quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Aparecido Raimundo de Souza (Viúva inconsolável)

O RATO CHEGOU todo cheio de si, cutucou o gato e disse impostando uma voz grossa e firme:
— Meu chapa, é o seguinte. Hoje eu vim aqui com uma única finalidade. Acabar com a sua raça.

Antes de responder, o doméstico caseiro com cara de Fígaro (aquele famoso gato do mestre carpinteiro Gepeto) se empertigou todo e sorriu com desdém:
— Estou pagando pra ver, seu insignificante espécime comum. Eu é que pretendo pôr um fim definitivo em você e a essa sua irritante empáfia. Darei início ao que acabo de dizer, assim que terminar a minha saborosa refeição. Saiba que partirei pra cima de seus costados como um rolo compressor. Fique preparado e esperto, que daqui a alguns minutos você virará picadinho. Será a minha sobremesa, após todas essas guloseimas que estou mandando pro bucho.

Foi a vez do pequeno roedor cair em gostosa gargalhada: 
— Você vai fazer picadinho de mim? Kikikikikikikikikiki... saiba que sou eu quem está pagando pra ver...

O felídeo virou o derradeiro gole do suco que bebia e observou:
— Você é tão imprestável e sem importância, que nem me darei ao trabalho de interromper a minha prazerosa e nutritiva refeição. Isso equivale dizer que você será a sobremesa. Faz tempo que não mando pra barriga um bom pedaço de carne de rato. Olhando pra suas orelhas, me vem à lembrança a figura do Chumbinho (referência ao desenho animado Chumbinho, rato e Bacamarte, gato). 
— Kikikikikikikikikiki...
— Ria mesmo, meu chapa. Divirta-se até não poder mais. Seus minutos estão contados.
— Seu frajola bobalhão. Vá ver se eu estou ali na esquina.
— Me traz um pedaço de queijo, que aproveito e ponho na sua boca, para que engula como a gororoba terminal.
— Seu tolo. Sem noção. Lembra que ontem eu coloquei esse chocalho que agora balança no seu pescoço? Ou será que esqueceu? Que mico você deve estar pagando! 

De fato, a essa lembrança, o Bacamarte ficou louco da vida. Essa proeza mexeu com seus brios. Realmente acordara com um guizo pendurado. A princípio pensara que fora seu velho dono, todavia, logo depois, chegou à conclusão que estava completamente errado. O velho senhorio, seu amo, havia viajado e ainda não voltara. Fuzilou o indefeso rato de laboratório, alguns passos a sua frente. O primeiro ímpeto que lhe veio à cabeça foi saltar sobre o desamparado. Acabar de vez com a sua fanfarronice. Contudo, confiante na sua superioridade, refreou os impulsos e manteve a calma. Aquele imbecil não perderia nada por esperar. Sua hora, a passos largos, chegava. Seria divertido e engraçado tripudiar um pouco mais sobre o pobrezinho, antes de torná-lo a sua sobremesa preferida pós-jantar de fim de tarde. Manteve a conversa.
— Não foi você...
— Claro que fui eu.
— Não foi. Deixa de ser mentiroso...
— Quer saber? Você estava dormindo igual um bêbado sem dono no tapete do quarto de seu patrão. A mim me pareceu que você havia bebido todas.
— Não sou dado a bebidas, seu mongoloide. Sou um gato, não um pinguço.
— Quase me esquecia do ronco. Barbaridade! Parecia uma dessas britadeiras que quebram os asfaltos de rua.
O gato, meio que impaciente, resolveu provocar o insolente opositor. Atazanou desafiando:
— Prove que foi você quem me colocou o guizo em meu pescoço.
— Tem minha palavra.
— Sua palavra de rato e uma bicicleta sem rodas não me valem de nada. Você não passa de um camundongo de esgoto. 
— Já imaginou se seus amigos aqui das redondezas ficarem sabendo dessa minha proeza? 
— Confesso que seria vexatório. Todavia, meu amado, eles não saberão. Dessa noite, você não passará.
— Queria ver a cara da sua namoradinha, a linda e esfuziante gatinha Lilica. Com certeza seu renome e a mentirosa medalha de bichano machão explodiriam no espaço. De roldão, a sua majestade “gatal” cairia por terra.
— Que interessante! Pena que Lilica jamais saberá. Ao contrário, chegará aos ouvidos da bela donzela, outra noticia. A da sua partida para os cafundós dos quintos do bueiro logo aqui em frente à mansão do meu senhorio.
— Ok! Antes que eu acabe com a sua graça, com seu ar de superioridade... e uma vez que não acredita em mim, nem aceita a minha palavra de rato, gostaria de provar à você, aqui e agora, que realmente fui eu quem colocou esse guizo no seu lindo corpinho.
— E como pretende demostrar tal proeza? Vindo até mim e retirando o guizo e depois o colocando de volta?
— Tecnologia, meu caro. Tecnologia...
— Não estou entendendo...
— Num piscar de olhos entenderá tudo...

A um gesto seu, um segundo ratinho (lembrava Fievel) entrou em cena trazendo, nas mãos um aparelho celular:
— Gostaria que desse uma olhada no que fiz gravar com muito cuidado.
O Hamster largou o celular perto do gato e tratou de cair fora o mais rápido que pode:
—Vamos sabichão. Assista ao vídeo. 

O gato se abaixou e pegou o celular. Abriu e...
Sua indignação aumentou. Criou forma e vida. Foi mais longe. Triplicou de tamanho a sua ira dentro da sua vontade de destruir e matar. Agora, mais que nunca, precisava acabar com aquele infeliz. Seu ódio chegou ao limite e não demoraria muito, explodiria como uma bomba.
— Acredita, agora?
— Você deu sorte. Eu estava cansado. Apesar disso, meu amado, não terá muito tempo de vida para comemorar. Seu fim acaba de ser adiado...
— Já que serei sua vítima, como pretende acabar comigo?
— Astúcia meu camarada. Astucia. Já ouviu, alguma vez, essa palavrinha mágica? De mais a mais, seu idiota de uma figa, desde quando um traste de um rato da sua laia tem audácia para nocautear um bicho da minha estirpe e tamanho? Repare na minha carcaça... 
— Quer apostar?
— Não! Porque vou ganhar e você não terá como saudar a dívida. Lembra, inseto de rodapé, sou um gato safo, ladino, experiente, ágil, esperto, senhor do meu nariz...  
— Se você soubesse quem realmente eu sou, começaria a se preocupar...

O Gato não aguentou e caiu de novo em estrondosa gargalhada. Chegou a chorar de tanto que riu.
— Quem é você? Não me faça ficar mais enfezado do que estou. Rir, em certas horas, é bom, faz bem, porém, provoca dores de barriga. Você é um rato, e como tal, o pior ser existente na face da terra. Um verme de esgoto, eu diria, sem medo de errar. Até onde sei, serve unicamente para transmitir doenças.
— Qual o quê! Os gatos também transmitem.
— Que conversa fora de esquadro, malandro. Qual é a sua?
— Vou enumerar algumas enfermidades oriundas da sua linhagem.
— Faça isso. Sou todo ouvido. Comece. 
— Você transmite a toxoplasmose.
— Fala difícil o sacana! Que é isso?
— É aquela doença que os humanos pegam em contato com as suas fezes. Darei um exemplo simples. Se uma mulher estiver grávida, em contato com os excrementos que você deixa pela casa, pelos jardins, corredores e quartos, poderá prejudicar o futuro bebê e ele nascer com problemas de malformação.
— Interessante... continue...
— Alergia respiratória. Vocês, ao contrario de nós, camundongos, produzem uma proteína que a medicina dá o nome de glicoproteína.
— Glicoproteína?
— Sim senhor. Ela desencadeia um leque de sintomas inoportunos, como espirros, inchaços das pálpebras dos olhos, não mencionando a asma e etc...
— Para um rato você é um sujeito sabido.
— Você ainda não viu nada. Temos também a Micose de Pele. Capitaneada, claro, pelo contato de sua epiderme com o couro de seu dono. Isso acaba sempre em vermelhidão o que redunda numa coceira desgraçada. Só de falar meu corpo começa a dar sinais de comichão. Ai, ui, ui, ai... 
— Vá em frente. Estou gostando do seu blá-blá-blá. Fale mais, antes que eu me compraze com seu mísero esqueleto, cujo tamanho não satisfará meu aguçado apetite.
— Seu rato, digo, seu gato malvado. Você é o causador da Esporotricose. 
— O que é isso? Acaso se come?  
— Calma, gato burro. Vou explicar, Mané. Esporotricose se pega quando você, numa brincadeira inofensiva e sem maiores contemplações, morde ou arranha alguém. Um simples triscar de suas afiadas unhas bastará para deixar suas vítimas em maus lençóis, ou seja, com feridas e lesões incicatrizáveis.  
— Ok. Cansei. Abarrotei, entulhei o saco. Estou por aqui. Posso me preparar para liquidar com a sua carreira de mouse?
— Ainda não... tem mais. 
— Uauuu...! Mais?  
— Com certeza. Você, gato mal-acabado, criatura feia, nojenta, repugnante, é igualmente responsável pela Síndrome da Larva Migrans Visceral.
— Como é que é?
— Eu explico. Quando as pessoas, por qualquer motivo, entram em contato com seu nojento excremento, que está cheia de ovos da tal verminose. É através dela, que os incautos contaminam o intestino, o fígado, o coração e os pulmões. Sem falar em dificuldades e embaraços os mais intrincados.
— Entendo! Bem, vamos ao que interessa. Como pode perceber, pela minha tez de gato com “G” maiúsculo, toda essa lengalenga fora de esquadro só contribuiu para aumentar assustadoramente o meu desejo veemente em relação à sobremesa “pós-barriga cheia.” Em razão disso...
— Relaxa. Não acabei ainda. Descrevi apenas algumas enfermidades. Tem mais... a lista...
— Meu enfadonho Stuart Little, nada mais me interessa. Se prepare. Sabe rezar? Comece agora.  Lembrando que será a derradeira coisa que fará antes de lhe... acomodar confortavelmente em minha barriguinha.

Sem que o gato perceba, o hamster que minutos atrás trouxera o celular reaparece em cena. Traz, consigo uma espécie de controle remoto. No que o gato pula, o pequeno animalzinho aciona um botão vermelho. O gato saltador cai aos trambolhões, batendo aqui e ali, como se atingido por uma enorme carga de corrente elétrica. Estrebucha seu horror perto da porta de entrada da cozinha todo desmilinguido e acabado. Sem forças, para se levantar. Sabe, por algum motivo, que chegou seu fim. Olha para o inimigo e tenta falar alguma coisa. Não consegue. 

O rato, sorridente e feliz, se aproxima: 
— Não te falei, bonitão? Agora você não passa de um “miauzinho” acabado, vencido e sem forças. Dentro de alguns minutos, estará completamente deletado, apagado. Eu venci. EU VENCIIIIII... 
—O que... vo... você... seu mal... dito ra... to... fez co... co... migo?
— Tecnologia, meu caro. Os tempos mudaram. Pra seu governo, irei agora mesmo atrás de sua linda namoradinha. E... quando topar com ela...
O pobre rato não teve tempo de terminar a frase. Lilica, a companheira do pobre agonizante, saltou sobre ele, de cima de um armário (onde estivera escondida desde o início da conversa) num excitamento de perseguição sem precedentes. Voou furiosa e aflita. Atacada por uma inclemência implacável, a bela o estraçalhou de uma só abocanhada. 

Fonte> Texto enviado pelo autor 

segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Versejando 131

 

Mensagem na Garrafa = 92 =


 Cláudio de Cápua
São Paulo/SP, 1945 – 2021, Santos/SP

MOMENTOS

O passado não existe porque é feito de momentos que se foram e não voltam.

O futuro não existe. Porque podemos morrer neste momento.

O que existe então?

O presente pode ser o momento que vivemos.

Na memória mora o nosso passado, é só lá que ele existe.

O presente, bem aproveitado, projeta outros momentos que serão automaticamente bons momentos que humanamente classificamos de futuro.

Quando uma pessoa está feliz, diz: – Gostaria que esse momento fosse para sempre.

Será que essa pessoa não percebe que a única realidade é aquele momento presente que ela está vivendo e ela é feliz.

A soma dos momentos vividos nos levam a uma realidade, a morte física. Mas para quem acredita, como eu, a vida continua em outro estágio ou em outra dimensão.

Nesta questão, matéria e espírito, como não sou dono da verdade, não sei neste momento se estou certo ou errado. 

O leitor decide no próximo momento.

 (Cláudio de Cápua. Retalhos de Imprensa. São Paulo: EditorAção, 2020. Enviado pelo escritor)

Cantigas Infantis de Roda (Rock do Ratinho)


(Cyro de Souza)

Era uma vez um ratinho pequenino
que namorava uma ratinha pequenina
e os dois se encontravam todo dia
num buraquinho na esquina

rock rock rock rock rock
é o rato e a ratinha namorando
rock rock rock rock rock
é o rato e a ratinha se beijando

o ratinho lhe trazia todo dia
um pedaço de toucinho fumeiro
um tiquinho de manteiga, um queijinho
e um pouquinho de manteiga no focinho

rock rock rock rock rock
é o sino da igreja badalando
rock rock rock rock rock
é o ratinho e a ratinha se casando…

Humberto de Campos (A Baronesa)

Um médico ilustre, de incontestável influência no seio da família carioca, está utilizando, ultimamente, o seu prestígio pessoal para que as senhoras eliminem, de uma vez, o hábito de pintar os cabelos. Acha ele que uma cabeça alva, ou, pelo menos. polvilhada de prata, é um sinal de insubstituível respeitabilidade, que se não pode, de modo nenhum, esconder ou disfarçar. E tamanho tem sido o resultado dessa campanha metódica, persistente, silenciosa, contra a vaidade feminina, que sobem a dezenas, já, as senhoras que se reconciliaram com o destino, conformando-se com as consequências inevitáveis da idade.

Esse costume de mudar a cor dos cabelos não é, entretanto, um vício dos nossos tempos. As atenienses conheceram-no, conheceram-no as mulheres de Veneza, criadoras do "louro veneziano", e não houve corte europeia posterior à Renascença em que não se procurasse um processo de ocultar à curiosidade do mundo, sempre impiedoso, a neve que nos avisa, alvejando-nos a cabeça, que é chegado, enfim, o triste inverno da vida... Há trinta anos, ainda, era isso em voga no Rio de janeiro. E era sobre isso mesmo que eu meditava, uma destas tardes, ao despedir-me da minha veneranda amiga a Sra. Baronesa de Caçapava, cujos oitenta e seis anos constituem, em nossos dias, uma das relíquias mais preciosas da mais alta sociedade do Império.

Estendida na sua "chaise-longue" (cadeira longa para esticar as pernas), com os pés, pequeninos e engelhados como duas flores murchas, abrigados sob uma delicada toalha de seda, a boníssima titular sorria, carinhosa, com a sua boca muito pequena, escondida em um dos vales do rosto recortado de rugas, quando eu lhe falei nos inícios do nosso conhecimento.

- O senhor andava pelos trinta anos; não era, conselheiro?

Eu fiz as contas, mentalmente, embaraçando-me nos algarismos.

- Não estou certo, Sra. Baronesa; não estou certo - respondi. - Recordo-me, porém, que, certa vez, ao vê-la, fiquei impressionadíssimo com a sua figura. A Sra. Baronesa, nesse tempo, lembro-me bem, tinha o rosto ainda moço, mas apresentava na cabeça, já acentuando a sua beleza, numerosos fios de prata.

- Foi em 1871, - confirmou a velha fidalga, sorrindo benevolamente com a sua boquinha de criança, encolhida e funda, privada de todos os dentes. - Foi em 1871; eu tinha, então, trinta e sete anos.

- De outra vez que a vi, - tornei, - o que mais me impressionou foi, ainda, a beleza do seu cabelo. A sua cabeleira, sempre farta, abundante, maravilhosa, era, ainda, inteiramente negra.

A Baronesa olhou-me novamente, com um sorriso de saudade, que era um doce perdão para nós ambos, e acentuou, bondosa:

- Foi em 1880; eu tinha quarenta e seis...

E, olhando-me significativamente, pediu-me, com a vergonha brilhando, como uma brasa, na cinza fria dos olhos:

- Cubra-me os pés, conselheiro; sim?

Fonte> Humberto de Campos. A Serpente de Bronze. Publicado originalmente em 1925. Disponível em Domínio Público.

Gislaine Canales (Glosas Diversas) LXVIII


 AMARGA PROFECIA

= = = = 
MOTE
= = = =
Profetizaste, é verdade,
que o nosso amor findaria
mas  esqueceste a saudade
nessa amarga profecia.
Alonso Rocha
Belém/PA, 1926 – 2011

= = = = = 
GLOSA
= = = = = 
Profetizaste, é verdade,
numa certeza que grita,
o fim da felicidade
de nossa história bonita!
 
Previste com muito afã,
que o nosso amor findaria.
Não restaria amanhã,
nem sombra dessa alegria!
 
Falaste com suavidade:
do fim – da separação,
mas esqueceste a saudade
que machuca o coração!
 
Depois do adeus, que é tão triste,
sobrará só nostalgia...
que, na verdade, omitiste
nessa amarga profecia.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

EU QUISERA...
 
= = = = 
MOTE
= = = =
Eu quisera ser feliz,
ser feliz como ninguém,
como ninguém, sempre eu quis,
ser feliz com outro alguém!
Dalvina Fagundes Ebling
Cruz Alta/RS, 2020+

= = = = = 
GLOSA
= = = = = 
Eu quisera ser feliz,
nesse mundo sofredor
e ser eterna aprendiz
na  faculdade do amor!
 
Viver somente alegrias,
ser feliz como ninguém,
e nessas minhas poesias
levar esse amor, além!
 
Quisera um novo matiz
pra minha realidade,
como ninguém, sempre eu quis,
achar a felicidade!
 
Sempre estarás  junto a mim,
pois o meu sonho contém
o desejo de, em meu fim,
ser feliz com outro alguém!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

CHORO AMORES...
 
= = = = 
MOTE
= = = =
Choro meus sonhos perdidos
e os meus desejos frustrados,
pelos anos mal vividos
entre amores fracassados!
Delcy Canalles
Porto Alegre/RS

= = = = = 
GLOSA
= = = = = 
Choro meus sonhos perdidos
porque os sonhos que sonhei,
sempre em nadas, convertidos,
foi o tudo que ganhei!
 
Meu pranto se faz mais triste,
e os meus desejos frustrados,
me mostram que não existe
nenhum sonho em meus guardados!
 
Meus cantos, viram gemidos
em dorida nostalgia,
pelos anos mal vividos
que entristecem o meu dia!
 
Eu vivo sem emoção.
Tenho os olhos já cansados.
Soluça o meu coração
entre amores fracassados!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

VELHICE... AO VENTO...
 
= = = = 
MOTE
= = = =
Nas curvas do desalento
quando a paixão me convida
eu largo a velhice ao vento
e bebo o sopro da vida!
Eduardo Toledo
Pouso Alegre/MG

= = = = = 
GLOSA
= = = = = 
Nas curvas do desalento
eu procuro desviar
para ver,  se assim aguento
o tempo triste a passar!
 
Mas fico atento e feliz
quando a paixão me convida
a fazer tudo que eu quis,
numa emoção comovida.
 
Sentindo esse doce alento,
me apegando de verdade,
eu largo a velhice ao vento
e vivo a felicidade!
 
Vivo, agora, o meu depois,
junto à quimera esquecida,
no cálice de nós dois,
e bebo o sopro da vida!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

RI, PALHAÇO...
 
= = = = 
MOTE
= = = =
Ri, palhaço, que o teu riso
vai, à dor, dar acolhida,
transformando em paraíso
teu picadeiro da vida.
Giselda Medeiros
Fortaleza/CE

= = = = = 
GLOSA
= = = = = 
Ri, palhaço, que o teu riso
tem sempre um eco profundo
quando te ouço, idealizo
um sorriso para o mundo!
 
O teu riso, diferente,
vai, à  dor, dar acolhida,
diminuindo a dor da gente,
curando qualquer ferida!
 
Em teu gargalhar, diviso,
tudo o que de bom existe,
transformando em paraíso
este nosso mundo triste!
 
Faze, então, doce palhaço
dessa alegria nascida,
sobreviver, sem fracasso,
teu picadeiro da vida.

= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

CUMPLICIDADE
 
= = = = 
MOTE
= = = =
É quando a noite se aquieta
que eu sinto a cumplicidade,
do amor que me faz poeta,
com a dor que me faz saudade!
João Paulo Ouverney
Pindamonhangaba/SP

= = = = = 
GLOSA
= = = = = 
É quando a noite se aquieta
na languidez das estrelas
que a minha visão de esteta
me deixa feliz, por vê-las!
 
É sempre em noite silente,
que eu sinto a cumplicidade,
pareço um adolescente,
sonhando em profundidade!
 
Encontro na estrada reta,
os pedacinhos de sonhos,
do amor que me faz poeta,
que faz meus dias risonhos!
 
Me identifico também,
com a dor e a ansiedade
e sofro, como ninguém,
com a dor que me faz saudade!

Fonte> Gislaine Canales. Glosas Virtuais de Trovas XI. In Carlos Leite Ribeiro (produtor) Biblioteca Virtual Cá Estamos Nós. http://www.portalcen.org. Setembro de 2003.

Arthur Thomaz (Futebol no Olimpo)

Zeus organizou um evento para resgatar o glamour do esporte, visto que estava bastante abalado pelo comportamento dos atuais jogadores. 

O meu estimado leitor poderá verificar no livro Mirabolantes, em minha última viagem com Pegasus para visitar as mulheres mais esplendorosas do mundo, na qual ele me confidenciou que Zeus, o deus máximo do Olimpo, era apaixonado pelo futebol soccer jogado em várias partes do planeta.

Surgiu, então, a ideia de um jogo épico entre deuses, semideuses, monstros mitológicos e outras personagens contra jogadores brasileiros de outras épocas. Enviei uma anacrônica carta solicitando hospedagem para nossa delegação e um campo para treinamento. 

Na resposta, zombeteiro, escreveu que o Olimpo não era para simples mortais, mas como os brasileiros eram considerados os “deuses” do futebol, ele abriria uma exceção e os hospedaria com prazer.

Tratamos cada um de elencar os jogadores dos dois times. Zeus convocou Hércules, que demorou a ser convencido. Em razão dos 12 trabalhos, queria ocupar as 12 posições no time. Ficou esclarecido que só existiam 11 posições e que cada jogador poderia ocupar uma delas.

Uma das cláusulas pétreas do contrato firmado para o evento era que os jogadores não poderiam olhar para a torcida organizada feminina do Olimpo F.C, pois lá estariam as mulheres mais lindas do universo, vestidas de Cheerleaders.

Chronos queria jogar e controlar o tempo da partida simultaneamente. Éolo foi convencido a não se agitar para a bola rolar. Pegasus não participou, pois teria que usar quatro chuteiras.

Netuno também não aderiu ao jogo porque inundaria o gramado, transformando-o em polo aquático. Hermes revelou-se um bom entregador de bola, ocupando o meio de campo. Zeus, sem questionamentos, escalou-se titular absoluto, capitão do time e sem posição definida.

Aquiles foi escalado na ponta-direita, por ser forte e guerreiro. Zeus exclamou ao ver a composição do time canarinho que isto não é uma escalação, e sim uma oração:

Gilmar, Djalma Santos, Bellini, Orlando e Nilton Santos.

Zito e Didi. Garrincha, Pelé, Vavá e Zagalo.

Pressentindo o desastre esportivo, Zeus argumentou que nós iríamos escalar monstros sagrados do futebol, portanto, ele também escalaria monstros mitológicos para substituir alguns deuses que estavam em missões pelo cosmo.

Na falta de um deus para ficar no gol, transformou temporariamente Octopus em um ser mitológico. Recrutou Golias para centroavante cabeceador. Um coro de bacantes entoava com emoção o hino do clube Olímpio FC.

No vestiário brasileiro, antes da peleja, o sistema tático foi o de cada um pegar a sua camisa e jogar o que sabe. 

Garrincha e Baco, já no corredor de entrada ao gramado, estabeleceram cordiais relações, graças ao néctar dos deuses bebido pelos dois. Nereidas e ninfas atuavam como gandulas.

Iniciado no horário exato, o jogo transcorreu magnificamente com Garrincha e Pelé infernizando a defesa adversária, colocando bolas entre os tentáculos de Octopus, quase causando um nó entre eles.

Aquiles corria pela ponta-direita com a marcação do elegantérrimo Nilton Santos, quando Éolo soprou em suas costas, dando-lhe uma velocidade maior. Ao perceber que não o alcançaria correndo, Nilton tentou com um carrinho tirar a bola de Aquiles, acertando-o no tendão . Eis aí a verdadeira origem da lenda do calcanhar de Aquiles.

Diferentemente do que a história relata, Nilton Santos não deu um passo para fora da grande área, o que ensejou a marcação do pênalti.

Zeus dirigiu-se até a marca da penalidade e mostrou que, como cobrador de pênaltis, ele era um excelente deus, chutando a bola no topo da montanha vizinha, o Everest.

Gilmar, Djalma Santos, Bellini e Orlando jogavam animadamente uma partida de truco na pequena área. 

No único lance de perigo ao gol canarinho, David colocou uma bola na testa de Golias, que atordoado cabeceou sobre o travessão. Octopus reservou dois de seus tentáculos para pegar as bolas no fundo de suas redes. O marcador eletrônico não possuía dois dígitos, portanto, o placar final foi 9 X 0, mas testemunhas dizem que beirou os 50 gols brasileiros.

Para o alívio do time local, soaram as sete trombetas, anunciando o fim da peleja.

Garrincha e Baco trocaram as camisas e saíram abraçados diretamente para a noitada.

Zeus reverenciou Pelé e até hoje são amigos, tendo ordenado a construção de um trono ao lado do seu, mostrando ao Universo que o Deus do futebol só houve e só haverá um, e que seu nome é Pelé.

PS: Nove meses depois do evento, três nereidas deram à luz três bebês com as perninhas tortas.

Fonte> Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: imponderáveis. Volume 3. Santos/SP: Bueno Editora, 2022. Enviado pelo autor 

Hinos de Cidades Brasileiras (Porto Alegre/RS)


Letra: Breno Outeiral

Refrão:
Porto Alegre Valerosa
Com teu céu de puro azul
És a joia mais preciosa
Do meu Rio Grande do Sul

Tuas mulheres são belas
Têm a doçura e a graça
Das águas, espelho delas,
Do Guaíba que te abraça

Refrão:
Porto Alegre Valerosa
Com teu céu de puro azul
És a joia mais preciosa
Do meu Rio Grande do Sul

E quem viu teu sol poente
Não esquece tal visão
Quem viveu com tua gente
Deixa aqui o coração.

Refrão:
Porto Alegre Valerosa
Com teu céu de puro azul
És a joia mais preciosa
Do meu Rio Grande do Sul

OBS: "Valerosa" segundo o dicionário Aurélio significa "valorosa", corajosa, ativa, enérgica.

O nosso português de cada dia (Erros de português que você não pode mais cometer) = 2

por Universidade Veiga de Almeida

14. Em vez de / Ao invés de

Para indicar apenas uma coisa no lugar de outra, usa-se "em vez de". 

Para mostrar opostos, vá de "ao invés de", como no exemplo: "Ao invés de ser o primeiro, ele foi o último".

15. Onde / Aonde

"Onde" é o lugar em que alguém ou alguma coisa está. 

"Aonde" está relacionado a movimento. Por isso, quem vai, vai "a" algum lugar: "vai aonde".

16. Demais / De mais

Na maior parte dos casos, emprega-se o advérbio "demais", que significa excessivamente, muito. 

A locução "de mais" é comparável à expressão "a mais", como em "nem sal de mais, nem de menos". "De mais" também é associada a estranheza: "Não vejo nada de mais naquilo".

17. Em princípio / A princípio

"Em princípio" assemelha-se a "em tese". 

"A princípio" é como "no início".

18. Uso do hífen

O prefixo terminado por vogal é separado por hífen se a palavra seguinte começar com a mesma vogal ou H. Caso contrário, sem hífen. Exemplos: autoescola, micro-ondas, semianalfabeto, autoestima.

19. Tachar / Taxar

"Tachar" significa "denominar, chamar de, considerar". 

"Taxar" é impor uma taxa ou imposto. Portanto, contextos diferentes.

20. Através de / Por meio de

Expressões com significados distintos. "Através de" expressa a ideia de atravessar, indica um movimento físico. 

"Por meio de" é semelhante a "por intermédio de" e se relaciona a "instrumento para a realização de algo". Portanto, ao começar um e-mail, por exemplo, o correto é "Venho por meio deste", e não "Venho através deste".

21. Vírgula entre sentenças

Quando as duas frases possuírem sujeitos diferentes, usa-se a vírgula antes da conjunção "e".

Errado: A mãe demorou para chegar e o filho ficou desesperado.

Certo : A mãe demorou para chegar, e o filho ficou desesperado.

22. Eu / Mim

O pronome reto "eu" é utilizado apenas na posição de sujeito do verbo. 

Nas demais situações, usa-se o pronome oblíquo "mim".

Errado: Não há mais nada entre eu e você.

Certo : Não há mais nada entre mim e você.

23. Haver / Fazer

Ambos os verbos, quando indicam passagem de tempo, não ganham plural: "Não conversávamos havia três anos" e " Faz três anos que não nos vemos".

24. Haver / Existir

No sentido de "existir", o verbo "haver" não vai para o plural. 

O verbo "existir" pluraliza normalmente: "Na reunião, existiam cerca de 60 pessoas".

Errado: Na reunião, haviam cerca de 60 pessoas.

Certo: Na reunião, havia cerca de 60 pessoas.

25. Assistir ao / Assistir o

Quando usado no sentido de "ver", o verbo "assistir" rege a preposição "a": "Assistiu ao programa". 

No sentido de "ajudar" ou "prestar auxílio", o verbo vem sem a preposição: "O técnico assistiu o cliente durante a instalação do equipamento".

Fonte: Universidade Veiga de Almeida, 03  dezembro 2019  in O Globo. 

domingo, 28 de janeiro de 2024

Carolina Ramos (Trovando) “09”

 

Mensagem na Garrafa = 91 =


Charles Chaplin
Londres/Inglaterra (1889 - 1977) Corsiersur-Vevey/Vaud/ Suiça

A VIDA

Já perdoei erros quase imperdoáveis, tentei substituir pessoas insubstituíveis e esquecer pessoas inesquecíveis.
Já fiz coisas por impulso,
Já me decepcionei com pessoas quando nunca pensei me decepcionar, mas também decepcionei alguém.
Já abracei para proteger,
Já dei risada quando não podia,
Já fiz amigos eternos.

Já amei e fui amado, mas também já fui rejeitado,
Já fui amado e não soube amar.
Já gritei e pulei de tanta felicidade,
Já vivi de amor e fiz juras eternas, mas “quebrei a cara” muitas vezes!

Já chorei ouvindo música e vendo fotos,
Já liguei só para escutar uma voz,
Já me apaixonei por um sorriso,
Já pensei que fosse morrer de tanta saudade e…
…tive medo de perder alguém especial (e acabei perdendo)! Mas sobrevivi!
E ainda vivo!

Não passo pela vida…
e você também não deveria passar. Viva!!!

Bom mesmo é ir a luta com determinação,
Abraçar a vida e viver com paixão,
Perder com classe e vencer com ousadia,

Porque o mundo pertence a quem se atreve
E A VIDA É MUITO, para ser insignificante.

Cantigas Infantis de Roda (Balaio)


Composição: Barbosa Lessa / Paixão Cortes.

Eu queria se balaio, 
balaio eu queria “sê”
Pra ficar dependurado, 
na cintura de “ocê”

Balaio meu bem, balaio sinhá
Balaio do coração
Moça que não tem balaio, sinhá
Bota a costura no chão

Eu mandei fazer balaio, 
pra guardar meu algodão
Balaio saiu pequeno, 
não quero balaio não

Balaio meu bem, balaio sinhá
Balaio do coração
Moça que não tem balaio, sinhá
Bota a costura no chão

Lima Barreto (A carroça dos cachorros)

Quando de manhã cedo, saio da minha casa, triste e saudoso da minha mocidade que se foi infecunda, na rua eu vejo o espetáculo mais engraçado desta vida.

Amo os animais e todos eles me enchem do prazer da natureza.

Sozinho, mais ou menos esbodegado, eu, pela manhã, desço a rua e vejo.

O espetáculo mais curioso é o da carroça dos cachorros. Ela me lembra a antiga caleça dos Ministros de Estado, no tempo do Império, quando eram seguidas por duas praças de cavalaria de polícia.

Era no tempo da minha meninice e eu me lembro disso com as maiores saudades. 

- Lá vem a carrocinha! - dizem.

E todos os homens, mulheres e crianças se agitam e tratam de avisar os outros. 

Diz D. Marocas a D. Eugênia:

- Vizinha! Lá vem a carrocinha! Prenda o Jupi!

E toda a "avenida" se agita e os cachorrinhos vão presos e escondidos. Esse espetáculo tão curioso e especial mostra bem de que forma profunda nós homens nos ligamos aos animais.

Nada de útil, na verdade, o cão nos dá; entretanto, nós o amamos e nós o queremos. Quem os ama mais, não somos nós os homens; mas são as mulheres e as mulheres pobres, depositárias por excelência daquilo que faz a felicidade e infelicidade da humanidade - o Amor.

São elas que defendem os cachorros das praças de policia e dos guardas municipais; são elas que amam os cães sem dono, os tristes e desgraçados cães que andam por aí à toa.

Todas as manhãs, quando vejo semelhante espetáculo, eu bendigo a humanidade em nome daquelas pobres mulheres que se apiedam pelos cães.

A lei, com a sua cavalaria e guardas municipais, está no seu direito em persegui-los; elas, porém, estão no seu dever em acoitá-los (acolhe-los).

(Publicado na Careta, 20-setembro-1919).

Fonte: Lima Barreto. Marginália. Publicado originalmente em postumamente 1953. Disponível em Domínio Público.