quarta-feira, 14 de maio de 2008

Lenda Indígena (A Chefe Naruna: A Rebelião das Mulheres)

Naruna foi eleita governante de sua tribo por ser a mais bonita.

Governava seu povo com a altivez de uma rainha, quando chegaram à aldeia uns estrangeiros de uma tribo dispersa, da qual Jurupari era o chefe.

Naruna, apesar de sua rara beleza, ainda estava solteira, não por opção, mas porque seu coração não havia palpitado mais forte por nenhum guerreiro de sua tribo.

Sendo assim, acolheu os estrangeiros e entre eles, encontrava-se Date, o mais lindo e forte dos estrangeiros que mexeu com suas entranhas de mulher. Escolheu-o então, para ser seu marido.

Date, que também tinha ficado sensibilizado com a beleza e inteligência de Naruna, aceitou-a como esposa.

Marcaram o casamento para a próxima lua. Date temia desgostar à Jurupari, mas estava perdidamente apaixonado por Naruna. Jurupari soube o que se passava pela Mãe do Sono (seu próprio sono). Então partiu com pressa para a aldeia de Naruna, mas só chegou lá no dia do casamento.

Quando começou a entrega dos presentes, Naruna ficou admirada e ao mesmo tempo fascinada com a imponente presença de Jurupari. Como ainda não estava casada com Date, num impulso pediu-o em casamento. Jurupari recusou e se ofendeu. Naruna, cheia de ódio, mandou que seus guerreiros castigassem Jurupari. Naruna, seus guerreiros e todos os índios adormeceram, ficando como que petrificados com o poder de Jurupari.

Jurupari dirige-se a Date e diz:

-"Toma esta puçanga, governa este povo e submete-o às nossas leis. Quando Naruna acordar não se lembrará que foi chefe." A seguir desaparece na floresta.

Date colocou a puçanga, ordenou a Naruna que acordasse e fosse banhar-se no rio.

Naruna sentiu que havia perdido tudo, mas principalmente o poder de governar e então meteu-se em uma talha de cachiri e acabar de vez com seu sofrimento.

À hora da refeição, Date procurou em vão por Naruna. Colocou a puçanga no nariz e chamou-a. A talha, como se tivesse pernas parou junto dele. Date quebrou a talha e encontrou o corpo de Naruna, morta pelos vapores da fermentação do cachiri. Date enterrou-a e todas as noites ia chorar sobre sua sepultura.

Um dia, encontraram-no morto e ali mesmo foi enterrado junto a Naruna. A tribo pintou-se de urucum e maldisse Jurupari!

Na lenda, estamos diante de uma ginecocracia, isto é, um governo de uma mulher, no nosso caso, Naruna. Portanto, é possível afirmar, que já houve épocas, na Amazônia, que imperava o matriarcado, mas que esse direito foi perdido, com o aparecimento de Jurupari, o "Filho do Sol", que instituiu novas leis sociais. Todas as mulheres então, passaram a uma condição de inferioridade.

Não satisfeitas com a nova condição e tendo em vista à forte repressão masculina, muitas fugiram e outras, como é o caso de Naruna, que não conseguiu retomar o poder, preferiu matar-se.

Date, na lenda, é considerado um dos "Filhos do Sol", ou seja, pertencia a uma comunidade de homens, que respeitavam as duras leis de Jurupari.

O Jurupari, foi o responsável pela instituição secreta "Casa dos Homens", que nada mais é do que um divisor de águas entre homens e mulheres, ou seja, servia para impor o caráter patriarcal no seio das tribos.

SITUAÇÃO DAS MULHERES ENTRE OS KAIAPÓS

As mulheres indígenas também são feministas, conhecem seu valor e sabem se impor diante de seus maridos e companheiros.

Na nossa sociedade indígena, em quase todas as tribos conhecidas, há igualdade entre os sexos. As restrições a certos tipos de afazeres possuem raízes mitológicas e não preconceito em relação ao sexo.

Entre os Kaiapós, do grupo Jê, as meninas chegam a puberdade por volta dos onze anos e já recebem instruções de suas mães para a utilização da planta conhecida como "mehrã-kendiô" (gente não deixa gerar), um anticoncepcional natural, com a qual fazem chás que as esterilizam por mais de um ano.

Também fazem uso de pinturas e "arapê kamrik" (bandoleira de fios de algodão na cor vermelha), para mostrar que já estão na idade de iniciar-se sexualmente. Depois elas passeiam pela tribo e arredores, para serem perseguidas pelos homens solteiros e serem desvirginadas. Quando a situação é concretizada, elas relatam aos seus pais e o acontecimento é comemorado.

Daí em diante, passam a ser consideradas adultas e vão pertencer à categoria "mekraytuk", mulheres que possuem as coxas pintadas de preto, com direito a fazer amor com quem quiserem.

Os rapazes também passam por uma situação semelhante e são agarrados pelas mulheres. Depois de serem desvirginados, passam a pertencer à categoria menõrõnu e devem usar proteção peniana. Quando as duas categorias se encontram, praticam relações sexuais livremente.

TIPOS DE CASAMENTO ENTRE KAIAPÓS

Já o casamento entre os Kaiapós são de dois tipos. No "me-prõ-printi" (o casamento prometido ou de virgens). A cerimônia é chamada de "abénmó djuuó ngo", que significa "gente, uns aos outros, pão dá". Nela é realizada uma grande festa, onde são servidos beijus com castanha do pará. Durante a festa o casal recolhe-se a uma choça reservada aos nubentes, onde acontece o defloramento. Em seguida, o jovem marido deverá exibir seu pênis sujo de sangue ao Conselho dos Velhos. Caso não haja sangue, fica comprovado que o casal teria tido relações antes do casamento.

O outro tipo de casamento é o que ocorre entre aqueles que já foram iniciados sexualmente. É organizada também uma grande festa para os jovens casadouros formam semi-círculos em frente um do outro, e uma pajé manda uma moça escolher seu marido. Ela aponta o rapaz que mais lhe agradar e, esse não poderá recusar, pois caso contrário, será ridicularizado por seus companheiros. Nesse tipo de casamento não há pacto de fidelidade conjugal até que resolvam consolidar a relação com um filho.

As índias Yanomami casam-se após a segunda menstruação, o que ocorre com a idade de onze à treze anos. Com doze anos, muitas delas já têm filhos. As mulheres também participam das guerras, com medo de servirem de troféus para os vencedores.

A infidelidade feminina, muito constante nessa tribo, é perdoada em troca de uma punição: o irmão aplica uma surra nos amantes. Essa punição redime o adultério e a sociedade não condena mais a mulher.

Também o homem que gosta de se ausentar da tribo e sua mulher não fica contente com a situação, corre o risco de quando voltar já encontrar outro em seu lugar. E a mulher é sempre considerada herdeira inconteste e jamais perde a guarda de seus filhos.

RITUAL DAS AMAZONAS (MEBIÔK)

Apesar de toda essa liberdade feminina os Kaiapós, realizam uma vez ao ano o Mebiôk, o Ritual das Amazonas.

Durante sete dias, ou o período de uma lua, as mulheres se tornam donas da aldeia e instalam-se na "ngobe", ou seja, na Casa dos Homens, proibida às mulheres. Cabe aos homens realizar as tarefas femininas, preparando os alimentos e cuidando dos filhos. À noite, eles são chamados para atender as necessidades das mulheres e provarem que são viris. É como se a época do matriarcado retornasse. Na última noite, no encontro na "ngobe" completamente às escuras, sem mostrar quem realmente são, fazem sexo até o pajé anunciar a aurora. Elas vão tomar banho e depois voltam às suas casas e a sua vida normal.

Através desse ritual, as mulheres relembram a seus maridos de que, se não as tratarem bem, elas podem se rebelar, como já fizeram suas antigas ancestrais, as amazonas.

As lendas das Amazonas não estão presentes apenas na cultura Kaiapó. Enquanto os homens xinguanos (Kamayurá, Ywalapiti, Mehinaku ou Waurá) realizam rituais como Karytu, Yawari ou Kuarup, no qual, além da mensagem mítica, pretendem reafirmar seu poder na sociedade, valorizando a beleza, a força e o vigor dos homens, as mulheres, em oposição, celebram o Yamarikumã, o ritual das Amazonas.

Esse ritual representa a rebelião coletiva contra o desprezo e a humilhação de permanecerem como simples espectadoras, assistindo às demonstrações que consideram machistas. Reagindo, elas fazem o "moitará" (o comércio de troca intertribal), batem nos maridos, apropriam-se dos seus artesanatos e das flautas sagradas, cantam, dançam e lutam "huka-huka" e promovem uma festa tão grande quanto a masculina. Essa é a forma de demonstrarem que a qualquer momento podem repetir o episódio das amazonas guerreiras e viver isoladamente.

Fonte:
http://www.rosanevolpatto.trd.br/lendanaruna.htm

terça-feira, 13 de maio de 2008

Pedro Malasartes e o Urubu

Malasartes fez o urubu falar

Quando o pai de Pedro Malasartes entregou a alma a Deus, fez-se a partilha dos bens - uma casinha velha - entre os filhos; e tocou a Pedro uma das bandeiras da porta da casa, com o que ele ficou muito contente.
Pôs a porta no ombro e saiu pelo mundo. Em caminho viu um bando de urubus sobre um burro morto. Atirou a porta sobre eles e caçou um urubu que ficou com a perna quebrada.

Apanhou-o, pôs a porta às costas e continuou viagem. Obra de uma légua ou mais, avistou uma casa de onde sala fumaça, o que queria dizer que se estava preparando o jantar.

Pedro Malasartes, que sentia fome, bateu à porta e pediu de comer.

Veio atendê-lo uma preta lambisgóia que foi logo dizer à patroa que ali estava um vagabundo, com um urubu e uma porta, a pedir de jantar.

A mulher mandou que o despachasse, que sua casa não era coito de malandros.
O marido estava de viagem e a mulher no seu bem bom a preparar um banquete para quem ela muito bem o destinava. Neste mundo há coisas!
Pedro Malasartes, tão mal recebido que foi, resolveu subir para o telhado, valendo-se da porta que trazia e lhe serviria de escada. Subiu e ficou espreitando o que se passava naquela casa, tanto mais que sentia o cheiro dos bons petiscos.
Espiando pelos vãos das telhas viu os preparativos e tomou nota das iguarias, e ouviu as conversas e confidências da patroa e da negra.

Justamente na hora do jantar chegou o dono da casa que resolvera voltar inesperado da viagem que fazia.

Quando a mulher percebeu que ele se aproximava, mandou esconder os pratos do banquete e veio recebê-lo e abraçá-lo, muito fingida, muito risonha, mas por dentro queimando de raiva.

Vai dai mandou pôr na mesa a janta que constava de feijão aguado, paçoca de carne seca, dizendo:
- Por que não me avisou, marido? Sempre se havia de aprontar mais alguma coisa...

Sentaram-se à mesa.

Pedro Malasartes desceu de seu posto e bateu na porta, trazendo o urubu.

O dono da casa levantou-se e foi ver quem era. O rapaz pediu-lhe um prato de comida e ele chamou-o para a mesa a servir-se do pouco que havia. A mulher estava desesperada, desconfiando com a volta do Malasartes. Pedro tomou assento, puxou o urubu para debaixo da mesa, preso pelo pé num pedaço de corda. Estavam os dois homens conversando, quando de repente o Malasartes pisou no pé quebrado do bicho e este se pôs a gritar:

Uh! uh! uh!

O dono da casa levou um susto e perguntou que diabo teria o bicho. Pedro respondeu muito sério:
- Nada! São coisas. Está falando comigo.
- Falando! Pois o seu bicho fala?!
- Sim senhor, nós nos entendemos. Não vê como o trago sempre comigo? É um bicho mágico, mas muito intrometido.
- Como assim?
- Agora, por exemplo, está dizendo que a patroa teve aviso oculto da volta do senhor e por isso lhe preparou uma boa surpresa.
- Uma surpresa! Conte lá isso como é.
- É deveras! Uma excelente leitoa assada que está ali naquele armário...
- Pois é possível! Ó mulher, é verdade o que diz o urubu deste moço?

Ela com receio de ser apanhada com todo o banquete e certa já de que Pedro sabia da marosca, apressou-se em responder:
- Pois então? Pura verdade! O bicho adivinhou. Queria fazer-te a surpresa no fim do jantar.

E gritou pela preta:
- Maria, traz a leitoa.

A negra veio logo correndo, mas de má cara, com a leitoa assada na travessa.

Daí a pouco Pedro Malasartes pisou outra vez no urubu que soltou novo grito. O dono da casa perguntou:
- O que é que ele está dizendo?
- Bicho intrometido! Está candongando outra boca, bicho!
- O que é?
- Outras surpresas...
- Outras!
- Sim senhor: um peru recheado...
- É verdade, mulher?
- Uma surpresa, maridinho do coração! Maria, traz o peru recheado que preparei para teu amo.

Veio o peru. E pelo mesmo expediente conseguiu Pedro Malasartes que viessem para a mesa todas as iguarias, doces e bebidas que havia em casa.

Ao fim do jantar, o dono da casa, encantado com as proezas do urubu, propôs comprá-lo a Pedro Malasartes que o vendeu muito bem vendido, enquanto a mulher e a preta bufavam de raiva, crentes também no poder mágico do bicho, que assim seria um constante espião de tudo quanto fizessem.

Fechado o negócio, Pedro Malasartes partiu satisfeito e vingado.

De como Malasartes vendeu o urubu

O dono da casa vendo que o urubu de Pedro Malasartes era encantado e sabia descobrir todos os segredos, propôs-lhe comprá-lo.

Malasartes, pescando que estava em véspera de fazer um bom negócio, encareceu ainda mais as virtudes do urubu e pediu este mundo e o outro.

O homem vacilou em fechar o negócio, e Pedro, justamente quando uma preta velha veio trazer café a sala, disse ao dono da casa de modo que a mucamba ouvisse:
- Este bicho é deveras encantado, patrão. ele é capaz de descobrir outras coisas que se passam em sua casa sem o senhor saber.
- Não me diga isto!
- É o que lhe digo. Mas, para que ele não emudeça e possa contar tudo que tenha visto, é preciso que haja o maior cuidado para que nenhuma mulher lhe verta água na cabeça. E, se quiser experimentar, deixe-o esta noite ficar no corredor, que amanha teremos que saber muitas novidades.

O homem aplaudiu a proposta e prometeu comprar o urubu se saísse certo o que lhe dizia o Malasartes.

Mas a preta que tinha ouvido a combinação mal saiu da sala foi contar tudo à senhora, que ficou muito assustada, pois que, naquela noite, havia de receber a visita do sacristão da vila, e não sabia como arranjar para que o urubu candongueiro não pusesse tudo a perder.

A preta teve uma luz, e disse que não havia perigo, pois ela se encarregaria de verter água na cabeça do urubu para que ele perdesse o encanto.

Às tantas da noite todos se foram acomodar, tendo Malasartes cuidado de deixar o bicho no corredor, fazendo de sentinela.

Lá para a virada da noite, a dona da casa, pé que pé, veio abrir a janela, por onde saltou para dentro o sacristão, enquanto a preta estava fazendo o que prometera na cabeça do urubu.

Quando o bicho se viu com a cabeça toda molhada, não teve mais conversa - tico! e deu uma bicada na preta lá onde quis e ela ficou segura, e vai então a negra soltou um grito.

A senhora, temendo que o marido despertasse, correu para arrancar a sua mucamba do bico do bicho. Agarrou-a pelo braço, mas não houve meio. A rapariga, então no auge do aperto, apegou-se no braço da senhora que se pôs também a gritar. O sacristão acudiu para ver se podia ajudar as duas a se desvencilharem. Mas, já a este tempo, Pedro Malasartes havia despertado o dono da casa. E os dois correram a ver o que era e encontraram aqueles três assim como estavam.

E vai então o dono da casa descobriu tudo, desancou o sacristão a pau, moeu os ossos tanto da senhora como da escrava e resolveu comprar o urubu.

Mas ai é que foi a história. Pedro Malasartes pediu pelo bicho cinco contos de réis. Abate que não abate, o homem teve mesmo de encorropichar o cobre, vintenzinho por vintenzinho, e Pedro Malasartes, deixando ficar o urubu, de quem se despediu chorando, pôs-se a caminho, mas vendo no pátio da fazenda uma carneirada, resolveu levá-la também e foi tocando como se fosse dono dela.

Fontes:
http://victorian.fortunecity.com/postmodern/135/pedromala.htm
http://climashopping.jacotei.com.br/ (imagem)

Lenda do Equador (Nunkui, criadora das plantas)

(Lenda Shuar - Equador)

Há muitos anos, quando os shuaras recém começavam a povoar as terras orientais do Equador, a selva não existia. Em seu lugar se estendida uma terra manchada apenas por escassas ervas. Uma destas era o unkuch, o único alimento dos shuaras.

Graças ao unkuch, os shuaras puderam suportar durante muito tempo a aridez da areia e o calor sufocante do sol equatorial.. Lamentavelmente, um dia, a erva de foi e os shuaras começaram a desaparecer lentamente.

Alguns, recordando outras desgraças, colocaram a culpa em Iwia e Iwianchi, seres diabólicos que desnudavam a terra comendo tudo quanto existia; mas outros continuaram seus esforços para encontrar o ansiado alimento. Entre estes havia uma mulher:Nuse. Ela, vencendo seus temores, buscou o unkuch entre os lugares mais ocultos e tenebrosos, mas tudo foi inútil. Sem desanimar, voltou onde estavam seus filhos e, contagiando-os com seu entusiasmo, reiniciou com eles a busca.

Seguindo o curso do rio, caminharam muitos dias; mas à medida que transcorria o tempo, o calor agoniante dessas terras terminou por aplastá-los. Assim, um a um, os viajantes caíram estendidos na areia.

Inesperadamente, sobre a transparência do rio, apareceram pequenas rodelas de um alimento desconhecido: a yuca. Ao vê-las, Nuse se lançou ao rio e as tomou. Apenas provou esse fruto saboroso e doce, sentiu seu animo renascer misteriosamente e, em seguida, correu a socorrer seus filhos. De pronto, percebeu que alguém a observava lá do vento. Inquieta, voltou seus olhos por todos os lados, mas só viu a solidão cinza do deserto e, de súbito, surgiu uma mulher de beleza primitiva.

Nuse recuou assustada, mas ao descobrir a doçura do rosto desta mulher, perguntou-lhe:
-Quem és, senhora?

-Eu sou Nunkui, a dona e soberana da vegetação. Sei que teu povo vive numa terra desnuda e triste, onde apenas cresce o unkuch, mas...
-O unkuch já não existe! Era nosso alimento e desapareceu. Por favor, senhora, sabe onde posso achá-lo? Sem ele, todos os de meu povo morrerão.
-Nada lhes acontecerá, Nuse. Tu demonstraste valentia e por isso te darei, não só o unkuch, mas todo o tipo de alimento.

Em segundos, ante os olhos surpresos de Nuse, apareceram galhos de ramas perfumadas.

Nuse ficou extasiada ppois jamais tinha visto nada semelhante: a paisagem era majestosa e a música que cantava a floresta, lhe havia roubado o coração.

Nunkui continuou:
-e para teu povo, que hoje luta contra a morta, te obsequiarei uma menina prodigiosa que tem a virtude de criar o unkuch e a yuca que comeste e ...
-Graças Nunkui, graças!

Nunkui desapareceu e em seu lugar surgiu a menina prometida.

Nuse ficou deslumbrada pelo que havia visto e ainda não saíra de seu assombro quando a pequena a guiou. Tão à vontade chegou a se sentir que desejou permanecer ali para sempre. Contudo, a lembrança de seu povo a entristeceu. Então, a pequena, filha de Nunkui – como logo a chamaram – anunciou-lhe que além também, no território dos Shuaras, a vegetação cresceria majestosa. Então, alvoroçada, Nuse reanimou seus filhos e retornou ao seu povo.

Quando chegaram, a menina cumpriu a promessa e a vida dos Shuaras mudou por completo. A dor foi esquecida. As plantas se elevaram nas hortas e cobriram o solo de esperanças.

Fonte:
http://victorian.fortunecity.com/postmodern/135/equador.htm

Conto do Tibete (A soberba da árvore)

Há muitíssimos anos no cume mais alto do Himalaia se erguia uma árvore gigantesca, de extraordinária frondosidade, em cuja sombra iam se proteger os habitantes daquelas regiões.

Ocorreu que certo dia um santo monge budista chamado Shinram, extenuado pelo calor e fadiga de uma longa caminhada, foi sentar-se à sombra acolhedora da grande árvore. E dirigiu ao esplêndido vegetal palavras de agradecimento e admiração.

- É evidente -disse- que deves gozar da proteção de algum poderoso deus, posto que nem o furacão nem as nevascas - que tão violentas são no Tibete- conseguiram desbaratar tua magnífica cabeleira, nem abater seu soberbo tronco no curso dos séculos. É por acaso o deus do Vento quem te protege?

- Nada disso! –contestou a árvore com altivez, sacudindo seus ramos com um ruído semelhante ao trovão. Engana-te, ancião. Nunca me protegeu nenhuma divindade, e menos ainda o maligno Vento, que não tem amigos nem perdoa a nada.

– Então ... – disse o monge.

– O que sucede, - interrompeu a árvore – é que nada nem ninguém pode contra mim, por forte e poderoso que seja. Quando o vento se desata furioso e sopra com seu ímpeto as demais árvore, se detém esgotado ante minha potência e se retira, mudo e temeroso, desejando em seu coração que eu não me encolerize contra ele e o castigue severamente.

Tais palavras cheias de soberba e de orgulho néscio, indignaram ao bom Shinram. Olhando fixamente à soberba árvore, o monge budista exclamou indignado:

- Não te envergonhas? Como te atreves, miserável vegetal, a usar este tom de desprezo para com um dos deuses mais poderosos, que é um terror do universo?

E pondo-se em pé, decidiu abandonar aquele lugar, dizendo:

- Vou daqui. Ainda que cansado e desejoso de sombra e frescor, não posso deter-me nem um minuto mais a falar com um ser tão indigno e tolo como tu.


E seguiu, apoiando-se em seu grosso cajado, murmurando palavras de indignação contra a árvore.

Mas ainda não havia desaparecido no horizonte quando o céu escureceu e a terra se pôs a tremer e apresentou-se o Vento em pessoa, com um espantoso sibilo, agitando ameaçadoramente sobre a árvore seus potentes braços feitos de nuvens.


Quando a árvore viu o poderoso deus junto a ela, estremeceu até o mais profundo de suas raízes, e no íntimo desejou jamais ter pronunciado aquelas insensatas palavras.

- Que tal arvorezinha – falou o Vento – Achas que não sou bastante potente para ti! Hahahaha!

E ao rir todas as árvores do bosque se dobraram aterrorizadas até o solo. O Vento prosseguiu, dizendo mal-humorado:

- Muito bem! Quer dizer que tenho medo de ti. Não sabes que se eu quisesse te derrubaria num instante como ao menor dos arbustos? Se agora te perdôo a vida, ingrato, e te conservei intacto durante séculos, é porque na noite dos tempos, quando o mundo era em grande parte um caos, o deus Brama, cansado do trabalho da criação do mundo, repousou na tua sombra. Não sabias, acaso?

- Não, não sabia – conseguiu murmurar a árvore.
- E é precisamente a memória daquele feito – completou o Vento – que te concedi a vida até hoje. Mas tu me insultaste, me ultrajaste e por isso mereces o castigo mais atroz. Mas não o aplicarei agora, mas sim amanhã.
- Perdão! – suplicou a árvore – Te prometo não voltar a fazê-lo.

Mas o Vento, sem fazer caso desta súplica, prosseguiu em tom ameaçador:

- Quero castigar-te à luz do sol, para que todos possam ver como o Vento trata aos ingratos e soberbos. Até amanhã!


E lançando um ultimo sibilo que abateu às árvores da selva e fez as feras irem ao fundo de suas tocas, desapareceu tão rapidamente como tinha vindo.

Pouco depois veio a noite e o silêncio envolveu o mundo. Todas as plantas adormeceram cansadas e temerosas. Só a árvore do Himalaia velava em sua angústia. E dizia para si:
"Com que gosto desdiria tudo que falei ao monge budista e me retrataria de tudo! Agora, quem sabe o que me espera! Provavelmente serei arrancado, feito em pedaços e triturado; meu tronco e ramos serão espalhados pela selva e só serão úteis para arder numa fogueira... Depois de tantos séculos de vida e reinado, serei cinzas na terra...!"

Mas, à medida que ia meditando essas coisas, ocorreu que talvez existisse um remédio heróico, uma última esperança de sobreviver: resistindo à fúria do Vento.

– Sim – murmurou – despojado de todos meus ramos e folhas, poderei resistir melhor aos embates do meu inimigo.

Num momento, se despojou de todos os ramos e arrancou até a última folha e a madrugada encontrou um tronco mutilado e desnudo.

Momentos depois se apresentou o Vento. Vinha cheio de cólera e desejoso de vingar-se. Mas então ocorreu algo surpreendente.

Quando o deus estava junto a árvore e a viu sem folhas, sua cólera se desvaneceu instantaneamente. E começou a rir, primeiro com um riso breve e logo uma gargalhada forte e sonora, que invadiu toda a terra. Por fim, uma vez recobrado o alento, disse com ironia:

- É verdade que não te conheço, árvore soberba! O castigo que tu mesmo te infligiu foi muito mais atroz do que eu podia te aplicar com toda a força de minha cólera. Agora és um espetáculo realmente grotesco, porque todos se riem de ti: os animais e plantas, os homens e também os deuses. Que maior vingança contra uma soberba e néscia como tu? Hahahah!

E proferindo sonoras gargalhadas, voltou à áurea morada dos deuses, deixando a árvore triste e humilhada.

Fonte:
http://victorian.fortunecity.com/postmodern/135/tibete.htm

Beowulf

Epopéia inglesa (provavelmente ano 1000).

Por doze anos o reino de Hrothgar era atormentado pelo monstro Grendel, que atacava seus súditos, destruí a aldeias e atacava quem quer se colocasse no caminho. Grendel era uma criatura mágica, a qual nenhuma arma forjada pelo homem poderia fazer dano, tornando-o quase invencível. Ninguém sabia de onde vinha, simplesmente apareceu e começou a destruir aldeias e devorar pessoas. Vivia nos pântanos próximos ao reino, onde ninguém se aventurava por medo de encontrá-lo. Só saía à noite, e muitas vezes entrava no palácio real e devorava quem encontrasse.

As histórias das desgraças do rei Hrothgar da Dinamarca viajavam por toda a Europa, até chegarem finalmente aos ouvidos de um guerreiro, chamado Beowulf. Ele vivia na Finlândia, chamada "A Grande Terra", onde inclusive lhe tinham oferecido o trono do país, por suas façanhas contra os inimigos. Mas Beowulf recusava em favor do filho da rainha, que era apenas uma criança, e concordou reinar junto com ele até que tivesse idade e experiência para reinar só.

Mas ao ouvir sobre o infortúnio que se abatia na Dinamarca, Beowulf zarpou da Finlândia com destino a Dinamarca com firme propósito de libertar a terra do monstro Grendel. Junto com ele iam 14 guerreiros para colaborar. Assim que chegaram às costas da Dinamarca foram recebidos pelos servidores do rei. Beowulf foi levado ao castelo, sendo recebido com honras e teve um banquete em sua homenagem.

Hrothgar contou a Beowulf todas as desgraças que Grendel os fazia passar: campos incendiados e destruídos, colheita aniquilada, até seu castelo era presa da cólera do ser; muitos haviam desaparecido sem deixar rastro. Era provável que o mostro os levasse à sua toca para lá devorá-los. Quando Beowulf perguntou qual o aspecto do monstro, Hrothgar não teve como explicar, porque todos os que o tinham visto, estavam mortos ou desaparecidos.

Alguns acreditavam que estava coberto por uma grossa camada de pêlo negro, quase como um urso, com poderosas garras capazes de despedaçar até met al e dentes enormes, que quebravam até os ossos de suas vítimas. Terminado o banquete, todos foram dormir. Beowulf e seus companheiros, mesmo com o oferecimento do rei de alojá-los devidamente em quartos, ficaram na sala do trono, vigiando.

A noite estava alta e todos, menos Beowulf, dormiam. Era tudo tranquilidade e silêncio. Só se escutava o vento que agitava suavemente as folhas das árvores. De repente, sem prévio aviso, entrou o monstro Grendel no local. Rapidamente Beowulf se levantou e quis dar aviso a seus companheiros; mas a entrada de surpresa de Grendel os tinha tomado desprevenidos, e o mais próximo ao monstro foi feito em pedaços por suas enormes e fortes garras.

Beowulf se jogou sobre o monstro e lutou sem armas, utilizando unicamente sua força. Era de fato uma criatura muito peluda, maior que um homem, porém devido à escuridão, Beowulf não podia ver seu rosto. Lutou corpo a corpo contra a grande besta; sua força era excepcional. Mas Beowulf também era forte e, graças a isso, pôde contê-lo. Finalmente conseguiu prensar o bicho entre seus braços e, agarrando a criatura, usando todas suas forças e toda sua coragem, agarrou um dos braços do monstro Grendel e o arrancou, separando-o do corpo da grande besta.

Grendel caiu ferido e lançou os mais terríveis gritos que se escutou em toda história do reino. Estava mortalmente ferido. Os companheiros de Beowulf se jogaram também sobre o monstro para aniquilá -lo, mas Grendel conseguiu se recompor e correu espavorido. Quiseram persegui-lo, mas desapareceu entre a entre a névoa e a vegetação. Estava mortalmente ferido e tinha deixado um rastro de sangue desde a sala do palácio até sua toca. O rei, feliz, cumprimentou Beowulf pela façanha e, certo de que o perigo havia passado, providenciou confortáveis aposentos para os guerreiros descansarem o resto da noite.

Mas deu que nem toda a ameaça havia desaparecido, e enquanto Beowulf e companheiros descansavam, longe de poder ajudar os guardas dinamarqueses, veio a mãe de Grendel, uma criatura completamente desconhecida para todos, furiosa e louca para vingar o filho, fazendo um massacre na sala do trono. Além disso, pegou o braço que Beowulf tinha arrancado do filho e o levou, junto com um nobre da casa do rei. Desapareceu com o braço de Grendel.

Na manhã, quando o rei Hrothgar viu o sucedido, chamou Beowulf e o levou ao local, pedindo-lhe que os livrasse deste novo mal. Assim Beowulf decidiu acabar com tudo aquilo de uma vez por todas. Equipado apenas com sua espada, viajou seguindo rastro de sangue que havia deixado Grendel em sua fuga.

Finalmente, depois de muito caminhar, chegou à margem de um rio. Ali terminava o rastro de sangue de Grendel. Sem saber exatamente até onde se tinha dirigido, Beowulf concluiu que o único caminho que poderia ter tomado sem deixar rastro era o rio. Assim decidiu lançar-se nas águas e buscar por ali. Uma vez submerso nas águas, Beowulf descobriu uma greta nas profundidades do rio. Sendo um nadador experiente, não teve problema em seguir o caminho sob a água. Nadou através de uma gruta até finalmente emergir numa caverna subterrânea.

Justamente ali, diante dele, estava a mãe de Grendel, urrando e sustentando em seus enormes braços o corpo inerte do filho. Beowulf saiu da água e desembainhou a espada. A mãe de Grendel, percebendo o perigo, pôs o filho no chão e se jogou sobre o intruso. Beowulf lutou valentemente com a feroz criatura. Armado com sua espada, pode vencê-la, cravando-a na besta. A mãe de Grendel caiu no chão e, dando os últimos grunidos, morreu.

Beowulf, vendo que finalmente os dinamarqueses poderiam gozar de paz e prosperidade, aproximou-se de Grendel e com um golpe, cortou-lhe a cabeça. Tomou-a e a levou ao rei Hrothgar, como prova que a época de desgraça e tristeza estava para traz. O rei Hrothgar recebeu Beowulf e ofereceu um banquete. Todos os habitantes da Dinamarca acudiram para agradecer pessoalmente a Beowulf por livrá-los do mal que havia se abatido sobre eles.

Com muita tristeza, chegou a hora de partir para Beowulf. O rei Hrothgar o encheu de riquezas em agradecimento pela ajuda. Finalmente zarpou de volta a Finlândia, onde foi recebido como grande herói. O jovem rei lhe concedeu altas honras e lhe deu uma vasta extensão de terra. Porém ocorreu que pouco tempo depois do regresso de Beowulf, o jovem rei caiu doente e, ao cabo de alguns dias, morreu. O povo foi ter com Beowulf para que os reinasse e, vendo que era seu dever, se converteu em rei da Finlândia, onde governou durante mais de cinqüenta anos, e a paz reinou em todo o país durante esse tempo.

Porém, de repente, já sendo Beowulf um ancião, apareceu um dragão que iniciou a destruição em suas terras. O dragão dizia estar furioso porque seu tesouro, que escondia numa caverna sob uma montanha, havia sido roubado. Como Grendel, esta criatura só saia à noite de sua guarida, e destruía as aldeias e devorava seus habitantes. Beowulf resolveu sair para lutar contra o dragão. Assim buscou sua toca e a encontrou. Da única entrada saía fumaça ardente.

Valente, sem mostrar medo algum, Beowulf se pôs frente à saída e gritou seu desafio. O drag ão saiu furioso de sua toca, cuspindo fogo de sua boca e nariz, e atacou Beowulf. Já este primeiro ataque quase o aniquila, pois Beowulf já era velho. Mesmo assim pôde se manter e dar luta ao dragão. A batalha foi tão devastadora que só um dos homens do rei Beowulf se manteve por perto; todos os demais fugiram.

Uma rajada de fogo eliminou a espada de Beowulf, e o jogou ao chão. O monstro se lançou sobre ele e cravou suas presas em seu pescoço, mas não percebeu que Wiglaf, o único dos homens do rei que havia permanecido para ajudar monarca, se lançou sobre ele e cravou sua espada na cabeça. O dragão caiu morto imediatamente. Porém o dano estava feito.Wiglaf tratou de ajudar Beowulf a levantar-se e levou-o de volta para que fosse socorrido, mas já era inútil. As feridas provocadas pelo dragão eram muito profundas. Beowulf nomeou neste momento Wiglaf como seu sucessor ao trono da Finlândia. Depois morreu. Wiglaf carregou seu corpo de volta à cidade. Ali fizeram um grande funeral em sua honra.

Fontes:
http://victorian.fortunecity.com/postmodern/135/beowulf.html
http://estradapop.blogspot.com/ (imagem)

Hans Christian Andersen (A menina dos fósforos)

Era véspera de Ano Bom. Fazia um frio intenso; já estava escurecendo e caía neve. Mas a despeito de todo o frio, e da neve, e da noite, que caía rapidamente, uma criança, uma menina, descalça e de cabeça descoberta, vagava pelas ruas. É certo que estava calçada quando saiu de casa; mas as chinelas eram muito grandes, pois que a mãe as usara, e escaparam-lhe dos pezinhos gelados, quando atravessava correndo uma rua, para fugir de dois carros que vinham a toda a brida. Não pôde achar um dos chinelos e o outro apanhou-o um rapazinho, que saiu correndo e declarando que aquilo ia servir de berço aos seus filhos, quando os tivesse. Continuou, pois, a menina a andar, agora com os pés nus e gelados. Levava no avental velhinho uma porção de pacotes de fósforos e tinha na mão uma caixinha: não conseguira vender uma só em todo o dia, e ninguém lhe dera esmola - nem um só vintém.

Assim, morta de fome e frio, ia se arrastando penosamente, vencida pelo cansaço e o desânimo - a estátua viva da miséria. Os flocos de neve caíam pesados, sobre os lindos cachos louros que lhe emolduravam graciosamente o rosto; mas a menina nem dava por isso. Via, pelas janelas das casas, as luzes que brilhavam lá dentro; vagava na rua um cheiro bom de pato assado - era a véspera do Ano Bom - isso sim, não o esquecia ela.

Achou um canto, formado pela saliência de uma casa, e acocorou-se ali, com os pés encolhidos para abrigá-los ao calor do corpo; mas cada vez sentia mais frio. Não se animava a voltar para casa, porque não tinha vendido uma única caixinha de fósforos, e não ganhara um vintém; era certo que levaria algumas lambadas. Além disso, lá fazia tanto frio como na rua, pois só havia o abrigo do telhado, e por ele entrava uivando o vento, apesar dos trapos e das palhas que lhe tinham vedado as enormes frestas. Tinha as mãozinhas tão geladas... estavam duras de frio. Quem sabe se acendendo um daqueles fósforos pequeninos, sentiria algum calor? Se se animasse a tirar um ao menos da caixinha, e riscá-lo na parece para acendê-lo... Ritch!... Como estalou, e faiscou, antes de pegar fogo!

Deu uma chama quente, bem clara, e parecia mesmo uma vela, quando ela o abrigou com a mão. E era uma vela esquisita, aquela! Pareceu-lhe logo que estava sentada diante de uma grande estufa, de pés e maçanetas de bronze polido. Ardia nela um fogo magnífico, que espalhava suave calor. E a meninazinha ia estendendo os pés enregelados para aquecê-los e... crac! Apagou-se o clarão! Sumiu-se a estufa, tão quentinha, e ali ficou ela, no seu canto gelado, com um fósforo apagado na mão. Só via agora a parede escura e fria.

Riscou outro. Onde batia a sua luz, a parede tornava-se transparente como a gaze, e ela via tudo lá dentro da sala. Estava posta a mesa, e sobre a toalha alvíssima via-se, fumegando entre toda aquela porcelana tão fina, um belo pato assado, recheado de maçãs e ameixas. Mas o melhor de tudo foi que o pato saltou do prato e, com a faca ainda cravada nas costas, foi indo pelo soalho direto à menina que estava com tanta fome, e... Mas - que foi aquilo? No mesmo instante acabou-se o fósforo, e ela tornou a ver somente a parede nua e fria, na noite escura. Riscou outro fósforo, e àquela luz resplandecente, viu-se sentada debaixo de uma linda árvore de Natal. Oh! Era muito maior, e mais ricamente decorada do que aquela que vira, naquele Natal, ao espiar pela porta de vidro da casa do negociante rico. Entre os galhos brilhavam milhares de velinhas; e estampas coloridas, como as que via nas vitrinas das lojas, olhavam para ela. A criança estendeu os braços, diante de tantos esplendores, e então, então... apagou-se o fósforo. Todas as luzinhas de natal foram subindo, subindo, mais alto, cada vez mais alto, e de repente ela viu que eram estrelas, que cintilavam no céu. Mas uma caiu lá de cima, deixando uma esteira de poeira luminosa no caminho.

- Morreu alguém - disse a criança.

Porque sua avó, a única pessoa que a amara no mundo, e que estava morta, lhe dizia sempre que quando uma estrela desce, é que uma alma subiu para o céu. Agora ela acedeu outro fósforo; e desta vez foi a avó que lhe apareceu, a sua boa vovó, sorridente e luminosa, no esplendor da luz.

- Vovó! - gritou a pobre menina - Leva-me contigo... Já sei que quando o fósforo se apagar, tu vais desaparecer, como se sumiram a estufa quente, e o rico pato assado, e a linda árvore de Natal!

E a coitadinha pôs-se a riscar na parede todos os fósforos da caixa, para que a avó não se desvanecesse. E eles ardiam com tamanho brilho, que parecia dia, e nunca ela vira a vovó tão alta, nem tão bela! E ela tomou a neta nos braços, e voaram ambas, em um halo de luz e de alegria, mais altoo, e mais alto, e mais longe... longe da terra, para um lugar lá em cima onde não há mais frio, nem fome, nem sede, nem dor, nem medo, porque elas estavam agora com Deus.

A luz fria da madrugada achou a menina sentada no canto, entre as casas, com as faces coradas e um sorriso de beatitude. Morta. Morta de frio, na última noite do ano velho. A luz do Ano Bom iluminou o pequenino corpo, ainda sentado no canto, com a mão cheia de fósforos queimados.

- Sem dúvida ela quis aquecer-se - diziam.

Mas... ninguém soube das lindas visões, que visões maravilhosas lhe povoaram os últimos momentos, nem em que halo tinha entrado com a avó nas glórias do Ano Novo.

Fontes:
Cursos e Livros. Digerati (CD-Rom).
http://www.aefa.edu.pt/ (imagem)

Enciclopédia

A Encyclopédie de Diderot e D'Alembert, publicada no século XVIII, serviu de modelo para todas as enciclopédias elaboradas desde então. Essa obra, muito além de sintetizar o saber da época, constituiu a base da renovação do pensamento filosófico e científico.

Os gregos, ao que parece, entenderam o termo enciclopédia como sistema completo de instrução, ou círculo (enkyklos) de aprendizagem (paideia), expressão que corresponde ao que modernamente se denomina cultura geral. O termo enciclopédia foi usado pela primeira vez em língua inglesa por Sir Thomas Elyot, em The Governour (1531), e em língua francesa por Rabelais, em Pantagruel (1532). Não se conhece seu emprego em título de livro na antiguidade ou da Idade Média.

Primeiras enciclopédias

Os filósofos gregos lançaram as bases das classificações mais tarde usadas nas enciclopédias, mas os romanos foram os primeiros a organizar obras que continham informações referentes a todas as áreas do conhecimento. Em quatro obras -- Antiguidades das coisas humanas e divinas, Disciplinas, Retratos e Sobre a agricultura -- Varrão (século I a.C.) empregou a organização em quatro sistemas que seria adotada pelos enciclopedistas posteriores: história, artes, biografias e palavras. Os 37 livros da História natural, de Plínio o Velho, completada no ano 77 e tida como a mais antiga enciclopédia ocidental, contêm 2.493 capítulos organizados por assunto.

Sobre o casamento da Filologia com Mercúrio, de Martianus Capella, trata das artes liberais e, como a obra de Plínio, foi de grande influência na Idade Média, cujos primeiros enciclopedistas foram são Jerônimo, Cassiodoro e Isidoro de Sevilha. A partir do século XII apareceram diversas obras enciclopédicas, a maior parte delas organizada por assunto.

No mundo bizantino, duas obras se destacaram: a Bibliotheca (c. 857), de Fócio, e De omnifaria doctrina, de Psellos. Os sábios muçulmanos, que inicialmente enfrentaram o problema de conciliar a filosofia grega com o islamismo, manifestaram tendência para o enfoque enciclopédico. Particularmente importantes são o Catálogo das ciências, de al-Farabi; Chaves da ciência, de al-Khwarizmi; Kitab al-shifa, enciclopédia filosófica de Avicena, e Colliget, enciclopédia médica de Averroés.

As enciclopédias chinesas, como algumas compilações ocidentais, consistiam em extratos de obras. As mais conhecidas são a Tai-ping yulan, de Wu Chu e Li Fang, do século X, composta de mil livros, e Grande padrão, compilada do século XV sob a direção do imperador Yung-lo, que compreendia 22.937 livros. A literatura hindu não possui enciclopédias no estilo das que existiam na Europa, no mundo muçulmano e na China, mas pode-se considerar as puranas, do século II ao VI, como compilações desse tipo.

Entre o século XIV e fins do XVI, quatro filósofos exerceram influência determinante sobre o conceito de enciclopédia: Raimundo Lúlio, que desenvolveu uma "arte" dividida em três partes: linguagem, gramática e uma enciclopédia do conhecimento; Petrus Ramus, que reorganizou as artes liberais e a filosofia; Francis Bacon, que dedicou seu gênio à organização e ao avanço do conhecimento, e Comenius, que propôs uma reforma da educação, segundo a qual a "luz universal" seria difundida por meio de livros, escolas e linguagem universais.

Enciclopédias modernas

Entre as enciclopédias do século XVII destacaram-se, por sua extensão e organização: Anatomia ingeniorum et scientiarum, de Antônio Zara; Encyclopaedia septem tomis distincta, de Johann Heinrich Alsted; e Le Grand Dictionnaire historique, ou le Mélange curieux de l'histoire sacrée et profane, alfabeticamente estruturado, que foi traduzido para o inglês, alemão, holandês e espanhol.

No século XVIII, o frade franciscano Vincenzo Maria Coronelli trabalhou numa enciclopédia alfabética, Biblioteca universale sacro-profana, prevista para 45 volumes, dos quais apenas sete foram publicados (1701-1706). Seguiram-se o Lexicon technicum, or Dictionary of the Arts and Sciences (1704), de John Harris, a primeira enciclopédia alfabética em língua inglesa. Em 1728, Ephraim Chambers publicou sua Cyclopaedia; or An Universal Dictionary of Arts and Sciences, cuja edição ampliada e revista foi publicada por Abraham Rees, em 1779-1788, e serviu de base para a Cyclopaedia de Rees, em 45 volumes. Johann Heinrich Zedler, livreiro de Leipzig, publicou, entre 1732 e 1750, seu Grosses vollständiges universal Lexicon, em 64 volumes, a mais abrangente e completa enciclopédia até então editada.

Encyclopédie

O empreendimento literário e filosófico que maior influência exerceu sobre a vida política, social e intelectual da Europa do século XVIII foi a Encyclopédie francesa. Programada para oito volumes de texto e dois de estampas impressas, contou com o concurso de 160 colaboradores e despertou enorme interesse, mas custou duras lutas contra resistências políticas e religiosas, só superadas pela perseverança de seu editor, Denis Diderot.

A história da Encyclopédie começou quando os direitos de publicação de uma tradução francesa da Cyclopaedia, de Chambers, foram oferecidos, em 1745, pelo inglês John Mills ao editor André Le Breton. Depois de um desentendimento com Mills, Le Breton rompeu o contrato, ampliou seus planos para uma obra em dez volumes e procurou a colaboração de três outros editores. Em 1745, D'Alembert e o abade Jean-Paul de Guade Malves associaram-se ao empreendimento e dois anos mais tarde Diderot assumiu a direção geral da Encyclopédie, exceto da parte de matemática, editada por Jean le Rond D'Alembert.

As traduções dos verbetes de Chambers foram abandonadas por sua má qualidade, erros e omissões. O primeiro volume apareceu em 1751, o segundo em 1752 e o terceiro em 1753, seguindo-se a publicação de um volume por ano até 1757. Certos verbetes suscitaram críticas de católicos e protestantes, o que levou D'Alembert a renunciar ao cargo de editor em 1758. No ano seguinte, a Encyclopédie foi incluída na lista das obras perigosas. Os últimos dez volumes de texto foram concluídos em 1765 e os 11 volumes de lâminas se completaram em 1772.

Com exceção de Rousseau e do barão d'Holbach, o grupo de escritores reunido por Diderot e D'Alembert para colaborar na obra era inicialmente quase desconhecido, mas a fama da Encyclopédie e os ataques de que foi objeto atraíram diversos colaboradores de peso. Após a morte do último editor original, Charles Joseph Panckoucke lançou um Supplément da Encyclopédie em quatro volumes de texto e um de lâminas, aos quais, mais tarde, adicionou dois volumes de índice preparados por Pierre Mouchon. Estes sete volumes, juntamente com os 28 elaborados sob a supervisão de Diderot, constituem a primeira edição da Encyclopédie, com 35 volumes in folio.

Em 1780, Panckoucke obteve os direitos de publicação de uma nova edição da obra reorganizada em forma de dicionários separados, sob o título de Encyclopédie méthodique ou par ordre de matières. Em 1788 o projeto inicial foi reformulado e se adotou um novo plano de divisão dos assuntos em 44 partes e 51 dicionários. Os trabalhos prosseguiram durante os anos da revolução francesa e foram concluídos em 1832, com o lançamento do volume 166.

Encyclopaedia Britannica

Outra das mais importantes enciclopédias do século XVIII foi a Encyclopaedia Britannica; or, a Dictionary of Arts and Sciences, editada em Edimburgo por Andrew Bell e Colin Macfarquhar, entre 1768 e 1771, com três volumes, 2.689 páginas e 160 lâminas, compilada de acordo com um novo plano em que as ciências e as artes eram sintetizadas em tratados ou sistemas. Para a segunda edição, o plano da obra foi ampliado com a inclusão de histórias e biografias: saiu em dez volumes e também em fascículos.

As sucessivas edições constituíram um êxito de vendas nos Estados Unidos, a tal ponto que, em 1901, uma empresa americana organizada para comercializar a Encyclopaedia Britannica em todo o mundo adquiriu os direitos da obra. Em 1920 esses direitos foram comprados pela Sears, Roebuck and Co. E. H. Powell, que em 1932 se tornou presidente da Encyclopaedia Britannica, Inc. formulou o plano de revisão contínua, segundo o qual novas impressões corrigidas e ampliadas passaram a ser lançadas anualmente; um anuário, o Britannica Book of the Year, passou a atualizar as informações contidas na obra.

Em 1941, William Benton, vice-presidente da Universidade de Chicago, convenceu a Sears a doar a Encyclopaedia Britannica à universidade, que, no entanto, recusou-se a assumir os riscos financeiros da operação. Benton tornou-se então presidente do conselho de diretores da empresa e seu maior acionista.

Século XIX

Três tendências assinalaram o desenvolvimento das enciclopédias no século XIX: (1) a combinação dos verbetes sobre artes e ciências com verbetes biográficos, geográficos e históricos; (2) o desenvolvimento de enciclopédias de verbetes curtos, enciclopédias sistemáticas de verbetes longos e enciclopédias de verbetes longos e curtos; e (3) equilíbrio da ordem alfabética com as disposições tópicas ou sistemáticas.

A primeira enciclopédia importante do século XIX foi a alemã Brockhaus Konversations-Lexikon, lançada em 1796 por Gotthelf Renatus Löbel com o título de Frauenzimmer-Lexicon e adquirida por Friedrich Arnold Brockhaus em 1808. Obra que trazia informações sumárias sobre todos os assuntos, a Brockhaus exerceu influência sobre enciclopédias de diversos países, especialmente da Dinamarca, Suécia, Noruega, Países Baixos, Hungria, Rússia, França, Itália e Espanha. Outras destacadas enciclopédias alemãs foram a Meyers Grosses Konversations-Lexikon, em 46 volumes, e a Allgemeine Enzyklopädie der Wissenschaften und Künste, em 167 volumes, caracterizada por suas longas monografias.

Entre as enciclopédias inglesas, as principais foram a Cyclopaedia, de Rees, em 45 volumes; a Encyclopaedia Metropolitana, em 25 volumes, e a British Cyclopaedia, em dez volumes. Nos Estados Unidos destacaram-se a New American Cyclopaedia, em 16 volumes, e a New Universal Cyclopaedia, em quatro volumes, reeditada em oito volumes sob o título de Johnson's Universal Cyclopaedia.

Na França são importantes o Grand dictionnaire universel du XIX siècle, em 15 volumes, de Pierre Larrousse, considerado obra de vulgarização, misto de dicionário e enciclopédia; e a Grande encyclopédie, inventaire raisonné des sciencies, des lettres e des arts, em 31 volumes, de organização alfabética, considerada uma das melhores enciclopédias do mundo.

Século XX

As facilidades de comunicações, os novos métodos de comercialização de livros e os modernos conceitos de educação generalizaram o uso de enciclopédias gerais, especializadas e dicionários enciclopédicos. Nos Estados Unidos, além das obras gerais, como a Grolier's Universal Encyclopedia (dez volumes) e The Encyclopedia Americana (trinta volumes), apareceram diversas pequenas enciclopédias destinadas ao público juvenil.

As principais enciclopédias francesas do século XX são a Larousse du XX siècle (seis volumes), Grand Larousse (dez volumes), Encyclopédie française (vinte volumes), Encyclopédie de la Pléiade, planejada para quarenta volumes e a Encyclopaedia Universalis (23 volumes). Na Itália, apareceram, além da grande Enciclopedia italiana di scienze, lettere ed arti, em 36 volumes, dirigida por Giovanni Treccani, o Dizionario enciclopedico italiano, em 12 volumes, e a Enciclopedia cattolica, publicada pelo Vaticano, também em 12 volumes.

Das enciclopédias alemãs, merecem referência as novas edições da Der Grosse Brockhaus, do Meyers Grosses Konversations-Lexikon e a Der Grosse Herder. Na antiga União Soviética, o preparo da primeira edição da Bolshaia sovetskaia entsiklopedia, em 65 volumes, prolongou-se de 1926 a 1947. Nos países de língua castelhana, além das obras editadas pela Encyclopaedia Britannica, Inc -- Barsa e Hispánica --, cabe mencionar a monumental Enciclopedia universal ilustrada europeo-americana, editada entre 1905 e 1953 pela Espasa-Calpe, que com o acréscimo de suplementos superou os cem volumes.

Um fato novo na última década do século foi o lançamento de enciclopédias em suporte eletrônico, ou seja, CD-ROM. Normalmente, essas enciclopédias incorporam, além de textos e fotografias, jogos educacionais ou recreativos, sons e imagens em movimento, que caracterizam a chamada multimídia.

Enciclopédia no Brasil

A primeira enciclopédia a dar alguma ênfase aos assuntos brasileiros foi a Encyclopedia e Diccionario Internacional (Lisboa, 1919, em vinte volumes), de organização alfabética, escrita por colaboradores portugueses e brasileiros. Igualmente publicada em Lisboa e, nominalmente, no Rio de Janeiro, a Grande enciclopédia portuguesa e brasileira (1935-1960), em quarenta volumes, dedica-se a assuntos portugueses mas inclui um suplemento, em quatro volumes, referente ao Brasil. Possui disposição alfabética.

A Enciclopédia brasileira Mérito (Rio de Janeiro, 1958-1964, vinte volumes) também possui organização alfabética; tem características de dicionário enciclopédico. A primeira enciclopédia brasileira estruturada por assunto, a Enciclopédia Delta-Larousse (Rio de Janeiro, 1960, 15 volumes), teve as matérias de interesse universal traduzidas da Encyclopédie Larousse méthodique. Outra coleção da empresa foi a Grande enciclopédia Delta-Larousse (Rio de Janeiro, 1970, 15 volumes) também alfabética e ilustrada a cores. Os temas universais foram traduzidos do Larousse trois volumes.

Com ênfase nos assuntos nacionais e inteiramente escrita por colaboradores brasileiros, foi lançada em 1964 a Enciclopédia Barsa, em 16 volumes, com organização alfabética e atualizada por um Livro do ano.

Em 1975 a Encyclopaedia Britannica do Brasil lançou a maior das enciclopédias brasileiras, a Enciclopédia Mirador internacional. Com direção editorial do filólogo Antônio Houaiss, foi publicada em vinte volumes e mais de 12.000 páginas.

Em 1997, depois de inúmeras revisões anuais, a Enciclopédia Barsa teve publicada a presente edição, inteiramente reformulada e ilustrada em cores. Dividida em quatro partes, compreende 18 volumes: 14 da Macropédia, com textos longos; dois da Micropédia, para consulta rápida; um da Datapédia, que reúne dados estatísticos ou perecíveis; e um da Temapédia, um amplo guia de estudos.

Fontes:
E-Learning. Digerati. EL 010 (CD-Rom)
http://www.arcadovelho.com.br (imagem)

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Érico Veríssimo (Ana Terra)

Ana Terra era uma moça que morava com sua família em um sítio muito longe da cidade e tinha uma vida sofrida, e a única coisa que Ana e sua família faziam era trabalhar. Embora Ana tinha o desejo de abraçar e beijar algum homem.

O princípio de seu desejo veio com a chegada do índio Pedro Missioneiro, e que lentamente foi crescendo na sua condição de macho: uma cara moça e trigueira, de maçãs salientes. Ana, quando o via sentia uma coisa que não podia explicar: um mal-estar sem nome, mistura de acanhamento, nojo e fascinação. Em sua singeleza, atraía-se pelo estranho, confirmando-se como aquela mulher desejável que enxergara no fundo das águas. Entregar-se àquele desconhecido foi um passo tão natural como o suceder das estações naqueles ermos. Antes, arriscou um jogo delicioso de avanços e recuos, sabendo que, quisesse ou não quisesse, agindo a favor ou contra a lei paterna, seria daquele homem. E, numa tarde, considerou-se pronta, e o desejo palpitava em todas as sua artérias; encaminhou-se para a barraca do índio, o reino de Pedro Missioneiro. E lá aconteceu algo que Ana queria.

Os dias seguintes foram de medo, pânico misturado à vergonha e depois disso, logo soube que estava grávida, e o isso tornou-se um espaço de lágrimas. Carregou o segredo o quanto pôde, mas um dia, não se contendo mais, revelou tudo à mãe. Dona Henriqueta nem teve tempo de consolá-la: e o pai declarou já saber de tudo e foi como se um trovão cortasse os céus. Nada mais poderia ser feito: cumprindo um código ancestral, ele convocou os dois filhos, e esses mataram Pedro Missioneiro. Sabia que sua vida naquela casa dali por diante seria um inferno.

De um instante para outro tornou-se invisível aos olhos do Pai, transfigurando-se numa entidade pecadora. Simbolicamente expulsa de sua casa, procurou fazer-se pequena, para que sua pequenez diminuísse a dor da culpa; tratava-se, porém, de uma culpa mais aceita do que entendida. Logo aconteceu o nascimento do filho de Ana Terra e, Dona Henriqueta assistiu-a, cortando o cordão umbilical do menino Pedro. Mesmo assim, os pais e irmãos não tomaram conhecimento do novo ser que habitaria o rancho.

Contra toda as possibilidades, Pedrinho cresceu, e a vida seguiu seu rumo. Os irmãos casaram-se, e, para Ana, cada dia era a repetição do dia anterior. Depois disso, sua mãe morreu, de nó nas tripas, mas esta morte não abalou muito à Ana. Então vieram vários castelhanos, assassinando, incendiando, violando. Ana mandou a esposa de seu irmão e as duas crianças irem se esconder no mato, e fingindo ser a única mulher da casa, imola-se voluntariamente à sanha dos bandidos. Foi estuprada várias vezes, e ao acordar de seu desfalecimento, encontrou um quadro de horrores: o pai, o irmão Antônio, os escravos, todos estavam mortos no meio da casa já destruída.

Ana entendia naquele momento que estava liberta de sua mancha original, e pela forma mais bárbara e purificadora. Nada lhe fora poupado em sofrimento, e pelo sofrimento reconciliava-se com a vida. Numa exaltação próxima a uma feroz alegria, aceitou o convite de um forasteiro para ir formar o núcleo inicial de uma nova vida, e uma longa viagem a levou para um planalto. Lá ela construiu uma casa, morando com seu filho, que logo teve que ir para uma guerra contra os castelhanos. Voltando da guerra vivo, casou-se com uma moça, teve um filho e logo teve que voltar para a guerra, com o compromisso de voltar vivo, pois agora ele tinha uma mulher e um filho para cuidar.

FONTE:
Concursos Públicos. Digerati. CEC 0004. (CR-ROM)
http://minerva.ufpel.edu.br (imagem)

Sergius Gonzaga (A Importância da Literatura)

No Brasil, até o início dos anos de 1960, a leitura de textos literários era considerada uma obrigação natural por parte de professores e de alunos, não havendo quem questionasse o sentido do ato de ler. Há que se entender que, em nosso país,, o livro exercia desde o século XIX inúmeras funções, particularmente para os grupos sociais privilegiados:
A) era a mais perfeita forma de lazer;
B) era uma insubstituível fonte de conhecimento humano;
C) era o próprio espelho da nação, no qual a pequena elite letrada se reconhecia;
D) era o modelo supremo de correção e elegância do idioma pátrio.

A década de 60 trouxe uma importante universalização e democratização do ensino, permitindo que outras classes - que não apenas as privilegiadas - tivessem acesso ao saber. Estes novos atores sociais, no entanto, provinham de um mundo sem livros e com referências culturais muito pobres. E antes que a tradição de leitura se incorporasse às suas existências, foram atraídos pela poderosa indústria cultural que se implementava na mesma época. Esta indústria, centrada na tevê e no disco, conquistou, de imediato, consideráveis parcelas da população recém-alfabetizada. As necessidades de lazer, entretenimento e informação - que todo indivíduo escolarizado possui - foram preenchidas por estes meios audiovisuais. E a leitura perdeu a guerra pela audiência, convertendo-se numa espécie de atividade refinada de alguns poucos nostálgicos.

Até mesmo as elites, abandonaram parcialmente o seu antigo amor - que lhes oferecia uma constelação de imagens e de visões de mundo -, trocando-o por uma sub-arte digestiva e fácil, produzida pelos meios de comunicação de massa. Contudo, esta situação não deve ser considerada como a emergência do apocalipse. Primeiro, porque nunca foram produzidos tantos livros como atualmente. Segundo, porque nunca se exigiu tanta qualificação intelectual dos jovens para vencer no mercado de trabalho. Terceiro, porque os professores - passado um período de desencanto e ceticismo - perceberam que podiam reinventar a leitura com seus alunos, desde que agindo com criatividade e persuasão.

Livros a granel e relativamente acessíveis; alunos que precisam se preparar do ponto de vista lingüístico e cognitivo para uma sociedade globalizada, onde apenas os altamente capazes do ponto de vista cultural irão triunfar; e professores preparados para provocar e seduzir seus discípulos com leituras vibrantes, prazerosas e vitais; eis os três elementos que sustentam o contínuo renascimento do gosto pela leitura nas escolas brasileiras.

José Hildebrando Dacanal assinala a importância da literatura em nossos dias:

É indiscutível que, mesmo na era das imagens e dos meios de comunicação de massa, a literatura preservará, como toda a arte, sua função de símbolo e documento do passado e desempenhará - enquanto a humanidade for a mesma - o papel pedagógico que sempre a caracterizou. Não apenas no sentido restrito da sala de aula, mas principalmente no sentido amplo e universal de instrumento de aquisição de conhecimento e diferenciação da elite em relação à massa, mantendo-se, pois, como relicário* da língua e como um espelho monumental da nação.
* Relicário: objeto onde se guardam relíquias

Em depoimento magnífico, o peruano Mario Vargas Llosa insiste no valor da literatura em comparação com outras atividades:

Em nossa época se escrevem e publicam muitos livros, mas já ninguém acredita que a literatura sirva para alguma coisa, a não ser para evitar que as pessoas se aborreçam muito nos ônibus ou no metrô, e para que, adaptada para o cinema e a televisão - se for sobre marcianos, horror, vampirismo ou crimes sadomasoquistas -, se torne televisiva ou cinematográfica. Para sobreviver, a literatura tornou-se light. É um erro traduzir essa noção por "leve" porque, na verdade, ela significa" irresponsável" e, muitas vezes, "idiota".

Se o objetivo é apenas o de entreter e fazer com que os seres humanos passem momentos agradáveis, perdidos na irrealidade, emancipados do inferno doméstico ou da angústia econômica, em descontraída indolência intelectual, as ficções da literatura não podem competir com as oferecidas pelas telas de cinema ou tevê. As ilusões forjadas com a palavra exigem a participação ativa do leitor, um esforço de imaginação e, às vezes - quando se trata da literatura moderna -, complicadas operações de memória, associação e recriação, algo de que as imagens do cinema e da tevê dispensam os espectadores. E, por isso, os espectadores se tornam cada vez mais preguiçosos, mais alérgicos a um entretenimento que requeira esforço intelectual.

Digo isso sem a menor intenção beligerante contra os meios audiovisuais, e a partir da minha condição de apreciador de cinema - vejo dois ou três filmes por semana - e que também gosta de um bom programa de tevê (essa raridade). Mas, justamente por isso, afirmo que nenhum dos filmes que vi me ajudou a compreender o labirinto da psicologia humana como os romances de Dostoievski. Ou os mecanismos da vida social, como os livros de Tolstói e de Balzac, ou os abismos e os pontos altos que podem coexistir no ser humano, como me ensinaram as obras de um Thomas Mann, um Faulkner, um Kafka, um Joyce ou um Proust.

As ficções apresentadas nas telas são intensas por seu imediatismo e efêmeras por seus resultados. Prendem-nos e nos liberam quase de imediato. Das ficções literárias, nos tornamos prisioneiros da vida toda, porque o resultado de uma boa literatura é sempre posterior à leitura - um efeito deflagrado na memória e no tempo.

Fonte:
http://educaterra.terra.com.br/

domingo, 11 de maio de 2008

Literatura Grega

Primeira a surgir na Europa, a literatura grega lançou, no curso de sua evolução, os alicerces de quase todos os gêneros literários. Assimilados pelos romanos, os grandes escritores gregos da antiguidade, junto com os clássicos latinos, passaram a ser considerados modelos universais, e deles provém certamente toda a tradição literária ocidental.

Distribuída em três grandes períodos -- o da antiguidade, o bizantino e o moderno -- a literatura grega abordou, no teatro e na poesia, na filosofia e no texto religioso, todos os grandes mitos e temas cruciais da humanidade. Serviu de referência não apenas à literatura universal como a atividades e correntes científicas e artísticas modernas, como o cinema, a psicanálise e a educação.

Antiguidade

A literatura grega da antiguidade é a que se desenvolveu desde que começou a difundir-se o emprego da escrita, por volta do século VIII a.C. Período da maior importância para a história das letras ocidentais, divide-se nas épocas arcaica (até o fim do século VI a.C.), clássica (séculos V e IV a.C.), e helenística e greco-romana (a partir do século III a.C.).

Época arcaica.
Antes mesmo de utilizarem a escrita para fins literários, os gregos já faziam poesia para ser cantada ou recitada. Seus temas eram os mitos, em parte lendários, baseados na memória difusa de eventos históricos, além de um pouco de folclore e de especulação religiosa primitiva. Os mitos, porém, não se vinculavam a qualquer dogma religioso e, embora muitos fossem deuses ou grandes heróis mortais, não eram autoritários e podiam ter seu perfil alterado por um poeta que desejasse expressar novos conceitos.

Assim, bem cedo o pensamento grego começou a progredir, na medida em que os poetas reelaboravam suas fontes. A esse estágio inicial, denominado época arcaica, pertencem os épicos atribuídos a Homero, a Ilíada e a Odisséia, que recontam histórias entremeadas de mitos da época micênica. A poesia didática de Hesíodo (c. 700 a.C.), provavelmente posterior aos épicos de Homero, embora com diferentes tema e tratamento, deu continuidade à tradição épica.

Os vários tipos de poesia lírica grega surgiram no período arcaico entre os poetas das ilhas do mar Egeu e da Jônia, no litoral da Anatólia. Arquíloco de Paros, do século VII a.C., foi o primeiro poeta grego a usar a elegia de uma forma mais pessoal. Suas formas e padrões métricos foram imitados por uma sucessão de poetas jônicos. No começo do século VI, Alceu e Safo criaram seus poemas no dialeto eólico da ilha de Lesbos e foram mais tarde adaptados por Horácio para a poesia latina. A eles se seguiu Anacreonte de Teos, na Jônia, que também compôs em dialeto jônico. A lírica coral, com acompanhamento musical, pertencia à tradição dórica.

A tragédia e a comédia se originaram na Grécia. Acredita-se que havia coros "trágicos" na Grécia dórica por volta de 600 a.C.. Também a comédia se originou na Grécia dórica e se desenvolveu na Ática.

Códigos legais surgidos no fim do século VII foram a primeira forma de prosa. Não se conhece autor de prosa anterior a Ferécides (c. 550 a.C.) de Siros, que escreveu sobre o começo do mundo. Mas o primeiro autor considerável, Hecateu de Mileto, escreveu sobre o passado mítico e a geografia do Mediterrâneo e terras próximas. Atribui-se a Esopo, personagem lendário de meados do século VI, a autoria das fábulas de sentido moral copiadas por escritores de épocas posteriores.

Época clássica.
Quase todos os gêneros literários atingiram seu ponto máximo no período clássico, com as tragédias de Ésquilo, Sófocles e Eurípides, a comédia de Aristófanes e a lírica coral de Píndaro. O clássico também foi um período áureo para a retórica e a oratória, cujo estudo levantou questões sobre verdade e moralidade na argumentação, e, dessa maneira, era objeto de estudo tanto do filósofo quanto do advogado e do político. A prosa histórica grega atingiu a maturidade nesse período.

As obras de Platão e Aristóteles, que datam do século IV, são os mais importantes produtos da cultura grega na história intelectual do Ocidente. Esses pensadores firmaram as bases da filosofia ocidental e determinaram a evolução do pensamento europeu ao longo de séculos.

Épocas helenística e greco-romana.
No imenso império de Alexandre o Grande, macedônios e gregos compunham a classe dominante e, assim, o grego tornou-se a língua da administração, um novo dialeto baseado em parte no ático e chamado koine, ou língua comum. Em todos os lugares, a cidade-estado estava em declínio. A criação artística passou ao patrocínio privado e, exceto pela comédia ateniense, as composições visavam um público pequeno e seleto, apreciador da erudição e da sutileza.

O período helenístico foi do fim do século IV ao fim do século I a.C. Pelos três séculos seguintes, até Constantinopla tornar-se a capital do império bizantino, os escritores gregos tinham consciência de viverem num mundo do qual Roma era o centro.

Gêneros

Poesia épica.
No início da literatura grega se situam duas grandes epopéias, a Ilíada e a Odisséia. Algumas fontes desses poemas são da época micênica, talvez de 1500 a.C., mas a obra escrita, atribuída a Homero, é datada de cerca do século VIII a.C. Ilíada e Odisséia são os primeiros exemplos de poema épico -- na antiguidade, era um longo poema narrativo, de estilo nobre, que celebrava conquistas heróicas.

Apesar de serem os poemas europeus mais antigos, Ilíada e Odisséia não podem ser considerados, de nenhum ponto de vista, primitivos. Mais que o começo, eles marcam o ponto mais alto dessa forma literária. Eram essencialmente poemas transmitidos de forma oral, desenvolvidos e aumentados ao longo de um extenso período de tempo, sobre cujo tema vários e sucessivos poetas anônimos livremente improvisaram. No mundo antigo, ocupavam uma classe especial entre os poemas épicos. De fato, conservam-se restos de um ciclo épico, com numerosos poemas que complementam a história das guerras de Tebas e Tróia e outros mitos.

A poesia didática não era tida pelos gregos como uma forma diferente da épica, mas o mundo do poeta Hesíodo, que viveu na Beócia por volta de 700 a.C., era completamente diferente do de Homero. Além de Os trabalhos e os dias, que descreve a vida de um simples agricultor beócio atormentado pela seca e pela opressão da aristocracia, deixou também o poema Teogonia, que narra a genealogia dos deuses e dos mitos associados à criação do universo, com clara influência da mitologia do Oriente Médio.

Poesia lírica.
A palavra "lírica" abrange muitos tipos de poemas. Aqueles cantados por indivíduos ou coros acompanhados de lira, ou às vezes flauta, eram chamados mélicos. As elegias -- nas quais o hexâmetro épico, ou verso de seis sílabas, se alternava com um verso mais curto -- eram associadas com a lamentação e acompanhadas de flauta. Mas os poemas também eram usados para poesia monódica, falada e cantada. Os poemas jâmbicos (de versos jâmbicos, ou unidades métricas de quatro sílabas longas e breves alternadas), forma versificada da sátira, em geral não eram cantados. A lírica coral, geralmente acompanhada de lira e flauta, não usava os versos ou estrofes tradicionais; seu metro era criado para cada poema e nunca utilizado novamente da mesma forma. Além de Alcmeão de Esparta e Estesícoro, destacam-se no gênero Simônides de Ceos, Píndaro e, já no declínio do gênero, Baquílides (século V a.C.).

Tragédia e comédia.
Em suas duas vertentes -- tragédia e comédia -- chegou nessa época à plenitude estética o teatro grego. Suas origens permanecem obscuras, mas parece claro que ambas foram tiradas dos rituais religiosos em honra do deus Dioniso.

O principal interesse de Ésquilo, cujas tragédias são geralmente agrupadas em trilogias, não é a ação dramática, nem a composição dos personagens, mas a subordinação da vida humana aos insondáveis desígnios dos deuses. Com Sófocles, seu sucessor, a tragédia alcançou ainda maior perfeição formal. O tema central de suas grandes obras, como Édipo rei, Electra e Antígona, é a exaltação da grandeza do homem que, embora submetido ao destino e à vontade dos deuses, mantém a integridade moral e cumpre seu dever.

Eurípides, contemporâneo dos sofistas, pertenceu a uma fase de questionamento de todas as crenças tradicionais. Ainda que partisse do mito, como os trágicos anteriores, seu interesse centrou-se no estudo da paixão humana -- Medéia, Hipólito -- e na crítica às idéias convencionais sobre religião, política e moral. Depois de Eurípides, que morreu em 406, a tragédia deixou de ser cultivada.

Paralelamente à tragédia, desenvolveu-se a comédia, que era sua contrapartida. Surgiu nas cidades dóricas, onde se destacou a figura de Epicarmo, mas adquiriu forma em Atenas, na primeira metade do século V. Na época inicial (comédia antiga) foi fundamentalmente sátira social e política. Aristófanes, um dos maiores gênios cômicos da literatura universal, ironizou, em obras como As rãs e As nuvens, as figuras políticas e intelectuais de seu tempo. A fase intermediária da comédia, na qual sobressaíram Antífanes e Aléxis, centrou-se na sátira e na paródia. Na comédia nova, cujo principal representante foi Menandro, no final do século IV, o tema principal foram os conflitos domésticos.

Prosa.
O primeiro grande historiador foi Heródoto de Halicarnasso, também grande geógrafo e antropólogo. Seu tema central é o confronto entre Ásia e Europa, que culminou com as guerras greco-pérsicas. Não menos importante foi Tucídides, que viveu na segunda metade do século V e escreveu a História da guerra do Peloponeso. Tucídides, diferentemente de Heródoto, exclui por completo a intervenção divina nos acontecimentos em que os homens intervêm. Costuma-se considerá-lo o verdadeiro criador da história como ciência, pelo rigor documental, sentido crítico e objetividade narrativa. Sua obra, que ficou inconclusa, foi completada por Xenofonte, que também escreveu Anábase, relato da retirada de dez mil gregos, depois do assassínio de seus líderes pelos persas de Ciro, desde as proximidades da Babilônia até a costa do mar Negro. Depois desses autores, o gênero histórico declinou até transformar-se em pouco mais que um exercício de retórica.

Retórica e oratória.
Em poucas sociedades terá sido mais valorizado o poder da oratória do que na Grécia. Foi sobretudo o surgimento das formas democráticas de governo que incentivou o estudo e o ensino da arte da persuasão.

Entre os oradores gregos do século IV, merecem particular atenção: Isócrates, que se distinguiu pelo cuidado do estilo e defendeu um ideal pan-helênico que pusesse fim às guerras internas entre os gregos, e sobretudo Demóstenes, o maior dos oradores gregos da antiguidade. Muito ativo na política, Demóstenes personificou a reação do velho ideal da pólis independente, frente ao nascente pan-helenismo. Depois de sua morte, com o declínio da democracia, a oratória entrou em decadência.

Prosa filosófica.
A prosa como um veículo para a filosofia começou a ser desenvolvida a partir do século VI a.C. Entre os primeiros filósofos se incluem Tales de Mileto, Anaximandro, Demócrito e Heráclito. A prosa filosófica foi a principal realização literária da época, muito influenciada por Sócrates (que não possui obra escrita) e seu método característico de ensino, por meio de perguntas e respostas, que evoluiu para o diálogo.

O discípulo mais célebre de Sócrates foi Platão, que começou a escrever pouco após a morte do mestre (399 a.C.) e, como escritor, deu forma insuperável a um novo gênero literário, o diálogo. Seu discípulo Aristóteles possuía um estilo admirado em seu tempo, mas suas obras conservadas são fundamentalmente didáticas e sem preocupação estilística.

Literatura bizantina

A literatura bizantina pode ser definida, de maneira geral, como a literatura grega da Idade Média, tanto a que se produziu no território do império bizantino quanto fora de suas fronteiras.

No fim da antiguidade, vários gêneros clássicos gregos, como o teatro e a poesia lírica coral, já tinham há muito se tornado obsoletos, e toda a literatura grega exibia de alguma forma a linguagem e o estilo arcaizantes, perpetuados por um sistema conservador de educação em que a retórica era a matéria mais importante. Os doutores gregos da igreja, produtos dessa educação, compartilhavam os valores literários de seus contemporâneos pagãos. Conseqüentemente, a vasta e dominante literatura cristã dos séculos III ao VI, que criou uma síntese do pensamento helênico e cristão, foi em grande parte escrita numa língua que há muito tempo não era mais falada por todas as classes em sua vida cotidiana. A utilização de duas formas muito diferentes da mesma língua para propósitos diversos caracterizou a cultura bizantina durante um milênio. A relação entre as duas formas, porém, se modificou com o tempo.

O prestígio da língua literária classicizante manteve sua força até o fim do século VI, e apenas algumas histórias populares das vidas dos santos e crônicas escaparam de sua influência. Nos dois séculos e meio que se seguiram, quando a própria existência do império bizantino estava ameaçada, a vida urbana e a educação entraram em declínio, e com elas o uso da língua e do estilo classicizantes. Com a recuperação política dos séculos IX e X teve início um renascimento literário, no qual se fez uma tentativa consciente de recriar a cultura helênico-cristã do fim da antiguidade. Desprezou-se a língua popular e a hagiografia (biografias de santos) foi reescrita em língua e estilo arcaizantes.

Por volta do século XII, a autoconfiança dos bizantinos lhes permitiu desenvolver novos gêneros literários, inclusive o romance de ficção, em que aventura e amor são os principais temas, e a sátira, que eventualmente usava citações do grego falado. O período entre a quarta cruzada (1204) e a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos (1453) assistiu a um vigoroso ressurgimento da literatura classicizante -- na medida em que os bizantinos buscavam afirmar sua superioridade cultural sobre o Ocidente, mais poderoso militar e economicamente -- e, ao mesmo tempo, ao início de uma florescente literatura que se aproximava do grego vernacular. Essa literatura vernacular, porém, limitava-se a romances poéticos, textos de devoção popular e outros afins. Toda a literatura séria continuou a usar a prestigiada língua arcaizante da tradição aprendida.

Didática no tom, e quase sempre também no contéudo, grande parte da literatura bizantina foi escrita para um grupo limitado de leitores cultos, capazes de compreender as alusões clássicas e bíblicas e apreciar as figuras de retórica. Alguns gêneros bizantinos não seriam considerados de interesse literário hoje. Ao contrário, parecem pertencer ao campo da literatura técnica, como é o caso dos volumosos textos dos doutores da igreja, como Atanásio, Gregório Nazianzeno, João Crisóstomo, Cirilo de Alexandria e Máximo o Confessor.

Poesia não litúrgica.
A poesia bizantina continou a ser escrita em métrica e estilo clássicos. Mas o senso de adequação da forma ao conteúdo estava perdido. Um exemplo disso é o trabalho de transição de Nonos de Panópolis, grego de origem egípcia do século V, que se converteu ao cristianismo. Seu longo poema Dionysiaká (Os dionisíacos) foi composto em linguagem e métrica homéricas, mas é muito mais aceito como um longo panegírico sobre Dioniso que como um épico. Contemporâneos de Nonos deixaram poemas narrativos curtos em verso homérico, de conteúdo mitológico.

Um clérigo, Jorge o Pisidiano, escreveu longos poemas narrativos sobre as guerras do imperador Heráclio (610-641), bem como um poema sobre os seis dias da criação do mundo, em trímetros jâmbicos (versos de 12 sílabas, em princípio de três pés jâmbicos, cada um com uma sílaba curta seguida por uma longa). Teodósio seguiu seu exemplo no épico sobre a retomada de Creta dos árabes, no século X.

O verso de 12 sílabas tornou-se a métrica mais utilizada em meados e no fim do império bizantino e serviu de veículo para narrativas, epigramas, romances, sátiras e instruções religiosas e morais. A partir do século XI encontrou um rival no verso de 15 sílabas -- usado pelo monge Simeon de Paflagônia em seus hinos místicos -- que se tornou um veículo para a poesia da corte no século XII. A nova forma também foi usada pelo metropolita Konstantinos Manasses em sua crônica do mundo e por um redator anônimo do romance épico Digenis Akritas, do século XIII.

Nessa métrica, que não seguiu modelos clássicos, foram escritos os primeiros poemas vernáculos, assim como o romance Calímaco e Crisorroe, entre outros que se incluem entre as mais significativas obras de ficção genuína na literatura bizantina. Muitos desses poemas eram adaptações ou imitações de modelos medievais ocidentais. Essa abertura ao Ocidente latino era nova. Mas mesmo quando se baseavam nos padrões ocidentais, os poemas bizantinos diferiam em tom e expressão de seus modelos.

A poesia bizantina é pouco original, cansativa e entediante. Mas alguns poetas revelam grande inspiração, como João Geometres (século X) e João Mauropo (século XI), ou extraordinário brilhantismo técnico, como Teodoro Pródomo (século XII) e Manuel II Paleólogo (século XIV). A habilidade para escrever versos era generalizada na sociedade bizantina letrada, e se apreciava muito a poesia.

Poesia litúrgica.
Desde os primórdios, a canção -- e pequenas estrofes rítmicas (troparia) em particular -- fazia parte da liturgia da igreja. Poemas em métrica e estilo clássicos foram criados por escritores cristãos desde Clemente de Alexandria e Gregório Nazianzeno. Mas as associações pagãs de gêneros, assim como as dificuldades da métrica, tornaram-nos inaceitáveis para o uso litúrgico geral.

No século VI, poemas rítmicos elaborados (kontakia) substituíram a troparia, mais simples. A nova forma devia muito à poesia litúrgica siríaca. O kontakion era uma série de até 22 estrofes, todas construídas com o mesmo padrão rítmico e terminando com um refrão curto. Em conteúdo, era uma homilia narrativa sobre um evento bíblico ou um episódio da vida de um santo. Quase sempre apresentava um forte elemento dramático. O maior compositor de kontakia foi Romanos Melodos (do início do século VI), um sírio provavelmente de origem judaica.

No fim do século VII o kontakion foi substituído por um poema litúrgico mais longo, o kanon, que consistia de oito ou nove odes, cada uma com muitas estrofes, além de ritmo e forma melódica diferentes. O kanon era um hino de louvor mais que uma homilia. Os mais notáveis compositores de kanones foram Andreas de Creta, João Damasceno, Theodoros Studita, Josephos Hymnógraphos e João Mauropo. A música original dos kontakia e kanones se perderam.

Historiografia.
Até o início do século VII uma série de historiadores recontou os eventos de seu próprio tempo em estilo classicizante, com falas fictícias e trechos descritivos do ambiente. Procópio de Cesaréia e outros historiadores que se seguiram partiram do ponto em que pararam seus antecessores. Posteriormente, esse veio permaneceu virtualmente extinto durante mais de 250 anos.

O renascimento da confiança na cultura e do poder político no fim do século IX assistiu ao ressurgimento da história classicizante, com interesse no personagem humano -- Plutarco era freqüentemente o modelo -- e nas causas dos eventos. O grupo de historiadores conhecidos coletivamente como os "Continuadores de Teófanes" registrou, não sem parcialidade, a origem e os primeiros dias da dinastia macedônica. Desde então até o fim do século XIV não houve uma só geração sem seu historiador. Os mais notáveis foram Simeon de Paflagônia (século X); Miguel Pselo (século XI); Ana Comnena (século XII); Georgios Akropolita (século XIII); e Nikephoros Gregoras e o imperador Johannes Cantacuzenos (século XIV). Os últimos dias do império bizantino foram recontados de vários pontos de vista por George Sphrantzes, o escritor conhecido simplesmente como Ducas (que era um membro da antiga casa imperial bizantina homônima), Laonicus Chalcocondyles e Michael Critobulus na segunda metade do século XV.

Outro tipo de interesse no passado era satisfeito pelas crônicas do mundo. Com freqüência ingenuamente teológicas em sua explanação das causas, simplistas na descrição dos personagens, e populares na linguagem, elas ajudaram o bizantino comum a se localizar num esquema de história mundial que era também uma história de salvação. As Chronographia de John Malalas, no século VI, e a Crônica de Pascal (Chronicon Paschale) no século VIII foram sucedidas pelas de Teófanes o Confessor, no início do século IX, e Jorge o Sincelo, no fim do século IX. Tais crônicas continuaram a ser escritas nos séculos seguintes, às vezes com pretensões críticas e literárias, como em John Zonaras, ou numa romantizada forma de verso, como em Konstantinos Manasses.

A importância que os governantes bizantinos deram à história se comprova na vasta enciclopédia histórica compilada por ordem de Constantino VII (913-959), em 53 volumes, dos quais somente poucos fragmentos permanecem.

Retórica.
Embora não houvesse oportunidade para oratória forense ou política no mundo bizantino, manteve-se o gosto pela retórica e pela linguagem bem-estruturada, pela escolha e pelo uso de figuras de linguagem e de pensamento. Do século X em diante sobrevive um vasto corpo de elogios, orações funerais, palestras inaugurais, discursos memoriais e de boas-vindas, celebrações de vitória e panegíricos variados. Essa profusão de retórica elaborada desempenhou um importante papel na formação e no controle da opinião pública nos círculos fechados e influentes, e ocasionalmente serviu de veículo para uma controvérsia genuinamente política.

Literatura grega moderna

Após a queda de Constantinopla, em 1453, a produção literária grega continuou quase exclusivamente nas áreas do mundo grego sob domínio de Veneza. Assim, Chipre, até ser capturada pelos turcos em 1571, produziu obras literárias no dialeto local, entre elas a crônica local, escrita por Leóntius Machairás. Em Creta, sob domínio de Veneza até 1669, assistiu-se a um importante florescimento literário, escrito em dialeto cretense. Escreveram-se tragédias, comédias, uma tragicomédia pastoral e uma peça religiosa baseada nos modelos italianos. Georgios Chortátsis era o escritor mais importante. Na primeira metade do século XVII, Vitséntsos Kornáros escreveu seu poema narrativo Erotókritos.

No território grego dominado pelos otomanos, as canções populares agradavam à população e se tornaram praticamente a única forma de expressão literária. Ao aproximar-se o fim do século XVIII, no entanto, vários intelectuais, sob a influência das idéias européias, procuraram elevar o nível da educação e da cultura gregas e lançaram as bases de um movimento em prol da independência. Os participantes desse "iluminismo grego" também abordaram o problema da língua, e cada um deles promovia uma forma diferente do grego para ser usada na educação. O principal intelectual do início do século XIX foi o acadêmico clássico Adamántios Koraïs, que em textos sobre a língua e a educação gregas, defendeu um grego moderno "corrigido" com base nas antigas regras.

Período pós-independência.
O grande renascer da literatura grega ocorreu a partir da independência, no final da década de 1820. Ao longo do século XIX houve uma discussão sobre qual das modalidades deveria ser adotada na língua literária: o katharevusa, variedade culta e deliberadamente arcaica; ou o demótico, baseado na língua falada. A princípio, foi mais empregado o katharevusa, mas no final do século triunfou na poesia o demótico, adotado em todos os gêneros literários a partir do início do século seguinte.

A literatura grega do século XIX esteve sob o signo do romantismo, ainda que nas últimas décadas tenha seguido novas tendências. Foram duas as mais importantes escolas de poesia: a ateniense e a jônica. Os poetas da primeira, que teve como fundador o líder Alexandros Soútsos, distinguiram-se pelo extremo sentimento patriótico e exacerbado romantismo. Além de Soútsos e de seu irmão Panayótis, introdutores do romance na Grécia, as figuras mais importantes foram Aléxandros Rízos Rangavís, em poesia narrativa e lírica, teatro e romance; Emmanuel Roídis, autor do romance satírico I Pápissa Ioánna (1866; A papisa Joana), um pastiche do romance histórico; e Pávlos Kalligás e Dimítrios Vikélas, que trataram de temas contemporâneos.

O representante máximo da escola jônica foi Dhionísios Solomós, poeta de grande profundidade filosófica e precursor do grupo de poetas atenienses que a partir de 1880 reagiu contra os exageros do romantismo e do formalismo do katharevusa. O movimento vulgarista defendeu o demótico como língua mais apropriada para a criação literária. Antónios Mátesis escreveu um drama histórico que foi a primeira obra em prosa em demótico. Aristotélis Valaorítis deu continuidade à tradição jônica com longos poemas patrióticos inspirados nas guerras nacionais gregas.

O movimento vulgarista na literatura, cujo principal ideólogo foi Yánnis Psicháris (Jean Psichari), inspirou poetas a enriquecerem a tradição popular grega com influências externas. Dentro dessa tendência, Kostís Palamás dominou a cena literária por várias décadas, com uma vasta produção de ensaios e artigos, e publicou sua melhor poesia entre 1900 e 1910. Angelos Sikelianós seguiu a mesma tendência em sua poesia lírica de natureza profundamente mística.

Na prosa, o culto folclórico fortaleceu o desenvolvimento do conto, inicialmente escrito em katharevusa, mas o demótico gradualmente ocupou maior espaço a partir da década de 1890. Esses contos, assim como os romances do período, descreviam cenas da vida tradicional rural, em parte idealizada, em parte vista de maneira crítica por seus autores.

Geórgios Vizyenós foi o primeiro contista grego, e o mais famoso e prolífico no gênero foi Aléxandros Papadiamándis. O romance O zitiános (1896; O mendigo), de Andréas Karkavítsas, satiriza a miséria econômica e cultural da população rural. A partir de 1910, essa visão crítica se refletiu na prosa de Konstantinos Chatzópoulos e Konstantinos Theotókis. Na mesma época, Grigórios Xenópoulos escreveu romances urbanos e trabalhou especialmente em teatro, gênero que recebeu um impulso substancial do movimento vulgarista.

A perda da Anatólia em 1922, quando os anseios expansionistas da Grécia na Turquia foram finalmente frustrados, trouxe uma mudança radical à orientação da literatura grega. Antes de cometer suicídio, Kóstas Kariotákis escreveu poemas sarcásticos sobre a lacuna entre os antigos ideais e a nova realidade.

A reação contra o derrotismo de 1922 veio com a geração de 1930, grupo de escritores que revigorou a literatura grega. Abandonaram as antigas formas poéticas e produziram romances ambiciosos que pretendiam corporificar o espírito da época. Os poetas Georgios Seféris, que também escreveu ensaios, e Odysseus Elytis ganharam o Prêmio Nobel de literatura em 1963 e 1979, respectivamente. Yánnis Rítsos foi outro importante poeta da época.

A geração de 1930 produziu romances notáveis. Entre eles, destacam-se I zoí en tafo (1930; A vida no túmulo), relato da vida nas trincheiras da primeira guerra mundial escrito por Strátis Myrivílis; Argo (1933-1936), obra em dois volumes de Yórgas Theotokás, sobre um grupo de estudantes durante a turbulenta década de 1920; e Eroica (1937), de Kosmás Polítis, que trata do impacto do amor e da morte sobre um grupo de estudantes.

Após a segunda guerra mundial, a prosa foi dominada por romances sobre as experiências dos gregos durante os oito anos da guerra (1941-1949). Iánnis Berátis escreveu To Platy Potami (1946; O rio largo) e, entre 1960 e 1965, Stratís Tsírkas publicou uma trilogia em que, com maestria, faz a recriação da atmosfera do Oriente Médio na segunda guerra mundial. No conto, Dimítris Chatzís retratou de forma irônica o período antes e durante o conflito.

O romancista mais famoso do período foi o cretense Níkos Kazantzákis, sobrevivente de uma geração anterior. Numa série de romances que teve início com Víos ke politía tou Aléxi Zorbá (1946; Zorba o grego) e prosseguiu com sua obra-prima O Christos xanastavronete (1954; O Cristo recrucificado), corporificou uma síntese das idéias de várias filosofias e religiões em personagens que enfrentam problemas imensos, como a existência de Deus e o propósito da vida humana. Antes disso, Kazantzákis já havia publicado Odésia (1938; Odisséia), poema épico de 33.333 versos que conta a história de Ulisses moderno, insatisfeito, em busca de uma vida superior. Pandelís Prevelákis publicou vários romances filosóficos ambientados na sua terra natal, Creta, entre os quais o de maior sucesso foi O ílios tou thanátou (1959; O sol da morte), que mostra um menino que aprende a lidar com a morte.

Durante a década de 1960, os prosadores tentaram explorar os fatores históricos que se encontravam na base da situação social e política. No romance To tríto stefáni (1962; O terceiro casamento), de Kóstas Tachtsís, o narrador feminino conta a história de sua vida e expõe a natureza opressora da família grega. A prosa curta, em parte ficcional, em parte autobiográfica, de Yórgos Ioánnou apresenta um retrato vívido de Tessalonica e Atenas entre as décadas de 1930 e 1980.

Nenhum poeta se destaca individualmente nas gerações pós-guerra na Grécia, mas Tákis Sinópoulos, Míltos Sachtoúris e Manólis Anagnostákis, todos marcados por sua vivência na guerra durante a década de 1940, estão entre os mais respeitados.

Fonte:
Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda. (CD-ROM)
http://www.wielkaencyklopedia.com (imagem)