quarta-feira, 7 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 99 =

 
Mara Melinni Garcia
Caicó/RN

FOTOGRAFIA

Não busco da vida o intento
senão de ser, todo dia,
feliz a cada momento
no meu ninho de poesia!
Mara Melinni Garcia

Quero a delicadeza do nascer do sol que, raio a raio, ilumina nossos dias com seu brilho, para que eu seja luz na vida dos que me cercam.

Quero a beleza simples e formosa da flor mais comum, que se sustenta no solo árido, para que nenhuma tristeza ou dificuldade ofusque a beleza da minha alma.

Quero todas as cores dando vida aos meus sentimentos, para que não padeçam meus sonhos no frio passar do relógio.

Quero a inspiração dos momentos mais puros e humanos - o sorrir de uma criança, o abraço caloroso dos meus pais, uma mão amiga quando eu precisar de ajuda e não pedir... - preenchendo meus espaços vazios.

Quero a paz do voo livre de um pássaro... Para que meus braços permaneçam firmes diante do grandioso céu chamado vida.

Quero o amor em sua forma mais serena e branda, com a leveza que protege, acalenta e cura.

Quero o sustento da oração que me ampara, para que eu não sinta medo e nem me perca da esperança.

Quero ser respeitada e admirada...

NÃO POR AQUILO QUE TENHO,
MAS POR AQUILO QUE SOU.

Cantiga Infantil de Roda (Bela pastora)


É uma roda de meninas, com uma do lado de fora. Cantam as da roda:

Lá em cima daquela montanha
Avistei uma bela pastora
Que dizia em sua linguagem
Que queria se casar

Quando as da roda cantam o quarteto seguinte, a pastora vem para o meio, a fim de aprender a brincar:

Bela pastora entra na roda
Para ver como se brinca
Uma roda, roda e meia
Abraçais quem vós quereis

A garota que for abraçada, será então a pastora seguinte.

Fonte: Veríssimo de Melo. Rondas infantis brasileiras. São Paulo: Departamento de Cultura, 1953.

Milton Souza (Bilhetinho de Dia dos Avós)

“Sabe vovó, eu tô escrevendo este bilhetinho porque a profe da minha escolinha me disse duas coisas: que hoje é o Dia dos Avós. E que as vovós e vovôs são as únicas pessoas que conseguem ler e entender as cartinhas de quem ainda não sabe escrever direito.

Eu sei que já sei escrever direito. Sempre que pego num lápis ou numa caneta, encho de letras e desenhos qualquer folha de papel. Mas até agora eu não entendia porque quando mostrava para os adultos os meus escritos eles só diziam: “Que riscalhada”. E eu ficava triste. Porém, quando mostrava para a senhora estes mesmos papéis, a senhora conseguia ler o que eu tinha escrito. Minha lua, meu sol, minha nuvenzinha, minhas casas e até o cachorro que eu sempre escrevia, a senhora lia, entendia e ainda misturava tudo e transformava em gostosas historinhas. Ainda bem que a minha profe me avisou que somente as vovós e os vovôs entendem e sabem ler o que os netinhos escrevem...

Eu quero aproveitar este bilhetinho, vovó, para te pedir desculpas por ter quebrado a santinha que estava na mesinha ao lado da tua cama. Eu sei que tu ficou braba comigo e com o vovô. Mas foi sem querer. A gente tava brincando de cavalinho e eu caia do cavalo em cima da cama. Eu ouvi tu dizer muitas vezes: - “Esta menina vai cair no chão e vai se machucar”. Terminei caindo mesmo, mas foi sobre a tua santinha. Mas não me machuquei. Sei que tu não achou graça nenhuma. Mas foi tri-divertido Eu e o vovô nos escondemos debaixo do lençol para poder rir. Não fica braba com a gente...

Outra coisa, vovó. Quero te dizer que gosto muito de trocar segredinhos contigo. Eu te conto coisas que nem a mamãe pode saber por que sei que tu não contas para ninguém. São segredinhos só nossos, viu. Eu sei que a mamãe ficaria brada se soubesse que tu me dá um monte de balas, que faz coisas gostosas para eu comer quando te digo que estou com fome, que deixas de ver a novela para que eu possa ver os meus desenhos na TV e que me deixas brincar de dar banho na minha boneca com água de verdade. Mas sei que tu não contas e, por isso, gosto ainda mais de ti. Eu até queria fazer um pedido para o meu anjinho da guarda neste Dia dos Avós: que ele pedisse para Jesus mandar para cada criança, principalmente para os meus coleguinhas da escolinha, uma vovó e um vovô parecidos com vocês. Peço isso porque eu conto para eles as coisas boas que a gente faz junto e eles não acreditam. Ele até ficam parecidos com estes adultos que não conseguem entender os bilhetinhos que eu escrevo... Beijos da tua netinha preferida.”

Professor Garcia (Pantuns) VII


PANTUN DA DOCE QUIMERA

Trova tema:
Quem se agarra a uma quimera
quem persegue uma utopia,
age como se soubera
que sem sonhos...morreria!
Carolina Ramos (SP)

Quem persegue uma utopia,
nunca se engana ao pensar,
que sem sonhos...morreria
um sonhador, sem sonhar.

Nunca se engana ao pensar,
que sem sonho, a vida é um tédio;
um sonhador, sem sonhar,
requer um santo remédio.

Que sem sonho, a vida é um tédio;
a ausência dessa ternura,
requer, um santo remédio,
para um mal quase sem cura.

A ausência dessa ternura,
desfaz tudo que se espera,
para um mal quase sem cura,
quem se agarra a uma quimera!
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PANTUN DA SORTE INGRATA

Trova tema:
Festeiro de alma iludida,
disfarçando a sorte ingrata,
faço uma festa da vida
mesmo que a vida me bata!...
José Tavares de Lima (MG)

Disfarçando a sorte ingrata,
eu me entrego ao desafio;
mesmo que a sorte me bata,
não bate em peito vazio.

Eu me entrego ao desafio
e em tudo mantendo a calma;
não bate em peito vazio,
pois ninguém bate em minha alma.

E em tudo mantendo a calma,
sigo em minha caminhada
pois ninguém bate em minha alma
que é mais feliz sem ter nada.

Sigo em minha caminhada
alma de cabeça erguida,
que é mais feliz sem ter nada,
festeiro de alma iludida!
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PANTUN DO DESTEMOR

Trova tema:
Sem temor, meu barco avança,
seja qual for a maré,
pois, no mastro da esperança,
iço a bandeira da fé.
Wanda  de Paula Mourthé (MG)

Seja qual for a maré,
maré baixa, maré cheia,
iço a bandeira da fé,
enfrento o mar, que se alteia.

Maré baixa, maré cheia,
seja do jeito que for,
enfrento o mar, que se alteia,
como eterno viajor.

Seja do jeito que for,
mar aberto, mundo afora,
como eterno viajor
remo em busca de outra aurora,

Mar aberto, mundo afora,
braços cheios de esperança,
remo em busca de outra aurora,
sem temor, meu barco avança,
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PANTUN DO LENÇO DO CAIS

Trova tema:
Mar adentro, mundo afora,
a distância aumenta mais...
e enquanto a saudade chora,
"um lenço acena no cais"
Mara Melinni (RN)

A distância aumenta mais...
lamentando essa distância,
"um lenço acena no cais"
despedindo-se da infância.

Lamentando essa distância,
vê-se a saudade tristonha,
despedindo-se da infância,
num cenário de quem sonha.

Vê-se a saudade tristonha,
e essa tristeza é medida,
num cenário de quem sonha
no instante da despedida.

E essa tristeza é medida,
nos acenos de quem chora,
no instante da despedida,
mar adentro, mundo afora!
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PANTUN DO VELHO SEGREDO

Trova tema:
Já sofri muito, em segredo,
e agora que me refiz,
sou feliz, mas tenho medo
de dizer que sou feliz!
Maria Nascimento Santos Carvalho (RJ)

E agora que me refiz,
não tenho mais o receio
de dizer que sou feliz,
na vida, por qualquer meio.

Não tenho mais o receio
do que tive no passado,
na vida, por qualquer meio
carrego a paz ao meu lado.

Do que tive no passado,
nada tenho no presente,
carrego a paz ao meu lado
e em nada mais sou descrente.

Nada tenho no presente,
para esconder por ter medo,
e em nada mais sou descrente,
já sofri muito, em segredo!

Fonte: Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020. Enviado pelo autor.

Carolina Ramos (Histórias da Bisa)

Certo dia… a Bisa espiou pela janela e viu um bando de passarinhos a revoar ali por perto e pensou. Esses pássaros são parte de uma grande família que se espalhou por aí.

- Papai, mamãe, filhos, netos e até bisnetos...

Será que aquele casal de pássaros que gerou todo esse belo clâ alado, teria chegado mesmo até os bisnetos?!... Difícil saber!

O espaço é imenso!... E também imenso é o mistério que envolve esse espaço, não permitindo imaginar qual o parentesco existente entre aqueles pássaros e aquela outra avezinha pousada num galho, que de longe observava, quase que indiferente, o voo daquelas asas ligeiras a se afastarem dela cada vez mais, sem sequer imaginar se voltariam ou não, algum dia.

E, então, Bisa olhou os bisnetos que brincavam alegremente à sua volta.

Lembrou-se de que: - Logo, logo... ela mesma é que estaria de partida, deixando para trás, um total sempre crescente de algumas criaturínhas que dividiam com ela as alegrias de viver!

Alegrias que não conseguiam ficar caladas dentro deles. E, por isso mesmo, enchiam a casa toda de uma algazarra que não deixava dormirem em paz nem o gato preguiçoso e muito menos aquele cãozinho estabanado que tudo fazia para participar das brincadeiras infantis.

Continuava a pensar: - Quando chegasse a sua vez, ao contrário do que acontecia agora com aqueles pássaros vistos da janela, era ela que, em definitivo, iria embora! E logo seria esquecida por aqueles pequeninos travessos, que desde já, mal tinham tempo para lembrar-se de que ela existia. A não ser quando lhe entregavam, de surpresa, um ligeiro abraço. Um abraço tão rápido, que nem dava tempo para ser retribuído com a mesma espontaneidade e com o dobro de amor.

Seria esquecida, sim! E, com certeza, bem depressa! Já que a vida é assim mesmo, tem pressa para chegar ao Além. 

E foi justamente aí que o plano começou a brotar na cabeça daquela Bisa, que, só não era branca, porque ela era vaidosa e não deixava que assim ficasse.

Contudo, não era nada agradável àquela bisa saber que logo mais seria esquecida. - Mas... Como alguém poderia ser lembrado, depois do derradeiro adeus?!

Retirou, ao acaso, um livro da estante. E, por acaso, o livro era de sua autoria. Folheou-o sem ler. Sabia o que lá estava escrito. Seu pensamento estava longe, porém... Voava junto àqueles pássaros vistos lá da sua janela.

E foi quando, de repente, aquela ideia surgiu tomando posse dela, e acendendo uma luz faroleira no horizonte!

- Sim... Por que não escrever um livro especialmente para aquelas cinco criaturinhas – três bisnetas e dois bisnetos? Os cinco teriam tempo de ter acesso ao que esse livro lhes pudesse contar - dois daqueles pequeninos ainda sequer sabiam ler!

A Bisa já tentara fazer isso, certa vez, escrevendo para os filhos… e depois, para os netos... Não dera certo! O livro que pretendera ser para crianças, falava sobre bichinhos, mas... a linguagem evoluíra sem querer, indo além do pretendido.

Mais autobiográfico do que infantil, o texto fugira praticamente à finalidade. A linguagem não era adequada às crianças, tal como acontecera naquela aventura extraterrestre narrada em seu livro "Um Amigo Especial" - que agradara a tantos leitores, porém... Leitores adultos, não propriamente juvenis, como objetivara.

Desta vez, haveria de ser diferente. Tinha o respaldo das palavras do poeta luso, Fernando Pessoa, uma vez que ele assim se manifestara: 

“Nenhum livro para crianças deve ser escrito para crianças."

-Êpa!... Um caso para pensar!

E a decisão acabou por chegar, sem muita espera:

– Aquela bisa resolveu que: - Contaria uma série de histórias edificantes, perfeitamente acessíveis às crianças, mas... teriam que ser histórias verdadeiras! Completamente isentas de fantasia ou ficção! Histórias vividas por alguém bastante importante e que pudessem ser úteis pela vida inteira, contribuindo, positivamente, para a formação do caráter dos seus bisnetinhos, não apenas na infância propriamente dita, mas principalmente, na adolescência, fase perigosa e de capital importância.

Bisa suspirou fundo para ganhar fôlego. Estava pronto o canteiro, ou seja, a decisão fora tomada.

Faltava ainda o ingrediente principal, ou seja, aquela semente viva, a alma do livro. Tão somente aquele enredo a ser carinhosamente escolhido, plantado e cultivado até virar uma história concreta, com base na verdade e digna do mais absoluto crédito.

Tudo bem... Mas, que história deveria ser essa, dentre tantas dignas de serem escolhidas?

Importante que fosse uma história bonita! Bastante bonita! E não somente bonita... edificante, também!

Uma História real! E, melhor ainda, se vivenciada em nossos dias. Uma história que comprovadamente merecesse ser contada! Não uma historinha inventada ou simplesmente uma verdade desvirtuada e enfeitada para agradar.

A decisão não tardou: - O assunto precisava ter fôlego transcendental. E méritos comprovados que justificassem a sua passagem à posteridade!

Foi o que decidiu aquela Bisa ao conversar consigo mesma, ternamente disposta a plantar a semente do bem no coraçãozinho daqueles seus cinco bisnetos: - Ângela e Sara - quase duas mocinhas. E seus três priminhos, os irmãos – Hosni, Lina e Tarik. Este último, ainda bem novinho. Conhecido pela bisa apenas por fotos, já que residiam em São Paulo e aquele ano, 2021, em que viera à luz, dificultava contatos, com suas restrições e pandemias.

A ideia literalmente caiu do céu, naquela tarde em que a Bisa leu na internet que Carlo Acutis, jovem adolescente de origem italiana, falecido há alguns anos, seria beatificado. O resumo da História de sua edificante vida foi aprovado no ato, pelo coração alvoroçado daquela bisa.

Carlo Acutis!... Perfeito! Personagem ideal para iniciar uma conversinha amena, e a um tempo séria.

Mas, afinal... Quem seria mesmo Carlo Acutis?! Quem?!...

Precisava informar-se melhor, antes de apresenta-lo às suas crianças!

Bisa colocou os óculos sobre o nariz e saiu apressada, em busca dos pormenores indispensáveis àquele caso que tanto a encantara e que pretendia repassar aos seus pequeninos, com precisão e carinho muito especiais.

- Bem... É aqui e agora, que esta história realmente começa.

E que siga adiante, contada pela voz emocionada desta Bisa aos seus cinco netinhos quando, de ouvidos prontos, desejassem ouvi-la.
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continua…

Fonte: Carolina Ramos. As histórias que a Bisa conta. Santos: Ed. da autora, 2022.

Hinos de Cidades Brasileiras (Belém/PA)


Letra: Eduardo Neves
Música: Luiz Pardal

Sobre o verde berço da floresta
Onde brota fauna e flora tão vibrante
Nasceste tu, minha Belém
Entre o leve alento dos igarapés
E agrados de rios afluentes

Junto aos pés de Fortim do Presépio
Naquela distante Feliz Lusitânia
Entre índios, brancos e negros
Gerou-se o forte gen do teu povo
Essência do sangue cabano

Cidade morena do cheiro-cheiroso
És o elo entre o rio e a floresta
Solo fértil que arde imenso saber
Círio e fé na alma do teu povo
Vale Ver-o-Peso em festa

És o portal da Amazônia
A Cidade das Mangueiras
Na Bandeira Nacional
Brilhas Belém, na primeira estrela.

A. A. de Assis (O Frade Frei Vitório)

Nosso professor de português no Colégio Fidelense, Expedito Neme, costumava aproveitar toda oportunidade para nos passar alguma dica interessante sobre certas sutilezas da linguagem. Eu tinha até um caderninho especial onde ia anotando cada uma daquelas lições fora do script.

Certa vez, por ser véspera da festa do padroeiro (São Fidélis de Sigmaringa), ele interrompeu a aula para perguntar se a gente sabia quais foram os fundadores da cidade. Um dos alunos, todo prosa, respondeu: “Foram dois freis capuchinhos”. “Nota 5 – sentenciou o mestre. Para ganhar 10 você deveria ter dito que foram dois frades, não dois freis”.

Ficamos todos boiando, sem entender qual era o problema. O professor explicou então que “frade” e “frei” (do latim “frater” = irmão) eram a mesma coisa, porém havia um porém: “frei” é uma forma abreviada de “frade” e só se usa junto do nome do religioso – frei Henrique, frei Jacinto. Ipso facto, a resposta correta e completa do menino teria que ser assim: “Os fundadores da cidade foram dois FRADES capuchinhos – FREI Ângelo e FREI Vitório”. Em Maringá diremos (certinho) que o nosso arcebispo, Dom FREI Severino, é um FRADE franciscano”.

Noutra ocasião, uma aluna perguntou se poderia sair um pouco mais cedo, porque teria que ir a um ensaio extra do “coral”. O professor Expedito aproveitou e deu mais um dos seus pitacos: “Ao ensaio do coral você não vai; só permito se for ao ensaio do coro”. E lá veio a explicação. “Coro” é substantivo; “coral” é adjetivo. “Coro” é o nome do grupo de vocalistas; o que o grupo canta é que se chama “canto coral”, ou seja, “canto do coro”. Hoje seria difícil voltar a chamar de “coro” o que quase todos passaram a chamar de “coral”. Mas fica a dica.

Como ex-seminarista, o bom e sábio mestre gostava especialmente de ensinar o significado de palavras relacionadas com religião. Vou dar alguns exemplos que no momento me ocorrem.

Aleluia – palavra de origem hebraica: “halleluyah”. “Hallelu” = louvar + “Yah” = forma abreviada de Javé. Alelu-ia significa então “louvai a Javé”, “louvai a Deus”.   

Paróquia – do grego “paroikia” (para = ao lado + oikia = casa). Ao pé da letra, paróquia é o mesmo que vizinhança, conjunto de casas vizinhas, comunidade. No sentido eclesial, paróquia é um território confiado a um pároco (antigamente mais conhecido como vigário). “Vigário”, em latim “vicarius”, de “vicis agere” = aquele que faz as vezes de outro, ou que age em nome de outro). No caso, é o padre que, na paróquia, zela pelos fiéis em nome do bispo.   

Bispo – do grego “epíscopos”  > epíscopo > piscopo > bispo). Epi = posição superior + scopos = ver). Supervisor. Lembra o antigo pastor de ovelhas, que se colocava geralmente no alto de uma colina para cuidar do rebanho. O bispo é o responsável pelo governo de uma diocese. O bispo da diocese principal de uma província eclesiástica (como é o caso de Maringá) tem o título de arcebispo (arce, arqui = principal) e sua diocese tem o nome de arquidiocese.

(Crônica publicada na edição de 26 outubro 2023, do Jornal do Povo) 

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

Trova ao Vento – 007

 

Mensagem na Garrafa = 98 =

Manuel Bandeira
(Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho)
Recife/PE, 1886 - 1968, Rio de Janeiro/RJ

ENQUANTO A CHUVA CAI

A chuva cai. O ar fica mole...
Indistinto... ambarino... gris...
E no monótono matiz
Da névoa enovelada bole
A folhagem como o bailar.
Torvelinhai, torrentes do ar!

Cantai, ó bátega chorosa,
As velhas árias funerais.
Minh'alma sofre e sonha e goza
À cantilena dos beirais.

Meu coração está sedento
De tão ardido pelo pranto.
Dai um brando acompanhamento
À canção do meu desencanto.

Volúpia dos abandonados...
Dos sós... - ouvir a água escorrer,
Lavando o tédio dos telhados
Que se sentem envelhecer...

Ó caro ruído embalador,
Terno como a canção das amas!
Canta as baladas que mais amas,
Para embalar a minha dor!

A chuva cai. A chuva aumenta.
Cai, benfazeja, a bom cair!
Contenta as árvores! Contenta
As sementes que vão abrir!

Eu te bendigo, água que inundas!
Ó água amiga das raízes,
Que na mudez das terras fundas
Às vezes são tão infelizes!

E eu te amo! Quer quando fustigas
Ao sopro mau dos vendavais
As grandes árvores antigas,
Quer quando mansamente cais.

É que na tua voz selvagem,
Voz de cortante, álgida mágoa,
Aprendi na cidade a ouvir
Como um eco que vem na aragem
A estrugir, rugir e mugir,
O lamento das quedas-d'água!

[Manuel Bandeira. A cinza das horas. 1917]

Cantiga Infantil de Roda (Lagarta pintada)


É uma roda de crianças, cada qual pegada na orelha da outra, cantando e dançando:

Lagarta pintada 
Quem foi que te pintou
Foi uma velha 
Que passou por aqui
A saia da velha 
Fazia poeira
Puxa lagarta 
No pé da orelha

Quando as meninas dizem - Puxa lagarta no pé da orelha - puxam realmente com força na orelha das outras

Outra versão:

Lagarta pintada quem foi que te pintou?
foi uma menina que aqui passou
por dentro das areias levanta poeira
pega esta menina pela ponta da orelha.

Lagarta pintada quem foi que te pintou?
Foi a velha cachimbeira por aqui passou.
No tempo da areia fazia poeira, Puxa
Lagarta nessa orelha... Orelha, orelha!

(Fonte: Veríssimo de Melo. Rondas infantis brasileiras. São Paulo: Departamento de Cultura, 1953)

Liév [Leon] Tolstói (Os dois irmãos)

Dois irmãos foram viajar juntos. Ao meio-dia, deitaram na floresta para descansar. Quando acordaram, viram que a seu lado havia uma pedra e na pedra havia algo escrito. Começaram a soletrar e leram:

“Quem achar esta pedra deve seguir direto para dentro da floresta na direção do nascer do sol. Na floresta, passa um rio; atravesse o rio até o outro lado. Vai ver uma ursa e seus filhotes: tome os filhotes da ursa e corra o mais que puder direto para a montanha. Na montanha, vai ver uma casa e, na casa, vai encontrar a felicidade.”

Os irmãos leram até o fim o que estava escrito e o mais jovem disse:

− Vamos os dois juntos. Quem sabe a gente consegue atravessar o rio, achar os ursinhos, levá-los até a casa e então, juntos, encontraremos a felicidade?

Então o mais velho respondeu:

− Não vou entrar na floresta atrás de filhotes de urso e não aconselho que você faça isso. Em primeiro lugar, ninguém sabe se é verdade o que está escrito nessa pedra; talvez tenham escrito tudo isso de brincadeira. Talvez não tenhamos soletrado direito. Em segundo lugar, se for verdade o que está escrito, vamos entrar na floresta, vai anoitecer, não vamos achar o rio e vamos nos perder. E se acharmos o rio, como é que vamos atravessar? Quem sabe se é largo e tem correnteza? Em terceiro lugar, se atravessarmos o rio, por acaso é fácil tirar os filhotes de uma ursa? Ela vai nos fazer em pedaços e, juntos, vamos perder a felicidade à toa. Em quarto lugar, se conseguirmos pegar os ursinhos, não vai dar para correr até a montanha sem descansar. E o principal ainda não foi dito: que felicidade vamos encontrar nessa casa? Talvez lá nos espere uma felicidade da qual não temos nenhuma necessidade.

O mais jovem respondeu:

− Para mim, é diferente. Não iam escrever isso à toa numa pedra. E tudo está escrito com clareza. Em primeiro lugar, não vamos sofrer nenhuma desgraça se tentarmos. Em segundo lugar, se não formos, outra pessoa vai ler a mensagem na pedra, vai encontrar a felicidade e nós vamos ficar sem nada. Em terceiro lugar, não se esforçar, não trabalhar não traz alegria a ninguém. Em quarto lugar, eu não quero que pensem que eu tive medo de alguma coisa.

Aí o irmão mais velho respondeu:

− Diz o provérbio: “Quem procura a grande felicidade perde a pequena”; e também: “Um pardal na mão vale mais do que uma cegonha no céu”.

E o mais jovem disse:

− Pois eu ouvi: “Quem tem medo de lobo não entra na floresta”; e também: “Debaixo de uma pedra parada, a água não corre”. Acho que é preciso ir.

O irmão mais jovem foi e o mais velho ficou.

Assim que o mais jovem entrou na floresta, topou com o rio, atravessou-o e logo na margem viu uma ursa. Estava dormindo. Ele agarrou os ursinhos e fugiu em desabalada carreira para a montanha. Quando chegou ao topo, vieram muitas pessoas a seu encontro, trouxeram uma carroça, o levaram para a cidade e o fizeram rei.

Ele reinou por cinco anos. No sexto ano, teve uma guerra contra um rei mais forte que ele, que conquistou a cidade e o expulsou. Então o irmão mais jovem voltou a vagar pelo mundo e foi ao encontro do irmão mais velho.

O irmão mais velho morava na aldeia, não era rico nem pobre. Os irmãos se alegraram um com o outro e conversaram sobre a vida.

O irmão mais velho disse:

− Aí está, eu tinha razão: levei uma vida boa e sossegada, o tempo todo; já você, embora tenha sido rei, passou muita desgraça.

O mais jovem disse:

− Eu não sofro com o que aconteceu no passado na floresta e na montanha; apesar de agora eu estar mal, tenho o que recordar na minha vida, já você não tem nada para lembrar.

Fonte: Liev Tolstói. Livros de leitura para crianças. Publicado originalmente em 1864. Disponível em Domínio Público

Dinair Leite (José Bento)


Peço licença meu povo,
ao expressar nesta trova,
a saga do primoroso
José Bento, à toda prova.

Esta história dos avós
inspira um quadro forrioso,
feito em sutis rococós,
num resgate glorioso.

Vovó eu mal conhecia
mas lembro a leve ternura
do amor que pouco vivi,
desse anjo belo em candura.

Quando se foi a vovó
para o céu... Ó que amargura!
Nosso galo carijó
cantou rouco e sem altura.

Se foi tão cedo a vovó,
levou lendas e mil juras! 
Já do vovô fui xodó,
consolo, bênção, venturas...

O vovô era tão lindo,
português, loiro de escol,
em qualquer lugar bem-vindo,
brílhante feito um farol!

A vovó também lindinha,
a pele alva como o leite,
da linda italianinha,
sem dúvida era um deleite.

Ângela Moreti, o nome
da bela sinhá e que ora
pelos netos - se consome -
rogando à Nossa Senhora!

A vovó sempre encantada,
com vovô e com poesia,
recebia extasiada,
verso, beijo e companhia.

Vovô era encantador!
Divina a sua cantiga,
mimava a vovó de amor
e ainda curtia uma briga...

Ele era prestes, garboso,
era alma da flor, crisol.
Era trovador charmoso,
em trovas de lua ou sol!...

Vovô era homem prendado,
lavrava a terra e sorria
às sete filhas - coitado -
pois filho algum ele tinha.

Seu Zé era bom trovista,
sobejo de Portugal,
da Galiza - humilde artista,
um inventor genial!

Roda d'água ele criou,
bem diferente, e um monjolo.
A fazenda prosperou...
Como era verde seu solo!

Mas voltando lá atrás
deste conto, que é poesia,
vemos vovô que num zás…
trás, se espichava à Maria.

Maria Izabel, bem morena,
cheia de borogodó,
passista desde pequena,
ela era uma graça só.

Vovô levara vovó,
para ver passar o samba.
No chão levantava o pó...
No samba ele era um bamba!

E, se vovó se zangava
e olhava-o criticando,
o belo, o facho abaixava,
se recompunha... sambando.

-Ângela... samba é cultural
- dizia vovô, o olhar
disfarçado na cintura
da cabrocha a rebolar...

- Ó José... se mal me engano
você não tem sangue mouro,
lembra mais deus africano,
meu português verde-louro.

E vovô ria envolvente,
bigode bem aparado,
cantando em fervor de crente,
caprichando o rebolado.

 Vovó via o vô sambar
e ficava enciumada.
Mas... era deusa em altar,
do Zé era a bem amada!

E... vovó sem utopia,
transbordante de bondade,
amava o vô e sabia
que era amada de verdade.

Vovô era boa pinta,
mulherengo que ele só,
virava-se bem nos trinta,
mas, a respeitar vovó.

Meu avô me deu amor,
com paciência e carinho,
me ensinou amar a flor,
proteger o passarinho!

Às vezes vejo na vida
verde-olhar, pele-café...
Será a neta na avenida,
sambando o sangue do Zé?

[Fonte> Dinair Leite. 11 rostos: antologia poética. SP: Edicon, 2015]

Arthur Thomaz (“Buteco”)

O autor escreve “buteco” porque entende que quem escreve boteco jamais esteve em um “buteco”.

O que nos leva ao “buteco”? Curiosidade, carência, busca de aventuras, a procura de reconhecimento ou pura sem-vergonhice.

Realizaremos um pequeno estudo sobre “butecos”, fazendo uma distinção entre o “buteco” citadino e o “buteco” de zona rural. Iniciaremos pelo rural, também denominado de Bolicho ou Bulicho.

Usualmente, conta com uma pequena construção de madeira com um telhado ao lado para comportar quatro ou cinco mesas de metal cedidas por fabricantes de cerveja. Geralmente, estão enferrujadas pelo derramamento constante de líquidos pelos usuários já bem animados. Situadas normalmente em frente à pequena propriedade rural do dono.

Sobre o chão de cimento, há alguns garrafões de cachaça de coloração amarelo ouro que incitam imediatamente a vontade de tomar o primeiro copo.

No isopor com muito gelo, temos algumas garrafas de cerveja. Sobre o rústico balcão, estão alguns petiscos que servem de tira-gosto e que causariam inveja a qualquer chef de cozinha.

Alguns afortunados, como este autor, tiveram a rara oportunidade de parar em alguns Bolichos no interior e no Litoral Sul do estado de São Paulo, em que atrás do “buteco” corria um riacho e que a engenhosidade do brasileiro se fazia presente.

Amarradas em uma corda, algumas garrafas de cerveja eram mergulhadas neste arroio e depois retiradas geladas para o consumo dos sortudos.

Na conta final não constava o dedo de prosa, sempre presente e agradabilíssimo. Iniciamos o estudo do “buteco” citadino, diferenciando-o entre bar e “buteco”. Bar é aquele local em que todos entram e saem, bebem, deseducadamente fumam um cigarro lá dentro, não conversam com ninguém, e vão embora.

Os “butecos”, locais intimistas, por sua vez, possuem, como as gafieiras, um inviolável estatuto, seguido à risca pelos frequentadores. 

O buteco raiz é na calçada mesmo, somente com um balcão de atendimento, com inúmeros petiscos. Os frequentadores ficam em pé na calçada ou sentados em confortáveis caixotes de cerveja.

Esta modalidade de “buteco” apresenta somente uma restrição: não funcionar em dias chuvosos.

O “buteco”, mais modernizado, oferece o serviço de garçonetes. No segundo dia, elas já chamam os fregueses pelo nome, trazendo imediatamente a bebida predileta dos clientes. Enfim, “butecos” são pedacinhos do paraíso.

Fonte> Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: imponderáveis. Volume 3. Santos/SP: Bueno Editora, 2022. Enviado pelo autor 

Hinos de Cidades Brasileiras (Londrina/PR)


Música: Andrea Nuzzi
Letra: Francisco Pereira Almeida Jr.

Londrina!
Cidade de braços abertos
A todos os filhos do nosso Brasil!

E a todos aqueles de Pátrias distantes,
Que aqui, confiantes
Sob um pálio anil,
Seu lar construíram e aos filhos se uniram,
E aos filhos se uniram do nosso Brasil!

Londrina!
Cidade que sobe, que cresce,
Que brota e floresce,
Que em frutos se expande!
Que a Pátria enriquece,
Que alta, e que grande,
O encanto oferece
De sempre menina!

Londrina!
Das matas e das derrubadas,
Londrina das roças de espigas dobradas!
Das filas cerradas de pés de café!
Dos grandes poentes das tardes douradas,
De escolas ao longo das longas estradas!
Do arado, do livro, da indústria e da fé!
De braços abertos, dá pouso e guarida,
A todos que a buscam, materna e gentil!
Porém, destemida, se os brios lhe ofuscam,
Sói ser atrevida, impávida, hostil.
Seu solo fecundo, feraz, generoso
A quem, carinhoso, lhe deita a semente,
Por uma dá mil!
Padrão de trabalho plantado na História!

Londrina!
Cidade que um povo viril
Ergueu para a
Glória
Do nosso Brasil!