quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Ialmar Pio Schneider (Soneto ao Dia do Gaúcho – 20 de Setembro)

Tela de Gláucia Scherer
Nobre Desfile Farroupilha
vejo pela televisão,
porque o gaúcho segue a trilha
de cultuar a Tradição !

Eu vou recordando a tropilha
das lendas do nosso rincão,
em que mais cintilante brilha
a estrela da libertação.

Este evento não é bairrismo,
mas, sim, um culto à liberdade,
forte raiz de telurismo...

A conotação da equidade
no movimento de atavismo,
deve culminar na amizade !
Fonte:
O Autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 674)


Uma Trova de Ademar  

A vida escreve-me enredos
com finais que eu abomino.
Meus sonhos viram brinquedos
nas mãos cruéis do destino...

–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional


Ao tentar pegar a rosa
qual não foi meu dissabor,
o espinho me disse, em prosa:
esta tem dono, senhor!

–Nemésio Prata/CE–

Uma Trova Potiguar


Quem a mulher discrimina,
não sabe a falta que faz
a beleza feminina
na concepção da paz.

–Expedito Jorge/RN–

Uma Trova Premiada

1991 - Ribeirão Preto/SP
Tema - CULPA - 6º Lugar.


Quem tem coração de paz
vive de culpa liberto,
porque faz do bem que faz
um céu de sol mais aberto!

–Nilton Manoel/SP–

...E Suas Trovas Ficaram


É um alpinista de fama,
mas dele a vida debocha:
por ironia se chama
Caio Rolando da Rocha.

–Waldir Neves/RJ–

U m a P o e s i a


Viajando nas asas da lembrança
igualmente uma ave migratória
nos longínquos arquivos da memória
recordei-me de quando era criança,
dos amigos da minha vizinhança,
do começo da minha puberdade,
os hormônios em alta quantidade
e o meu corpo um pouquinho transformado;
invadi o espaço do passado
viajando nas asas da saudade.

–Júnior Adelino/PB–

Soneto do Dia

RISONHO NASCIMENTO.
–Horácio Ferreira Portella/RJ–


Dourado, o sol desponta no horizonte
a dissipar das brumas a cortina.
Ouve-se o manso murmurar da fonte
que desce pela encosta da colina

disseminando o seu poder planctonte,
na verdejante mata e na campina,
para ensejar que a vida, assim, desponte
em plenitude mágica, divina.

As borboletas colorindo a festa...
As flores espargindo seu perfume...
Os pássaros, em mística seresta.

Após o parto que a natura espera
por nove meses para dar a lume
a deslumbrante filha: Primavera!

Zélia Chamusca (Poemas)

A CAMINHO DA LUZ ENCONTREI O SONHO

Parti da escuridão
A caminho da luz
E o sonho encontrei
Em tudo o que pensei
E me encantei…

A caminho da luz
Encontrei a magia
Em tudo o que me envolvia:
A paz e o amor,
A luz e a cor,
A alegria
Na plenitude da fantasia…

Sonhei…
Com o calor da amizade
Outrora realidade,
E, hoje, apenas, saudade…

Do caminho da escuridão
Para o caminho da luz
Eu encontrei
O sonho que sonhei…

VIVER

É a contínua caminhada
Por nós projetada
Seguindo sempre
Em frente,
Levados por paixões,
Ou perante fracassos
E desilusões.
É o projectar
Permanente
Em concretizar
Nossas aspirações.

Viver
É decidir
O que podemos ser
E ter
E, para isso agir,
E, até mesmo,
Decidir não decidir.

Viver
É agir
Em circunstância
E decidir
Perante essa mesma circunstância.

Viver
É ser livre
E ser
Condenado
À liberdade,
E obrigado
A agir
E ter
Que decidir
Face à liberdade.

Viver
É o que fazemos
E o que acontece
E disso termos
Consciência,
É viver-se
E sentir-se viver
No encontro com o mundo
E no mundo.

Viver
É conviver,
É viver
Em termos de relação,
Sabendo o que está a acontecer.
É ver e participar
Nos acontecimentos,
É projetos concretizar,
É amar,
É querer,
É sofrer,
É odiar,
É desejar,
É temer.


É isto viver.
Se não houver consciência
Desta existência
Não haverá vida.

Viver
É o que ninguém
Pode fazer por mim
E por si.
É um ato intransmissível,
Só por cada um possível
A vida viver.

Viver
É o dado fundamental,
Realidade primordial,
Indubitável no Universo.

INGRATIDÃO

O mais nobre sentimento
Que de mim brotou,
Se esvaiu como nuvem
Pelo vento
Esfumado,
Saindo num lamento
Das cinzas dum tormento.

Passou…
E se desfez
Nos ares do esquecimento...
Ninguém notou
No encanto
Que a vida
Tanto, tanto…
Lhes doou…

Ninguém o viu…
E se esvaiu
Na cegueira da ingratidão
Que magoou meu coração!…

O SONHO

O sonho se esvai
Na chuva que cai
E corre para o rio
Deixando o vazio…

E, ele se recria,
É pura magia,
É um renovar,
Perene sonhar…

Eu vejo, além,
Outro que ali vem,
Cor do firmamento,
É encantamento!…

ADORO-TE

Estás sempre comigo
Nos momentos de solidão
Quando todos tão distantes,
De mim, estão…

Quando meu coração aperta
E as lágrimas correm sem fim,
Te aproximas de mim
E vens meu rosto limpar,
Me acariciar…

Quando pratico o bem
E responde a ingratidão
De alguém,
Tu vens consolar meu coração…

Sempre que preciso de ajuda
És o Amigo presente.
Sempre…

Em qualquer momento,
Em qualquer lado,
És meu Ser Adorado…

Sem Ti não viveria.
És minha força de viver
De crescer e de ser.

Estás sempre comigo,
E, comigo estarás, até ao fim…
Adoro-Te…
Fontes:
E-mail enviado pelo Portal Academia Virtual Sala dos Poetas e Escritores
http://www.avspe.org/index.php?pg=pfautor&idu=112

Lenda Portuguesa (A Lenda do Santo Servo)

Na Câmara de Lobos, na ilha da Madeira, existe um antigo convento de franciscanos, o primeiro a ser construído fora do Funchal, conhecido como Convento de S. Bernardino.

Conta uma lenda que, em 1485, entrou nesse convento um monge humílimo que tomou por nome frei Pedro da Guarda. Foi-lhe distribuído como encargo o serviço da cozinha conventual, ofício que frequentemente se esquecia por anseio místico de oração no coro da igreja, onde ficava horas sem fim mergulhado em profundíssima meditação.

Acontecia, porém, que, apesar do esquecimento constante dos seus deveres comunitários, nunca faltava uma refeição nas escudelas dos monges às horas devidas, de tal modo que se gerou entre os franciscanos a ideia de que eram os anjos do Céu quem vinha cozinhar as refeições para que frei Pedro pudesse entregar-se à oração. E durante muitos anos se prolongou este maravilhoso viver do frade, ao qual começaram a chamar Santo Servo de Deus.

A sua figura tornou-se lendária aos olhos dos contemporâneos e conforme o tempo ia passando ia aumentando a sua aura de mistério. Assim, em breve o povo assegurava que o popular frei Pedro era profeta e por isso tinha conhecimento das mortes dos conterrâneos que morriam longe de Câmara de Lobos, ao que constava por conversar com as almas dos mortos que vinham pedir-lhe remédio para o que haviam deixado por fazer na sua terra.

Um outro dom maravilhoso deste homem era o de domar e reter consigo não só aves como animais bravios.

Quando, vinte anos depois de ter recolhido ao convento de S. Bernardino, o Santo Servo morreu, eram-lhe atribuídos, já então, muitos milagres. Diz-se que na hora da sua morte os sinos do mosteiro repicaram sem que mãos humanas lhes tocassem.

Frei Pedro, entretanto, havia previsto o dia e hora da sua morte. O seu cadáver, ao contrário do que seria natural, não exalou qualquer cheiro putrefacto e assim, muitos anos passados, mercê de umas luminárias estranhas que apareciam sobre o seu túmulo, abriram-no e encontraram corpo e hábito incorruptos, tal como, há perto de meio século, fora enterrado.

Durante os cerca de noventa e dois anos em que o corpo do Santo Servo esteve sepultado em S. Bernardino, nunca lhe faltaram fiéis, e diz-se que nesse prazo lhe atribuiu o povo para cima de seiscentos milagres.
Fonte:
Lendas Portuguesas da Terra e do Mar, Fernanda Frazão, disponível em Estúdio Raposa 

História da Literatura (Classicismo) Parte V

Epigrama: 
composição de 2 ou 3 versos com pensamentos engenhosos e de estilo cintilante;

Sextilha:
composição de seis estrofes de seis versos com uma forma muito engenhosa, em que as palavras finais dos versos de todas as outras, apenas com a ordem trocada;

EXEMPLO DE SEXTILHA
Sextina

Foge-me pouco a pouco, a curta vida,
E por caso é verdade que inda vivo;
Vai-se-me o breve tempo de ante os olhos;
Choro pelo passado; e, enquanto falo,
Se me passam os dias passo a passo,
Vai-se-me, enfim, a idade e fica a pena.
Que maneira tão áspera de pena!
Que nunca ua hora viu tão longa vida
Em que possa do mal mover-se um passo.
Que mais me monta ser morto que vivo?
Pera que choro, enfim? pera que falo,
Se lograr-me não pude de meus olhos?
Ó fermosos, gentis e claros olhos,
Cuja ausência me move a tanta pena,
Quanta se não compreende enquanto falo!
Se, no fim de tão longa e curta vida,
De vós me inda inflamasse o raio vivo,
Por bem teria tudo quanto passo.
Mas bem sei que primeiro o extremo passo
Me há-de vir a cerrar os tristes olhos,
Que Amor me mostre aqueles por que vivo.
Testemunhas serão a tinta e pena,
Que escreverão de tão molesta vida
O menos que passei, e o mais que falo.
Oh! que não sei que escrevo, nem que falo!
Que se de um pensamento noutro passo,
Vejo tão triste género de vida
Que, se lhe não valerem tanto os olhos,
Não posso imaginar qual seja a pena
Que traslade esta pena com que vivo.
Na alma tenho confino um fogo vivo,
Que, se não respirasse no que falo,
Estaria já feita cinza a pena;
Mas, sobre a maior dor que sofro e passo
Me temperam as lágrimas dos olhos,
Com que, fugindo, não se acaba a vida.
Morrendo estou na vida, e em morte vivo;
Vejo sem olhos e sem língua falo;
E juntamente passo glória e pena.
(Luís Vaz de Camões)


Ditirambo:
canto coral constituído por um poema lírico de versos e estrofes irregulares, que exprimem entusiasmo, sensualidade e paixão. Composto inicialmente para os cultos em honra ao deus Dionísio, está na origem da tragédia grega

Continua… Generos Literários

Fontes:
Garganta da Serpente
Imagem = compartilhada no facebook pela Libreria Fogola Pisa

21 de Setembro (Um Poema em Cada Árvore)

No Dia da Árvore, projeto de incentivo à leitura realiza mobilização nacional

Amanhã, dia 21 de setembro de 2012, será realizada em 83 cidades de todo o Brasil a mobilização nacional do projeto Um poema em cada árvore, uma iniciativa de incentivo à leitura que utiliza as árvores como suporte de leitura.

Neste dia, em que se comemora o Dia da Árvore, uma rede poetas, educadores, agentes culturais e sociais estarão mobilizados para levar a poesia aos locais onde o povo está.

Sobre o projeto

O Um poema em cada árvore é uma iniciativa de incentivo à leitura realizada desde agosto de 2010 na cidade de Governador Valadares, Minas Gerais.

Idealizada pelo poeta Marcelo Rocha e realizada pelo Instituto Psia, a iniciativa caracteriza-se por utilizar as árvores como suporte para a leitura, pendurando mensalmente poemas de poetas desconhecidos do grande público nos oitis valadarenses.

Esta foi uma forma encontrada para construir novos espaços de fruição poética, ampliar o acesso da população à poesia e colocar o trabalho de poetas anônimos em contato com novos públicos.

O Um poema em cada árvore foi uma das iniciativas premiadas com o Prêmio Vivaleitura 2011, concedido pela OEI - Organização dos Estados Ibero-Americanos, Ministério da Cultura, Ministério da Educação e Fundação Santillana.

Mobilização nacional

A repercussão nacional do projeto somada à sua característica pioneira e de fácil replicação permitiu que diversos poetas, educadores, agentes culturais e sociais brasileiros manifestassem interesse em realizar o Um poema em cada árvore em suas cidades.

Ao encontro dessas maravilhosas manifestações será realizado no Dia da Árvore (21 de setembro) o Um poema em cada árvore (Mobilização Nacional) em 83 (oitenta e três) cidades de 24 Unidades Federativas brasileiras, constituindo assim uma rede de poetas, educadores,agentes culturais e sociais mobilizados em fomentar ainda mais as intenções do projeto no que refere à conquista de novos espaços de fruição poética, ampliação do acesso da população à poesia, divulgação do trabalho de poetas desconhecidos do grande público e elevação do índices de leitura em nosso país.

Lista das cidades participantes
01. ALEXANDRIA - RN
02. ALMENARA - MG
03. ALTA FLORESTA - MT
04. ANÁPOLIS - GO
05. BACABAL - MA
06. BAGÉ - RS
07. BELO HORIZONTE - MG
08. BOQUEIRÃO - PB
09. BRASÍLIA - DF
10. CAMPINA GRANDE - PB
11. CAMPO GRANDE - MS
12. CAMPO NOVO DO PARECIS - MT
13. CARMOPOLIS DE MINAS - MG
14. CERQUILHO - MG
15. CHAPADA GAÚCHA - MG
16. CONSELHEIRO LAFAIETE - MG
17. CONTAGEM - MG
18. CURITIBA - PR
19. DELTA - MG
20. DOURADOS - MS
21. ENTRE RIOS DE MINAS - MG
22. ESPLANADA - BA
23. FORTALEZA - CE
24. FREDERICO WESTPHALEN - RS
25. GARÇA - SP
26. GOVERNADOR VALADARES - MG
27. GUARANÉSIA - MG
28. IBATEGUARA - AL
29. ILHÉUS - BA
30. ITABUNA - BA
31. JANUÁRIA - MG
32. JARAGUARI - MS
33. JUAZEIRO DO NORTE - PB
34. JUÍNA - MT
35. LAGAMAR - MG
36. LAPÃO - BA
37. LARANJAL - MG
38. LIVRAMENTO DE NOSSA SENHORA - BA
39. MACAPÁ - AP
40. MAJOR SALES - RN
41. MANAUS - AM
42. MARABÁ - PA
43. MARAVILHA - SC
44. MARIANA - MG
45. MARINGÁ - PR
46. MATA GRANDE - AL
47. NITERÓI - RJ
48. OSASCO - SP
49. OURO BRANCO (ITATIAIA - ZONA RURAL) - MG
50. PETRÓPOLIS - RJ
51. PIAÇABUÇU - AL
52. PIRAJU - SP
53. POÁ - SP
54. PONTE NOVA - MG
55. PORTO ALEGRE - RS
56. PORTO VELHO - RO
57. PRATA DO PIAUI - PI
58. QUELUZ - SP
59. RECIFE - PE
60. RIO DE JANEIRO - RJ
61. RIO DOCE - MG
62. RIO GRANDE - RS
63. RIO VERDE DE MATO GROSSO - MS
64. SALVADOR - BA
65. SANTA CRUZ DE GOIÁS - GO
66. SANTA CRUZ DO SUL - RS
67. SANTA MARIA - RS
68. SANTANA - AP
69. SANTIAGO (TERRA DOS POETAS) - RS
70. SÃO FRANCISCO DO CONDE - BA
71. SÃO GONÇALO DO SAPUCAI - MG
72. SÃO JULIÃO - PI
73. SÃO MATEUS - ES
74. SERRA - ES
75. TEIXEIRA DE FREITAS - BA
76. UBAÍRA - BA
77. UBERABA - MG
78. UNAI - MG
79. UNIÃO DOS PALMARES - AL
80. VINHEDO - RS
81. VITÓRIA - ES
82. VITÓRIA DA CONQUISTA - BA
83. XAPURI - AC

Mais informações:
http://www.institutopsia.org/p/mobilizacao-nacional.html


Fonte:
Http://concursos-literarios.blogspot.com

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Antonio Roberto De Paula (Meu Lugar)

Tela  de Edgar Werner Osterroht
(retrata o Maringá Velho em 1952) 
Foi um tempo bom. Em que não havia tantas casas, não havia tanta gente. Você identificava um a um. Nas noites quentes, as pessoas colocavam cadeiras em frente à rua e ficavam até altas horas da noite quente conversando com os vizinhos.

O tempo não corria. Correr pra quê? Ia gostosamente devagar. A gente saboreava cada estação, cada jardim que renascia, cada chuva… A vida havia privilegiado todos nós. Pode parecer exagero, mas hoje é possível dizer que fizemos parte de um paraíso sem termos tido a noção disso.

O tempo foi passando. A máquina do tempo foi acelerando cada vez mais. Bruscas mudanças foram ocorrendo. Nosso lugar, uma perfeita obra de arte, foi sendo alterado até perder quase que completamente a identidade. De original ficamos nós, acuados.

Hoje, as casas estão coladas umas nas outras. Os carros aceleram no asfalto. Pessoas vêm e vão e eu não as conheço. E vez de cercas de balaústres, muros altos e grades. Na noite, estamos todos entricheirados.

O tempo corre. Já não consigo acompanhá-lo com a mesma eficiência. Vasculho recordações para tornar mais leves os dias. Deito na cama e sonho. Dou risadas com os amigos olhando para a rua vazia e o céu límpido. Uma buzina me acorda. O barulho me avisa que o paraíso ficou só na memória.
Fonte:
Da minha janela – 2003

Gente de Minha Terra: Antonio Roberto de Paula (1957)

O jornalista Antonio Roberto de Paula, sócio-proprietário da TV Clipping Maringá, nasceu na cidade paulista de Lupércio, em 17 de junho de 1957. É o primogênito dos quatro filhos de Alcebíades de Paula Neto e Rita Andrade de Paula. A mudança para Maringá ocorreu em 1959. De Paula concluiu o curso primário em 1967, em Engenheiro Beltrão (PR), onde a família residiu até meados de 1972.

Em 1968 estudou no Seminário Verbo Divino, em Ponta Grossa. De 1969 a 1976, fez o ginásio e o científico, como eram chamados na época os ensinos fundamental e médio, nos seguintes estabelecimentos de ensino de Maringá: Santo Inácio, Instituto de Educação, Gastão Vidigal e Paraná.

Foi aprovado no vestibular do curso de Letras na UEM (Universidade Estadual de Maringá) em 1981, mas desistiu do curso. Em 2001, formou-se em Jornalismo pelo Cesumar (Centro Universitário de Maringá). Em 2003, fez o curso de pós-graduação Língua Portuguesa – Teoria e Prática, pelo Instituto Paranaense de Ensino e Univale (União das Escolas Superiores do Vale do Ivaí). Atualmente, cursa Mestrado em Letras na UEM.

Sua monografia de conclusão do curso de graduação foi a apresentação do livro Os homens da Folha do Norte do Paraná , jornal maringaense fundado em 1962, pelo primeiro arcebispo de Maringá, dom Jaime Luiz Coelho, e que teve suas atividades encerradas em 1979.

Antes de atuar profissionalmente na imprensa, De Paula foi escriturário na Transparaná (1977), funcionário público municipal ( 1977 a 1979), tendo trabalhado na extinta Codemar (Companhia de Desenvolvimento de Maringá) e Secretaria de Fazenda; bancário ( 1979 a 1985), no Centro Regional do Bradesco-Maringá; e foi proprietário do Bar do Toninho ( 1985 a 1990), na avenida Dr. Alexandre Rasgulaeff, no Jardim Alvorada, em Maringá.

Desde a adolescência escreve poesias, contos, crônicas e artigos, inclusive com publicações desde a década de 1970, nos jornais O Diário do Norte do Paraná , O Jornal de Maringá e Jornal do Povo . Sua primeira experiência efetiva no jornalismo ocorreu em 1975, no Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, com o jornal Skeletus , do CETA (Centro Estudantil Tristão de Athaíde).

Publicado até 1977, o Skeletus tinha como editores, além de De Paula, seus amigos Mário Sérgio Recco, José Miguel Grillo, Nivaldo Gôngora Verri, Edson Cemensati e Edson Luiz Matias. Em 1981, foi colaborador do Vôo Livre , suplemento de O Diário publicado às sextas-feiras, editado por Mário Sérgio Recco.

Seu primeiro emprego efetivo na imprensa foi no Jornal do Povo, em 1991, como colunista de futebol amador, passando depois para a editoria de esportes e escrevendo a coluna Visão de jogo. Neste mesmo ano atuou como comentarista da extinta Rádio Metropolitana (Rádio Jornal).

Em 1992 e 1993 trabalhou como comentarista em transmissões de futebol amador pela RTV Maringá. Em 1993, deixou o Jornal do Povo e se transferiu para a sucursal do Correio de Notícias, jornal curitibano que encerrou as atividades na cidade no ano seguinte. Lá, foi colunista e editor de esportes.

Ainda em 1993, deixou a RTV indo para a TV Maringá (Band) para ser editor, pauteiro e produtor do programa diário Esporte por Esporte , onde permaneceu até 1995.

Neste período, De Paula também foi produtor e comentarista do programa Atalaia Esportiva, da Rádio Atalaia de Maringá. De 1995 a 1997, trabalhou no O Diário exercendo as funções de editor de esportes, colunista do DNP Esporte, repórter de matérias políticas e locais, pauteiro e secretário de redação.

De 1997 a 1998 foi repórter da Revista M-9. De 1997 a 1999 escreveu crônicas, artigos, poesias e contos na coluna Linha Expressa, no Jornal do Povo. Em 1998 e 1999 atuou como editor-chefe do departamento de jornalismo da TV Cidade – Sistema NET. Em 2000, foi repórter, pauteiro e colunista do jornal Hoje Maringá.

De Paula e o jornalista Cláudio Viola são parceiros em composições em que incluem os hinos do Maringá Futebol Clube (1996), do Grêmio Maringá (2000) e as músicas Maringá Velho, gravada em 2003 pela cantora maringaense Márcia Mara, e Cabrito na horta , classificada no Femucic (Festival de Música Cidade Canção), gravada por Helington Lopes (que também foi um dos compositores) e o grupo Receita do Samba.

Em 2002, abriu com a jornalista Simone Labegalini a TV Clipping Maringá. No início de 2003, De Paula trabalhou como produtor, repórter e comentarista do programa Estação Comunitária , da Rádio Comunitária São Francisco FM, do Jardim Alvorada, retornando no ano seguinte. Foi responsável juntamente com seu filho Guilherme Tadeu de Paula da sucursal em Maringá do jornal londrinense Paraná Shimbun, em 2003 e 2004, e um dos produtores do programa Beca TV , da TV Clipping Maringá, com Guilherme Tadeu e Allan Oliveira, em 2004. Em 2003, publicou o livro Da minha janela, de crônicas, artigos, poemas, contos inéditos e já publicados.

Em 2004 lançou o livro A história política de um cabo de José, de Maria e de todos os Santos , em que narra a história do vereador maringaense Cabo Zé Maria e seus dez anos de mandato. Em 2005, dirigiu o videodocumetário Crônica democrática de uma cidade brasileira , sobre as Eleições 2004, numa produção da TV Clipping Maringá, com roteiro de Guilherme Tadeu de Paula e fotografia e montagem de Allan Oliveira.

Foi nomeado assessor de imprensa da Câmara Municipal de Maringá em 1997, vindo a ocupar a chefia do setor no final de 1999, onde permanece até hoje.

Fonte:
TV Clipping Maringá . http://www.tvcm.com.br/

Olympio Coutinho (Histórias de trova) Capítulo II, continuação – Meus Irmãos, os Trovadores

Na busca para corresponder-me com os trovadores, descobri endereços de Luiz Otávio, JG, Aparício Fernandes, Eno Theodoro Wanke,
Invejo a felicidade
de quem saudoso se diz:
- Quem hoje sente saudade
já foi, Um dia, feliz!


Walter Waeny,
Não te prendas mais à dor,
nem lembres quem te esqueceu,
pois quem quer morrer de amor
vive do amor que morreu.


Álvaro Faria,
Mais pobre do que não ter
nem mesmo pão em seu lar,
é ter muito a receber
e nada ter para dar


e muitos outros. Enviava trovas, pedia opinião e recebia respostas que deixavam o então jovem trovador cada vez mais entusiasmado.

O JG enviou sua resposta através de um artigo publicado na seção “No Mundo da Poesia”, página literária de “O Jornal Feminino”, suplemento de “O Jornal”, do Rio de Janeiro, com o título “Um Trovador Mineiro”, que começava assim:
“Minas é a grande ilha do arquipélago da poesia brasileira. Terra de poetas e trovadores. Desde a primeira Escola de Poesia, com Gonzaga, Alvarenga, Cláudio Manoel da Costa, até os modernistas autênticos, como esse grande Drummond, alto e de ferro, mas musicado de águas como uma montanha de Itabira. Começo com estes palavras para falar de um trovador que desponta: Olympio da Cruz Simões Coutinho, de Ubá... Quanto às trovas que me mandou, posso lhe dizer que são boas, que deve continuar a escrever, pois possui as qualidades inatas de um trovador...” E, citando uma de minhas trovas enviadas
Eu sempre que fui roubar
as galinhas dos vizinhos
fico com pena dos órfãos:
trago também os pintinhos,


terminava assim: “Continue, meu caro Olympio, como trovador.... Mas, cuidado com a Polícia”.

Esta trova rodou muito por aí e, ao longo do tempo, cheguei a vê-la como anônima em almanaques e, mais tarde, fiquei sabendo que um magnífico trovador, José Ouverney, de Pindamonhangaba, criador do site www.falandodetrova.com.br, quando mais moço, anotava trovas em um caderno e, entre elas, havia anotado a tal “trova dos pintinhos” sem saber de quem era. Ficou sabendo somente em 2008, quando passei a ter contato virtual com ele através do seu site e quando, aliás, voltei a participar dos concursos e dos jogos, depois de mais quase 50 anos longe do movimento. Recentemente, quis incluí-la em uma antologia editada pela UBT BH, mas foi brecada... Daí, dei-lhe o formato atualmente exigido, mas não gostei:
Eu sempre que vou roubar
as galinhas dos vizinhos,
para órfãos não deixar,
trago, também, os pintinhos.


O A.A. de Assis a conhecia e sabia de quem era, pois fomos meio contemporâneos ali por volta de 1960/61/62.

Em 1961, ganhei um prêmio em um concurso de trovas promovido pelo Rotary Clube de Vila Isabel, no Rio, cujo tema era “rosa”. A trova vencedora foi:
“Enganou-se o passarinho,
voando de flor em flor,
pensando que fossem rosas
os teus lábios, meu amor!”.


Fui lá, levando meus pais, pois o orgulho era grande. Aproveitei a viagem para procurar trovadores com os quais mantinha correspondência. Estive também na redação do “O Jornal” para conhecer a Elza Marzullo e também o Symaco da Costa, que já me havia escrito. O Symaco era um tipo popular, bastante crítico em relação, principalmente, ao grande número de “trovadores” que surgiam devido à divulgação do movimento e que escreviam coisas assim:
“Se eu me chamasse Maria,
que sorTE EU TEria, enfim,
tanta gente escreveria
muitas trovas para mim”.


Mais tarde, em artigo publicado, afirmou: “
Veja o enfim; foi enfiado ali a martelo”.

Na mesma oportunidade, procurei o Aparício Fernandes no banco onde ele trabalhava para conhecê-lo pessoalmente. Ele havia divulgado uma de minhas trovas no programa da Rádio Globo sobre o trovismo. O Aparício convidou-me então para ir a uma reunião em uma casa da Tijuca, onde os trovadores de então se encontravam nas tardes/noites das quintas-feiras, um happy hour trovadoresco. Fui lá: não me lembro de quem era a casa, mas me lembro, ainda que vagamente, da presença do Luiz Otávio, do JG, do Aparício e outros que a memória não guardou. O Luiz Otávio, o JG e o Aparício já conheciam algumas trovas minhas e já haviam escrito, incentivando-me. Entre as trovas, havia a seguinte, que havia sido elogiada:
“Quisera ser qual o pássaro
que no laranjal faz ninhos;
constrói a felicidade
dentro de um monte de espinhos”.


Da original que eu havia produzido, houvera duas correções, a primeira feita pelo Symaco da Costa, quando o visitei na redação do O Jornal: qual no lugar de como no primeiro verso; a segunda, feita naquela reunião: que no laranjal faz ninhos... originalmente era “que nos laranjais faz ninhos”. Mas a briga boa foi da turma tentando colocar rima dupla na bichinha... tentaram, tentaram e acabaram dizendo mais ou menos o seguinte: "Deixa como está; é boa assim mesmo!"

Ainda em 1961, resolvi fazer uma primeira edição de um livro de trovas, ao qual dei o nome de “Festival de Trovas”. Tinha capa amarela e 101 trovas. Tratei de enviar exemplares para todos os trovadores com os quais mantinha correspondência e recebi elogios e conselhos que muito me valeram de JG de Araújo Jorge, Symaco da Costa, Augusto Astério de Campos, José Dias de Moraes, Walter Waeny, Luiz Otávio, Isaías Ramirez, Walter Gomes da Silva, José Alencar Gomes da Silva e Honório Joaquim Carneiro (então presidente e secretário, respectivamente da Associação Comercial de Ubá), Fernando Burlamarqui, A. Isaías Ramirez, Synésio Fagundes, Eno Theodoro Wanke, Nordestino Filho, Dídimo Paiva, Rodolfo Coelho Cavalcanti, Camilo Lélis da Silva, Evandro Moreira, Pereira de Assunção, Renato Pacheco e Aparício Fernandes. Uma carta que também me deixou entusiasmado foi a recebida do Rodolfo Coelho Cavalcanti, de Jequié, Bahia, da qual, imodestamente, transcrevo um trecho:

"O seu livro Festival de Trovas fez-me dizer sinceramente: o Brasil tem mais um trovador!... Tanto no lirismo como no humorismo, o amigo é um bom trovador. Sorri bastante com o seu grande humor na questão dos “pintinhos”... Fazia tempo que eu não sorria com uma boa trova e não queira saber a gostosa gargalhada que eu dei. Disponha sempre do trovador popular a amigo...”

Continua
Fonte:
O autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 673)

Uma Trova de Ademar  

Num sonho eu me fiz refém,
ao viver uma emoção
que o próprio sonho a retém
na mente e no coração...

–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional


Se São Francisco de Assis,
fosse o herói da mocidade,
dos corações juvenis
transbordaria humildade!

–Luiz Antonio Cardoso/SP–

Uma Trova Potiguar


Quero paz, mão estendida,
carinho, amigos e enfim,
a escolha de amar a vida
e ser amado, por fim ...

–Fabiano Wanderley/RN–

Uma Trova Premiada



2011 - Nova Friburgo/RJ
Tema - PRESSA - M/H


Minha vontade se expressa
e eu recuo e ... me patrulho,
segurando a minha pressa
para agradar meu orgulho!

–Dilva Maria Morais/RJ–

..E Suas Trovas Ficaram


Por mais que a vida destrance
tantos sonhos, nó por nó,
não desfaz nosso romance,
porque somos dois...num só!

–João Freire Filho/RJ–

U m a P o e s i a


No sertão quando a terra está chovida
se escuta a cantiga do carão,
a cigarra se cala no oitão
e a paisagem se torna mais florida,
a semente do milho se engravida
nasce uma raiz e lasca o chão,
cresce o pé, a boneca e o pendão
e a espiga começa a criar dente;
o trovão meia noite no nascente
é um grito de Deus no meu sertão.

–Ferreirinha/PB–

Soneto do Dia

DECLARAÇÃO DE AMOR DO QUINTO MILÊNIO.
–Pedro Mello/SP–


Seu eu te disser o quanto que te quero
e que por ti me torno até bandido,
não te enganes pensando que exagero:
o amor me torna louco e destemido!

Se eu te disser que não me desespero,
mas que me entrego a um sonho desmedido,
acredita que estou sendo sincero,
pois sou capaz de coisas sem sentido!

Quando enfim reduzir os meus rivais
a pó, eu te amarei ainda mais,
sem medo de qualquer tribulação ...

E nós dois fugiremos do planeta,
embarcando num rabo de cometa
para vermos as flores em Plutão...

História da Literatura (Classicismo) Parte IV

Epístola: 
composição em que o autor expõe suas idéias e opiniões, em estilo calmo e familiar. Pode ser doutrinária, amorosa ou satírica. É feita à maneira de uma carta;

EXEMPLO DE EPÍSTOLA
Carta da Índia

Desejei tanto uma vossa, que cuido que pela muito desejar a não vi; porque este é o mais certo costume da Fortuna: consentir que mais se deseje o que mais presto há-de-negar. Mas porque outras naus me não façam tamanha ofensa, como é fazerem-me suspeitar que vos não lembro, determinei de vos obrigar agora com esta; na qual pouco mais ou menos vereis o que quero que me escrevais dessa terra. Em pago do qual, de antemão vos pago com novas desta, que não serão más no fundo de uma arca para aviso de alguns aventureiros que cuidam que todo o mato é orégãos, e não sabem que cá e lá más fadas há.
Depois que dessa terra parti, como quem o fazia para o outro mundo, mandei enforcar a quantas esperanças dera de comer até então, com pregão público: Por falsificadoras de moedas. E desenganei esses pensamentos, que por casa trazia, por que em mim não ficasse pedra sobre pedra. E assim posto em estado que me não via senão por entre lusco e fusco, as derradeiras palavras que na nau disse foram as de Cipião Africano: Ingrata patria, non possidebis ossa mea. Por que quando cuido que, sem pecado que me obrigasse a três dias de Purgatório, passei três mil de más línguas, piores tenções, danadas vontades, nascidas de pura inveja, de verem su amada yedra de sí arrancada y em outro muro asida... Da qual também amizades, mais brandas que cera, se acendiam em ódios que disparavam lume que me deitava mais pingos na fama que nos couros de um leitão. Então ajuntou-se a isto acharem-me sempre na pele a virtude de Aquiles, que não podia ser cortado senão pelas solas dos pés; as quais de mas não verem nunca, me fez ver as de muitos, e não enjeitar conversações da mesma impressão, a quem fracos punham mau nome, vingando com a língua o que não podiam com o braço. Enfim, Senhor, eu não sei com que me pague saber tão bem fugir a quantos laços nessa terra me armavam os acontecimentos, como com me vir para esta, onde vivo mais venerado que os touros de Merceana, e mais quieto que na cela de um frade pregador.
Da terra vos sei dizer que é mãe de vilões ruins e madrastra de homens honrados. Porque os que se cá lançam a buscar dinheiro, sempre se sustentam sobre águas com {o} bexigas; mas os que sua opinião deita a las armas, Moriscote, como a maré corpos mortos à praia, sabei que, antes que amadureçam, se secam. Já estes que tomavam esta opinião de valente às costas, crede que nunca

Riberas del Duero arriba
Cabalgaron zamoranos,
Que roncas de tal soberbia
Entre sí fuesen hablando;

E quando vêm ao efeito da obra, salvam-se com dizer que se não podem fazer tamanhas duas cousas, como é prometer e dar.
Informado disto, veio a esta terra João Toscano, que, como se achava em algum magusto de rufiões, verdadeiramente que ali era su comer las carnes cruadas, su beber la viva sangre. Calisto de Sequeira se veio cá mais humanamente, por que assim o prometeu em uma tormenta grande em que se viu. Mas um Manuel Serrão, que, sicut et nos, manqueja de um olho, se tem cá provado arrazoadamente, porque fui tomado por juiz de certas palavras de que ele fez desdizer a um soldado, o qual, pela postura de sua pessoa, era cá tido em boa conta.
Se das damas da terra quereis novas, as quais são obrigatórias a uma carta como marinheiros à festa de S. Frei Pero Gonçalves, sabei que as portuguesas todas caem de maduras, que não há cabo que lhe tenha os pontos, se lhe quiserem lançar pedaço. Pois as que a terra dá? Além de serem de rala, fazei-me mercê que lhe faleis alguns amores de Petrarca ou de Boscão; respondem-vos uma linguagem meada de ervilhaca, que trava na garganta do entendimento, a qual vos lança água na fervura da mor quentura do mundo. Ora julgai, Senhor, o que sentirá um estômago costumado a resistir às falsidades de um rostinho de tauxia de uma dama lisbonense, que chia como pucarinho novo com a água, vendo-se agora entre esta carne de salé, que nenhum amor dá de si. Como não chorará las memorias de in illo tempore! Por amor de mim, que às mulheres dessa terra digais de minha parte que, se querem absolutamente ter alçada com baraço e pregão, que não receiem seis meses de má vida por esse mar, que eu as espero com procissão e pálio, revestido em pontifical, aonde estoutras senhoras lhe irão entregar as chaves da cidade, e reconhecerão toda a obediência, a que por sua muita idade são já obrigadas.
Por agora não mais, senão que este soneto que aqui vai, que fiz à morte de D. Antônio de Noronha, vos mando em sinal de quanto dela me pesou. Uma écloga fiz sobre a mesma matéria, a qual também trata alguma cousa da morte do Príncipe, que me parece melhor que quantas fiz. Também vo-la mandara para a mostrardes lá a Miguel Dias, que, pela muita amizade de D. Antônio, folgaria de a ver; mas a ocupação de escrever muitas cartas para o Reino me não deu lugar. Também lá escrevo a Luís de Lemos em resposta de outra que vi sua: se lha não derem, sabia que é a culpa da viagem, na qual tudo se perde. - Vale.
(Luís Vaz de Camões)


Epitalâmio:
composição em honra aos recém casados, própria para ser recitada em bodas;

Canção:
composição erudita, de longas estrofes, versos decassílabos por vezes entremeados com outros de seis sílabas (heróicos) e de caráter amoroso;

EXEMPLO DE CANÇÃO
Canção V

Oh! quem me ali dissera
Que de amor tão profundo
O fim pudesse ver inda algua hora!
Oh! quem cuidar pudera
Que houvesse aí no mundo
Apartar-me eu de vós, minha Senhora,
Pera que desde agora
Perdesse a esperança,
E o vão pensamento
Desfeito em um momento,
Sem me poder ficar mais que a lembrança,
Que sempre estará firme,
Até o derradeiro despedir-me.

Mas a mor alegria
Que daqui levar posso,
Co'a qual defender-me triste espero,
É que nunca sentia,
No tempo que fui vosso,
Quererdes-me vós quanto vos eu quero;
Porque o tormento fero
De vosso apartamento
Não vos dará tal pena
Como a que me condena,
Que mais sentirei vosso sentimento
Que o que minha alma sente.
Moura eu, Senhora, e vós ficai contente!

Canção, tu estarás
Aqui acompanhando
Estes campos e estas claras águas,
E por mim ficarás
Chorando e suspirando,
E ao mundo mostrando tantas mágoas,
Que de tão larga história
Minhas lágrimas fiquem por memória.

Se este meu pensamento,
Como é, doce e suave,
De alma pudesse vir, gritando, fora,
Mostrando seu tormento
Cruel, áspero e grave,
Diante de vós só, minha Senhora;
Pudera ser que agora
O vosso peito duro
Tornara manso e brando.
E eu que sempre ando,
Pássaro solitário, humilde, escuro,
Tornado um cisne puro,
Brando e sonoro, pelo ar voando,
Com canto manifesto
Pintara meu tormento e o vosso gesto.

Pintara os olhos belos,
Que trazem nas meninas
O Menino que os seus neles cegou;
E os dourados cabelos
Em tranças de ouro finas,
A quem o Sol seus raios abaixou;
A testa, que ordenou
Atura tão formosa;
O bem proporcionado
Nariz, lindo, afilado,
Que cada parte tem da fresca rosa;
A boca graciosa,
Que querê-la louvar é escusado.
Enfim, é um tesouro:
Os dentes perlas, as palavras, ouro.

Vira-se claramente
Ó Dama delicada,
Que em vós se esmerou mais a Natureza;
E eu, de gente em gente,
Trouxera trasladada
Em meu tormento vossa gentileza.
Somente a aspereza
De vossa condição,
Senhora, não dissera,
Por que se não soubera
Que em vós podia haver algum senão.
E se alguém, com razão,
- Porque morres? - dissera, respondera:
- Mouro porque é tão bela,
Que inda não sou para morrer por ela.

E se pela ventura,
Dama, vos ofendesse,
Escrevendo de vós o que não sento.
E vossa fermosura
Tanto à terra descesse
Que a alcançasse humilde entendimento,
Seria o fundamento
Daquilo que cantasse
Todo de puro amor,
Por que vosso louvor
Em figura de mágoas se mostrasse.
E onde se julgasse
A causa pelo efeito, minha dor
Diria ali, sem medo:
Quem me sentir, verá de quem procedo.

Então amostraria
Os olhos saudosos,
O suspirar que a alma traz consigo;
A fingida alegria,
Os passos vagarosos,
O falar e esquecer-me do que digo;
Um pelejar comigo,
E logo desculpar-me;
Um recear, ousando;
Andar meu bem buscando,
E de poder achá-lo acobardar-me;
Enfim, averiguar-me
Que o fim de tudo quanto estou falando
São lágrimas e amores;
São vossas isenções e minhas dores.

Mas quem terá, Senhora,
Palavras com que iguale
Com vossa fermosura minha pena?
Que em doce voz de fora,
Aquela glória fale
Que dentro na minha alma Amor ordena?
Não pode tão pequena
Força de engenho humano
Com carga tão pesada,
Se não for ajudada
Dum piedoso olhar, dum doce engano,
Que, fazendo-me o dano
Tão deleitoso e a dor tão moderada,
Enfim se convertesse
Nos gostos dos louvores que escrevesse.

Canção, não digas mais; e se teus versos
À pena vêm pequenos,
Não queiram de ti mais, que dirás menos.
(Luís Vaz de Camões)


Fontes:
Garganta da Serpente
Imagem = compartilhada no facebook pela Libreria Fogola Pisa

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Trova 228 - Nemésio Prata (Fortaleza/CE)


Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 672)

Uma Trova de Ademar  

Eu sou qual um jangadeiro
que a fé no peito tatua...
Num barco sem paradeiro,
sua esperança flutua.

–Ademar Macedo/RN–

Uma Trova Nacional


Pensamento irresolvido
remoendo a mesma história:
- um amor não esquecido
reticente na memória.

–Eliana Jimenez/SC–

Uma Trova Potiguar


Conduzo a minha jangada
remando-a (já na descida)
sem temer onda quebrada
no mar revolto da vida.

–Tarcísio Fernandes/RN–

Uma Trova Premiada

2011 - Nova Friburgo/RJ
Tema - PRESSA - M/E


O que eu vibrei em teus braços
a minha alma vibra agora...
ouvindo o som dos teus passos,
mais que depressa, indo embora!

–Clenir Neves Ribeiro/RJ–

...E Suas Trovas Ficaram


Na quietude costumeira
de muita vida vazia,
solidão é companheira
dos que não têm companhia...

–Luiz Otávio/RJ–

U m a P o e s i a


O tempo faz e desfaz
não começa como finda,
estou velho e penso ainda
nos tempos que não vem mais,
vejo no corpo os sinais
das chagas dos desenganos,
são os fantasmas tiranos
carrascos dos meus segredos
olhando para os rochedos
das serranias dos anos.

–Cazuza Nunes/PB–

Soneto do Dia

PRIMAVERA.
–José Ouverney/SP–


Quando a esperança já não faz efeito,
Quando a alegria já não tem lugar,
Faz-se mister mexer no “script”, ousar,
Substituindo o “por fazer” por “feito”.

Às vezes por cautela, preconceito
Ou razões que não cabe revelar,
O homem opta até por não lutar,
Achando que o destino “dá um jeito”.

E nessa alternativa derradeira
tem gente que percorre a estrada inteira
colhendo o amargo fruto de uma espera;

submete-se ao inverno e seus rigores,
sonhando com um mundo só de flores
e morre... sem que alcance a primavera...

Jogos Florais de Cantagalo 2012 (Classificaçaõ Final – Âmbito Nacional)

ÂMBITO NACIONAL:

TEMA: ESPAÇO


01
No ocaso de minha vida,
se antigos sonhos refaço,
vem a saudade e, atrevida,
quer ocupar todo o espaço!
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLA (São Paulo/SP)

02
Neste planeta avarento,
onde o "ter" é o ditador,
que triste é ver o cimento
roubar o espaço da flor!
ANTÔNIO AUGUSTO DE ASSIS (Maringá/PR)


03
Ao passar por mim, nem para...
sou a sombra de ninguém!
Que espaço enorme separa
meu amor de seu desdém!
WANDA DE PAULA MOURTHÉ (Belo Horizonte/MG)

04
Quando me deito e, no espaço
que foi teu, alguém se lança,
não é outra que eu abraço
senão a tua lembrança...
JOSÉ OUVERNEY (Pindamonhangaba/SP)

05
Por te amar tanto, é que a vida,
embora dure um segundo,
possui o espaço e a medida
das horas todas do mundo...!
MARA MELINNI DE ARAUJO GARCIA (Caicó/RN)

06
A maquiagem pesada,
diante do espelho, desfaço
e em minha cara lavada
rugas brigam por espaço...
ÉLBEA PRISCILA DE SOUZA E SILVA (Caçapava/SP)

07
Meu amor nunca se expande
por mais que eu queira e insista.
Não cabe um amor tão grande
no teu espaço egoísta!
RITA MOURÃO (Ribeirão Preto/SP)

08
Perdê-la foi uma pena...
E hoje dói ficar olhando
esta casa tão pequena,
com tanto espaço sobrando.
HEGEL PONTES (Juiz de Fora/MG)

09
Mandei a ilusão embora.
A saudade quis entrar.
Há tanto espaço lá fora,
mas ela insiste em ficar.
ZENI DE BARROS LANA (Belo Horizonte/MG)

10
Homem...! É afoito seu passo
e um paradoxo o consome:
- Rompe limites no Espaço,
enquanto a Terra... tem fome!
PEDRO MELLO (São Paulo/SP)

11
Um casebre na favela...
o espaço ganhou fulgor,
quando alguém pôs na janela
um simples vaso de flor!
VANDA FAGUNDES QUEIROZ (Curitiba/PR)
12
Se a inspiração vem chegando,
eu me vejo em pleno espaço,
vendo Deus metrificando
todos os versos que eu faço!
ADEMAR MACEDO (Natal/RN)


13
Ventre Materno... o espaço
da semente em gestação,
onde Deus fez Seu regaço
em amor à Criação!
MARIA DA CONCEIÇÃO FAGUNDES (Curitiba/PR)

14
Quem tem um amor fecundo,
semeado a cada passo...
Quando parte deste mundo,
deixa um "vazio" no espaço!...
ROBERTO TCHEPELENTYKY (São Paulo/SP)

15
O mais cruel beijo do mundo
demonstrou de forma ingrata,
que no espaço de um segundo
alguém trai, condena e mata.
WANDIRA FAGUNDES QUEIROZ (Curitiba/PR)

Fonte:
A.A. de Assis

Edson Amâncio (Lançamento do romance "Diário de um Médico Louco)

Data: 19 de setembro de 2012 (quarta-feira), às 19 horas.

Local: Casa das Rosas (Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura).

Endereço: Av. Paulista, 37 (Metrô Brigadeiro) - São Paulo/SP - Brasil. Entrada franca.

Precedendo à sessão de autógrafos, haverá uma Mesa Redonda sobre o tema "LITERATURA, GENIALIDADE E LOUCURA". Integrantes da Mesa: o autor Edson Amâncio (neurocientista, especialista em transtornos da mente, integrante do corpo clínico do Hospital Albert Einstein e escritor), Ademir Demarchi (poeta e crítico, doutor em Literatura Brasileira pela USP e editor da revista "Babel Poética"), Fábio Lucas (professor, crítico e escritor) e Flávio Viegas Amoreira (escritor, crítico e jornalista). Mediador: Nicodemos Sena (escritor e editor).

ACERCA DO ROMANCE "DIÁRIO DE UM MÉDICO LOUCO"

São já célebres as reflexões de Foucault sobre a relação da escrita com a loucura que, a partir do século XIX, como que governa os textos motivando a liberação do escritor da necessidade de ter uma relação social, podendo ele derramar-se em busca de seus limites, assunto que é explorado à exaustão por Blanchot, com quem Foucault dialoga.

A liberação do texto de qualquer amarra possibilitou, por sua vez, a entrega dos escritores não apenas à loucura do texto, mas à expressão de sua loucura no texto, a ponto de Doctorow ter se saído com uma interessante síntese segundo a qual “escrever é uma forma socialmente aceita de esquizofrenia”.

Este Diário de um médico louco é, pois, justamente, um relato que se monta sobre essas questões, ganhando ares de uma confissão de algo há muito contido, que supostamente teria levado à demência e que move a escrita, de modo a que o narrador se transforme de médico em escritor com sua fantasia de ser socialmente aceito como tal e com todos os seus defeitos e supostos crimes praticados.

Num primeiro plano, temos um narrador médico que apresenta um colega que lhe deixou um diário, esse que se lerá. Esse narrador é comedido e não tece comentários sobre o colega, mas o que descreve dele com uma aparente frieza clínica não soa normal aos olhos de um leitor arguto. E é isso que se constatará a seguir: o relato de um louco que soa como uma câmara de ecos, que é a própria ordem da literatura contemporânea. Não à toa o autor deste livro o começa com um dos clichês da literatura, ou seja, com um narrador que informa que recebeu de outro um relato que não é dele e em seguida é esse outro que passa a narrar o que se vai ler.

A partir dessa introdução a ressonância a temas caros à literatura e à vida de outros escritores, assim como aos textos deles, vai se imiscuindo no texto em cornucópia, consubstanciando a tal câmara de ecos, e assim nele passamos a ler através do médico louco os modos próprios de sua profissão, sobre como se forma um louco com direito a um batismo de fanatismo religioso, extraterrestres, autores como Edgar Allan Poe, Théophile Gautier, Camus, Walser, Freud e Jung, Guimarães Rosa, Cervantes, e os preferidos de Edson Amâncio, os russos, como Dostoiévski, Gógol, Pushkin, cuja parte do diário, sobre uma viagem à Rússia, é o ponto alto do livro.

O diário tenta transmitir uma “verdade”, um relato de algo que existiu, mas que, para o leitor, o tempo todo vai se colocando, de fato, como seguidos falseamentos. A dúvida, assim, perpassa a leitura, afinal em nada se pode compactuar com o narrador, pois as viagens que relata, uma delas à Rússia de Dostoiévski, podem ser totalmente falsas, uma vez que fantasias, delírios de um louco que não saiu do entorno de seu quarto, para mencionar Maistre. Desse quarto ele vê as estrelas e o mar de Santos, ironizado nas entrelinhas, e pode, através dos livros, ir à Rússia, tal como quem o lê vai...

O aviso disso parece notório já no início do diário, quando o narrador, continuando sua autobiografia, faz um relato de veterano de guerra, típico das literaturas pós-guerras mundiais, para nós familiares, de tanto que já os lemos. Ocorre, porém, que esse fragmento inserido no texto imediatamente se desmonta quando o narrador informa que deixou a TV ligada... Ou seja, como se trata do relato de um louco, não somente a TV está ligada ecoando a cultura de massas em todas as suas possibilidades, mas, na esquizofrenia de eus, a própria literatura e a biblioteca de Babel que vai se presentificando nos autores mencionados, consubstanciando a loucura no texto, bem como a loucura do texto, que é a própria literatura. (Obs: Texto de orelhas escrito pelo crítico Ademir Demarchi, doutor em Literatura Brasileira pela USP-Universidade de São Paulo).

O AUTOR

Edson Amâncio nasceu a primeiro de janeiro de 1948, em Sacramento-MG, e vive em São Paulo. Pertence à nobre estirpe de escritores (infelizmente em extinção) da qual fazem parte Machado de Assis (Quincas Borba, O Alienista), Graciliano Ramos (Angústia), Dyonelio Machado (Os ratos, O louco do Cati) e Dostoiévski (Notas do subsolo, Memórias da casa dos mortos). Graduado, mestre e doutor em Medicina, Edson Amâncio integra o corpo clínico do Hospital Albert Einstein (São Paulo). Como cientista, tem estabelecido ‘pontes’ entre Ciência e Arte, as duas fronteiras de resistência da civilização ao declínio e à barbárie. Quer como neurocientista, quer como ficcionista, realiza uma profunda e incisiva prospecção nos “modos difusos da Alma”. Ao debruçar-se sobre casos de transtornos mentais à que foram acometidos artistas e celebridades, deteve-se sobre a vida de Fiodor Dostoiévski, que sofria de epilepsia, levando-o tal interesse a visitar a ex-União Soviética, em busca de novas informações sobre o caso, bem como a vasculhar indícios de possíveis influências da doença no estilo denso e muitas vezes delirante com que o inigualável escritor russo vazou a sua vasta e polifônica obra, marcada por personagens desconcertantes e situações carregadas de absurdo e dramaticidade, terminando por se tornar Edson Amâncio, quer do ponto de vista da ciência médica, quer nos aspectos estritamente literários, um dos maiores especialistas na vida e na obra do magnífico autor de Os Irmãos Karamázovi, considerado pelo pai da Psicanálise, Sigmund Freud, a "maior obra da história". Dessa trajetória através dos terrenos áridos e sombrios da psique humana e da alta literatura resultaram os assuntos e também o estilo denso e perquiritório utilizados por Edson Amâncio no "Diário de um médico louco".

Edson Amâncio fez sua estreia literária com os contos de Em pleno delito (1986), vindo a seguir Cruz das almas (romance, 1988), Pergunte ao mineiro (crônicas, 1995) e Minha cara impune (romance, 1997), que obtiveram excelente recepção por parte da crítica especializada. O reconhecimento do público, entretanto, só chegou com a obra O homem que fazia chover e outras histórias inventadas pela mente (2006), na qual discorre sobre as ligações ainda obscuras entre distúrbios psíquicos e genialidade e comentam-se casos clínicos bizarros de pacientes comuns e de mestres como John Nash, Bill Gates, Mozart, Van Gogh, Flaubert, Machado de Assis e Virginia Woolf.

SAIBA MAIS: http://www.letraselvagem.com.br/pagina.asp?id=244

Fonte:
Letra Selvagem

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Olympio Coutinho (Histórias de trova) Capítulo II – Meus Irmãos, os Trovadores

Enquanto vivia os doces anos da adolescência em Ubá, sempre fazendo trovas, acompanhava de longe o movimento trovadoresco. As iniciativas de Luiz Otávio

Tirem-me tudo que tenho,
neguem-me todo o valor!
-Numa glória só me empenho:
a de humilde trovador...

e J. G. de Araújo Jorge

Neste dia belo e doce/
de festa, - sentimental
- quem dera que você fosse
meu presente de Natal!


promovendo os primeiros “Jogos Florais” e, ainda, a edição de trovas de outros autores, como o “Cantigas de Muita Gente”. Zalkind Piatgorsky,

Vou sorrindo com cuidado,
sondando bem a pessoa,
pois ser feliz é um pecado
que pouca gente perdoa!


que mantinha um programa de trovas na TV Continental, em parceria com Aparício Fernandes

Parti do Norte chorando,
que coisa triste, meu Deus,
eu vi o mar soluçando
e o coqueiral dando adeus”


 lançava a coleção “Trovas e Trovadores” e o primeiro, em parceria com Magdalena Léa, a coleção “Trovas do Brasil”.

Quando volto ao meu rincão
piso a terra comovida;
- Cada pedaço de chão
conta um pedaço de vida


Nesta época, jornais como ”O Globo” e “O Jornal”(dos Diários Associados) davam certo destaque às trovas. No “O Globo”, Antônio Olinto, conterrâneo de Ubá, mantinha coluna chamada “Porta de Livraria”, onde, além de outras notícias literárias, prestigiava diversos Jogos Florais, principalmente os de Nova Friburgo, publicando as trovas classificadas; além dele, Helena Ferraz publicava a coluna “Na Boca do Lobo”, onde sempre saía uma trova na seção “Quadra no Quadro”, e, no “O Jornal”, Elza Marzulo editava o suplemento literário “Jornal Feminino”, onde a trova aparecia sempre com destaque.

Na Rádio Globo, Aparício Fernandes alimentava de trovas o Programa Luiz de Carvalho. Na Bahia, o trovador popular Rodolfo Coelho Cavalcanti, então presidente do Grêmio Brasileiro dos Trovadores, editava um jornal de trovas, “O Trovador”, e muitos outros trovadores, nos diversos recantos do País, também se encarregavam de divulgar o movimento trovadoresco. Nesta mesma época, surgiu a União Brasileira dos Trovadores (UBT), hoje com ramificações em praticamente todo o Território Nacional, em capitais e no interior dos Estados.

Introduzo aqui um comentário do trovador João Costa, delegado da UBT em Saquarema (RJ),

É nobre o gesto de quem
o sofrimento ameniza,
partilhando o que mal tem
com alguém que mais precisa


que, em artigo publicado In Poesis, julho de 2004, tendo como fonte de pesquisa “Uma Análise do Trovismo”, do saudoso e grande estudioso da trova Eno Thedoro Wanke, escreveu: “A trova atravessou os séculos e chegou até nossos dias, tendo seu primeiro movimento, seu apogeu, nos anos 60 e 70, graças a Luiz Otávio e J. G. de Araújo Jorge. Antes, porém, havia chegado à capital cultural do país, o Rio de Janeiro, através do pernambucano Adelmar Tavares

Oh linda trova perfeita
que nos dá tanto prazer!…
Tão linda depois de feita,
tão difícil de fazer…


 e quase estourou como movimento literário, mas o Modernismo esfriou os ânimos. A trova, inclusive, chegou a ser chamada de“boboca” por alguns modernistas mais empolgados. Mas, a verdade é que um trovador chegou à Academia Brasileira de Letras e a trova continuou tendo um lugar especial nos corações brasileiros”.

Continua…
Fonte:
O Autor

Lenda Portuguesa (O Penedo do Sino)

A pequena aldeia de Bustelo, que, como se sabe, fica no alto do monte a dois passos da Citânia, viveu em tempos idos um cabaneiro que possuía um enorme rebanho de ovelhas, entre as quais existia também uma preciosa cabrinha leiteira. Rebanho e cabra eram apascentados na serra pela sua única filha, que, diz a lenda, era um encanto de menina. Aconteceu que, uma manhã, quando a pastorinha foi abrir a porta do redil para sair com o gado a pastar, viu sobre um penedo que havia no recinto um enorme sardão. Tinha um ar muito vivo e parecia ter o corpo coberto de pedras preciosas, tal o colorido reluzente das pintas que o cobriam. Nem a presença da menina nem o movimento do rebanho o assustaram e, a partir de então, a pastora nunca mais entrou no redil sem que visse sobre aquela pedra o sardão bonito, que parecia sorrir-lhe mansamente. Tanto se familiarizaram um com o outro que a pastora acabou por considerá-lo e amá-lo como a cada ovelha do seu rebanho.

 Uma vez que estava mungindo a cabrinha, a rapariga viu o sardão aproximar-se como quem tem fome, e pegando numa escudela cheia de leite pô-la à frente do bicho. O sardão sorveu tudo com sofreguidão, ficando tão alegre e satisfeito que a moça compreendeu imediatamente que lhe prestara um grande serviço. Assim, daí para a frente guardava sempre uma escudela de leite para aquele amigo.

 Estranhamente, porém, a rapariga começou a notar que desde que dava o leite ao sardão a cabra ia secando pouco a pouco, até ameaçar secar de todo. E se este facto entristecia a pastora, não parecia, contudo, aborrecer o sardão, que se mantinha alegre como dantes. Ela atribuía essa alegria ao reconhecimento do animalzinho e um dia, falando para ele como era seu costume, disse-lhe:

 — Ai, meu bichinho! O leite da cabrinha está quase seco e qualquer dia não tenho com que te alimentar!

 Ao ouvir isto, o bicho, em vez de mostrar tristeza, redobrou de corridas até que parou na frente da menina como que sorrindo muito contente.

 A determinada altura, o leite secou totalmente. Pela manhã, a pastora dirigiu-se ao redil muito acabrunhada, pensando no que daria de comer ao sardão nesse dia. Mas, ao abrir a porta ao gado, qual não foi o seu espanto, quando, em vez do sardão, viu sentado no mesmo penedo um rapaz muito bonito e bem vestido.

 Carinhosamente, ele disse-lhe então:

 — Entra, minha amiga, que sou ainda o mesmo! Não tenhas medo! O sardão que alimentavas não era senão eu, um pobre filho da Moirama que seus pais, ao serem expulsos de Portugal, aqui deixaram encantado naquele animalzinho. Foram os teus cuidados que quebraram o encanto e cativeiro a que estava votado. Há tempos e tempos que esperava a minha liberdade, que estava pendente do leite de noventa dias de uma cabrinha do monte da Citânia. Desde que o meu encanto se quebrou, secou o leite da cabra, mas descansa, que mal eu pise a terra da Moirama o leite há-de voltar. Antes, porém, vou deixar-te uma lembrança minha, como testemunho da minha gratidão e amizade.

 E puxando por um objecto muito brilhante, com forma de um X, que trazia na algibeira, acrescentou:

 — Toma isto que te dou. É um talismã com o qual conseguirás seduzir quem tu quiseres. Trá-lo sempre contigo durante três meses, ao fim dos quais devo ter chegado à Moirama, para onde vou partir. Nessa altura,

 volta aqui e coloca o talismã sobre este penedo, que é o cofre dos meus tesouros. O talismã há-de transformar-se numa chave debaixo da qual encontrarás uma fechadura. Abre, e tudo o que encontrares é teu. Mas atenta bem que até lá tens de guardar segredo absoluto de tudo isto que connosco se passou, senão perderei de novo a liberdade e voltarei à condição de réptil, como me encontraste.

 A rapariguinha ainda não conseguira sair do seu espanto quando o mouro desapareceu e a deixou ali de boca aberta e talismã na mão.

 Daí por diante, a pastorinha da Citânia tornou-se o enlevo e a sedução de quantos a conheciam. Principalmente, diz a lenda, não havia rapaz que a olhasse e não ficasse perdido de amores por ela.

 Isto tornou-se tão escandaloso que o pai da rapariga, vendo-a dar tanto nas vistas, a chamou para que lhe explicasse as razões do seu condão.

 Como resposta, a pastora perguntou:

 Meu pai, há quantos meses secou o leite da nossa cabra?

 Já lá vão uns quatro meses. Porquê? - perguntou o pai.

 Venha então comigo! - disse ela.

 De caminho até ao redil, ela foi-lhe contando tudo o que se passara e que levara ao seu poder encantatório junto das pessoas. Por fim, já junto ao penedo onde aparecera o sardão, pousou o talismã e tudo se passou como o mouro lhe predissera.

 Abriram a rocha e, maravilhados, encontraram lá dentro uma tão imensa fortuna que passado pouco tempo se tornaram fidalgos e grandes senhores da corte do nosso Rei. Eram grades, arados, cadeados, cordões, grilhões e meadas, tudo do mais puro ouro, tudo cravejado de pérolas e diamantes de todas as cores, tudo nunca visto!

 O penedo, assim que se viu vazio daquela riqueza, fechou-se para não tornar a abrir-se. Com o tempo, as casas colmaças que existiam sobre ele caíram e desapareceram com o vento, restando apenas, e esperamos que para sempre, o penedo tocando a vazio, oco como um sino e tangendo como ele.

Fonte:
Lendas Portuguesas da Terra e do Mar, Fernanda Frazão, disponível em Estúdio Raposa

Ambrose Bierce (O Capitão do Camelo)

Tradução de Octávio Marcondes

Ambrose Bierce (1842-1914 - Estados Unidos)
Criativo e crítico, escritor e aventureiro (ele foi lutar na Revolução Mexicana e acabou desaparecendo. Carlos Fuentes transformou-o em personagem no seu romance Nuestro Gringo), Bierce deixou uma obra diversificada, como o livro de humor em forma de dicionário (The Devils Dictionary), muito popular, além de fábulas modernas, contos e outros relatos. Aqui, escolhemos uma amostra de sua criatividade um conto de puro non-sense, no melhor tradição anglo-saxã.


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O nome do navio era Camelo. Sob certos aspectos tratava-se de um barco extraordinário. "Media" 600 toneladas; mas depois de embarcar lastro suficiente para impedir que emborcasse como um pato morto, mais as provisões necessárias para uma viagem de três meses, era preciso ser muito meticuloso na escolha, tanto da carga, quanto dos passageiros. Uma vez, só para ilustrar, quando estava para zarpar veio um bote do porto com dois passageiros, um homem e sua mulher; eles haviam feito reservas no dia anterior, mas ficaram em terra para fazer mais uma refeição decente antes de se sujeitar ao "pé sujo de bordo", como o homem chamava a mesa do capitão. A mulher veio a bordo, e o homem se preparava para segui-la, quando o capitão, se inclinando na amurada, o viu.

- Bem - disse o capitão -, que é que o senhor pretende?

- Que é que eu pretendo? - disse o homem, se agarrando à escada. - Embarcar neste navio é o que eu vou fazer.

- Não, gordo deste jeito, o senhor não vai - gritou o capitão. - O senhor pesa no mínimo 120 quilos, e eu ainda não levantei a âncora. Ou vai querer que eu abandone minha âncora?

O homem disse que a âncora não era problema dele - que era como Deus o tinha feito (embora, pela sua aparência, desse a impressão que um cozinheiro tivesse dado uma mão ao Criador), e, por bem ou por mal, ele se propunha a embarcar no navio. Uma bela discussão se seguiu, mas finalmente um dos marinheiros jogou-lhe um colete salva-vidas, e o capitão, dizendo que assim ele ficaria mais leve, deixou-o embarcar.

Este era o Capitão Abersouth, anteriormente no comando do Atoleiro, o melhor marinheiro que alguém possa imaginar, sentado na murada da popa e lendo uma trilogia. Nada podia se igualar à paixão daquele lobo do mar pela literatura. Em cada viagem ele vinha com tantos pacotes de livros que não havia espaço para a carga. Eram romances no porão, romances no convés, romances no salão e ainda havia romances nos beliches dos passageiros.

O Camelo fora desenhado e construído por seu proprietário, um arquiteto do centro de Londres, e se parecia tanto com um navio quanto a Arca de Noé. Tinha sacadas e varanda; um beiral e portas na linha d'água. As portas tinham sinetas e campainhas. Em uma área tinha havido até uma tentativa fútil de se construir um navio. O salão dos passageiros era na ponte e coberto de telhas. A esta estrutura, com a aparência de uma corcova, o barco devia seu nome. Seu arquiteto havia construído várias igrejas (a de Santo Ignotus ainda é usada por uma cervejaria em Hotbath Meadows) e, possuído pela inspiração eclesiástica, dera ao navio um casco em forma de cruz, mas, descobrindo que as laterais atrapalhavam seu deslocamento na água, as removera, o que enfraquecera bastante a estrutura da quilha a meia nave.

O mastro principal era como um pedestal e no topo havia um cata-vento em forma de galo, de sua gávea se descortinava uma das mais belas vistas da Inglaterra.Era assim o Camelo quando me juntei à sua tripulação, em 1864, para uma viagem de descoberta ao Pólo Sul. Uma expedição sob os auspícios da Real Sociedade pela Promoção do "Fair Play". Numa reunião desta excelente associação, ficara decidido: 1 - que o favoritismo da ciência pelo Pólo Norte era uma indevida diferenciação entre dois objetivos igualmente meritórios, pela qual a Natureza já havia mostrado sua desaprovação castigando Sir Jonh Franklin e tantos outros de seus imitadores (o que era bem feito para eles); 2 - que esta empresa seria uma forma de protesto contra tal preconceito; e, finalmente, 3 - que nenhuma despesa ou responsabilidade devia reverter para a dita sociedade como corporação, mas que se criaria um fundo para o qual qualquer membro de forma pessoal poderia contribuir, se alguém fosse suficientemente idiota para isto (o que, justiça seja feita, ninguém foi). Aconteceu apenas que o cabo de amarração do Camelo arrebentou, num dia em que eu estava nele. O barco deixou o porto vagando com a corrente rumo ao Sul, debaixo dos insultos e imprecações de quantos o conheciam e, como eu, já não podiam voltar. Em dois meses ele cruzou o Equador, e o calor se tornou insuportável.

De repente começou uma calmaria. Tivéramos uma brisa perfeita até as três da tarde, e o navio vinha fazendo quase dois nós por hora quando, sem um aviso, as velas se inflaram ao contrário, isto devido ao ímpeto com que vínhamos, e então, quando ele parou de todo, as velas caíram, mais lisas que saia de mulher magra.

O Camelo não só parou por completo como começou um lento movimento de ré, rumo à Inglaterra. O velho Ben, nosso mestre, disse que calmaria igual só tinha visto mesmo uma, e esta, ele explicou, foi quando Pregador Jack, o marinheiro regenerado, se excitou demais num sermão e gritou que Miguel, o Arcanjo, sacudiria o Dragão de dentro do barco e faria o maldito provar a ponta de uma corda!

Nós permanecemos nesta situação deplorável boa parte do ano, até que, com impaciência crescente, a tripulação me delegou poderes de representação para procurar o capitão e ver se alguma coisa podia ser feita. Eu o encontrei, sob a coberta, entre um convés e outro, num canto empoeirado e coberto de teias de aranha, com um livro nas mãos. De um lado ele tinha, recém desembrulhados, três pacotes de "Ouida", do outro lado uma pilha de Miss M. E. Braddon que chegava à altura de sua cabeça.

Havia terminado "Ouida" e começara a atacar Miss Braddon. Ele estava muito mudado.

- Capitão Abersouth - eu disse, na ponta dos pés para poder ver por cima dos picos montanhosos de Miss Braddon -, o senhor poderia, por gentileza, me dizer até quando isso vai durar?

- Não tenho certeza - me respondeu sem tirar os olhos do livro. - Provavelmente eles vão transar pela metade do livro. Enquanto isso o jovem Monshure de Boojower vai entrar na posse de uma fortuna milionária. Então, se a bela e orgulhosa Angélica não vier atrás dele, depois de abandonar o advogado naval, então, pelo de Deus, eu não entendo nada do profundo e misterioso coração humano.

Eu me sentia incapaz de relatar aos homens de bordo a forma esperançosa que o capitão encarava nossa situação e subi para o convés bastante desanimado, mas foi só botar a cabeça para fora para notar que o navio movia-se com uma velocidade incrível.

Nós tínhamos a bordo um touro e um holandês. O touro estava preso ao mastro, pelo pescoço, com uma corrente, já o holandês tinha bastante liberdade e só era trancado à noite. Havia uma desavença entre eles - uma antipatia que tinha suas raízes no apetite do holandês por leite e no senso de dignidade pessoal do touro; seria penoso e cansativo relatar aqui o incidente específico que deu origem ao ódio. Aproveitando a siesta, que seu inimigo fazia depois do almoço, o holandês conseguira passar pelo mastro sem ser visto, e chegar até a proa, para pescar. Quando o animal, acordando, viu a outra criatura na sua frente pescando, deu uma folga na corrente, para pegar impulso, abaixou os chifres e atacou seu desafeto. O mastro era firme, a corrente era forte e com o touro rebocando o navio, como diria Byron: "caminhar sobre as águas foi coisa normal".

Depois disso nós deixamos o holandês exatamente onde estava, noite e dia. O velho Camelo andava como nem mesmo um furacão o faria andar. A bússola mostrando sempre o rumo Sul.

Nosso problema agora era outro. Há algum tempo não tínhamos comida suficiente, faltava carne em especial. Nós não podíamos sacrificar nem o touro nem o holandês; e o carpinteiro de bordo, tradicionalmente o primeiro recurso dos esfomeados no mar, era magro como um esqueleto. Os peixes nem mordiam nem se deixavam morder. Quase todos os cabos já haviam sido usados numa macarronada; tudo que era de couro, inclusive nossos sapatos, tinha acabado dentro de uma omelete; com trapos e betume fizéramos uma salada bastante razoável, e depois de uma breve carreira como dobrada à moda do Porto, nossas velas haviam dado adeus ao mundo para sempre. Só restavam duas alternativas, ou comíamos uns aos outros, como manda a etiqueta naval, ou lançávamos mão dos romances do capitão Abersouth. Terrível alternativa! - mas sempre uma escolha. E raramente, creio, marinheiros esfomeados têm o privilégio de encontrar à sua disposição um inteiro carregamento de nossos melhores autores contemporâneos já fritos pela crítica. Nós comemos toda aquela ficção.

As obras que o capitão já terminara de ler duraram seis meses, a maioria eram best-sellers e bastante substanciais. Depois que elas acabaram (é claro que alguma coisa tinha de dada ao touro e ao holandês) nós apertamos o capitão, tomando os livros de suas mãos assim que ele os acabava de ler. Algumas vezes, quando parecia que nós estávamos nas últimas e já nada podia nos salvar, ele saltava uma página inteira de considerações éticas, ou aquelas partes chatas com descrições monótonas, que eram imediatamente devoradas; e sempre, assim que ele começava a prever o desenvolvimento da trama (o que em geral acontecia pela metade do segundo volume), ele nos entregava o final do livro sem uma reclamação.

Os efeitos desta dieta não só não eram desagradáveis, mas ao contrário bastante interessantes. Nos sustentava fisicamente, nos exaltava o intelecto e moralmente não nos tornava muito piores de que já éramos. Nós falávamos como nunca ninguém falou, antes de nós. Coisas de uma absoluta falta de sentido eram ditas com muito espírito. Como na coreografia óbvia de um duelo de palco, onde cada golpe tem seu previsível contragolpe, nas nossas conversas, cada observação era a deixa para a outra fala que, por sua vez, provocava o seu preciso retorno. Uma seqüência que, quando interrompida, fazia perceber o vazio de que era feita; como um colar que, rompido o fio, deixasse ver suas contas, uma a uma, brilhantes e ocas.

Nós fizemos amor, uns com os outros, e conspiramos sombrios pelos cantos mais escuros do porão. Cada grupo de conspiradores tinha seus espiões e traidores que às vezes brigavam entre si. Às vezes havia confusão entre eles, dois ou mais indivíduos disputando o direito de espionar a mesma conspiração. Lembro-me quando o cozinheiro, o carpinteiro, o segundo cirurgião assistente e um marinheiro brigaram com ferros na mão pela honra de trair minha confiança. Outra vez, eram três os assassinos mascarados do segundo turno de vigia, debruçando-se ao mesmo tempo sobre o vulto adormecido do grumete que mencionara na semana anterior possuir: Ouro! Ouro! - acumulado durante oitenta anos (pois é, oitenta) de pirataria enquanto parlamentar pelo distrito de Zaccheus-cum-down e ia à missa todos os domingos. Vi o capitão no alto da ponte cercado de pretendentes à sua mão enquanto ele mesmo tentava adivinhar, sem desembrulhar, o conteúdo de um pacote de livros olhando pela fresta do papel e, ao mesmo tempo, fazia uma serenata para sua amada que se barbeava num espelho.

Nossas falas compunham-se de partes iguais, de alusões dos clássicos, citações diretamente das tabernas, amostras de fofoca copa-e-cozinha, do código de iniciados dos clubes esnobes e do jargão técnico da heráldica. Nós nos vangloriávamos muito de nossos ancestrais e admirávamos a brancura de nossas mãos, sempre que se pudesse ver alguma coisa através da camada de sujeira e graxa que as cobriam. Depois de amor, botânica, assassinato, incêndio, adultério e liturgia, o que mais ocupava nossa conversação eram as artes. A figura de proa do Camelo, representando um negro da Guiné sentindo um mau cheiro, e dois golfinhos corcundas pintados na popa assumiram uma nova importância. O holandês quebrara o nariz do negro com um pontapé e os restos da cozinha haviam praticamente coberto os golfinhos. Mas as duas obras eram objeto de peregrinações diárias de amantes das artes que a cada vez descobriam belezas ocultas, tanto na concepção quanto na excelente e sutil execução. Nós mudáramos muito; e se o suprimento de ficção contemporânea fosse igual à demanda, eu acho que o Camelo seria pequeno para conter as forças morais e estéticas despertadas pela maceração da imaginação dos autores no suco gástrico dos marinheiros.

Tendo conseguido transferir do seu cérebro para os nossos toda a literatura a bordo, o capitão apareceu na ponte de comando pela primeira vez desde que havíamos deixado o porto. Nós continuávamos no mesmo curso, e, fazendo sua primeira observação do sol com o sextante, o capitão constatou que estávamos a 83º de latitude Sul. O calor era insuportável; o ar como o bafo de uma fornalha dentro de uma fornalha. O mar fervia como um caldeirão e no seu vapor nossos corpos eram cozidos - nossa última ceia estava sendo preparada. Empenado pelo sol, o navio tinha popa e proa fora d'água; o convés da proa estava tão inclinado que o touro corria ladeira acima e o holandês se equilibrava precariamente no pico da proa em vertical. Havia um termômetro no mastro principal e nós nos reunimos em volta dele enquanto o
capitão fazia a leitura.

- Oitenta graus centígrados! - ele murmurou com evidente assombro. - Impossível! - virando-se rapidamente, ele correu os olhos sobre nós, e perguntou em voz alta:

- Quem ficou no comando enquanto eu passava os olhos nos livros?

- Bem, capitão - eu respondi, o mais respeitosamente possível -, no quarto dia no mar eu me vi, infelizmente, envolvido numa disputa, no meio de um jogo de cartas, com o imediato e o segundo oficial. Na falta desses excelentes marinheiros, senhor, eu me senti na obrigação de assumir.

- Matou eles, hein?

- Eles se suicidaram, capitão, questionando a eficácia de quatro reis e um ás.

- Bem, seu trapalhão, como é que você justifica esta temperatura absurda?

- Não é minha culpa, capitão. Nós estamos no Sul, muito ao Sul mesmo, e sendo agora o meio de julho, a temperatura é desconfortável, eu admito, mas, considerando a latitude e a estação, não chega a ser absurda.

- Latitude e estação! - ele gritou, pálido de raiva. - Latitude e estação! Sua besta emplumada, quadrúpede, alimária, você não sabe nada? Ninguém nunca disse a você que as latitudes ao Sul são mais frias que ao Norte, ou que julho é o meio do inverno aqui? Considere-se confinado ao seu alojamento, saia da minha frente agora mesmo, seu filho de uma égua, ou eu arrebento você.

Oh! Muito bem - respondi. - Eu não vou ficar aqui de qualquer forma, que não sou homem de aturar esse tipo de insultos, estou avisando. Faça como achar melhor.

Eu mal acabara de falar, quando um vento frio e cortante me fez olhar o termômetro. Segundo as novas noções de ciência geográfica o mercúrio vinha caindo rapidamente; no próximo segundo o instrumento estava completamente coberto por uma nevasca que impedia a visão. Enormes icebergs se levantavam do mar por todos os lados, erguendo-se monstruosamente dezenas de metros acima do mastro e nos cercando por completo. O navio se contorceu e tremeu, empurrado para cima; cada peça de madeira nele rangeu, e o barco fez um último balanço, como o coice de uma pistola. O Camelo congelou rápido. A parada brusca partiu a corrente atirando ao mar o touro e o holandês, que assim continuaram no gelo sua guerra pessoal.

Tentando descer para minha cabine, como me ordenara o capitão, ao passar pelos homens eu os vi caírem, à esquerda e à direita, como bonecos de boliche. A tripulação estava rigidamente congelada. Passando pelo capitão, eu perguntei com certa dose de ironia o que ele estava achando do tempo segundo o novo regime. Ele me respondeu com um olhar vago. O frio tinha chegado a seu cérebro e afetado suas faculdades. Ele disse:

- Nesse delicioso lugar, contentes e estimados por todos, cercados de tudo aquilo que torna a vida tranqüila, eles viveram felizes até o fim de seus dias. FIM.

Sua boca ficou aberta. O capitão do Camelo estava morto.

Fonte:
Flávio Moreira da Costa (org.). Os 100 Melhores Contos de Humor da Literatura Universal. 5.ed. RJ: Ediouro, 2001.