segunda-feira, 9 de março de 2009

Dalton Trevisan (1925)

(O Vampiro de Curitiba)

Nascido em 14 de junho de 1925, o curitibano Dalton Jérson Trevisan sempre foi enigmático. Antes de chegar ao grande público, quando ainda era estudante de Direito, costumava lançar seus contos em modestíssimos folhetos. Em 1945 estreou-se com um livro de qualidade incomum, Sonata ao Luar, e, no ano seguinte, publicou Sete Anos de Pastor. Dalton renega os dois. Declara não possuir um exemplar sequer dos livros e "felizmente já esqueci aquela barbaridade".

Entre 1946 e 1948, editou a revista Joaquim, "uma homenagem a todos os Joaquins do Brasil". A publicação, que circulou até dezembro de 1948, continha o material de seus primeiros livros de ficção, incluindo Sonata ao Luar (1945) e Sete Anos de Pastor (1948). A publicação tornou-se porta-voz de uma geração de escritores, críticos e poetas nacionais. Reunia ensaios assinados por Antonio Cândido, Mario de Andrade e Otto Maria Carpeaux e poemas até então inéditos, como O caso do vestido, de Carlos Drummond de Andrade. Além disso, trazia traduções originais de Joyce, Proust, Kafka, Sartre e Gide e era ilustrada por artistas como Poty, Di Cavalcanti e Heitor dos Prazeres.

Já nessa época, Trevisan era avesso a fotografias e jamais dava entrevistas. Em 1959, lançou o livro Novelas Nada Exemplares - que reunia uma produção de duas décadas e recebeu o Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro - e conquistou o grande público. Acresce informar que o escritor, arisco, águia, esquivo, não foi buscar o prêmio, enviando representante. Escreveu, entre outros, Cemitério de elefantes, também ganhador do Jabuti e do Prêmio Fernando Chinaglia, da União Brasileira dos Escritores, Noites de Amor em Granada e Morte na praça, que recebeu o Prêmio Luís Cláudio de Sousa, do Pen Club do Brasil. Guerra conjugal, um de seus livros, foi transformado em filme em 1975. Suas obras foram traduzidas para diversos idiomas: espanhol, inglês, alemão, italiano, polonês e sueco.

Já no começo dos anos setenta Trevisan é incluído na famosa antologia O conto brasileiro contemporâneo, organizada por Alfredo Bosi, ao lado de Guimarães Rosa, Lygia Fagundes Telles, Osman Lins, Clarice Lispector, Rubem Fonseca e outros treze autores. Bosi, na apresentação, chama a atenção para o fato de que nos contos de Trevisan a concisão é uma obsessão do essencial que parece beirar a crônica, "mas dela se afasta pelo tom pungente ou grotesco que preside à sucessão das frases, e faz de cada detalhe um índice do extremo desamparo e da extrema crueldade que rege os destinos do homem sem nome na cidade moderna". E se nos primeiros livros Trevisan já chama a atenção pela estética de feitio minimalista, com Ah, é? , de 1994, o autor leva o conto a uma espécie de limite e praticamente inaugura o miniconto contemporâneo brasileiro.

São esses três Trevisans, o poeta, o contista e o minicontista, além de um curioso Trevisan cronista e crítico literário, que se reúnem em Dinorá, também datado de 1994 mas publicado um ano depois de Ah, é?, tornando o volume extremamente interessante, verdadeiro ponto de partida para se compreender a obra do vampiro "iconoclasta ou alienado, que abomina o social e o político", como se define o próprio autor em "Quem tem medo de vampiro?".

O poeta, pouco conhecido, bebe do mesmo sangue que o prosador, exibindo seres violentos, velhinhos tarados e tipos pervertidos em versos secos e sem espaço para rimas ou outras gracinhas literárias. Em "Dinorá", por exemplo, texto que dá título ao livro, uma mulher revela ser espancada e maltratada por um homem que a "queima de cigarro e corta de faca". Em "Curitiba Revisitada", o pessoal dá lugar ao social, mas o tom pungente é mantido, criando uma espécie de ode ao avesso de sua cidade natal, "cidade irreal da propaganda/ ninguém não viu não sabe onde fica".

Mesmo sem grande variação de estilo, o contista é o que mais chama a atenção, sem dúvidas. Alternando contos mais longos, de até dez páginas, com contos de menos de uma página, Trevisan demonstra domínio técnico e segurança temática em textos como "O afogado" e "Iniciação", permitindo-se até um tom amoroso e sentimental em "Tiau, Topinho", quando narra em primeira pessoa a volta para a casa de um homem que precisou sacrificar seu cãozinho.

Entre a prosa e a poesia, numa espécie de hibridismo de ambas, surge também o minicontista, o mesmo que assinou sozinho Ah, é?, dono de um estilo em formação e então ainda chamado de "haicai", mas que preferimos chamar de narrativas mínimas, ou minicontos. Há três coleções deles no livro, "Dez haicais", "Nove haicais" e "Oito haicais", o que totalizam 27 mínis (em Ah, é? são 187, todos também sem títulos). E se alguns deles se parecem anedotas, como "Toda noiva goza duas vezes a lua-de-mel: uma, quando casa, e outra, ao ficar viúva", outros preservam muitas características do conto, revelando história oculta, história aparente, conflito e tensão:

Parentes e convidados rompem no parabéns pra você. De pé na cadeira, a aniversariante ergue os bracinhos:
― Pára. Pára. Pára.
Na mesa um feixe luminoso estraga o efeito das cinco velinhas:
― Mãe, apaga o sol.

Numa primeira leitura, o que temos aqui é a história de um aniversário de criança. Mas, indo um pouco além da superfície, veremos o sem-limite dos quereres de uma criança, possivelmente uma criança mimada da classe média, exigindo da mãe mais do que bolos, parabéns e velinhas, exigindo a alteração da natureza para satisfazer seus caprichos.

Mas o mais curioso Trevisan de Dinorá é o cronista/crítico literário. Tal qual um senhor sem papas na língua, escreve sobre Machado de Assis, sobre os críticos de má fé que questionam a traição de Capitu em Dom Casmurro, ironiza Borges e, em "Quem tem medo de vampiro?", brinca com sua própria produção:

"Há que de anos escreve ele o mesmo conto? Com pequenas variações, sempre o único João e a sua bendita Maria. Peru bêbado que, no círculo de giz, repete sem arte nem graça os passinhos iguais. Falta-lhe imaginação até para mudar o nome dos personagens".

Em "Cartinha a um Velho Poeta" e "Cartinha a um Velho Prosador", sobram conselhos e alfinetadas a pretensos escritores:

"Escrever bem é pensar bem, não uma questão de estilo. Os bons sabem de seus muitos erros, os medíocres não sabem coisa alguma. O que há de ser, para você já foi. Não se finge o talento ― falto de engenho, vento é vento e pó. As letras roubadas são falsas."

Não é leitura fácil, sem dúvida: a colagem de textos tão diferentes pode confundir o leitor e dissolver o efeito obtido, tão caro ao conto. Mas o que se perde em unidade se ganha em originalidade e graça, graça que revela um Trevisan mais humano, sem tantos "passinhos iguais" e conhecedor profundo de teoria e história literárias. Que, se não tornam ninguém melhor escritor, estão por trás de toda bem-sucedida carreira literária.

Dedicando-se exclusivamente ao conto (só teve um romance publicado: "A Polaquinha"), Dalton Trevisan acabou se tornando o maior mestre brasileiro no gênero. Em 1996, recebeu o Prêmio Ministério da Cultura de Literatura pelo conjunto de sua obra. Mas Trevisan continua recusando a fama. Cria uma atmosfera de suspense em torno de seu nome que o transforma num enigmático personagem. Não cede o número do telefone, assina apenas "D. Trevis" e não recebe visitas — nem mesmo de artistas consagrados. Enclausura-se em casa de tal forma que mereceu o apelido de O Vampiro de Curitiba, título de um de seus livros.

Inspirado nos habitantes da cidade, criou personagens e situações de significado universal, em que as tramas psicológicas e os costumes são recriados por meio de uma linguagem concisa e popular, que valoriza os incidentes do cotidiano sofrido e angustiante

"O "Nélsinho" dos contos originalíssimos e antológicos, é considerado desde há muito "o maior contista moderno do Brasil por três quartos da melhor crítica atuante". Incorrigível arredio, há bem mais de 35 anos, com um prestígio incomum nas maiores capitais do País. Trabalhador incansável, fidelíssimo ao conto, elabora até a exaustão e a economia mais absoluta, formiguinha, chuvinha renitente e criadeira, a ponto de chegar ao tamanho do haicai, Dalton Trevisan insiste ontem, hoje, em Curitiba e trabalhando sobre as gentes curitibanas ("curitibocas", vergasta-as com chibata impiedosa) e prossegue, com independência solene e temperamento singular, na construção e dissecação da supra-realidade de luas, crianças, amantes, velhos, cachorros e vampiros. E polaquinhas, deveras."

Além da literatura, Trevisan exerce a advocacia e é proprietário de uma fábrica de vidros.

Em 2003, divide com Bernardo Carvalho o maior prêmio literário do país — o 1º Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira — com o livro "Pico na Veia".

Livros Publicados:
- Abismo de Rosas
- Ah, É?
- A Faca No Coração
- A Guerra Conjugal
- A Polaquinha
- Arara Bêbada
- A Trombeta do Anjo Vingador
- Capitu Sou Eu
- Cemitério de Elefantes
- 111 Ais
- Chorinho Brejeiro
- Contos Eróticos
- Crimes de Paixão
- Desastres do Amor
- Dinorá - Novos Mistérios
- 234
- Em Busca de Curitiba Perdida
- Essas Malditas Mulheres
- Gente Em Conflito (com Antônio de Alcântara Machado)
- Lincha Tarado
- Meu Querido Assassino
- Morte na Praça
- Mistérios de Curitiba
- Noites de Amor em Granada
- Novelas nada Exemplares
- 99 Corruíras Nanicas
- O Grande Deflorador
- O Pássaro de Cinco Asas
- O Rei da Terra
- O Vampiro de Curitiba
- Pão e Sangue
- Pico na veia
- Primeiro Livro de Contos
- Quem tem medo de vampiro?
- 77Ais
- Vinte Contos Menores
- Virgem Louca, Loucos Beijos
- Vozes do Retrato - Quinze Histórias de Mentiras e Verdades
- Macho não ganha flor

Livros renegados pelo autor:
- Sonata ao Luar
- Sete Anos de Pastor
(Primeiros livros publicados, que o autor renega. Editores desconhecidos).

Filmes:
- A Guerra Conjugal - histórias e diálogos do autor, roteiro e direção de Joaquim Pedro de Andrade, 1975.

Fontes:
– PAES, José Paulo e ANTÔNIO, João. Jornal O Estado de São Paulo. 20 de julho de 1996.
– SPALDING, Marcelo. O Melhor de Dalton Trevisan. http://www.digestivocultural.com/ . 27 de março de 2008.
http://pt.wikipedia.org/
http://educacao.uol.com.br/
– Imagem = http:// http://www.parana-online.com.br/

domingo, 8 de março de 2009

Gilberto Fernando Tenor (História de Sorocaba)



O povoado de Sorocaba foi fundado em agosto de 1654 pelo capitão Baltazar Fernandes, que veio para esta terra com a intenção de fundar uma cidade. Baltazar queria seguir os passos de sua família, cuja especialidade era iniciar novas povoações e fundar cidades. Seu pai foi o fundador de Santana do Parnaíba e seu irmão mais velho fundou Itu. As terras que Baltazar escolheu para fundar Sorocaba eram de sua propriedade e foram doadas a ele pelo rei de Portugal.

Quando chegou em Sorocaba já existiam na região outras duas vilas: a de Nossa Senhora do Monte Serrat de Araçoiaba e a de São Felipe do Itavuvu. Diferentemente do povoado de Sorocaba, os dois povoados que deram origem as estas vilas foram fundados por homens interessados na exploração dos minérios da região, como o ouro, a prata e o ferro. Este foi o principal motivo pelo qual estes dois povoados não prosperaram, pois a intenção inicial não era fundar um povoado e sim explorar as riquezas da terra.

O primeiro registro histórico de Sorocaba que se tem notícia foi justamente sobre a busca de riquezas nestes povoados. O registro data de 1599, e diz que o então governador-geral do Brasil, dom Francisco de Souza, acreditando na existência de ouro, esteve na região e levantou o pelourinho - símbolo do poder real - na nova Vila de Nossa Senhora de Mont Serrat. Como o ouro não foi encontrado, o governador retomou à Corte. Doze anos mais tarde, o mesmo dom Francisco de Souza mudou o nome da vila para Itavuvu.

Elevação a Vila

Baltazar Fernandes estimulou o povoamento e desenvolvimento da pequena aldeia e, em 1661, requereu a elevação de Sorocaba à categoria de Vila, sendo atendido. Com essa mudança administrativa, o pelourinho foi transferido de Itavuvu para a Vila de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba e o governo nomeou os primeiros integrantes do Poder Público Municipal: os juízes Baltazar Fernandes e André de Zunéga; os vereadores Cláudio Furquim e Pascoal Leite Pais; o procurador Domingos Garcia; e o escrivão Francisco Sanches.

Como o Capitão Baltazar Fernandes, os primeiros moradores da Vila de Sorocaba eram bandeirantes, que buscavam ouro, prendiam indígenas e ampliavam as fronteiras do País.
A cidade cresceu durante os séculos XVII e XVIII e a primeira tropa de muares passou por suas ruas no ano de 1733. O condutor era o Coronel gaúcho Cristóvão Pereira de Abreu, um dos fundadores do Rio Grande do Sul. Pereira de Abreu estava fazendo História e inaugurando o ciclo do Tropeirismo.

Com o tempo, Sorocaba tornou-se um marco obrigatório para os tropeiros, o desaguadouro das mais diversas culturas regionais, e o eixo econômico entre o Norte, Nordeste e Sul. A cidade, com o afluxo de tropeiros, ganhou uma Feira de Muares, onde brasileiros de todos os estados reuniam-se para vender e comprar animais.

A Feira de Muares aglutinou novos moradores e permitiu o florescimento do comércio e da indústria caseira. Facas, facões, redes, doces, peças de ouro para montarias, selas, arreios, estribos e cabos de chicotes, feitos por ourives sorocabanos, ficaram conhecidos em todo o País.

O sueco Frederico Luiz Guilherme de Varnhagem, em 1818, conseguiu fazer funcionar a Real Fábrica de Ferro São João do Ipanema. O pioneirismo de Sorocaba em toda a América Latina no setor metalúrgico é inconteste. A fábrica de Ipanema produziu grande quantidade de ferro, principalmente material bélico, durante a Guerra do Paraguai.

Em 1852, graças à acumulação de capital proporcionada pelas Feiras de Muares, surgiram as primeiras fábricas de algodão e de seda. A experiência industrial não foi longe, mas Sorocaba tornou-se pioneira no plantio do algodão herbáceo - para substituir o arbóreo - para exportação a Inglaterra.

As primeiras sementes de algodão foram plantadas de 1856. Os resultados foram tão bons que, em 1870, Luís Matheus Maylasky, o maior comprador de algodão da região, levantou a idéia da construção de uma estrada de ferro para facilitar a exportação do produto. Assim, cinco anos depois, era inaugurada a Estrada de Ferro Sorocabana.

Política

Na área política Sorocaba também foi destaque. A Revolução Liberal nasceu aqui em 1842. O Brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar foi aclamado presidente da Província de São Paulo para lutar contra o cerceamento das liberdades imposto pelo Poder Central. A Revolução foi vencida, mas Sorocaba foi elevada à categoria de cidade, juntamente com Curitiba, ainda pertencente a São Paulo, e Campinas. A Comarca viria em 1871.

As iniciativas industriais voltaram nos anos 80 do século XIX. Em 1882, foi inaugurada a Fábrica de Tecidos Nossa Senhora da Ponte e, em 1890, as Fábricas de Santa Rosália e Votorantim. Aos poucos, Sorocaba tornou-se um pólo industrial de referência internacional. Por isso, ficou conhecida como a Manchester Paulista

Fontes:
http://www.sorocaba.com.br
Imagem = http://i340.photobucket.com

Gilberto Fernando Tenor (assume dia 10 de março cadeira da Academia Sorocabana de Letras)

Gilberto Fernando Tenor, sorocabano, filho de Juracy Tenor e Thereza dos Santos Tenor. É formado em Administração de Empresas pelas Faculdades Integradas de Itapetininga.

É pesquisador histórico, interessado no resgate da memória das cidades do Estado de São Paulo, tendo destaque para Sorocaba e Avaré, aonde divulga dados sempre de fontes fiéis e documentais.

No campo filatélico, é associado ao Club Philatelico Sorocabano, desde 1983. Sendo presidente do mesmo, dos anos de 1993 a 1998, e 2001/2002. Nestes anos de associação, fez inúmeras exposições filatélicas em Sorocaba e em outras localidades, inclusive fora do Estado de São Paulo, sempre levando o nome do Club nesses lançamentos. Como referência, pode-se destacar o relançamento dos quatro volumes do “O Colleccionador de Sellos”, edição fac-similar, compreendendo os anos de 1896 a 1899, que foi considerado o maior lançamento filatélico dos últimos anos.

Atualmente exerce os cargos de Tesoureiro do Club Philatelico Sorocabano, Presidente do Clube Filatélico Avareense, Tesoureiro da Federação das Entidades Filatélicas do Estado de São Paulo, Conselheiro da Federação Brasileira de Filatelia, Conselheiro da Associação Brasileira dos Jornalistas Filatélicos, Secretário da Associação Paulista de Numismática e Representante no Estado de São Paulo do Clube Filatélico Maçônico do Brasil.

Durante os anos de 2000 a 2003, foi Membro da Comissão de Filatelia e Numismática da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo e diretor da Sociedade Numismática Brasileira, durante 10 anos.

Recebeu as seguintes honrarias: Prêmio Parceiro da Cultura 97, pela Secretaria de Estado da Cultura; Medalha Cidade de Cerquilho 1999, pela Câmara Municipal de Cerquilho; Certificado de Reconhecimento Público, pela Câmara Municipal de Avaré, em 2000; Comenda do Mérito Legislativo “Maneco Dionísio”, pela Câmara Municipal de Avaré, em 2003 e Prêmio Associação Brasileira de Jornalista Filatélico 2004.

Fonte:
http://www.sorocaba.com.br

Célia Abend (Borboleta amarela)


Uma borboleta amarela esvoaçava em plena uma da tarde na Avenida Presidente Antônio Carlos, Centro do Rio. Miragem, só podia ser, pensei. Mas não.

Enquanto eu aguardava impaciente que o motorista do táxi furasse o bloqueio dos ônibus e seguisse a via estreita demais para tanto trânsito, ela borboleteava alegre e faceira no meio do gás carbônico daquela selva do asfalto, sob o calor inclemente de janeiro.

A caminho de um almoço de negócios, atrasada, interpretei aquela aparição como um sinal de boa sorte. Tenho, desde pequena, por influência de minha mãe, uma superstição envolvendo borboletas: quando elas aparecem para mim, algo bom está para acontecer.

A bobagem que costumo utilizar para ludibriar minha alma é o resultado de uma interpretação do filme "Suplício de uma Saudade", um dos grandes sucessos de Hollywood, que minha mãe viu e reviu nos cinemas. Contava a história de uma médica chinesa que se apaixona por um oficial americano. Ele morre na guerra e ela volta à colina cheia de borboletas para se lembrar do dia em que disse a ele, ali, que, para os chineses, este animalzinho é um sinal de boa sorte. Se não é exatamente assim, foi desta forma que aprendi a mensagem do filme, se bem que, se o namorado da moça morreu na guerra, ela não teve tanta sorte.

Passei, desde então, a achar que as borboletas gostam de circular à minha volta. De vez em quando, algumas chegam a pousar em meus ombros. Sem dúvida alguma, sou uma pessoa de muita sorte. Minha vaidade sugere que este poderia ser o argumento de um filme mexicano, do tipo realismo mágico. Meu senso de ridículo indica que isto não daria nem novela venezuelana.

Dentro do táxi, ar condicionado a toda prova, o trânsito não anda um centímetro.

Estressada, começo a me inquietar. Melhor ir a pé, que vai mais rápido, comento, meio sussurrando, só para torturar o motorista, que se angustia e se culpa por ter tomado o pior caminho.

Olho para o lado e lá está ela de novo, grande, amarela, passeando entre os carros.

Não é possível!

Qualquer dia desses vou ler no jornal que as os cientistas descobriram que as borboletas não são aqueles seres inocentes e alegres que sempre pensamos que fossem. Vão dizer que elas são altamente resistentes à poluição e que sua presença nas grandes cidades só comprova a tese de que elas convivem muito bem com um mundo estragado e feio.

Acha difícil? Fizeram isso com as garças, lembra? Aquele serzinho branco, elegante e impávido, à beira da Lagoa Rodrigo de Freitas, dizem eles, está se alimentando do esgoto clandestino que deságua numa das paisagens mais bonitas do Rio.

Outro dia tentaram denegrir a imagem dos golfinhos. Que eles não são tão simpáticos assim, que por trás daquele sorriso maroto há segundas e terceiras intenções.

Desconfio que exista gente no mundo que vive só para acabar com as doces ilusões dos seres humanos. A próxima vítima vai ser a borboleta que passeia na Antônio Carlos, vocês vão ver.
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Sobre a Autora
Célia Abend (1961), é jornalista formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Entre outras funções, foi repórter e chefe de reportagem do "Jornal do Brasil", coordenadora de Comunicação Social da Prefeitura do Rio de Janeiro e assessora de comunicação da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, cargo que exerce atualmente

Fontes:
http://www.releituras.com.br

Ulisses Tavares (Poesia Nota Dez!)

(Depois de percorrer o Brasil nos últimos anos realizando oficinas para professores(as), tentando (e, às vezes, até conseguindo) fazer com que se mudasse o tratamento do assunto poesia em salas de aula, o poeta Ulisses Tavares resolveu resumir sua experiência em forma de poesia auto-ajuda. Acompanhe estes lances da saga do poeta.Como o nome de sua oficina é Poesia Nota Dez! ele manteve os 10 tópicos/dicas/toques para professores(as) e, por que não?, para alunos passarem a seus mestres.)

1: Nem pense em dar nota!

Gentil professorinha, digno professor,
Nem pense em dar nota ao seu aluno
Candidato à poeta, a escritor.
Isso é impossível, até risível,
E a seu aluno só vai causar dor.
Toda poesia é boa,
Até aquela atoa,
Importante é que haja a próxima,
Que vai ser muito melhor.
Incentive, finja, faça cara de satisfeito,
Um dia afinal seu aluno vai acabar
Escrevendo direito.

2. Pelo amordedeus, chega de rap!

Rap, tcháu e benção!
Já valeu, esgotou a cota.
Fazer rap qualquer um faz,
E bem e certinho.
Tão certinho que deixa de ser poesia
Passa a ser água fria.
Existem mais de 368 ritmos musicais
Tantos, que ai meus sais! Nem agüento ouvir.
Professora empenhada mesmo
Apresenta a seus alunos o ermo:
Catira, catiretê, desafio, candango.
Original é inovar, mudar, surpreender,
O resto é ver pra crer, lugar comum avalizar,
E isso não é ensinar.

3: Sociedade dos poetas vivos!

Drummonds, Vinicius, Cecílias,
Tudo bem, nada mal,
Apenas que a poesia do Brasil
Este país de poetas, varonil,
Vai muito além disso.
Poetas, aqui, não se contam apenas
Entre os oficiais, os consagrados,
Livres de suas cadenas,
Os poetas não estudados ainda,
Pedem seu olhar, sua atenção,
Um olhar liberto, atento,
De cabeça e coração.

4: Competição, só de criatividade!

Parece muito bacana,
Mas é uma tremenda armadilha.
Me refiro a campeonatos,
Concursos de poesia, minha filha.
O mundo já é hostil e competitivo
O suficiente
O que resulta nesta sociedade indecente.
Promova exposições, recitais, leituras,
E premie a todos, na cara dura.
Todo poeta se aprimora
Com o tempo, desde cedo
Ninguém vai fazer poesia boa
Para competir, com medo.

5: Moderno é ser antigo, bem antigo.

Viaje com seus alunos
Pela máquina do tempo da poesia.
Leia os romanos, os gregos,
Suas grandes biografias.
Eles vão adorar saber, e repetir,
O que os loucos poetas da antiguidade
Já fizeram por séculos:
Encenar poesias com máscaras,
Se fingir de cegos,
Dramatizar com bocas e caras,
Imitar animais
Guerras e misturar poemas e cantos
Em animados jograis.

6: Poeta tira poesia até de jornais!

O Mário Quintana já dizia
Num toque de sabedoria:
Poeta deve ler jornais e revistas.
Onde se lê notícias, veja-se poesia!
Crianças e jovens,
Curiosos que são,
Adoram, se bem conduzidos,
Transformar a notícia do dia
Em pura, instantânea poesia!
Pode até se transformar num hábito
Uma molecagem do dia a dia:
Um Jornal do Poeta
Colado na parede da sala de aula
Renovado por todos,
Onde o coração fala
Caudaloso, a rodo.

7: Palimpsesto, uau!

Os egípcios que inventaram
O tal do palimpsesto:
Não passa de apagar o escrito
E nele escrever outro texto!
Sabe aqueles poemas
Que você encontra em qualquer
Livro didático?
Pegue um deles, seja prático,
E proponha aos alunos
Que o reescrevam de seu jeito.
Não vai sair perfeito, garanto,
Mas é um estímulo e tanto.

8: Antes era Zeus, depois foi Deus, hoje sou Eus!

O título aí de cima é um poeminha
Do anarquista Roberto Freire
Meu guru, meu amigo,
Que resume bem essa onda juvenil
De só se interessar pelo próprio umbigo!
Comece por aí, se quiser,
Que muito bem irás a poesia
Encontrar do jeito que vier e der.
Acrósticos são poemas feitos
A partir das letras do próprio nome,
Do ego aplaca a fome,
E a partir do nome de cada um
Pode-se exercitar palavras, poesia,
O que se encontra em Carfanaum?
Car…ro, fan…ho, um…ído?
Nossa!, a lista é infindável
Se encontra de zona à escapulário.
E assim se aprende o fazer poético
O qual não se faz sem um grande vocabulário!

9: A poesia é igual a pamonha de Piracicaba!

Poesia, neste mundo da matéria,
De tênis de marca, drogas e miséria,
Fica sempre parecendo assunto
Estapafúrdio, escalafobético, fora do mundo.
Nada disso, não é não, nadinha:
Poesia é coisa também fresquinha
Saída agora para consumo imediato,
Deliciando a alma,
Com pressa ou com calma.
Que tal, por exemplo, propor
Para tirar a classe do estupor
Que cada um escreva, já, agora,
O que gostaria de dizer
Para sua paquera, para sua família,
Em uma frase?
Daí pegar aquela frase e reescrever
Em forma de poesia?
É pagar pra ver como aquilo
Que era imediatista vira o que se sonha.
Teremos poesia, não papo de pamonha.

10: Real e aspiracional.Uma experiência animal!

A gente já sabe,
Quem ensina mais ainda:
Há uma grande dificuldade
Do pré-primário à faculdade,
Do aluno sair de si mesmo
De voar para o desconhecido, o ermo.
Conte pra ele, então,
Que todo mundo é…dois!
O que se é no real, e no aspiracional depois.
O careca se imagina cabeludo,
A gorda, magra,
O rejeitado, amado em tudo,
E por aí vai a saga humana,
Sempre um degrau a mais de seu real.
Pois a verdade é que só a poesia
Pode expressar e dizer
O meu verdadeiro aspiracional!

11: Não force a barra, só incentive.

De fato algumas pessoas,
Talvez a maioria,
Nunca vai gostar de poesia.
Aceite o fato, a vida é assim.
É como tocar música clássica
Para alguém que só ouviu pagodeiros
A vida inteira, na bobeira.
Tenha uma postura elástica:
Vá mostrando diferentes tipos de poetas
Diferentes tipos de poesia
Seja abundante, pródiga, escorreita.
De repente, seu aluno se identifica
Com alguma poesia, algum poeta, uma via,
E nela ou nela gruda, fica.

12: Não despreze a Internet, a poesia foi pra lá!

Tudo bem que a classe,
Sem classe como é,
Foi pra internet ver mulher pelada.
Deixa, isso é quase nada.
Mas tem outras coisas lá
Também bem interessantes.
Que tal criar um blog de poesias
De seus alunos?
Eles podem interferir,
E até mudar o papo de rumo.
O que não pode acontecer
É professor(a) descuidado
Que nem sabe nada de computador
E de seus alunos fica desplugado!
A internet é cruel e simples:
Ou você entra já ou é deletado.

Fonte:
Edição do Ano I - Número 5. http://www.ulissestavares.com.br

Dicionário do Folclore (Letra E)



EBÓ. É uma comida africana, trazida pelos escravos. Faz-se com farinha de milho branco, sal ou misturada com feijão-fradinho torrado. Depois, quando estiver fervendo, junta-se o sal ou azeite de dendê. Foi, o ebó, a primeira refeição de Oxalá no palácio de seu filho Oxum-Guiam, quando voltou da prisão, libertado por Xangô, também seu filho. Ebó significa, ao mesmo tempo, o feitiço, a muamba, a coisa-feita, o despacho. Veja DESPACHO.
ECLIPSES. Os agricultores nordestinos, por ocasião do eclipse lunar para que não morra a plantação de algodão, costumam acordar os pés de algodão gritando, batendo em latas, dando tiros de espingarda. Acreditam que as crianças, filhos de brancos, quando nascem durante os eclipses, têm a cor morena. É uma tradição universal.
EFÓ. O efó é um prato da cozinha baiana, feito da seguinte maneira: Cortam-se em pedacinhos folhas de taioba. Depois de bem aferventadas, escorre-se a água, usando-se uma peneira grossa. Tempera-se com camarões secos, descascados e bem moídos, cebola ralada, coentro, pimenta e sal. Junta-se, em seguida, um pedaço de peixe seco ou bacalhau, dando-se preferência aos pedaços da cabeça, com os ossos. Cozinha-se com pouca água, até ficar como pasta bem cozida e bem enxuta. Põe-se um pouco de azeite-de-dendê, mexendo-se bem. O efó é servido numa terrina untada com azeite-de-dendê quente. Come-se com arroz branco, acaçá ou aberém.
EFUM. É uma cerimônia que consiste em pintar a cabeça do iauô, candidato ao posto de filho-de-santo. Raspada a cabeça, no início da cerimônia, ela é pintada com as cores do orixá ao qual se devotará. A escolha das cores é feita pelo babalaô. O efum será apagado com uma infusão de ervas também dedicadas ao mesmo orixá.
EMBIGO-DE-FREIRA. É um biscoito doce muito popular na Bahia.
EMBIRICICA. 1. É uma fieira, que se faz com uma embira, dos peixes, depois de pescados; 2. Também é, no sentido figurado, a gente que acompanha, em Belém, PA, os cordões-de-marujos durante o carnaval, os boi-bumbás no São João e as pastorinhas no Natal.
EMBOLADA. É uma forma poética musical, improvisada ou não, em compasso binário, cuja melodia é declamada em intervalos curtos, e que é usada pelos cantadores como refrão coral ou dialogada. O rei dos emboladores foi, sem nenhuma dúvida, Manuel Pereira de Araújo, conhecido artisticamente como Manezinho Araújo, o pernambucano que, na época, divulgou em todo o Brasil, através das estações de rádio e de televisão, bem como em discos, seus grandes sucessos como "Pra onde vai, valente?", "Cuma é o nome dele?", "O caminhão do Coroné".
EMENDAR-A-CAMISA. É o duelo sertanejo. Os contendores têm suas camisas amarradas pelas pontas e, armados de faca ou punhal, lutam até que um deles caia morto.
EMENDAR-OS-BIGODES. É lutar, corpo a corpo, solucionar um caso de honra, resolver uma parada, como o povo diz.
EMPELICADO. Diz-se da criança que nasce com a cabeça coberta com uma membrana branca chamada pelica. O povo acredita que a criança que nasce empelicada será uma pessoa rica quando crescer.
ENCAMISADA. Era um cortejo nos carnavais passados, saindo às ruas apenas na segunda-feira, vestindo camisas compridas até os pés, mascarados de branco, dançando, fazendo graça. Aparecia a encamisada nos carnavais do Rio Grande do Norte e da Paraíba. No carnaval atual é feita uma sátira como a dos encamisados; a crise financeira fez do cortejo ou bloco carnavalesco, os descamisados (sem camisas).
ENCOMENDAÇÃO-DAS-ALMAS. Nas sextas-feiras da Quaresma, até os meados do século XIX ou mesmo durante o mês de novembro (conhecido como mês das almas), saiam procissões noturnas que percorriam as principais ruas da cidade, em sufrágio das almas do purgatório. A procissão saía da igreja entre onze horas e meia-noite, com os homens à frente, com as feições encobertas, conduzindo lanternas. Cantavam ladainhas, rezavam rosários em voz alta. Todas as casas das ruas por onde a procissão passava estavam com as portas fechadas e as luzes apagadas. As portas ou janelas que estivessem abertas eram alvo de pedradas. Alguns devotos se flagelavam.
ENCRENCA. Encrenca significa complicação, problema, confusão, terminando muitas vezes, em briga. Termo da gíria dos gatunos do Rio de Janeiro, a palavra se espalhou pelo país a partir de 1911, na agitação política das eleições estaduais. Muitos maridos costumam, carinhosamente, chamar suas esposas de Dona Encrenca. Quando o automóvel pára com algum defeito, o povo diz que "o carro encrencou".
ENCRUZILHADA. A encruzilhada é a parte onde os caminhos se cruzam. É, apesar de sua forma geométrica, o local dos demônios. Nas encruzilhadas os gregos e romanos depositavam presentes a Hécate, aos fantasmas. A tradição foi trazida pelos portugueses colonizadores. Os índios e os escravos não conheciam os mistérios das encruzilhadas que era coisa de brancos. Nos cultos afro-brasileiros, Exu também é conhecido como o homem das encruzilhadas.
ENFEITAR-O-MARACÁ. É contar uma estória, enfeitando o mais possível, para que se torne verdadeira sem ser, com a intenção de convencer as pessoas que estão ouvindo. É uma expressão corrente no Nordeste, especialmente em Pernambuco.
ENGENHO-NOVO. É uma dança popular do Nordeste, pertencente aos cocos de ganzá. Homens e mulheres dançam em roda, soltos, cantando com o ritmo da embolada, batendo palmas: "Engenho-Novo,/ Engenho-Novo,/ Engenho Novo,/Bota a roda pra rodar". No sul do país (São Paulo e Minas Gerais) o engenho novo é uma dança diferente, também chamada guarapá.
ENGUIÇO. É o nome que se dá ao mau-olhado, quebranto, caiporismo, mau-agouro, empecilho. Também é coisa pequena mas difícil de ser feita. Passar a perna pelo corpo de alguém que estiver deitado, é enguiço. A pessoa não cresce mais. Para desenguiçar, basta apenas fazer o contrário, isto é, passar a perna no sentido contrário.
ENSALMO. O ensalmo é uma oração supersticiosa cujas palavras foram tiradas dos salmos, usado pelos curandeiros para as pessoas voltarem a gozar saúde.
ENTERRO-DOS-OSSOS. É um almoço do que sobrou da refeição do dia anterior (festa de casamento, batizado, aniversário, etc.). Já em Mato Grosso, é um clube carnavalesco que sai no primeiro domingo depois do carnaval. Os foliões, vestidos de preto, trazem caveiras pintadas e instrumentos musicais tocando musicas fúnebres. Conduzem caixões mortuários cheios de galinhas, perus, churrascos e cachaça à vontade. O povo ri, come e bebe à vontade.
ENTRUDO. É o período de divertimento popular, que compreende os três dias que precedem a Quarta-Feira de Cinzas. É o carnaval, com seu nome primitivo.
ERÊ. É um orixá filho de xangô. Trata-se de um espírito inferior, um companheiro da filha-de-santo. Todas as pessoas que têm santo, também têm um erê, que pode ser de Cosme, de Damião, de Doú ou de Alabá.
ESCADA. Muita gente não passa por baixo de uma escada, superstição muito espalhada no Brasil. O pernambucano Joaquim Nabuco não era supersticioso, mas nunca passou por baixo de uma escada. A escada lembra a subida, a elevação social, econômica. E passar por baixo do que sobe é renunciar à melhoria social, econômica. Quem passa por baixo de uma escada fica marcando passo a vida inteira, sem melhorar de vida.
ESCALDADO. É um prato da culinária brasileira, feito com carne, ou peixe ou crustáceos cozidos num molho especial, com azeite-doce, tomate, coentro, sal, jiló, quiabo e ovos inteiros. Quando o caldo começa a ferver, põe-se, na panela, o peixe e os camarões tratados. O pirão escaldado é feito com farinha seca, pondo-se em cima colheradas do caldo, bem quente.
ESPELHO. Quando uma pessoa morre todos os espelhos da casa devem ser cobertos com pano preto durante toda a semana após sua morte. Não é bom a pessoa falar diante do espelho porque terá sonhos horríveis, pesadelos. Não se deve pôr recém-nascidos diante de espelhos; se assim acontecer, eles vão demorar a falar. Essas superstições correm o mundo todo.
ESPERANÇA. Diz o povo que quando uma esperança (inseto ortóptero) pousa numa pessoa é porque vai acontecer coisa agradável. Há, também, a crença da esperança da boca preta, que traz má sorte quando pousa em alguém.
ESPIA-CAMINHO. É uma planta que geralmente nasce à margem dos caminhos, onde a terra é mais fértil, por receber fezes dos animais, restos de comida, etc. As mulheres têm raiva da espia-caminho e, por onde elas passam, costumam arrancar todos os pés que encontram. As mulheres acham que a espia-caminho tem uma flor imoral, parecida com o órgão sexual feminino.
ESPIRRO. O costume de se dizer: "Salve!", "Viva!", "Saúde!", "Deus te salve!" quando uma pessoa espirra, é muito antigo e universal. Os romanos acreditavam que espirrar à meia-noite e ao meio-dia era sinal de más notícias, o que não acontecia se a pessoa não espirrasse ao meio-dia, à meia-noite. A pessoa não deve espirrar quando se deita na cama pela manhã ou quando estiver à mesa durante as refeições. O povo diz que quando o doente espirra não morre nesse dia. O espirro faz com que a pessoa fique livre das bruxarias.
ESQUENTA-MULHER. Conjunto musical popular em Alagoas, constante de dois ou três pífes (flautas rústicas de bambu), uma caixa, dois zabumbas (bombos) e pratos de metal. Veja CABAÇAL.
ESTAR-DE-BODE-AMARRADO. Diz-se de quem está de mau humor, macambúzio, triste, sem achar graça em nada.
ESTHER KARWINSKY, Baronesa, nasceu em Brodosqui. SP. Advogada pela Faculdade Católica de Direito de Santos, professora, museóloga, com diversos cursos de extensão no Brasil, na França, no México, tendo participado em congressos e festivais de Folclore em Marrocos, na França, no Chile, nos Estados Unidos, na Grécia, na Hungria, na Noruega, em Portugal, Canadá, na Argentina, na Áustria, na Índia, na China, na Alemanha, nos quais apresentou comunicações sobre assuntos pertinentes ao Folclore brasileiro, Esther Karwinky é membro da Comissão Paulista de Folclore, da Comissão Municipal de Folclore e artesanato de Guarujá (SP), da Associação Brasileira de Folclore, da American Folklore Society, da Societé d’Éthnologie Française, da Société Internationale d’Ethnologie et Folklore – SIEF, da International Society for Folk Narrative Research - ISFNR e da Folklore Fellows da Finlândia e, na área de Folclore, publicou Danças e folguedos (1974), Guarujá, uma experiência em levantamento de Folclore (1975), Festas Folclóricas fixas mais importantes da Ilha de Santo Amaro (1977), Museus e museologia (1990) e O Caiçara (1993), além de ensaios e artigos na imprensa e revistas especializadas.
ESTILINGUE. O mesmo que baladeira, badoque ou bodoque.Veja ATIRADEIRA.
ESTÓRIA. É o conto popular. A estória de Trancoso com que os contadores-de-estórias deliciam a criançada, principalmente nas cidades do interior. Os contadores de estórias eram, geralmente, pretos velhos, avós e pessoas de idade avançada.
ESTRELA. A estrela é cercada por um mundo misterioso de crendices e superstições. Quem aponta com o dedo indicador (o fura-bolo), uma estrela no céu ou conta as estrelas (uma, duas, cinco, dez, etc.) nascerá no corpo tantas verrugas quantas estrelas a pessoa contar. Tem a oração das estrelas que, rezada com muita fé, faz com que as pessoas alcancem a proteção divina. Quando a pessoa tem uma íngua, sai de casa, à noite, fita uma estrela qualquer, coloca a mão direita sobre a parte inflamada e diz, três vezes: "Minha estrela donzela, esta íngua diz que morrais vós e viva e crença nela, eu digo que cresçais vós e morra ela". O povo também tem muito medo das estrelas cadentes, que correm no céu. Acreditam que se uma estrela cadente cair na Terra, o mundo se acabará. Outras pessoas dizem que toda vez que correr uma estrela, uma alma entrará no céu.
EXCELÊNCIA. A excelência, ou incelença como o povo diz, é um canto entoado por muitas pessoas à cabeça do moribundo. Cantam sem acompanhamento musical, aos pés do morto e os benditos à cabeça do falecido. A excelência tem o poder de despertar no moribundo o arrependimento de seus pecados. As excelências também são cantadas em Portugal e de lá foram trazidas pelos colonizadores.
EXIBIÇÃO-DE-PROVA-DE-VIRGINDADE. Nos idos de 1870, era costume, no Sertão nordestino e vários países da Europa, os noivos mostrarem às pessoas que estavam esperando na manhã seguinte ao dia do casamento, o lençol manchado de sangue, comprovando, assim, a virgindade da recém-casada. Quando uma moça era falada, por seu procedimento, as pessoas duvidavam da sua virgindade, dizendo: "Aquela não mostra os panos..."
EXU. É o Demônio nos cultos afro-brasileiros. Exu é respeitado, temido e objeto de culto. Nada se faz sem Exu e para se conseguir qualquer coisa é preciso fazer o despacho de Exu. Exu também é conhecido como o homem das encruzilhadas.

Fontes:
LÓSSIO, Rúbia. Dicionário de Folclore para Estudantes. Ed. Fundação Joaquim Nabuco
Imagem = http://www.terracapixaba.com.br

Ciranda de Trovas do Paraná: Sabedoria

 A maior sabedoria de quem sabe o seu saber é saber que a cada dia sempre tem o que aprender. NEI GARCEZ CURITIBA O dom da Sabedoria do Espírito Santo é graça de ver, com santa alegria, o Bem até na desgraça. LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE PINHALÃO Deus nos dá sabedoria, para o bem que nos conduz amor que, com a alquimia, nos torna um farol de luz! VANDA ALVES DA SILVA CURITIBA Quando eu sonhava, eu não via quanta chance... que passou! Faltava a sabedoria que o mestre Tempo ensinou. VANDA FAGUNDES QUEIROZ CURITIBA Quem vive a maturidade mantendo a mesma alegria revela que na verdade conquistou sabedoria. LEONILDA YVONNETI SPINA LONDRINA Escolher rumos amenos, inovar o dia-a-dia, errar menos... Sempre menos... Também é SABEDORIA. MARIA DA GRAÇA STINGLIN DE ARAÚJO CURITIBA Não se tem sabedoria só com estudos a esmo. É coisa que se inicia no conhecer de si mesmo. GERALDO PEIXOTO DE LUNA LONDRINA Não busque a felicidade pelas trilhas da utopia, busque- a dentro da verdade e à luz da Sabedoria. WALNEIDE FAGUNDES DE SOUZA GUEDES CURITIBA Teço a alegria em minha alma com muita sabedoria. Tecendo-a feliz e calma, faço mais belo o meu dia! ARLENE LIMA MARINGÁ Sem ser um sabedor,ia buscando a felicidade. Sem achar sabedoria foi se perdendo na idade FAHED DAHER APUCARANA A vida é força, poder, vinda de Deus com amor! Sabedoria é entender tão pouco tempo a dispor ! VIDAL IDONY STOCKLER CURITIBA Se a noite é escura e vazia pela fé, que é a luz Divina, vejo que a Sabedoria não brilha, mas, ilumina. WANDIRA FAGUNDES QUEIROZ CURITIBA Quem usa a sabedoria não briga, apenas debate. Ponderado, desconfia que o adversário quer combate. YAYÁ PETTERLE PORTUGAL CURITIBA Usar de sabedoria é o segredo nesta Vida para haver paz e alegria do Nascer à Despedida!... SÔNIA DITZEL MARTELO PONTA GROSSA A minha alma em espiral buscando a Sabedoria, foge do mundo banal para o reino da harmonia. ROZA DE OLIVEIRA CURITIBA
Fonte: Ciranda de Trovas Sabedoria – http://www.tekanascimento.net/ciranda_trova_sabedoria.htm

sábado, 7 de março de 2009

Como fazer um gibi


Para desenhar os quadrinhos é preciso, além da inspiração, conhecer algumas técnicas

Se você tem uma idéia incrível para uma história em quadrinhos, já está a meio caminho de conseguir fazê-la. Mas há etapas a serem cumpridas antes de seu gibi ser um sucesso. Veja.

1. Criação dos personagens

Dos protagonistas aos tipos secundários, o autor precisa planejar tudo, para não cair em contradição mais tarde. O ideal é ter em mente cada personagem, com a personalidade, o aspecto físico, o estilo das roupas, os vícios e as virtudes. Nessa fase, o artista deve desenhar cada um dos tipos em posições variadas e em expressões faciais bem marcadas. Treinando o seu traço não haverá perigo de, ao longo da história, o personagem ficar irreconhecível.

2. Argumento e roteiro

O argumento é a idéia geral da história, com começo, meio e fim. Quando é trocado em miúdos, tem-se o roteiro, que deve ser planejado quadro a quadro. Nessa fase as páginas são diagramadas, as cenas descritas e os diálogos finalmente definidos.

3. Desenho

A lápis, as linhas de todos os elementos das páginas são marcadas ­ personagens, cenários, balões (já no caso dos textos, escritos a lápis), onomatopéias (palavras que reproduzem sons naturais, como Tchibum! Pou! Crás! ) e os contornos dos quadrinhos.

4. Letras

Com tinta nanquim (seus alunos podem usar uma caneta hidrográfica preta de ponta fina), o texto dos balões e as onomatopéias são finalizados. Os profissionais trabalham com páginas cujo espaço para letras já vem pré-marcado. Um erro muito comum para quem está começando é entusiasmar-se demasiadamente e desenhar todo o quadrinho antes de decidir o texto que acompanhará a imagem. Quando chega a hora de preencher os balões, descobre-se que o espaço é curto. Aí é tarde. Planeje, então, o desenho e o texto simultaneamente. O melhor modo de fazer isso é checar e rechecar o seu roteiro.

5. Arte-final

Como as letras, os demais elementos gráficos recebem a tinta preta, cobrindo cuidadosamente os traços a lápis e corrigindo eventuais falhas. Você pode optar por usar caneta ou pincel. Para dar efeito de luz e sombra, pode-se hachurar ou pontilhar. Nos quadrinhos de autor, o arte-finalista e o desenhista são a mesma pessoa.

6. Cor

A última etapa antes da impressão do gibi é a colorização dos quadrinhos. Os desenhistas profissionais vêm usando cada vez mais programas gráficos de pintura por microcomputador. Na classe, os alunos podem optar entre os lápis de cor, as canetinhas ou outras técnicas de pintura que já tenham sido trabalhadas em sala de aula.

Para ler mais

Livros sobre gibis trazem desde análises profissionais até piadas sobre super-heróis

Há uma boa bibliografia para quem quiser aprofundar-se no estudo dos gibis, conforme você pode conferir abaixo.

Como Fazer Histórias em Quadrinhos, de Juan Acevedo Global Editora, 1990. O autor organizou uma oficina de quadrinhos para crianças e, com base nessa experiência, ensina no livro os fundamentos práticos da HQ. Tel. (011) 277-7999, 22 reais.
Desvendando os Quadrinhos, de Scott McCloud, Makron Books, 1995. Artista e roteirista premiado, McCloud analisa profundamente a estética e a semiologia dos gibis.
História da História em Quadrinhos (2ª edição), de Álvaro de Moya, Editora Brasiliense, 1993. Em 34 artigos, o professor da Escola de Comunicações e Artes da USP descreve mais de 160 anos de evolução dos quadrinhos no mundo, desde seus precursores até o cenário atual. Tel. (011) 887-8436.
O Homem no Teto, de Jules Feiffer. Companhia das Letras, 1995. Romance juvenil sobre um garoto que sonha ser quadrinista, mas não conta com o apoio dos pais.
A Linguagem dos Quadrinhos, de Moacy Cirne, Editora Vozes, 1971. Estudo detalhado das criações de Mauricio de Sousa e de Ziraldo.
Quadrinhos e Arte Seqüencial, de Will Eisner, Editora Martins Fontes, 1989. Eisner, lenda viva entre os fãs do gênero, disseca a estrutura narrativa das HQs e sugere a aplicação dos quadrinhos em outros setores, como a educação.
Super-herói ­ Você Ainda Vai Ser Um, de Marcelo Duarte, Companhia das Letrinhas, 1996. O divertido jornalista revela os segredos dos personagens mais musculosos e poderosos dos quadrinhos

Fontes:
Revista Nova Escola. abril de 1998. Reportagem de Capa. edição 111
Imagem = http://saresp.edunet.sp.gov.br

Histórias para quem está começando



Escolas usam revistas para apresentar as primeiras letras às crianças de 3 a 5 anos

Para ler gibis não é preciso saber ler. Aliás, os quadrinhos parecem mesmo feitos sob encomenda para apresentar as primeiras letras. Eles são coloridos, têm textos curtos e são velhos conhecidos da garotada, que costuma ter contato com eles quando ainda usa fraldas. "Os desenhos conseguem comunicar algo para a criançada", assegura Fernanda Flores, orientadora pedagógica do Colégio Fernando Pessoa.

Balõezinhos apagados

No Fernando Pessoa ­ onde as fotos desta reportagem foram feitas ­, tirinhas simples são projetadas na parede e lidas para os alunos, que têm entre 3 e 5 anos de idade. A professora aponta com o dedo o trecho que está lendo e ajuda as crianças a compreender o enredo e a decifrar as expressões dos personagens.

Na fase de alfabetização, algumas escolas propõem como exercício apagar as falas dos balõezinhos dos personagens e pedir às crianças que interpretem a seqüência de desenhos e criem sua própria história. Algo parecido com o que faz a arte-educadora Cecifrance Aquino, da The Global School, de Salvador, capital da Bahia. Ela recorta uma historinha, separa os quadrinhos um a um e monta um quebra-cabeça. Embaralhado, ele pode ser reorganizado pela criançada em uma nova seqüência. "Um ótimo estímulo à criatividade", diz ela.

Uma leitura dividida que une a turma

Ao lerem a mesma história em voz alta, alunos de 1ª série avançam na alfabetização

A leitura dos gibis permite, a partir da 1a série, identificar elementos constitutivos do texto. "Pode-se explicar o que é um título e que ele sintetiza o enredo da história", explica Paula Stella, do Colégio Fernando Pessoa.

Outro bom exercício para os recém-alfabetizados é a leitura compartilhada de gibis. Cada um recebe um exemplar da mesma revista. A professora escolhe um episódio e começa a lê-lo em voz alta. Em determinado ponto, pára e pede que um aluno continue a leitura. A tarefa é passada para a próxima criança, até que todos tenham lido. A leitura em comum acaba uniformizando o desempenho da turma.

Exercício para `amiorá´ a ortografia

O linguajar caipira de Chico Bento vira lição na classe de 2ª série

Expressões regionais tiradas de gibi vão para o quadro-negro: grafia corrigida
As caipirices do personagem Chico Bento, criado por Mauricio de Sousa, fascinam alunos e professores. Os alunos acham o personagem simpático e se identificam com os apertos que ele passa em sala de aula. Já os professores gostam do Chico Bento, por mais curioso que seja, porque ele fala "errado". Os ocê, bão, num, lasquera, sem-vregonhera e aminhã que ele usa em suas histórias são motivo para divertidos exercícios de ortografia nas turmas de 2ª série. De quebra, a leitura crítica das aventuras rurais do Chico Bento servem para debates sobre regionalismos e o uso da linguagem falada nos registros culto e familiar.

No Fernando Pessoa, a professora entrega aos alunos cópias xerocadas de uma história do personagem e pede que eles, em duplas, discutam e marquem as palavras escritas erradas.

Palavras corrigidas

Ao final da atividade, as palavras marcadas pelas crianças são reproduzidas no quadro-negro e, ao seu lado, anotada a ortografia correta. A professora debate com a turma em que situações pode-se usar expressões mais familiares e em que momentos o recomendável é expressar-se obedecendo à norma culta.

RODA DE BIBLIOTECA

A idéia é simples: aumentar o acervo de gibis à disposição dos alunos e permitir que eles mesmos escolham e recomendem as melhores HQs uns aos outros. Trata-se da Roda de Biblioteca. Nela, os alunos levam exemplares de gibis e os apresentam para o resto da turma. Depois, cada criança escolhe um título e o leva para casa. Em outro dia, a roda se reúne novamente. É quando cada estudante conta e comenta o que leu.

Ninguém é obrigado a ler nem a professora cobra a leitura.

Revistas já foram jogadas na fogueira

As HQs nunca foram tão bem-vistas nos seus 103 anos de existência como agora. Elas são consideradas uma eficaz ferramenta pedagógica por muitas escolas e as famílias permitem que entrem em suas casas. Mas nem sempre foi assim. Rotulados de subliteratura, os gibis já foram acusados de serem a causa principal da delinqüência entre os jovens americanos dos anos 50. Nesse período, marcado pela intolerância ideológica, era comum a queima, em praça pública, das revistas consideradas inadequadas.

É fácil ter uma gibiteca na escola

Acusadas de má influência sobre a juventude, elas foram vítimas de uma caça às bruxas

Existem no país centenas de gibitecas públicas e particulares. Muitas delas estão instaladas em escolas do ensino fundamental. Se a sua escola não tem ainda uma gibiteca, não perca tempo. É fácil e barato organizar um variado acervo de gibis. Comece escolhendo um espaço adequado para o tamanho da sua coleção. Prefira um local seco e instale estantes resistentes. Papel costuma pesar bastante e pode até quebrar prateleiras de má qualidade. Veja, ao lado, mais dicas para organizar sua gibiteca.

1- Prepare pastas especiais para guardar os gibis mais finos e de capa mole, que não se sustentam em pé. Cole etiquetas na lombada das pastas e identifique seu conteúdo

2 - Ao catalogar os gibis, use a mesma metodologia adotada para os periódicos da biblioteca. Os álbuns e livros em quadrinhos obedecem à norma fixada para os livros

3 - Organize as prateleiras segundo um desses critérios: título, gênero (infantil, super-heróis, humor, ficção etc), autor ou formato

4 - Faça fichas de empréstimo e estabeleça prazos para devolução. As regras têm de ser claras. Os atrasos devem acarretar multas, mesmo simbólicas

5 - O estado de conservação dos exemplares depende dos alunos. Não os deixe esquecer disso. Se houver disponibilidade, organize escalas periódicas para as crianças cuidarem da gibiteca

Elas ensinam até a evitar enchentes

HQs já foram usadas para denunciar ações da CIA e prevenir catástrofes naturais

Os gibis vêm sendo usados com sucesso como instrumento de disseminação de idéias e de utilidade pública. Há dez anos, nos Estados Unidos, o Christic Institute, uma entidade de defesa dos direitos humanos, escolheu um gibi como veículo ideal para denunciar as ações ilegais da CIA ­ o serviço de inteligência do governo americano. O gibi causou a indignação do eleitorado daquele país. O fato pesou no fracasso do então presidente George Bush em tentar sua reeleição. Bons exemplos de gibis educativos são Os Três "Mosquiteiros", da década de 60, e Chega de Enchente, lançado em 1990. A primeira, desenhada por Carlos Estevão, apresenta o Elefantinho ­ antiga mascote da companhia de petróleo Shell ­ dando dicas a um garoto sobre como evitar a disseminação de mosquitos e pernilongos. A segunda, assinada por Ziraldo, traz o Saci Pererê e sua turma explicando a moradores das favelas cariocas como poderiam ser evitados as enchentes e os deslizamentos de terra.

Fontes:
Revista Nova Escola. abril de 1998. Reportagem de Capa. edição 111
Imagem = https://lx1.letti.com.br/planetagibi.com/compramos.php

Convite para posse na Academia Sorocaba de Letras

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Fonte:
Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece

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Fonte:
Colaboração de Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece

Vikas Swarup (Quem Quer ser um Milionário?)


O livro que inspirou o filme Quem quer ser um milionário?, vencedor de 8 Oscars em 2009, é ainda muito melhor que o filme, segundo a crítica.

Sua resposta vale um bilhão, romance de estréia do diplomata indiano Vikas Swarup, é uma narrativa à maneira das Mil e uma noites, com uma história central em que um personagem conta histórias para outro. O contador de histórias aqui é Ram Mohammad Thomas, um garçom de dezoito anos que ganhou um bilhão de rupias - o maior prêmio de todos os tempos - num programa televisivo de perguntas e respostas. Os organizadores do concurso, inadimplentes, se recusam a pagar o prêmio. Alegam que um garoto inculto como Ram não poderia conhecer as respostas, e o entregam à polícia para que ele seja torturado e confesse a fraude. Salvo por uma advogada, Ram terá de contar a ela a história de sua vida. Cada episódio explica como ele ficou sabendo coisas como o significado da inscrição INRI, que aparece nos crucifixos, e qual a maior condecoração por bravura concedida pelas forças armadas indianas. Unificadas pela presença do protagonista, herói picaresco que sempre acaba se saindo bem, graças a uma combinação de esperteza e sorte, as narrativas são ora cômicas, ora trágicas e apresentam um rico panorama da Índia contemporânea, onde passado e presente, miséria e opulência, religiosidade e comercialismo, ternura e violência se misturam.
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MATÉRIA NA FOLHA DE S. PAULO - 28/02/2009

Livro quer mostrar a "nova Índia", não miséria. Autor de obra que originou "Quem Quer Ser um Milionário?" tenta expor país "dinâmico"

"Sua Resposta Vale um Bilhão", de Vikas Swarup, tem reedição no Brasil; escritor diz querer romper com literatura maravilhosa indiana

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

A volumosa premiação no Oscar do filme "Quem Quer Ser um Milionário?", do diretor britânico Danny Boyle, fez o mundo observar e lamentar a dura vida nas favelas da Índia. Curiosamente, o livro que deu origem à produção condecorada com oito estatuetas no último domingo está longe de ser uma obra preocupada em expor a miséria do país.

"Sua Resposta Vale um Bilhão", do indiano Vikas Swarup, 46, agora relançado no Brasil, é um thriller urbano. Nele, o protagonista é também um rapaz pobre que se dá bem num programa de perguntas e respostas televisivo. Mas a comparação vai só até aí.

Enquanto Boyle preferiu reforçar o papel da favela na vida do rapaz, Swarup leva seu herói a vagar por cidades do que considera ser a nova Índia, ouvindo histórias inusitadas e aparentemente aleatórias, mas que o ajudam a acertar as questões que surgem quando está diante das câmeras.

Swarup diz que quer romper com a tradição da literatura maravilhosa indiana. "Não sou Salman Rushdie, quero escrever livros de mistério e suspense, que se passam no mundo real", disse à Folha, em entrevista por telefone. E, por mundo real, Swarup entende a nova situação geopolítica da Índia.

"Todos querem saber como o país se moderniza e cresce tão rápido, mesmo neste momento de crise, e ainda assim consegue manter um pé em tradições e costumes", diz, orgulhoso, o homem que durante o dia exerce atividades diplomáticas. Atualmente, trabalha na embaixada de seu país em Pretória, na África do Sul.

Fábula

"A questão das favelas não é importante para o meu trabalho, busco a Índia das transformações", explica. E acrescenta: "As pessoas estão acostumadas a olhar para nós e ver o exótico ou a pobreza. Minha literatura quer mostrar que lá tudo é mais complexo e dinâmico."

Ao tentar construir um romance que tocaria indianos de todos os cantos e religiões do país, criou o personagem central com diversos elementos. O garoto Ram Mohammad Thomas, como o nome indica, é, ao mesmo tempo, hindu, árabe e cristão. "Na Índia, quando alguém diz o nome, é possível saber sua religião, a parte do país de onde vem e até que comida consome. Ao juntar os nomes, fiz uma figura que representa todas as crenças e culturas."

A produção cinematográfica e a obra literária obedecem a um mesmo eixo narrativo. Há um garoto pobre e sem formação que vence um programa do tipo "Show do Milhão" porque, por sorte, sabe as respostas. Essa "sabedoria" é adquirida ou por experiência própria ou por ter ouvido uma história em que a resposta aparece.

Do livro para o filme, permanece essa linha, mas as situações mudam. Na história original, por exemplo, há uma passagem da guerra entre Índia e Paquistão que não seria possível reproduzir nas telas com o curto orçamento do filme. Este, por sua vez, cria soluções mais rápidas e ágeis para obedecer à montagem pop da produção. "Não acho ruim que tenham mudado as situações. O que me deixa feliz é que a estrutura narrativa, a essência da história permanece e, no final, dá sentido ao conjunto", diz Swarup.

Mas ele aponta que há algo distinto entre os dois formatos. "O filme é sobre o destino; o livro é sobretudo acerca da sorte e da esperança. Thomas adquire conhecimento sem necessariamente estar atrás dele. E isso é algo que nos passa sempre na vida sem nos darmos conta. Ele teve sorte de tropeçar em coisas que lhe seriam valiosas no futuro. Mas será que isso não é comum a todos nós? E só precisamos prestar atenção no que nos passa diante dos olhos? Reparar nos acasos também é construir conhecimento. Ele sai vitorioso ao notar isso."

"Sua Resposta Vale um Bilhão", primeiro livro do autor, já havia sido traduzido para 37 línguas antes mesmo do Oscar. O segundo, "Six Suspects", saiu na Inglaterra em 2008.
SUA RESPOSTA VALE UM BILHÃO
Autor: Vikas Swarup
Lançamento: Companhia das Letras
Tradução: Paulo Henriques Britto
343 págs.
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SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

O humor negro cumpre diversas funções em "Sua Resposta Vale um Bilhão", de Vikas Swarup. É o que permite, por exemplo, transitar pelo cenário de extrema pobreza dos meninos de rua indianos - em Déli, Mumbai (antiga Bombaim) e Agra - sem perder a batalha para o sentimentalismo.

A autoironia da narração em primeira pessoa, com ótimo uso de frases curtas e imagens recorrentes, possibilita também que doses pesadas de crítica sociopolítica sejam feitas de maneira mais efetiva do que se o texto discursasse, com ar professoral, contra as injustiças do país.

O órfão Ram Mohammad Thomas -cujo nome, sozinho, já embute o colorido anedótico do romance, ao fundir raízes hinduístas, muçulmanas e cristãs- aprende a se fazer de bobo, o que ajuda na sobrevivência, mas às vezes é mesmo ingênuo, o que o atira em dificuldades.
A alternância entre esperteza e fragilidade, o olhar agudo e a verve inquieta do protagonista criam com o leitor a cumplicidade necessária para que se associe esse contumaz contador de histórias à Sherazade de "As Mil e Uma Noites" e também ao personagem manipulador de Kevin Spacey em "Os Suspeitos" (1995).

Todos eles envolvem seus interlocutores porque precisam sobreviver, mas Ram Mohammad Thomas o faz também porque precisa falar. Ao torná-lo porta-voz de uma geração de indianos excluídos, em trama muito mais rica, suja e engenhosa do que sugere o filme "Quem Quer Ser um Milionário?", Vikas Swarup o transforma em um daqueles personagens que não queremos abandonar ao final do livro.

Fonte:
Colaboração da Livraria Resposta.
http://www.livrariaresposta.com.br

Márcio Bueno (A Origem curiosa das palavras)



Por que razão chamamos um veículo de jardineira e uma escola de jardim-de-infância, se nenhuma relação existe com flores ou plantas ornamentais? De onde vem o termo chorinho, se a música é alegre e brejeira? Em que circunstância o verbo azarar, que significa urubuzar, incorporou o sentido de paquerar? De onde vêm termos usados no mundo do futebol como barbada, embaixada, frango, gol olímpico, lanterna, zebra etc.? Por que chamamos uma ave de peru (Peru), os povos de língua inglesa chamam de turkey (Turquia) e os de francesa de dinde (da Índia), se não é originária de nenhum desses três países?

Márcio Bueno, com seu espírito inquieto e questionador, decidiu procurar respostas para várias dessas questões intrigantes. Aliás, tem por hobby colecionar a história de palavras que apresentam alguma curiosidade em seu nascimento, em sua evolução ou ao assumir novas acepções.

A partir de 1995 e durante sete anos, o passatempo transformou-se em pesquisas sistemáticas, com consultas a trabalhos dos mais conceituados etimólogos, filólogos e historiadores de língua portuguesa, de outras línguas neolatinas e também de germânicas. E o autor foi além, desenvolvendo pesquisas de campo que apresentaram resultados surpreendentes, como a descoberta da origem de biruta, que até hoje os estudiosos não haviam identificado. O resultado final é um dos mais sérios e profundos estudos de etimologia voltados para o grande público. As surpresas se sucedem a cada página.

Profissional de televisão, Bueno tem uma forte ligação com imagens. Essa é a razão por que o livro é ilustrado com desenhos e fotografias de objetos e personalidades que deram origem a palavras que usamos no cotidiano. Em diversos verbetes, é possível conhecer as injunções políticas e econômicas que motivaram o surgimento de novos vocábulos. No verbete cuba-libre, por exemplo, são desvendados os interesses que estiveram por trás da criação do nome e também da própria bebida. Em muitos outros casos, o autor fala da origem das palavras e também da própria coisa significada, a exemplo de asa delta, bina, capoeira, chorinho, tênis etc.

Embora respeitando fundamentalmente o que dizem os estudiosos, o autor descobriu pelo menos um caso em que a razão está com os chamados iletrados. Segundo suas pesquisas, quando o povo pula do bisavô para o tataravô, ignorando solenemente a existência do intermediário, o trisavô, está tão somente resistindo a uma mudança que teve como base um equívoco cometido no século XIX. No capítulo Influência Portuguesa, o autor nos brinda com termos correntes em diversos outros idiomas, incluindo o inglês, o francês e o japonês que tiveram origem em nosso idioma. É o momento de maior elevação da auto-estima de quem fala português.

O AUTOR

Márcio Bueno é jornalista e publicitário. Trabalhou ou colaborou em publicações como os jornais Movimento, Pasquim, Folha de São Paulo, Jornal do Brasil e O Globo. Em televisão, foi editor nacional de telejornais na Rede Globo, dirigiu telejornais e programas na Rede Manchete e exerceu a função de superintendente de Jornalismo na TV Educativa. É co-autor do livro 20 Anos de Resistência - As Alternativas da Cultura no Regime Militar, publicado em 1986 pela Editora Espaço e Tempo.

Fonte:
Colaboração da Livraria Resposta.
http://www.livrariaresposta.com.br

sexta-feira, 6 de março de 2009

Miguel João Simão (O Poeta no Papel)



SONHOS

O mar a brandir nas pedras
Faz-nos ouvir uma canção
Mesmo distante das águas
Eu as vejo com o coração
E penso com saudade de alguém
Da minha ardente paixão

Depois lembro do sol
Com seu infinito esplendor
De dia clareia a terra
À noite mantém seu calor
Tornando a lua fogosa
Querendo mostrar seu amor

Por isso sofro quieta
Não posso mostrar minha dor
Sofro na vida sozinha
Por um proibido amor
Vivo iludida por sonhos
Sonhos que alguém me encantou

(extraído do livro maria de ganchos- pag 38)
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HOMENAGEM AO PESCADOR

Lá vai o filho do mar
Com o chapéu de palha
Com o remo na mão
Buscando o sustento nas águas
Rezando contra tudo que lhe atrapalha
Sonhando com um pedaço de pão.

Depois da noite perdida
Recolhe a rede e nada vê
Olha pra cima e suspira
Clama por Deus e por Nossa Senhora
Pois começa a chegar a hora
De sua família rever.

Chega em casa de mansinho
Olha a esposa e o filhinho
E começa a resmungar
O mar foi traiçoeiro
Eu perdi o dia inteiro
E nada pude juntar.

A esposa o acalenta
E não o deixa falar
Amanhã tu vai de novo
No mesmo tempo, na mesma hora
E clamamos por Nossa Senhora
Que ela vai te ajudar.

Assim o dito foi feito
Pobre tem seu direito
É só saber insistir
O mar foi traiçoeiro
Apenas quem chegar primeiro
E a Deus saber pedir.

Das profundezas das águas
A rede puxou com a mão
Olhou pro céu e sorrindo
Agora com o sustento na mão
E a Deus já foi pedindo
O seu sagrado perdão.
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"ETERNAMENTE IOLANDA"

Dos olhos que tudo vê
Do silêncio que tudo percebe
Da sua sabedoria infinita
Deus percebia que algo faltava.

Deu-nos o céu com todas as estrelas
Até onde a vista pode alcançar
Cobriu-nos com o calor do sol
Com as lágrimas da chuva
Com a luz da lua e com o cheiro do mar.

Fez das flores inspirações
Imagens perfeitas para o homem sonhar
Jardins cobertos de cores
Rosas perfumadas, azaléias delicadas
Prontas para o beija-flor beijar.

Fez tudo, tudo... com perfeição
Criou céus, terras e mar
Não queria mais se incomodar?
Faria o mundo perfeito para o homem desfrutar.

Mas, viu que algo precisava para o mundo melhorar
Mandou anjos cercados de paz
Criaturas santas preparar o caminho
Haveria de mandar a mais bela das fadas
Aquela que me faria perceber a nobreza de sua obra
A grandeza de seu poder, a plenitude do seu amor.

Nos mandou a fada menina
Menina moça vestida de fada
Bela entre outras que o mundo tem
Sorriso faceiro, olhar revelador
Que nós chamamos de IOLANDA
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Miguel João Simão (A Rosa que eu Perdi...)

Do alto do campanário da velha igrejinha sentada no topo do morro, o sino badalava sem cessar.

O sino era tão velho quanto a construção das paredes da igrejinha rebocadas com óleo extraído de fígados de baleias.

Lembro-me bem do dia, quando chegou na lancha do Pereirinha, deu uma trabalheira só, para tira-lo e leva-lo até a igreja. Inventaram mil maneiras para subir o morro com o sino, mas não foi fácil! Foi tão difícil quanto pendura-lo no alto, de onde badala todos os domingos chamando o povo a rezar.

A igreja foi um sonho do povo que necessitavam de um lugar para rezar. Sua construção data de 1941, mas não é a data da pedra fundamental, que foi
colocado no local bem antes, nem se sabe ao certo quanto tempo antes. É de conhecimento do povo, que por volta de 1850, um tal de Manoel Florêncio dos Santos, juntou alguns moradores do lugar e fincou ali, um pouquinho na frente onde está a igreja hoje, uma grande cruz de madeira como sinal da fé católica. Essa cruz só foi tirada do lugar por volta de 1925, quando construíram uma igrejinha de madeira que, então, foi substituída pela de tijolos.

Todo mundo queria ver a igrejinha acabada, com janelas, com portas, com uma torre bem alta. Muitos não alcançaram, foram embora desse mundo antes da obra ficar pronta, não chegaram nem a conhecer o padre. Mas, outros tiveram até o privilégio de vestir seus primeiros ternos na inauguração, chapéus de carmuça e lenços brancos no bolso do paletó.

Para as “moças de famílias” não faltou o véu que lhes cobriam os rostos e que só eram levantados na hora de tomar a comunhão. Roupas descentes, sem decotes e as saias abaixo dos joelhos, é claro.

Teve até a banda de músicos que veio de Florianópolis, foi aquele festão!

A rua toda enfeitada com bandeirolas que se entrelaçavam nos arcos feitos de bambus.

Depois da missa, começava a domingueira no salão improvisado ao lado da igrejinha. Salão Poeira, como diziam os hilários de plantão. Uma cobertura com lonas, cercado com uns pedaços de madeira, e ali todos se divertiam.

De um lado as moças acompanhadas pelas mães, e de outro os moços que volta e meia tentavam se assanhar. As vezes dava certo para alguns, outros não estavam no seu dia de sorte, bastava um olhar de desprezo da moça desejada para perder toda vontade que tinham de dançar.

Foi em uma dessas vezes que Pedro se encheu de coragem e respondeu ao olhar fascinante da mais bela jovem que ali estava a enfeitar ainda mais a festa.

Chegou de mansinho, meio envergonhado e pediu permissão para aquela dança. Prontamente a moça aceitou, não se mostrou difícil como algumas faziam na hora que chegava um moço que não lhe agradasse e acabavam indo apenas por serem obrigadas. Naquela época era assim, em nome dos bons costumes e do respeito, a filha só entrava no salão, acompanhada pela mãe. Mulher separada não podia dançar e nem se misturar com as outras mulheres de família. E a moça que negasse a dançar com um moço, era convidada a se retirar do salão.

Começaram a dançar. Os olhares se atentaram a eles, centro de atenção por criarem um momento de raro esplendor. Formou um belo casal aos olhos dos mais velhos que ali estavam e deu inveja nos mais jovens.

Ele era nativo da pacata vila de pescadores denominada Canto dos Ganchos, localidade pertencente ao Distrito de Ganchos, que pertencia ao Município de Biguaçu, e que só foi emancipado em 1963, passando a se chamar Governador Celso Ramos em 1967. Descendia de uma mistura de alemães com portugueses. Alemães por parte do pai e portugueses puro por parte da mãe. O moço moreno claro, de olhos meio esverdeados trazia bem os traços das duas raças. Alto, de bela presença, chamava a atenção por onde passava. Foi educado sobre olhares vigilantes e disciplinadores do pai e da mãe, que não davam moleza para filhos fazerem o que quisessem. Esses predicados somados à vontade e o capricho na hora do trabalho lhe destacavam entre outros moços de sua época.Acompanhava o pai nos trabalhos de carpintaria e se tornou bom profissional, um dos mais procurados na região. Não dava mole para o serviço, parecendo que nunca se cansava de trabalhar.

Ela chamava-se Rosa, uma rosa pura e bela que chamava a atenção por onde passava por sua beleza ímpar. Seus avós paternos eram alemães, que chegaram em Tijucas no finalzinho do século XIX. Os avós maternos foram desbravadores italianos que ajudaram a construir a colonização italiana em Santa Catarina. Chegaram em meados do século XIX, em Nova Trento.

Loira pura de cabelos amarelinhos e de olhos azuis, lindos como o céu clareado sem nuvens, era percebida sempre por onde passava. Sua simpatia, seu carisma eram qualidades admiradas por todos que lhes conheciam.

Essa dança foi o primeiro contato que ela teve com um moço desconhecido, por isso tão marcante para sua vida. Era a primeira vez que saia só, sem a companhia dos pais.

Natural da cidade vizinha de Tijucas, conhecia a vila de Ganchos apenas de nome. A imagem que desenhava em sua memória sobre o lugar, era de um povoado com poucos casarios, adormecido entre os morros e que se pode num olhar longínquo avistar a vizinha cidade de Tijucas, que é separada apenas pelas águas do Atlântico.

Mal terminava essa dança e o músico já comunicava a dança da gasosa, um costume da época que, muitas vezes, esvaziava o salão e que permaneciam apenas os poucos sortudos.

A dança da gasosa era uma espécie de brincadeira que acontecia em todos os bailes, onde as moças eram quem convidavam os moços a dançar, e como uma maneira generosa de retribuir o convite, o moço pagava um refrigerante (uma gasosa) para a moça. Nesse momento, ficavam todos de orelhas bem em pé, pois os convidados geralmente eram seus futuros pretendentes ao namoro. As moças só convidavam mesmo para dançar, quem elas tinham interesses futuros e não para ganhar uma gasosa.

Rosa dirigiu seu olhar encantador para Pedro. As expressões no rosto, o sorriso singelo já dizia tudo, era o convite para dançar.

Na primeira dança nem uma palavra, mas na dança da gasosa já estavam mais soltos, mais a vontade, e puderam trocar algumas palavras que marcariam aquele momento como único, sagrado para o jovem casal.

Final de tarde! Algumas estrelas começam a pintar o céu, que vai perdendo o azul irradiante pelo tom escuro da noite que se aproxima. A domingueira termina, as moças dirigem-se as suas casas, apenas os rapazes ficam ainda por mais tempo trocando idéias, fazendo comentários da festa, dando boas gargalhadas.

Rosa vai acompanhada da tia e da prima, mesmo assim ainda consegue deixar algumas palavras de despedida a Pedro, visto que partiria cedo no dia seguinte.

Na manhã de inverno, daquele 30 de junho, agasalhada com um casaco que lhe protegia do frio, ela se despede dos parentes e embarca na lancha que a levaria até Tijucas. Ficou na terra recém conhecida a marca sublime da primeira paixão, ficou ali o homem que lhe conquistou com gestos, com palavras. Não trocaram nem um beijo, mesmo porque não ousariam se encorajarem a tanto e quebrar uma norma tão rígida. Se houvesse um beijo, um abraço forte que alguém visse, a moça ficaria mal-falada e o moço seria punido, na maioria das vezes, obrigavam-lhes casar. Mas sentiram suas mãos suarem no aperto das mãos a cada passo da dança.

Enamoraram, se atreveram em deixar que seus olhares fossem olhados por outros. Não ousaram em ultrapassar os limites impostos pela sociedade, mas não esconderam a vontade de ficarem juntos, Quando chegou em casa, não levou muitas novidades, o pai já sabia da festa, das companhias e até da dança.

O pai de Rosa era um homem duro, incompreensível, áspero. Era do tipo que achava que um bom pretendente para a filha tinha que ser dali dos arredores, gente de família conhecida, menino que ele viu nascer e crescer, nada de gente de fora. Dizia que paixão é igual fogo de palha, logo se apaga. Um bom casamento não precisa ter paixão, amor, essas coisas tiradas da cabeça de gente nova. Um bom casamento se fazia com obediência. Mulher obediente e trabalhadeira tem futuro, pega bom casamento. A moça tem que ser prendada, saber cozinhar bem para agradar o marido, usar bem o ferro de passar para não amarrotar a roupa, deixando-a bem passada. Coisas que as moças eram obrigadas a aprender com as mães, para a família não passar vergonha quando a filha casasse. Uma moça que não soubesse fazer as atividades domésticas, se viesse a casar, envergonharia a família inteira, pois os comentários seriam passados a frente, e todo mundo acabava sabendo.

Por mais que Rosa, com a ajuda da compreensiva mãe, tentasse explicar que tinha sido apenas uma dança, o homem não queria entender. Para tanto, tratou logo de arrumar um casamento para a filha. O moço em questão era de família tradicional de Tijucas e há muito tempo se interessava por Rosa.

No pacato vilarejo de Ganchos, Pedro continuava suas atividades profissionais ao lado do pai. Em suas horas de solidão, buscava no amigo violão o antídoto para suas dores de cotovelos. Cantava, inventava canções, declamava poesia, vivia um sonho acordado.

Era um incansável lutador pelo sonho que desenhou ao lado de Rosa. Sempre que ia alguém de confiança para Tijucas, mandava uma carta. As viagens à Tijucas eram comuns na época e aconteciam quase todos os dias. Sempre ia alguém para Tijucas, fazer compras, buscar remédios nas benzedeiras, vender crivos, enfim, sempre alguém tinha alguma coisa para fazer em Tijucas, visto ser uma cidade desenvolvida, com muitos recursos por aqui inexistentes.

Em todas as cartas recebidas por Rosa vinha a certeza do amor de Pedro. Mas, seu coração partia de dor em imaginar que já era comprometida, mesmo contra-gosto, mas por força de seu pai. Pedro sabia das atitudes do pai de Rosa, mas a cada casa, a cada barco que terminava de construir, guardava o dinheiro, moeda sobre moedas, pois haveria de surpreender a família de Rosa. Era uma promessa feita para si mesmo, economizar, e quando tivesse um montante suficiente iria à Tijucas e fugiria com a moça.

Namorou Rosa quase um ano por carta e se encontraram depois daquela inesquecível domingueira apenas duas vezes, tempo suficiente para jurarem amor eterno.

O primeiro encontro aconteceu em Tijucas, a beira do rio, onde Rosa lavava roupas. Foi rápido, tempo suficiente para trocarem algumas palavras. Ali nada de exageros, pois, era um local aberto e passavam muitas pessoas. Conversaram rapidamente, trocaram poucas palavras e apenas deram como despedida um forte abraço. E ele como verdadeiro apaixonado deixava de lembrança uma linda rosa vermelha que colhera pelo caminho.

A segunda vez que se encontraram, foi como se o destino preparasse a despedida de ambos. Era um sábado qualquer. Sem ter o que fazer naquela tarde, Pedro estava em casa descansando, quando é convidado por seu pai a visitar alguns amigos em Tijucas. Prepararam a embarcação e se foram, mar a dentro. Chegando lá, na casa de Manuel, um dos amigos da família de Pedro, o jovem avista Rosa, que caminhava solitária na rua á beira rio.

Pedro deixou seu pai com o amigo e correu ao encontro de Rosa. A moça que escuta o chamado de Pedro, resolve esperá-lo debaixo de uma velha figueira plantada a mais de cem anos, debruçada sobre o rio Tijucas, fazendo sombra aos velhos pescadores que, do gigante de águas claras, tiram seu sustento.

O fogo ardente da paixão dominou o local, os olhares se cruzaram e suas bocas se beijaram. Parecia um sonho que estavam vivendo, e que preferiam não acordar nunca. Rosa conta a Pedro do namoro obrigado que seu pai a fez aceitar, e ele promete que em breve, muito breve haveria de arrumar uma solução para o caso.

Aqueles momentos que viveram juntos, aqueles minutos marcados na vida de Rosa, lhes apertavam mais o coração. Pedro fora embora, lhe prometeu que viria busca-la e não o fez. Comentários de “boca pequena” diziam que Pedro já havia lhe esquecido, e quando ela imaginava isso, sentia uma dor horrível no peito que lhe sufocava a alma. Rosa imaginava que Pedro o enganara, que havia lhe esquecido, que tudo o que viveram fora para ele, uma brincadeira. De outro lado, o pai de Rosa insistia em apressar mais o casamento. Ver a filha casada com o pretendente que ele escolheu, já era uma questão de honra.

Enquanto isso, Pedro trabalhava incansavelmente e não via a hora de buscar Rosa, pois já fazia algum tempo que ele não recebia notícias dela. As costumeiras cartas já não lhe eram respondidas e, depois do último encontro, ele recebeu apenas uma carta sua, que suplicando ela dizia que o casamento, logo seria marcado.

No sábado, depois da Páscoa, do ano seguinte, com uma quantia de dinheiro que era suficiente para assumir tamanho compromisso, o de tirar uma moça de família de casa de seus pais e dá-lhe o conforto necessário, Pedro se preparou para buscar Rosa.

Acordou feliz! Como se tivesse achado ouro enterrado. Ele foi buscar um terno que mandou o alfaiate fazer, engraxou seus sapatos e tratou com um dono de embarcação a hora da surpresa. Quer dizer, surpresa para a família de Rosa, porque em Ganchos todos sabiam que Pedro iria se casar, iria buscar a sua amada para viverem juntos para sempre. Ali não era segredo para ninguém, todos comentavam em todos os lugares, desde as fontes onde as mulheres lavavam roupas até nas salgas, onde trabalhavam na limpeza dos peixes.

Eram três horas da tarde, horário em que o dono da embarcação desce a lancha para o mar. Na praia, familiares e amigos de Pedro se faziam presentes. Todos torcendo pelo bom jovem, que era querido por todos na terra.

Mar calmo! E lá se vão os homens, remando rumo à Tijucas. Na entrada da barra já se avista as casas e a Igreja de São Sebastião. Foram eles se aproximando e vendo a presença de pessoas que se dirigiam para a igreja. Pessoas bem arrumadas, carroças e charretes enfeitadas e cheiro de festa no ar. Pedro, os dois remadores e o dono da embarcação atracam a canoa no Porto e desceram. Eles sabiam que naquela data não havia comemoração alguma na igreja, e para um sábado comum só podia ser festa de casamento.

A curiosidade de Pedro instigou-lhe a perguntar uma senhora, qual era a festa que tinha na cidade. A senhora que também se dirigia à igreja, sorrindo, calmamente falou:

- É o casamento da Rosa, filha do seu Antônio, com Geraldo, o filho do fazendeiro.

Os remadores e o dono da embarcação baixaram a cabeça e só as levantaram quando os sinos da igreja anunciavam a entrada da noiva. Ficaram estáticos, nem os olhos se mexiam, esperando a reação de Pedro que teve seu olhar transformado em dor, solitário, aprisionado. Lágrimas lhes caiam do rosto, mas manteve a postura de um homem educado, nem uma palavra falou, apenas pasmo ficou.

Não acreditou no que aquela mulher havia falado, preferiu ele mesmo confirmar com seus próprios olhos.

Deixou todas as pessoas entrarem na igreja, e quando os noivos se aproximam do altar, ele chega de mansinho a porta da igreja. Olha as pessoas, a igreja, dirige seu olhar em direção aos noivos.

Peito rasgado, não conseguia imaginar Rosa nos braços de outro, para viver como manda os mandamentos de Deus. Casar para a vida toda, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. Queria uma explicação plausível para o caso, queria saber se Rosa havia deixado de lhe amar. Saiu da porta da igreja da mesma maneira que ali chegou, e preferiu esperar o casamento terminar próximo a embarcação.Gostaria de poder olhar nos olhos de Rosa, mesmo que fosse pela última vez.

Quase uma hora depois, saia da igreja a noiva de braços dados com o noivo. Ela não o percebeu. Soube, muitos anos depois por uma amiga, que Pedro tinha ido lhe buscar, bem no dia de seu casamento.

Ele pode apreciar sua beleza, mesmo de longe, lá da barranca do rio, viu pela última vez sua amada, como desejou um dia vê-la, vestida de noiva.

Ordenou aos homens que dessem a volta na lancha e dando seu último olhar em direção a igreja, com os olhos marejados de lágrimas, disse: Lá se foi a Rosa que eu perdi.....

Fonte
http://recantodasletras.uol.com.br/