domingo, 16 de fevereiro de 2014

Cecília Meireles (História de uma Letra)

Muita gente me pergunta se deixei de escrever o meu sobrenome com letra dobrada devido à reforma ortográfica; e quando estou com preguiça de explicar, digo que sim. Mas hoje tomo coragem, balanço-me a confessar a verdade, que talvez não interesse senão aos meus possíveis herdeiros.

A verdade nunca é simples, como se imagina. E em primeiro lugar, devo dizer que o meu sobrenome simplificado só vale na literatura. Nos documentos oficiais prevalece a forma antiga, e eu por mim gosto tanto da tradição que não me importava nada carregar um ípsilon, um th, todas as atrapalhações possíveis que enrugam e encarquilham um idioma.

Por outro lado, as reformas ortográficas são sempre tão arrevesadas que já perdi as esperanças de estar algum dia completamente em condições de escrever sem erros, descansando assim no tipógrafo e no revisor, que são os grandes responsáveis pelas nossas faltas e pelas nossas glórias. Não foi, portanto, por afeição às reformas que sacrifiquei uma letra do meu nome. A história é mais inverossímil.

Todos na vida atravessamos certas crises. Dever-se-ia mesmo escrever sobre a gênese, desenvolvimento, apogeu e fim das crises. Se uma pessoa está sem emprego, o natural é que se empregue. Se está doente, o natural é que morra ou se cure. Mas o fenômeno da crise é importante precisamente por ser o contrário do natural. De modo que se a pessoa está desempregada, não há maneira de arranjar emprego, e se está doente não há maneira de se curar, etc...

As crises são muito variadas. Há crises sentimentais, econômicas, de inspiração, de talento, de prestígio — e o povo classifica essa situação, que ele, em sua sabedoria, já observou, com o fácil nome de azar.

O azar não é lógico. Isso é que o torna desesperador. A pessoa sai de casa, bem com a sua consciência, com as faculdades mentais em perfeita ordem, os músculos, os nervos, tudo bem governado, atravessa a rua como um cidadão correto, observando o sinal, e quando chega do outro lado, apanha na cabeça um tijolo que um operário, inocente, deixou cair do sétimo andar de uma construção.

Naturalmente, todo o mundo tem refletido sobre as razões secretas dessas coisas inexplicáveis. E foi assim que, com o correr do tempo, se chegou à caracterização de um certo número de fatos e objetos que servem de prenúncio ao azar: espelhos quebrados, relógios parados, sal entornado na mesa, sapato emborcado, tesoura aberta, gato preto, mariposas, sexta-feira dia treze, mês de agosto, gente canhota e estrábica, vestido marrom, para só falar dos principais.

Penetrando mais no estudo de todas essas superstições, pessoas entendidas têm procurado explicá-las pelas correlações existentes com as crenças do paganismo, estas por sua vez baseadas no empirismo e na ignorância dos nossos antepassados, e assim por diante, o que não impede que as pessoas ainda hoje se benzam, quando bocejam, para que o Demônio não lhes entre pela boca; e não cruzem a mãos, quando se cumprimentam, para não atrapalharem algum matrimônio, e não se deitem com os pés para a rua, e não façam muitas outras coisas, só pelo medo das suas conseqüências ocultas.

Outras pessoas, igualmente entendidas, dão rumo diverso aos seus estudos, descobrem o entrelaçamento das causas e efeitos universais, chegam até a afirmar que tudo quanto nos acontece nesta encarnação é fruto remoto de encarnações anteriores, e respeitam o que diz um provérbio oriental — que o simples roçar da roupa de um passante, na nossa roupa, é indício de alguma proximidade de vidas, em tempos imemoriais.

E há os que seguem o caminho dos astros, e com uma circunferência, umas retas, uns planetas, uns cálculos, dizem e predizem os nossos destinos, com todas as suas inesperadas trajetórias.

E há os que lêem nas linhas das mãos, e contam as nossas viagens, os nossos padecimentos de fígado, o que vamos fazer daqui a vinte anos, e o minuto em que empalidece a nossa estrela...

Está claro que creio em tudo isso. Eu justamente creio em tudo. Creio até no contrário disso. A minha faculdade de crer é ilimitada. Não compreendendo por que as pessoas crêem numas coisas e noutras não. Tudo é crível. Principalmente o incrível. Não estou fazendo paradoxo. A vida é que já é por si mesma paradoxal, desde que seja vista não apenas pela superfície.

Ora, uma vez, todas as coisas começaram a correr contra mim. Fazendo a mais profunda e leal introspecção, estou bem certa de que não merecia tanto. Se punha roupa branca, chovia; se precisava ver a hora, o relógio estava parado; muitas coisas pequenas, assim e outras maiores, já com intervenção humana, e que, por isso, não é necessário contar.

Então, considerando que tal concordância de acontecimentos desagradáveis devia ter uma razão secreta, pus-me a procurá-la.

Ao contrário do que geralmente se faz, comecei por atribuir a mim mesma a razão dos meus males. É certo que todos temos muitos defeitos. Mas nunca me dei ao luxo de ter tantos que justificassem a conspiração que se fazia contra mim.

Admitida a minha inocência, passei ao exame das circunstâncias que por acaso estivessem sob a minha responsabilidade. Nem espelho partido nem vestido marrom nem gato preto nem número fatídico na porta.

E assim descendo de observação em observação, e consultando algum conhecido — e os nossos conhecidos sempre sabem essas coisas ocultas e se não nos ajudam com as suas luzes é pela timidez em não acreditarem o momento propício — passei a analisar o meu nome.

Esqueci-me de dizer que estava disposta a todos os despojamentos. Se a culpa fosse de algum mau sentimento, de alguma ação malvada, eu me castigaria energicamente. E até para me estimular recordava o exemplo daquela senhora americana que arrancou um olho e cortou a mão, convencida de que esses dois fragmentos do seu corpo estavam estragando a sua alma.

Foi nessa ocasião que me explicaram o valor cabalístico das letras, e a razão por que muitas pessoas mudam de nome, trocando aquele que lhes foi dado por outro em que haja uma combinação de valores mais favorável aos seus destinos.

Todos os conhecimentos têm uma profunda sedução. Quem conseguisse saber tudo ficava igual a Deus. Por isso é que muitos são de opinião que se saiba o menos possível, para não se ter a mesma sorte de Eva, que logo no princípio do mundo estragou o Paraíso com o pecado do saber.

Digo isto porque um tratado de biologia me atrai com a mesma força que um volume de ciências ocultas, e os números e as letras me parecem tão organizados, tão sensíveis, tão vivos, tão poderosos, enfim, como um animal, uma planta, um átomo.

Naturalmente, desmontei o meu nome, peça por peça, calculei, pesei, refleti, devo ter chegado a alguma conclusão de que já não me lembro, e não tenho a impressão de que os meus cálculos fossem assim desfavoráveis. Mas pelo sim, pelo não, como havia uma letra disponível, achei melhor sacrificar essa letra.

Há os que sacrificam os filhos, os carneiros, as aves, e há os que sacrificam o seu coração. Sacrifiquei o meu. Porque eu gostava de todas as minhas letras, fervorosamente. Ter de cortar uma, não foi assim coisa tão fácil como as reformas ortográficas ordenam. Uma letra é um signo, é uma coisa misteriosa que as gerações vêm carregando consigo, modificando de longe em longe, por mão inexperiente, por súbito esquecimento, por ignorância de algum escriba emprestado.

Deu-me um trabalho muito grande, ficar sem essa letra. Quando olhava para o meu nome sem ela, sentia como se me faltasse um pedaço, como se estivesse realmente mutilada, sem a mão ousem o olho. Consolava a letra perdida. Escrevia-a sozinha, do lado, sorria-lhe, contava-lhe coisas, para distraí-la. Tudo era muito infantil e muito triste. A pobrezinha ficava para trás, e dava-me saudade. Recapitulando estas coisas, sinto-me entristecer, e preciso recobrar a minha força de vontade para não alterar outra vez o sobrenome.

Afinal, como último trabalho convincente, estabelecemos este acordo. A letra não ficaria perdida: seria usada nos documentos oficiais, nesses lugares respeitáveis em que a firma é a garantia da nossa pessoa recebendo e pagando os lugares que nos vemos que merecem a consagração e a estima unânimes dos nossos colegas humanos.

Quanto às coisas literárias, essas efêmeras coisas pelas quais vamos morrendo dia a dia, não são assim de tal modo graves que precisem da firma autêntica, daquela firma por que os juízes nos podem perguntar um dia, brandindo um papel pavoroso e fulminante: "Dize, bandido, foste tu que assinaste este documento?" Não, as coisas literárias não chegam a esse ponto. O mais que nos pode acontecer é tirarem o nome que escrevemos no fim e substituírem-no por outro, sem juiz, sem fulminação, sem defesa...

Isto posto, a letra abandonada e eu nos abraçamos ternamente, e nos separamos. Como era uma letra suave, terá querido dizer com o seu romantismo: "Quero apenas que sejas menos infeliz. Acompanhei-te durante tanto tempo! Tiveste tanta dificuldade em aprender a escrever-me... Pensavas com inocência no mistério das letras dobradas... Sentias orgulho, na escola, por essa letra dobrada no nome... Mas talvez eu esteja pesando demais na tua vida. Não fiques triste. Adeus."

Fiquei muito triste. Faltava-me a letra. Já não era como se me faltasse um pedaço de mim, — mas, um parente, um amigo extraordinário.

A minha vida, porém, mudou tanto que, por mais saudade que me venha dessa letra perdida, não me animo a fazê-la voltar.

E está feita a confissão. Como se vê, uma história longa, que não se pode repetir a cada instante. Principalmente porque é uma história íntima, e ninguém deve cortar as letras do seu nome só por ter visto outras pessoas fazê-lo. E fica explicado para sempre que assino deste modo por motivos sobrenaturais, fantásticos, como quiserem, mas não pela reforma ortográfica, aliás muito cautelosa com os nomes próprios, respeitando-os tanto quanto me parece deverem ser respeitados, principalmente pelos mistérios que dentro deles vão navegando.

(Rio de Janeiro, A MANHÃ, 27 de dezembro de 1944.)

Fonte:
Cecília Meireles. Obra em prosa. Volume 1. RJ: Nova Fronteira, 1998.

Irmãos Grimm (Dona Ola)

Era vez uma viúva que tinha duas filhas — uma delas era bonita e trabalhadora, ao passo que a outra era feia e preguiçosa. Mas a mãe gostava mais da filha que era feia e preguiçosa, porque ela era sua filha própria; e a outra, que era filha do marido dela, era obrigada a fazer todo o trabalho doméstico, e como tal, era a Gata Borralheira da casa. Todos os dias a pobre garota tinha de sentar-se perto de um poço, que ficava à beira do caminho, e fiava e fiava até que seus dedos sangrassem.

E então aconteceu que um dia a bobina ficou manchada com o sangue dela, então ela mergulhou a bobina no poço, para remover as marcas de sangue; mas a bobina escorregou das suas mãos e caiu no fundo do poço. Ela começou a chorar, e correu até a sua madrasta e contou a ela o seu infortúnio. Esta porém, repreendeu-a com severidade, e foi tão impiedosa a ponto de dizer, "Como foi você que deixou a bobina cair dentro do poço, você deve pegá-la de volta."

Então a garota voltou até o poço, e não sabia como fazer isso; e como o seu coração estava aflito, ela pulou dentro do poço para pegar a bobina. Ela perdeu os sentidos; e quando acordou e voltou a si novamente, percebeu que estava num lindo campo onde o sol brilhava e milhares de flores estavam desabrochando. Ela começou a vagar pelo campo, e finalmente avistou um forno de padaria repleto de pães, e o pão gritava para ela, "Oh, me tire daqui! me tire daqui! ou eu vou me queimar; já estou assado há muito tempo!" Então ela se aproximou dele, e tirou todos os pães, um após o outro, com uma pá de pegar pães.

Depois disso, ela continuou andando até que encontrou uma árvore repleta de maçãs, que gritaram para ela, "Oh, chacoalhe o galho! chacoalhe o galho! porque nós estamos todas maduras!" Então, ela chacoalhou a árvore, até que caiu uma chuva de maçãs, e ela continuou chacoalhando até que todas tivessem caído, e quando ela tinha apanhado um montão delas, ela seguiu seu caminho.

Finalmente ela chegou numa casa pequenina, onde uma velhinha estava espiando; mas ela tinha dentes tão grandes que a garota ficou assustada, e teve vontade de fugir.

Mas a velhinha gritou para ela, "Do que você tem medo, minha menininha? Fique aqui comigo; se você fizer todo o trabalho de casa direitinho, você mostrará que é uma boa menina. Somente você deve tomar muito cuidado para arrumar bem a minha cama, e você deve sacudir bem forte até que as penas voem  —  e então é como quando a neve cai sobre a terra. Eu sou a Dona Ola."[1]

Como a velhinha falava de um modo tão gentil com ela, a garota tomou coragem e concordou em fazer o serviço. Ela fez todo o serviço para satisfação da velhinha, e sempre sacudia a cama dela com tanta força que as penas voavam por todo lado e caíam como flocos de neve. Então ela tinha uma vida agradável ao lado da velhinha; que nunca se zangava; e comia comida boa todos os dias.

Durante algum tempo ela ficou em companhia de Dona Ola, e depois ela começou a ficar triste. A princípio, ela não sabia qual era o problema que a aborrecia, mas aos poucos ela foi descobrindo que era saudade da sua casa: embora ela fosse mil vezes mais feliz aqui do que na sua casa, mesmo assim ela sentia uma grande vontade de estar lá. Por fim, ela acabou dizendo para a velhinha, "Estou com muita saudades de casa; e embora eu seja muito feliz aqui, não posso ficar mais; preciso voltar para a minha família."

Dona Ola disse, "Fico feliz que você sinta saudade da tua casa, e como você me serviu com tanta dedicação, eu mesma vou te levar de volta." Dito isto, ela pegou a menina pela mão, e a levou até uma porta muito grande. A porta estava aberta, e assim que a donzela estava passando bem debaixo dela, uma pesada chuva de ouro começou a cair, e todo ouro ficava colado no corpo dela, até que ela ficou completamente coberta do metal.

"Tudo isso será teu porque você é muito esforçada," disse a Dona Ola; e ao mesmo tempo deu de volta a ela a bobina que ela havia deixado cair dentro do poço. E então a porta se fechou, e a pequena donzela se viu deitada no chão, não muito distante da casa da sua madrasta.

E a medida que ela caminhava em direção ao quintal ela avistou um galo que estava pousado ao lado do poço, e gritou — "Cocoricó! A menina de ouro voltou para casa!" Então ela foi até sua mãe, e quando ela se aproximou toda coberta de ouro, ela foi bem recebida, tanto por ela como pela irmã.

A garota contou tudo o que aconteceu a ela; e assim que a mãe ficou sabendo como ela conseguiu tanta riqueza, ela ficou muito desejosa que a sua filha, feia e preguiçosa, tivesse a mesma sorte. A única coisa que ela tinha de fazer era ficar sentada ao lado do poço e fiar e fiar; e para que a bobina ficasse manchada de sangue, ela precisou encostar a mão num espinheiro para que seu dedo fosse picado. Depois, ela atirou a bobina dentro do poço, e em seguida pulou dentro dele.

Ela se viu então, no mesmo e belo campo, como a sua outra irmã, e percorreu os mesmos caminhos. Quando ela chegou perto da fornalha o pão gritou novamente, "Oh, me tire daqui! me tire daqui! ou eu vou me queimar; há muito tempo que já estou assado!" Mas a pequena preguiçosa respondeu, "Como se eu tivesse alguma vontade de me sujar!" e continuou seu caminho. Pouco depois, ela encontrou o pé de maçãs, que falou para ela, "Oh, chacoalhe o galho! chacoalhe o galho! As maçãs estão todas maduras!" Mas ela respondeu, "Eu gostaria de fazer isso! mas uma de vocês poderia cair na minha cabeça," e continuou andando.

Quando ela chegou à cada de Dona Ola ela não ficou com medo, porque ela já tinha ouvido falar dos dentes grandes que ela possuía, e logo começou a fazer todo serviço que precisava ser feito.

No primeiro dia ela se esforçou para trabalhar com dedicação, e obedecia à Dona Ola quando esta lhe pedia para fazer alguma coisa, pois ela estava pensando em todo ouro que a velhinha lhe daria. Mas no segundo dia ela começou a ficar com preguiça, e no terceiro dia com mais preguiça ainda, até que ela não queria mais levantar cedo de jeito nenhum. Ela nem sequer arrumava a cama de Dona Ola como deveria, e não sacudia a cama com força até que as penas começassem a voar.

Dona Ola então se cansou de tanta preguiça, e falou para ela para que se fosse dali. A menina preguiçosa estava mesmo querendo ir embora, e pensou que naquele momento uma chuva de outro começaria a cair. Dona Ola a conduziu até uma porta muito grande; mas quando ela estava bem debaixo da porta, ao invés de ouro uma chuveirada de piche caiu por todo seu corpo. "Esta é a recompensa pelos teus serviços," disse a Dona Ola, fechando a porta.

E então a menina preguiçosa foi para casa; mas ela estava totalmente coberta de piche, e o galo estava sentado ao lado do poço, e assim que ele viu a menina, exclamou — "Cocoricó! A menina cheia de piche chegou!" Mas o piche estava tão grudado no corpo dela, que não pode ser removido durante toda a sua vida.
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Nota
[1] É por isso que em Hesse, na Alemanha, quando cai neve, as pessoas dizem: "Dona Ola está arrumando a cama agora.”


Fonte:
Contos de Grimm

A Saudade em Versos Diversos IV

GERMANA FACUNDO
Saudades do que nunca viveu

Que saudades
Como pode alguém sentir saudades do que nunca houve
Como pode alguém sentir saudades do que nem viveu
É como estou hoje
Com saudades
Morrendo de saudades dos sonhos que criei
Chorando de saudades das horas que imaginei
Das histórias que sonhei
Hoje estou assim
Querendo que o tempo vá para onde eu quero
Para onde ele nunca esteve
Mas a saudade é tanta que me paralisa
É muita saudade
E nem aconteceu
E nada eu vivi
Como se pode sentir saudades de uma época que não existiu
De fantasias e de promessas que nunca se concretizaram
Por que sentir saudades de um futuro inventado
Quando há um presente imenso para se viver
Mas não se manda no coração
O coração é pretensioso e quase sempre faz o que quer
A razão até tenta dominar
Mas raramente consegue
E por causa do coração a gente faz um monte de besteira
E fica esperando, esperando
Esperando que tudo volte a ser como antigamente
Ou pior
Que tudo seja como criamos em nossos sonhos mais recorrentes.

CHARLES CHAPLIN
Se amanhã sentires saudades

Tua caminhada ainda não terminou
A realidade te acolhe
Dizendo que pela frente
O horizonte da vida necessita
De tuas palavras
E do teu silêncio.

Se amanhã sentires saudades
Lembra-te da fantasia
E sonha com tua próxima vitória
Vitória que todas as armas do mundo
Jamais conseguirão obter
Porque é uma vitória que surge da paz
E não do ressentimento.

É certo que irás encontrar situações
Tempestuosas novamente
Mas haverá de ver sempre
O lado bom da chuva que cai
E não a faceta do raio que destrói.

Tu és jovem
Atender a quem te chama é belo
Lutar por quem te rejeita
É quase chegar a perfeição
A juventude precisa de sonhos
E se nutrir de lembranças
Assim como o leito dos rios
Precisa da água que rola
E o coração necessita de afeto.

Não faças do amanhã
O sinônimo de nunca
Nem o ontem te seja o mesmo
Que nunca mais
Teus passos ficaram
Olhes para trás
Mas vá em frente
Pois há muitos que precisam
Que chegues para poderem seguir-te.

MÁRIO QUINTANA
Do Amoroso Esquecimento

Eu, agora - que desfecho
Já nem penso mais em ti
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?

Teófilo Braga (O Ovo e o Brilhante)

Recolhido no Porto

Havia uma mulher, que tinha uma filha e uma enteada. Estavam sozinhas em casa, uma sempre na cozinha, muito maltratada, e a outra sempre altiva e soberba na janela. Passou uma velhinha, e pediu se lhe davam alguma coisa. Disse a soberba:

– Vá-se embora, tia, que não há pão cozido.

A outra disse:

– Não tenho que lhe dar; só se for este ovo fresco que pôs agora a galinha.

E deu o ovo à velhinha. A velhinha quebrou-o, e dentro do ovo estava uma grande pedra preciosa, que era um brilhante; pegou nele e deu-o à menina:

– Trazei sempre essa pedra ao pescoço, que enquanto andares com ela haveis de ter todas as felicidades.

A pequena pôs a pedra ao pescoço. A irmã, com inveja, foi também buscar um ovo, e deu-o à velhinha.

Ela disse que o partisse pela sua mão; assim fez, e rebentou o ovo choco, que estava com mau cheiro e a cobriu de porcaria pela cara e pelas mãos.

A velhinha foi-se embora. Aconteceu passar por ali o rei, e viu aquela menina com a pedra ao pescoço, e achou-a tão linda, e ficou logo tão apaixonado, que a mandou buscar e casou com ela.

Ficou rainha; e como era boa, a madrasta e a irmã pediram-lhe para que as deixassem viver no palácio; deixou.

Um dia o rei foi para uma guerra, onde tinha de se demorar; a rainha ficou no palácio. Ora a madrasta, que já sabia do poder da pedra preciosa, confiava mais a filha com intuito de ver se lhe furtavam, até que um dia que ela estava no banho, e que a irmã lhe tinha ido botar o lençol, furtou-lhe a pedra sem ela saber.

Imediatamente ficou muito aflita, e a irmã mais a madrasta fugiram para irem ter com o rei, que estava na campanha, porque tinha a certeza que ele a tomaria por mulher.

Pelo caminho puseram-se a descansar e adormeceram. Passou uma águia e viu luzir a pedra, e de repente desceu e arrancou-a, e engoliu-a. Quando as mulheres continuaram o seu caminho, chegaram à barraca do rei, sem terem ainda dado pela falta da pedra.

Pediram licença para entrar, dizendo que era a mulher do rei que vinha visitá-lo, porque tinha muitas saudades. O rei conheceu quem eram, e mandou-lhes dar muita pancada e pô-las fora; foi então que a rapariga deu pela falta da pedra, e se colocou a fugir, e a mãe atrás dela.

Quando o rei chegou ao seu reino, veio a rainha ao seu encontro; mas como não tinha a pedra o rei não a conheceu, e disse:

– É uma tola como as outras. E escorraçaram-na.

Ela tornou para o palácio, e lá só a aceitaram para ajudar na cozinha. De uma vez estava-se a arranjar um grande jantar para o casamento do rei, e ela ao preparar uma águia, achou-lhe no papo uma grande pedra preciosa.

Guardou-a, e pediu ao dono para ir servir à mesa. Assim foi; pôs a pedra ao pescoço, e assim que entrou na sala, o rei conheceu-a e lembrou-se dela, e perguntou-lhe como é que aquilo tinha sido.

Ela contou-lhe tudo, e o rei sentou-a logo à sua direita, e a outra princesa foi-se embora.

Fonte:
Contos Tradicionais do Povo Português

Machado de Assis (Gazeta de Holanda) N.° 42 – 28 de dezembro de 1877

Eu cá, quando toda a gente
Chora ou treme de assustada,
Tenho um desejo veemente
De dar uma gargalhada.

E a razão, — se há razão nisto,
Não é senão porque é útil
Fazer deste mundo um misto
De terrífico e de fútil.

Outrora o teatro dava,
Ao riso afrouxando a rédea,
Depois de uma peça brava,
Uma farsa, uma comédia.

Acabado o Aristodemo,
Vinha uma ária do Martinho;
Ao fel que chorava o demo,
Ao fel que sucedia o vinho.

Eu não, eu misturo tudo,
De modo que cada grito,
Angustioso ou sanhudo,
Não nos traga um faniquito.

Ou então uso o contrário;
Quando é geral alegria
Solto o verbo funerário
E misturo a noite e o dia.

Para não irmos mais longe,
Ninguém dirá que passamos
Uma existência de monge,
Que rezamos, que choramos.

Antes vejo anunciados
Bailes de vários feitios,
Teatros abarrotados
De cristãos e de gentios.
Malgrado o sol e a poeira,
Corridas de bons cavalos;
Toda uma cidade inteira
Brincando sem intervalos.

Pois é justamente agora
Que eu, por integrar a vida,
Deito a vista para fora,
Desordenada, insofrida.

E, ao ver do lado do norte
Aquele pobre diabo
Que encontrou comprida morte
Onde torce a porca o rabo;

Que foi com rara presteza,
Agarrado, arrebatado,
E com toda a ira acesa,
Crucificado e esfolado;

Vingando a sorte, vingando
Aquela porca mesquinha
Que, em suas roças entrando,
Foi morta e não foi rainha;

E, ao lado do sul, a dama
Que à preta engolir fazia,
Não garoupa sem escama,
Nem doce, nem malvasia;

Mas comidas singulares,
Não feitas por encomenda,
E a beber com tais manjares
Vinho de outra pipa horrenda;

E se a boca recusava
O petisco enjoativo,
Tição aceso lhe dava
Novo e forte aperitivo;

Sem contar a bordoada,
Que as rijas carnes alanha,
E era a música obrigada
Daquela ceiata estranha;

Às pressas trago estas duras
Histórias com que tempero
As folias e aventuras,
E ato ao jovial o fero,

Para que, quando tomarmos
No Pascoal alguma cousa,
Ou algum colar mirarmos
Na loja do V. de Souza.

Digamos: — P’ra lá, menina,
Menina in-oitavo, in-fólio,
Dá cá tua mão divina
Ao teu amador Malvólio.

Fonte:
Obra Completa de Machado de Assis, Edições Jackson, Rio de Janeiro, 1937.
Publicado originalmente na Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, de 01/11/1886 a 24/02/1888.

Ricardo Kelmer (O Rio que não Gostava de Mudar)

Movimento significa contínua transformação, mudança, aprendizado. Significa evolução.

Isso nos faz lembrar da historinha sobre o sentido da vida. Ela diz que somos todos como o rio que vai descendo, procurando o melhor caminho. Podemos nos enganar muitas vezes mas isso fará parte do aprendizado e não da derrota. Podemos cansar de tudo e, deprimidos, querermos até desistir. Então, parados, transformamo-nos em lagos, para assim podermos provar a nós mesmos que estamos sozinhos e que o universo ao redor, com sua mania de movimento e transformação, não nos diz respeito e tudo que se dane.

No entanto, começa a cair uma chuvinha irritante que termina nos fazendo transbordar e lá vai o rio descendo novamente, seguindo caminho, inapelavelmente.

O rio, então, muda-se para um lugar onde não chove e ele possa continuar sua reclusão em paz, onde ele possa sofrer sozinho sem ninguém para lhe dar lições de moral. Mas aí, acaba descobrindo que aos poucos está se transformando em vapor, subindo para o céu e virando nuvem. Ele até pensa em aproveitar e seguir como uma nuvem até o polo sul, onde desceria como neve e ficaria como aquelas montanhas de gelo, solitárias e autosuficientes. Mas só de pensar no quanto teria de se transformar, desiste. Além do mais quem garante que até elas não evaporem mesmo com o sol fraco dos polos?

Achando aquilo tudo o cúmulo da aporrinhação e intromissão, o rio enfim decide esconder-se numa caverna profunda, a mais profunda que houvesse, no centro do planeta, onde enfim pudesse ser um pequeno lago, eternamente tranquilo e sem ninguém a lhe dar conselhos sobre evolução e transformação. Foi um esforço tremendo. Teve que primeiro transformar-se em chuva e umedecer bem as rochas, depois penetrá-las e descer por dentro delas, tendo sempre que buscar reforço quando o calor ameaçava estragar tudo. Pensou várias vezes em desistir mas aquilo era sua única saída. Sabia que talvez levasse toda a vida provando sua tese mas valeria a pena. Por fim terminou conseguindo. Virou um lago no fundo da caverna mais profunda. Mostrou ao mundo que podia ficar deprimido e desistir de tudo, tinha esse direito de não querer seguir em frente, de não querer se transformar.

Então, completamente exausto, sorriu satisfeito e morreu. E a morte veio saudar-lhe com todas as honras. Afinal, um rio que dedicou sua vida inteira a se transformar no lago mais distante da mais profunda caverna, e conseguiu, é mesmo um rio bem especial. Um rio que captou como nenhum outro que a evolução é o sentido da vida.

Moral da história: tudo se transforma, cada um a seu modo, ainda que insista em não se transformar. Porque somos a própria evolução.

Fonte:
KELMER, Ricardo. Quem Apagou a Luz?.

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Outros Contistas: Ricardo Kelmer

      
      Ricardo Kelmer (Fortaleza, 1964) estreou como cronista de jornal em 1994 e no ano seguinte publicou o primeiro livro. Cursou Letras e Comunicação Social e foi redator de publicidade. Livros publicados: Quem apagou a Luz?, ideias espiritualistas,1995; O irresistível charme da insanidade, romance, 1996; Guia Prático de sobrevivência para o final dos tempos, contos, 1997; Baseado nisso – viagem pelo universo folclórico da maconha, contos; Matrix: o segredo dos predestinados, artigos, 2003;  A arte zen de tanger caranguejos, crônicas, 2003; Matrix e o despertar do herói, 2005; Blues da vida crônica, crônica, 2006, e Guia do Escritor independente.

            Em Guia prático de sobrevivência para o final dos tempos, Ricardo Kelmer reuniu nove narrativas, quase todas longas. Trata-se de uma literatura diferente da que se vem publicando no Brasil, sobretudo nos gêneros conto e romance. Na obra de Ricardo não se vê nada de violência urbana, infância desamparada, miséria, favelização das cidades, etc, temas tão caros à maioria dos escritores brasileiros desde os anos 1970. Para ele a “realidade” se encontra muito longe disso. Seus personagens convivem com íncubos, demônios, princesas perdidas em bosques e sonhos, mortos que vivem em outras dimensões, bichinhos invisíveis, etc.

                Em “O íncubo” o narrador onisciente fala a uma mulher ideal, faz suposições, usa muitas vezes os verbos no futuro, como se fizesse a defesa do íncubo, que estaria nos sonhos de todas as mulheres. No final observa: “Lera certa vez alguma coisa sobre demônios que invadem o sono das mulheres para copular com elas, lendas medievais.” Temas como esse reaparecem em outras peças do livro. Em “Quando os homens não voltam para casa”, um casal – Luciane e Junior – vive uma história inteiramente insólita: o homem deixa uma carta para a moça, desaparece e... A carta narra uma estranha sequência de fatos: a aquisição de um quadro em que uma princesa posa diante de um lago, um sonho, uma briga do casal, outros sonhos. Lida a missiva (ponto de vista de Junior), se inicia (ou se completa) a narração, por narrador onisciente, de uma série de fatos, com o surgimento de outros personagens e o desfecho misterioso.

                Esse clima de mistério aparece em todas as narrativas do livro. Em “O presente de Mariana” o leitor deparará o mundo do espiritismo, dos transes, dos orixás. No belíssimo “Há algo de podre no 202” (o conto não merece este título), veem-se o amor de duas meninas, a sequência da vida delas, a separação, o reencontro (já moças), a morte de uma delas, e, sobretudo, os misteriosos seres que atormentavam a narradora. História terna e, ao mesmo tempo, chocante.

                Não há como negar a vocação de Kelmer para o fantástico. Não o realismo mágico dos hispano-americanos, mas o fantástico puro ou mais próximo do absurdo. Em “O cilindro da luz azul” o leitor poderá até vislumbrar nele uma alegoria, uma sátira às sociedades totalitárias, como o fizeram Aldous Huxley, George Orwell, Anthony Burgess e outros. O povo é dividido em categorias: desobedientes, destoantes, resistentes, etc. Ao surgirem uns cilindros nas areias das praias, o leitor percebe que não se trata de literatura de protesto e pode até pensar em ficção científica. Entretanto, no final verá que o conto nada tem nem de uma coisa nem de outra. Mas Kelmer também pratica ficção científica, como em “Pequeno incidente em Hukat”.

                As tramas de Ricardo Kelmer se desenrolam quase sempre em espaços irreais ou imaginários. Uma das poucas histórias em que os personagens se movimentam em espaço real é “A vertigem”. Em Quixadá, cidade do sertão cearense, vive seo Pepeu, um velho aloucado que conversa com uns “bichinhos”, seres invisíveis, pequenos demônios. Também a cidade de Fortaleza é palco de outra narrativa: “Crimes de Paixão”, que destoa das demais, por seu realismo urbano.

                Em algumas composições, mundos opostos – o real e o irreal – se mesclam. Luciene de “Quando os homens não voltam para casa” trabalha num escritório, mora em apartamento, vive numa cidade grande. Outra “realidade”, no entanto, se manifesta no mundo pintado num quadro de sua casa. A cidade de “Cilindro azul” é absolutamente irreal, fantasmagórica.

                Ricardo se vale dos mais variados recursos expressivos. Em algumas peças utiliza somente a narração. Em outras intercala, como se tem feito ao longo dos tempos, diálogos (ainda com travessão) à narração. A linguagem coloquial das falas, com seus erros gramaticais comuns, ele a usa com muita frequência. Há um conto – “O strip-tease”– constituído somente de diálogo. Não há, portanto, em sua literatura, insubordinação de linguagem, como se pode ver em Jorge Pieiro. Pelo contrário, Ricardo Kelmer cultiva as formas tradicionais de contar. Mas isto não desmerece a sua arte.   

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

Erros Comuns em Redação II

51.
Chegou "a" duas horas e partirá daqui "há" cinco minutos.

Há indica passado e equivale a faz, enquanto a exprime distância ou
tempo futuro (não pode ser substituído por faz):

Chegou há (faz) duas horas e partirá daqui a (tempo futuro) cinco minutos.
O atirador estava a (distância) pouco menos de 12 metros.
Ele partiu há (faz)pouco menos de dez dias.


52.
Blusa "em" seda.

Usa-se de, e não em, para definir o material de que alguma coisa é feita: Blusa de seda, casa de alvenaria, medalha de prata, estátua de madeira.

53.

A artista "deu à luz a" gêmeos.

A expressão é dar à luz, apenas:

A artista deu à luz quíntuplos.

Também é errado dizer: Deu "a luz a" gêmeos.

54.
Estávamos "em" quatro à mesa.

O em não existe:

Estávamos quatro à mesa.
Éramos seis.
Ficamos cinco na sala.

55.
Sentou "na" mesa para comer.

Sentar-se (ou sentar) em é sentar-se em cima de.

Veja o certo:
Sentou-se à mesa para comer.
Sentou ao piano, à máquina, ao computador.

Fonte:
www.info-vest.com.br

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Acruche Collection - Trova 22


José Roberto Balestra (Autofágico)

(miniconto em três capítulos)

Capítulo I:

Era de câncer.

Capítulo II

Comeu caranguejo.

Capítulo III - Final

Morreu.
-----------------------
José Roberto Balestra é jornalista, de Maringá/PR

Fontes:
Imagem by www.antares.com.br
http://zerobertoballestra.blogspot.com.br/2011/01/tragediautofagica.html

2º Prêmio de Trovas Humorista Chico Anísio/2013 – UBT-Maranguape (Resultado Final) 3a. Parte, final

ÂMBITO: ESTADUAL

TEMA: Personagens de Chico Anysio

(Trovas Humorísticas)

TROVAS VENCEDORAS

VENCEDORES

1º. Lugar:


Pra contar uma potoca
Pantaleão não se aperta
Sem milho já fez pipoca
Quem quiser pergunte a Terta.
HORTÊNCIO PESSOA
Fortaleza/CE

2º. Lugar:


Nazareno bem parece
Mas, de besta nada tem.
Sua mulher, sempre esquece,
Pra paquerar, a de alguém.
ABELARDO NOGUEIRA XAVIER
Aracoiaba/CE

3º. Lugar:


Cuidado, Brasil querido,
Pra não cair na besteira
De ser, de novo, iludido
Por Eike "Canavieira"!
NEMÉSIO PRATA CRISÓSTOMO
Fortaleza/CE

MENÇÕES HONROSAS

4º. Lugar:


Por não gostar da pobreza
Justo Veríssimo diz:
sem o voto da pobreza
fui eleito e sou feliz...
GUTEMBERG LIBERATO DE ANDRADE
Fortaleza/CE

5º. Lugar:


O Coronel Limoeiro
Leva chifre com certeza
Sempre diz ao mundo inteiro
Cadê Maria Tereza?
MARIA RUTH BASTOS A BRANDÃO
Maranguape/CE

 

6º. Lugar:

Azambuja, um trambiqueiro,
Conhecido por machão,
Ao lograr um motoqueiro
Sua fama foi ao chão.
ANA MARIA NASCIMENTO
Aracoiaba/CE

MENÇÕES ESPECIAIS

7º. Lugar:


Justo Veríssimo é,
O retrato verdadeiro
Do sujeito de má fé,
Chamado politiqueiro.
ABELARDO NOGUEIRA XAVIER
Aracoiaba/CE

8º. Lugar:

 

O primo rico se orgulha
Pela fartura que tem
E o primo pobre mergulha
Na classe do Zé-Ninguém.
RAIMUNDO RODRIGUES DE ARAÚJO
Maranguape/CE

9º. Lugar:

 

Painho pediu penico
Quase que descadeirou
Porque na casa do Chico
Privada não encontrou.
HORTÊNCIO PESSOA
Fortaleza/CE

DESTAQUES

10º. Lugar:


Justo Veríssimo, diz:
que não gosta de pobreza,
quando vê um infeliz
dobra esquina, com certeza...
GUTEMBERG LIBERATO DE ANDRADE
Fortaleza/CE

11º. Lugar:


Hoje clamo ao Deus Altíssimo
Pra livrar nossa Nação
Da praga "Justo Veríssimo",
Causa do mal "Mensalão"!
NEMÉSIO PRATA CRISÓSTOMO
Fortaleza/CE

12º. Lugar:


O primo pobre procura
O primo rico-abonado
Conta a sua desventura
Sai sempre desconfiado.
RAIMUNDO RODRIGUES DE ARAÚJO
Maranguape/CE

ÂMBITO: INTERNACIONAL EM LINGUA HISPANICA

TROVAS CLASIFICADAS

TEMA: SONRISA (S) [L/F]

VENCEDORES

 

1º. Lugar:

Si quieres la puerta abierta
ten presente esta premisa:
todo éxito se concierta
siempre con una sonrisa.
MARÍA ELENA ESPINOSA MATA
San Nicolás De Los Garza/Nuevo León/  México

2º. Lugar:

 

Tu sonrisa me fascina
invitándome a soñar.
Eres imagen divina
que me cautiva mirar.
MARÍA CRISTINA FERVIER
Salto Grande/ Provincia Santa Fe/ARGENTINA

3º. Lugar:


En el niño la sonrisa
es un reflejo del cielo,
es como la suave brisa...
es ver a DIOS, sin un velo.
MAGUI DEL MAR (MARGARITA RUIZ)
Tijuana/Baja California/México.

Menciones Honrosas

4º. Lugar:


Si quiere tener salud
y gozar de larga vida
la sonrisa es la actitud
que sana cualquier herida.
HÉCTOR JOSÉ CORREDOR CUERVO
Bogotá DC./Colombia

5º. Lugar:


Pienso en Dios y su sonrisa
ilumina la mañana,
y en mi mente se improvisa
un salmo que lo engalana.
GISELA CUETO LACOMBA (CUBA)
Union City/New Jersey/USA.

6º. Lugar:


Como amor de amanecer
Siento tu beso de brisa,
y enciendes todo mi ser
con el sol de tu SONRISA.
TERESA DE JESÚS RODRÍGUEZ LARA
San Cristóbal de La Laguna/ Islas Canarias/España

Menciones Especiales

7º. Lugar:


Hay sonrisas seductoras
que nos llenan de pasión,
tan pícaras, tentadoras,
que al beso es invitación.
CATALINA MARGARITA MANGIONE (MARGA MANGIONE)
Berazategui/ Buenos Aires/Argentina

8º. Lugar:


Soy amiga de las risas
y me gusta ser así.
Si repartes mil sonrisas
ellas volverán a ti.
FABIANA PICEDA
Florencia (Santa Fe) /Argentina

9º. Lugar:

 

Tu sonrisa prende luces
en tus ojos por hermosos,
estrellitas que conduces
si me miran silenciosos.
STELLA MARIS TABORO
San Jorge/ Provincia Santa Fé/Argentina

Destacas

10º. Lugar:

 En el rostro una sonrisa
demuestra dulzura y paz;
si en tu cara se entroniza,
donde vayas la hallarás.
HILDEBRANDO RODRÍGUEZ
Mérida/ Mérida/Venezuela

11º. Lugar:


La sonrisa fue el oficio
que sublimaste con arte,
Dios te guarde Chico Anisio
en una estrellita aparte.
ALMENDRA VICTORIA AGUIRRE
San Fernando/Buenos Aires/Argentina

12º. Lugar:


El valor de la sonrisa
solo es dable comparar
con el soplo de la brisa,
con la eternidad del mar.
MARÍA ROSA RZEPKA
Fcio Varela/ Provincia de Buenos Aires/Argentina

Irmãos Grimm (O Ganso de Ouro)

Era uma vez um homem que tinha três filhos. O mais moço era chamado de Dummling[1] — mais conhecido como João Bocó, pois todos achavam que ele era mais do que a metade de um tolo, — e ele era o tempo todo zombado e mal tratado por todos da casa.

Aconteceu que o filho mais velho cismou de ir à floresta para buscar lenha, e a sua mãe lhe deu um bolo delicioso e uma garrafa de vinho para ele levar, para que ele pudesse se refrescar e se alimentar durante o trabalho.

Quando ele entrou na floresta, um pequeno velhinho cinzento lhe disse bom dia, e falou:

— Será que você poderia me dar um pedaço de bolo que você tem no prato, e um pouco de vinho da sua garrafa, porque estou com muita fome e sede. Porém, este jovem e esperto rapaz respondeu:

— Dar a você o bolo e o vinho que trago comigo? Não, obrigado, eu não tenho o suficiente para mim mesmo. E foi embora.

Logo ele começou a derrubar uma árvore, mas não tinha dado senão algumas machadadas quando ele errou o golpe, e se cortou, e foi obrigado a ir para casa para cuidar do ferimento.

Ora, tinha sido o pequeno velhinho que fizera ele cometer este acidente.

Em seguida, o segundo filho saiu para trabalhar, e sua mãe lhe deu também um pedaço de bolo e uma garrafa de vinho. E o mesmo velhinho encontrou-se com ele também, e lhe pediu algo para comer e para beber.

Mas ele também se achava muito esperto e falou:

— Quanto mais você comer, menos sobra para mim: então vá embora! O pequeno velhinho pensou que ele também teria a sua recompensa, e no segundo golpe que ele deu contra a árvore, ele errou o alvo e acertou bem na perna, então ele foi obrigado a ir para casa.

Então João Bocó disse:

— Pai, eu gostaria de ir para cortar lenha também. Mas o seu pai respondeu:

— Os seus dois irmãos machucaram as pernas, seria melhor que você ficasse em casa, pois você não sabe nada sobre esse negócios de cortar lenha.

Mas João Bocó era muito teimoso, e finalmente seu pai concordou:

— Vai então! Você ficará mais esperto quando você sofrer por causa da sua tolice. E a sua mãe deu a ele somente um pouco de pão seco e uma garrafa de cerveja choca. Mas quando ele entrou na floresta, ele encontrou o pequeno velhinho que lhe disse:

— Me dê um pouco de comida e de bebida, pois estou com muita fome e sede.

João Bocó disse:

— Eu tenho apenas pão seco e cerveja choca; se isso for bom para você, poderemos sentar para comer tudo que temos, juntos.

Então eles se sentaram e quando o rapaz pegou o pão para comerem, eis que ele se transformou num bolo delicioso: e a cerveja que estava choca, ao saboreá-la, havia se transformado em vinho finíssimo. Eles comeram e beberam com satisfação, e quando haviam acabado, o pequeno homem disse:

— Como você tem um bom coração, e teve a alegria de dividir tudo comigo, eu lhe darei uma bênção. Alí está uma árvore velha, corte-a e você encontrará algo embaixo de suas raízes. Então, ele pediu licença e continuou o seu caminho.

João Bocó pôs-se a trabalhar, e derrubou a árvore; e quando ela caiu, ele encontrou, em buraco debaixo das raízes, um ganso com penas de puro ouro. Ele pegou o ganso, e foi em direção a uma pequena estalagem à beira do caminho, onde ele pensou dormir durante a noite antes de retornar para casa.

E aconteceu que o estalajadeiro tinha três filhas, e quando elas viram o ganso, elas ficaram muito curiosas para saber, como era maravilhosa aquela ave, e queriam muito retirar uma das penas do rabo do ganso. Por fim, disse a mais velha:

— Eu quero e vou conseguir uma pena. Então ela esperou até quando João Bobo foi dormir, e então segurou o ganso pela asa, mas para sua grande surpresa ela ficou grudada, pois nem sua mão, nem seus dedos conseguiam se soltar.
   
Depois veio a segunda irmã, e pensou em pegar uma pena também, mas no momento que ela tocou a sua irmã, ela também ficou grudada.

Finalmente veio a terceira irmã, e ela também queria uma pena, mas as duas outras gritaram:

— Se afaste, pelo amor de Deus, se afaste!

Todavia, ela não entendeu o que elas queriam dizer.

— Se elas estão lá, pensou ela, eu também posso ir lá. Então ela foi até elas, mas no momento que ela tocou as suas irmãs ela ficou grudada, e presa ao ganso, como elas tinham ficado. E então elas fizeram companhia para o ganso a noite toda no relento.

Na manhã seguinte João Bocó levantou-se e colocou o ganso debaixo de seus braços. Ele não percebeu de modo nenhum as três garotas, mas saiu com elas penduradas bem atrás dele. Então, toda vez que ele corria, elas eram forçadas a segui-lo, quer elas quisessem ou não, tão rápido quanto suas pernas pudessem correr.

No meio de um campo um pastor os encontrou, e quando ele viu o cortejo, ele disse:

— Vocês não se envergonham de si mesmas, suas garotas atrevidas, correr atrás de um jovem rapaz dessa maneira pelos campos? Esse é um comportamento digno?

Então ele pegou a mais jovem delas pela mão para levá-la embora, mas, assim que a tocou ele ficou preso imediatamente, e seguia o cortejo, embora totalmente contra a sua vontade, pois não estava ele em boa forma para correr tão depressa, e exatamente, naquele momento ele sentiu uma pequena agulhada no dedão do seu pé direito.

Foram andando e encontraram um sacristão, e quando ele viu o seu amo, o pastor, correndo atrás de três garotas, ele ficou espantado e disse:

— Calma aí, senhor reverendíssimo, para onde vais com tanta pressa? Tem um batizado hoje?

Ele ele correu e tocou na sua roupa, e eis que ele ficou grudado também.

Enquanto os cinco estavam assim marchando rapidamente, um atrás do outro, eles encontraram dois camponeses que vinham do trabalho com suas enxadas, e o pastor gritou com toda sua força para que eles o ajudassem. Porém, mal eles tocaram as mãos no pastor, quando também ficaram na fila, e daí eles já eram sete, todos correndo juntos atrás de João Bocó e do seu ganso.
   
Ora, João Bocó pensou que ele gostaria de fazer um pequeno passeio antes de ir para casa, então ele e os seus acompanhantes o seguiram, até que finalmente chegaram numa cidade onde havia um rei que tinha somente uma filha.

A princesa era pessoa tão séria e mal humorada que ninguém conseguia fazê-la rir, e o rei havia mandado falar para todo o mundo, que aquele que conseguisse fazê-la rir a teria por esposa.

Quando o jovem rapaz soube disso, ele foi até ela, com o seu ganso e todos os seus acompanhantes, e assim que ela viu os sete presos uns nos outros, e correndo juntos, e pisando um no calcanhar dos outros, ela não conseguiu segurar uma longa e barulhenta gargalhada.

Então João Bocó reivindicou a sua esposa, e se casou com ela, e ele se tornou herdeiro do reino, e viveu durante muito tempo e feliz com a sua esposa.

Mas o que aconteceu com o ganso e o rabo do ganso, isso eu nunca fiquei sabendo.
================
Nota
[1] Em algumas versões desta história, o filho mais novo se chamava Simpleton


Fontes:
Contos de Grimm
ilustração de L. Leslie Brooke, (1905)

Cecília Meireles (Chuva com Lembranças)


Começam a cair uns pingos de chuva. Tão leves e raros que nem as borboletas ainda perceberam, e continuam a pousar, às tontas, de jasmim em jasmim. As pedras estão muito quentes, e cada gota que cai logo se evapora. Os meninos olham para o céu cinzento, estendem a mão — e vão tratar de outra coisa. (Como desejariam pular em poças d'água! — Mas a chuva não vem...)

Nas terras secas, tanta gente, a esta hora, estará procurando também no céu um sinal de chuva! E, nas terras inundadas, quanta gente a suspirar por um raio de sol!

Penso em chuvas de outrora: chuvas matinais, que molham cabelos soltos, que despencam as flores das cercas, entram pelos cadernos escolares e vão apagar a caprichosa caligrafia dos exercícios.

Chuvas de viagens: tempestades na Mantiqueira, quando nem os ponteiros dos para-brisas dão vencimento à água; quando apenas se avista, recortada na noite, a paisagem súbita e fosfórea mostrada pelos relâmpagos. Catadupas despenhando sobre Veneza, misturando o céu e os canais numa água única, e transformando o Palácio dos Doges num imenso barco mágico, onde se movem, pelos tetos e paredes, os deuses do paganismo e os santos cristãos. Chuva da Galiléia, salpicando as ruas pobres de Nazaré, regando os campos virentes, toldando o lago de Tiberíades coberto ainda pelo eterno olhar dos Apóstolos. Chuva pontual sôbre os belos campos semeados da França, e na fluida paisagem belga, por onde imensos cavalos sacodem, com displicente orgulho, a dourada crina...

Chuvas antigas, nesta cidade nossa, de perpétuas enchentes: a de 1811, que, com o desabamento de uma parte do morro do Castelo, soterrou várias pessoas, arrastou pontes, destruiu caminhos e causou tal pânico que durante sete dias as igrejas e capelas estiveram abertas, acesas, com os sacerdotes e o povo a implorarem a misericórdia divina. Uma, de 1864, que Vieira Fazenda descreve minuciosamente, com árvores arrancadas, janelas partidas, telhados pelos ares, desastres no mar e “vinte mil Lampiões da iluminação pública completamente inutilizados”.

Chuvas modernas, sem trovoada, sem igrejas em prece, mas com as ruas igualmente transformadas em rios, os barracos a escorregarem pelos morros, barreiras, pedras, telheiros a soterrarem pobre gente. Chuvas que interrompem estradas, estragam lavouras, deixam na miséria aqueles justamente que desejariam a boa rega do céu para a fecundidade de seus campos.

Por enquanto, caem apenas algumas gotas daqui e dali. Nem as borboletas ainda percebem. Os meninos esperam em vão pelas poças d'água onde pulariam contentes. Tudo é apenas calor e céu cinzento, um céu de pedra onde os sábios e avisados tantas coisas liam outrora:

"São Jerônimo, Santa Bárbara Virgem,
lá no céu está escrito, entre a cruz e a água benta:
Livrai-nos, Senhor, desta tormenta!”

Fonte:
Quadrante 2. RJ: Editora do Autor, 1963.

A Saudade em Versos Diversos III


ARNALDO JABOR
Volta


Existe gente que precisa
Da ausência para querer a presença
O ser humano não é absoluto
Ele titubeia, tem dúvidas e medos
Mas se a pessoa realmente gostar, ela volta
Nada de drama.

FLORBELA ESPANCA
Saudades


Saudades!
Sim... Talvez...
E porque não?
Se o nosso sonho foi tão alto e forte.
Que bem pensara vê-lo até à morte.
Deslumbrar-me de luz o coração!
Esquecer! Para quê?
Ah! Como é vão!
Que tudo isso, amor, nos não importe.
Se ele deixou beleza que conforte.
Deve-nos ser sagrado como o pão!
Quantas vezes, amor, já te esqueci,
Para mais doidamente me lembrar
Mais doidamente me lembrar de ti!
E quem dera que fosse sempre assim:
Quanto menos quisesse recordar
Mais a saudade andasse presa a mim!

ÁLVARO DE CAMPOS
Mesma saudade


Sou eu, eu mesmo, tal qual resultei de tudo
Espécie de acessório ou sobressalente próprio
Arredores irregulares da minha emoção sincera
Sou eu aqui em mim, sou eu
Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou
Quanto quis, quanto não quis, tudo isso me forma
Quanto amei ou deixei de amar é a mesma saudade em mim...

CLARICE LISPECTOR
Sentimento urgente


Saudade é um pouco como fome
Só passa quando se come a presença
Mas, às vezes, a saudade é tão profunda
que a presença é pouco
Quer-se absorver a outra pessoa toda
Essa vontade de um ser o outro
para uma unificação inteira
É um dos sentimentos mais urgentes
que se tem na vida.

MACHADO DE ASSIS
Dever de amor


Guarda estes versos que escrevi chorando
Como um alívio a minha saudade
Como um dever do meu amor
E quando houver em ti um eco de saudade
Beija estes versos que escrevi chorando.

VITAL FARIAS
Ai Que Saudade d´Ocê

 

Não se admire se um dia
Um beija flor invadir
A porta da sua casa
Te der um beijo e partir
Fui eu que mandei o beijo
Que é pra matar meu desejo
Faz tempo que eu não te vejo
Ai que saudade d´ocê

Se um dia ocê se lembrar
Escreva uma carta pra mim
Bote logo no correio
Com frases dizendo assim
Faz tempo que eu não te vejo
Quero matar meu desejo
Lhe mando um monte de beijos
Ai que saudade sem fim

E se quiser recordar
Aquele nosso namoro
Quando eu ia viajar
Ocê caia no choro
Eu chorando pela estrada
Mas o que eu posso fazer
Trabalhar é minha sina
Eu gosto mesmo é d´ocê.

Não se admire se um dia
Um beija flor invadir
A porta da sua casa
Te der um beijo e partir
Fui eu que mandei o beijo
Que é pra matar meu desejo
Faz tempo que eu não te vejo...
Ai que saudade d´ocê .

Ray Silveira (Lúcidos delírios)

   
    Ultimamente andava dormindo demais. Não me preocupava. O sono ambulante deixa de ser metáfora da morte para se tornar hipérbole de vida. Nesta noite, porém, uma chuva me despertou em plena caminhada. Abrolhos. Tento fugir me abrigando sob uma marquise. Os fios de água me perseguem. Enviaram uma ventania para me encontrar. Sem alternativas, deixo-me molhar e me ponho a refletir a luz da verdade. Enquanto isso, a chuva chapinhava chorosa girandolando, a seguir, sobre a chapa cheia d’água de um ralo de esgoto. Não tenho futuro, nem presente, nem particípio passado. Vivo no próprio passado. Não naquele que suscita ressuscitações de acontecências agradáveis nos normais e nos poetas. Nem sou obcecado por pretéritas peripécias ou por maus influxos da infância, como sucede com os doentes d’alma. Minha agoridade é cada instante sofrido no ontem acontecendo, de fato, de novo. Continuamente. Não me queixo, não busco consolo, nem sinto autopiedade. De fato, existem pessoas vivendo o seu presente e sofrendo tanto quanto eu. Hoje não é hoje, e sim um dia tal de um mês qualquer de um ano que já houve. Contudo, tudo se passa agora, outra vez. Alguns desses pós-aconteceres são frutos privativos meus e não há como aposentá-los por invalidez. Pois apesar de serem mais velhos do que eu, jamais foram adversados.
   
   O desastre é outro: não consigo me concentrar em apenas um deles. Fogem de mim, assim como fugi da chuva. A sensação de quem vai morrer daqui a pouco não é tão diferente da de quem vai morrer daqui a muito. Todos acreditam num fim remoto (com ou sem controle), e esperam suceder algo de bom antes da morte. Curiosa esperança! Parece que a consciência - aquele atributo que dizem servir para distinguir um homem de um animal - não passa de um instinto em plena seleção natural, no estrito sentido darwiniano da expressão. Não há melhor explicação para a tolerância dos humanos à expectativa do aniquilamento total. Se assim for, não fica difícil prenunciar a extinção da espécie humana, através de suicídios em massa, enquanto a consciência avançar para a sua completude evolutiva.

       Comparo o tempo que me resta de vida com a vida restante na Terra, e me pergunto se ela, como um todo, não seria apenas isso mesmo: mera sobra de infinito; sobejo cósmico; rejeito do universo. Não. Não é desespero, nem pânico o que me leva a pensar assim. E é muito fácil demonstrar. Primeiro, se estivesse em pânico ou desesperado, seria mais lógico me apegar ao instinto de conservação e valorizar a sobrevivência. Em segundo lugar, estou suficientemente lúcido para deduzir: um medo súbito causador de uma reação descontrolada ou de uma desesperação, não permitiria a ninguém reflexões dessa natureza.

       Impossível me concentrar... Surge outra questão. Agora sofro por não ser capaz de identificar a velocidade dos pensamentos. Sinto uma forte impressão de passar demasiado rápido por acontecimentos constrangedores do meu passado-presente. Um ato de semostração que pratiquei está agora mesmo reacontecendo. Será orgulho ou vaidade? Seria desimportante distinguir? A moral condena mais o orgulho. Mas para mim ele é quase nada diante da vaidade. Sempre cuidei ser o orgulho convicção não ostensiva do próprio mérito. A vaidade, uma ambição. Gananciosidade de reconhecimento. Portanto, sou vaidoso, não orgulhoso. Então, mais fatuidade, mais nescidade e mais bestagem compõem o meu caráter. Ansiedade. Estou sendo maniqueísta. Não existe a vaidade, nem o orgulho exclusivos. Embora um deles predomine. Mas qual será o que predomina em mim? Só o existir da semostração mostra ser a vaidade.

       A chuva passou. O meu passado-presente, não. Agora ando acordado, mas sem destino. Observo tudo. Nada interessa. Os gritos dentro da noite. O calor do dia escondido no azeviche do asfalto, que nem a chuva logrou desarquivar. A suntuosidade de “estranhas catedrais” desafiando a miséria das favelas.

       Minhas ideias e eu fugimos cada vez mais. Eu, do meu passado que insiste em ser presente. Elas, de suas primas tristes: as lembranças. Minhas ideias escapam. Eu não. Quanto mais fujo, menos me liberto. Complexo de culpa não é o estado aparentemente louvável de quem se sente responsável por um desastre. Trata-se de puro egoísmo. Por isso, nem a própria morte redime. Se, involuntariamente, cometesse um crime, me sentiria culpado. Não por estar arrependido ou sofrendo remordimentos. Mas por causa da censura alheia. Do veredicto da opinião pública. Da sensação narcisista da rejeição e do desaplauso social. Logo, morrer, seria escapar de um martírio. Renunciar à redenção pela crucificação. Nestas circunstâncias, morrer é um crime perfeito.

       Encontro-me diante de um terrível acontecimento passado acontecendo novamente. Cato a causa cardinal daquele acaso. Tenho como a mais provável, a saudade de não ter tido pais. Fruto de uma geração espontânea, comecei a ser sem ter sido. Não me pariram: nasci-me. Sou filho adotivo de um ninguém. Um descendente em linha reta do absurdo. No máximo, um enteado de Deus. De gota em gota, o tempo modulou a minha infância. E quando me entendi por gente, já era como fui na véspera de hoje. Bolinei uma lâmpada de Aladim que não havia, e um gênio mouco escutou meus três pedidos. A partir de então, sofro alternadamente a sucessão e a simultaneidade dos instantes.

       Um sanguinoso doutor operou a minha alma e, de propósito, deixou um camundongo dentro da cabeça. Mãos avaras de piedade complementaram o trabalho, arrepanhando o coração. E restaram somente dois olhos supurando lágrimas, uns farrapos de pele porejando mágoas e uma artéria aberta vertejando vida. Sinto sendas sinuosas - sem saber a sua destinação - se estreitando à minha frente. Palmilho-as acicatado só pelo instinto. E me extravio num labirinto de tremuras, de tonteiras, de náuseas e de desbrios, sem nenhum porventura para me mostrar a saída. Nuvens carregadas de esquivanças anoiteceram minha tarde ao meio-dia. Meus cartões de crédito de esperança há muito já estouraram seus limites. Tenho, enfim, a impressão de que estou morto e me esqueci de parar de respirar...

       Cansado de aconteceres que não consigo compreender, volto a ter sono. Ando enxergando demais ultimamente. Preciso parar de andar e me deitar para dormir.

Fonte:
http://cronopios.com.br/site/colunistas.asp?id_usuario=40

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Outros Contistas – Ray Silveira

               
Ray Silveira (Raymundo Silveira) nasceu em Fortaleza, 1947. Médico aposentado. Adepto da literatura na Internet. Vencedor de vários concursos literários. Seus contos estão espalhados em sites e blogs, assim como em antologias. Conquistou diversos prêmios literários.

                Alguns narradores de Ray Silveira são seres incomuns, em constante conflito interior, como se delirassem em suas ruminações. O de “Lembranças do inexistido”, na verdade, “jamais tivera mãe. Fruto de geração espontânea, começara a ser sem pré-existir. Enteado de Deus, nasci-me. Ninguém me pariu”. Busca explicações para sua vida e a morte de sua mãe, em narração de acontecimentos em tempos variados. Em “Sacrifício” o contista se vale de outro expediente: ao lado do narrador principal, o protagonista, dá voz a outro personagem. As falas de ambos se intercalam, em diálogos (“Falei com o diretor. Estão te esperando. Senhor... O quê? Desististe? Não! Pelo contrário: o mecanismo de lavagem interior não funcionou ontem.”) e em narrações (“Senti-me como quem entra são numa clínica de check-up, e sai com um diagnóstico de te prepara. Passou aquela noite transpirando poças de terror...”).

                Ray dá aos personagens uma liberdade quase que ilimitada, como se perdesse o controle sobre eles. Disso resultam considerações filosóficas, éticas, umas demasiadamente óbvias ou há muito repetidas ou desgastadas pelo uso: “A condição humana é um emaranhado de contradições”; “Só os bêbados conhecem este hiato diabólico entre a embriaguez e a sobriedade.”

                Talvez nem seja essa a razão pela qual Ray se abeire tanto da filosofia, dos conceitos, das definições, em detrimento da narração. Sua vontade quiçá nem seja a de contar histórias ou pintar personagens e paisagens. Certamente a ele interessam os temas essenciais do ser, motivo por que se vale tanto da alegoria. “Deplorável véu”, que lembra sonho, pelo ambiente opaco, nebuloso, sombrio, nos remete à busca da essencialidade humana: a alma, o ser. “Quem?” poderia ser crônica, não fosse a alegoria da feminilidade, afirmada no final da peça.

                Há também nas narrativas de Ray Silveira um constante jogo de palavras e sons: “dos hediondos cozinheiros que flambaram, tostaram, fritaram, refogaram, guisaram, torraram, assaram, cozinharam, sapecaram, esturricaram, carbonizaram o corpo e a alma da Joana do Arco e de milhares de outros inocentes”. Faz uso também da associação de ideias e nomes: “valsando às margens de vienenses Danúbios straussianos. Bailando o bailado das Alegorias da Primavera, ao som de sinfonias entremeadas de bemóis de suspiros e sustenidos de desejos, acompanhada de cavalheiros de longos cabedais e de cavaleiros de távolas redondas”. Vale-se ainda das sequências de substantivos e adjetivos: “sonatas mozartianas, tocatas e cantatas bachianas, cavalgatas wagnerianas e sambatas noelroseanas...”. Além disso, se dá bem com os neologismos.

                Percebe-se também a preocupação do escritor em se mostrar cosmopolita, como na ambientação das tramas em cidades europeias (sem explicação aparente). No conto “Via dolorosa”, o protagonista explica: “Soube apenas, em fragmentos, que fui removido do Hotel Ibis, no centro da cidade, para o setor de Urologia do Kaiser-Franz-Josef-Spital, na zona sul da capital austríaca.” Em “A última vez que viu Paris” toda ação se passa na capital de França. “... E os dois choraram” é de inspiração grega: “Viveu, no Asclepion de Trica, na Tessália”. Em Londres se ambienta “O duplo eu”. Mas nem só na Europa vivem os seres fictícios de Ray. Moram também em Fortaleza, como o narrador de “Alguém me viu?”: “Moro nas proximidades da rua Treze de Maio, entre Assunção e Floriano Peixoto”.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

Machado de Assis (Gazeta de Holanda) N.° 41 – 20 de dezembro de 1887

Nos quoque gens sumus, digo
Sem nenhum acanhamento;
Se é moda, eu a moda sigo;
Se é vento, acompanho o vento.

Não somente ao literato
Cabe descobrir mistérios;
Eu sou curioso nato,
Tão sério como os mais sérios.

Et quoque cavalgare
Sabemus, como ia expondo;
Lá se acaso errar, errare
Humanum est
, respondo.

Eu, — não é porque me gabe,
Mas acho que o elogio
De um tio muito mais cabe
Na boca do próprio tio.

Esperar que outras pessoas
Descubram seus pensamentos
E cantem honrosas loas
Aos nossos merecimentos,

Palavra que me parece
Negócio muito arriscado;
Este cala, aquele esquece,
Nada fica publicado.

Vamos ao caso. Há dois dias
Recebi este bilhete
Do meu amigo Mathias,
Residente no Catete:

“Pois que já fomos colegas,
Manda-me a razão bastante
Por que se diz: “cá o degas”.
Não corri à minha estante,

Corri à pena e ao tinteiro,
Porque trazia comigo
O histórico verdadeiro
Do que me pede este amigo.

E aqui lhe conto, — deixando
Que riam maus e praguentos:
Ouço o riso e vou andando
Cá com os meus bolorentos.

Ora bem, ninguém ignora,
(Menos que ninguém, Mathias)
Que houve um grande Egas outrora,
Varão de alias bizarrias.

Afonso, meio enteado,
De um tal Peres, se encastela
Em Guimarães já cercado
Pelas forças de Castela;

Vai então Egas, pensando
Em livrar o rei, caminha
Para o castelhano infando
E segreda-lhe ao que vinha.

Vinha prometer que o moço
Afonso obedeceria,
Sem mais sangue nem destroço.
Castela creu no que ouvia

Mas logo que os castelhanos
Daquele sítio abalaram,
Afonso e os seus lusitanos
Entregar-se recusaram.

Que faz o grão Egas? Vendo
Que faltara ao prometido,
Faz sacrifício horrendo,
Ele, pai, ele, marido.

Vai com a família, e dá-se
Ao inimigo. Ação única!
Outra não há que a ultrapasse,
Ou esta fé, ou fé púnica.

Tempos vindos, tempos idos,
Entrou no povo esta fala,
Quando alguém os ofendidos
Brios punha em grande gala:

“Cá o Dom Egas não há de
Deixar de cumprir a jura”.
Depois a celeridade
Do tempo, que tudo apura,

Foi diminuindo o adágio,
Perdeu-se o jura primeiro
E foi crescendo o naufrágio
Do primeiro ao derradeiro.

Já no século passado
Ia em tais e tantas penas
Que ficou — do que era usado,
Cá o Dom Egas” — apenas.

Mas o Dom tanto se escreve
Na forma acima apontada,
Como por outra mais breve,
Um D, um ponto e mais nada.

Daí resultou que o povo,
Lendo, como lê, às cegas,
Faz um dito inda mais novo
E ficou só: — “Cá o degas”.

Fonte:
Obra Completa de Machado de Assis, Edições Jackson, Rio de Janeiro, 1937.
Publicado originalmente na Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, de 01/11/1886 a 24/02/1888.

Teófilo Braga (A madrasta)

Recolhido no Porto

Uma mulher tinha uma filha muito feia e uma enteada bonita como o sol; com inveja tratava-a muito mal, e quando as duas pequenas iam com uma vaquinha para o monte, à filha dava-lhe um cestinho com ovos cozidos, biscoitos e figos, e à enteada dava-lhe côdeas de broa bolorentas, e não passava dia algum sem lhe dar muita pancada. Estavam uma vez no monte e passou uma velha que era fada, e chegou-se a elas e disse:

– Se as meninas me dessem um bocadinho da sua merenda? Estou a cair com fome.

A pequena que era bonita e enteada da mulher ruim deu-lhe logo da sua codinha de broa; a pequena feia, que tinha o cestinho ceio de coisas boas, começou a comer e não lhe quis dar nada.

A fada quis-lhe dar um castigo, e fez com que ela feia ficasse com a formosura da bonita; e que a bonita ficasse em seu lugar, com a cara feia.

Mas as duas pequenas não o souberam; veio a noite e foram para casa. A mulher ruim, que tratava muito mal a enteada que era bonita, veio-lhes sair ao caminho, porque já era muito tarde, e começou às pancadas com uma vergasta na própria filha, que estava agora com a cara da bonita cuidando que estava a bater na enteada.

Foram para casa, e deu de comer sopinhas de leite e coisas boas à que era feia, pensando que era a sua filha, e a outra mandou-a deitar para a palha de uma loja cheia de teias de aranha, e sem ceia.

Duraram as coisas assim muito tempo, até que um dia passou um príncipe e viu a menina da cara bonita à janela, muito triste e ficou logo a gostar muito dela, e disse-lhe que queria vir falar com ela de noite ao quintal.

A mulher ruim ouviu tudo, e disse à que estava agora feia e que cuidava que era a sua filha, que se preparasse e que fosse falar à noite com o príncipe, mas que não descobrisse a cara.

Ela foi, e a primeira coisa que disse ao príncipe foi que estava enganado, que ela era muito feia. O príncipe dizia-lhe que não, e a pequena descobriu então a cara, mas a fada deu-lhe naquele mesmo instante a sua formosura.

O príncipe ficou mais apaixonado e disse que queria casar com ela; a pequena foi-o dizer à que pensava que ela era a sua filha.

Fez-se o arranjo da boda, e chegou o dia em que vieram buscá-la para se ir casar; ela foi com a cara coberta com um véu, e a irmã, que estava agora bonita, ficou fechada na loja às escuras.

Assim que a menina deu a mão ao príncipe e ficaram casados, a fada deu-lhe a sua formosura, e foi então que a madrasta conheceu que aquela era a sua enteada e não a sua filha.

Corre à pressa a casa, vai à loja da palha ver a pequena que lá fechara, e dá com a sua própria filha, que desde a hora do casamento da irmã tornara a ficar com a cara feia.

Ficaram ambas desesperadas e não sei como não arrebentaram de inveja.

É bem certo o ditado: «Madrasta nem de pasta».

Fonte:
Contos Tradicionais do Povo Português

Nelson Alexandre (Disfunção passageira de um sujeito que não sabe se quer matar ou morrer)

Essa gente tem a mania de misturar a vulgaridade da comida com a magia das emoções... São como porcos, que engolem tudo. Não podem parar nunca. Comem, ao mesmo tempo, a rosa e o esterco que rodeia a roseira...
Louis Ferdinand Céline.

Muitas coisas podem arrebentar com o coração de um homem.

Mas o que fazer a respeito de um homem que tem coração, mas não consegue amar. Que só tem a sensação de estar com os pés no vazio. Num estado onde todas as emoções estão vivas, interligadas, e ao mesmo tempo, elas não se mexem. Parecem todas robotizadas. Travando qualquer movimento que seja voluntário.

Nasci com um nome, mas não vou dizer qual é. Tenho vinte e dois anos e não estou próximo de ser algo relevante para a sociedade ou para qualquer pessoa. Estou próximo de uma grande avalanche de acontecimentos que podem marcar a minha vida.

Desde criança só conheci a rua como porta de entrada e saída para minhas investidas na vida. A vida, aliás, que desde sempre só havia me pregado peças e mais peças, e eu, caindo em todas as armadilhas como um verdadeiro imbecil.

Às vezes o coração tem culpa por sermos mesquinhos ou otários.

Eu tinha veneno nas veias. Sabia que tinha um talento fervilhando dentro de mim, sendo apurado, esperando a hora certa de vir ao mundo, amadurecido, pronto para colocar para fora do corpo, tudo o que eu vinha acumulando com as experiências boas e ruins. Eu queria derreter o paredão de gelo que está aprisionando o coração da humanidade. Eu queria lutar desesperadamente contra a ideia de que somos uma experiência que não deu certo. De que o irmão é capaz de levantar a mão com uma faca e tirar a vida do próximo. Eu queria negar isso, fazendo de mim uma cobaia para testar a compreensão e sabedoria das pessoas comuns.

Me estrepei.

Eu não tinha pretensão de me canonizar, de que as pessoas me vissem à altura de um Santo; eu tinha, justamente, a ideia contrária.

Eu tinha fé de que era exatamente quebrando a hierarquia celeste que chegaríamos lá.

Um delírio.

Foi num delírio que Deus falou comigo. Dizia que eu precisava ter paciência, que não é num só dia que se faz uma ponte que liga uma margem de estranhamento à outra de conhecimento. É necessário calcular, planejar, deixar que as coisas se encaixem na proporção em que vão acontecendo. Como num fluxo de pensamento onde a bondade faz desaparecer a água estagnada do lago gelado do coração humano.

Eu havia renunciado a muita coisa que me veio de mão beijada durante esse período, por me encontrar numa enorme cegueira. Eu tinha olhos, mas não via. Tinha vontade, mas me abatia. Em síntese, era como uma planta morta que implorava água, e quando era regada, renunciava ajuda, gritando para que todos fossem para o inferno.

Eu havia desesperadamente lutado para me tornar um escritor, mas já não via muito sentido nisso. Nessa mistura ainda apurando dentro das minhas veias.

Havia dias em que eu colocava a mão sobre o papel e ficava lá, por horas, sem que nada saísse da minha cabeça. Uma vogal que fosse. Uma partícula de mentira ou verdade para me resgatar do meu caos particular.

Para mim, tudo era negro e desesperado. Eu era um palhaço sem graça que fazia  as criancinhas chorarem ao invés de fazê-las sorrirem até que arrebentassem a pança cheia de vermes. Nada mais do que um palhaço dentro do seu próprio circo de horrores, maquiando um rosto triste, penteando a face com uma navalha.

Aprendi que o mundo, a vida, nos coloca numa roda-gigante que podemos escolher se queremos ficar embaixo.

                                 ou
                                 em cima.
                              
O segredo está em querer ser GRANDE ou pequeno.

Depois dessa escolha, o negócio é agarrar-se a essa ideia com dentes e unhas. Desejar e colocar em prática esse desejo que quer se libertar de correntes e cadeados.  É  preciso, ainda, extrair desse desejo todo o sumo que nele existe, cuspindo toda a sobra, todo o resíduo que insiste em querer retardar esse processo mágico.

Você fica na distinta problemática de querer matar ou morrer.

Essa é uma disfunção em que sinto liberdade, a verdadeira liberdade que tanto eu buscava com fúria, com amor, com determinação, e que para minha surpresa estava tão perto e eu não a enxergava, porque haviam arrancado os meus dois olhos com uma faca, e eu vagava como um sonâmbulo lunático pronto para cair dentro de uma sepultura sem inscrição na lápide, apenas a terra úmida e os vermes para me devorarem pedaço por pedaço.

É a época das primeiras descobertas.

De um louco cego lutando sozinho na “quebrada”.

Fonte:
Contos Maringaenses

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

2º Prêmio de Trovas Humorista Chico Anísio/2013 – UBT-Maranguape (Resultado Final) 2a. Parte


ÂMBITO:
NACIONAL/INTERNACIONAL

TEMA: PERSONAGENS DE CHICO ANYSIO
(Trova Lírica/filosófica)

TROVAS VENCEDORAS

VENCEDORES

1º. Lugar:


Bento Carneiro - a vingança
foi "malígrina", por certo:
- quanto vampiro enche a pança
com nosso sangue... e liberto!!!
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

2º. Lugar:


Esbanjando humor profundo
conquistaste o mundo inteiro
como "Professor Raimundo"
ou como "Bento Carneiro"!!!
ERCY MARIA MARQUES DE FARIA
Bauru/SP

3º. Lugar:


A extrema sabedoria
o povo aplaudia até...
-Que saudade da ironia
nas falas de Salomé!
EDMAR JAPIASSÚ MAIA
Nova Friburgo/RJ

MENÇÕES HONROSAS

4º. Lugar:


Percorrendo o meu calvário,
sinto um desgosto profundo:
" - Eu ganho o mesmo salário
do bom Professor Raimundo..."
ANTONIO COLAVITE FILHO
Santos/SP

5º. Lugar:


Chico Anísio - O Professor...
Da Escolinha do Raimundo -
Foi Por Deus - o grande ator...
mais feliz ... e mais profundo!!!
ANA MARIA GUERRIZE GOUVEIA
Santos/SP

6º. Lugar:


Deu-me o professor Raimundo
a mais difícil lição:
mostrar meu sorriso ao mundo,
olhando a televisão!
JOSAFÁ SOBREIRA
Rio de Janeiro/RJ

MENÇÕES ESPECIAIS

7º. Lugar:


Ensinando ao aprendiz,
nosso professor Raimundo,
no quadro negro e com giz
sonhava mudar o mundo.
DULCÍDIO DE BARROS MOREIRA SOBRINHO
Juiz de Fora/MG

8º. Lugar:


Sábio o Professor Raimundo
que disse: – o salário, ó!
De professor nesse mundo
nunca ninguém teve dó!
GERALDO TROMBIN
Americana/SP

9º. Lugar:


Quando assisto à "Escolinha"
do bom Professor Raimundo,
volto a ser professorinha
querendo salvar o mundo!
MYRTHES MAZZA MASIERO
São José dos Campos/SP

DESTAQUES

10º. Lugar:


Grande Professor Raimundo,
notável filho do agreste,
Deus te pague no outro mundo
cada lição que nos deste.
GERSON SILVESTRE ALENCAR GONÇALVES
Belo Horizonte/MG

11º. Lugar:

 

Ele só pensa em dinheiro,
que exibe no paletó;
Justo Veríssimo, inteiro,
é só casca, embaixo é pó.
NADIR NOGUEIRA GIOVANELLI
São José dos Campos/SP

12º. Lugar:


Sou Frei Justino de Assis,
o popular “Franciscano”,
hoje orgulhoso e feliz,
visto que o Papa é meu mano!
ANTÔNIO AUGUSTO DE ASSIS
Maringá/PR

ÂMBITO: ESTADUAL

2º PRÊMIO DE TROVAS CHICO ANYSIO – 2013

TEMA: PERSONAGENS DE CHICO ANYSIO
(Trova Lírica/filosófica)

TROVAS VENCEDORAS

VENCEDORES


1º. Lugar:

A mentira só tem graça
Na voz do Pantaleão;
Pois na verdade ela é traça
Que corrói o coração!
NEMÉSIO PRATA CRISÓSTOMO
Fortaleza/CE

2º. Lugar:


Nosso professor Raimundo
Tornou-se perpetuado,
Revelando para o mundo
O seu salário minguado.
ANA MARIA NASCIMENTO
Aracoiaba/CE

3º. Lugar:


Está sempre reclamando
das injustiças do mundo
do pouco que vem ganhando
nosso Professor Raimundo.
GUTEMBERG LIBERATO DE ANDRADE
Fortaleza/CE

MENÇÕES HONROSAS

4º. Lugar:


Eternizando a memória
Do nosso herói do sertão
Eis a contar sua história
O grande pantaleão.
ABELARDO NOGUEIRA XAVIER
Aracoiaba/CE

5º. Lugar:

 

Como professor Raimundo,
Chico Anísio fez menção;
Com humor sério e profundo
Criticou a educação.
ABELARDO NOGUEIRA XAVIER
Aracoiaba/CE

6º. Lugar:


Salomé de Passo Fundo
Vivia lá seu segredo
Com algo muito profundo
Com o guri Figueiredo.
AUREILSON DE ABREU
UBT-Maranguape/CE

MENÇÕES ESPECIAIS

7º. Lugar:

 

Nosso Professor Raimundo
naquela escola, coitado,
com salário moribundo,
sempre lamenta um bocado...
GUTEMBERG LIBERATO DE ANDRADE
Fortaleza/CE

8º. Lugar:


Mostrou a realidade
Com humor bom e profundo.
Demonstrou capacidade
Nosso Professor Raimundo
ARTEMIZA CORREIA
Ocara/CE

9º. Lugar:

 

Pantaleão mentiroso
Disso ninguém o liberta
E fica mais duvidoso
Se diz: “É mentira Terta”.
MARIA RUTH BASTOS A BRANDÃO
UBT-Maranguape/CE

DESTAQUES

10º. Lugar:


A Escola é coisa séria,
Disto sabe todo mundo,
Dela não se faz pilhéria;
Só o Professor Raimundo!
NEMÉSIO PRATA CRISÓSTOMO
Fortaleza/CE

11º. Lugar:

 

No futebol, já fui o tal
Mas adoro a malandragem
Azambuja, o genial
Só me falta é a coragem.
LUIZ CARLOS A BRANDÃO
UBT-Maranguape/CE

12º. Lugar:


O Coalhada diz que topa
Jogar pela seleção
Convocado para a copa
Joga em qualquer posição.
RAIMUNDO RODRIGUES DE ARAÚJO
UBT-Maranguape/CE
== = = = = = = = = =

NACIONAL/INTERNACIONAL

TEMA: PERSONAGENS DE CHICO ANYSIO
(Trova humorística)

TROVAS VENCEDORAS

VENCEDORES

1º. Lugar:


Foi uma "Zorra Total"
quando "Meinha" e "Coalhada"
numa confusão geral
disputavam a "pelada"!!!
ERCY MARIA MARQUES DE FARIA
Bauru/SP

2º. Lugar:

 

Sua mulher por dinheiro
se casou e, agora, é "dama"...
Mas Coronel Limoeiro
diz: "Essa bichinha me ama"!...
ROBERTO TCHEPELENTYKY
São Paulo / SP

3º. Lugar:


Azambuja, revoltado,
comenta a Convocação:
“Coalhada foi desprezado:
Não vai longe a Seleção”.
EDWEINE LOUREIRO DA SILVA
Saitama/Japão

MENÇÕES HONROSAS

4º. Lugar:


Haroldo tenta ser macho,
mas seu fetiche desfaz:
- Luana, vira capacho,
aos pés de um guapo rapaz.
FABIANO DE CRISTO MAGALHÃES WANDERLEY
Natal/RN

5º. Lugar:


Tropeçava no seu pé,
furava na cabeçada,
mas se julgava um Pelé
o nosso bravo Coalhada.
LICÍNIO ANTÔNIO DE ANDRADE
Juiz de Fora/MG

6º. Lugar:

 

Justo Veríssimo assume
nossa política toda:
quando fala, ele resume:
“Quero que o pobre se exploda”.
MILTON SOUZA
Porto Alegre/RS

MENÇÕES ESPECIAIS

7º. Lugar:


Se a pergunta é do fedelho,
Pantaleão não tem dó.
Quem pintou o Mar Vermelho?
Foi sua mãe, Pedro Bó!
GERSON SILVESTRE ALENCAR GONÇALVES
Belo Horizonte/MG

8º. Lugar:

 

Alberto Roberto amava
ser símbolo sexual!
Aos gritos, desmunhecava,
retorcendo e dando "tiau"!
MARIA CONCEIÇÃO DE PAULA (CONCEITITA)
São José dos Campos/SP

9º. Lugar:

 

O trabalho um tanto rude
“Alfacinha” leva a sério...
Vende Planos de Saúde
no portão do cemitério!
EDMAR JAPIASSÚ MAIA
Nova Friburgo/RJ

DESTAQUES

10º. Lugar:


Professor Raimundo tem
a paciência de Jó,
alunos burros também
e o salário dele, Óh!
DILMA RIBEIRO SUERO
Rio de Janeiro /RJ

11º. Lugar:


Parece o craque Coalhada
com o galã falastrão:
não aguenta uma pelada
mas diz que joga um bolão.
DULCÍDIO DE BARROS MOREIRA SOBRINHO
Juiz de Fora/MG

12º. Lugar:

 

À líder desta nação...
Uma dica, em um segundo:
Pra pasta da Educação...
Basta o professor Raimundo!
ANDRÉ LUÍS SOARES
Guarapari/ES

=================
continua…