sugere que o motivo deve ter sido, em ambos os casos, ineficácia e pouca assiduidade do poeta. Em 1875 publicou o romance que melhor o situaria na campanha abolicionista e viria a ser a mais popular das suas obras: A Escrava Isaura. Dedicando-se inteiramente à literatura, escreveu ainda quatro romances e mais duas coletâneas de versos. A visita de Dom Pedro II à Minas Gerais, em 1881, deu motivo a que o Imperador prestasse expressiva homenagem a Bernardo Guimarães, a quem admirava. Voltando a Ouro Preto, ali viveu até a morte, em 10 de março de 1884.

Embora tenha começado a escrever ficção nos fins do decênio de 50, e tenha feito poesias até os últimos anos, como qualidade a sua melhor produção poética vai até o decênio de 1860; a partir daí, realiza-se de preferência na ficção. Estreando com os Cantos da Solidão em 1852, reúne-os com outros em 1865 nas Poesias. De 1866 é a publicação parcelada d'O Ermitão do Muquém (posto em livro em 69, mas redigido em 58), seguido por Lendas e Romances, 1871; O Garimpeiro, 1872; Lendas e tradições da Província de Minas Gerais (incluindo A Filha do Fazendeiro) e O Seminarista, 1872; O Indio Afonso, 1873; Maurício, 1877; A Ilha Maldita e O Pão de Ouro, 1879; Rosaura, a Enjeitada, 1883. Publicara mais duas coletâneas de versos: Novas Poesias, 1876, e Folhas de Outono, 1883. Postumamente surgiram o romance O Bandido do Rio das Mortes, 1904, e o drama A Voz do Pajé, 1914. Deve-se registrar além disso, uma saborosa produção de poesia obscena, cuja maioria se teria perdido, sendo algumas recolhidas em folheto.

Obras Publicadas

1852 Cantos da Solidão
1864 O Ermitão de Munquém
1865 Poesias
1867 Inspirações da Tarde
1871 Lendas e Romances
1872 O Seminarista
1872 História e Tradições da Província de Minas Gerais
1872 O Garimpeiro
1873 O Índio Afonso
1875 A Escrava Isaura
1876 Novas Poesias
1877 Maurício ou Os Paulistas em São João d'El Rei
1879 A Ilha Maldita e O Pão de Ouro
1883 Folhas de Outono
1883 Rosaura, a Enjeitada

Fontes:
www.sitedoescritor.com.br
www.spectrumgothic.com.br

Ialmar Pio Schneider (O Poeta e o Pelicano)


Estava eu a matutar no que iria escrever nestas horas monótonas de minha vida, quando me deparei com uma poesia da época romântica francesa que traduzimos na adolescência, ao cursarmos o Científico. Lembro-me que o professor de francês no Colégio Nossa Senhora da Conceição de Passo Fundo – RS, era o irmão marista Érico, cujo apelido carinhoso era “Foquinha”, e que ao ler as poesias em voz alta ele se empolgava transmitindo uma emoção ímpar e que todos ouvíamos em silêncio, no original desta língua tão melódica quanto sonora, no meu mero entendimento. O livro em que estudávamos era o Cours de Français, de Augusto R. Rainha e José A. Gonçalves, e nas páginas 35, 36 e 37, constava a minibiografia do autor e a poesia a que me refiro, como segue:

“Época Romântica – A Poesia – MUSSET (1810-1957) –

1 – Alfred de Musset nasceu em Paris, onde após excelentes estudos, partiu do Cenáculo e se engajou no romantismo. Entretanto, não tardou a retomar uma independência da qual era cioso (ciumento). Levou, durante algum tempo, uma vida licenciosa que lhe não deixa senão remorso e desencantamento. Tornou-se então um poeta apaixonado. É o período de sua grande poesia.

Este poeta tão grande e tão maravilhoso, é Enfant du siècle (Filho do século), como ele gostava de se chamar a si mesmo, e morreu na idade de quarenta e sete anos.

2 – Suas Obras Líricas estão reunidas em dois volumes: Primeiras Poesias (Contos da Espanha e da Itália); Novas Poesias (as Noites), a melhor parte da obra do poeta.

3 – Musset é antes de tudo o “poeta do amor”. É seu princípio que “toda a obra literária consiste em abrir seu coração e a penetrar no coração do leitor”. “Ah ! bate de encontro ao teu coração: é lá que está o gênio” – escreveu. É um poeta todo pessoal (original), não gostava de imitar: “Mon verre n’est pas grand, mais je bois dans mon verre.” (Meu copo não é grande, mas eu bebo no meu copo).”

Após este prólogo tão interessante quanto necessário, a meu ver, em tradução minha adaptada, vamos à poesia:

“O PELICANO

Qualquer preocupação que sofras em tua vida,
Oh! deixa dilatar-se, esta santa ferida
Que os negros serafins têm cavado em teu peito
Nada nos faz tão grandes como um sofrer perfeito.
Mas, por estar atento, não creias, ó poeta,
Que no Mundo a tua voz deva ficar quieta !
Os mais pungentes são os cânticos mais belos,
E eu conheço imortais que são tristes anelos.
Quando o pelicano, em longa viagem solta,
Nas brumas da tardinha aos seus caniços volta,
Famintos filhos seus caminham sobre a praia,
Vendo-o esbater-se ao longe em cima às plúmbeas águas
Já crendo em apanhar e repartir a presa
Eles correm ao pai com gritos de alegrias
Erguendo os bicos sobre as gargantas frias.
Ele, galgando a passos lentos uma rocha elevada,
Em sua asa pendente abrigando a ninhada,
Pescador melancólico, ele olha os céus.
O sangue corre em golfadas em seu peito aberto;
Em vão dos mares escavou a profundeza:
O Oceano estava vazio e a praia deserta;
Por todo alimento ele traz seu coração.
Sombrio e silencioso, estendido sobre a pedra,
Repartindo aos seus filhos suas entranhas de pai,
No seu amor sublime embala a sua dor,
E, olhando escorrer seu peito a sangrar,
Sobre seu festim de morte ele se prostra e cambaleia,
Ébrio de volúpia, de ternura e de horror.
Mas às vezes, no meio do divino sacrifício,
Fatigado de morrer em tão longo suplício,
Ele acredita que os filhos o deixem vivendo;
Então soergue-se, abre sua asa ao vento,
E, ferindo-se o coração com um grito selvagem,
Solta dentro da noite um tão fúnebre adeus,
Que os pássaros dos mares desertam a beira-mar,
E que o viajor demorado na praia,
Sentindo passar a morte, se recomenda a Deus.”
(La Nuit de Mai (1835).

Ao findar o mês de maio em pleno outono, quis prestar uma homenagem in memoriam a este inigualável poeta romântico francês que com seu poema( inserido em Noites de Maio), demonstrou até onde vai o amor paterno e materno, sacrificando sua própria vida para que seus filhotes continuem a viver. É uma lição divina da natureza.

Fontes:
Texto enviado pelo autor
Imagem = http://www.iguinho.ig.com.br

Hermoclydes S. Franco (Algumas Trovas Esquecidas)


A vagar pela cidade,
Desde os tempos de menino,
Procuro a felicidade
Que mora além do destino!...

Ser mãe é trabalho insano
Que tal carinho irradia
E te faz, por todo o ano,
Ser a mãe de cada dia!

Foi tanta emoção sentida,
Foram mil sonhos sonhados,
Que atravessamos a vida
Como eternos namorados...

Para ser livre e ufano,
Ter poder, ser sempre um bravo,
Na verdade o ser humano
Da lei deve ser escravo...

Plangem sinos, é Natal,
Festa em nossos corações...
O Deus-Menino, imortal,
É o centro das emoções...

O fulgor da Estrela-Guia
Viu nascer em Nazaré:
Para o mundo, novo dia;
Para os homens, nova Fé!...

Um lençol verde de paz...
Um rio... Uma catarata...
Lindas flores... animais...
Sons do silêncio, eis a mata!... (Sem verbos)

Tu foste, na minha vida,
Tempestade que passou...
Neblina descolorida
Que alguma nuvem deixou!...

Versejando à luz difusa,
Se o sentimento me inspira,
Eu te elejo a doce musa
Que há de tanger minha lira!...

Nas mensagens de prazer,
Carteiro, nas tarde mansas,
Tens o condão de trazer
O renascer de esperanças...

Em privação de sentidos,
Em teus braços perfumados,
Sonhei sonhos não vividos...
Vivi sonhos não sonhados...

Abraça o tempo que corre,
Na rapidez em que avança,
Que um bom momento não morre,
Acaba sempre em lembrança!

Mãe! Flor de amor e bondade,
Nem precisa rima rica,
Na poesia de saudade
Da lembrança que nos fica!

Escondendo tal carinho
Em seu semblante sisudo,
Meu PAI me pôs no caminho
Preparado para tudo!...

Não julgues a alheia sorte
Pelo brilho do brasão:
A luz que brilha mais forte
Tem mais curta duração...

MEMÓRIA... Forja de sonhos,
Arquivo de sentimentos,
Relicário onde os tristonhos
Escondem seus bons momentos...

Noite de Paz e de Amor!
Noite de sonho e de luz...
Veio ao mundo o Salvador,
O Deus-Menino, Jesus!...

A tempestade aparente
Do teu gênio, por magia,
Transformou-se de repente,
Ao meu beijo, em calmaria!

Terminado o encantamento,
Só restou a indiferença
De um calado sofrimento
Marcando sempre presença!

Minha fé a grande força
Que trago desde criança,
Não deixa que a vida torça
O meu rumo de esperança

Não tive coragem, creia,
De fugir nesta revolta...
Por isso é que, volta e meia,
Vivo dando a meia-volta!...

Na luta pela conquista
Do melhor que a via encerra,
Sou um simples pacifista:
“Faço o amor, não faço a guerra”.

A emoção é bailarina,
Num palco azul de ilusões...
Se Deus a fez feminina,
Tinha lá Suas razões.

Com efeitos especiais,
Meus sonhos mostram, em tela,
Os teus encantos reais
Na mais bonita aquarela!...

A inspiração é uma fada,
Com varinha de condão...
Quando toca a musa, amada,
Há poesia em profusão!...

Pelo teu corpo, em viagens
De sonhos e encantamentos,
Minhas mãos passam mensagens
De indescritíveis momentos...

Trago tantas emoções
Nas minhas canções serenas
Que, quando canto as canções,
Vivo de emoções, apenas!...

Para espantar minha dor,
Eu passo a vida a cantar,
Sabendo que mal de amor
Ninguém consegue espantar...

Lobo máu, o vento, ao léu,
Se transforma em furacão
Ao ver, nas nuvens do céu,
Carneirinhos de algodão!...

A vida é a fada-madrinha
Que, ao ver nosso intenso flerte,
Deu-me, em toque de varinha,
O prazer de conhecer-te!

Aquele que a paz expande
Tem a luz, bem definida,
Que se transforma no grande
Prazer de viver a vida!

Na vida, estrada de sonhos,
Conheci divinos seres
Que me ensinaram, risonhos,
Segredos de mil prazeres!...

Vem amor, morar comigo,
Que eu te mostro o que é viver
E, em longa noite contigo,
Eu te ensino o que é prazer...

O triste da caminhada,
Na longa estrada da vida,
É ver a fome estampada
Em tanta gente excluída!

Nossas sombras, abraçadas,
Sob a luz do luar risonho,
Atravessam madrugadas
Em busca do mesmo sonho!

Seria o grande momento,
Para toda a humanidade,
Se o bom Deus mandasse o vento
Varrer do mundo a maldade...

Não há sonho mais bonito
Nem mentira mais falaz
Do que o amor infinito
Que a vida jamais nos traz!

Teu amor é o suave açoite
Que eu desejo, em calmaria:
Como o dia busca a noite...
Como a noite busca o dia!

No meu sonho, em bela imagem,
Neste meu destino incerto,
Seu recado foi miragem
E apagou-se em meu deserto!...

Fonte:
Trovas enviadas pelo autor

Jean de La Fontaine (Fábulas) A Raposa e a Cegonha

Ilustração de Gustave Doré
Quis a raposa matreira,
Que excede a todas na ronha,
Lá por piques de outro tempo,
Pregar um ópio à cegonha.

Topando-a, lhe diz: "comadre,
Tenho amanhã belas migas,
E eu nada como com gosto
Sem convidar as amigas.

De lá ir jantar comigo
Quero que tenha a bondade;
Vá em jejum porque pode
Tirar-lhe o almoço a vontade."

Agradeceu-lhe a cegonha
Uma oferenda tão singela,
E contava que teria
Uma grande fartadela.

Ao sítio aprazado foi,
Era meio-dia em ponto,
E com efeito a raposa
Já tinha o banquete pronto.

Espalhadas num lajedo
Pôs as migas do jantar,
E à cegonha diz: "comadre,
Aqui as tenho a esfriar.

Creio que são muito boas -
Sans façon - vamos a elas."
Eis logo chupa metade
Nas primeiras lambidelas.

No longo bico a cegonha
Nada podia apanhar;
E a raposa em ar de mofa,
Mamou inteiro o jantar.

Ficando morta de fome,
Não disse nada a cegonha;
Mas logo jurou vingar-se
Daquela pouca vergonha.

E afetando ser-lhe grata,
Disse: "comadre, eu a instigo
A dar-me o gosto amanhã
De ir também jantar comigo."

A raposa labisqueira
Na cegonha se fiou,
E ao convite, às horas dadas,
No outro dia não faltou.

Uma botija com papas
Pronta a cegonha lhe tinha;
E diz-lhe: "sem cerimônia,
A elas, comadre minha."

Já pelo estreito gargalo
Comendo, o bico metia;
E a esperta só lambiscava
O que à cegonha caía.

Ela, depois de estar farta,
Lhe disse: "prezada amiga,
Demos mil graças ao céu
Por nos encher a barriga."

A raposa conhecendo
A vingança da cegonha,
Safou-se de orelha baixa,
Com mais fome que vergonha.

Enganadores nocivos,
Aprendei esta lição.
Tramas com tramas se pagam,
Que é pena de Talião.

Se quase sempre os que iludem
Sem que os iludam não passam,
Nunca ninguém faça aos outros
O que não quer que lhe façam.

Fonte:
La Fontaine. Fábulas. SP: Martin Claret, 2005.

Monteiro Lobato (O Saci) XIX – Lobisomem; XX – Mula sem Cabeça

XIX - Lobisomem

Nem bem acabara o saci de pronunciar estas palavras e Pedrinho notou grande rebuliço entre os sacizinhos. Parece que também pressentiram qualquer coisa, pois largaram das brincadeiras e desapareceram na floresta, como por encanto.

Era tempo. O mato começou a estalar como se algum animalão por ele viesse rompendo, e por fim surgiu na clareira a carantonha sinistra de um lobisomem. Parou, farejou o ar como se estivesse sentindo cheiro de carne humana. O saci, porém, tivera a precaução de emitir um certo cheirinho a enxofre, e isso iludiu o lobisomem, que continuou o seu caminho e passou. O cheiro a enxofre disfarça o da carne humana, explicou mais tarde o saci.

Apesar do medo que sentira, Pedrinho pôde notar que o monstro tinha a pele virada, isto é, o pêlo para dentro e a carne para fora — uma coisa horrível! No mais, era um perfeito lobo, embora de dimensões muito mais avantajadas.

Assim que o lobisomem deixou a clareira, o menino respirou um ah! de alívio e pediu ao saci que lhe contasse alguma coisa desses monstros.

— Dizem — respondeu o saci — que quando uma mulher tem sete filhos machos, o sétimo vira lobisomem na noite das sextas-feiras. Sai então pelos campos, invade os galinheiros (onde come um produto das galinhas que não é o ovo) e também assalta e devora os cães e as crianças que encontra pelo caminho. Se alguém ataca um lobisomem e corta-lhe uma das patas, ele vira imediatamente no homem que é — e esse homem fica por toda a vida aleijado do membro correspondente à pata cortada.

Pedrinho não resistiu à tentação de ver de perto as pegadas do monstro e apesar das advertências do saci saiu do oco para examiná-las à luz de um vaga-lume. Mas não teve tempo. Assim que saiu do oco, ouviu um estranho rumor ao longe, seguido do agudo assobio do saci chamando-o. Voltou precipitadamente.

— Que há? — indagou.

O saci, que também parecia amedrontado, puxou-o bem para o fundo do esconderijo, murmurando: — A mula-sem-cabeça!

XX – A mula-sem-cabeça

A mula-sem-cabeça!

Pedrinho estremeceu. Nenhum duende das florestas o apavorava mais que esse estranho e incompreensível monstro, a mula-sem-cabeça que vomita jogo pelas ventas! Muitas histórias a seu respeito tinha ouvido aos caboclos do sertão e aos negros velhos, embora Dona Benta vivesse dizendo que tudo não passava de crendice.

A galopada aproximava-se; já se ouvia o estalar dos arbustos que em seu desenfreado galopar a mula-sem-cabeça vinha quebrando. Súbito, parou.

— Vai mudar de rumo! — murmurou o saci, com cara mais alegre.

E de fato foi assim. A mula retomou a galopada, mas em outra direção, embora passasse por perto não chegou ao alcance dos olhos do menino.

— Que pena! — exclamou ele. — Tanta vontade que eu tinha de conhecer esse monstro...

— Que pena? — repetiu o saci. — Que felicidade, deve você dizer! A mula-sem-cabeça é o mais sinistro duende que há no mundo; tem o dom de transtornar a razão de todos que a vêem. Por isso é que tive medo — não por mim, mas por você...

— Mas qual é a origem dessa mula?

— Uma história muito velha. Dizem que antigamente houve um rei cuja esposa tinha o misterioso hábito de passear certas noites pelo cemitério, não consentindo que ninguém a acompanhasse. O rei incomodou-se com isso e certa noite resolveu segui-la sem que ela o percebesse. No cemitério deu com uma coisa horrenda: a rainha estava comendo o cadáver de uma criança enterrada na véspera e que por suas próprias mãos cheias de anéis havia desenterrado! O rei deu um grito. Vendo-se pilhada, a rainha deu outro grito ainda maior — e imediatamente virou nessa mula-sem-cabeça, que desde aquele momento nunca mais parou de galopar pelo mundo, sempre vomitando fogo pelas ventas.

E foi assim que Pedrinho perdeu a única oportunidade que teve de ficar conhecendo pessoalmente o estranho monstro que tanto impressiona a imaginação dos nossos sertanejos.

Ela corre sem cessar, espalhando a loucura por onde passa. Não existe criatura, seja bicho do mato ou gente, que não prefira ver o Diabo em pessoa a ver a tal mula-sem-cabeça. É horrenda!

— Mas como será que vomita fogo pelas ventas, se as ventas estão na cabeça e ela não tem cabeça?

— Também não entendo; mas é assim — disse o saci.
____________
continua... XXI - Más notícias ; XXII – Chegam ao sítio
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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Viagem ao Céu & O Saci. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. II. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 319)


Uma Trova Nacional

O vento, com peraltice,
leva folhas pelo espaço.
Que bom se um dia o sentisse
levando as preces que faço...
–RUTH FARÁH NASCIF/RJ–

Uma Trova Potiguar

Se eu me for, antes de ti...
Levarei, dos nossos traços,
cada noite que vivi
na cortina... dos teus braços.
–MARA MELINNI/RN–

Uma Trova Premiada

2000 - Niterói/RJ
Tema: DELÍRIO - M/E.

Nos delírios desse amor
de saudades desiguais,
eu vivo só de favor
de saber como tu vais!
–EDUARDO A. O. TOLEDO/MG–

Uma Trova de Ademar

Há tempo para as agruras
de um viver que se maldiz,
e há tempo para as venturas,
na busca de ser feliz!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Ah, coração!...não palpites
tão forte que o espaço é estreito,
e esta mágoa, sem limites,
tem que caber no meu peito!
–WALDIR NEVES/RJ–

Simplesmente Poesia

Receita de Longevidade
–JOÃO JUSTINIANO DA FONSECA/BA–

Levanta a cabeça e segue
olhando firme na frente.
Não há bicho que te pegue
se tens firmeza de mente.

Não digas que te fraqueja
a resistência na luta.
Maior que seja peleja
jamais penses na cicuta.

Nunca olhes para traz,
olha à frente, sê capaz
de pensar que o mal passou.

Com certeza hás de chegar
aos oitenta sem cansar
igual assim como estou.

Estrofe do Dia

Roberto é rei da canção
do barro, foi Vitalino,
do cangaço, é Virgulino
o famoso lampião,
Gonzaga, rei do baião
Brasil foi rei do café,
do futebol foi Pelé,
pinto foi rei do repente,
existe um rei entre a gente:
Patativa do Assaré.
–OLIVEIRA DE PANELAS/PE–

Soneto do Dia

Sessenta Musas
–ROGACIANO LEITE/PE–

Respondam-me, afinal, Nilda, Suzete,
Nenen, Guiomar, Eulália, Mozarina,
Célia, Dora, Socorro, Amilcarina,
Gilca, Norma, Rosália, Dulce, Ivete;

Creusa, Ivone, Ceci, Lourdes, Arlete,
Nisa, Ofélia, Masé, Lindalva, Nina,
Lúcia, Rita, Marli, Sônia, Marina,
Vilma, Zezé, Luci, Neusa, Ivonete;

Clarisse, Adélia, Auri, Zélia, Marleide,
Anita, Zilma, Edi, Laurita, Neide,
Maura, Carmen, Mimi, Olga, Ilma, Talma;

Denise, Helena, Itália, Hilda, Helenice,
Maristela, Zizi, Beatriz e Alice...
- Que é que vocês fizeram de minha alma?

Fonte:
Textos e imagem enviados pelo Autor

Patativa de Assaré (O Sabiá e o Gavião)

Imagem por Ivan Simas
Eu nunca falei à toa.
Sou um cabôco rocêro,
Que sempre das coisa boa
Eu tive um certo tempero.
Não falo mal de ninguém,
Mas vejo que o mundo tem
Gente que não sabe amá,
Não sabe fazê carinho,
Não qué bem a passarinho,
Não gosta dos animá.

Já eu sou bem deferente.
A coisa mió que eu acho
É num dia munto quente
Eu i me sentá debaxo
De um copado juazêro,
Prá escutá prazentêro
Os passarinho cantá,
Pois aquela poesia
Tem a mesma melodia
Dos anjo celestiá.

Não há frauta nem piston
Das banda rica e granfina
Pra sê sonoroso e bom
Como o galo de campina,
Quando começa a cantá
Com sua voz naturá,
Onde a inocença se incerra,
Cantando na mesma hora
Que aparece a linda orora
Bejando o rosto da terra.

O sofreu e a patativa
Com o canaro e o campina
Tem canto que me cativa,
Tem musga que me domina,
E inda mais o sabiá,
Que tem premêro lugá,
É o chefe dos serestêro,
Passo nenhum lhe condena,
Ele é dos musgo da pena
O maiô do mundo intêro.

Eu escuto aquilo tudo,
Com grande amô, com carinho,
Mas, às vez, fico sisudo,
Pruquê cronta os passarinho
Tern o gavião maldito,
Que, além de munto esquisito,
Como iguá eu nunca vi,
Esse monstro miserave
É o assarsino das ave
Que canta pra gente uví.

Muntas vez, jogando o bote,
Mais pió de que a serpente,
Leva dos ninho os fiote
Tão lindo e tão inocente.
Eu comparo o gavião
Com esses farão cristão
Do instinto crué e feio,
Que sem ligá gente pobre
Quê fazê papé de nobre
Chupando o suó alêio.

As Escritura não diz,
Mas diz o coração meu:
Deus, o maió dos juiz,
No dia que resorveu
A fazê o sabiá
Do mió materiá
Que havia inriba do chão,
O Diabo, munto inxerido,
Lá num cantinho, escondido,
Também fez o gavião.

De todos que se conhece
Aquele é o passo mais ruim
É tanto que, se eu pudesse,
Já tinha lhe dado fim.
Aquele bicho devia
Vivê preso, noite e dia,
No mais escuro xadrez.
Já que tô de mão na massa,
Vou contá a grande arruaça
Que um gavião já me fez.

Quando eu era pequenino,
Saí um dia a vagá
Pelos mato sem destino,
Cheio de vida a iscutá
A mais subrime beleza
Das musga da natureza
E bem no pé de um serrote
Achei num pé de juá
Um ninho de sabiá
Com dois mimoso fiote.

Eu senti grande alegria,
Vendo os fíote bonito.
Pra mim eles parecia
Dois anjinho do Infinito.
Eu falo sero, não minto.
Achando que aqueles pinto
Era santo, era divino,
Fiz do juazêro igreja
E bejei, como quem bêja
Dois Santo Antõi pequenino.

Eu fiquei tão prazentêro
Que me esqueci de armoçá,
Passei quage o dia intêro
Naquele pé de juá.
Pois quem ama os passarinho,
No dia que incronta um ninho,
Somente nele magina.
Tão grande a demora foi,
Que mamãe (Deus lhe perdoi)
Foi comigo à disciprina.

Meia légua, mais ou meno,
Se medisse, eu sei que dava,
Dali, daquele terreno
Pra paioça onde eu morava.
Porém, eu não tinha medo,
Ia lá sempre em segredo,
Sempre. iscondido, sozinho,
Temendo que argúm minino,
Desses perverso e malino
Mexesse nos passarinho.

Eu mesmo não sei dizê
O quanto eu tava contente
Não me cansava de vê
Aqueles dois inocente.
Quanto mais dia passava,
Mais bonito eles ficava,
Mais maió e mais sabido,
Pois não tava mais pelado,
Os seus corpinho rosado
Já tava tudo vestido.

Mas, tudo na vida passa.
Amanheceu certo dia
O mundo todo sem graça,
Sem graça e sem poesia.
Quarqué pessoa que visse
E um momento refritisse
Nessa sombra de tristeza,
Dava pra ficá pensando
Que arguém tava malinando
Nas coisa da Natureza.

Na copa dos arvoredo,
Passarinho não cantava.
Naquele dia, bem cedo,
Somente a coã mandava
Sua cantiga medonha.
A menhã tava tristonha
Como casa de viúva,
Sem prazê, sem alegria
E de quando em vez, caía
Um sereninho de chuva.

Eu oiava pensativo
Para o lado do Nascente
E não sei por quá motivo
O só nasceu diferente,
Parece que arrependido,
Detrás das nuve, escondido.
E como o cabra zanôio,
Botava bem treiçoêro,
Por detrás dos nevoêro,
Só um pedaço do ôio.

Uns nevoêro cinzento
Ia no espaço correndo.
Tudo naquele momento
Eu oiava e tava vendo,
Sem alegria e sem jeito,
Mas, porém, eu sastifeito,
Sem com nada me importá,
Saí correndo, aos pinote,
E fui repará os fiote
No ninho do sabiá.

Cheguei com munto carinho,
Mas, meu Deus! que grande agôro!
Os dois véio passarinho
Cantava num som de choro.
Uvindo aquele grogeio,
Logo no meu corpo veio
Certo chamego de frio
E subindo bem ligêro
Pr’as gaia do juazêro,
Achei o ninho vazio.

Quage que eu dava um desmaio,
Naquele pé de juá
E lá da ponta de um gaio,
Os dois véio sabiá
Mostrava no triste canto
Uma mistura de pranto,
Num tom penoso e funéro,
Parecendo mãe e pai,
Na hora que o fio vai
Se interrá no cimitéro.

Assistindo àquela cena,
Eu juro pelo Evangéio
Como solucei com pena
Dos dois passarinho véio
E ajudando aquelas ave,
Nesse ato desagradave,
Chorei fora do comum:
Tão grande desgosto tive,
Que o meu coração sensive
Omentou seus baticum.

Os dois passarinho amado
Tivero sorte infeliz,
Pois o gavião marvado
Chegou lá, fez o que quis.
Os dois fiote tragou,
O ninho desmantelou
E lá pras banda do céu,
Depois de devorá tudo,
Sortava o seu grito agudo
Aquele assassino incréu.

E eu com o maiô respeito
E com a suspiração perra,
As mão posta sobre o peito
E os dois juêio na terra,
Com uma dó que consome,
Pedi logo em santo nome
Do nosso Deus Verdadêro,
Que tudo ajuda e castiga:
Espingarda te preciga,
Gavião arruacêro!

Sei que o povo da cidade
Uma idéia inda não fez
Do amô e da caridade
De um coração camponês.
Eu sinto um desgosto imenso
Todo momento que penso
No que fez o gavião.
E em tudo o que mais me espanta
É que era Semana Santa!
Sexta-fêra da Paixão!

Com triste rescordação
Fico pra morrê de pena,
Pensando na ingratidão
Naquela menhã serena
Daquele dia azalado,
Quando eu saí animado
E andei bem meia légua
Pra bejá meus passarinho
E incrontei vazio o ninho!
Gavião fí duma égua!

Fonte:
Portal São Francisco

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

A. A. de Assis (Trovas Ecológicas) - 6


Cornélio Pires (Trovas do Coração)



AFIRMATIVA

Entre aqueles que se amam,
Por a união lhes agrade,
Se maior é a disciplina,
Maior é a felicidade.

ALEGRIA

Um amigo me viu e disse:
_ “Olá, Cornélio! É você? ...
Quanta alegria abraçar,
Amigos de Tietê.”

BENEFICÊNCIA

Caridade que não busca
Ver os outros como estão,
Não promove sindicância,
Nem exige gratidão.

CANDEIA VIVA

Que não se alegrem os maus
Porque a vida é transitória;
Nós todos estamos presos
Na candeia da memória.

CASO TRISTE

Expulsando o pai leproso
Que o buscava, há vários dias,
Tonho caiu e morreu,
Ao descer escadarias.

CRIAÇÃO

Deus criou o homem na terra
À sua imagem Divina
Mas não falou quando é
Que esse trabalho termina.

DESENGANO

Numa palestra serena,
Disse-me o sábio Conrado:
“Desengano que mais doi
É o que vem de um ente amado.”

DESERÇÃO

Abel, rapaz elegante,
Casou-se com Zina Alceu;
A moça teve dois gêmeos,
Abel desapareceu.

DESPEDIDA

Saudade, tanta saudade!...
Quem deixa as provas da vida,
È que sabe como dói
O tempo da despedida!...

DESTAQUE

Quem busca festas e balas,
No destaque do próprio nome
Lembra a aranha: tece e teia,
A teia em que se consome.

DISCIPLINA

Outro amigo me oferece
Um licor de tangerina
Explico: -Agora não posso,
Eu estou em disciplina.

DIVINO REI

Tutor da terra foi Rei
E é sempre Rei, o Amado Jesus,
Teve a coroa de espinhos,
Por trono, o lenho da cruz

ESQUEÇAMOS

Lendo livros ou jornais
Guarda no bem a cabeça,
Esqueçamos qualquer mal
Para que o mal nos esqueça.

ESTAS TROVAS

Estas trovas que escrevo
São de amor e de saudade,
Lembram flores que colhi
No jardim da Amizade

FESTA

Festa é um jardim de alegria,
Flores, quitutes, emblemas,
No entanto, de várias festas,
Saem difíceis problemas.

FILHO E PAI

João, viuvo, foi pedir
Para o filho a mão da Bela,
Mas gostou tanto da moça
Que se fez esposo dela

FINAL

Versos simples de meus sonhos
Ah! queridos sonhos meus!...
Estas provas, finalmente,
São todas de mor a Deus.

GÊMEOS

Léo e Téo eram dois gêmeos
Téo amava Conceição...
Téo no turismo atrasou
Léo quis a noiva do irmão.

GUERRA ANÔNIMA

Um tipo de guerra existe
Que a muitos perturba e estraga,
É a guerra que se mantém
Por dentro da própria casa.

GRANDES EVENTOS

De grandes reuniões,
Seja aqui, seja acolá...
É preciso vigilância
Não se sabe o que virá.

GRATIDÃO

Das grandes forças da vida
À mais pequenina flor,
Tudo canta sobre a terra:
Louvado seja o Senhor!...

HORA DE FÉ

Não sei exaltar, ao certo,
Na força que nos conduz
O excelso apoio de Deus
E a proteção de Jesus

IMPACIÊNCIA

Nos dias de provação
Não te aborreças nem fales
Impaciência é uma brasa
Por cima de nossos males.

LIGAÇÕES

Ligações na vida humana?
Será talvez a mais forte
A novela entre as pessoas
Que prossegue além da morte.

NOVO DIA

Um novo dia aparece,
Temos o beijo solar
E a vida perto nos fala:
“Servir e recomeçar...”

O INIMIGO

O inimigo, muitas vezes,
Quando surge em nossa estrada
É alguém que viveu conosco
Por pessoa muito amada.

O SERVIDOR DE JESUS

Quem ama e serve a Jesus
Seguindo-lhe as diretrizes,
Perdoa aos irmãos errados
E socorre aos infelizes.

ORAÇÃO

Entram em curta oração
Meus sentimentos plebeus,
Agradeço os dons da vida
E peço a bênção de Deus.

ORIGEM DO AMOR

Onde a força que há no amor
É assunto que não me cabe
A origem certa do amor
Somente Deus é que sabe

PERDA

A pessoa quando ama
Acha esta nota na vida,
Quando mostra mais ciúme
Perde a pessoa querida.

PREVISÕES

As previsões nunca faltam
Com suportes de alarido,
Todos, porém, navegamos
No mar do desconhecido

PROBLEMA DA PAZ

Filósofos, cientistas,
Inteligências de luz,
Só nos garantem a paz
Quando unidos a Jesus

PRODÍGIO DO AMOR

Admiro certa mãe
Que tem em si tanto amor
Que a bondade dela própria
Cativou o obsessor.

PROSSEGUE

Servindo ao bem continua,
Espalhando amo e paz,
Do caminho de Jesus
Não se volta para trás.

REALIDADE

Quem se afasta de Jesus
Como sempre tantos vi,
Não muda por própria escolha
Porque não foge de si

RECONFORTO

“Vinde a mim vós que sofreis”
Diz Jesus à alma ferida...
Não nos cura, mas ampara,
Agindo nas leis da vida.

RELAÇÕES

Se as relações entre dois
Sempre fosse naturais,
O casamento no mundo
Duraria muito mais.

RESUMO DA LEI

Vale a pena recordar
Este resumo da Lei:
“Amai-vos” – disse Jesus –
“Assim com vos amei!...”

SEGREDOS

Há tão amargos segredos
Nos corações intranqüilos,
Que é falta de caridade
O intento de descobri-los

SEGREDOS DA VIDA

A fim de não entendermos
Neste mundo quem é quem,
Deus, nos caminhos da vida
Não dá cópias a ninguém

SOLIDÃO ÚTIL

Quem anda na senda estreita,
Vendo as pedras do caminho,
Prossegue servindo aos outros
Mas prefere estar sozinho.

TRANQUILIDADE

Vive sempre de alma limpa,
Que aceita, serve e se curva
O Céu nunca se reflete
Em lagoas de águas turvas.

VALIOSA POUPANÇA

Poupa conversa e festança
Onde estejas e onde vais,
Qualquer tempo gasto em vão
É tempo que não vem mais.

USUFRUTO

De nada vale ao sovina
Ser homem esperto e astuto,
O mundo é apenas de Deus
A nossa posse é usufruto.

VIDA ÍNTIMA

Nossos próprios sentimentos
Agindo em luta sem voz,
Igualam-se a tempestade
Rugindo dentro de nós.

VIAGEM ADIANTE

Cada reino quer domínio,
Usando força incomum,
Mas, em milênios se irmanam,
E apenas são três em um.

VIAGENS DA ALMA

Em nós existem três reinos
Que lutam contra a razão,
Por nome são conhecidos:
O Amor, a Paz e o Perdão.

INVENCÍVEL

Dos poderes que há na terra
Que mudam bens de lugar,
A morte é força invencível,
Não se deixa subornar

Fonte:
Francisco Cândido Xavier (psicografia) Trovas do Coração.

Amosse Mucavele (Luzí(a)das e Voltas do Avô Camões)

Ao Manuel António Pina - Prêmio Camões 2011

Feito dos homens, que em retrato breve
A muda poesia ali descreve(vii,76)
E como a seu contràrio natural
A pintura que fala querem mal(viii,41)
in Os Lusíadas-Luis V.de Camões

Caro poeta, o inesperado acabou por acontecer, não tardou, ele anda a uma velocidade cósmica tal como a luz em brasas.

O velho adágio dizia: esperança é a última a morrer, mas consigo foi diferente, ela chegou de forma inusitada, em ti ainda não tinha nascido, coitado morreu ainda no ventre da sua mãe.

Eu o vi no Rio de Janeiro de mãos dadas com os seus dois netos - João Ubaldo Ribeiro e Ferreira Gullar à entrada da Biblioteca Nacional , digo-te que o avô está rejuvenescido, ele passou todo o ano 2010 com Ferreira Gullar, foram a Maranhão. Na última conversa que tive com o avô, quando perguntei-lhe sobre a poesia, ele disse-me que já não sabe escrever, bem sabe sujar o poema pois aprendera com F.Gullar.

Quando chegarem a Portugal não o deixe ficar em Lisboa, porque aí, ele vai te largar, pois o Rio Douro reflete a luz do sol após a sua enciclopédica voz, a Torre de Belém evoca os seus cantos e o Mosteiro dos Jerónimos tem o seu rosto, e com certeza ele perguntar-te-a sobre Miguel Torga, Sophia de Melo Breyner Anderssen e José Saramago (não o diga que subiram às estrelas), diga-o que exilaram-se na memória do povo, pois com o Saramago aprendeu a viajar como o Elefante, ele não se esquece de nada, vai te contar as estórias da Indía e do Vasco da Gama, A terra Sem Fim, foi por isso que António Lobo Antunes chamou-o “Memória de Elefante". Volto a repisar nunca aborde a questão da morte com ele: porque para ele a morte é um Reflexo num Espelho Ausente, como ele vive de lembranças irá procurar o espelho em todos cantos do mundo, vai te falar da ilha dos amores e da casa do rei , você conhece? Foi o que aconteceu comigo, Autran Dorado, João Ubaldo Ribeiro e Ferreira Gullar quando passeávamos com ele, e alguém disse aquela é a casa dos Budas Ditosos, sorriu e em seguida mandou parar a viatura. Descemos juntos com ele, chegamos perto da casa, dentro da mesma tinha um monte de gente armada a intelectual, politicos e bebâdos, dirigiu-lhes a palavra -Tudo bom com vocês, posso ler um poema para vocês?, e eles responderam:

-Nós somos do partido no poder, nos distinguimos com os ideiais do FMI, Banco Mundial e da NATO.

-ELE RESPONDEU-...vão se danar, vocês todos mentirosos, mentirosos, a esmagadora maioria hipócrita e santarrona, viva nós os mentirosos a força, os conscientes (1).

Saimos com o velho Camões a arder de nervos e de repente disse: - Vamos a Bahia. Mandem um fax ou liguem para o Jorge Amado dizendo que estamos a caminho.

Ficamos em silêncio, sem saber qual seria a resposta a dar ao velho Camões.

- Serà que não ouviram o que eu disse. Querem que eu repita? - retorquiu ele

- Oh, VÔ! O Jorge Amado não està na Bahia - respondemos em coro com vozes a tremer de medo.

- Para onde ele foi, digam-me o que esta a acontecer. Vocês estão estranhos, digam onde ele esta afinal!

O Ferreira Gullar disse-lhe o seguinte: O Jorge foi ao Japão ajudar o Kenzaburo OE da tragédia que assolou aquele País Niponico irmão. Não se trata de uma questão Pessoal, mas de uma questão Natural.
-------
- Prezado amigo previna-se e não toque neste assunto, leve-o a (Sabugal) Guarda de carro. Não se atreva a viajar com ele de barco, pois falar-te-á da Indía e quando chegarem e ele perguntar-te se jà chegaram a Casa Perdida?

Responda-o: - Ainda Não é o Fim nem o Princípio do Mundo. Calma ! É Apenas um Pouco Tarde

E quando perguntar-te onde estão?

Responda-o seguinte:

-Estamos No País das Pessoas de Pernas Para o Ar,nunca diga que estão em Portugal, porque irà te pedir ir à Leiria.

Sei que da África Portuguesa conhece pouco ou por outra ainda nao visitou. Peça para que te conte sobre a sua estadia em Moçambique com José Craveirinha, veràs o sorriso que dilacera os seus olhos e a doçura do mel que unta as suas sábias palavras. Falar-te-a das doces tangerinas de Inhambane, daquela dança denominada Chigubo e daquela mulher linda que ele apadrinhou quando do seu casamento com Craveirinha, a Maria.

Conheceu Angola pelas mãos do Pepetela, e foi là onde acreditou que o homem é o melhor amigo do cão, quando viu o Cão e os Caluandas sempre juntos, e se quiser saber mais da guerra da Unita e o MPLA. Peça–o, ele vai te falar do Mayombe, e foi em Angola onde escalou a Estepe e o Planalto.

Volvidos 9 anos voltou de novo a Angola ,ao encotro do José Luandino Vieira, mas para a desilusão de todos nós, o Luandino não quis recebê-lo,a legando não sendo ele a pessoa indicada para o receber, e recusou por motivos íntimos e pessoais.

Mas o avô Camões não voltou, foi recebido como rei pela comunidade de Luaanda, gente humilde onde o singular não tem expressão, o coletivo é a palavra de ordem.

Quando interpelou um deles perguntando-lhe o nome, responderam todos em coro dizendo:

-Nós Os do Makulusu.

Ficou muito feliz, coisa jamais vista. Sairam da cidade a caminho do subúrbio onde vive esta humilde comunidade.

O avô Camões inconformado, irrequieto, quando viu aquelas casas de madeira e zinco, questionou:

-Esta não é a Mafalala do José Craveirinha?

Responderam: - Não, este é o Nosso Musseque.

Questionou de novo: - E aquela senhora não é a Dona Flor com os Seus Dois Maridos?

Responderam: - Não, aquele é o João Vêncio e Os Seus Amores.(2)

E sobre Cabo-Verde, onde esteve em 2009 com o Arménio Vieira, será a partir deste debate, o papo com o velho Camões que perceberás que em África não estamos no Inferno, como todo mundo diz.

Aquela beleza da Cidade de Praia, ímpar é um verdadeiro Eleito Do Sol, a Ilha do Sal é a raiz de todas Mitografias deste povo Crioulo - assim ele definiu Cabo-Verde.

E quando estiveres a pintar as palavras não deixe os Papeis espalhados, o velho Camões não gosta de ver desarrumações, caso isto acontecer, ouvirás a seguinte questão.

-São Papeis de K?

Responda o seguinte: - São Livros - e não o diga que são poemas,percebeu? Porque com o Poema, o Velho Camões encontra a sua Viagem e o Sonho.

Caro poeta, abrace-o e ande com ele com muita cautela, pois ele está velho ,esta é a sua 25ª viagem ao mundo Lusófono, depois de ele te contar todo o essencial das suas digressões. Conte aquela interessante História do Sabio Fechado na sua Biblioteca.

Mande muitos abraços, beijos, cumprimentos e larguras, e diga a ele que estamos a espera dele muito em breve. E quando perguntar-te de mim, diga que estou trancado na biblioteca a aprender a recriar mundos, tal como fez Saramago no seu Memorial do Convento (o Convento de Mafra).
Kanimambo pela atenção dispensada, poeta.
---------------
Notas:
(1) in a casa dos budas ditosos pag 144 de João Ribeiro
(2) Romance de Luandino Vieira

Fonte:
Texto enviado pelo escritor moçambiquano.

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 318)


Uma Trova Nacional

Após busca pertinaz,
descobri, um dia, a esmo:
– Só hei de encontrar a paz
na renúncia de mim mesmo!
–LUIZ ANTONIO CARDOSO/SP–

Uma Trova Potiguar

De beijar-te tenho ânsia,
pois vivemos separados...
"o beijo é a menor distância
entre dois apaixonados".
–DJALMA MOTA/RN–

Uma Trova Premiada

2000 - Ribeirão Preto/SP
Tema: UNIVERSO - 5º Lugar.

Meu Peito que é só pedaço,
na dor cruel que o invade,
não sabe onde arruma espaço
“pra” colocar mais saudade!
-MANOEL NAHAS NETO/SP-

Uma Trova de Ademar

Entre sonos e cochilos,
numa deslumbrante rota,
meus sonhos voam tranquilos
nas asas de uma gaivota...
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Quem parte devagarinho,
mas vai de rumo traçado,
ao começar seu caminho,
tem meio caminho andado.
–WALDIR NEVES/RJ–

Simplesmente Poesia

Acróstico...
–JOÃO BATISTA XAVIER/SP–

Amanhecer com seus versos na tela
Devaneio nas cores da paisagem;
Enalteço o arrebol que na passagem
Mistura os brilhos em linda aquarela.
Aurora potiguar, a luz mais bela,
Resplandecendo em bênçãos sua imagem.

Manhãs floridas na semana inteira:
Alento que balsama nossa lida;
Convite e busca à alegria perdida
Exalando os aromas da roseira.
Desperta a cadência em rima fagueira
O Poeta do Amanhecer à vida!!!

Estrofe do Dia

Seu poema é como a foz
dos sentimentos escritos,
por isso são mais bonitos
do que sua própria voz,
só não canta como nós
mas se quisesse podia,
o verso é Deus quem lhe envia
como o mar manda a maré;
patativa do Assaré,
gênio imortal da poesia.
NONATO COSTA/CE–

Soneto do Dia

O Que é a Vida.
–CLARISSE BARATA SANCHES/PT–

A Vida é uma pluma espaço fora…
Uma nuvem no Céu a deslizar;
Primavera vestida de Luar,
Aurora que deslumbra e não demora!

A Vida é uma luz de tempo e hora,
Uma ilusão que dura até chegar
Ao Átrio de Amor, sonhado Lar,
Onde termina a mágoa de quem chora!

A Vida é um abrir e fechar de olhos…
Um barco a navegar em mar de abrolhos
Para ancorar na Terra da Verdade!

A Vida é uma graça de momento;
Um perfume de rosa em movimento:
- Segredo a desvendar na Eternidade!..

Fonte:
Textos e imagem enviados pelo Autor

Esio Antonio Pezzato (Antologia Poética)


COLCHA DE RETALHO

A minha velha colcha de retalho,
Feita por minha Mãe, na minha infância,
(Tempo este já perdido na distância...)
Hoje, ainda, me serve de agasalho...

Altas noites friorentas, e eu, em ânsia,
Busco-a e me cubro – feito um espantalho –
E a ela coberto lembro-me o trabalho
Que teve minha Mãe em longa estância...

Muito mais que meu corpo, ela me aquece
O coração, que bate como prece
E mais parece guizo de um chocalho...

Não quero, não, uma coberta nova,
Do amor de minha Mãe – é eterna prova,
A minha velha colcha de retalho!
22.09.2001

EXORTAÇÃO

Canta, Poeta, os versos que fabricas
Como as águas correntes, junto ás bicas
Que correm cristalinas, pelo mato;
Canta em versos perfeitos e sonoros
A inspiração que brota de teus poros
Tirando da beleza todo o extrato!

Canta, Poeta, o amor justo e perfeito,
A sinfonia que exacerba o peito
Em alvorada multicolorida;
Canta a Graça, a Ternura, a áurea Esperança,
Canta o Amor, canta a Paz, canta a Bonança,
Canta toda a Beleza que há na vida!

Canta, Poeta, às luzes da alvorada,
O que te deixa de alma apaixonada
Num sorriso fremente, num sorriso
Que contém dentre as armas – mais poderes,
O que traz sonhos a milhões de seres
Que almejam alcançar o paraíso!

Canta, Poeta, em versos benfazejos,
Os soluços de amor dos sertanejos
Dedilhando, na tarde, uma viola;
Canta toadas com a simplicidade
De quem sabe encontrar felicidade
E de quem, entre afagos, se consola!

Canta, Poeta, em qualquer tempo, canta!
Pois tuas rimas servem-nos de manta
Tuas estrofes são nossos escudos;
Enquanto em versos soltas tua Lira,
Em nossos corações acende a pira
E a tua voz – permanecemos mudos!
14.10.1998
SEXTILHAS SOBRE O CORVO

Cada vez mais de Poe, o negro corvo,
Na minha vida anda causando estorvo
A guturar seus versos sepulcrais...
É que seu negro, atro e nefasto grito,
– Eco de sombra a ungir todo o Infinito! –
Em minh’alma crocita:– nunca mais!

Este grito de morte me atordoa,
No mais fundo de mim, lúgubre soa,
Como o verso da morte que me vem
E arrepiam-me peles e cabelos,
Iguais horripilantes pesadelos
Que caminho, na noite, sem ninguém.

A noite fere em luz pingos de estrelas,
Eu – solitariamente andando pelas
Noites de horror que estão dentro de mim,
Avisto em meio aos trôpegos destroços,
Um punhado de brancos, podres ossos,
Das vidas todas que tiveram fim.

Alem, perdida num moirão da estrada,
Eis a ave negra e funeral, pousada
Alertando meus rumos a seguir:
Armadilhas estão em cada canto,
– Fico parado, pálido de espanto,
Talvez pelo final de meu porvir!

Perscruto o olhar de lince... Calmamente
A passos lerdos vou pisando em frente
E o corvo fica a me seguir no olhar.
Está dentro de mim um denso medo!
Mas vou a desvendar este segredo
Embora sinta enorme falta de ar.

Os passos alardeiam-me a presença,
E o corvo negramente, em sua crença,
Repete-me seus ecos guturais.
É noite. Vou perdido no caminho,
E ao desespero deste andar sozinho
É o corvo crocitando:– nunca mais! –

15.11.1997

PESCADOR

(para meu filho Esio, pescador convicto)

O pescador passa as horas
Sentando á beira do rio

O sol corre o espaço aberto
E o pescador distraído
Sentando á beira do rio
Não vê o tempo passar

Tranqüilo calmo em seu mundo
As horas lerdas se arrastam

E dentro de seu silêncio
No lento arrastar das horas
O pescador pensativo
Brinca ao silêncio do tempo

Na água lerda da corrente
Navega a sua ilusão

A brisa mansa e serena
Cheia de sonhos repisa
Momentos e horas passadas
Em cardumes de esperanças

Escamas brilham em lua
Com os braços do pescador

O denso suor escorre
Pelos caminhos vincados
Das faces contemplativas
Tentando a luta vencer

O samburá prende sonhos
Dourados jaús pintados

Mas a vida provisória
Da cadeia de bambu
Prolonga a hora da morte
Para o instante da partida

Silêncio pede silêncio
Quando retesam-se as linhas

Formando um longo trapézio
Entre as mãos os pés e a água
O reflexo mais parece
Um triângulo escaleno

Equilibra-se na angústia
Do percebido e não visto

A luta submersa trava-se
Com a vontade infinita
De vencer a vida aquática
Com anzóis de aço e de fisgas

Luta – fieira de silêncio
Para a vitória do nada

Mas o pescador bem sabe
Que além da aquática luta
Há o caminho para a casa
E á vida – maior disputa

14.10.1998

BALADA INSPIRADA

Há na minh’alma a inspiração
De oferecer a ti, amada,
Aos sons do amor, uma canção,
Para mostrar que – apaixonada,
Ela anda em plena madrugada
A repetir este refrão:
– Sem ti, querida, não sou nada,
E a vida é apenas ilusão!

Por isso, em plena comoção,
Dentro da noite enluarada,
Vou aos teus pés – com devoção,
Oferecer-te esta balada.
És minha Musa, és minha Fada,
Hino de vida e de razão.
– Sem ti, querida, não sou nada,
E a vida é apenas ilusão!

Ardo de amor como o verão
Que deixa a vida incendiada.
E vivo sempre na estação
Que a vida faz iluminada.
Contemplo em luzes a alvorada
Que traz-me o sol com explosão.
– Sem ti, querida, não sou nada
E a vida é apenas ilusão.

OFERTA


És minha fruta açucarada!
Provo-te o sumo em emoção!
– Sem ti, querida, não sou nada,
E a vida é apenas ilusão!

14.08.2002

CONSIDERAÇÕES

Minha poesia já não traz o encanto
Da passada e esmaecida mocidade.
Hoje é tangida em cordas da saudade
E é sem sonoridade este meu canto.

Poucos anos separam o passado
Deste presente insípido e tristonho.
O porvir não me traz ridente sonho
E fica em pesadelo transformado.

A primavera vai perdendo as flores
E o verão antecipa a cor do outono.
As folhas vão rolando no abandono
E o inverno se transmuda em frias cores.

A exclamação do corpo belo e altivo,
Numa interrogação atroz se tange.
A costa arqueada lembra um frio alfanje,
Das intempéries fica-se cativo.

Tudo é veloz de mais... a loura aurora
Alcança o sol a pino e traz a arde...
O fogo do desejo já não arde
E o que era doce e lindo... vai-se embora...

O entardecer de dúvidas se fere,
O olhar se torna baço e se enevoa...
E a silenciosa sombra sempre soa
Num ritual de triste miserere...
13.11.2000

DESESPERANÇA

Pelas sombras, nas trevas, solitário,
Coração perambula no caminho,
Na tortura de sempre estar sozinho
Lembra Alguém que seguiu atroz calvário.

Como é triste, Senhor, o itinerário
De quem, na vida, já não tem carinho.
Ave que foi expulsa de seu ninho
Já não tem mais encantos de canário...

Mudo e tristonho vou, sem esperanças,
Carregando farrapos de mil sonhos
Pelos ermos perdidos das lembranças...

O outrora céu azul da mocidade
Hoje contém relâmpagos medonhos
E anuncia terrível tempestade...

23.10.2000

CANTO NOTURNO
(1982)

Em pleno dia o Pássaro da Noite
Cortou, felino, a tua trajetória:
E calou tua voz
E levou teu sorriso
Também tua esperança
Longe de todos nós.
– Teus sonhos de criança
Anseios de mulher,
Projetos do futuro
Lembranças do passado;
– Está tudo acabado.

A morte veio e entrou na tua vida
Deixando em todos nós, uma saudade:
Saudade dos teus cantos
E da agressividade
Junto às canções de brasa
Que soubeste cantar:
Ódio, raiva, delírio,
Amor, fogo, paixão,
Desespero inflamado
No ato da louvação
Ao cantar o passado.

Anjos cheirando a cocaína e álcool
Desmoronaram o teu corpo físico,
E a dor da morte paira
No tédio da saudade,
No palco do Teatro,
No pranto de um amigo,
Que agora, a recordas,
Lembra do paraíso
Na voz do teu sorriso
Que era maior que o mar.

Basta de soluções e mil hipóteses
Para sair da Noite a tua morte.
Melhor será lembrar-te
No palco cintilante,
Porque tudo na vida

Brilha a falsa brilhante,
E a transversal do Tempo
Não tem curva ou retorno,
E a história tão-somente
Seguindo a longa estrada,
Jamais e esquecerá.
Basta de conjecturas, pois as tramas,
Ficarão, para sempre, no segredo:
Fatos – serão passados,
Fotos – serão guardadas;
E os cantos, na magia
De tua voz perfeita,
Agradarão ouvidos
Num poema feliz
E todos, ao ouvi-los,
Relembrarão saudosos:
– Esta voz é da Elis!

25.01.1982

Fonte:
Esio Antonio Pezzato. Colcha de Retalhos. 2002.

domingo, 28 de agosto de 2011

A. A. de Assis (Trovas Ecológicas) - 5


Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 317)


Uma Trova Nacional
Uma Trova Potiguar

Se todos fossem honestos,
ninguém veria, na praça,
mendigos comendo restos
do pão que a miséria amassa!
–CLARINDO BATISTA/RN–

Uma Trova Premiada

2007 - ATRN-Natal/RN
Tema: MOTIVOS ECOLÓGICOS - 8º Lugar

Na angústia das mais estranhas,
estão chorando as cascatas:
são murmúrio das montanhas
refletindo a dor das matas.
–CLÁUDIO DE CÁPUA/SP–

Uma Trova de Ademar

Mesmo na terceira idade
busco fontes de prazer;
amemos pois, de verdade...
Não há mais tempo a perder!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Dizem que, dos tempos idos
no pelourinho da praça,
ainda se escutam gemidos
de torturas de uma raça...
–VASQUES FILHO/PI–

Simplesmente Poesia

Ontem...
–MANOEL RODRIGUES DE LIMA/SP–

Ontem não haveria sol
conforme anunciara o homem do tempo.
Não haveria chuva,
não haveria vento.
O que haveria em mim era a solidão.

Ontem não haveria risos,
conforme anunciara os velhos palhaços.
Não haveria alegria.
Haveria sim, mil pedaços,
desse meu sofrido e pobre coração.

Ontem não haveria cantos,
conforme anunciara a própria natureza.
Não haveria revoadas.
Haveria sim, tristeza
demonstrada em minha desilusão.

Ontem não haveria festa,
conforme anunciara o meu interior.
Haveria pranto,
haveria dor.
Haveria o silencio dentro de mim.

Estrofe do Dia

Olho os mares, os vejo revoltados
quando o vento fugaz transtorna as brumas
e as ondas raivosas lançam espumas
construindo castelos encantados,
as sereias se ausentam dos pecados
que nodoam as almas dos humanos
e tiram notas das cordas dos pianos
que o bom Deus ocultou nos verdes mares,
e gorjeiam gravando seus cantares
na paisagem abismal dos oceanos.
–DINIZ VITORINO/PB–

Soneto do Dia

Sobre as Ondas
–MARIO BARRETO FRANÇA/PE–

Era noite. O alto mar se enfurecia...
Para o barco veloz que à morte avança,
não restava uma simples esperança
de incólume rever a luz do dia...

Entre as brumas, porém, da noite fria
aparece uma sombra, calma e mansa...
Era um fantasma? – Não! – era a bonança
que em Jesus, como bênção, se anuncia.

Inda hoje o mar do mundo se encapela;
e, no barco da vida, já sem vela,
não nos resta sequer uma ilusão...

Mas – Senhor! – sobre as ondas revoltadas,
volta a trazer às almas torturadas
o consolo da tua salvação!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor