sábado, 12 de setembro de 2009

Dicionário do Folclore (Letra S)


SÁ-DONA. Tratamento que os homens do interior, camponeses, dão às senhoras casadas (Nordeste).

SABÃO. É uma dança do fandango no Rio Grande do Sul, São Paulo e Pernambuco, bastante popular nos meados do século XIX.

SABER-ONDE-O-CALO-APERTA. Saber, a pessoa, as suas dificuldades, os seus problemas.

SABONGO. É um doce feito com coco ralado e com mel de engenho ou de rapadura até o ponto apertado, para ser comido puro ou com farinha de mandioca. A mesma coisa que cocada, com um ponto mais brando.

SACI-PERERÊ. É um duende conhecido em diversas regiões brasileiras do sul, é um negrinho que só tem uma perna, ágil, astuto, atrevido, traquinas, gosta de fumar cachimbo, tem as mãos furadas, usa uma carapuça vermelha que tem poderes mágicos e que lhe cobre a carapinha. À noite, ele assobia, inquietando as pessoas, criando-lhes dificuldades, apagando o fogo, queimando os alimentos, assustando os viajantes durante a noite. O Saci é associado ao Diabo entre os mestres de folias de reis. Tudo faz crer que o Saci tenha nascido no século XIX.

SACOLÉ. É um picolé feito em casa, mas acondicionado em pequenos sacos plásticos, amarrados com linha, sem o pauzinho. Para saboreá-los só é preciso cortar uma das extremidades do saquinho e puxá-la para baixo.

SAGUIM. É um macaquinho que anda aos bandos. Dizem que o saguim morre se alguém lhe fizer uma careta. Também é conhecido como saguí, sauí e sauim.

SAIA-SAIÁ. Dança do fandango, do Paraná.

SAIA-VERDE. As meninas da saia verde são entidades que se manifestam no catimbó nordestino. São incontáveis, moram no fundo do mar, um dos reinos invisíveis.

SAIDEIRA. É como se diz do último copo de bebida na despedida de um dos parceiros ou quando a farra se acaba.

SAIETA. É um doce tradicional em Minas Gerais, feito da polpa de coco da palmeira buriti.

SAL. Usado no batismo da Igreja Católica, com aplicação universal para afastar os malefícios sobre a criança. Um dos feitiços que se possa fazer para maltratar uma pessoa é misturar sal com areia na pegada de uma criatura tendo, no meio, uma unha, um cabelo e um pedaço de roupa íntima. O contra feitiço é diluir o sal na água do mar. Pôr sal à porta de uma rival, obriga-a a deixar o namorado. Derramar sal na mesa é agouro. A sabedoria popular diz que para se conhecer um amigo, a pessoa tem que comer sal com ele, isto é, conviver algum tempo. O sal era a moeda circulante entre alguns povos antigos e dizem até que entre os indígenas brasileiros. Por isso a palavra salário é derivada de sal.

SALA-DE-DANÇA. Nome que se dá, na Bahia, aos candomblés que não seguem a tradição autenticamente africana.

SALGAR-O-GALO. É tomar a primeira dose do dia. É matar o bicho.

SALIVA. Com a saliva Jesus curou cegos e surdos-mudos. Na década de 40 andou pelo Agreste e Zona da Mata de Pernambuco um cidadão que se dizia médico e que aplicava injeções de saliva para curar determinadas doenças. A saliva tinha que ser de uma criança. Já na feitiçaria, a saliva pode até matar. Na medicina popular vamos encontrar a saliva usada para combater o mau-olhado. A saliva não deve ficar exposta, mas, coberta com areia ou esmagada com os pés para que o diabo não se apodere dela, hábito muito nordestino na zona rural.

SALTAR FOGUEIRA. Acontece por ocasião das festas do ciclo junino, quando as fogueiras são acesas; saltá-las, é um folguedo tradicional, como prova de coragem e agilidade de quem assim procede.

SAMBA. É baile popular nas cidades e na zona rural, sinônimo de função, pagode, fobó, arrasta-pé, balançar-o-esqueleto, balança-flandre. A palavra samba vem de semba e significa umbigada na língua dos escravos de Luanda que aqui chegaram. Somente em 1916 apareceu, pela primeira vez, a primeira música impressa mencionando a palavra samba: "Pelo telefone", de Donga, compositor carioca.

SAMBA-DE-LENÇO. O samba-de-lenço tem sua origem africana. Homens e mulheres, em fila, todos com um lenço na mão acenando para os cavalheiros e, homens e mulheres, formando pares, se dirigem ao centro, dançam ao som de uma caixa e, às vezes, pandeiros e guaiás.

SAMBOCA. É uma mistura de água de coco com açúcar.

SAMBURÁ. É um cesto feito de cipó, de tamanho pequeno, preso por um cordão grosso, para se trazer a tiracolo. Os pescadores botam no samburá os peixes que pescam. Na linguagem popular barriga de samburá é a pessoa que tem barriga grande. Pescar para o seu samburá é cuidar de seus negócios, de seus interesses.

SANFONA. É o mesmo que acordeona ou acordeon, fole, harmônica. No Rio Grande do Sul este instrumento musical é conhecido como gaita.

SANGRIA. 1. É uma mistura de vinho tinto com água e açúcar, aconselhada às mulheres que dão à luz, para aumentar o leite; 2. É uma incisão que se faz numa das veias para soltar o sangue, tratamento de algumas doenças quando a medicina estava engatinhando.

SANGUE-DE-BARATA. Como se sabe, a barata não tem sangue. E quando se diz que uma pessoa tem sangue-de-barata significa que essa pessoa é insensível, calma demais.

SANHAÇU. Pássaro também conhecido por sanhaço, que gosta muito de comer mamão. Na linguagem popular, sanhaçu é a pessoa que gosta de beber.

SANSA. É um instrumento musical trazido pelos escravos africanos, feito com um casco de jabuti no qual são presas tiras metálicas. Toca-se como um instrumento de corda.

SANTA RADI. É uma santa popular canonizada pela população do Alto Madeira, Amazonas, onde nasceu, viveu e morreu. Era uma moça de uma beleza sem igual, que ensinava catecismo às crianças, tocava violino sem saber música e vivia sempre rezando. Restabelecia a paz doméstica quando os casais brigavam e curava as pessoas quando estavam com paralisia, erisipela e outras doenças.

SANTA VITÓRIA. Era o nome dado à palmatória nas escolas, antigamente. Os alunos, às escondidas da professora, escondiam ou mesmo davam fim à palmatória para não serem castigados quando se comportavam mal ou não sabiam as lições.

SANTO-DO-PAU-OCO. Frase irônica aplicada a um menino travesso, traquinas, com ares de bonzinho. A explicação desta expressão é a seguinte: as imagens de santos, esculpidas em madeira, eram ocas, e vinham de Portugal, cheias de dinheiro falso.

SANTOS SEM DIA. Todo dia tem seu santo. Acontece que os 365 dias do ano não acomodam todos os santos da Igreja Católica que, para corrigir tal deficiência, determinou que o primeiro domingo do ano depois de Pentecostes, fosse o Dia de Todos os Santos. Hoje o Dia de Todos os Santos tem data fixa: 1° de novembro. O povo, para se ver livre de obrigações, criou um santo que não tem dia: é o Dia de São Nunca. Inventou, também, o Dia São Pagomião, que é o dia móvel em que os assalariados recebem seus salários e pagam suas contas.

SÃO JORGE. É um santo muito popular, também conhecido por Ogum nos ritos afro-brasileiros, patrono de corporações militares, escolas de samba, clubes de futebol. Justiceiro, protetor dos oprimidos e injustiçados, São Jorge é cultuado não somente nas igrejas católicas como também em terreiros de todas as linhas. Como Ogum-beira-mar, comanda o povo do mar. Como Ogum-ronda, cuida da segurança das pessoas, dos veículos, das casas de residência e comerciais. É conhecido como o Santo Guerreiro e festejado no dia 23 de abril, com procissões católicas e atividades nos terreiros. A espada-de-são jorge é uma planta usada nos banhos e libações. É bom ter um pé de espada-de-são jorge plantado no jardim das casas que ficam, assim, protegidas de todo o mal.

SÃO SEBASTIÃO. São Sebastião nasceu na Narbônia e foi legionário do Imperador Carino. Era o chefe dos Pretorianos que, na antiga Roma, se encarregavam de distribuir a justiça. Como ele era cristão, e foi denunciado ao imperador, ele, depois de amarrado numa árvore, foi crivado de setas até a morte. É um santo muito popular no Brasil. É o padroeiro da cidade do Rio de Janeiro e dá seu nome a dois municípios fluminenses: São Sebastião do Rio de Janeiro e São Sebastião do Alto. Conta a lenda que, na batalha final que expulsou os franceses que ocupavam o Rio de Janeiro, São Sebastião foi visto, de espada na mão, entre os portugueses, mamelucos e índios, lutando contra os franceses calvinistas. O dia da batalha coincidiu, exatamente, com o dia do santo, celebrado no dia 20 de janeiro. São Sebastião é o protetor da humanidade contra a fome, a peste e a guerra.

SAPATOS. Os sapatos estão ligados às crendices do povo. O povo acredita que deixar um sapato emborcado, isto é, de solado para cima, está chamando a morte do dono. É comum o uso de sapatinhos feitos de madeira, osso ou metal, como adorno, para a pessoa ter boa saúde, boa sorte e situação financeira equilibrada. Tem também a estória daquele homem que era tão econômico que os filhos só usavam um sapato para não gastar o par, de uma só vez.

SAPOS. O sapo é muito usado nas bruxarias, nos feitiços. Escrever o nome de uma pessoa na boca de um sapo, costurando-a, em seguida, traz muito mal à pessoa que é dona do nome. Acontece, também, que os sapos chamam a chuva e são seus guardiães. Diz-se que a pessoa tem a boca de sapo quando tem a boca muito grande. Uma das cantigas de ninar mais conhecidas no Brasil é a do sapo-cururu, com a qual as mães embalam seus filhos: "Sapo-cururu/Da beira do rio,/Quando o sapo canta, ó maninha,/Diz que está com frio!..."

SARABAGUÉ. É uma dança da Santa Cruz, em Carapicuíba-SP, ao som de uma viola de dez cordas, pandeiros, cuíca e reco-reco.

SARAPATEL. O sarapatel foi trazido da Índia pelos portugueses. É uma comida que conta com os seguintes ingredientes: sangue de porco, uma garrafa de vinagre, uma colher de sopa de sal, todos os miúdos do porco, temperos secos e verdes, duas folhas de louro, meio quilo de banha. É uma comida considerada como pesada, significando que, depois de comer sarapatel, uma pessoa não pode dormir nem tomar banho. Para cortar o peso do sarapatel o povo costuma tomar, depois de saborear um gostoso sarapatel, um cálice de cachaça ou de batida.

SARARÁ. É uma formiga vermelha, de asas. É o mulato de cabelos vermelhos, como a formiga de igual nome.

SARNA. É uma dança do Rio Grande do Sul. Enquanto dançam, os pares fingem que se coçam, como se estivessem com sarna, uma coceira que ataca as pessoas e que só passa com enxofre.

SARRABULHO.1. O mesmo que SARAPATEL; 2. Diz-se que uma pessoa leva um sarrabulho quando é derrubado por uma onda do mar quando está brabo.

SARUÉ. É uma dança que mistura a quadrilha francesa com a americana e também com passos do sertão. É a corrutela de soireé ou sarau.

SAUÍ. Veja SAGUIM.

SAUIM. Veja SAGUIM.

SAÚVA. Também conhecida como saúba, carregadeira, formiga-de-roça e sobitu. As fêmeas são as tanajuras, um prato tradicional, e fazem parte do molho do tucupi. Há um antigo slogan que diz: "Ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil."

SEGREDO-DE-ABELHA. Diz-se quando qualquer coisa é muito cheia de mistério impenetrável.

SEIXEIRO. É a pessoa que engana, passa calote, não paga a dívida contraída.

SEIXO. É uma pedra que de tanto percorrer a correnteza dos rios ficou arredondada, perdendo as quinas.

SEM-PÉ-NEM-CABEÇA. Diz-se de tudo que não tem nexo, não tem sentido, não tem começo nem fim.

SENTINELA. É o mesmo que velório, em Pernambuco, Alagoas e Ceará. Na Paraíba, no Rio Grande do Norte e também no Ceará, é quarto ou guarda. Em São Paulo, é guardamento.

SENZALA. Casa onde moravam os escravos nos antigos engenhos e significa morada, habitação, ambundo. A palavra é de origem africana.

SEQUILHOS. De origem portuguesa, os sequilhos são rosquinhas de massa seca, com ou sem amêndoas, castanhas de caju ou amendoim, de forma arredondada.

SER-FILHO-DO-PADRE. Diz-se de quem tem muita sorte em tudo que faz, em tudo em que se mete, negócios, mulheres, agricultura, tudo, enfim.

SER-O-CÃO-DO-SEGUNDO-LIVRO. Nas décadas de 20 e 30 o Primeiro e o Segundo Livro de Leitura, de Felisberto de Carvalho, eram adotados nas escolas primárias brasileiras. Mas era justamente no Segundo Livro de Leitura que os meninos daquela época se deparavam, a páginas tantas, com o desenho do Cão – como é mais conhecido o Diabo, o Satanás, o Demônio no Nordeste. Era uma figura terrível, de chifres, de cauda, botando fogo pelo nariz e empunhando um tridente, figura que causava medo na época em que tudo que se fazia era pecado e ainda existia o inferno. Daí a expressão popular ser-o-cão-do-segundo-livro com dois significados diferentes: a) como sinônimo de feio, horrível; b) significando danado de bom, inteligente, brabo, valente, bom em futebol, jogo de cartas, cantando, dançando, etc.

SER-UM-RAPADO. Ser um pobretão, não ter onde cair morto, nada ter de seu.

SERÁ-O-BENEDITO? Expressão popular equivalente a Será possível? É inacreditável!

SERAFIM. Santo italiano da Ordem dos Capuchinhos, canonizado pelo Papa Clemente X. Ele tinha uma das mãos tortas e as crianças costumavam brincar, assim: - "Uma esmola para São Serafim! Quem não der fica assim", diziam entortando uma das mãos.

SERENATA. Um pequeno grupo de rapazes entre os quais um toca violão ou piston e que, nas noites de lua, vão cantar à janela da moça pela qual um dos componentes do grupo está apaixonado. Alguns pais não gostam de serenatas e, às vezes, até mesmo atiravam ou derramavam urina sobre os rapazes da serenata.

SERENGA. É o canto entoado pelos romeiros por ocasião da festa do Divino Espírito Santo quando, remam, em suas canoas, para o encontro festivo das duas bandeiras, rio abaixo e rio acima.

SERENO. Ficar no sereno é o ato de quem não é convidado e fica do lado de fora, olhando, através das janelas, os bailes familiares.

SERESTA. Veja SERENATA.

SEREIA. A sereia é metade mulher muito bonita e a outra metade é peixe, que seduz os pescadores, fazendo com que eles morram afogados.

SERICÓIA. É um pássaro, uma espécie de saracura que, quando canta, está anunciando que vai chover.

SERPENTE. A serpente tem muito valor na sabedoria popular. Ela significa vida, força, mistério. O povo acredita que uma serpente cortada ao meio vira duas serpentes. Quando a serpente entra num rio, deixa o veneno fora d’água, e se morder uma pessoa, por mais venenosa que seja a serpente, a pessoa nada sofrerá. Se uma mulher grávida passar por cima de uma serpente, esta morrerá. Depois que Deus fez o mundo, o Diabo, muito invejoso e mau, pediu-lhe licença para também fazer seus bichinhos e tanto suplicou que Deus atendeu a seu pedido. O Diabo, então, fez a serpente, a cobra. O homem do interior tem seus remédios contra as picadas de cobras venenosas. Os rezadores também têm suas rezas para combater o mesmo mal.

SERRAÇÃO-DE-VELHA. Serra-a-velha é uma brincadeira muito antiga, trazida pelos colonizadores portugueses, e que consiste no seguinte: um grupo de pessoas se reunia à porta de uma velha e, chorando, gritando, com um serrote, serravam um pedaço de madeira, gritando "Serra-a-velha!". Às vezes o serra-velha terminava em tragédia quando os familiares da pessoa que estivesse sendo serrada disparava velhas espingardas contra os serradores. Pessoas até jogavam água quente ou urina sobre os serradores. A brincadeira acontece durante a Quaresma, até o Sábado de Aleluia. Em algumas cidades do interior nordestino ainda persiste esta brincadeira.

SERRANA. É uma dança dos fandangos do Rio Grande do Sul.

SEXO. Prever qual é o sexo da criança que vai nascer, é uma tradição corrente e popular na Europa. Foi o colonizador português o responsável pela divulgação dessa tradição entre nós. Vejamos como saber qual o sexo das crianças que ainda vão nascer: 1. Ferver um quiabo e, se ele se abrir depois da fervura, nascerá uma menina e, em caso contrário, será um menino; 2. Dá um talho num coração de galinha e fazê-lo cozinhar; se o coração conservar o talho aberto, nascerá uma menina e, se ficar fechado, nascerá um menino; 3. Põe-se uma folha de salsa na chapa do fogão; se a folha se encrespar, ficar encolhida com o calor, nascerá uma menina e, se não encolher, nascerá um menino; 4. Ao subir numa escada se a mulher grávida começar a subir com o pé direito, nascerá um menino e, em caso contrário, uma menina; 5. Pedir à mulher grávida que mostre a mão; se a estender com as costas da mão para cima, nascerá um menino e se mostrar a palma da mão, nascerá uma menina; 6. Se o ventre da mãe for pontudo, nascerá um menino e, se for arredondado, nascerá uma menina; 7. Se o feto for muito buliçoso, nascerá um menino e, se não for buliçoso, nascerá uma menina; 8. Manda-se, também, que a mulher fique em pé, encostada numa parede e pede-se que ela comece a andar. O sexo da criança depende do primeiro passo: se for dado com o pé direito, será do sexo masculino e, se for dado com o pé esquerdo, será do sexo feminino; 9. A primeira pessoa que bater em casa, no momento em que a mulher começa a cortar o enxoval do filho, também indicará o seu sexo; se a pessoa que bateu na porta da casa for um homem, a criança será do sexo masculino e, se for mulher, a criança será do sexo feminino; 10. Pelo bico do seio da gestante também é possível saber o sexo do futuro filho: se a coroa que se forma em seu redor for escura, nascerá um menino, e se for clara, quase natural, será uma menina.

SILÊNCIO. Lara, Mata e Tácita são a mesma deusa do silêncio, festejada no dia 18 de fevereiro. No folclore, o silêncio está nas superstições dos remédios, do tratamento das mordidas de cobra venenosa, de guarda-defuntos, do ato de desenterrar dinheiro dado por almas do outro mundo, de viagem noturna, de promessa de acompanhar procissão e outros – são coisas que a pessoa tem que fazer calada, no mais absoluto silêncio. No Brasil, alguns jogos infantis em que perde o menino que quebra o silêncio, isto é, fala, grita, chora.

SILVIO ROMERO nasceu no dia 21 de abril de 1851, na cidade de Lagarto, SE. Fez o primário com o professor Badu e, aos doze anos, estudou os preparatórios no Rio de Janeiro, onde também cursou o Ateneu Fluminense. Com 17 anos chegou ao Recife para cursar a Faculdade de Direito, bacharelando-se no dia 12 de novembro de 1873. Cursou a Faculdade, naquele tempo com Tobias Barreto, de quem se tornou amigo. Em 1871 colaborou no Correio de Pernambuco, no Diario de Pernambuco, no Jornal do Recife e na A República. Do Recife passou a residir no Rio de Janeiro, publicando ensaios, artigos e muitos livros. Na área de Folclore, salientamos: Contos populares do Brasil (1882), Etnografia brasileira (1888) e Estudos sobre a poesia popular no Brasil (1888). Pertenceu à Academia Brasileira de Letras do qual foi um dos fundadores. Faleceu no dia 18 de junho de 1914, na cidade do Rio de Janeiro.

SIMPATIA. É uma prática muito difundida entre as diversas classes sociais, empregada com a finalidade de chamar chuva, curar doenças, afastar formigas, encontrar noivo, achar emprego, fazer chover, etc. Entre as muitas simpatias, lembramos: 1. Para menino aprender a andar: dar de beber à criança água da primeira chuva de janeiro; 2. Para câimbra: amarrar um barbante virgem na perna; 3. Para dor de dente: aplicar na cárie cera de ouvido de cachorro; 4. Para bronquite: matar uma barata, colocar num saquinho de pano e amarrar no pescoço do paciente; 5. Coceira: passar urina de vaca no lugar afetado; 6. Embriaguês: colocar um pedaço de limão no bolso do bêbado; 7. Insônia: colocar três folhas de alface na fronha do travesseiro; 8. Para dor de barriga: tomar chá feito com olhos da goiabeira; 9. Suor nas mãos: passar as mãos na parede de uma igreja; 10. Urina solta: urinar dentro de uma casca de ovo e enterrá-la num formigueiro.

SINHÁ. É como os escravos chamavam as mulheres de seus senhores. Sinhazinha eram as filhas da sinhá, também chamadas de Sinhá Moça. Com a abolição da escravatura, a palavra sinhá perdeu seu significado inicial para se tornar um apelido.

SINHÔ. Sinhô é uma corrutela de senhor e tem a mesma origem da palavra sinhá. Os filhos do sinhô eram sinhozinhos.

SIRI. 1. O siri é um crustáceo do mar e dos rios quando se encontram, das marés. Várias são as qualidades de siri: o siri de mangue, o siri mole, o siri capiba que é o maior deles. Siri também é a pessoa que carrega o facho aceso ou o lampião no bumba-meu-boi. Siri-donzelo é como se chama o rapaz tímido, palerma. Um adágio popular diz que "O siri magro carrega água para o gordo". Na culinária do Nordeste o siri é muito solicitado: a fritada, o casquinho e as patas do siri são pratos encontrados nos bares e restaurantes da orla marítima; 2. A expressão brabo-que-nem-siri-na-lata é usada para qualificar a pessoa quando está braba, fazendo barulho, encrenca, fora de si.

SIRIRI. 1. Dança popular em Mato Grosso; 2. Ronda infantil abrangendo todo o Nordeste . O siriri é o menino que fica no meio da roda, feita por meninos e meninas de mãos dadas, cantando e, em seguida, segura uma das meninas que o substitui no meio da roda e no canto.

SÓ-TER-BOCA. Diz-se de quem só é valente na boca, sem ter coragem para brigar.

SOCA. Quando a cana é plantada em terra apropriada, fértil, no fim de dez a doze meses dá o seu primeiro corte, ao qual conhecemos com o nome de planta; dos troncos nascem novos rebentos que, no ano seguinte, fornecem outra safra, que é a soca; no terceiro ano, tem-se a ressoca; e no quarto, a contra-soca. Acontece que da soca, ressoca e contra-soca já não floresce uma cana de boa qualidade.

SOGRA. No mundo todo as sogras, com raras exceções, são odiadas pelos genros. A sogra é motivo de pilhérias, de piadas, de anedotas em todas as línguas. O povo diz que: 1. Sogra não é parente. É castigo; 2. Sogra boa é a que já morreu; 3. Feliz foi Adão, que não teve sogra nem caminhão; 4. Deus fez a mãe e o Diabo fez a sogra; 5. Não mando minha sogra para o inferno porque fico com pena do Diabo; 6. Sogra e arado só prestam debaixo do chão; 7. Duas coisas matam de repente: vento pelas costas e sogra pela frente; 8. Morar com sogra é fazer vestibular para o céu; 9. Depois que minha mulher morreu casei com minha cunhada pra fazer economia de sogra; 10. Sogra, milho e feijão, só debaixo do chão. ANEDOTAS: 1. Dois professores conversavam: - conheço duas línguas que nenhum poliglota é capaz de dominar. – E quais são elas? – A língua da minha sogra e a da minha mulher... 2. Dizia um amigo: - Por que é que você tem tanta raiva dos médicos? – É porque eles salvaram minha sogra três vezes... CULINÁRIA: No que diz respeito à sogra a culinária é bastante rica: a) Beijo-de-sogra; b) Olho de sogra; c) Pudim de sogra. APELIDOS DA SOGRA: a) A cobra choca; b) A mexeriqueira; c) A caninana; d) O pára-raios; e) A besta fera; f) A intrusa; g) A maleitosa; h) A espingarda ruim.

SOLEIRA. Vários povos consideram a soleira da porta de entrada das casas como um lugar de respeito e até mesmo sagrado. A pessoa, ao entrar numa casa, antes de pisar na soleira tinha que tirar o chapéu, em sinal de respeito ao reinado doméstico. Não se deve varrer a soleira, lugar onde são enterrados os umbigos dos recém-nascidos, onde são colocadas as primeiras unhas cortadas do filho e os cabelos das filhas. Um mundo de crendices está, assim, associado à soleira.

SOPA. 1. Prato comum no mundo todo, feito com caldo de carne, arroz ou macarrão, verdura, tempero verde, a gosto; 2. Também é o nome que se dava aos pequenos ônibus antigamente. Na Bahia, a sopa tinha o nome de marinete; 3. Sopa também é tudo que é fácil, bom. Fazem-se sopas de peixe, de milho verde, de macaxeira, de jerimum, de inhame, de cabeça de peixe, etc.

SOPA-DE-CAVALO-CANSADO. Em Portugal, é muito comum. A sopa é feita de vinho tinto com açúcar, canela e pão torrado.

SORORGO. Os escravos trouxeram para o Brasil esta dança africana.

SOVACO-DE-COBRA. Nos restaurantes populares está tendo muita aceitação o sovaco-de-cobra, um prato feito com charque desfiada e assada, para ser comida com macaxeira. É parecido com roupa-velha, prato feito com carne de boi desfiada e assada.

SUJO-QUE-SÓ-PAU-DE-GALINHEIRO. Diz de tudo que é demasiadamente sujo, pessoas, animais ou coisas, e também das más pessoas sem caráter, sem moral.

SUMÉ. Sumé é um homem branco que, antes do descobrimento do Brasil, aparecia aso indígenas, ensinando-lhes o cultivo da terra e regras morais. Acredita-se que o sumé seja o mesmo São Tomé, também chamado de Zomé.

SUOR. As roupas íntimas são muito usadas na feitiçaria, principalmente quando estão molhadas de suor. Coar café, chá, chocolate numa camisa suada de uma mulher e depois de bebidos faz com que a pessoa que bebeu mereça ao amor da dona da camisa. Quando as crianças estão sob a ação do quebranto, o pai ou o parente homem mais próximo faz com que passem entre suas perna abertas, estando suados.

SUPERSTIÇÃO. É um sentimento religioso baseado na ignorância ou no medo e que leva as pessoas à pratica de coisas criadas pela fantasia das crendices. A superstição é universal. Para que as pessoas se defendam das superstições devem usar amuletos. Não é bom passar por baixo de uma escada. O número 13 é azarento. Ver gato preto dá azar. Dormir com os pés na direção da porta do quarto é chamar a morte. A pessoa deve dar o primeiro passo com o pé direito. O americano quando pisou o solo lunar colocou primeiro o pé direito e, depois, o esquerdo.

SURRÃO. Pequeno saco de couro cru no qual os vaqueiros e agricultores levam a comida preparada em casa, o bode, composto de farinha, carne seca e um pedaço de rapadura.

SURUBIM. 1. Peixe de bom tamanho encontrado nos grandes rios brasileiros, considerados o bacalhau nacional; 2. Também é o nome de um boi muito famoso, cantado em verso pelos poetas populares nordestinos.

SURUCUCU. É uma cobra muito venenosa, encontrada na região amazônica. Sua carne assada é usada pelos indígenas na cura do reumatismo; e se faltar a carne, o remédio é feito com seus ossos pulverizados em infusão de cachaça ou café.

SURURU. 1. É um molusco típico da culinária alagoana. Fritadas, empadas, refogados de sururu são uma delícia. O sururu é encontrado na lama dos brejos, das lagoas; 2. Sururu também significa, na linguagem popular, confusão, brigas, barulho entre pessoas.

SUSPIRO. De origem oriental, o suspiro é um doce feito de clara de ovos batidos, com açúcar branco e limão, assado em forno brando, em forma de flores, frutos, etc.

SUSTENTAR-A-PÃO-DE-LÓ. Tratar bem as pessoas, sem que nada lhes falte.
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O Dicionário completo pode ser obtido em http://sites.google.com/site/pavilhaoliterario/dicionario-de-folclore
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Fontes:
LÓSSIO, Rúbia. Dicionário de Folclore para Estudantes. Ed. Fundação Joaquim Nabuco
Imagem =
http://www.terracapixaba.com.br/

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Pérolas Gramaticais



"Pérolas Gramaticais" é uma denominação comumente utilizada para designar o uso de vocábulos inadequados presentes nas construções linguísticas, os quais prejudicam a coesão das mensagens emitidas. É importante observar que tanto a fala como a escrita estão sujeitas à ocorrência desse tipo de "deslize", e que as "pérolas", muitas vezes, são proferidas por descuido (ou mesmo desconhecimento da forma correta) por parte do emissor. O leitor/ouvinte, ao se deparar com "pérolas gramaticais", pode considerá-las divertidas, fato perfeitamente explicável tendo-se em vista a incoerência que as construções apresentam. Geralmente, as pérolas são extraídas de redações de vestibular. Observe alguns exemplos:

Gostaria de informar que o período de matrícula inspirou. (expirou)

Quando o jogo está a mil, minha naftalina sobe. (adrenalina)

Na Bahia há um povo muito hospitalar. (hospitaleiro)

Agora que estou informatizado, cobrarei meus direitos. (informado)

O Brasil é um país abastardo com um futuro promissório. (abastado, promissor)

O maior matrimônio do país é a Educação. (patrimônio)

Os índios eram muito atrasados, mas com o tempo foram se sifilizando. (civilizando)

A vida é um conto de fábulas. (fadas)

Tiradentes, depois de morto, foi decapitulado. (decapitado)

A capital de Portugal é Luiz Boa. (Lisboa)

O principal rio nos Estados Unidos é o Mininici. (Mississipi)

O acidente foi no célebre Retângulo das Bermudas. (Triângulo)

A ciência progrediu tanto que inventou ciclones, como a ovelha Dolly. (clones)

O problema ainda é maior em se tratando da camada Diozoni. (Camada de Ozônio)

Eu luto para atingir os meus obstáculos. (objetivos)

O Euninho já provocou secas e enchentes calamitosas. (El Niño)

É um problema de muita gravidez. (gravidade)

Existem raios ultra-violentos. (ultravioletas)

Os lagos são formados pelas bacias esferográficas. (hidrográficas)

Nao foi ilusão idiótica o que eu tive. (ilusão de ótica)

Isso é crime de falsidade biológica! (ideológica)

É necessário ler a bússola do remédio. (bula)

As mudanças ocorrem devagarosamente. (vagarosamente)

Como diz o ditado: é duro agradar a pobres e troianos. (gregos)

Eu concordo em gênero e número igual. (gênero, número e grau)

Ele tem medo de ficar preso no elevador, pois tem cleptomania. (claustrofobia)

Acho que minha professora é lésbica, pois está sempre olhando para cima. (estrábica)

Fonte:
http://www.soportugues.com.br/secoes/perolas/index.php

José Paulo Paes (Poesias para Crianças)



RARIDADE

A arara
é uma ave rara
pois o homem não pára
de ir ao mato caçá-la
para a pôr na sala
em cima de um poleiro
onde ela fica o dia inteiro
fazendo escarcéu
porque já não pode
voar pelo céu.

E se o homem não pára
de caçar arara,
hoje uma ave rara,
ou a arara some
ou então muda seu nome
para arrara.

De Olha o Bicho (1989)
–––––––––––––––––––

GATO DA CHINA

Era uma vez
Um gato chinês

Que morava em Xangai
Sem mãe e sem pai

Que sorria amarelo
Para o Rio Amarelo

Com seus olhos puxados
Um pra cada lado

Era um gato mais preto
Que tinta nanquim

De bigodes compridos
Feito um mandarim

Que quando espirrava
Só fazia “chin!”

Era um gato esquisito
Comia com palitos

E quando tinha fome
Miava “ming-au!”

Mas lambia o mingau
Com sua língua de pau

Não era um bicho mau
Esse gato chinês

Era até legal
Quer que eu conte outra vez?

Do CD Brincando com Palavras (2005)
––––––––––––––––––––-

S

O sapo saltou na sopa
de um sujeito que, sem mais papo,
deu-lhe um sopapo e gritou: — Opa!
Não tomo sopa de sapo!

De Uma Letra Puxa a Outra (1992)
–––––––––––––––––––––-

VALSINHA

É tão fácil
dançar
uma valsa,
rapaz.

Pezinho
pra frente,
pezinho
pra trás.

Pra dançar
uma valsa
é preciso
só dois.

O sol
com a lua.
Feijão
com arroz.
––––––––––––––––––

CORREÇÃO

Como dizia
aquele bem-te-vi que ficou míope:
“bem te via... bem te via...”

De É Isso Ali (1984)
--------

José Paulo Paes (Melhores Poemas)



Organizado por Davi Arrigucci Junior, ensaísta, crítico e professor de Literatura Comparada da USP, contém poemas escolhidos de treze livros de Paes.

DE CÚMPLICES (1951)

Madrigal
Meu amor é simples, Dora,
Como a água e o pão.
Como o céu refletido
Nas pupilas de um cão.

DE NOVAS CARTAS CHILENAS (1954)
L'Affaire Sardinha

O bispo ensinou ao bugre
Que pão não é pão, mas Deus
Presente na eucaristia.

E como um dia faltasse
Pão do bugre, ele comeu
O bispo, eucaristicamente.

DE EPIGRAMAS (1958)

Bucólica
O camponês sem terra
Detêm a charrua
E pensa em colheitas
Que nunca serão suas.

DE RESÍDUO (1980)

Epitáfio para Rui

... e tenho dito
Bravos!
(mas o que foi mesmo que ele disse?)
Um Sonho Americano
CIA limitada

DE CALENDÁRIO PERPLEXO (1983)

A Verdadeira Festa (12 de junho - namorados)
mas pra que fogueira
rojão
quentão?

basta o fogo nas veias
e a escuridão
coração.

DE A POESIA ESTÁ MORTA MAS JURO QUE NÃO FUI EU (1988)

Curitiba
O inventor no estado
era um pinheiro inabalável

inabaláveis pinheiros igualmente
o secretário da segurança pública
o presidente da academia de letras
o dono do jornal
o bispo o arcebispo o magnífico reitor

ah se naqueles tempos
a gente tivesse
(armando glauco dalton)
um bom machado!
Pisa: A torre
em vão se inclinas pedagogicamente
o mundo jamais compreenderá a abliqüidade dos
bêbados ou o mergulho dos suicidas.

Fonte:
http://intervox.nce.ufrj.br/~clodo/jose_paulo_paes.htm

José Paulo Paes (1926 – 1998)



(Taquaritinga, 1926 — São Paulo, 9 de outubro de 1998) foi um poeta, tradutor, crítico e ensaísta brasileiro.

Neto de um livreiro e filho de um caixeiro-viajante. Tendo estudado química industrial na cidade de Curitiba (entre 1945 e 1948), durante muitos anos José Paulo trabalhou em laboratório farmacêutico. Todavia, paralelo a essa profissão jamais deixou de lado a literatura, cujo interesse foi lhe passado pelo avô que era livreiro, juntou-se a artistas e escritores que freqüentavam o Café Belas-Artes (um bar paranista que ficava em frente à livraria Ghignone), sendo que ainda nos tempos de aluno em Curitiba, já colaborava com a revista Joaquim, dirigida por Dalton Trevisan. Dessa temporada paranaense nasce seu livro de estréia, em 1947- O ALUNO -, fortemente influenciado pela poesia de Drummond, do qual recebeu uma crítica severa, segundo qual Paes se procurava nos outros, isto é, era um poeta que não tinha luz própria. de 1947.

Em 1949, transfere-se para São Paulo, quando passa a colaborar com os jornais Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, O Tempo, Jornal de Notícias e Revista Brasiliense, aproximando-se de escritores modernistas como Graciliano Ramos, Jorge Amado e Oswald de Andrade. Conhece também Dora, sua mulher por toda a vida a quem dedicou Cúmplices, de 1951, seu segundo livro. Por falta de um estudo melhor, sua obra foi comparada às dos poetas da Geração de 45, tendo inclusive participado de uma antologia na companhia de Haroldo de Campos e Décio Pignatari, quando eram chamados de “Novíssimos”, ou seja antes da eclosão da poesia concreta, à qual Zé Paulo soube com inteligência absorver, cujos resultados apareceram em seu livro Anatomias de 1967, apresentado justamente por Augusto de Campos. Mais que poesia concreta seu livro aproveitava um ritmo mais oswaldiano, como nos poemas “L'affaire Sardinha” (que fora publicado em 1962 na antologia Violão de Rua, da UNE) e o conhecido “Epitáfio para um Banqueiro”

Por volta de 1963, Zé Paulo dá início a um trabalho editorial intenso à frente da Editora Cultrix, abandonando o trabalho como químico, dedicando-se a partir de então integralmente à literatura. Na companhia de Massaud Moisés foi organizador do Pequeno Dicionário de Literatura Brasileira, publicado pela Editora Cultriz em 1967.

Em 1981,José Paulo aposenta-se como editor, dando início a um dos mais competentes trabalhos de tradução entre os escritores brasileiros, verteu para o português autores de diversas línguas, como Charles Dickens, Joseph Conrad, Pietro Aretino, Konstantínos Kaváfis, Laurence Sterne, W. H. Auden, William Carlos Williams, J.K. Huysmans, Paul Éluard, Hölderlin, Paladas de Alexandria, Edward Lear, Rilke, Seféris, Lewis Carroll, Ovídio, Níkos Kazantzákis, entre outros tantos. Seu reconhecimento na matéria resultou em sua nomeação como Diretor da oficina de tradução de poesia no Instituto de Estudos da Linguagem (IEL) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Em 1986 vem a público o livro Um por todos, reunião de seu trabalho até então, apresentado pelo crítico Alfredo Bosi. Vem ainda da década de 1980 seu interesse pela poesia infantil, com a qual alcançou grande êxito entre as crianças.

Em 1989, Zé Paulo lança pela coleção Claro Enigma, organizada por Augusto Massi, o livro "A poesia está morta mas eu juro que não fui eu", título extraído do poema "Acima de qualquer suspeita".

Na década de 1990 dá seqüência ao seu trabalho, lançando diversos livros de ensaios, poemas infantis, traduções e poesia, sendo um dos mais bem recebidos "Prosas seguidas de odes mínimas", livro no qual reflete um momento difícil de sua vida, quando tem uma perna amputada, como pode-se ler no poema "Ode à minha perna esquerda":

Ao falecer em 1998, deixou inédito o livro "Socráticas" que veio a público em 2001.

Fontes:
http://pt.wikipedia.org
http://intervox.nce.ufrj.br/

Oficina para formação de leitores tem início em setembro


A formação de leitores para leituras públicas é a proposta de uma oficina literária promovida pela Fundação Cultural de Curitiba, em setembro. As inscrições para o curso “Estética da Leitura” já estão abertas e devem ser feitas até o dia 10 de setembro no Palacete Wolf (Praça Garibaldi), mediante a doação de um livro novo de literatura.

Abertas a professores, estudantes e ao público em geral, as aulas serão desenvolvidas no Palacete Wolf, sob a orientação de Marcio Abreu, ator, diretor e dramaturgo, criador da Companhia Brasileira de Teatro. Com início no dia 14 de setembro, “Estética da Leitura” terá encontros sempre às segundas-feiras, das 19h às 22h, até o mês de novembro. Uma segunda turma está agendada para 2010, com aulas de março a maio, no mesmo horário e dia da semana.

Os participantes da oficina “Estética da Leitura” realizarão uma análise profunda de diversos textos, com o objetivo de perceber quais os ritmos das cenas e personagens. Essas emoções serão transmitidas em suas leituras por meio das entonações da voz e do posicionamento do corpo.

Serviço:
Inscrições para a oficina literária “Estética da Leitura”, promovida pela Fundação Cultural de Curitiba

Local: Coordenação de Literatura da Fundação Cultural de Curitiba (Palacete Wolf – Praça Garibaldi, 7 – Centro)

Horário: de segunda a sexta-feira, das 9h às 12h e das 14h às 17h30

Valor: doação de um livro novo de literatura

Certificado de participação para quem tiver 85% de frequência

Informações: (41) 3321-3379

Realização das oficinas:
Oficina “Estética da Leitura”

Turma 1 – aulas dias 14 e 28 de setembro, 5 e 19 de outubro, 9 e 23 de novembro de 2009, das 19h, às 22h

Turma 2 – aulas dias 8 e15 de março, 5 e 19 de abril, 3 e 17 de maio de 2010, das 19h às 22h
Local: Palacete Wolf (Praça Garibaldi, 7 – Centro)
Vagas: 30

Oficina “Amostra Grátis”
Aulas dias 15, 16, 17, 22, 23 e 24 de setembro de 2009, das 19h às 22h
Local: Palacete Wolf (Praça Garibaldi, 7 – Centro)
Vagas: 20

Fonte :
Fundação Cultural de Curitiba. publicado em 01/09/2009

Vinicius de Moraes (Samba de Breque)


Esta história é verdade.

Um tio meu vinha subindo a Rua Lopes Quintas, na Gávea - era noite - quando ouviu sons de cavaquinho provenientes de um dos muitos casebres que minha avó viúva permite nos seus terrenos. O cavaco cavucava em cima de um samba de breque e esse meu tio, compositor ele próprio, resolveu dar uma estirada até a casa, que era a de um conhecido seu, companheiro de música, um rapaz operário com mulher e uma penca de filhos. Tinha toda a intimidade com a família e às vezes ficava por lá horas inteiras com o amigo, cada qual palhetando no seu cavaquinho, puxando música madrugada adentro.

Nessa noite o ambiente era diverso. À luz mortiça da sala meu tio viu a família dolorosamente reunida em torno de uma pequena mesa mortuária, sobre a qual repousava o corpo de um "anjinho". Era o caçula da casa que tinha morrido, e meu tio, parado à porta, não teve outro jeito senão entrar, dar as condolências de praxe e reunir-se ao velório. O ambiente era de dor discreta - tantos filhos! - de modo que ao fim de poucos minutos resolveu partir. Tocou no braço da mulher e fez-lhe um sinal. Mas esta, saindo da sua perplexidade, pediu-lhe que entrasse para ver o amigo.

Foi encontrá-lo num miserável aposento interior, sentado num catre, o cavaquinho na mão.

- Pois é, velhinho. Veja só... O meu caçula...

Meu tio bateu-lhe no ombro, consolando-o. A presença amiga trouxe para o pai uma pequena e doce crise de lágrimas de que ele muito se desculpou com ar machão:

- Poxa, seu! Até pareço mulher! Não repara, hein companheiro...

Meu tio, com ar mais machão ainda, fez qual-que-bobagem, essa coisa. Depois o rapaz disse:

- Tenho um negocinho para te mostrar...

E teve um gesto vago, apontando a sala onde estava o filho morto, como a significar qualquer coisa que meu tio não compreendeu bem.

- Manda lá.

Conta meu tio que, depois de uma introdução dentro das regras, o rapaz entrou com um samba de breque que, cantado em voz respeitosamente baixa e ainda úmida de choro, dizia mais ou menos o seguinte:

Tava feliz
Tinha vindo do trabalho
E ainda tinha tomado
Uma privação de sentidos no boteco ao lado
Que bom que estava o carteado...
O dia ganho
E mais um extra pra família
Resolvi ir para casa
E gozar
A paz do lar
-- Não há maior maravilha!
Mal abro a porta
Dou com uma mesa na sala
A minha mulher sem fala
E no ambiente flores mil
E sobre a mesa
Todo vestido de anjinho
O Manduca meu filhinho
Tinha esticado o pernil.

Diz meu tio que, entre horrorizado e comovido com aquela ingênua e macabra celebração do filho morto, ouviu o amigo, a pipocar lágrimas dos olhos fixos no vácuo, rasgar o breque do samba em palhetadas duras:

- O meu filhinho
Já durinho
Geladinho!

Fonte:
MORAES, Vinicius de. Para Viver um Grande Amor. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1984. In http://www.releituras.com

Cecília Meirelles (Poesia para Crianças)



OU ISTO OU AQUILO

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
Quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!

Ou guardo dinheiro e não compro doce,
ou compro doce e não guardo dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo

A LUA É DO RAUL

Raio de lua.
Luar.
Lua do ar
azul.

Roda da lua.
Aro da roda
na tua
rua,
Raul!

Roda o luar
na rua
toda
azul.

Roda o aro da lua.

Raul,
a lua é tua,
a lua da tua rua!

A lua do aro azul.

COLAR DE CAROLINA

Com seu colar de coral,
Carolina
corre por entre as colunas
da colina.

O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.

E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina,
põe coroas de coral
nas colunas da colina.

O ECO

O menino pergunta ao eco
onde é que ele se esconde.
Mas o eco só responde: “Onde? Onde?”

O menino também lhe pede:
“Eco, vem passear comigo!”
Mas não sabe se o eco é amigo
ou inimigo.
Pois só lhe ouve dizer “Migo”.
--------------
Fonte:
MEIRELLES, Cecília de. Ou Isto ou Aquilo (1964)
Carlos Machado.
http://www.algumapoesia.com.br/poesia3/poesianet267.htm

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Paraná em Trovas

Passeio Público de Curitiba (Pintura de Alfredo
Andersen - c. 1925)
Da viagem pouco importa
minhas dores e cansaços,
se ao voltar te encontro à porta
a receber-me nos braços!
Amália Max

Quando o assunto exige pressa,
então redobre o cuidado!
“Viver mais” é o que interessa,
mesmo chegando atrasado.
Ângelo Batista

Dois corpos não podem, dizes,
ocupar o mesmo espaço...
Podem, sim, quando, felizes,
se fundem num terno abraço!
Antônio Augusto de Assis

Não pode ser infeliz
o que trova com amor;
quem faz o outro feliz
deixa de ser sofredor.
(+) Harley Stocchero

A saudade rasga o véu
do tempo e traz do passado
minha mãe, que lá do céu,
sempre tem me abençoado.
Horácio F. Portella

Abrindo meu coração,
aos quatro ventos proclamo:
ergui meu lar no teu chão,
és a cidade que eu amo!
Janske N. Schlenker

Um sorriso, ainda que seja
muito breve, de passagem...
É maneira, benfazeja,
de passar uma mensagem.
Jorge de Oliveira

Nos labores desta lida,
venha sempre o que vier,
curvo minha alma rendida
a Deus, que me fez mulher.
Karla C. Bitencourt

Quem divide os próprios
dias, sem desejo interesseiro,
merece sim, alegrias
e...encontra paz, por inteiro!
Lourdes B. da Porciúncula

Minha mãe já bem velhinha
não controla as emoções
ao soar a campainha
de suas recordações!
Mª Aparecida Pires

Se caem do céu as águas
com tanta beleza e encanto
por que desencanto e mágoas
há nas águas do meu pranto?
Mª da Conceição Fagundes

Escolher rumos amenos,
inovar o dia-a-dia,
errar menos... sempre menos...
também é SABEDORIA.
Mª da Graça Stinglin de Araújo

Num pratinho prateado,
dei-lhe a flor da inspiração.
E você, tão encantado,
deu-me a flor do coração.
(+) Marita Taborda França

Entre o céu, o mar e a terra
habita no Paraná,
a gralha azul que soterra...
o pinhão que brotará!
Mariza S. de Azevedo

Meu amor na mocidade
foi efêmera ilusão;
dele só resta a saudade,
nas cinzas de uma paixão.
Maurício N. Friedrich

Construtor de propriedade,
João-de-Barro, arquiteto
sem cursar a faculdade,
cria e monta o seu projeto.
Nei Garcez

Quem diz que não tem saudade
e se é verdade o que diz,
não teve a felicidade
de já ter sido feliz.
Orlando Woczikosky

Minha noiva não tem dó:
pelo seu regulamento,
me avisou, agora só,
que noivado é casamento!
Ralf Gunter Rotstein

Minhas trovas são abraços.
Mil braços vou abraçar
nos mil infinitos laços
que a trova sabe engendrar.
Roza de Oliveira

O amor quando é verdadeiro
no peito em que faz guarida,
principalmente, o primeiro...
deixa marca em nossa vida!
Sara Furquin

Sinto imensa gratidão
por alguém que nunca vi,
mas que fez a plantação
dos frutos que hoje colhi!
Vanda Fagundes Queiroz

Diz-se que o poeta não
morre, uma assertiva bonita!
Verdade que não ocorre,
mas é mentira bendita!
Vidal Idony Stockler

Não busque a felicidade
pelas trilhas da utopia,
busque-a dentro da verdade
e à luz da Sabedoria.
Walneide F.S. Guedes

A trova é mais que um recado
escrito por nossa mão,
é um lindo cartão timbrado
pela voz do coração.
Wandira F. Queiroz

A Trova, chispa divina,
bem igualzinha ao amor:
É sublime, é bela, fina...
nos lábios do Trovador!
Wellesley Nascimento

No grande jogo da vida
sorvi belo amor, profundo!
Viver vida bem vivida
é o melhor bingo do mundo.
Yaramara de Castro A.Fiecker
--------
Fonte:
Colaboração de Antonio A. De Assis com o Informe: Os Trovadores. Ano 18. N.57. Julho 2009. UBT/ Curitiba,PR.

Euclides da Cunha (Os Sertões)


Mas, afinal, de que assunto trata o livro Os Sertões?

Pergunta simples, resposta complexa. Podemos encaminhá-la lembrando que, em 1897, ocorreu no sertão da Bahia episódio que ficou conhecido como a Guerra de Canudos. Chefiados por Antônio Conselheiro, sertanejos reuniram-se numa cidadela - chamada Canudos - situada nas margens do rio Vaza-Barris. O crescimento da nova comunidade e as características de seu líder e adeptos incomodou fazendeiros da região pela redução da mão-de-obra disponível nas fazendas; acrescendo-se a isso o não pagamento de impostos e práticas consideradas incompatíveis com a religião, gerou-se situação considerada de exceção pelo governo estadual e, logo depois, pelo governo federal.

A tentativa de dissuadir os conselheiristas a abandonarem o local através de intervenção da Igreja - dois capuchinos visitaram Canudos para este fim - resultou inútil. A partir daí, pequenos incidentes precipitaram ações progressivamente maiores dos governos estadual e federal. Foram realizadas quatro expedições militares contra Canudos. O fracasso da terceira expedição, formada por 1300 homens, transformou Canudos num problema nacional: atribuiu-se à cidadela a condição de foco monarquista, isso numa época em que o regime republicano estava por se firmar e temia-se o retorno da monarquia.

A quarta expedição, comandada pelo general Artur Oscar, enfrentou grande resistência dos canudenses e prolongou-se por tempo além do previsto. Ante o iminente fracasso de mais uma expedição o Ministro da Guerra, marechal Carlos Machado Bittencourt, foi enviado ao palco das operações. É nesse momento que se inicia a participação de Euclides da Cunha no conflito. Em março de 1897 Euclides havia escrito dois artigos sobre Canudos no jornal O Estado de São Paulo sob o título de A Nossa Vendéia. No primeiro desses artigos traduzia a impressão de que o movimento de Canudos visava a restauração da monarquia. Entretanto, para o articulista, o simples desejo de restauração seria insuficiente para explicar tão grande sublevação. Havia, portanto, em Canudos um mistério a se desvendar. Além disso, adiantava-se Euclides ao tom dos artigos escritos na época, alertando para as condições geográficas do sertão, estas talvez o maior inimigo das forças republicanas.

Convidado por O Estado, Euclides da Cunha licenciou-se de suas atividades e tornou-se repórter daquele jornal. Tempos depois, embarcou em direção a Salvador viajando no mesmo navio que levava Machado Bittencourt. O desembarque na cidade aconteceu em 7 de agosto sendo que ali ficaram até 30 de agosto, data do início da viagem ao sertão. Dos dias em que Euclides esteve em Salvador e de todo o período de viagem a Canudos resultaram vários artigos enviados por ele e publicados pelo jornal. Toda essa correspondência de guerra foi mais tarde reunida num livro de reportagens intitulado Diário de uma Expedição.

Chama atenção nessas reportagens a progressiva mudança das opiniões de Euclides: o contato com a realidade do sertão e a extraordinária capacidade do escritor para observar e analisar detalhes ignorados por outros rapidamente o convenceram de que a guerra que supunha-se rápida não estava por terminar; que Canudos de modo algum seria foco de resistência monarquista com intenções restauradoras. Canudos era, sim, uma sociedade velha gerida pela autoridade do Conselheiro e ininteligível aos brasileiros do litoral.

Canudos finalmente caiu nos primeiros dias de outubro de 1897. População dizimada e arraial destruído, a vitória foi comemorada com grandes manifestações na capital federal. A espantosa resistência dos jagunços resultou em mais de cinco mil mortes nas tropas do Exército - considerando-se as quatro expedições.

Terminada a Guerra Euclides da Cunha retornou às suas atividades de engenheiro junto à Superintendência de Obras do Estado de São Paulo. Entretanto, já trabalhava em seu livro que só viria a ser publicado em 1902.

Em Os Sertões Euclides da Cunha não se limita a narrar os episódios da sangrenta Guerra de Canudos a qual denunciou como crime. Para explicar os fatos ocorridos no sertão da Bahia o escritor serve-se de todos os meios que, na época, estão ao seu alcance. Exaltando a influência do meio e da raça no comportamento coletivo, Euclides recorre à geografia, à sociologia, às características climáticas, raciais e biológicas, às biografias, ao linguajar dos caboclos, aos depoimentos que ouviu e todo o conteúdo do que pode observar no sertão. Só munido de tais ferramentas pode estabelecer as diferenças entre o brasileiros das regiões litorâneas e as incultas gentes dos sertões, submetidas às mais precárias condições de vida, ao ambiente geográfico e climático completamente desfavorável. Foi desse modo, analisando profundamente os móveis que permitiram o surgimento da coletividade canudense que Euclides, aos poucos deixando de lado suas convicções científicas moldadas segundo o determinismo vigente na época, pode ver no jagunço outra sorte de brasileiros cuja defesa procedeu através das páginas de seu livro vingador. Sobre isso nos diz Silvio Rabelo, um dos biógrafos de Euclides: " Ele viu na resistência heróica dos jagunços do Conselheiro mais que uma possível ameaça às instituições e à ordem estabelecida. Ele viu o direito de sobrevivência de uma população que estacionara por não ter tido condições favoráveis à assimilação dos valores culturais do litoral, em bases econômicas mais sólidas e sob influência de idéias mais avançadas. Os Sertões são, deste modo, um brado e brado quase inútil, contra o crime de um governo que abandonara a sua gente a uma natureza nem sempre propícia à vida e a uma organização social nem sempre compatível com a dignidade humana; e, mais do que isto, exterminara-a sem nenhuma condescendência."

É a variedade de recursos utilizados por Euclides na confecção de seu livro - história, geografia, etnologia, sociologia, etc - que torna inúteis as tentativas de classificar Os Sertões dentro de gêneros literários estanques. Livro de história, sociologia, literatura ou simples ficção? Impossível responder a não ser para dizer que Os Sertões são a um só tempo um pouco disso tudo e, mais que isso, obra genial de um genial escritor.

Há na prosa de Euclides muito de poesia conforme atestaram alguns estudiosos. A linguagem é rica e profunda sugerindo estar o escritor a esculpir suas palavras, metodicamente. É muito dele o uso de palavras incomuns e mesmo a busca de termos arcaicos quando não encontra no vocabulário de sua época algo que sirva para traduzir com fidelidade a imagem que empresta ao leitor. Precisão de relojoeiro, de alguém atento ao ritmo e às sonoridades, alguém que tem o gosto por paradoxos e que abusa de contrastes para deles extrair a força máxima de palavras e imagens. Assim, a riqueza verbal de Os Sertões é estonteante, obra de quem força a língua aos seus limites para dela extrair o máximo.

O grande livro que é Os Sertões paga tributos aos conhecimentos científicos vigentes á época em que foi escrito. Entretanto, Euclides da Cunha rompe com a camisa-de-força dos princípios então disponíveis para descobrir nos sertanejos a grande força que os conduz ao extermínio, embora sem jamais render-se. "O sertanejo é, antes de tudo, um forte" e "Canudos não se rendeu" estão entre as máximas imorredouras da obra de Euclides da Cunha e traduzem com fidelidade a natureza do trabalho a que ele se dedicou.

Fonte:
http://www.tarrafaliteraria.com.br/homenagem.aspx

Euclides da Cunha (1866 – 1909)



Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha nasceu em Cantagalo (RJ), no dia 20 de janeiro de 1866. Foi escritor, professor, sociólogo, repórter jornalístico e engenheiro, tendo se tornado famoso internacionalmente por sua obra-prima, "Os Sertões", que retrata a Guerra dos Canudos.

Cronologia:

1866 - Nasce no dia 20 de janeiro, na Fazenda Saudade, em Cantagalo, região serrana no vale do rio Paraíba do Sul, na província do Rio de Janeiro, onde vive até os três anos, quando falece sua mãe. O autor e sua irmã, Adélia, passam a viver, em 1869, com seus tios maternos, Rosinda e Urbano, em Teresópolis (RJ).

1871 - Com a morte da tia, Rosinda, vão morar com os tios maternos, Laura e Cândido, em São Fidélis (RJ).

1874 - Inicia os estudos no Instituto Colegial Fidelense.

1875 - Seu pai, Manuel Rodrigues Pimenta da Cunha, tem o poema "À morte de Castro Alves" publicado na segunda edição de "Espumas flutuantes", do poeta baiano, prematuramente falecido.

1877 - Estuda no Colégio Bahia, em Salvador (BA), durante um breve período em que morou naquela cidade, na casa de sua avó paterna.

1879 - Muda-se para a cidade do Rio de Janeiro (RJ), e estuda no Colégio Anglo-Americano.

1883 - Estuda no Colégio Aquino, e escreve seus primeiros poemas em um caderno, ao qual dá o título de "Ondas".

1884 - Publica em "O Democrata", jornal dos alunos do Colégio Aquino, seu primeiro artigo.

1885 - Ingressa na Escola Politécnica para cursar Engenharia. Freqüenta somente por um ano, pois é obrigado a desistir por motivos financeiros.

1886 - Matricula-se na Escola Militar da Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, no curso de Estado-maior e Engenharia Militar da Escola Militar, medida adotada porque a Escola pagava soldo e fornecia alojamento e comida. Tinha, entre seus colegas, Cândido Rondon, Lauro Müller, Alberto Rangel e Tasso Fragoso.

1887 - Passa, por três vezes, pela enfermaria da escola. Pede licença de dois meses para tratar da saúde.

1888 - Sua matrícula na Escola Militar da Praia Vermelha é trancada, face ao ato de protesto durante uma visita do Ministro da Guerra, conselheiro Tomas Coelho, do último gabinete conservador da monarquia. É desligado do Exército sob o pretexto de incapacidade física. Convidado, passa a escrever no jornal "A Província de São Paulo", hoje "O Estado de São Paulo", jornal engajado na campanha republicana. O artigo "A pátria e a dinastia, publicado no dia 20/12/1888, marca sua estréia.

1889 - Retorna à Escola Militar da Praia Vermelha, graças ao apoio de seu futuro sogro , o major Sólon Ribeiro e de seus colegas da Escola, que pedem sua reintegração.

1890 - Casa-se com Ana Emília Ribeiro.

1891 - Tira um mês de licença para tratamento de saúde. Viaja com a esposa para a Fazenda Trindade, de seu pai, localizada em Nossa Senhora do Belém do Descalvado (atual Descalvado), no interior de São Paulo. Morre sua filha Eudóxia, recém-nascida.

1892 - Conclui o curso na Escola Superior de Guerra e é promovido a tenente, seu último posto na carreira. Cumpre estágio na Estrada de Ferro Central do Brasil - trecho paulista da ferrovia, entre a capital e a cidade de Caçapava, por designação do marechal Floriano Peixoto. É nomeado auxiliar de ensino teórico na Escola Militar do Rio. Nasce seu filho Solon Ribeiro da Cunha.

1893 - Escreve artigo com críticas ao governo do marechal Floriano, cuja publicação foi negada pelo jornal "O Estado de São Paulo". Acometido de forte pneumonia, interrompe sua colaboração com o jornal. Volta a trabalhar como engenheiro praticante na Estrada de Ferro Central do Brasil. Com a Revolta da Armada, que teve início em 06/09, seu sogro é preso. Sua mulher, Ana, refugia-se, com o filho Solon, na fazenda do sogro, em Descalvado (SP). O escritor é designado para servir na Diretoria de Obras Militares.

1894 - É punido com transferência para a cidade de Campanha (MG), por ter protestado, em cartas á "Gazeta de Notícias", do Rio, contra a execução sumária dos prisioneiros políticos, pedida pelo senador florianista João Cordeiro, do Ceará. Nasce seu filho Euclides Ribeiro da Cunha Filho, o Quidinho.

1895 - Obtém licença do Exército, por ser considerado incapaz para o serviço militar devido à tuberculose. Vai para a fazenda do pai e se dedica às atividades agrícolas. Cansado, poucos meses após tornar-se lavrador, vai trabalhar como engenheiro-ajudante na Superintendência de Obras Públicas em São Paulo.

1896 - Mesmo desaconselhado pelo sogro, o autor desliga-se do Exército, sendo reformado no posto de tenente.

1897 - Volta a colaborar no jornal "O Estado de São Paulo". Cobre a 4ª Expedição contra Canudos, como correspondente daquele jornal. Em seus artigos, afirma sua certeza na vitória do governo sobre os conselheristas. O presidente Prudente de Morais o nomeia adido do estado-maior do ministro da Guerra, marechal Carlos Machado de Bittencourt. Torna-se sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. Acompanha, de perto, toda a movimentação de tropas e faz pesquisas sobre Canudos e o Conselheiro. Em Monte Santo, em companhia do jornalista Alfredo Silva, faz incursão nos arredores da cidade, observa as plantas e minerais da região. Nas cercanias de Canudos, no dia 19/09, escreve sua primeira reportagem da frente de batalha. Antonio Conselheiro morre de disenteria em 22/09. O autor passeia pela cidade, anotando em sua caderneta de bolso, expressões populares e regionais, mudanças climáticas, desenhos da cidade e das serras da região e copia diários dos combatentes. Transcreve poemas populares e profecias apocalípticas, depois citados em "Os Sertões". Com acessos de febre, retira-se do local, confessando, em seu último artigo para o jornal, o profundo desapontamento provocado pela visão das centenas de feridos que gemiam amontoados no chão. Retorna a Salvador (BA), em 13/10, e escreve, no dia seguinte, no álbum da médica Francisca Praguer Fróes, o poema "Página vazia", aqui publicado. Volta ao Rio de Janeiro e, de lá, a São Paulo (SP). Após quatro meses de licença para cuidar de sua doença, viaja para Descalvado onde, começa a escrever "Os sertões".

1898 - Reassume seu cargo na Superintendência de Obras Públicas de São Paulo. Publica, em "O Estado", o "Excerto de um livro inédito", trechos de "Os sertões", em que defende a tese de que o sertanejo é um forte, cuja energia contrasta com a debilidade dos "mestiços" do litoral. A ponte recém-inaugurada, construída em São José do Rio Pardo (SP), em parte sob a fiscalização do escritor, desaba, levando o biografado àquela cidade para acompanhar o desmonte. A demora nos trabalhos faz com que o escritor mude-se para aquela cidade, onde fica até 1901. Profere palestra no Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, sobre a "Climatologia dos sertões da Bahia", e propõe a construção de açudes para resolver o problema das secas no Nordeste. Grande parte de "Os sertões" é escrita em São José, com a colaboração do prefeito da cidade, Francisco Escobar, que se tornara amigo do escritor.

1900 - Falece, em Belém, o General Solon Ribeiro, sogro do biografado. Finaliza, em maio, a primeira versão de "Os sertões".

1901 - É nomeado chefe do 5º Distrito de Obras Públicas, com sede em São Carlos do Pinhal (SP), onde conclui "Os sertões". Nasce seu filho, Manuel Afonso Ribeiro da Cunha. Assina contrato com a editora Laemmert, do Rio, a publicação de 1.200 exemplares de "Os sertões", assumindo o compromisso de pagar a metade dos custos de edição, 1conto e quinhentos mil réis, quase o dobro de seu salário de engenheiro.

1902 - Após um trabalho insano de revisão, "Os sertões (Campanha de Canudos)" chega às livrarias em dezembro, sendo recebido com aplausos e restrições pela crítica.

1903 - A primeira edição do livro se esgota em pouco mais de dois meses. Começa a tomar notas para a "História da revolta", livro sobre a rebelião da Marinha, que combateu no Rio, como oficial do Exército, de 1893 a 1894. Elege-se para a cadeira nº 7 da Academia Brasileira de Letras, cujo patrono é Castro Alves, e como sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Face à possibilidade de participar de expedição ao Purus, suspende a redação do livro. Vende os direitos das segunda tiragem de "Os sertões" para o editor Massow. Demite-se da Superintendência de Obras Públicas.

1904 - Participa, através de artigos publicados em jornais, do debate sobre os conflitos de fronteira. Condena o envio de tropas brasileiras para o Alto Purus e defende uma solução diplomática que permita incorporar o território do Acre. Propõe uma "guerra dos cem anos" contra as secas do Nordeste, que inclua a exploração científica da região, a construção de açudes, poços e estradas de ferro e o desvio das águas do rio São Francisco para as regiões afetadas pela estiagem. Após trabalhar alguns meses na Comissão de Saneamento de Santos, desentende-se com a diretoria e pede demissão. Sem emprego, volta a escrever no jornal "O Estado de São Paulo" e, também, em "O País", do Rio. Dificuldades financeiras fazem-no transferir, por uma bagatela, os direitos de "Os sertões" para a editora Laemmert. É nomeado, pelo barão do Rio Branco, chefe da Comissão Mista Brasileiro-Peruana de Reconhecimento do Alto Purus, na fronteira do Brasil com o Peru. Parte rumo a Manaus (AM) no dia 13/12.

1905 - Realiza viagem heróica pelo Rio Purus, na Amazônia, chefiando missão oficial do Ministério das Relações Exteriores. Percorre cerca de 6.400 quilômetros de navegação, alguns trechos inclusive a pé. A comissão chega à foz do rio Purus em 09/04. De volta, redige, com o comissário peruano, o relatório da expedição. Embarca para o Rio no dia 18/12. Durante sua ausência, a editora Laemmert publica a terceira edição de "Os sertões".

1906 - Com a saúde debilitada pela malária, ao chegar encontra Ana, sua esposa, grávida do cadete Dilermando de Assis. Trabalha como adido do barão do Rio Branco. Trabalha no preparo de documentação necessária à construção da estrada de ferro Madeira-Mamoré. A Imprensa Nacional publica "Notas complementares do comissário brasileiro" sobre a história e a geografia do Purus, incluído no "Relatório da comissão mista Brasileiro-Peruana de reconhecimento do Alto Purus". Recusa indicação para fiscalizar a construção da ferrovia Madeira-Mamoré. Ana dá à luz Mauro, que falece de debilidade congênita uma semana após seu nascimento. Tempos depois, afirmará ter tomado remédios abortivos tentando interromper a gravidez e que fora também impedida pelo marido a amamentar a criança, filha de Dilermando. O "Jornal do Commércio" publica "Peru versus Bolívia". Começa a escrever "Um paraíso perdido", livro sobre a Amazônia, que não é terminado face à morte do autor. Os originais se perderam. Toma posse, finalmente, na Academia Brasileira de Letras.

1907 - Publica "Contrastes e confrontos", pela editora Livraria Chardron, do Porto (Portugal). Nasce Luís Ribeiro da Cunha, registrado como seu filho, mas que irá adotar, já adulto, o sobrenome Assis, de seu pai biológico Dilermando. Profere, com grande sucesso, no Centro Acadêmico 11 de Agosto, da Faculdade de Direito de São Paulo, a conferência "Castro Alves e seu tempo".

1908 - Escreve o prefácio do livro "Poemas e canções", de Vicente de Carvalho. Em "Antes dos versos", expõe sua concepção da poesia moderna. Publica no "Jornal do Commércio", a crônica "A última visita", sobre a inesperada homenagem de um anônimo estudante a Machado de Assis em seu leito de morte. O biografado ocupa, por breve período, com o falecimento de Machado, a presidência da Academia Brasileira de Letras. Passa o cargo para Rui Barbosa. Inscreve-se no concurso para a cadeira de lógica no Ginásio Nacional (Colégio Pedro II), no Rio.

1909 - Obtém a segunda colocação no concurso. Graças à interferência junto ao presidente da República, Nilo Peçanha, do barão do Rio Branco e do escritor e deputado Coelho Neto, é nomeado para a vaga. Entrega aos editores, Lello & Irmão, as provas de "À margem da História".

Morre no dia 15 de agosto de 1909, depois de uma troca de tiros com o aspirante Dinorá e seu irmão, o cadete Dilermando de Assis. Em 1916, o segundo-tenente Dilermando de Assis, que havia sido absolvido da morte do biografado (legítima defesa), mata em um cartório de órfãos no centro do Rio, o aspirante naval Euclides da Cunha Filho, o Quidinho, que tentou vingar a morte do pai. Dilermando é novamente absolvido, pelo mesmo veredicto.

Bibliografia:

1902 - Os Sertões
1907 - Contrastes e Confrontos
1907 - Peru versos Bolívia
1909 - À margem da história (póstumo)
1939 - Canudos (diário de uma expedição) (póstumo) - Reeditado em 1967, sob o título Canudos e inéditos.
1960 - O rio Purus (póstumo)
1966 - Obra completa (póstumo)
1975 - Caderneta de campo (póstumo)
1976 - Um paraíso perdido (póstumo)
1992 - Canudos e outros temas (póstumo)
1997 - Correspondência de Euclides da Cunha (póstumo)
2000 - Diário de uma expedição (póstumo)

Fonte:
http://www.tarrafaliteraria.com.br/

Homenagem ao poeta Castro Alves na Faculdade de Direito da USP



Mais de 700 exemplares do livro que poderá viabilizar uma homenagem ao poeta Castro Alves foram vendidos. A obra levantará fundos para a construção de uma herma (coluna de mármore com o busto do poeta) na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. A pré-venda foi prorrogada até a próxima sexta-feira (4/9). A obra trará em livro a conferência sobre Castro Alves proferida por Euclides da Cunha, em 1907, no Centro Acadêmico do Largo São Francisco. O projeto foi idealizado pelo historiador Cassio Schubsky.

Sabendo da importância da homenagem a um dos poetas mais importantes da literatura brasileira, personalidades de variadas atuações no âmbito nacional estão contribuindo com a compra do livro. O ex-ministro das Relações Exteriores e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), Celso Lafer, foi uma delas.

Para ele, é a oportunidade de continuar algo que começou cem anos atrás. “Nesse sentido, nossa Associação de Antigos Alunos é muita ativa em manter a memória da Faculdade de Direito sempre em evidência, reverenciando aqueles que são os grandes poetas do nosso país”. Parafraseando uma passagem de um livro do escritor Alberto da Costa e Silva, Lafer diz que “Castro Alves foi o grande pop star literário do Brasil de sua época”. O ex-ministro afirmou que alguém com desenvoltura social como o poeta abolicionista merece tantas honras quanto puderem ser feitas.

Lafer finalizou reafirmando a importância do respeito a grandes poetas e a lembrança de acontecimentos históricos ao mesmo tempo. “Você engloba Euclides da Cunha e o centenário de sua morte, o poeta Castro Alves e um uma grande conferência que aconteceu em 1907, com o empenho de homenagear três grandes poetas”. Lafer refere-se aos poetas Álvares de Azevedo, que já teve um busto construído em sua homenagem; Castro Alves; e Fagundes Varela, que também será homenageado com a uma herma na Faculdade de Direito. “Sem dúvida nenhuma, esses três poetas são figuras que moldaram a literatura brasileira”, completou.

Além de Celso Lafer, aderiram ao projeto personalidades como a escritora Lygia Fagundes Telles, o advogado e ex-ministro do Trabalho, Almino Affonso, e o historiador José Murilo de Carvalho, dentre outros.

A obra nasce de uma parceria entre a Editora Lettera.doc e a Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito e será lançada em 28 de setembro, mas está em fase de pré-venda até sexta-feira (4/9). Todos que comprarem antecipadamente a obra terão o nome publicado no próprio livro, mostrando o apoio ao projeto. O lançamento do livro comemorará também o centenário de morte de Euclides da Cunha, completados em 15 de agosto.

A publicação editada pela Lettera.doc terá ainda textos dos dois poetas, cronologias, cartas e curiosidades históricas que permearam o evento de 1907, com texto mais acessível se comparado as demais obras de Euclides da Cunha.

Hermas
Em 1907, a diretoria do Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP, lançou uma campanha para a construção das hermas de três grandes poetas românticos brasileiros: Álvares de Azevedo, Castro Alves e Fagundes Varela. No mesmo ano, o escritor Euclides da Cunha foi convidado pelos alunos para fazer uma exposição sobre Castro Alves e com a oportunidade de falar sobre o colega, ele decidiu transformar o evento em um esforço para a construção da herma. Ingressos foram cobrados para a conferência, mas o dinheiro não foi suficiente. Até hoje, apenas o busto de Álvares de Avezedo foi feito.

Em 2007, ao comemorar o centenário do evento, o historiador Cassio Schubsky teve a ideia de publicar a conferência proferida por Euclides da Cunha. “Toda a imprensa dedicou espaço e tempo à visita do escritor que era ilustre na época”, conta, revelando a importância do acontecimento na cidade de São Paulo. A conferência aconteceu cinco anos depois da publicação do clássico Os Sertões.

Fontes:
Artigo de Flávio Rodrigues in Consultor Jurídico. http://www.conjur.com.br
Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece

Vicência Jaguaribe (Por entre brumas )

Acabou-se o combate.
Para ela já não haverá lágrimas,
nem prantos, nem sobressaltos.
(Ignácio Larrañaga)

O marido entra no quarto e abre a cortina. Ela puxa o lençol e cobre a cabeça.

- Como amanheceu, querida? Dormiu bem?

Ela olha para o homem, posicionado contra o sol, que entra pela janela. O que vê são raios luminosos projetando-se de uma figura que ela não sabe o que é, e sente medo. A figura desloca-se e aproxima-se da cama. Ela percebe que é um homem, mas não sabe quem é. Faz uma cara de susto e recua na cama.

- Sou eu, Júlia, o Hugo. Trouxe o seu mingau.

Ela toma todo o mingau que ele lhe dá a colheradas. De vez em quando, olha para o homem com o olhar meio temeroso e, quando ingere a última colherada do alimento, encolhe-se e cobre-se da cabeça aos pés. O homem olha aquela trouxinha branca em cima da cama, ensaia um carinho, mas desiste. E sai do quarto deixando a porta aberta. Há muito renunciara às tentativas de trazer a mulher à realidade. Às vezes, tinha a impressão de que ela o reconhecia, queria falar-lhe, mas era uma impressão de minutos ou até de segundos. Logo ela se recolhia ao seu mundo especial, ao qual ninguém tinha acesso.

Mal o marido deixa o aposento, ela tira o lençol do rosto. Em sua cabeça, os fatos e as pessoas se misturam, e ela não consegue situar-se nem em relação a eles nem a ela mesma. Aquele homem que acabara de sair, por exemplo, não sabe quem é. Às vezes, tinha a impressão de que o conhecia; outras vezes, tinha medo dele. Mas ele estava sempre ali, com ela. Aquelas mãos que lhe davam comida, que a banhavam, que a penteavam... ela as reconhecia. De repente, uma imagem clara aparece em sua mente – aquelas mesmas mãos, só um pouco mais novas, seguravam uma de suas mãos e lhe punham um anel. Ela sorria, feliz. Mas ao seu lado aparecia a imagem de outro homem! E ela tem medo, e as imagens tornam a embaralhar-se, e ela volta a encolher-se em cima da cama.

O marido termina de vesti-la e penteia-lhe os cabelos molhados. Enche-a daquela colônia suave, sua preferida, e tenta conversar. Ela não faz a cara de medo que tanto o entristece, mas também não diz nada. Ele precisa sair, e a nora ficará de plantão. Dá-lhe um beijo na testa, encosta uma cadeira na porta. Faz-lhe um aceno.

Um outro clarão em sua mente... o outro homem a tomava nos braços e a beijava. Como era o nome dele? De repente ela o via de braços dados com uma outra mulher, segurando a mão de uma criança. Aquela mulher... aquela mulher... sim, era irmã do outro, aquele que lhe dera uma aliança. E ela tem medo, e encolhe-se na cama. Mas, desta vez, as imagens não voltam a embaralhar-se. E a mente teima em enviar-lhe outras imagens que ela parece entender – ela, feliz, na cama com o homem estranho. Não! Não! Por que essas lembranças agora!

Deve ter gritado, porque a nora sobe as escadas correndo.

- O que foi, dona Júlia? Está sentindo alguma coisa?

A resposta vem em forma de um esgar, seguido de um gesto com os braços, como se quisesse impedir a nora de se aproximar.

Quando fica novamente sozinha, um outro clarão – a porta do quarto onde ela se encontrava com o homem se abriu, e a mulher que estava de braços com ele entrou. E aí, na sua cabeça, as imagens e os fatos se clarificam: a mulher era irmã de seu marido e esposa do homem que... O medo vem forte, e as lembranças se vão, deixando-a novamente naquele vazio, que talvez seja para ela uma bênção.

O marido veste-lhe uma camisola limpa, muda os lençóis e arruma-a para dormir, depois de lhe dar o sonífero. Afaga-lhe os cabelos, desliga a luz principal do quarto e deixa acesa apenas a pequena lâmpada do abajur. Retira-se para o seu quarto, que tem com o da mulher uma porta de correspondência. Aquele olhar que ela, às vezes, como há instantes, lança-lhe – olhar de dor, de súplica... chegava até a pensar... de pedido de perdão – leva-o ao passado, a fatos nunca explicados, a suspeitas nunca confirmadas. Basta! Que adianta desenterrar defunto? Ele já morreu, e ela está praticamente morta!

A mulher fecha os olhos e tenta dormir... os clarões na mente, no entanto, reaparecem. Ela comprime os olhos fechados, enrola a cabeça. Em vão! As lembranças chegam, claras, em forma de relâmpagos e impõem-se sem lhe dar nenhuma chance de apagá-las. O olhar reprovador das cunhadas, que ela recebia com um sorriso de ironia! Os cuidados da sogra, para que o filho não desconfiasse, a que ela respondia com gargalhadas! A dor e o desespero controlado da cunhada traída, que ela devolvia com demonstrações de alegria! E o marido, apaixonado desde o primeiro dia, na sua santa ignorância, ou no oportuno faz de conta que não sei! E os relâmpagos se sucedem vertiginosamente, até que ela não suporta mais e grita.

O marido, na porta do apartamento, ouve o diagnóstico: enfarto no miocárdio; é questão de horas. Fecha a porta e senta-se na cadeira ao lado da cama. Pega a mão da mulher e, entre triste e aliviado, espera.
–––––––––––––––––-
Vicência Maria Freitas Jaguaribe, natural de Jaguaruana-Ce.
Professora de Literatura e Estilística da Universidade Estadual do Ceará.
Mestra em Literatura pela UFC.
Trabalhos publicados nas áreas de Literatura, Estilística e Lingüística do Texto.

Fonte:
http://www.conexaomaringa.com/

Camila Vardarac (Radar Murnau)


Dois seres pálidos apagam suas sombras ao abandonarem as réstias de luz, seguem fracos e rastejantes como moribundos esperançosos na direção da escuridão plena, porque só no mais puro breu nasce a semente vital que alimenta os seus espíritos, semente que abre as cortinas da alma, fechadas durante a temporada do sol.

Dos habitantes diurnos só querem o sangue contaminado que corre pelos corpos debilitados, aliás, esses seres obscuros valorizam muito mais o sangue por não possuí-lo naturalmente, é preciso consegui-lo a partir dos homicídios (nem sempre premeditados), assaltos a hospitais ou contribuições dos suicidas, que estão cada vez mais raras visto que esses kamikazes de hoje só querem mesmo morrer sem dor, uma morte calada num cômodo de apartamento impenetrável.

Antigamente, corria nas veias um sangue mais limpo, regido ainda por algumas ordens naturais, sem tanta química corrosiva. Antigamente, sangue era néctar e quem quisesse morrer o fazia com honra e tiro e foice, às vezes corda e o desespero avisava aos seres da noite que o banquete estava servido, agora morre-se por pílulas, analgésicos e calmantes em excesso e nenhum alarme soa aos ouvidos dos sedentos noturnos... o fim também está próximo para eles, por mais que saiam das tocas lacradas assim que o sol se põe, na cansativa busca pela vida carregada de contagem regressiva.

O fim se aproxima e o dia é apenas o prelúdio.
–––––––––––––––––––
Camila Vardarac nasceu no Rio de Janeiro, em 1987.
Observadora por natureza, escritora por impulsão – pela necessidade (recorrente) de expressar-se em prosa e poesia.
Voyeur da realidade e de suas representações, encontrou no cinema um meio de materializar suas idéias no continuum do espaço-tempo, desconstruindo-se em impressões.

Fonte:
http://www.conexaomaringa.com/

Estante de Livros



Nora Roberts (Pecados Sagrados)

Nos indolentes dias de verão, uma impiedosa onda de calor é o principal assunto na capital norte-americana. Mas a condição climática logo deixa de ser matéria das primeiras páginas quando uma jovem é encontrada morta por estrangulamento. Um bilhete foi deixado - Seus pecados lhe são perdoados. Logo surgem duas outras vítimas, e, de repente, as manchetes passam a ser dedicadas ao assassino que a imprensa apelidou de 'Padre'.

Quando a polícia pede à Dra. Tess Court, uma psiquiatra renomada, que auxilie na investigação, ela apresenta o retrato de uma alma perturbada. O detetive Ben Paris não dá a mínima para a psique do assassino. No entanto, o que ele não consegue descartar com facilidade é a sensual Tess.

Moreno, alto e bonitão, Ben tem uma reputação lendária com as mulheres, mas a fria e elegante Tess não reage como as outras que ele conheceu e o detetive acha o desafio sedutor. Agora, enquanto os dois estão juntos numa perigosa missão para deter um serial killer, irrompe a chama de uma paixão incandescente. Mas há alguém que também está de olho na linda médica loura, e só resta a Ben rezar para que, se o assassino atacar, ele consiga detê-lo antes que seja tarde demais.
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Françoise Bourdin (Mensagem no Jardim)

Em 'Mensagem no jardim', Françoise Bourdin apresenta a história de Pascale Fontanel, uma médica esgotada após seu recente divórcio e cansada de sua vida sem graça em Paris, que decide voltar à sua pacata cidade natal, Peyrolles, no sudoeste da França. Seu pai, contudo, por querer vender a propriedade da família, opõe-se totalmente à decisão da filha. Seria a morte brutal de sua primeira mulher num incêndio e a depressão da mãe de Pascale razões para esta reação tão ferina quanto inesperada?

Mesmo com a resistência do pai, Pascale retorna e instala-se na antiga casa com a determinação de ali reconstruir sua vida. Contudo, ocorrem episódios que vão perturbar as suas lembranças. O jardineiro, um homem de comportamento estranho, recusa-se a deixar a propriedade. Os vizinhos, por sua vez, contam histórias assustadoras ligadas à família Fontanel. E o mais intrigante - a antiga caderneta da família achada no sótão por Pascale.

O que realmente terá acontecido em Peyrolles? Que outros mistérios a casa esconde? Pascale não descansará até descobrir toda a verdade.
–––––––––––––––––––-
Fonte:
Livraria Cultura

Santos sedia Encontro Internacional de Escritores


A celebração da Literatura quase sempre ocorre num contato silencioso do livro com o seu leitor. Neste momento, pode até parecer que o escritor está ausente, e que a sua presença é menos sentida do que a dos próprios personagens. Este ano, Santos aproxima as pessoas e as histórias, e ganha a sua celebração da leitura. Desta vez, os protagonistas são os autores e você.

Esta rede de histórias, autores e leitores é a Tarrafa Literária, acontece em Santos de 3 a 7 de setembro de 2009 no tradicional teatro Guarany, restaurado e majestoso, no centro histórico de Santos.

Uma Festa Literária, e não uma feira de livros: trata-se de uma grande reunião de leitores e escritores, em quatro dias para dar voz ao pensamento e conversar sobre literatura, jornalismo, filosofia, história, futebol e o que mais vier à mente dos convidados. Não é um ambiente acadêmico, mas de entretenimento e cultura; não é uma ocasião informal, mas a ocasião é despojada e o lugar acolhedor.

Estarão com grandes nomes da literatura nacional e internacional, apresentando temas dos mais interessantes na atualidade, bem próximos de São Paulo capital. Considerando os atrativos do porto e das praias, as partidas de futebol e a praticidade do Sistema Anchieta-Imigrantes para o acesso à região, o período é bem favorável para quem vem de fora, seja para um programa diferenciado de um dia, seja para aproveitar as vésperas do feriado da Independência do Brasil.

PROGRAMAÇÃO

quinta-feira, 3 de setembro de 2009
20:00 - Solenidade de abertura

Intervenção Artísticas com entrega de pergaminhos com trechos da obra de Euclides da Cunha.
Local: Praça dos Andradas

sexta-feira, 4 de setembro de 2009
16:00 - Os livros dentro dos livros 1
Ruy Castro e Heloisa Seixas - Mediador: Ricardo Kotscho
Tarrafinha

16:00 - Retalhos Poéticos, Livros de pano
Local: Foyer - 1º piso do Teatro Guarany

17:45 - Autógrafo com autores
Local: Lobby de entrada do Teatro Guarany

19:00 - Os livros dentro dos livros
Hélio de Almeida e Estela dos Santos Abreu - Mediadora: Patrícia Andrik

Tarrafinha

19:00 - Contação de histórias
Livro: O sapo vira rei vira sapo
Local: Foyer - 1º piso do Teatro Guarany

21:00 - Autógrafo com autores
Local: Lobby de entrada do teatro Guarany

sábado, 5 de setembro de 2009
16:00 - Ficção, a Mentira sem culpas.
Milton Hatoun e André Laurentino.
Mediador: José Roberto Torero.

Tarrafinha
16:00 - Cortina de Histórias
Livro: O Pequeno Rei e o Parque Real
Local: Foyer - 1º piso do Teatro Guarany

17:45 - Autógrafo com autores
Local: Lobby de entrada do teatro Guarany

19:00 Mentiras, culpa da ficção.
Lourenço Mutarelli e Marcelo Mirisola.
Mediação: José Luiz Tahan.

Tarrafinha

19:00 - Contação de histórias
Livro: O Diário de Lelê
Local: Foyer - 1º piso do Teatro Guarany

21:00 - Autógrafo com autores
Local: Lobby de entrada teatro Guarany

domingo, 6 de setembro de 2009
16:00 - JORNALISTAS ALÉM MUROS
Jorge Caldeira e Laurentino Gomes
Mediação: Zuenir Ventura

Tarrafinha

16:00 - Contação de histórias
Livro: As Letras, de Laura Beatriz

19:00 - Cortina de histórias
Local: Foyer - 1º piso do Teatro Guarany

19:00 - FILÓSOFOS ALÉM MUROS
Theo Ross (Alemanha) e Márcia Tiburi
Mediadora: Mona Dorf

21:00 - Autógrafo com autores
Local: lobby de entrada Teatro Guarany

segunda-feira, 7 de setembro de 2009
11:00 - Jogo de Futebol
Local: Santos Futebol Clube
Estádio Urbano Caldeira, Vila Belmiro

16:00 - FUTEBOL E LITERATURA, PAIXÃO NACIONAL
Matthew Shirts e Xico Sá
Mediador: Vladir Lemos

Tarrafinha

16:00 - Confecção de livros, Poeta dos mares
Local: Foyer, 1º piso do Teatro Guarany

19: 00 - Construção de livros de brinquedo
Local: Foyer, 1º piso do Teatro Guarany

19:00 - LIVROS QUE MOLHAM
Amyr Klink e Tim Winton (Austrália)
Mediador: Arthur Dapieve

21:00 - Autógrafo com autores
Local: Lobby de entrada teatro Guarany

21:15 - Intervenção Artística
Local: Praça dos Andradas

Fontes:
Douglas Lara.
http://www.sorocaba.com.br/acontece

domingo, 6 de setembro de 2009

Antonio Augusto de Assis (Notas de Viagens)


1
Nobre Porto Alegre.
Em cada rua Quintana
passarinha ainda.

2
Érico sulíssimo.
Olhai os lírios dos pampas,
um deles Veríssimo.

3
Lagoa, Floripa.
De repente um cisne negro:
Cruz e Sousa passa.

4
Curitiba, a chique.
Na lenda da Kolody,
a luz de Leminski.

5
Maringá, Joubert.
Canção que virou cidade
que virou buquê.

6
Vida, luz, ação.
Intrépida Pauliceia
de Mário de Andrade.

7
Guilherme, Campinas.
Haicai que rimando sai
das chuvinhas finas.

8
Ah, Bauru, que bom.
Ah se houvesse mais Helvécios
e Nempuku Satos.

9
Entre aviões e carros,
nos campos de São José,
Cassiano Ricardo.

10
Taubaté tal sítio
do picapau amarelo.
No portão, Lobato.

11
Rio de Janeiro
e de Machado de Assis.
De lambuja, o mar.

12
Niterói se gaba.
Luiz Antônio Pimentel,
o guru da taba.

13
Estação Friburgo.
Luiz Otávio e Jota Gê
regando os florais.

14
Campos, sempre doce.
Tal qual Antônio Roberto
gorjeando trovas.

15
São Fidélis, o eco
das rimas de padre Augusto.
Poeta de Deus.

16
Velho Cachoeiro
de Roberto e Rubem Braga.
Do Itapemerim.

17
A bênção, Fabiano.
Dizei-me qual mais amais:
Belzonte ou Beraba?

18
Mariana, Alphonsus.
Os sinos e os cinamomos
recontando histórias.

19
Um só coração:
Pouso Alegre e o casarão
do poeta Meyer.

20
Ouço Juiz de Fora,
escuto Belmiro Braga.
E haverá quem não?

21
Cordisburgo, a rosa
do Rosa das rosas ledas.
Dos sertões: veredas.

22
Cora Coralina.
Coração do coração
do Brasil, Goiás.

23
De todos os santos.
Bahia de Castro Alves,
da praça do povo.

24
Maceió, Fulô.
Ora se deu que chegou
o Jorge de Lima.

25
Sol da Paraíba,
licença que eu quero ouvir
Augusto dos Anjos.

26
Recife, Recife,
de Bandeira e de Adelmar.
Com engenho e frevo.

27
Natal dos três reis:
Reinaldo, Luís Cascudo
e Luís Rabelo.

28
De Acari partiu,
o coqueiral deu-lhe adeus.
Aparício, o bom.

29
Fortaleza, o mar
de Alencar e de Iracema.
Poeta e poema.

30
Maranhão, Gullar.
As aves ali gorjeiam
com Gonçalves Dias.
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Fonte:
Colaboração do autor

Aristóteles Guilliod de Miranda (Caldeirão Literário do Pará)



RUÍDOS

Traduzo meu risco de ser
buscando-te no desvão do eco
da palavra espanto
plantada no olfato de gestos
deste chão que planejo
assim como a natureza
da morte revisitada
em cada ausência.
–––––––––––––––-

PORTA-RETRATOS

A vida parada num sorriso
que desafia o tempo
e que se destrói
quando alguém
troca a foto
– que já não toca.
–––––––––––––––-

XXII

O cinzeiro mede a hora
e a alma
O tapete acalma os pés
inquietos
com seu carinho sintético
A lâmpada e seu olho quente
observam a
natureza morta do homem

Só o relógio, impunemente,
enterra o tempo
entre os ponteiros
–––––––––––––––––––

1964

Então, foi decretado o escuro.
Eu, que nem iniciara
o aprendizado da luz,
fiquei sem sol.

––––––––––––––-
MACACO

Do espelho ancestral me olhas
em caretas e curiosidade
como a perguntar pelas eras
em que eras eu

Semi-ereto, teu caminho
encontra meu destino recurvo

Em guinchos saúdas a razão
em seu caminho milenar
até a voz

Teus riscos no chão inauguram
as palavras com que te celebraria
mais tarde.
––––––––––––––––––

ANIMA/IS

em penas
em pêlos
em pele
– plenos de si

cantos e escamas
cascos, carapaça e casulo
caudas

seda envoltos
vital invólucro
vôo & passo
uivos

patas irmãs das minhas mãos
em asas e nadadeiras

quebra-cabeças da natureza
misteriosa mistura
de cheiros e gritos e textura
universo inverso
de mim
––––––––––––––––––

PARA SEMPRE

Remeter ao vértice
ao pubiano vórtice incendiado
em alegóricas auroras
entranhadas na hora amortecida
Entre pêlos
..................sábios
.............................lábios
aludir segredos
diluir delírios
Sucumbir em vagas
em estridentes vagas ressoadas
como um bote
––––––––––––––––

Aristóteles Guilliod de Miranda (1954)



Aristóteles Guilliod de Miranda, nasceu em Belém do Pará em 1954.

Médico desde 1977, em atividade. Arrisca-se na poesia desde a adolescência. Mais tarde reavalia a “produção” tendo sobrado poucos poemas desta fase.

Leituras de Pessoa, Vinícius e Bandeira, principalmente, vão ajudando na determinação de continuar. “Edita” de forma artesanal Viagem Íntima (1984), trinta poemas para comemorar seus 30 anos.

Ainda na década de 80 participa de antologias poéticas.

Licenciatura em Letras (1989) e Mestrado em Teoria Literária (1991). Nesse período colabora com regularidade, por quase dois anos, para o jornal O Liberal com artigos. Três prêmios em poesia e um em ensaio pela Academia Paraense de Letras.

Publica Travessia do Ser, poesia, em 1999. Incluído na Poesia do Grão-Pará (2001), antologia organizada por Olga Savary. Em 2006 lança um novo livro de poemas: Para Além dos Alísios.

Fonte:
http://www.culturapara.art.br/