quinta-feira, 26 de julho de 2012

Efigênia Coutinho (Mulher Mãe e Futura Avó)

Eu vou vendo na face da terra muitos animais errabundos, são aves, peixes, quadrúpedes. Vejo o bailado das andorinhas fenderem o céu atravessando o Oceano infinito. E vi o alcião nunca repousar as asas cansadas, suspensas sempre entre o azul do céu e o azul do grande mar. Sei também que os peixes passam dum a outro mar, e que as baleias viajam dum a outro pólo. Mas nenhuma espécie destas, vive uma vida como nós os seres humanos.

Talvez eu tenha ânsia em procurar para minha vida, um sentido mais alegre, como se eu fosse um peixe, pois procuro mais a fonte que a terra, e onde ela esta se não se espelha na onda, afigura-se que está morta toda a natureza humana. Procuro a água, amiga minha, ao pé das geleiras, onde gota a gota, estilando entre os granitos, vai beijando os macios musgos e miosótis azuis.

Murmuram, ou antes balbuciavam aquela água palreira, como os sons duma criança que aprende a falar. Provei desta água, e achei-a doce como mel, continuei minha busca, desci da geleira pela encosta dos montes, e arroios, regatos e torrentes me encantavam as alegrias da água criança tornada menina.

Bebi sedenta daquela água, e achei-a mais doce ainda. Os regatos e as torrentes desciam sempre, desciam todos, procurando no leito dos rios, não sei dizer o que, talvez o puro Amor, para o qual correm com ânsia fadigosa todas as criaturas vivas. Continuei a descer os rios, que correm um após outros com fúria crescente. Provei todas essas águas, e eram sempre adocicadas.

A água criança havia-se tornado menina, e depois uma mulher, e um tempo depois uma MÃE. Todas essas águas são doces, porque são lágrimas espremidas dos olhos duma mulher Mãe, das que Amam e são Amadas, das que bendizem ao bom Deus pela vida vivida. E regatos palreiros, e torrentes ruidosas, e rios murmurantes desta vida, tem pouca água, visto como as alegrias duma Mãe que vai vendo a vida nascendo noutro ser, e o poder sublimado de Deus em ser Avó.

Fontes:
A Autora
Imagem = http://saudeoeste.blogspot.com

Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa (Parte 4: S. Tomé e Príncipe)

A evolução social de São Tomé e Príncipe teria sido paralela, em muitos aspectos, à de Cabo Verde [31]. Mas, em meados do século XH, implantando-se o sistema de monocultura, a burguesia negra e mestiça vai ser violentamente substituída pelos monopólios portugueses, o processo social do Arquipélago alterado e travada a miscigenação étnica e cultural. Mesmo assim, não podem deixar de ser considerados os efeitos do contacto de culturas. A sua poesia, de um modo geral, exprime exactamente isso; mas, na essência, é genuinamente africana.

A primeira obra literária de que se tem conhecimento relacionada com S. Tomé e Príncipe é o modesto livrinho de poemas Equatoriaes (1896) do português António Almada Negreiros (1868 — 1939), que ali viveu muitos anos e terminou por falecer em França. A última é a de um moderno poeta português, crítico, e professor universitário em Cardiff, Alexandre Pinheiro Torres, cujo título, A Terra de meu pai (1972), nos fornece uma pista: memorialismo bebido na ilha, por artes superiores de criação literária metamorfoseada na ilha «que todos éramos neste país solitário». Sem uma revista literária, sem uma actividade cultural própria, sem uma imprensa significativa, apesar do seu primeiro periódico, O Hquador, ter sido fundado em 1869, com uma escolaridade mais do que carencial os reduzidos quadros literários do Arquipélago naturalmente só em Portugal encontraram o ambiente propício à revelação das suas potencialidades criadoras. O primeiro caso acontece logo nos fins do século XIX com Caetano da Costa Alegre (1864 — 1890), {Versos, 1916) cuja obra foi deixada inédita desde o século passado. Cabe aqui, todavia, uma referência particular ao teatro a que poderemos chamar «popular», pelas características e relevância que assume no arquipélago de S. Tomé e Príncipe. Trata-se, em especial, de duas peças: O tchiloli ou A tragédia do Marquês de Mântua e de Carloto Magno e do Auto de Floripes, mas com preferência para a primeira. A segunda oriunda da tradição popular portuguesa; e O tchiloli supõe-se ser o auto do dramaturgo português do século XVI, de origem madeirense, Baltasar Dias, levado, tudo leva a crer, pelos colonos medeirenses na época da ocupação e povoamento. Reapropriados pela população de S. Tomé (e do Príncipe) estão profundamente institucionalizados no Arquipélago, principalmente O tchiloli mercê da actuação de vários grupos teatrais populares que, continuadamente, se dão à sua representação, enriquecida por uma readaptação do texto e encenação, cenografia e ilustração musical notáveis.

Parece ter sido um homem infeliz, em Lisboa, o autor de Versos, Costa Alegre: Tu tens horror de mim, bem sei, Aurora, Tu és dia, eu sou a noite espessa [32] «Aurora» aqui é um ente humano e não um fenómeno cósmico. A ambiguidade resolve-se na leitura completa do poema. Caetano da Costa Alegre utiliza este signo polissémico com a intenção, ao cabo, de ele traduzir a cor branca: És a luz, eu a sombra pavorosa, Eu sou a tua antítese frisante [33]

A poesia de Caetano da Costa Alegre, na quase totalidade, funciona espartilhada num mecanismo antitético. Exprime a situação desencantada do homem negro numa cidade europeia, neste caso Lisboa. Versos é, porventura, a mais acabada confissão que se conhece, quiçá mesmo nas outras literaturas africanas de expressão europeia, do negro alienado. Costa Alegre, não se dando conta (impossível, diríamos, no século XIX e no tempo cultural e político da área lusófona) das contradições que o bloqueavam, faz-se cativo da sua condição de humilhado:
A minha côr é negra, Indica luto e pena; És luz, que nos alegra, A tua côr morena. É negra a minha raça, A tua raça é branca,
Todo eu sou um defeito [34]

Como tenta Costa Alegre desbloquear-se desta situação? Porque «negra» é a sua «raça», «todo» ele é um «defeito». Como pode ele reencontrar o seu equilíbrio psíquico? Alienado, /«-consciencializado, batido no deserto social em que se movimenta, então cura libertar-se através de uma compensação. Revoltando-se? Clamando contra a injustiça que o atinge? Não. Contrapondo atributos morais.

«Ah! pálida mulher, se tu és bela, [...] Ama o belo também nesta aparência!» [35]. Amiúde as relacionações antinómicas vai buscá-las ao Cosmo:

«Só explendor por fora,
Só trevas é no centro!
O Sol, és meu inverso:
Negro por fora, eu tenho amor cá dentro» [36]

Com efeito, a sua poesia é a de um homem infelicitado. Amiúde recorrendo à comparação e à antítese, as figuras mais pertinentes são as que significam ou simbolizam as cores «negro» e «branco». Da erosão da sua alma transita para a obsessão infeliz, lutando por restabelecer a sua dignidade no refúgio do apelo à evidência moralizante, por norma em poemas lírico-sentimentais ou de amor. Versos fica como o primeiro e único texto onde o problema da cor da pele actua como motivo — e de uma forma obsessivamente dramática. Consideramo-lo o caso mais evidente de negrismo da literatura africana de expressão portuguesa. Alguns autores angolanos coevos de Costa Alegre deram também uma contribuição para este fenómeno, mas percorrendo um espaço menos significativo.

Perspectiva Geral

Temos deste jeito, e em resumo, o seguinte: cedo se esboça uma linha africana, irrompendo de um sentimento regional e em certos casos de um sentimento racial fundo, mas postulado ainda em formas incipientes que, tenazmente, abre um sulco profundo por entre a literatura colonial. De sentimento regional se transita para sentimento nacional, que vai dar lugar, entretanto, a uma literatura alimentada já por uma verdadeira consciência nacional e daí uma literatura africana, caracterizada pelos pressupostos de intervenção.

Ora, os fundamentos irrecusáveis de uma literatura africana de expressão portuguesa vão definir-se, com precisão, deste modo: a) — em Cabo Verde a partir do revista Claridade (1936 — 1960); b) — em S. Tomé e Príncipe com o livro de poemas Ilha de nome Santo (1943), de Francisco José Tenreiro; c) — em Angola com a revista Mensagem (1951—1952); d) — em Moçambique com a revista Msaho (1952); e) — na Guiné-Bissau com a antologia Mantenhas para quem luta! 1977.
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Notas

31    Francisco José Tenreiro, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe: Esquema de uma evolução conjunta. Sep. do Cabo Verde, ano III, n.° 76. Praia, Cabo Verde, 1956, pp. 12-17.

32    Caetano da Costa Alegre, Versos, 1916, p. 26.

33    Idem, p. 26.

34    Idem, p. 47.

35    Idem, p. 61.

36    Idem, p. 100.
 
Continua… Cabo Verde – 1. Lírica

Fonte:
Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa I Biblioteca Breve / Volume 6 – Instituto de Cultura Portuguesa – Secretaria de Estado da Investigação Científica Ministério da Educação e Investigação Científica – 1. edição — Portugal: Livraria Bertrand, Maio de 1977

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Sexteto em Sextilhas (Parte 1)


01 - Assis
Zé Lucas, Delcy, Gislaine,
Assis, Garcia, Ademar:
eis o Sexteto em Sextilhas,
pronto para decolar.
Preparem-se, pois, irmãos,
porque o vôo vai começar.

02 - Ademar
Pronto estou pra decolar
e a inspiração me reveste.
Quero ser um elo forte
na construção inconteste
desta ponte de poesia
ligando o Sul ao Nordeste.

03 – Delcy
Sei, amigo, que quiseste
criar novas maravilhas,
pois és um elo bem forte
a cavalgar nas sextilhas,
e espero participar
destas pampeanas coxilhas!

04 – Prof. Garcia
São tantas as nossas trilhas
nesta nova caminhada,
que vou pedir a Jesus
inspiração renovada,
para guiar meu destino
até o fim da jornada.

05 – Gislaine
Eu peço o sonho, mais nada!
Vou continuar a sonhar...
O sonho enfeita meu mundo
e não me deixa chorar,
me dá ternura e alegria
me ajuda a vida, levar!

06 - Zé Lucas
Acostumei-me a lutar
mais do que muitos, talvez,
mas um debate tão amplo,
como este, nunca se fez,
reunindo meia dúzia
de poetas de uma vez.

07 –  A. A. de Assis
Três do Sul, Nordeste três,
seis operários da rima,
cultores da bela arte
que a fantasia sublima,
e que talvez aqui teçam,
brincando, uma obra-prima.

08 - Ademar
Buscamos a melhor rima,
pois inspiração não falta;
nossas mentes brilham mais
do que as luzes da ribalta,
e na bolsa da poesia
nosso verso está em alta.

09 – Delcy
Cada sextilha  ressalta
o  desejo que nos move,
poetizar com esmero
e que o nosso verso prove,
a  todo amigo  que o  leia,
nosso  desejo e o aprove!

10 - Prof. Garcia
Que o leitor não desaprove
nem seja incréu nem ingrato
pois este nosso trabalho
se reveste de um bom trato,
feito com muito carinho
esmero, amor e aparato.

11 – Gislaine
Este Sexteto é de fato
velho sonho que eu queria,
traz a mim,  felicidade,
junto aos astros da poesia, 
torna verdade o  meu sonho...
Vem iluminar meu dia!

12 - Zé Lucas
Este mundo da poesia
tem coisas surpreendentes,
como este belo debate
que estimula nossas mentes
a captar versos e rimas
nascidos de seis vertentes.

13 - Assis
Meia dúzia de vertentes
num permanente cantar,
jorrando paz e poesia
para este mundo alegrar
e ao final, na foz, lá adiante,
encher de sonhos o mar.

14 - Ademar
Nasci sem saber rimar,
mas eu estou aprendendo,
e tendo Assis como mestre
cada vez mais vou crescendo,
e vejo o quanto aprendi,
nos versos que eu vou fazendo.

15 – Delcy
Os versos que vens fazendo
atestam que és cantador,
independente do Assis
ou de outrem, seja quem for;
e,  nós gaúchas, pedimos:
sê  o  nosso  professor!
 
16 – Prof. Garcia
Sou apenas sonhador
em constantes desatinos,
palmilhando este debate
com versos tão pequeninos,
buscando caminhos certos
na luz de nossos destinos.

17 – Gislaine
Ouço o badalar dos sinos,
e com certeza é um sinal
que Deus também é poeta,
o Poeta Universal,
que guiará nossos versos,  
nosso destino, afinal!

18 – Zé Lucas
Na corte celestial
a luz da poesia brilha,
e é de lá que recebemos
a visão de nossa trilha
e as peças fundamentais
da construção da sextilha.

19 - Assis
"Nenhum homem é uma ilha",
disse um famoso poeta.
E é por isso que aqui estamos
cumprindo a bonita meta
de unir o Sul ao Nordeste
com nossa alma inquieta.

20 - Ademar
A minha mão só se aquieta
quando eu escrevo um repente
da transmutação dos versos
formados na minha mente,
num rasgo de inspiração
Que Deus manda de presente...

21 – Delcy
O nosso nordeste, gente,
tem grande facilidade
de divulgar repentistas
que um certo ciúme me invade,
mas, se o Senhor me ajudar,
Crescerei "barbaridade"!

22 - Prof. Garcia
Crescer, Delcy, na verdade
é nosso sonho de esteta;
no barco em que navegamos
cada barqueiro é poeta;
no balanço da sextilha
nosso verso se completa.

23 - Gislaine
Atingimos nossa meta
nesse balanço gostoso
desse mar que nós criamos,
vezes alegre ou saudoso,
pelas sextilhas surfando
num  versejar primoroso!

24 - Zé Lucas
Eu sinto o clima gostoso
de uma sextilha sonora
que me invade o coração
como o Sol invade a aurora;
ela me ferve por dentro,
um minuto, e pula fora!

25 - Assis
Aos bons parceiros, agora,
de todo o meu coração,
e a quantos outros nos leiam
por este vasto mundão,
aqui deixo um grande abraço,
mais que de amigo, de irmão.

26 - Ademar
Com a pureza do sertão
te digo sem embaraço,
que a poesia no Brasil
ganha agora um novo espaço,
pois meu verso sem o teu,
fica faltando um pedaço!

27 – Delcy
Eu envio o meu abraço
ao quinteto que sextilha,
e peço que me desculpe
o cochilo em minha trilha.
Prometo ter mais cuidado:     
tenho sangue  farroupilha!

28 – Prof. Garcia 
Nosso sexteto em sextilha
todo instante se refaz;
por cada idéia que chega
novo repente se faz,
em vez de guerra de versos,
fazemos versos de paz.

29 – Gislaine
Fazer  versos  satisfaz
nossa alma sempre sedenta,
sedenta de amor e paz.
O verso acalma a tormenta
deste mundo desigual,
onde a desventura aumenta!

30 - Zé Lucas
A poesia nos traz
um clima de amenidade,
balsamiza o coração,
mata o vírus da maldade,
desagasalha a tristeza
e aninha a felicidade.
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continua...

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 618)

Uma Trova de Ademar 

Meu momento mais doído
foi perder quem tanto adoro,
por isso eu choro escondido
para ninguém ver que eu choro!
–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional 


Recordando o meu passado
vejo passar, no presente,
todo "passado" guardado
no espaço da minha mente!
–Nemésio Prata/CE–

Uma Trova Potiguar 


Desta saudade infinita
não guardo mágoas, porque
foi a coisa mais bonita
que me ficou de você!
–Aparício Fernandes/RN–

Uma Trova Premiada 


1992  -  Amparo/SP
Tema  -  TREVAS  -  M/H


A nossa fé é a virtude
que nos dá tanto otimismo,
que deixa ver, da altitude,
a flor nas trevas do abismo!
–Domitilla Borges Beltrame/SP–

...E Suas Trovas Ficaram 


A mentira é como a bola
de neve, descendo o cume.
Quanto mais a esfera rola,
mais aumenta de volume!
–Carolina A. de Castro/PE–

Uma Poesia 


Me inspiro nas cantilenas
e no sussurro das fontes,
no canto dos passarinhos
e no silêncio dos montes;
se a natureza me inspira,
enxergo as cores da lira
nas cores dos horizontes!
–Prof. Garcia/RN–

Soneto do Dia 

SEM PALAVRAS.
–Bernardo Trancoso/SP–


Não pode ser você quem vejo aqui!
Sim, sou... Que bom te ver! Tempo passou,
Você cresceu... Você também mudou...
Por onde andou? Aí... Muito aprendi!

Por que voltou? Saudade deu de ti!
Não fale assim... É, sim... Quem me ensinou
O amor, nunca esqueci... por isso, estou
Aqui! Prá ter de volta o que perdi!

Anos depois... Pois é... Um dia, eu cá
Pensei, não voltará! Errei... Você
Deixou-me a dor, mas cri... Quem ama, crê!

Foi tanto o que sofri! Não sofrerá!
Se depender de ti... Mudei! Virá?
Vou... Sem palavras, já... Falar, prá quê?

terça-feira, 24 de julho de 2012

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 617)


Uma Trova de Ademar  

A natureza nem nota, 
mas, enxergo bem pouquinho; 
e todo dia ela bota 
mais pedras no meu caminho... 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Quando afago teus cabelos, 
como o vento afaga a flor, 
tenho a esperança de vê-los, 
brancos, seguidos de amor. 
–Carmen Pio/RS– 

Uma Trova Potiguar  

Aquele sonho, tão lindo... 
entre nós dois, na verdade, 
era um mistério sorrindo 
entre o amor e a saudade! 
–Eva Garcia/RN– 

Uma Trova Premiada  

1996  -  Belém do Pará/PA 
Tema  -  ÁGUA  -  M/H 

Meus olhos cheios de mágoa
buscam as pedras do chão,
são dois riachos sem água
perdidos na imensidão...
–Fernando Câncio Araújo/CE– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Se a riqueza traz a calma, 
falsa é a paz que dela vem; 
paz é a que emana da alma 
que vive fazendo o bem. 
–Alfredo Valadares/MG– 

Uma Poesia  

Nós que somos Trovadores, 
pelo verso destemido, 
a nossa voz se agiganta... 
o bem é fortalecido, 
porque falando de amor 
a vida tem mais sentido! 
–Elisabeth Souza Cruz/RJ– 

Soneto do Dia  

OBRIGADO SENHOR, MUITO OBRIGADO. 
–João Justiniano da Fonseca/BA– 

Aqui estou Senhor, uma vez mais 
Numa simples palavra de obrigado. 
Tens tanto concedido ao meu agrado, 
Tanto enchido de bem os meus anais! 

Que peço nos noventa e dois? O arado 
Continuo a mover. E os cabedais 
Ainda crescem em lágrimas e ais, 
Em crônica, soneto ou arrazoado. 

Fica à vontade, Pai, Tu e São Pedro 
Para fechar o meu caixão de cedro 
E conduzir-me a ti e a tua glória. 

Pressa não tenho. Tudo em mim vai bem. 
Fica a vontade. É bom lembrar que os cem 
Seria, em boa forma, uma vitória!

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Teresa Lopes (A Bailarina de Degas)


Para a Sara e para a Ana, minhas bailarinas de Degas.

A casa era grande e tinha um jardim. Para lá do jardim ficava o bosque de árvores imensas que se estendiam até não poderem ser mais vistas, por entre caminhos traçados sob as folhas do Outono.

Telma adorava passear-se pelo bosque. Corria pelos caminhos, inventava outros atalhos e tentava passos de dança, braços ondulando ao sabor de melodias imaginadas.

Ser bailarina era um sonho só seu. Desde que descobrira, na biblioteca, um livro com reproduções de quadros célebres, e, nas suas páginas, umas pinturas de bailarinas, a ideia que até então lhe passara vagamente em seus pensamentos tornou-se numa vontade constante, doentia.

Por isso se dividia Telma entre os passeios pelo bosque e as visitas à biblioteca.

As grandes prateleiras repletas de livros tinham-na assustado, no início.

Alguns deles eram antigos e cheiravam a pó. Outros eram mais novos e as suas capas despertavam a curiosidade da menina, que, por não saber ainda ler bem, se entretinha a olhar as figuras e a tentar descobrir o que estava lá dentro.

Foi numa tarde chuvosa de Novembro que Telma descobriu o livro das bailarinas. Na grande capa colorida, um nome que ela soletrou:

D-e-g-a-s.

Telma soube, anos mais tarde, que tinha sido um grande pintor francês, do séc. XIX e que o seu nome se pronunciava como se a letra e tivesse um acento circunflexo. Na altura, não queria a menina saber daquele nome, que nada lhe dizia. Só queria ver as figuras e mais figuras e a todas despia com os olhos ávidos de cor, de movimento e de sinfonias cada vez mais triunfais.

Esperava a hora da sesta. Fingia que dormia. E em passos de algodão escondia-se na biblioteca, entre a porta envidraçada que dava para o bosque e o grande reposteiro de veludo carmesim.

De todos os quadros, o que mais a fascinava era um que tinha o título de Bailarina com ramo de flores.

Telma entrava então naquele cenário e juntava-se ao corpo de baile. Vestia o fato em tons de amarelo esbatido, saia de tule querendo voar, sapatinhos de ponta cor de rosa e um ramo de flores na mão, o aroma do campo no ar quieto daquela sala.

E Telma bailava, bailava, esvoaçava pelo meio das outras bailarinas, tentando imitar os passos que elas davam, erguendo-se na ponta dos pés até mais não poder, até a dor ser mais forte que a vontade.

No fim do espectáculo, agradecia ao público que só ela via e que só a ela aplaudia.

Depois, quando se apanhava de novo no bosque, erguia-se quanto podia nas pontas dos seus sapatos de cetim e largava o sonho que escondia no peito. E imaginava-se pintura em movimento num quadro de Degas.

Ainda hoje ninguém entende, naquela casa, por que razão fugia Telma tanto para o bosque.

Também ninguém nunca entendeu o que fazia, no quarto de Telma, um grande ramo de flores campestres, eternamente frescas, pousado sobre a sua mesa de cabeceira.

Nem um par de sapatos de bailarina que pendia, em laços de cetim esbatidos pelo tempo, da cabeceira de sua cama.

Fonte:
LOPES, Maria Teresa. Histórias Que Acabam Aqui (ilustrações de Sara Costa). Edições ArcosOnline.com (www.arcosonline.com), abril de 2005.

Nilton Manoel (Cordel)

Você já leu algum folheto de Cordel? Não! Nas bancas de jornais e revistas, existem histórias interessantes.

O cordel chegou a Ribeirão Preto, com a Editora Melodias e com o trabalho de Rodolfo Coelho Cavalcante por todo o Brasil. O cordelista morando em Salvador, próximo ao Mercado Modelo, editava seus folhetos e vendia-os em varais, ao mesmo tempo em que editava o jornal Brasil Poético, escrevia no Folha do Subúrbio (Camaçari-BA) e presidia entidades literárias nacionais. Inspiração fértil, mais de 1.800 folhetos, entre eles A moça que bateu na mãe e virou cachorra com quase dois milhões de cópias vendidas. Quando colunista do Diário de Notícias Nilton Manoel divulgava bastante os folhetos Rodolfo... Falecido em 1.986, nossa cidade consagrou-lhe o nome de uma rua e confirmou a data de 12 de março, Dia Municipal da Literatura de Cordel.

O gênero é usado na prática pedagógica das escolas e tele-cursos. Ajuda na alfabetização infantil e adulta conforme estudos realizados por especialistas. A FTD tem o livro de Ruth Rocha e Ana Flora – Escrever e criar... é só começar... O PNLD diversas histórias e a Secretaria da Educação, Autores de Cordel, 1986. Na época dos conquistadores greco-romanos, fenícios, cartagineses e saxônicos, o Cordel já existia. No século XI, chegou a península Ibérica (Portugal e Espanha). Cordel é Cultura! Leia!Pesquise! Declame! Promova projetos de poesia e consagre espaço para os sua região. O Cordel está presente nos núcleos de língua-portuguesa do Japão, Holanda, França, USA e Brasil com destaque para a Biblioteca Nacional. Temos diversas arcádias entre elas a Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel e a Academia Brasileira da Literatura de Cordel.

O CORDEL NA HISTÓRIA

          A história remonta a séculos. O vocábulo foi registrado pela primeira vez no Dicionário Contemporâneo de Aulete em 1881. Não há como precisar uma data do surgimento desse tipo de literatura, embora proceda a informação de que herdamos dos colonizadores portugueses que primeiramente desembarcaram na Bahia; porém não foram os portugueses os seus únicos criadores. Eles a assimilaram de fontes diversas a partir da Península Ibérica – região localizada entre Portugal e Espanha – e a ela imprimiram uma marca própria.

       Ler Camões (1524-1580),Cervantes (1547-1616) e Castro Alves (1847-1871) ampliamos nossa conceituação sobre a arte. Vejamos:- Em Luiz de Camões acham-se elementos dessa Cultura; idem na obra de Miguel Cervantes e do poeta baiano Castro Alves.

      Em vários países hispano-americanos e europeus, como no Chile e na França, também são perceptíveis os sinais dessa literatura.

     O paraibano Leandro Gomes de Barros foi o principal expoente da arte cordelista no Brasil (texto do livro A presença dos cordelistas e cantadores repentistas em São Paulo, Ibrasa, Assis Ângelo).

O CORDEL RIBEIRÃOPRETANO

A produção de literatura de Cordel em Ribeirão Preto é pequena, mas constante. Temos bons poetas no gênero. A poética cordelista exige cuidados específicos.

O dia 12 de março é o Dia Municipal da Literatura de Cordel. O projeto 359/94 do vereador Cícero Gomes da Silva deu origem ]à Lei 6850/94 que homenageia Rodolfo Coelho Cavalcante, autor centenas de folhetos e palestras por todo o Brasil. Autor de sonetos, trovas e editor do jornal Brasil Poético. A constância literária deu-lhe homenagem pela Academia Brasileira de Letras por indicação de Jorge Amado. Diversos autores escrevem sobre Rodolfo.

CORDEL NAS ESCOLAS

    Nas escolas, a literatura de Cordel está em projetos didáticos e numa série de livros do PNLD:Língua Portuguesa (coleção Conhecer e Crescer) da Escala Educacional, 5º ano.2008, Língua Portuguesa, 4º ano,(projeto prosa,Editora Saraiva,2008.Na Semana Nacional do Folclore, o Cordel tem todos os espaços possíveis. A paulista Olímpia (SP), capital nacional do folclore, promove diversos eventos. A editora FTD na coleção Escrever e Criar é Só Começar, informa como se fazem folhetos de cordel. Encontramos hoje dezenas de outros autores com a poética do Cordel e a arte xilográfica.

No Brasil, pesquisadores apontam a literatura de Cordel como veio rico de educação, cultura e civismo. Temos núcleos de Cordel em vários países: na França, na Holanda, no Japão, em Portugal e USA, etc.

          Os franceses, pertencentes ao CNRS – Centre de Recherches Latino-americaines-Archivos (Poitier-Fr) pesquisam o Cordel. O mesmo ocorre com entidades brasileiras físicas e jurídicas; entre elas a Ordem Brasileira dos Poetas da Literatura de Cordel (BA) e a ABLC-Academia Brasileira de Literatura de Cordel (RJ).

A ABLC ressalta:– “Oriunda de Portugal, a literatura de Cordel chegou no balaio e no coração dos colonizadores, instalando-se na Bahia e mais precisamente em Salvador. Dali irradicou-se para os demais estados do Nordeste”.

       O verbete Cordel é polêmico e historiadores acreditam que a arte deveria ser conhecida como poesia popular ou poesia nordestina. O poema de cordel nordestino costuma trazer ilustrações xilográficas. Alguns deles fazem menções heráldicas e genealógicas.

OFICINA DE CORDEL

Material necessário:- papel sulfite A4, branco, para o livro e colorido para a capa.  Lápis de cor ou giz de cera, grampeador Carbex 26/6 ou cola.  Inspire-se! Seja criativo. Boa sorte.

A produção de um folheto de Cordel estimula o aluno à leitura, à escrita e a arte quando ilustra a capa ou a história por ele feita. Ainda a socialização do trabalho quando exposto em sala de aula ou pátio da escola.
O poema cordelista é um dos gêneros mais explorados na atualidade.

No aspecto material, o folheto em estilo nordestino é feito de uma folha de sulfite A 4 que, dobrada em quatro viram oito páginas. Seguindo nessa ordem 16,32...

 Os poetas gostam de explorar suas histórias em estrofes de seis versos (sextilhas ) ou sete versos (setilhas). As estrofes de seis versos (linhas) rimam apenas os versos 2ª,4º e 6ª e as setilhas: 2ª.4ª e 7ª e o 5ª com o 6º verso.Na metrificação os versos têm sete sílabas poéticas.

O poeta de Cordel é um mediador da cultura popular e erudita. Os produtores de Cordel adotam hoje a feitura em off set com fontes de micro-computadores (antigos tipos) de diversos formatos. As ilustrações são a cores (os folhetos da Luzeiro Editora) e as capas em papel encorpado. Nos bons tempos da geração mimeógrafo, poetas editavam com as letras da velha Remington 11. Os folhetos cordelistas exigem - como todo texto - a criatividade de seus autores. As histórias vão de 14 a 28 versos por página e multiplicam-se  por 8,16,32 etc. Quando o poeta tem fôlego, escreve uma história de  300 ou 400 versos, tranqüilamente;muito comum nos romances. Nos concursos literários pede-se de 32 a 64 estrofes. Se o folheto tem 4 estrofes de sete versos, somam-se 28 versos e multiplicando-se pelo número de páginas o total de versos de um folheto.

A literatura de Cordel está nas feiras e galerias comerciais. Nas grandes cidades, mesmo aquelas que falam de preservação histórica, o poeta de cordel, repentista e folhetinista, tem perdido o espaço das praças centrais com a interferência das fiscalizações municipais. Literatura de Cordel é Educação e Cultura.

 PRODUÇÃO DE FOLHETOS DE CORDEL

Solicitar da Biblioteca da escola folhetos ou livretos do gênero. No PNLD, Cordel adolescente, o xente (FTD) serve de orientação.Interpletar,comentar as ilustrações, ressaltar o titulo e autoria. Trocar   Escolher um tema e redigir no caderno o texto.Reescrever.Ler e avaliar o que foi feito.Depois escrevê-lo no livrinho de folha de sulfite

Quando estiver pronto, pegar meia folha de papel colorido A4 e fazer a capa ilustrada colocando o nome do autor, o titulo da história e ano de edição.

Feito isto, coloque o livrinho dentro da capa e grampeie ao meio duas vezes. O grampeador Carbex 26/6 tem a medida certinha para esse trabalho.

O professor recolhe os folhetos feitos como o  combinado. Escolhe um local para o varal de barbante e prende os folhetos com prendedores de roupa.

A diversificação de assuntos (temas) chamará a atenção dos leitores. Quando não existia jornal o Cordel fazia o papel de um jornal. Vamos ler um trecho do folheto Publicistas da Madrugada, de Nilton Manoel, 1981, Gráfica Brasil.

1
Ribeirão Preto...Onde está
a cidade onde eu nasci?
A província cheia de graça
já se perdeu por aí!
Em cada trecho um tapume
e historiadores sem ciúme
         da história que há por aqui.

2
Parece uma betoneira
nossa terrinha atual
É um reboliço confuso...
Tudo parece normal
a quem olhe indiferente
ao passado... O presente
será futuro afinal?

23
Vila Recreio, querida,
dos tempos da lamparina,
ainda o pó de suas ruas
é a mesma triste sina...
A lata a ponta de um pau
molha a rua...Num varal
seca a roupa de gente fina...

24
Terna e dura uma bisnaga
repleta de inspiração
desenha em muro sem reboco
Uma frase com emoção:
- Quem mais luta por seu dia,
vive de curta alegria
         temendo a falta do pão

Poemas antigos,nas bancas:
Publicistas da Madrugada
-A festa dos papagaios
-Mistérios do Campo Aberto
–––-
Em Ribeirão Preto, SP; 12 de março (homenagem a Rodolfo)  Dia Municipal da Literatura de Cordel (Dia de Civismo,Educação, Cultura e Cidadania)

 (Nilton  Manoel, especialista em Educação, pedagogo (administração e supervisão),contabilista, jornalista, fotografo. Pertence a rede estadual de ensino. Afiliado a Apeoesp e Udemo. Faz parte de entidades literárias.  Tem livros editados e prêmios recebidos)

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