quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Adélia Prado (Rodando)

Depois de muita e boa chuva, Célia voltava de Belo Horizonte para sua casa no interior do Estado. Era bom viajar de ônibus, vendo, parecia-lhe que pela primeira vez, o verde rebrotando com força. Ouviu um passageiro falando pra ninguém: que cheiro de mato!

Sol farto e os moradores desses conjuntos habitacionais de caixa de papelão e zinco, que brotam como grama à margem das rodovias, aproveitavam pra esquentar o couro rodeados de criança e cachorro.

Os deserdados desfilavam, a moça e seu namorado com bota de imitação de peão boiadeiro iam de mãos dadas, com certeza à casa de uma tia da moça, comunicar que pretendiam se casar. Uma avó gorda com seu neto também passou, ela de sombrinha, ele de calcinha comprida de tergal. Iam aonde? Célia fantasiou, ah, com certeza na casa de uma comadre da avó, uma amiga dela de juventude. O menino ia sentir demais a morte daquela avó que lhe pegava na mão de um jeito que nem sua mãe fazia.

Desceram três moços de bermuda e camisa do Clube Atlético Mineiro, e um quarto com grande inscrição na camiseta: SÓ CRISTO SALVA! Camiseta e bermuda não favorecem a ninguém, ela pensou desgostosa com a feiúra das roupas. Bermudas principalmente, teria que se ter menos de dez anos pra se usar aquela invenção horrorosa. Teve dó dos moços que só conheciam futebol e dupla sertaneja. Foi um pensamento soberbo, se arrependeu na hora. Tinha preconceitos, lembrou-se de que gostara muito de um jogo de futebol em Londrina, rodeada de palavrões e chup-chup com água de torneira e famílias inteiras se esturricando gozosamente entre pão com molho e adjetivos brutais, prodigiosamente colocados, lindos e surpreendentes como as melhores invenções da poesia.

Concluiu sonolenta, o mundo está certo.

Uma criança começou a chorar muito alto: quero ficar aqui não, quero sentar com meu pai, quero o meu pai. A mãe parecia muito agoniada e pelo tom do choro Célia achou que ela abafava a boca da criança com uma fralda ou a apertava raivosa contra o peito, envergonhada de ter filha chorona. Suposições.

Tudo estava muito bom naquele dia, não sofria com nada, nem ao menos quis ajudar a mãe, botar a menina no colo, estas coisas em que era presta e mestra. Assistia ao mundo, rodava macio tudo, o ônibus, a vida, nem protagonista nem autora, era figurante, nem ao menos fazia o ponto naquele teatro perfeito, era só platéia. Aplaudia, gostando sinceramente de tudo. Contra céu azul e cheiro de mato verde Deus regia o planeta.

Estava muito surpresa com a perfeita mecânica do mundo e muitíssimo agradecida por estar vivendo. Foi quando teve o pensamento de que tudo que nasce deve mesmo nascer sem empecilho, mesmo que os nascituros formem hordas e hordas de miseráveis e os governos não saibam mais o que fazer com os sem-teto, os sem-terra, os sem-dentes e as igrejas todas reunidas em concílio esgotem suas teologias sobre caridade discernida e não tenhamos mais tempo de atender à porta a multidão de pedintes. Ainda assim, a vida é maior, o direito de nascer e morar num caixote à beira da estrada.

Porque um dia, e pode ser um único dia em sua vida, um deserdado daqueles sai de seu buraco à noite e se maravilha. Chama seu compadre de infortúnio: vem cá, homem, repara se já viu o céu mais estrelado e mais bonito que este! Para isto vale nascer.

 Fonte:
Adélia Prado. Filandras. RJ: Record, 2001

Baú de Trovas (Esperança)

Na vida tudo se alcança,
quando a Esperança se tem!...
Porém se morre a Esperança,
a vida morre também.
A..B. LOPES RIBEIRO - MG

Esperança - voam aves...
Galhos, cascas flutuando...
Colombo comanda as naves
cheias de nautas cantando.
ADALBERTO DUTRA DE RESENDE - PR

Quanta vez em tristes rotas
tombei sem me ter queixado
porque nas minhas derrotas
tive a Esperança ao meu lado.
AGMAR MURGEL DUTRA - RJ

No verdor da mocidade,
 quanta esperança entretive!
 Agora tenho saudade
 das esperanças que tive!
 ALFREDO DE CASTRO -  MG

A esperança é voz do Além
  que nesta vida nos guia.
Sem este amparo ninguém
às mágoas sobrevivia.
ANA ROLÃO PRETO M. ABANO - ANGOLA

Mãe que traz uma criança
nas entranhas do seu ser,
carrega a própria esperança
no filho que vai nascer.
ANIS MURAD - RJ

Há muita gente na vida
que a felicidade alcança,
não por ter sorte florida,
mas por viver de Esperança!
ANTONIETA BORGES ALVES - SP

Pensando, na tarde calma,
 logo me ocorre à lembrança
 que a própria vida tem alma,
 e a alma da vida é a esperança!
 APARÍCIO FERNANDES - RJ

A Esperança se revela
 em cousa bem natural:
 um sapato na janela
 numa noite de Natal!
 ARCHIMINO LAPAGESSE - RJ

Desde o tempo de criança
- de ingênua colegial -
fiz de ti minha esperança
e só tenho esse fanal.
ARIETE REGINA DE PAULA FERNANDES - RJ

Por que é verdade a esperança?...   
Se todo o mundo soubesse...
- É que, por mais que se espere,
ela nunca amadurece...       
PE. BELCHIOR D'ATHAYDE - BA

Que não seja a tua esmola,
vazia de coração;
a esperança mais consola
do que um pedaço de pão.
CÉLIA CAVALCANTE - RJ

Há muito mais esperança,
 segundo o meu evangelho,
 numa lágrima de criança
 que num sorriso de velho.
 COLBERT RANGEL COELHO -  RJ

Entre o meu pai - já velhinho,
 e o meu filho - uma criança,
 vejo estender-se o caminho
 por onde passa a esperança.
 DENANCY MELLO ANOMAL – RJ

Esperança - chama acesa
no coração a brilhar.
quando ela morrer, a tristeza
vem tomar o seu lugar.
DINARTE BARBOSA ARMOND - MG

A esperança é como um sopro
 de vida, dado por Deus.
 É o dia, depois da noite,
 é a volta, depois do adeus.
 EDGAR BARCELOS CERQUEIRA - RJ

Todos nós temos na vida,
quer seja agitada ou mansa,
a doce, a terna guarida,
onde se abriga a esperança!
EDNA DE CASTRO - MG

A dor de tua partida,
que não sai da lembrança,
já me levou mais que a vida:
levou-me toda esperança!
FRAZÃO TEIXEIRA – RJ

Esperança - bem que enleva
nossa vida, no presente;
- um raio de luz na treva
  do incerto amanhã da gente.
GERALDO PIMENTA DE MORAES - MG

Ante a inclemência dos fados
da vida em cada revés...
Consolo dos desgraçados!
- Esperança é o que tu és!...
HONÓRIO SANTANA - BA

Com mágoa de toda a sorte,
se a velhice nos alcança,
crendo que há vida na morte,
temos na morte, Esperança.
JOÃO BATISTA DE AZEVEDO - MG

Esperança - céu nublado
 no Nordeste, os bois ao léu;
 o sertanejo ajoelhado,
 de mãos postas para o céu...
 JORGE MURAD  - RJ

Neste mundo que nos cansa
 tanta maldade se vê,
 que a gente tem esperança
 mas já nem sabe de quê...
 JOSÉ MARIA MACHADO DE ARAÚJO - RJ

Esperança e, simplesmente
um sentimento perjuro:
são mentiras no presente...       
desenganos no futuro...
LECTÍCIA PIRES RANGEL COELHO - RJ

Quando a ventura está morta,
deixando a dor como herança,
nossa alma se reconforta,
buscando a luz da esperança!
LEONARDO HENKE - PR

Mesmo sendo uma quimera
 a Esperança anima e acalma,
 pois ela, enquanto se espera,
 enche de rosas nossa alma!...
 LINCOLN DE SOUZA - RJ

Esperança é aquela estrela
de verde luz envolvida,
a cintilar, pura e bela,
no céu escuro da vida.
LÚCIA LOBO FADIGAS - RJ

Numa era de baixeza,
num mundo de podridão,        
a esperança  é a tocha acesa
que trago no coração.
 LUIZ EVANDRO INOCÊNCIO - RJ

A Esperança corre, voa,
mas deixa por onde passa,
uma impressão suave e boa:
de paz, de amor e de graça.
MANOELITA AMORIM MEYER - MG

Quando um bem está perdido
outro nos vem consolar -
Esta esperança, querido,
Deus não me pode negar.
MARIA CARMEM SAUER BATISTA - RJ

Culpada de minha dor,
 foi a esperança, Maria.
 Leu nos teus olhos - amor
 em vez de ler simpatia.
 MARIA JOSÉ BARCELLOS CERQUEIRA - RJ

De flores tão enfeitada,
loiros cabelos em trança
Neste esquife azul , deitada,
vai toda a minha Esperança.
(MARIA JOSÉ FORTES BRAGA - MG

Esperança, isto se chama
e a todo instante acontece:
uma carta... um telegrama...
um meigo olhar... uma prece...
MAURO BARBOSA ARMOND - MG

Com o verde da natureza
e o sorriso da criança
Deus coloriu a tristeza
pondo no mundo a esperança.
NATAL MACHADO - DF

Podes perder mocidade,
amor, ventura, abastança,
nada perdes, em verdade,
se te ficar a esperança.
OCTACÍLIO AZEVEDO - CE

Esperança - nordestino                
numa cerca debruçado,
contemplando, sol a pino,
o verdejante roçado.
OLDEMAR ANDRADE - RJ

No porto dos meus anseios
 esperanças são navios,
 que de manhã partem cheios
 e à tarde voltam vazios...
 ORLANDO BRITO – SP

Quando minha alma sentida
nesta vida nada alcança,
inda me resta na vida
- graças a Deus ! - a esperança!
RODOLFO COELHO CAVALCANTI - BA

Quem quiser ver a Esperança
olha uma noiva no altar,
fite um rosto de criança,
repare uma mãe rezar!
SEVERINO UCHOA - SE

No tédio de minha vida
de emoções vazia e nua,
só me torna comovida
a Esperança de ser tua...
VERA MILWARD DE CARVALHO - SP

Ai, do pobre, sem carinhos,
cuja dor se vê na face,           
se no meio dos espinhos,    
a esperança não brilhasse...
VIRGILIO GUERREIRO - SP

N'alma, a esperança reflete
 uma risonha mentira,
 pois é o que a vida promete
 em troca do que nos tira...
 WALTER WAENY JUNIOR - SP

A fonte da minha vida
- o meu  sonhar de criança -
não ficou toda perdida…
- Vive um pouco na Esperança...
 ZALKIND PIATIGORSKY - RJ

Fonte:
Organização em ordem alfabética dos trovadores por José Feldman. Trovas selecionadas de 100 Trovas  sobre a  “Esperança”, dos I Jogos Florais de Pouso Alegre. Disponível no site de J. G. de Araújo Jorge. http://www.jgaraujo.com.br/trovadores/11_trovas_sobre_esperanca.htm

Monteiro Lobato (Reinações de Narizinho) Cara De Coruja –VIII – A Varinha de Condão

Durante todo aquele tempo Pedrinho, Aladim e o Gato de Botas ficaram de parte, conversando sobre valentias. Aladim contava as mil façanhas de sua lâmpada maravilhosa. Não querendo ficar atrás, Pedrinho contou as proezas do seu famoso bodoque. Por fim chegaram a brigar.

— Pois apareça aqui um dia — disse Pedrinho — para vermos quem pode mais, você com sua lâmpada ou eu com o meu bodoque.

— Aposto na minha lâmpada! — disse Aladim.

— E eu aposto no meu bodoque! — disse Pedrinho.

O Gato de Botas interveio.

— Eu serei o juiz e em seguida desafiarei a ambos. Quero ver o que vale mais, se esse bodoque e essa lâmpada ou as minhas botas de sete léguas!...

Enquanto discutiam e marcavam a data do pega, um acidente muito grave aconteceu na sala. O pobre Visconde dormia em cima do binóculo, tão bem dormido que, de repente, plaft!... caiu lá do alto um grande tombo no chão. Caiu e ficou desacordado. As princesas correram a acudi-lo com água e esfregações pelo corpo. Mas como o pobre sábio não voltasse a si, foi uma consternação geral.

— O melhor é virar o Visconde nalguma coisa – sugeriu Emília dirigindo-se a Cinderela. — Dê-lhe uma varada com a varinha de condão, princesa!

Cinderela, achando boa a idéia, assim fez. Mas antes quis saber no que havia de virar o Visconde. Narizinho achava que deviam virá-lo num grande mágico de chapéu de cartucho. Rosa Vermelha preferiu que o virassem em lobo. Venceu afinal a opinião da Emília, que era a mais prática.

— Tia Nastácia anda precisando dum pilãozinho de socar sal. Boa ocasião para virar o Visconde em pilão! Ao menos fica servindo para alguma coisa.

Aprovada a idéia, a princesa da varinha bateu nele, dizendo:

— Vira que vira, vira virando, vira pilão!

Imediatamente o Visconde virou num pilãozinho novo, exatamente como tia Nastácia queria. A princípio a negra ficou assombrada. Depois disse:

— Mas eu não tenho coragem de socar sal nesse pilãozinho!

Pego a imaginar que já foi o Visconde e morro de dó. Em todo caso, fico muito agradecida a dona Cinderela pelo lindo presente.

E guardou o pilãozinho numa prateleira, resmungando:

— O mundo está perdido!... Quando eu havia de pensar que o Visconde ia ter este fim? Não valemos nada nesta vida. Quando chega a hora de virar, pode ser rei, pode ser Visconde, a gente vira mesmo — e ainda é bom quando vira pilão...

Na sala de baile estavam todos brincando de virar. Cinderela batia com a varinha e virava tudo que lhe pediam. Emília trouxe todos os seus brinquedos para os fazer virar em outros brinquedos ainda mais bonitos. Depois sentiu saudades dos brinquedos velhos e os fez desvirar novamente. E estavam ainda nessa brincadeira, quando ouviram na porta uma batida esquisita, muito diferente das demais. As princesas assustaram-se.

— Parece batida de lobo! — disse Capinha Vermelha que fora espiar pelo buraco da fechadura. — É lobo mesmo! — exclamou de lá, arregalando os olhos de pavor. — Justamente o malvado que comeu vovó...

Foi uma correria. Narizinho procurou acalmar as princesas.

— Não pode ser — disse ela. — O lobo que comeu a avó de Capinha foi morto a machadadas por aquele homem que entrou, É o que dizem os livros.

— Deve de ser erro tipográfico — sugeriu asnaticamente Emília, que também fora espiar o lobo. É lobo, sim – e magríssimo! Bem se vê que só se alimenta de velhas bem velhas. Com certeza soube que dona Benta morava aqui e...

Não pôde concluir. Narizinho estava em prantos.

— Pobre vovó! — gemia ela torcendo as mãos. — Que desgraça se o lobo a devora! Chamem Pedrinho e os príncipes! Corra Emília!...

Mas justamente minutos antes Pedrinho e os príncipes haviam saído para o terreiro a fim de fazerem uma experiência com a lâmpada de Aladim. Estavam as meninas ali sem um homem que as pudesse socorrer.

— Bata com a vara nele e vire-o numa pulga – lembrou Emília já preparando a unhinha para matar a pulga.

— Impossível! — exclamou Cinderela aflita. — Seria preciso abrir a porta e o lobo poderia me agarrar de um bote.

Enquanto isso o lobo continuava a bater, toc, toc, toc, cada vez mais furioso. Depois começou a arranhar a porta, tirando lascas.

Rabicó tremia como geléia; em vez de ajudar as princesas a se salvarem dos apuros, mais atrapalhava. Agarrou-se à saia de Branca de Neve, que teve de afastá-lo com um bom pontapé.

— Só o Visconde poderá nos salvar! — exclamou Emília. – Os sábios sabem meios para tudo.

Disse e foi correndo buscar o pilãozinho para que Cinderela o virasse em Visconde. Cinderela, muito trêmula, bateu com a varinha e o Visconde surgiu de novo, tonto e assustado. Narizinho explicou-lhe do que se tratava e apontou para a porta.

— O lobo está arrebentando as tábuas. Mais um minuto e penetra aqui. Veja se acha um jeito de nos salvar, Visconde!...

Mal a menina acabara de pronunciar essas palavras, o lobo arrancou uma tábua e enfiou o focinho pelo buraco, farejando o ar.

— Hum... Hum!... Estou sentindo cheiro de avó de gente... — rosnou ele.

Era demais. Narizinho desmaiou. Vendo aquilo, as princesas desmaiaram também. Emília ficou na sala sozinha com o Visconde.

— Vamos, Visconde! Faça alguma coisa! Mexa-se!...

Mas o Visconde não saía do lugar, e só então Emília percebeu que ele tinha virado Visconde só da cintura para cima, continuando pilão da cintura para baixo. Com a pressa e o nervoso, Cinderela só lhe havia dado meia varada...

— E agora! — exclamou Emília coçando a cabeça e pensando lá consigo se valeria a pena desmaiar também.

E talvez fizesse isso, se o lobo naquele instante não arrancasse mais uma tábua e não enfiasse dentro da sala quase meio corpo. Vendo que o monstro entrava mesmo, Emília berrou com todas as forças dos seus pulmões:

— Acuda, tia Nastácia! O lobo está entrando de verdade e vai comer dona Benta...

Ouvindo o berro, a negra veio lá da cozinha com a vassoura e num instante espantou dali a fera com três boas vassouradas no focinho.

— Lobo sem-vergonha! Vá prear no mato que é o melhor. Dona Benta nunca foi quitute pra teu bico, seu cão sarnento!...

— Bravos! — exclamou Emília batendo palmas. — A senhora é tão valente que até merece casar com o pássaro Roca.

A preta só disse:

— Em vez de dizer bobagens, antes me ajude a acordar estas princesas. Traga depressa uma caneca de água fria, ande...

A primeira a ser despertada foi Narizinho.

— Que é do lobo? — perguntou ao voltar a si, ainda tonta e com a vista atrapalhada. — Já comeu vovó? A negra deu uma risada com a beiçaria inteira.

— Credo! Que idéia! O lobo a estas horas já deve estar chegando na Europa!... e contou o que havia acontecido.

Em seguida despertou as outras. Capinha Vermelha, louca de alegria, abraçou tia Nastácia, prometendo mandar-lhe uma cesta de bolinhos. As princesas também a abraçaram, prometendo mandar pilõezinhos de verdade e mais coisas bonitas.

Nisto entrou o menino com os príncipes.

— Bonito! — exclamou Narizinho. — Os senhores vão para a troça e nos deixam aqui sozinhas à mercê das feras... e contou tudo.

Aladim ficou aborrecidíssimo de haver perdido aquela oportunidade de mostrar o poder da sua lâmpada e Pedrinho ainda mais, pois com duas bodocadas tinha a certeza de que o lobo sairia ventando. Nesse momento um vulto entrou pela janela como um grande pássaro Peter Pan! Assim que Pedrinho e os demais o reconheceram, reboou uma grande salva de palmas, seguida do hino dos índios guerreiros, composto pela boneca. Dona Benta, que havia acabado de escrever a sua carta, ouviu o rumor e lembrou-se da promessa feita a Narizinho. Veio espiar a festa.

Entrou na sala.

— Boa tarde, senhor Peter Pan! Fico satisfeita de saber que o senhor também é amigo dos meus netos — mas quero que não faça com eles o que fez com Wendy e seus irmãozinhos. Não lhes ensine a voar, senão estou perdida. Se não sabendo voar já são assim, imagine sabendo...

— A senhora pensa que voar é perigoso? — perguntou Emília.

— Levando o seu guarda-chuva como pára-quedas, não há perigo nenhum!...

— Sei que não há perigo — disse a velha. — Mas sei também que se voarem começarão a ir para muito longe e poderão um dia esquecer-se de voltar.

Peter Pan sossegou-a. Disse que nada receasse, pois só lhes ensinaria a voar se obtivesse o consentimento dela.
–––––––
Continua... Cara de Coruja– IX – A Partida

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Carolina Ramos (Parceria)

Isabel Furini (A Disputa)


Apoiou as unhas longas e grossas sobre as grades e arranhou-as violentamente. Um chirriado agudo reverberou no lugar. A fila enorme que acompanhava as curvas das nuvens, tremeu. Alimentou-se das emoções de medo e incerteza. O arroto com odor de enxofre e a estrondosa gargalhada aumentaram o temor das almas. Depois observou esse homem magro que caminhava lentamente. Olhava-o com a voracidade de um vampiro. Uma mente brilhante, murmurou.

São Pedro, o bondoso, organizava a fila. Algumas almas estavam ansiosas e moviam suas formas feitas de matéria etérica, formas luminosas e muito semelhantes aos corpos físicos, mas sem o peso e as limitações dos verdadeiros corpos. Outras, acostumadas a esperar em filas de mercados e bancos, permaneciam quietas e resignadas. As mais impetuosas agitavam no ar as mãos quase transparentes, elas queriam entrar.

Na recepção, antes do segundo portal, o chamado Portal Definitivo, Deus, rodeado pelos seus anjos de belas asas brancas, ia julgando as almas com infinita sabedoria. Algumas podiam entrar no céu, outras caíam vítimas de suas más ações.

No momento em que esse homem idoso, calmo, aproximou-se, o próprio guardião dos portões, São Pedro disse:

– Peço perdão para ele, Senhor, ele foi um escritor brilhante.

O diabo, que permanecia em silêncio, no lado esquerdo do portão, encostado nas grades, reclamou:

– Ele é meu, Altíssimo. Brilhantes foram muitos militares e arrasaram cidades. Brilhantes foram muitos reis e massacraram o povo. Até alguns papas como Bórgia...

– Esse escritor defendeu os oprimidos! Merece seu perdão, Senhor.

– Ele é meu! Há tempos que não recebo alguém com uma mente, digamos, tão criativa, tão suculenta... Falou o diabo arrumando sua capa vermelha.

– Ele foi um bom homem.

– Não é essa a questão, Pedro - gritou enfurecido o diabo e bateu o tridente na ponta de um asteróide – A questão é que ele foi ateu, negou sua existência, Senhor.

– O lugar dele é no Céu!

– Não, Pedro. O lugar dele é no inferno.

– Céu!

– Inferno! Ateus vão ao inferno!

– Não seja preconceituoso, Satã – disse Deus. E Pedro, ao ouvir a voz de Deus, ajoelhou-se em sinal de humildade.

– Você sabe, anjo do mal, que eu amo todos os meus filhos e não tenho preconceitos contra ateus. Alguns me adoram só com os lábios, por isso eu não julgo os homens segundo suas palavras. Eu meço corações. Se julgasse os homens segundo suas palavras, o céu estaria cheio de retóricos e de políticos...

– Aproxime-se, filho.

O escritor se aproximou lentamente. Estaria sonhando?

Pedro pegou uma faca feita de luz violeta e abriu o peito do escritor. Mas ele não sentiu dor. Pedro retirou o coração e colocou-o em uma balança. Se o prato da balança desce, a alma do morto cai no abismo da culpa e da desolação. Pedro fechou os olhos e escutou um Ahhh!!! Era o diabo.

O peso do coração apontava: bondade, compaixão e fraternidade. E Pedro, triunfante, abriu os Portões para essa nobre alma. O escritor estava entrando no Céu quando Satã gritou:

– Antes de entrar, por favor, autografe este exemplar de seu último livro. Quero mostrar aos outros anjos caídos que quase, quase consegui sua alma.

Fonte:
Isabel Furini (organizadora). Passageiros do Espelho: antologia de contos. Curitiba: Íthala, 2011.

Antonio Brás Constante (Um Toque Sobre a Essência das Mãos)


As mãos estão conosco desde que nascemos. São cuidadosas mãos as primeiras coisas que encontramos ao chegarmos neste mundo pós-uterino, nos segurando e protegendo. Mãos de pulso firme batem com bondade em nossa corpórea fragilidade nos fazendo chorar, respirar, viver, e em outras vezes, mãos covardes espancam com maldade o nosso corpo, nos fazendo gritar, engasgar, morrer.

As mãos falam através de sinais mudos. É a mão que encontrando outras mãos, expressa sua amizade e confiança através da força e firmeza que imprime neste encontro. Os amantes pedem a mão desejada em casamento. As mãos benevolentes estão sempre abertas para auxiliar a quem precisa, mas existem mãos rancorosas que se fecham pelo ódio e cólera que a tantos intimidam.

A mão que acolhe com bondade é a mesma que empurra com brutalidade. A mão que puxa para aproximar é a mesma que solta sem demonstrar se importar. São as mãos que nos socorrem nos momentos em que a escuridão nos envolve e, sem qualquer aviso, cega o nosso olhar. Mãos que nos fazem ver, muitas vezes, aquilo que não queremos enxergar.

A mesma mão que aponta acusando é aquela que se une com outras em prece pedindo perdão. Uma mão caridosa lava a outra, lhe ajuda, protege e ampara, fazendo o que estiver ao seu alcance na hora de prestar auxilio. Mas a mão impregnada de egoísmo também lava a própria culpa de si mesma, quando quer se omitir de ajudar quem precisa.

A mão suja representa o trabalho, mas a sujeira nas mãos também é o símbolo da corrupção. As mãos vazias de riquezas, sem nada, representam a pobreza, bem como as frágeis mãos ainda tão pequenas, desamparadas e pedintes. Cruel realidade das crianças mendicantes nas sinaleiras.

São as mãos que batem continência em sinal de respeito e disciplina militar em nome de uma pátria nem sempre amada. Mas também foram elas que ficaram erguidas, o braço direito estendido para frente, simbolizando a loucura nazista que marcou uma era malograda.

São mãos amigas que amparam quando as palavras falham, nos envolvendo na comunhão de um abraço. É uma mão cheia de ternura que dá adeus quando alguém parte, e enxuga a vertente de lágrimas que escorre pela face de nosso semblante sofrido.

São as mãos que batem na porta para anunciar a chegada. Mãos cheias de energia aplaudem aqueles que admiram, e se juntam ampliando o som das vozes quando querem vaiar. As mãos unidas podem até derrubar governos...

São as mãos que acariciam vários instrumentos de corda fazendo-os tocar, espalhando os sons dos anjos pelo ar. A mão que nos alimenta é também aquela que nos auxilia a aprender a contar, brincar, trabalhar, amar.

São as mãos que abrem a carta com as notícias tão desesperadamente esperadas. E através de um simples toque de seus dedos, um clique é dado sobre o mouse, abrindo o e-mail desejado.

É a mão que aperta o gatilho da arma. É a mão que tapa a boca da vítima impedindo-a de gritar. São mãos frias que puxam a alavanca do cadafalso cumprindo a ordem de matar.

A mesma mão que escreve as verdades também rasga os direitos em sinal de intolerância, jogando pedras em corpos vivos e livros ao fogo, que ardem em nome do preconceito.

São elas que fecham nossas têmporas quando enfim rumamos para imensidão.

Foi por causa dessas mãos, dessas tantas mãos: fortes e frágeis, grandes e pequenas, jovens e velhas, negras, brancas, orientais, universais, que me pus pacientemente a dedilhar o teclado, dando vida a este pretenso texto com ares de poesia. Enfim, as mãos unidas pelo amor são a essência de nossa humanidade. Agora peço que você releia todo texto novamente, trocando as expressões que representam as “mãos” por “pessoas”... Feliz 2012.

Fonte:
Texto enviado pelo autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas de Ano Novo n. 436)


Uma Trova Nacional

Rogo ao ano que inicia,
Paz, Luz, Amor, como embalo,
ao raiar do novo dia
ao som do cantar do galo.
–VANDA ALVES/PR–

Uma Trova Potiguar


Ano Novo, nova vida
e muita poesia nova,
desejo a elite que lida
na lapidação da Trova!
–CLARINDO BATISTA/RN–

Uma Trova de Ademar


Neste Ano Novo, eu queria
entre nós, mais união;
e que o amor pela poesia
cresça em nosso coração!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Que o Ano Novo nos dê,
à maneira que puder,
o Bem que eu quero a você
e o Bem que você me quer!
–ALCY RIBEIRO S. MAIOR/MG–

Simplesmente Poesia

A Vida Continua

–GILSON F. MAIA/RJ–

Não é o fim, meu amigo,
a jornada continua!
Terá sequência domingo
o passeio em outra rua.
Que seja alegre a viagem!
Que seja linda a paisagem!
Ame o sol, namore a lua!

Estrofe do Dia

Que o ano que se despede
Leve com ele as tristezas,
As dúvidas e incertezas
E que todo mal se arrede,
Tudo quanto nos impede
Tome outras diretrizes,
Corte os males nas raízes
Trazendo um total renovo
Para que nesse ano novo
Possamos ser mais felizes!
–CARLOS AIRES/PE–

Soneto do Dia

No Ano Novo
–THALMA TAVARES/SP–


Ano que vem quero esquecer as dores,
quero vestir a roupa colorida,
a que me faz sorrir dos dissabores,
para enfrentar com mais humor a vida.

Eu quero repensar os meus valores,
se os tenho respeitado na medida
em que suporto a dor dos sofredores
pungindo mais minha alma dolorida.

Eu quero abrir meu peito à humanidade,
mudar meu egoísmo em caridade
e transformar-me assim no Homem Novo.

E espero que o bom Deus, nosso Senhor,
transforme este meu sonho em Paz e Amor,
em trabalho e mais pão para o meu povo.

Fonte:
Textos e imagem enviados pelo Autor

Adélia Prado (Os Componentes da Banda)


O menino da vizinha dos fundos, trepado no muro como ele vive, deve ter investigado bem o meu quintal, porque hoje me gritou: "do-o-na, do-o-na, a mãe falou se a senhora quer vender umas panelas pra ela."

Me desgostou muito a forma de pedir, o pedido em si. Com tanto vizinho, porque Dona Alvina foi enxergar logo as minhas panelas? A distância entre a casa dela e a minha é a mesma entre a casa dela e a do Osmar Rico. É claro que percebeu minha fraqueza. Não posso esconder, está na minha cara a atração que exercem sobre mim. São como diamantes no cascalho. Pobres, eu os farejo, pressinto, me ofereço a eles como manjar. As panelas, se estavam no barracão é porque estavam mesmo sobrando. O que não me falta é panela. Por que então não fui capaz de pegar a melhor delas e dar para Dona Alvina com o coração exultante de poder ajudar? De jeito nenhum. Primeiro disse ao menino, contrariada: as panelas não são de vender não. Fiquei com raiva dela falar em comprar, já sabendo que eu não ia vender.

Logo me arrependi, chamei o menino de volta e peguei a melhor panela, mas não pense que mandei a tampa junto. Achei-a boa demais, servia pra tampar o caldeirão onde gosto de cozinhar batatas. Dei a panela pura. Foi uma bondade boba, pela metade, sem nenhum valor. Não descansei enquanto não inventei um meio de visitar Dona Alvina. Com um mês só na casa velha, toda escorada, que o
dono do curtume deu para ela morar, já fez horta, jardim, os cacarecos são limpíssimos. A menina pequetita, paninho na cabeça, brinquinho de ouro na orelha desensebada. Fui com desculpa de comprar cebolinha e fiquei sabendo: ela faz faxina nas casas, o marido trabalha fora e só vem fim de semana, eles não são daqui não.

Muito bem, pois saí sem ter coragem de dizer a ela a única coisa que meu coração pedia que dissesse: olha, Dona Alvina, somos vizinhas e a senhora pode contar comigo no que precisar, estou à sua disposição. Isto falei toda emproada pra Dona Leonor, pra Dona Ester, porque no fundo sabia, são destas vizinhas que pedindo um dente de alho pagam logo com uma réstia de cebolas, enfim, me serviriam quando eu precisasse sem me dar amolação. Dona Alvina é diferente, porque é precisada mesmo. Se me pedir cinquenta cruzeiros vai demorar um ano pra pagar. Qual é o dinheiro que entra lá que seus quatro crioulinhos não consomem num átimo? E ela deve pensar assim: "Dona Violeta é rica, pode muito bem esperar." Posso mesmo. Por que então, meu Deus, não sei ajudar a Alvina? Empresto o dinheiro, passam nem duas semanas fico dizendo: ao menos satisfação eu merecia; não é por causa do dinheiro. E outras bobagens mais que todo mundo fala nestas situações. O fato é que estou chateada com a mudança deles pra cá. Antes era Dona Terezinha que, bem ou mal, eu vivia acudindo. Passou mais de ano sem morador na casa, um verdadeiro descanso. Agora envém Dona Alvina que, sem saber, é um ferrão na mão de Deus. Não chupo mais uma bala sem pagar um dízimo de tristeza. Claro que está tudo errado, qualquer sacristão bobo sabe disso, menos eu que não atino com a forma de gozar dos frutos da terra, criados por Deus para todos comerem em perfeita alegria, eu inclusive.

Demoraram um dia só para descobrir minha mangueira de cinqüenta metros: "do-o-na, a mãe falou se pode emprestar a mangueira pra nós aguar a horta?" Este batido durou um mês. Pedro até botou um trapo no muro pra não esfolar a borracha. Depois foi ficando chato. Queria lavar o carro, aguar nossa horta mais cedo, a mangueira com Dona Alvina. Bibia falava: "mãe, que povo folgado, vai ser descansado assim! Acho a senhora e o pai muito bobos." Não podia aplaudir a menina, mas por seguro matutamos: a voz das crianças é a voz de Deus.

De noite Pedro bateu na casa da Alvina para bispar a situação. Se pudesse, falou o marido, mandava ligar a água, mas onde vou arranjar dinheiro? Pedro foi na Companhia, pagou a taxa, acabou a questão da mangueira. Nem assim sosseguei: será que foi correto? Não teria sido mais edificante emprestar a mangueira com paciência até eles arranjarem modo de pagar a taxa? Vejo o marido da Alvina passar aos sábados com umas mexericas que ele arranjou pra vender e penso: nem pra dar uma satisfação, um sinal. Pedro nem se lembra mais. É diferente de mim, nunca dá meia panela. Por isso a alegria dele é inteira.

Fonte:
Adélia Prado. Os componentes da banda. Editora Rocco, 1988

Maria Zilda da Cruz (Gemido Verde)


Frondosa, a majestosa árvore oferecia mais um verde à natureza. Sua cor pertencia ao matizado de tantos outros verdes, existentes nas grandes árvores, nos pequenos arbustos nas humildes hortaliças e nas plantas quase rasteiras. Não importa o tamanho. A diversidade do verde se espalha ao infinito!

As árvores, juntas, formam o bosque quando muitas engrandecem a terra com uma floresta. A Amazônia enriquece o território brasileiro.

Mas eis que o homem, empobrecido de pensamento, sem coração, mata o verde, tira a nobre mata e deixa pobre o solo. Forma-se um vazio na terra, despida de sua maternidade de tantas dadivosas árvores.

Em cidades hospitaleiras do verde, elas crescem orgulhosas de suas sombras. Ofertam a beleza de flores, às vezes de frutos e sempre acolhem os pássaros e outros bichinhos.

Assim era aquela gigantesca árvore; um dia fora pequenina, plantada por mãos carinhosas. Hoje, ostentava a imponência herdada de séculos de ascendência. Crescia cada vez mais: na altura, desafiando chegar próxima ao céu; na largura, ara aumentar a sombra, em proteção ao sol quente, de algum verão exagerado. Até ajudava a agasalhar a desprevenida pessoa, sem guarda-chuva, de alguma chuva passageira. Em seus galhos fortes, sustentava meninos travessos, brincalhões, sentindo-se heróis em imaginárias cavalgadas, corridas velozes sem sair do lugar, confundidos na exuberante ramagem.

Aquela árvore era a presença duradoura para mais de uma geração. Enfeitava a avenida que, com muitos alargamentos, acabara por deixá-la isolada num canteiro central. Só, ela se destacava ainda mais. Os pássaros sentiam um refúgio seguro para construir seus ninhos. Até faziam o par do amor para depois, surgirem redondos ovinhos. Então, passado o tempo da natureza, novas gerações de aves cantavam a sonoridade da vida.

Olhando ao redor, a árvore se preocupava com tantas mudanças urbanas. Não entendia muito os planos de modificações do lugar. Nem sempre deixavam o local mais bonito: o cimento, o asfalto comia a terra dos canteiros e muito verde desaparecia. Então, ela escutava um nome esquisito, progresso, que lhe causava arrepios.

Um dia, o temor se transformou em medo. Homens com grossas luvas seguravam uma serra bem forte. Com decisão e audácia contra a vida, a mortífera máquina começou a trabalhar. No vai e vem dos dentes impiedosos, a serra logo sentiu o crime de seu ato. A árvore estremecia. Os pássaros voavam pedindo socorro pelos seus ninhos, pelos ovinhos, pelos filhotes indefesos. Os galhos aos poucos caiam! Dezenas de anos, lentamente florescidos, sentiam a morte decretada. Uma imensidão de verde cobria o negro asfalto da nova avenida.

Molhada pela seiva da vida perdida, que escorria em abundância, a serra tremia um pedido de desculpas pelo que fazia. Já pressentia a avalanche de futuros remorsos, fantasmas de um crime sem culpa. Somente uma criança, parada na calçada, sentia a agonia da frondosa árvore e ouvia o gemido de dor de um verde vencido.
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Maria Zilda da Cruz é Mestra e Doutora em Psicologia pela USP. Presidente da Academia Feminina de Ciências, Letras e Artes de Santos e Membro da Diretoria da Academia Santista de Letras.

Fonte:
Texto e imagem obtidas em:
Cláudio de Cápua (editor). Revista Santos: arte e cultura. Ano V, vol. 27. Maio de 2011.

Flávio Paiva (Os Guerreiros de Nilto Maciel)

Quem passa desavisado por Baturité nem imagina que aquela cidade do maciço poderia nem existir, caso no tempo em que, na ficção do escritor Nilto Maciel, 66, ela ainda era vila, tivesse sido destruída pela revolução nativista sonhada pelo anti-herói protagonista do livro "Os guerreiros de Monte-mor" (Armazém da Cultura, 2011), que será lançado hoje, às 19 horas, na Livraria Cultura, em Fortaleza. A primeira edição dessa novela alegórica cearense foi publicada em 1988, pela editora Contexto, de São Paulo.

Enlouquecido pelos efeitos da matança colonial ocorrida por estas bandas, o personagem João Cardoso decide libertar os povos nativos do Ceará, derrubando o poder da província e o império português instalado no Brasil. Com um bode de apoio e combate, que carrega nas costas uma infantaria de morcegos engaiolados e presos a caçuás, ele parte para o enfrentamento irreversível de uma derrota histórica.

O remanescente dos Jenipapo carrega em sua caricatura um coração tapuio, a pulular por Baturité, Canindé e Barbalha até encontrar-se no desvario dos sem-memória que, indignados com o destino, passam a zanzar pela geografia, pelo linguajar e pela etno-história cearense. Neste sentido, o livro de Nilto Maciel renova uma tradição iniciada por José de Alencar (1829 - 1887), em sua característica da novela psicológica, indianista, regional e histórica.

Fico contente quando encontro a nossa literatura explorando com inteligência as identificações da cearensidade. "Os guerreiros do Monte-Mor" é alegoria quixotesca saída da gema de ovo de galinha pé duro. João e seus poucos companheiros de destemida louquidão oferecem ao leitor percursos políticos e estéticos comparáveis à exaltação utópica de Antonio Conselheiro (1893 - 1897) e de seus muitos seguidores na trágica experiência de Canudos.

Em suas desesperadas tentativas para reversão do domínio colonial, os personagens transitam pelas veredas do tempo e se relacionam com figuras da nossa historiografia, como o Naturalista Feijó (1760 - 1824) e Tristão Gonçalves (1789 - 1824). Os guerreiros de Nilto Maciel fazem o papel de si mesmos em uma narrativa que floresce na sequidão do passado esquecido de um Ceará enfatizado pela sátira romanesca da sua formação, enquanto entidade política, etnológica e literária.

As batalhas dos defensores da Revolução Nativista se dão contra o abandono, contra a falsa identificação e em favor de uma rejeição que quer participar. O autor parece fazer questão de firmar, afirmar e confirmar a marginalidade histórica e cultural do Ceará profundo. Sente-se em seu texto uma preocupação quase metodológica para que isso aconteça. Embora denso nessa suposta deliberação, o livro não perde a naturalidade, nem se inclina para simplificações ou linearidade imitativa.

O intransponível está sempre presente página por página porque a saga é inglória em sua gênese e impraticável como fator de conversão. Não há como escapar daquela sina, traçada em determinismos do passado dos exterminados, com todas as vertentes históricas e culturais e seus diversos enredos seculares. Os esforços dos guerreiros do Monte-Mor, no impetuoso enfrentamento das falsas consciências impostas pelas circunstâncias, recaem em justiça estética da maioria que se tornou minoria e que desapareceu na história oficial, ressurgindo na recriação literária como uma ideia de sociedade.

Da geografia humana cearense Nilto Maciel extrai especificidades em lembranças que até achamos que temos, mesmo que seja simplesmente convergência de ilusões. O livro se desenrola nesse vácuo, evidenciando passos e compassos perdidos de um Ceará que conhece pouco o Siará e por isso acha que do seu litoral para dentro tudo é desolação e do seu interior para fora sobeja insolação.

A novela, aparentemente sem eira nem beira de Nilto Maciel, presencia o que não existe e acaba pintando cenários de um tempo em perspectiva curva, como em um cinema 180 graus, fazendo circular inquietações esquecidas. A luta febril dos guerreiros ingênuos por uma liberdade qualquer, reescreve o que não foi sequer escrito e dá contornos abstratos ao que foi desfigurado por toda sorte de ignorância.

Em face da compreensão alterada e tosca da realidade, por parte de seu protagonista, o livro se desenrola onde tudo acontece e nada se passa; onde quase ninguém lembra e todos são profusamente convidados a ficar para trás. Essa diversão alienante é uma das curiosidades do livro "Os guerreiros do Monte-Mor". São trabalhos literários assim que contribuem para um lugar voltar a si mesmo, desatando aspectos inconscientes de uma guerra silenciosa contra algo que nem sabemos que somos.

Rubem Alves me contou por e-mail, no sábado passado que o escritor franco-marroquino Daniel Pennac diz que a literatura nos "aliena" para, em seguida, nos trazer de volta. Ao ler "Os guerreiros de Monte-Mor" fiquei com essa sensação. Óbvio que por conta disso não quero cobrar de uma ficção o preenchimento de lacunas historiográficas, mas bem que a leitura do livro de Nilto Maciel me levou a recordar de algumas expressões e cacoetes culturais da cearensidade que gostei de reencontrar: no lugar de "triste" ele coloca "capiongo"; onde seria "desajeitado", ele escreve "marmotoso"; e se alguém está montado a cavalo, ele diz que vai "escanchado".

A despeito de o livro ter um glossário, o ritmo de leitura pode ser lento para quem não conhece os códigos do palavreado e do jeito atoleimado de se expressar dos guerreiros e do autor. Sabe-se que as histórias que ouvimos quando criança praticamente determinam a imagem que fazemos de nós e do mundo. Isso, de certo modo, torna-se um desafio aos que chegam ao Monte-Mor sem saber muito bem como aproveitar o papel não historiográfico das metáforas.

Quem guarda consigo conteúdos da cearensidade pode beber sorvendo essa narrativa bem humorada, mas quem não estiver familiarizado com isso precisa estar com sede para ingeri-la. Ler trabalhos como o dos guerreiros de Nilto Maciel requer o esforço de quem cava cacimba em leito de rio seco, com a paciência de esperar a revência pingar a água infiltrada nas raízes, pela paisagem subterrânea dessa literatura com cheiro de Lunário Perpétuo. O bom é que nela, não há subentendidos, tudo pode ser desperdiçado, que a prosa não vai embora, fica com o leitor pela força monogênica do texto.

Os revolucionários João, José e Xocó estão mais vivos do que nunca. Na tentativa de fazer uma primavera tapuia, eles podem ser associados às transformações que estão sendo processadas na atualidade pelo conflito entre as crenças no darwinianismo cultural e o realce das diferenças. Na condição de agitadores marginais, poderão até sair vitoriosos fora do livro, se a inclinação dos desfechos das lutas cidadãs tenderem para a perda da hegemonia das narrativas colocadas a serviço da replicação das estruturas sociais, ideologias e doutrinações dominantes.

A literatura tem a liberdade de dizer que nem tudo o que está posto sempre foi ou será desse ou daquele jeito. Em "Os guerreiros de Monte-Mor", Nilto Maciel captura do passado um espírito impetuoso plural e aberto ao discurso crítico, reflexivo, cômico e divertido. É uma guerra que se dá no âmbito da inquietação delirante, mas seus guerreiros, mesmo não conseguindo o que talvez quisessem, conquistaram o direito de procurar por um poder, qualquer que seja, desde que melhor do que o desencanto e o abandono.

Fonte:
caderno3@diariodonordeste.com.br Diário do Nordeste, Fortaleza, 1º/dez/2011. Disponível em http://literaturasemfronteiras.blogspot.com/2011/12/os-guerreiros-de-nilto-maciel-flavio.html

Nilto Maciel (Os Guerreiros de Monte-Mor: Construtor de Igrejas)

João levava muito a sério a questão da raça, apesar de em suas veias correr sangue português. Sua mãe havia nascido de uma relação entre o sesmeiro Domingos Carneiro e uma índia jenipapo. Compreendia, no entanto, a impossibilidade de uma nova guerra, como desde menino ouvia seu pai pregar, e cedo se apaixonou pelos ideais dos inconfidentes mineiros, sentimento que lhe valeu bordoadas da guarda imperial.

Mal curou‑se dos ferimentos, desceu a serra e, sem dar um pio, foi direto à matriz, onde orou, ajoelhado diante da imagem de Nossa Senhora da Palma, durante um dia inteiro. Ao retirar‑se, o povo, doido para ver de perto o filho de Antônio Cardoso, enchia a praça, tal como no dia da inauguração da vila.

Antes mesmo da viração da tarde, já uma pequena multidão se postava à frente da igreja, curiosa, bisbilhoteira, zombadora.

– É o inconfidente.

Pelo pender do sol, havia subido a serra o primeiro pregoeiro a anunciar novidades em Monte‑Mor: João da Silva Cardoso, o contador de lorotas, preparava‑se para subir aos céus. Com pouco, a praça virava feira: o cruzeiro enchia‑se de pencas de banana; no obelisco, penduradas em paus, cacarejavam dezenas de galinhas.

Finda a prolongada reza, João escapuliu pela sacristia e, tomando o rumo do mato, apressado e tonto, deixou a multidão apalermada.

– Ele voou para o céu.

Os mais incrédulos acreditavam ter ele se escondido dentro do sacrário. Mas, antes de o sol se pôr, dava João boas‑noites ao pai de Maria do Amparo. Mal recebido de início, pouco a pouco aman­sou o velho. Ia se dedicar a trabalho rendoso – o de construtor. Quis blasonar, mordeu a língua, cutucado pela voz do pai dentro das oiças.

Conversa vai, conversa vem, entraram no assunto principal – a mão da donzela. O dono da casa fez promessas, João dizia sim senhor. Não tocaram no caso da surra, nem em negócios de metal. Só no finzinho do entendimento, o rapaz fez resumo de um romance que falava da conversão de um príncipe à Santa Madre Igreja. E se despediram como velhos compadres.

Daí em diante, João virou frequentador de igrejas e da casa do futuro sogro. Não dizia para ninguém, mas conduzia sempre um terço pendurado ao pescoço e, quando não conversava lorotas, rezava feito um penitente. Jurava a si mesmo que ia ser santo e ter altar só seu na matriz.

Virou e mexeu, noivou. Deixou os romances de lado e vivia ora na casa do sogro, ora aos pés dos santos.

Na primeira conversa mantida com o padre, falou da necessidade de mais igrejas e capelas na vila. O apóstolo concordou com suas opiniões e aproveitou‑se delas para relatar o estado de pobreza da freguesia. A matriz precisava de reformas, vinho e hóstia. Aparecessem pedreiros e pintores, bem que Deus agradecia.

Ao beijar a mão do padre, João reafirmou sua fé e boa vontade. Podia o outro arranjar os trabalhadores e o material, e deixasse o resto com ele.

– Vou mostrar como se remodela uma igreja pai‑d’égua como essa.

O reverendo levou o crucifixo aos lábios e olhou para o céu, sem palavras.

Fonte:
Nilto Maciel. Os Guerreiros de Monte-Mor. 2.ed. Fortaleza: Armazém da Cultura, 2011.

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas de Ano Novo n. 435)

 Uma Trova Nacional

Que 2012 seja
tempo de amor e harmonia...
e que você, onde esteja,
viva com Deus, todo dia!
VANDA FAGUNDES QUEIROZ/PR

 Uma Trova Potiguar

Na minha “sonhocultura”,
vou cultivar para o povo,
leirões de literatura
para enfeitar o Ano Novo.
FRANCISCO MACEDO/RN

 Uma Trova Premiada

2000 - Petrópolis/RJ
Tema: Ano 2000 - 13º Lugar

Que os anos 2000 nos falem
de novos feitos de luz,
mas que seus ecos não calem
a voz que bradou na cruz!
DOROTHY JANSSON MORETTI/SP

 Uma Trova de Ademar

Eu desejo aos Trovadores,
Convicto e cheio de pose:
Muita Paz...Muitos amores
e um feliz “2012” !!!
ADEMAR MACEDO/RN

 ...E Suas Trovas Ficaram

Deus com seu saber profundo,
para nos trazer a paz,
mandou o seu filho ao mundo
há dois mil anos atrás
MIGUEL RUSSOWSKY/SC

 Simplesmente Poesia

Um Mundo Menos Aflito
 HÉLIO ALEXANDRE/RN

Que o novo ano sorria,
que o amor não se desgaste,
toda tristeza se afaste
e se aproxime alegria;
espero que a fantasia
se torne realidade
para que a fraternidade
substitua o conflito,
e um mundo menos aflito
encontre a felicidade.

 Estrofe do Dia

Ano novo, vida nova,
assim diz velho refrão,
mas a vida ensina e prova
que em qualquer situação,
só o amor constrói o bem,
tornando feliz quem tem
afeto no coração.
VITOR RONALDO COSTA/DF

  Soneto do Dia

Dois Mil e Doze
RAYMUNDO DE SALLES BRASIL/BA

Dois mil e doze vai se aproximando,
receoso, talvez, do que lhe espera,
dar fim a tanta droga! Ah, quem lhe dera!
E prender de uma vez quem está roubando.

Tarefa ingente sob o seu comando,
tempo tão curto para tanta espera,
enorme corrupção que prepondera,
e essa pobreza ínfima grassando.

Reveste-te, ANO NOVO, de poder!
De onde quer que tu venhas, venhas rei,
trazendo um velho lema contundente

que clama: ser, é bem melhor que ter,
e todos são iguais perante a lei,
e merecem viver honradamente!

Fonte:
Textos enviados pelo autor

Monteiro Lobato (Reinações de Narizinho) Cara De Coruja –VII - A coroinha

Depois que Narizinho e as princesas se enjoaram de ver aquela maravilha, resolveram dançar. A boneca imediatamente saiu para arranjar pares. Foi ao terreiro e trouxe de lá o príncipe Ahmed, o príncipe Codadad e outros. Narizinho agarrou Codadad antes que alguma princesa o fizesse, e saiu dançando com ele como se fosse uma princesa oriental. Branca de Neve dançou com o príncipe Ahmed. Rosa Vermelha foi tirada por Ali Babá, e Rosa Branca, pelo Gato de Botas. Só Cinderela não dançou para não estragar os seus sapatinhos de camurça. Nisto o Visconde, que ainda estava à janela, gritou:

— Estou vendo uma poeirinha lá longe... Todos pararam de dançar, murmurando: “Quem poderá ser?” Logo depois duma batidinha na porta, Rabicó introduziu a menina da Capinha Vermelha.

— Capinha! — exclamaram todas alegríssimas, porque todas queriam muito bem a essa gentil criança. Viva Capinha!...

A menina entrou, muito corada por ter vindo a pé, e disse:

— Boa tarde para todos os presentes, ausentes e parentes !

Em seguida deu um beijo em Narizinho e outro na boneca.

— Antes de mais nada — foi dizendo Emília — quero saber o seu verdadeiro nome, porque uns dizem Capinha Vermelha e outros, Capuzinho Vermelho. Qual é o certo?

— Meu verdadeiro nome é Capinha Vermelha, porque depois que vovó me fez esta capinha todos que me viam ir para a casa dela diziam: “Lá vai indo a menina da capinha vermelha!” Mas, como vocês podem ver, esta capinha tem um capuz, que eu às vezes uso. De modo que tanto podem chamar-me Capinha, como Capuzinho, ou mesmo Chapeuzinho Vermelho.

— Coitada de sua avó! — exclamou Emília. — Você não imagina como ficamos tristes com o que lhe aconteceu! Diga-me: sua avó era muito magra?

Capinha estranhou a pergunta — mas respondeu que sim.

— Muito magra ou meio magra?

— Bem magra.

— Então não entendo aquele lobo — disse Emília – porque uma velha muito magra não é alimento. Só osso...

Todos riram-se da boneca, e Narizinho explicou que Emília, coitada, era asnática de nascença. Nisto o relógio bateu cinco horas.

— As senhoras princesas e os senhores príncipes – disse Narizinho — estão convidados para um café. E voltando-se para a cozinha:

— Tia Nastácia! Traga um café bem gostoso para estes ilustres amigos.

Quando tia Nastácia entrou na sala com a bandeja de café, seus olhos se arregalaram de espanto.

— Credo! — exclamou. — Não sei onde Narizinho descobre tanta gente importante e tanta princesa tão linda! A sala está que até parece um céu aberto...

— Quem é ela? — perguntou Branca de Neve ao ouvido da boneca enquanto a negra servia o café.

— Pois não sabe? — respondeu Emília com carinha malandra.

— Nastácia é uma princesa núbia que certa fada virou em cozinheira. Quando aparecer um certo anel, que está na barriga dum certo peixe, virara princesa outra vez. Quem vai danar com isso é dona Benta, que nunca achará melhor cozinheira.

Quando tia Nastácia veio servir Narizinho, a menina notou qualquer coisa enganchada em sua saia.

— Que é isso, Nastácia? Tem jeito de uma coroinha.

A negra abaixou-se.

— Credo! — exclamou. — Até parece feitiço. Uma coroinha de rei, sim... É que fui ao quintal buscar um pau de lenha e quase nem pude andar de tanto rei e fada e princesa que vi por lá. Com certeza esbarrei nalgum reizinho e a coroa enganchou na minha saia. Mas não foi por querer, não. Credo!...

— Estou conhecendo essa coroa! — exclamou Rosa Vermelha.

— É do meu sogro, o poderoso rei que mora atrás do meu castelo. Com certeza viu passar o bando da Xerazade e correu atrás e na carreira deixou cair a coroa.

E guardou-a no bolso para restituí-la ao seu dono. Todos tomaram café, menos Cinderela.

— Só tomo leite — explicou a linda princesa. — Tenho medo de que o café me deixe morena.

— Faz muito bem — disse Emília. — Foi de tanto tomar café que tia Nastácia ficou preta assim...
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Continua... Cara de Coruja– VIII – A Varinha de condão

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa