terça-feira, 9 de novembro de 2010

Luiz Antônio Aguiar (A Lliteratura Infanto-Juvenil e o Jovem Leitor Contemporâneo), em Porto Alegre


Muitos escritores, professores e pais reclamam da falta de vontade dos jovens pela leitura, ainda que ano a ano sejam produzidos livros de extrema qualidade para o público infanto-juvenil. Qual a raiz dessa contradição? Qual o espaço da leitura, e da literatura, na contemporaneidade?

O 2º Papo de Escritor, organizado pelo portal AG e a AGES na Feira do Livro de Porto Alegre, traz o premiado escritor carioca Luiz Antônio Aguiar para conversar com o público gaúcho sobre estas questões, enfocando especialmente a literatura infanto-juvenil contemporâneo e seu leitor. A mediação é de Marcelo Spalding.

Dia 13 de novembro de 2010

Sábado, às 20 h

Na Feira do Livro de Porto Alegre

Casa do Pensamento - Cais do Porto - Área Infantil e Juvenil

ENTRADA FRANCA!

Fonte:
Artistas Gaúchos

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo IV: Em pleno mar dos Substantivos


Havia muita coisa a ver no bairro dos Substantivos, e por essa razão todos protestaram quando Emília falou em visitar as INTERJEIÇÕES.

— Espere, bonequinha aflita! — disse Quindim. — Inda há muito pano para manga aqui. Vocês ainda não observaram que estes Senhores Nomes estão divididos em dois gêneros, o MASCULINO e o FEMININO, conforme o sexo das coisas ou seres que eles batizam. Paulo é masculino porque todos os Paulos pertencem ao sexo masculino.

— Mas Panela? — advertiu Emília. — Por que razão Panela é Nome feminino e Garfo, por exemplo, é masculino? Panela ou Garfo têm sexo?

— Isso é uma das maluquices desta cidade — respondeu o rinoceronte. — Já em Anglópolis não é assim. Há lá mais um gênero, o GÊNERO NEUTRO, para todas as palavras que designam coisas sem sexo, como Panela e Garfo.

— Coitados dos ingleses que se mudam para o Brasil! — advertiu Pedrinho. — Imaginem a trabalheira para decorar o sexo de milhares de palavras indicativas de coisas que. . . não têm sexo!

— Você tem razão — disse Quindim —, mas em matéria de língua a coisa é como é e não como deveria ser. Nesta cidade os Substantivos terminados em O, U, I, Em, Im, Om, Um, En, L, R, S e X são quase sempre masculinos.

— Nossa Senhora! — exclamou Narizinho. — Quantas terminações! Os homens mostram o seu egoísmo em tudo. "Chamaram" para o sexo deles quase todas as terminações possíveis. E os femininos?

— São quase sempre femininos os Nomes terminados em A, Ã, Ção, Gem, Dade e Ice.

— Bandidos! — protestou a menina. — Os homens tomaram para si doze terminações e só deixaram seis para o sexo feminino — a metade. . .

— Não faz mal, Narizinho — consolou a boneca. — Quando nós tomarmos conta do mundo, havemos de fazer o contrário — ficar com doze para o nosso sexo e só dar seis para o sexo deles.

O rinoceronte continuou:

— E há ainda Nomes que possuem dois sexos, isto é, que tanto servem para indicar seres ou coisas do gênero feminino como do masculino. Nós, gramáticos, usamos um nome muito feio para designar tais substantivos — EPICENOS.

— Isso não é designar, é xingar! — disse Emília.

— Nomes como Onça, Cônjuge, Criança, Jacaré e tantos outros têm o defeito de servir para os dois sexos. São Nomes Epicenos.

— Epiceno é o nariz dos gramáticos — exclamou Emília.

— Um defeito a gente deve corrigir. Xingar o defeito com um nome feio não adianta.

— E há ainda — continuou o rinoceronte — os Nomes chamados COMUNS DE DOIS, que ora são masculinos, ora são femininos. O Nome Artista, por exemplo, é Comum de Dois, porque a gente tanto pode dizer O Artista como A Artista. Fora dessas duas classes de Nomes, o resto passa dum sexo para outro por meio duma simples mudança do final. Os que terminam em O mudam esse O em A e viram femininos. Outros, porém, arranjam um nome diferente para o feminino, como Pai — Mãe; Frade — Freira; Cavalo — Égua; Ladrão — Ladra.

— E qual o feminino de Rabicó? — perguntou Narizinho. O rinoceronte ficou atrapalhado.

— O feminino de Rabicó é Emília, porque ela é a mulher de Rabicó.

Emília, que já de muito tempo se havia divorciado de Rabicó, ficou danadinha e disse:

— Nesse caso, o masculino de Narizinho é Bacalhau. . . Todos arregalaram os olhos, sem perceber a idéia da boneca.

— Sim, porque Narizinho também é casada com o tal Príncipe Escamado, que para mim não passa dum bacalhau de porta de venda, muito ordinário. . .

— Calma, calma! — exclamou o rinoceronte. — Deixem as brigas para quando regressarem. Em vez disso prestem atenção a outra particularidade dos Substantivos. Além de Gênero, ou Sexo, eles têm NÚMERO, como dizem os gramáticos. Ter Número quer dizer ter SINGULAR e PLURAL. Quando um Substantivo designa uma coisa só, vai para o Singular; quando designa duas ou mais coisas, vai para o Plural. O meio de passar do Singular para o Plural consiste no ajustamento dum rabinho chamado S. Exemplo: Gato, é Singular; põe o rabinho e vira Gatos — Plural.

— É assim com todos os Substantivos? — perguntou Emília.

— Não; existem muitos que fazem o Plural de outros modos. Os que terminam em A, Ol e Il tônicos trocam o L final por Is, como Sol, que faz Sóis; Canal, que faz Canais; Barril, que faz Barris.

Os terminados em El e os terminados em Il átonos mudam o El e o Il em Eis assim: Anel, Anéis; Fóssil, Fósseis. Os terminados em Ul trocam o L por Is, como Azul, que faz Azuis. Alguns não seguem a regra, como Cônsul, que faz Cônsules.

— Enjoado! — comentou Emília, fazendo bico. — E os terminados em R, Z e N?

— Esses fazem o plural juntando Es — Mulher, Mulheres; Nariz, Narizes; Abdômen, Abdômenes. E os que terminam em M trocam esse M por Ns, como Homem, que faz Homens. E os que terminam em S não mudam, como Pires, Lápis. Um pires, dois pires. Entretanto, os terminados em Ês fazem o plural acrescentando Es, exemplo Mês, Meses; Cortês, Corteses.

— Chega de Número, Quindim — disse Emília. — Já me está enjoando as tripas. Mude de tecla.

Nesse momento surgiu o Visconde, que ficara nos subúrbios de prosa com a velha Bofé e outras corujas. Vinha correndo e a tapar os ouvidos com as mãos.

— Que aconteceu, Visconde? Que carreira é essa?

O pobre sábio parou, arque jante, de língua de fora como um cachorro cansado.

— Oh, estou envergonhadíssimo! — exclamou com esforço, enxugando a testa com as palhinhas de milho do pescoço. — Imaginem que ao vir para cá errei e fui dar com os costados num bairro horrível, que nem sei como a polícia deixa! O bairro das PALAVRAS OBSCENAS. . . Que coisa feia, Santo Deus! Vi por lá, soltas nas ruas, esmolambadas e sórdidas, as palavras mais sujas da língua. Sarnentas, vestidas de farrapos e sem a menor compostura nos modos. Assim que me viram deram-me uma grande vaia nos termos mais infames. Os nomes que ouvi eram de fazer cor ar a um frade-de-pedra. E vim correndo avisar vocês para que não passem por lá.

Mas a pestinha da Emília, que era boneca e não achava nada no mundo indecente, assanhou-se logo.

— Vocês, sabugos, são tão cheios de histórias como as gentes de carne — disse ela. — As coitadas das palavras que culpa têm de existirem no mundo coisas que os homens consideram feias? Vou lá, sim. Quero consolar as pobres infelizes e dar-lhes uns bons conselhos.

Narizinho, porém, não deixou.

— Não vai, não, Emília. Inocentes ou culpadas, o melhor é não nos metermos com elas. Vovó, se soubesse, ficaria aborrecida. Por aqui ainda há muita coisa decente para vermos. Olhe aquela palavra esquisita, que vem latindo. Senhora Palavra, venha cá!

A palavra Canzarrão aproximou-se, latindo.

— Au! Au! Que é que a menina deseja?

— Saber quem é a senhora e o que faz.

— Sou a mesma palavra Cão aumentada; se tenho de designar um cão grande, viro Canzarrão; e se tenho de designar um cão pequenino, viro Cãozinho.

— Isto é o que os gramáticos chamam GRAU — mudança nas palavras para dar idéia do tamanho das coisas — explicou o rinoceronte. — Há o Grau AUMENTATIVO, para aumentar, e o Grau DIMINUTIVO, para diminuir.

— Sei disso — declarou Emília. — As palavras quando querem significar uma coisa grande, latem; e quando querem significar uma coisa pequena, choramingam.

Ninguém entendeu.

— Sim — insistiu ela. — Botar um Ao no fim duma palavra é latir, porque latido de cachorro é assim — ão, ão, ao! E botar um Inho, ou um Zinho no fim das palavras é choramingar como criança nova. Panela, por exemplo; se late, vira Panelão e se choraminga, vira "Panelinha. . .

O rinoceronte admirou-se da esperteza da boneca.

— Muito bem, senhorita! — exclamou ele. — Está certo. Mas nem sempre é assim. Aquelas duas palavras que vêm vindo para o nosso lado estão aumentadas — e aumentaram sem latir.

Vinha vindo a palavra Cabeçorra, de braço dado à palavra Copázio.

— São aumentativos de Cabeça e Copo — explicou Quindim. — Cabeça — Cabeçorra; Copo — Copázio.

— Mas eu posso dizer Cabeção e Copão — insistiu Emília.

— Pode, mas também existem aquelas formas de aumentativo sem Ao. Bicho, por exemplo, dá Bichão e Bichaço. Corpo dá Corpão e Corpanzil. No caso de serem palavras femininas, em vez de Ão elas botam no fim Ona. Mulher, Mulherona.

— Ou Mulher aça — advertiu Narizinho. — Já ouvi vovó dizer que a viúva do Maluf da venda é uma Mulheraça.

— Está certo — confirmou Quindim —, e portanto fica visto que com Ão, On, Zarão, Rão, Aço ou Aça, Az, Ázio e Orra, as palavras aumentam. E para diminuírem, além do chorinho que Emília descobriu, como é que fazem?

Ninguém sabia diminuir sem chorinho. O rinoceronte explicou:

— Além do Inho e Zinho que Emília já disse, elas diminuem com Ito. . .

— Mosca, Mosquito — lembrou logo Pedrinho.

— E também com Ete, Eto, Oto, Ico...

— Antônio, Antonico — lembrou a menina.

— E com Ejo — continuou Quindim —, e com Ilho, Elho, El, lm, Olo, Ulo e Elo.

— Quantos jeitos! — exclamou Emília. — Isso é que aborrece na língua. Em vez de haver um jeito só para cada coisa, há muitos. Tal abundância de jeitos só serve para dar trabalho à gente.

— Dá um pouco de trabalho, sim — disse o rinoceronte —, mas em compensação traz muitas vantagens. Se Pedrinho virar algum dia escritor de histórias, há de ver que esta variedade ajuda grandemente o estilo, permitindo a composição de frases mais bonitas e musicais.

Narizinho olhou para Quindim com ar de surpresa. Como é que um bicho cascudo daqueles, vindo lá dos fundões da África, entendia até de "estilo" e frases "musicais"?

— Não posso compreender como ele virou tamanho gramático assim dum momento para outro. . .

— Para mim — sugeriu Emília — Quindim comeu aquela gramaticorra que Dona Benta comprou. Lembre-se que a bichona desapareceu justamente no dia em que Quindim dormiu no pomar. O Visconde tinha estado às voltas com ela, estudando ditongos debaixo da jabuticabeira. Com certeza esqueceu-a lá e o rinoceronte papou-a.

— Que bobagem, Emília! Gramática nunca foi alimento.

— Bobagem, nada! — sustentou a boneca. — Dona Benta vive dizendo que os livros são o pão do espírito. Ora, gramática é livro; logo é pão; logo é alimento.

— Boba! — gritou a menina. — Pão do espírito está aí empregado no sentido figurado. No sentido material um livro não é pão de coisa nenhuma.

Emília deu uma gargalhada.

— Pensa que não sei que os livros são feitos de papel de madeira? Madeira é vegetal. Vegetal é alimento de rinocerontes. Logo, Quindim podia muito bem alimentar-se com os vegetais que se transformaram no papel que virou gramática.

Apesar do absurdo de semelhante hipótese, Narizinho ficou meio abalada. Quem sabe lá se Quindim não tinha mesmo comido a Gramática histórica de Eduardo Carlos Pereira? Acontece tanta coisa esquisita neste mundo. . .

— Bom — disse o rinoceronte. — Chega de Substantivos. Vamos agora dar uma volta pelo bairro dos Adjetivos.
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Continua... Capítulo V: Entre os Adjetivos
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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por http://groups.google.com/group/digitalsource

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.43)


Trova do Dia

Aquela rede que um dia
foi nosso ninho perfeito,
hoje balança vazia
na varanda do meu peito.
FRANCISCO JOSÉ PESSOA/CE

Trova Potiguar

Nós somos mal informados.
Nossas chances são pequenas,
por vivermos mergulhados
sob as ilusões terrenas.
CHICO MOTA/RN

Uma Trova Premiada

2006 > Camboriú/SC
Tema > PESCADOR > Menção Especial

Na imensidão desse mar
o pescador corajoso,
tem sempre que se arriscar
em seu trabalho penoso!
GLEDIS TISSOT/SC

Uma Poesia livre

– José Feldman/PR –
REALIDADE

Não somos mais que esboços
Desenhados por outras mãos
Olhos cegos que vêem sem ver
Fantasmas do passado
Assombrando o amanhã.

Uma Trova de Ademar

Nas colheitas dadivosas
que vemos pelos caminhos,
uns curvam-se e colhem rosas,
outros só colhem espinhos...
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

Caminho sobre os escombros
do que foi a mocidade,
carregando sobre os ombros
o madeiro da saudade!
CAROLINA AZEVEDO DE CASTRO/PE

Estrofe do Dia

Quem nasceu com pouca sorte
Com nada se acostuma,
Uns têm castelos de areia,
Outros castelos de espuma;
As dádivas já são contadas,
Feliz de quem ganha uma!
CHICO DE ASSIS/RN

Soneto do Dia

– João Batista Xavier Oliveira/SP –
UM LUGAR PARA A ROSA.

Oh! tempo enganador, longevidade
parece tão curtinha no compasso
da vida cirandeira sem espaço
de ver o verde avesso à vacuidade.

O infindo no finito de um regaço
é a fonte que jamais se perde à idade.
E quem não vive o colo na saudade
não sente alvorecer num meigo abraço.

No passo escasso o espaço que se faz
amplia a solidão mesmo envolvida
na luz de uma cadência insidiosa.

A roda-viva ronda a nossa paz;
a frialdade aflige-nos ferida...
Redescubramos com urgência a rosa!!

Fonte:
Ademar Macedo

domingo, 7 de novembro de 2010

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.42)


Trova do Dia

Tem gente livre, mas cega
pois enxerga mas não vê,
seu jardim tem flor, não rega,
compra livro e nunca lê!
JOSIAS ALCÂNTARA/PR

Trova Potiguar

Xeroquei as tuas cartas
pra reler com todo o amor,
mas vejo que não te fartas
de arranhar a minha dor!
JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN

Uma Trova Premiada

2010 > São Paulo/SP
Tema > FEITIÇO > Vencedora

Por teu feitiço ou magia,
mesmo sabendo quem és,
troquei a minha alforria
e fui escravo a teus pés...
ERCY MARIA MARQUES DE FARIA/SP

Uma Poesia

– Ialmar Pio Schneider/RS –
NOSSO CAMINHO.

Envio-lhe estes versos com saudade
dos momentos felizes
de serenidade
ou deslizes...
Tudo é possível quando nos visita
uma paixão avassaladora,
inaudita
e sedutora...
Um sonho se descortina
em nosso caminho
e nos fascina
pelo carinho...
Quando estivermos juntos e unidos
vamos sempre lembrar
que fomos concebidos
para viver e amar...

Uma Trova de Ademar

Na Floresta, a “derrubada”
deixa em minha alma sequela,
pois a dor da machadada
dói mais em mim do que nela.
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

Louco de amor te busquei,
a ao te encontrar, percebi
que não fui eu que te achei,
eu, sim, é que me perdi!...
J. G. DE ARAÚJO JORGE/AC

Estrofe do Dia

Ao trocar o sertão pela cidade
confundi meu prazer com minha ânsia,
dediquei-me ao trabalho muito cedo
mutilei um pedaço da infância;
se não fosse o arquivo da memória
o capítulo melhor da minha história
estaria perdido na distância.
EDMILSON FERREIRA/PI

Soneto do Dia

– Alphonsus de Guimarães/MG –
S O N E T O.

Mãos que os lírios invejam, mãos eleitas
Para aliviar de Cristo os sofrimentos,
Cujas veias azuis parecem feitas
Da mesma essência astral dos olhos bentos;

Mãos de sonho e de crença, mãos afeitas
A guiar do moribundo os passos lentos,
E em séculos de fé, rosas desfeitas
Em hinos sobre as torres dos conventos;

Mãos a bordar o santo Escapulário,
Que revelastes, para quem padece,
O inefável consolo do Rosário;

Mãos ungidas no sangue da Coroa,
Deixai tombar sobre minh’alma em prece
A benção que redime e que perdoa!

Fonte:
Ademar Macedo

sábado, 6 de novembro de 2010

Luiz Hélio Friedrich (Livro de Trovas)


A cada dia que passa,
muda minha realidade,
meus sonhos viram fumaça,
amores viram saudade.

A eternidade me alcança
em quimeras descobertas
nos minutos de uma dança,
se num abraço me apertas.

Contra-senso é eu ter na vida,
Por meu sol os olhos teus,
E ao te olhar, minha querida,
Bem ceguinhos deixo os meus.

Curitibano adotivo,
eu vim cá, para estudar.
Apaixonado aqui vivo;
fiz da cidade meu lar.

Debruçada sobre o berço
do seu querido filhinho
busca a mãe, rezando o terço,
indicar-lhe um bom caminho.

Falhei nesta vida minha,
ao querer ser o teu rei
pois tu já eras rainha,
e escravo teu me tornei.

Mãe é palavra sublime,
e foi sábio o português
não criou outra que rime
com ela nem uma vez.

Meu pai, sisudo e calado,
não me deu muito conselho.
Porém, seu exemplo, honrado,
segue sendo o meu espelho.

Na mulher – delicadeza -
é fraqueza que me intriga;
sendo mãe, é fortaleza
que os filhos pra sempre abriga.

Na renúncia à própria vida
pra gerar os filhos seus,
uma mãe tem, garantida,
outra vida junto a Deus.

O poeta quando canta
a sua dor que é infinda
até a Deus ele encanta:
-Ganha mais dores , ainda!

Para mãe, não há uma rima,
no idioma português,
pois ser mãe é obra prima,
- foi assim que Deus a fez.

Por seguir a vida afora
sem haver nenhum tropeço,
agradece à mãe, agora,
o filho por seu começo.

Qual o filho mais querido
aquele que a mãe mais gosta?
Se existe algum preferido?
Nem ela sabe a resposta!

Quem não se importa onde pisa,
na escalada desta vida,
sobe muito mas desliza
e escorrega na descida.

Quem tiver filhos pequenos
por força há de cantar:
quantas vezes as mães cantam
com vontade de chorar.

Quisera que o mundo visse
meu ar de felicidade
assim que você me disse:
“Namoro” – e não: “Amizade”.

Saudade, nem sempre triste,
traz lembrança de um ausente
que de longe ainda insiste,
em se dar como presente.

Luiz Hélio Friedrich (1942)



Luiz Hélio Friedrich, natural de Porto União – SC, nasceu em 23 de junho de 1942.

Filho de Afonso Luiz Friedrich, ourives e comerciante, e de Araceli Rodrigues Friedrich, professora, ex-vereadora em Porto União, trovadora. É casado com a artista plástica Marlene Froelich Friedrich. Mudou-se para Curitiba, Paraná onde foi oficial da Reserva pelo CPOR de Curitiba, formou-se em Engenharia Civil pela Escola de Engenharia da Universidade Federal do Paraná e em Engenharia de Segurança na FUMEC – MG.

Como Engenheiro, participou de grandes obras, como Hidrelétrica Parigot de Souza, Estrada de Ferro Central do Paraná, Metrô de Belo Horizonte e das obras de Túneis do Projeto Corrales de irrigação no Chile.

Atuante em várias entidades, Luiz Hélio Friedrich foi
Presidente do Departamento do Paraná da ABENC – Associação Brasileira de Engenheiros Civis;
Conselheiro Titular do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CREA-PR e do Instituto de Engenharia do Paraná – IEP.

Como trovador é sócio efetivo da UBT, seção de Curitiba, entidade que presidiu no biênio 2005-2006. Elaborou por 4 anos o boletim Os Trovadores, desta mesma seção.

Cadeira numero 40 na Academia Paranaense da Poesia, tendo como patrono Valfrido Pilotto.

Rafael Rodrigues (O Escritor Premiado)

Ilustração de Jairo Souza
No dia seguinte à chegada inesperada e retumbante, porém demorada, do sucesso, percebeu que suas roupas já não lhe serviam mais. Decidiu que iria imediatamente comprar calças, camisas, ternos e sapatos decentes, que fizessem jus a seu posto de mais talentoso e premiado escritor do ano.

Chegou a tirar o telefone do gancho, com intenção de ligar para a esposa e dizer “daqui a quinze minutos passo aí para te pegar”, mesmo que ainda fosse três da tarde e ela só estivesse livre do escritório às seis. O emprego dela não era mesmo grande coisa, seria até bom que abandonasse assim o expediente. Afinal, desde o dia anterior ela não era mais a esposa do escritor fracassado, de algumas centenas de livros vendidos e duas aparições na tevê (em matérias de cinco minutos cada, veiculadas no jornal local, nas quais deu declarações que, somadas, totalizam exatamente cento e setenta e sete segundos, de acordo com seu próprio cronômetro). Agora, ela seria a esposa de um dos expoentes da literatura contemporânea do país, que daria entrevistas a vários jornais, revistas e canais de televisão. Seria convidado da Flip, da Flap, do Flop e do Flup. Da Flep, não, porque esse evento é organizado por um de seus maiores desafetos. Mas quem precisa da Flep, afinal? Nem cachê eles pagam...

Abandonou o telefone porque lembrou-se da noite anterior. Depois de saber que seu livro inacreditavelmente fora eleito o melhor do ano por aquele bando de críticos que ele sempre julgou serem vendidos e, além disso, invejosos, idiotas, burros, analfabetos, safados, pilantras, mercenários e adjetivos outros que não cabem ser explicitados aqui, ele e sua esposa foram a um desses hipermercados que ficam abertos vinte e quatro horas comprar um vinho.

Mas não um vinho qualquer. A ocasião era por demais especial. Porque além de ter seu livro elogiadíssimo – os jurados do prêmio literário, na nota de divulgação do resultado final, diziam coisas como “um dos melhores romances da última década”, “com sua prosa arrojada, o autor entra para o seleto grupo de escritores que merecem o maior dos prêmios literários: a posteridade”, ou, ainda, “perturbador do início ao fim, este romance é uma obraprima” –, sua conta bancária em breve estaria recheada de centenas de mil dinheiros. Para ele, dinheiro não seria mais problema, e fazia questão de comprar o melhor vinho que estivesse à venda naquela espelunca.

Até então, nunca precisara comprar um bom vinho. Nem mesmo quando do casamento. Com tanta coisa para pagar – “e a casa, meu Deus, e a casa?”, ele pensava, na época, sempre desesperado para honrar o financiamento em 300 meses feito através da Caixa Econômica Federal –, o casamento foi simples – bem simples, mesmo – e o vinho, mais ainda. Mas isso não significa que ele não soubesse o que é um vinho decente. Em suas leituras – ele lia muito, afinal, é um escritor –, volta e meia apareciam personagens ricos, cultos – e esnobes –, apreciadores de bons vinhos. Geralmente literatura francesa, sendo que alguns escritores norte-americanos também faziam questão de explicitar seus conhecimentos vínicos. Tal característica em escritores que ele tanto admirava o deixou curioso e ele terminou por ler alguma coisa sobre vinhos.

Na seção de bebidas, perguntou à esposa que tipo de vinho ela preferia. Ouviu como resposta “Um bom, ué. Pode ser este aqui”. Estava segurando uma garrafa de Quinta do Morgado (tinto e suave). Há pouco mais de um mês um amigo lhes indicara aquela marca, da qual gostaram muito. Mas agora a situação era outra. Ele não poderia tomar um vinho daqueles, barato, que qualquer um pode comprar. Além disso, lembrou-se dos escritores cultos, esnobes – mas nem sempre ricos – e geralmente alcoólatras que lia. Decididamente, não compraria um vinho ridículo como aquele.

Disse à esposa, com todo o cuidado, que gostara muito do Quinta do Morgado, mas que a ocasião era especial e que deveriam comprar algo melhor e mais caro. Novamente pediu-lhe uma sugestão; ela disse-lhe que não entendia de vinhos, e que gostara bastante daquele que agora colocava de volta na prateleira.

Naquele momento, não lhe causou espanto ouvir sua esposa dizer que não entende de vinhos. Mas nos segundos que antecederam o abandono do telefone, notou que não poderia comprar roupas com uma mulher que nada entende de algo tão importante. Decidiu ir sozinho ao shopping.

O shopping. Ele odiava o shopping. Pessoas indo de um lado para o outro, subindo e descendo, olhando vitrines, tomando sorvetes, comendo sanduíches, pessoas berrando, bebendo, fumando, tropeçando nele, impedindo sua passagem, levando horas para sacar um maldito dinheiro num caixa eletrônico. Ia algumas vezes ao shopping apenas porque frequentava as duas livrarias que lá estavam abrigadas. Não fosse isso, jamais colocaria seus pés ali.

Mas, naquele dia, o shopping lhe pareceu muito agradável. Pessoas sorridentes, felizes, mães e pais andando de mãos dadas com seus filhos, casais de namorados abraçados, tudo na mais perfeita harmonia. Percorreu algumas lojas masculinas de grife e gastou o equivalente ao valor que ganhara em todo o mês anterior, com suas aulas de literatura num cursinho pré-vestibular e alguma coisa que pingava em sua conta bancária referente a direitos autorais. Entrou em uma das duas livrarias, mas não comprou nenhum livro. Sequer passeou seus olhos pelas estantes. Nem mesmo verificou se ainda estava lá o único exemplar do seu livro que restava na livraria, coisa que ele sempre fazia quando ia lá – naquela loja ele bateu seu recorde de vendas: 53 exemplares vendidos na noite de lançamento, há dois anos. Queria apenas tomar um capuccino e comer um cookie de chocolate.

Ao chegar em casa, pouco antes das seis horas da tarde, seus olhos ignoraram a foto que ele sempre mirava ao abrir a porta e que estava no mesmo lugar em que sempre esteve nos dois últimos anos: uma peça comprada por eles especificamente para aquele fim. Ela queria que uma fotografia dos dois, a que ela mais gostava, fosse uma espécie de cartão de visitas do casal a todo aquele que entrasse naquela casa.

Ela chegou pouco depois das seis e meia e ficou surpresa ao ver todas aquelas sacolas de compras ao lado da cama. Perguntou que novidade era essa, e ele respondeu dizendo que um escritor talentoso não podia mais vestir roupas comuns, de lojas de departamentos. Precisaria, a partir de agora, vestir-se bem, com elegância. Ela achou engraçado, disse que a esposa do escritor queria andar elegante também e foi tomar um banho. Ele chegou a pensar na possibilidade de irem comprar roupas novas para ela no dia seguinte, mas seus pensamentos se voltaram novamente para a noite anterior. Depois, pensou que uma mulher como ela, que trabalhava no setor administrativo de uma empresa de médio porte, não tinha motivos para andar elegante. Durante a maior parte do dia ela vestia a farda da empresa, e nos finais de semana eles pouco saíam juntos. Ela não gostava de ir a eventos literários e, enquanto ele estava em um lançamento de livro, assistindo a uma mesa redonda sobre literatura ou mesmo tomando um café com algum amigo escritor, ela aproveitava para visitar sua mãe ou receber a visita de alguma amiga. Para atividades como essas, estar elegante não era necessário.

Alguns minutos se passaram e ela foi à cozinha com intenção de tomar o café que ele sempre fazia antes de ela chegar. Mas não havia café. Ele não fizera. Perguntou sobre o café e ouviu-o dizer que esquecera. Ela acabou fazendo.

Enquanto ela comia – ele, não, “fiz um lanche no shopping”; “você, comendo no shopping?”; “é, um capuccino e um cookie, deu vontade” –, ele pensava que, dali em diante, sua vida jamais seria mais a mesma. Se aquele livro lhe rendera um prêmio tão importante, o que os próximos, que seriam melhores ainda, não poderiam conquistar? E os anteriores, que também eram bons, começariam a vender mais, ganhariam novas edições, finalmente seriam lidos pelos mesmos críticos que ele julgava serem vendidos e, além disso, invejosos, idiotas, burros, analfabetos, safados, pilantras, mercenários e adjetivos outros que não cabem ser explicitados aqui, e certamente esses mesmos críticos derramariam sobre suas obras elogios dos mais variados, como “um dos melhores livros de contos da última década”, “com sua prosa arrojada, o autor entra para o seleto grupo de escritores que merecem o maior dos prêmios literários: a posteridade”, ou, ainda, “perturbador do início ao fim, este volume de contos é uma obra-prima”. Editoras disputariam pra ter seu nome no catálogo, ele assinaria contratos de valores surreais e no máximo em três anos sua vida financeira estaria muito
bem, obrigado. Ele dava ênfase ao “muito bem”.

Sua esposa terminara o café e se aproximava para sentar-se ao seu lado. Com aquela voz doce que só as mulheres carinhosas têm, ela perguntou como estava o seu escritor favorito de todos os tempos. Ela sempre esteve ao seu lado. Foi uma das poucas pessoas que acreditaram no seu talento e, quando ele se permitia pensar em desistir da literatura, ela dizia que ele só faria isso se passasse por cima de seu cadáver. O corpo dele respondeu mecanicamente ao carinho, exceto seus lábios, que não
se moveram – nem para beijá-la, nem para dizer palavra.

Tão cedo ele não precisaria pensar em desistir da literatura, mas agora, enquanto forçosamente a abraçava, pensou que a ideia do cadáver não era de todo ruim.
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O Autor
Baiano de Feira de Santana, Rafael Rodrigues colabora desde 2003 com sites literários, tendo textos (resenhas, contos, crônicas e alguma poesia) publicados internet afora. Colaborador da revista Conhecimento Prático Literatura, além de ser editor-assistente e colunista do site Digestivo Cultural. Música, literatura e cinema - temas deste blog - são suas paixões.

Fonte:
Suplemgnto Literário. N. 1330 – maio-junho 2010. Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais.

Antonio Brás Constante (Essência das Rosas sem Perfume)


As lágrimas de sangue que escorrem de meus olhos são essências de rosas sem perfume.
Cultivadas em um pomar de tristezas; sementes estéreis em uma face de incertezas;
Sou agricultor de saudades, plantadas em minha remoída memória já tão sofrida.
Regadas com dores eternas, que perambulam por uma mente que jaz em feridas.
Não há brotos em meu peito, flores coloridas ou frutos que me tragam prazer.
Somente um choro perdido, lavando e levando cada sentimento de meu ser.
Como brumas largadas ao sabor amargo do vento frio com jeito de morte.
Agora chegou o momento final, que venha enfim a tal colheita maldita,
Ceifando impiedosa a seiva podre que se tornou parte de minha vida.
Sinto-me tal qual adubo, poeira, gotas amargas de água com sal,
Sou uma casca quebrada e sem fruto, espiral de existência oca,
Folhas secas ao sol. Trincadas. Cor marrom. Empoeiradas,
Bagaço cuspido sem dó, sem sumo, sem alma, sem rumo,
Amor perdido por luto, colhido e guardado na história,
Raízes profundas da mais simples e cruel solidão.
Rosas sem perfume são exemplares da traição;
Um vampiro a gargalhar em minha jugular;
Não se engane pela beleza dessas flores;
Suas cores são matizes de dores;
Ervas daninhas e danosas;
Manancial de espinhos;
Sádicos tons florais.
Rudes Trepadeiras;
Heras venenosas;
Desatino forte.
Destino torpe.
Falsidade.
Morte...

Fontes:
O Autor
Imagem = http://www.muraldosescritores.ning.com/

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo III: Gente importante e gente pobre

A cidade de Portugália dava a idéia duma fruta incõe — ou de duas cidades emendadas, uma mais nova e outra mais velha. A separação entre ambas consistia num braço de mar.

— A parte de lá — explicou o rinoceronte — é o bairro antigo, onde só existiam palavras portuguesas. Com o andar do tempo essas palavras foram atravessando o mar e deram origem ao bairro de cá, onde se misturaram com as palavras indígenas locais. Desse modo formou-se o grande bairro de Brasilina.

— Compreendo — disse Pedrinho. — Para cá é a parte do Brasil e para lá é a parte de Portugal. Foi a parte de lá, ou a cidade velha, que deu origem à parte de cá, ou a cidade nova.

— Isso mesmo. A cidade nova saiu da cidade velha. No começo isto por aqui não passava dum bairro humilde e malvisto na cidade velha; mas com o tempo foi crescendo e ainda há de acabar uma cidade maior que a outra.

— Vamos percorrer a cidade nova, que é a que mais nos interessa — propôs Narizinho.

Montaram de novo no rinoceronte, que se pôs a trote pelo morro abaixo. Chegados ao sopé, saltaram em terra, porque não seria gentil penetrarem na cidade da língua montados em tão notável gramático.

Oh, ali era outra coisa! Ruas varridas, sem mato e com "grilos" nas esquinas. Grande número de palavras moviam-se com muita ordem, andando de cá para lá e de lá para cá, exatinho como gente numa cidade comum.

— Que bairro será esse? — perguntou Narizinho.

— Um muito importante — o bairro dos NOMES, ou SUBSTANTIVOS.

— Que emproados! — observou Emília. — Até parecem as Vogais da terra do alfabeto.

— E são de fato as Vogais das palavras. Sem eles seria impossível haver linguagem, porque os Substantivos é que dão nome a todos os seres vivos e a todas as coisas. Por isso se chamam Substantivos, como quem diz que indicam a substância de tudo. Mas reparem que há uns orgulhosos e outros mais humildes.

— Sim, estou notando — declarou a menina. — Uns não tiram a mão do bolso e só falam de chapéu na cabeça. Outros parecem modestos. Quem são esses prosas, de mão no bolso?

— São os Nomes PRÓPRIOS, que servem para designar as pessoas, os países, as cidades, as montanhas, os rios, os continentes, etc. — Ali vai um — Paulo, que serve para designar certo homem.

— Mas há muitos Paulos — observou Emília.

— Pois esse Nome designa cada um deles, exigindo depois de si um Sobrenome para marcar a diferença entre um Paulo e outro. Paulo Silva, Paulo Moreira, etc. Silva e Moreira são sobrenomes que diferenciam um Paulo de outro. Já aquela palavra que vem um pouco mais atrás goza de mais importância que o Nome Paulo. É a palavra Himalaia, que não tem outra coisa a fazer na vida senão designar certa montanha da índia, a mais alta do mundo. Por ter pouco serviço está gorda assim. Só é chamada de longe em longe, quando alguém quer referir-se à tal montanha. Paulo é um Nome mais magro porque os homens exigem dele bastante serviço.

— Nesse caso o Nome José deve ser fininho como um palito — disse Emília. — E o Nome Maria também.

— Falai no mau, aprontai o pau! — gritou Narizinho. — Lá vem o nome José, suando em bicas, magro que nem um espeto, surrado que nem taramela de porta de cozinha. . .

— Venha cá, Senhor Nome José! — chamou Emília.

O Nome José aproximou-se, arquejante, a limpar o suor da testa.

— Cansadinho, hein?

— Nem fale, menina! — disse ele. — A todo momento nascem crianças que os pais querem que eu batize, de modo que vivo numa perpétua correria de igreja em igreja, a grudar-me em criancinhas que ficam josezando até à morte. Eu e Maria somos dois Nomes que não sabem o que quer dizer sossego. . .

Nem bem havia dito isso e — trrrlin!. . . soou a campainha de um radio telefone; a telefonista atendeu e depois berrou para a rua:

— O Nome José está sendo chamado para batizar um menino em Curitiba, capital do Paraná. Depressa!

E o pobre Nome José lá se foi ventando para Curitiba, a fim de josezar mais aquele Zezinho.

— Não vale a pena ser muito querida nesta cidade — observou Emília. — Eu, se fosse palavra, queria ser a mais antipática de todas, para que ninguém me incomodasse, como incomodam a este pobre José.

— Disso estou eu livre! — murmurou uma palavra gorda, que estava sentada à soleira duma porta. Era o Nome Urraca.

— Sim — continuou ela. — Como os homens me acham feia, não me incomodam com chamados quando têm filhas a batizar. Antigamente não era assim. Muitas meninas batizei em Portugal, e até princesas. Mas hoje, nada. Deixaram-me em paz duma vez. Desconfio que não existe no Brasil inteiro uma só menina com meu nome.

— Por isso está gorda assim, sua vagabunda! — observou Emília.

— Que culpa tenho de ser feia, ou dos homens me acharem feia? Cada qual como Deus o fez.

— Nesse caso, se é inútil, se não tem o que fazer, se está sem emprego, a senhora não passa dum Arcaísmo cujo lugar não é aqui e sim nos subúrbios. Está tomando o espaço de outras.

— Não seja tão sabida, bonequinha! Eu há muito que moro nos subúrbios, e se vim passear hoje aqui foi apenas para matar saudades. Esta casa não é minha.

— De quem é então?

— Duma diaba que veio de Galópolis e anda mais chamada que uma telefonista — uma tal Odete. Volta e meia sai daqui correndo, a batizar meninas. Mas minha vingança é que está ficando magra que nem bacalhau de porta de venda, de tanto corre-corre.

— Está aí dentro, essa palavra?

— Aqui dentro, nada! Não pára em casa um minuto. Inda agora recebeu chamado para batizar uma menina em Itaoca. Tomara que seja uma negrinha preta que nem carvão. . .

Enquanto Emília conversava com aquele Nome sem serviço, Pedrinho ia atentando na soberbia dos Nomes indicativos de países e continentes. O Nome Europa era o mais empavesado de todos: louro, e dum orgulho infinito. Passou rente ao Nome América e torceu o nariz. Também o Nome Alemanha era emproadíssimo, embora andasse com uma cruz de ponto falso no nariz.

— Estes Nomes Próprios — explicou Quindim — têm a seu serviço essa infinidade de Nomes COMUNS que formigam pelas ruas. Os Nomes Comuns formam a plebe, o povo, o operariado, e têm a obrigação de designar cada coisa que existe, por mais insignificante que seja. Qual será a coisa mais insignificante do mundo?

— Cuspo de micróbio — gritou Emília.

— Realmente, bonequinha, cuspo de micróbio deve ser a coisa mais insignificante do mundo. Pois mesmo assim há necessidade de dois Nomes Comuns para a designar. Imaginem agora a humildade desses dois Nomes quando passam perto do Nome Próprio Deus, por exemplo, ou Ouro, que são dos mais graduados!

— Com certeza deitam-se no chão e viram tapete para que Deus e Ouro lhes pisem em cima — observou Emília.

Entre a multidão de Nomes que enxameavam naquela rua, os meninos notaram outras diferenças. Uns pertenciam à classe dos Nomes CONCRETOS e outros à classe dos Nomes ABSTRATOS. Havia ainda os Nomes SIMPLES e os Nomes COMPOSTOS. Quindim foi explicando a diferença.

— Os Nomes Concretos são os que marcam coisas ou criaturas que existem mesmo de verdade, como Homem, Nastácia, Tatu, Cebola. E os Nomes Abstratos são os que marcam coisas que a gente quer que existam, ou imagina que existem, como Bondade, Lealdade, Justiça, Amor.

— E também Dinheiro — sugeriu Emília.

— Dinheiro é Concreto, porque dinheiro existe — contestou Quindim.

— Para mim e para Tia Nastácia é abstratíssimo. Ouço falar em Dinheiro, como ouço falar em Justiça, Lealdade, Amor; mas ver, pegar, cheirar e botar no bolso dinheiro, isso nunca.

— E aquele tostão novo que dei a você no dia do circo? — lembrou o menino.

— Tostão não é dinheiro; é cuspo de dinheiro — retorquiu Emília.

Depois daquela asneirinha, o rinoceronte continuou:

— Há os Nomes Simples, como a maior parte dos que circulam por aqui, e há os Nomes Compostos, como aqueles que ali vão. Estes Nomes Compostos formam-se de dois Nomes Simples, encangados que nem bois.

Ia passando o Nome Guarda-Chuva, de braço dado com o Nome Couve-Flor.

— Parecem bananas incões — observou Emília.

— E há ainda os Nomes COLETIVOS — continuou Quindim. — São os que indicam uma coleção, ou uma porção de coisas — como aquele, acolá! Emília chamou-o.

— Venha cá, Senhor Coletivo! Explique-se. Diga quem é.

— Sou o Nome Cafezal e indico uma porção de pés de café. Deseja mais alguma coisa, senhorita?

— Quero saber se não está com a broca.

— Broca só dá nos arbustos que eu batizo quando são muitos.

— E quando são poucos?

— Só os batizo quando são muitos. Se se trata apenas de dois, três ou uma dúzia, não dou confiança. Ficam sendo dois, três ou uma dúzia de pés de café, mas nunca um Cafezal. Está satisfeita?

— Estaria — respondeu Emília, despedindo-o espevitadamente — se em vez de tantos pés de café você me desse uma xícara de café com bolinhos. . .
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Continua = Capítulo IV = Em Pleno Mar dos Substantivos

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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por
http://groups.google.com/group/digitalsource

Conto Indiano (O Mestre, o Aluno e o Elefante)



Em um famoso ashram, lugar onde os mestres ensinavam seus alunos, um discípulo muito curioso e atrapalhado perguntou ao professor:

Onde Deus mora?

O mestre respirou fundo e respondeu: — Tudo o que existe é Deus.

O aluno terminou de ouvir os ensinamentos do professor, levantou-se do chão, abriu a porta da sala e foi-se embora. No caminho para casa, ele foi pensando na frase: "Tudo o que existe é Deus".

Com a frase ainda ricocheteando em seu cérebro, o aluno viu ao longe um elefante que se aproximava em alta velocidade e começou a falar: — Bom, se o mestre tem razão, eu sou Deus, o elefante também é Deus, portanto não posso temer a mim mesmo.

Ele então decidiu que não sairia da trajetória do elefante. O condutor do animal, vendo o aluno parado como um poste no meio do caminho, começou a gritar:

— Saia daí! Você vai ser atropelado. Saia!

O jovem aluno, de olhos arregalados, vendo aquele animal de algumas toneladas se aproximando cada vez mais, repetia baixinho:

"
Eu sou Deus, ele é Deus, nada vai me acontecer..."

O condutor ainda gritou o mais alto que pôde, mas não adiantou. O elefante pegou o aluno com a tromba e o jogou para longe. Já em casa, recuperando-se das várias fraturas provocadas pelo acidente com o elefante, o aluno recebeu a visita do seu mestre. —
Mestre, ainda bem que veio. Isso tudo aconteceu por sua causa. Não me disse que Deus está em tudo o que existe?

Sim, isso é verdade — respondeu o mestre.

Então, se eu sou Deus e o elefante era Deus, por que Deus fez isso consigo mesmo? — perguntou o aluno.

O mestre se aproximou da cama do aluno e respondeu: —
Sim, você é Deus, o elefante era Deus e o condutor que estava em cima dele também era Deus. Por que você não obedeceu a Deus, que gritou tantas vezes para você sair da frente do elefante?

Fonte:
ILAM, Brenman. As 14 Pérolas da Índia. SP: Brinque-Book, 2008.

Prêmio Benvirá de Literatura 2010


As inscrições deverão ocorrer no período de 12/08/2010 a 30/11/2010, somente através do site http://www.benvira.com.br/

Revelar novos talentos e promover a literatura nacional são propósitos do Prêmio Benvirá de Literatura Ficção 2010.

Com a finalidade de estimular a produção e divulgação das obras de escritores brasileiros, a Editora Saraiva institui o concurso, que também abre uma porta do mercado editorial aos estreantes: o livro selecionado será publicado e distribuído em todo o país.

Autores já publicados ou não, de nacionalidade brasileira, poderão participar inscrevendo uma obra inédita de ficção, de tema livre escrita em língua portuguesa. Cada candidato poderá concorrer somente com 1 (um) original. O livro selecionado será publicado e distribuído em todo o país.

Caberá ao vencedor, além da publicação da obra pelo selo Benvirá, um prêmio de R$30.000,00 (trinta mil reais).

REGULAMENTO DO CONCURSO CULTURAL “1º PRÊMIO BENVIRÁ DE LITERATURA”, promovido pela Editora Saraiva.

Este concurso tem caráter exclusivamente cultural, não estando subordinado a qualquer modalidade de área ou pagamento por parte dos concorrentes para aquisição de produtos ou serviços, nos termos do artigo 30 do Decreto nº 70.951/72.

A finalidade do presente concurso é fomentar a arte literária, mediante a premiação da melhor obra literária, dentro da proposta do presente Regulamento:

1. A participação do concurso é gratuita e aberta aos escritores brasileiros ou naturalizados, com mais de 18 anos, que apresentem originais dirigidos ao público infanto-juvenil ou adulto. Funcionários do Grupo Saraiva e/ou seus parentes em primeiro grau não poderão participar do presente concurso.

2. Os originais deverão ser inéditos e escritos em língua portuguesa. Entende-se por inédito o original não editado e não publicado (parcialmente ou em sua totalidade) em antologias, coletâneas, suplementos literários, jornais, revistas, sites e publicações do gênero. Cada candidato poderá concorrer somente com a apresentação de 1 (um) original.

3. O conteúdo do original deverá obedecer ao seguinte critério: um tema livre que aborde uma história de ficção. Entende-se por ficção designar uma narrativa imaginária, irreal ou referir obras criadas a partir da imaginação.

4. A inscrição do original deverá ser feita no período de 12/08/2010 a 30/11/2010, através do site www.benvira.com.br/premiobenvira2010

5. O interessado deverá preencher corretamente o formulário de inscrição disponível no site www.benvira.com.br/premiobenvira2010 e anexar o arquivo do original no formato Word.

6. No ato de envio da inscrição pelo site www.benvira.com.br/premiobenvira2010 , o inscrito receberá uma mensagem de confirmação. O recebimento da mensagem de confirmação não isenta o candidato de verificar e cumprir os requisitos constantes do presente Regulamento.

7. Para efeito de inscrição serão considerados os originais recebidos até às 24h do dia 30/11/2010.

8. A identificação dos originais se dará mediante o preenchimento completo e correto da ficha de inscrição, que conterá: nome completo, número do RG, número do CPF, endereço para contato, endereço eletrônico (e-mail), telefone com o respectivo DDD, mini currículo pessoal do Autor e sinopse da obra. O candidato que enviar a ficha incorreta ou incompleta, com qualquer dado em branco, será automaticamente desclassificado.

9. Para a seleção da melhor obra, a Editora Saraiva elegerá uma Comissão Julgadora apta a avaliar todos os originais de acordo com os critérios editoriais e escolher o vencedor do presente concurso cultural.

10. Toda e qualquer decisão tomada pela Comissão Julgadora será irrevogável.

11. A escolha da melhor obra literária será publicada no mês de março de 2011, no site Benvirá (www.benvira.com.br/premiobenvira2010) .

12. O vencedor será premiado com o 1º Prêmio Benvirá de Literatura, consistente (i) no pagamento em favor do vencedor do importe de R$ 30.000,00; e (ii) na publicação do original da sua obra pelo selo Benvirá, da Editora Saraiva, no ano de 2011, ocasião em que será formalizado um contrato de edição, de comum acordo entre as partes.

13. A entrega do 1º Prêmio Benvirá de Literatura acontecerá após a divulgação do resultado, em data e local a serem ainda definidos pela Editora Saraiva, os quais serão oportunamente disponibilizados no site Benvirá (www.benvira.com.br/premiobenvira2010), sendo o vencedor comunicado através do telefone e e-mail informados na ficha de inscrição.

14. No caso do vencedor residir fora da Cidade de São Paulo, os gastos de deslocamento e hospedagem de até 2 (dois) dias para recebimento do prêmio serão de responsabilidade da Editora Saraiva, desde que previamente aprovados pela mesma. As demais despesas não descritas neste Regulamento, tais como – mas não se limitando a – gorjetas para carregadores de malas, tarifas para malas que excedam o peso, a quantidade ou as dimensões máximas permitidas, passeios não inclusos, alimentação, bebidas, bem como despesas extras de caráter pessoal como telefonemas, utilização de cofres, lavanderia, bar, frigobar, sauna, ginástica, filmes de televisão, compras de qualquer natureza e quaisquer outras despesas não mencionadas serão de responsabilidade do vencedor.

15. A Editora Saraiva poderá manifestar interesse por trabalhos inscritos no presente concurso cultural e não premiados. Assim, durante o prazo de 6 (seis) meses, a contar da data de divulgação do vencedor, a Editora Saraiva poderá estabelecer contato com os autores de obras recomendadas pela Comissão Julgadora, para adquirir os direitos de publicação.

16. Os originais em desacordo com as normas contidas no presente regulamento serão imediatamente desclassificados.

17. Os originais e demais documentos entregues à Editora Saraiva em razão da participação no presente concurso cultural não serão devolvidos.

18. A apresentação de originais para concorrer ao 1º Prêmio Benvirá de Literatura implica em expresso acordo às normas expressas no presente regulamento.

19. A participação no presente concurso cultural é gratuita.

20. O prêmio é pessoal e intransferível e não poderá ser trocados por quaisquer outros produtos.

21. Os candidatos autorizam o uso e veiculação do seu nome pela Editora Saraiva ou por terceiros por ela autorizados, inclusive para fins comerciais.

22. Todos os casos não previstos nas normas deste regulamento serão resolvidos diretamente pela Editora Saraiva.

23. Aplica-se a este concurso cultural, incluindo, mas sem se limitar à sua divulgação, condução, às participações e à premiação, a legislação brasileira e fica eleito o foro Central da Comarca de São Paulo para dirimir quaisquer controvérsias oriundas do presente Regulamento.

Luiz Otávio (Decálogo de Metrificação para Trovadores)



(É o resumo de um ensaio e de um relatório, ambos sobre metrificação, de autoria de LUIZ OTÁVIO com a colaboração de 53 trovadores de diversas seções da UBT (União Brasileira dos Trovadores) e também de Portugal)

DECÁLOGO DE METRIFICAÇÃO

1) - As sílabas são contadas até a última tônica do verso.

2) - As pontuações não impedem as junções de sílabas.

3) - Não se deve fazer o aumento de uma sílaba métrica nos encontros consonantais disjuntos, (ou seja: não usar "suarabacti").
Exemplo: “ig-no-ro” e não “i-gue-no-ro”

4) - Uma vogal fraca faz junção com a vogal fraca ou forte inicial da palavra seguinte.
§ único - Aceitam-se exceções a esta regra no sentido de evitar a formação de sons duros e desagradáveis.
Exemplo: Ventura única – venturúnica.

5) - Uma vogal forte, pode ou não, fazer junção com vogal fraca da palavra seguinte, no entanto jamais deve fazê-la com vogal forte.

§ único - Nos casos em que se prefira a junção "forte + fraca", deve-se ter sempre o cuidado de evitar sons desagradáveis: "mais que tu/ardo" ou formar novas palavras: vi/a moça

6) - Pode haver a junção de três vogais numa sílaba métrica.

§- Não deve haver mais de uma vogal forte.

§- No caso em que a vogal forte não esteja colocada entre as vogais fracas e sim em 1* e 3* lugar, para que seja correta a junção, as duas vogais fracas devem juntar-se por crase ou por elisão, e não por sinalefa (ditongação). Assim, estará certo:
"é a ambição que nos prende”, e não se pode unir as três vogais de "e a / intima palavra".

§- Deve ser usada com cuidado a junção de mais três vogais, embora haja casos corretos de quatro e até de cinco vogais.

7) - Os ditongos aceitam as pré-junções com vogais fracas: "E eu".

As post-junções são aceitas somente nos ditongos crescentes (encontros instáveis): "a distância infinita", e são repelidas nos ditongos decrescentes: "Eu sou/a que no mundo …

§ Único - Há casos de uso facultativo de pré-junção de vogais fortes aos ditongos, quando essas vogais são as mesmas dos iniciais dos ditongos e não forem as tônicas das palavras.
Aceita-se: "será auspiciosa", e é inaceitável: "terá/auto".

8) - Nos encontros vocálicos ascendentes (formados por vogais ou semivogais tônicas), a sinérese é de uso facultativo.
Exemplo: "ci/ú/me" ou "ciú/me"; “po/e/ta” ou “poe/ta”.

§ Único - Há neste grupo, excepcionalmente, encontros vocálicos que não aceitam a sinérese. Geralmente, são formados pela vogal "a" seguida das vogais "a", "e" ou "o". Exemplo: Sa/ara, a/éreo, a/orta, ou, em alguns casos, da mesma vogal "a" seguida das semi-vogais "i" ou "u" tônicas, como em: "para/íso, "ba/ú".

9) - Nos encontros vocálicos descendentes (formados por vogais ou semivogais tônicas) seguidas de vogais ou semi-vogais átonas) não se aceita a sinérese ("tua", "lua", "frio", "rio" etc., e sim, "tu/a", "su/a","fri/o", "ri/o", etc.)

§ Único - Em algumas regiões do Brasil é usada a sinérese nestes encontros vocálicos, com base na fonética local. No entanto, não será aceita na Metrificação, em benefício da uniformidade, uma vez que na maioria dos Estados é feita a separação dessas vogais.

10) - 0 uso da aférese ("inda", etc), síncope ("pra", etc), apócope ("mui", etc) e de ectilípse (com a, com o, com as, com os) é facultativo.

§ 1º - A junção de "com" mais palavras iniciadas com vogais átonas é correta mas pouco usada. Acompanhando a maioria dos poetas, sempre que possível, deve ser evitada.
Exemplo: "com amor".

§ 2º - A junção de "com" mais palavras iniciadas com vogais tônicas não será aceita.
Exemplo: "com esta".

§ 3º - A junção de fonemas anasalados "am", “em”, "im", etc., com vogais átonas ou tônicas não será aceita.
Exemplo: "formaram" / idéias", "cantaram / hinos" etc.

§ 4º - É preciso cuidado com o uso de aféreses, síncopes e apócopes que, por estarem em desuso ou por formarem, geralmente, sons desagradáveis, irão ferir a sensibilidade dos leitores e dos ouvintes.

GLOSSÁRIO -

Por ordem alfabética, para melhor compreensão do Decálogo de Metrificação.

AFÉRESE - Supressão de sílabas ou fonema inicial ("/inda").

APÓCOPE - Supressão de sílaba ou fonema final ("mui/“).

CRASE - Fusão de duas vogais numa só ("a alma") ("e este").

DIÉRESE - Transformação de um ditongo num hiato ("sa/u-da-de").

DITONGO - Fusão de uma vogal + semivogal, ou vice-versa; na mesma sílaba. ("sai") ("falei") ("Niterói")

DITONGO CRESCENTE - Semivogal + vogal (“pátria”) (“gênio”) (“diabo”).

DITONGO DECRESCENTE - Vogal + semivogal (“pão”) (“meu”) (“dourado”)

ECTLIPSE - Supressão de um fonema nasal final para possibilitar a crase ou ditongação (sinérese) com a vogal inicial da palavra seguinte. ("com o") ("com amor")

ELISÃO - supressão da vogal átona no final de uma palavra. ("Ela estava" = "Elestava").

ENCONTROS CONSONANTAIS - Duas consoantes unidas:
A. inseparáveis - ("bl - bloco”) ("fl - "flor") ou "grupos consonantais".
B. separáveis ("gn - ignóbil”) ("bs – observar”) ou "encontros consonantais disjuntos".

HIATO - uma sílaba terminada, por vogal-base seguida de outra iniciada também por vogal-base. ("re/eleger") (“ca/olho”) (“a/éreo) (Rocha Lima);
Encontro de duas vogais pronunciadas em dois impulsos distintos, formando sílabas diferentes. (“Sa/ara”) (“podi/a”) (“sa/úde”) (Cegalla).

ENCONTROS VOCÁLICOS ASCENDENTES - “designação de Luiz Otávio” - Encontro de duas vogais ou semivogais, pronunciadas separadamente, sendo a primeira fraca e a segunda forte. (“di/a”) (“tu/a”) (“ri/o”) (“fri/o”)
.
JUNÇÃO - “designação de Luiz Otávio” - No sentido generalizado para traduzir a união de sílabas métricas, Abrange pois, os diferentes processos de diminuição de sílabas poéticas. comumente e erradamente empregada pela maioria dos poetas como elisão. Ver no Glossário, os vários processos ou métodos para diminuir as sílabas métricas ou processos de fazer a junção de sílabas: crase, elisão, sinalefa, sinérese, aférese, síncope, apócope e ectilipse.

POSTJUNÇÃO - “designação de Luiz Otávio” - Junção posterior a uma sílaba ou palavra.

PREJUNÇÃO - “designação de Luiz Otávio” - Junção anterior a uma sílaba ou palavra.

SEMIVOGAIS - São os fonemas "i" e "u", quando ao lado de uma vogal formam uma sílaba com ela. Assim em "pai" e em "mau", o "i" e o “u" funcionam com valor de consoante; em "lu/ta" e em vi/da", funcionam com função de vogal.

SÍLABA OU MÉTRICA ou SÍLABA POÉTICA - São sílabas usadas nos versos, têm contagem diferente das sílabas gramaticais.

SINALEFA - Fusão ou junção de vogais ou semivogais, entre duas palavras, formando ditongo (“Este amor = Esteamor").

SÍNCOPE - Supressão de fonema ou sílaba no meio da palavra ("p/ra").

SINÉRESE - Transformação de um hiato em ditongo, na mesma palavra. ("ci/ú/me em ciú/me").

SUARABACTI - Aumento de uma sílaba métrica, pela pronúncia das vogais de apoio, nos encontros consonantais disjuntos" ("i/gui/no/rar") – Luiz Otávio.

TÔNICA - Sílaba forte, acentuada.

VOGAIS - Fonemas sonoros, que se produzem pelo livre escapamento do ar pela boca e se distinguem entre si por seu timbre característico" - Rocha Lima.
VOGAL FORTE ou FRACA - A vogal átona ou acentuada (tônica) da palavra ou do verso.


TROVAS DEMONSTRATIVAS Da aplicação das dez regras da Metrificação

Estas trovas foram feitas para demonstrar os diferentes casos de aplicações das dez regras da METRIFICAÇÃO. Têm, pois, finalidade puramente didática. Devemos observar em cada uma, pela numeração, a aplicação da Regra de número correspondente.

1ª regra - Última Tônica
Poderá a força elétrica
de um sábio computador
ensinar contagem métrica
mas não faz um trovador...

2ª regra - Pontuação
Pensa em calma! Evita errar,
Injusto é se nos reprovas,
Pois não queremos mudar
o modo de fazer trovas

3ª regra - Encontros Consonantais
Você pode acreditar
ter a pura convicção
que a ninguém vou obrigar
a ter a minha opinião...

4ª regra - Vogal Fraca + Fraca (ou forte)
Podes crer és muito injusto
e estás longe da verdade;
pois na Trova, a todo cust,o
defendo a espontaneidade...

5ª regra - Vogal Forte + Fraca
É uma história bem correta
em tudo o ensino é preciso,
no entanto, só / o poeta
quer ser gênio de improviso...

6ª regra - Junção de Três Vogais
Esta é uma Trova indiscreta,
convenções, mal amparadas,
induzem muito poeta
a convicções enraizadas.

7ª regra - Ditongos
Para medir nossos versos,
se o ouvido fosse o juiz,
em nossos “metros” diversos
ninguém poria o nariz...

8ª regra - Encontros Vocálicos Ascendentes (***)
Na Trova, soneto ou poema,
em toda a parte do mundo,
se a Forma é o seu di/adema
Su/a alma é sempre o fundo!

9ª regra - Encontros Vocálicos Descendentes
As dúvidas são pequenas,
não sejas tão pessimista,
dá-me a tu/a ajuda, apenas,
e será bela a conquista.

10ª regra - Licenças – Aféreses - Síncopes – Apócopes - Ectlipses.
É mui/to feio crificar(apócope)
a/inda que seja um direito (aférese)
p/ra ser justo, aulas vem dar (síncope)
Com/ o teu plano sem defeito... (ectlípse)

(***) Na trova de exemplo, da REGRA 8, ENCONTROS VOCÁLICOS ASCENDENTES, Luiz Otávio dá as duas formas de contagem de sílabas:
– poe/ma e di/a/dema, entretanto isto é feito apenas como um exemplo pois: NÃO SE PODE USAR AS DUAS CONTAGENS NA MESMA TROVA.

UMA FRASE DE LUIZ OTÁVIO PARA DECORAR AS DEZ REGRAS

"Tendo Paciência e Estudo Você Versejará Tecnicamente Direito Encontrando Estética e Lirismo."

Nesta frase temos:
T = tônica;
P = pontuação;
E = encontros consonantais;
V = vogal fraca;
V = vogal forte;
T = três vogais;
D = ditongos;
E = encontros vocálicos ascendentes;
E = encontros vocálicos descendentes;
L = licenças poéticas).

OBSERVAÇÃO – Este DECÁLOGO foi aprovado pelo Conselho Nacional da UBT e é, portanto, o melhor guia, tanto para aqueles que concorrem como para aqueles que julgam.

A UBT (União Brasileira de Trovadores) sente-se orgulhosa em proporcionar a oportunidade a um grande número de trovadores de conhecer o DECÁLOGO DE METRIFICAÇÃO onde, além de LUIS OTÁVIO, colaboraram grande nomes da Trova, entre outros podemos citar: Carlos Guimarães; Carolina Ramos; Lilinha Fernandes; Helvécio Barros; Vera Vargas; Milton Nunes Loureiro; Sávio Soares de Souza; Manita; Joubert A. Silva; Vasques Filho; David de Araújo; Rodolpho Abbud; Jacy Pacheco; Ivo dos Santos Castro; Micaldas Corrêa e Dimas Lopes de Almeida (Portugal).

Fontes:
Revista dos XXV Jogos Florais de Bandeirantes/PR – 2008.
Imagem =Imagem = http://virtualiaomanifesto.blogspot.com

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.41)


Trova do Dia

Na Feira, o "seu" Manoel:
- Não vendo nada... Pois, pois!
Mas se esgoela: – Olha o pastel!
Pague três e leve dois!
LISETE JOHNSON/RS

Trova Potiguar

Está cegando Renato
pois, um objeto qualquer
só conhece pelo tato
principalmente mulher.
RENATO CALDAS/RN

Uma Trova Premiada

2009 > Bandeirantes/PR
Tema > ARRUAÇA > Menção Honrosa

O bebum faz arruaça
se em toda blitz é parado;
de tanto tomar cachaça,
só sopra todo babado.
VANDA ALVES DA SILVA/PR

Uma Trova de Ademar

Eu sei que o santo se vinga,
mas cana não lhe ofereço;
mesmo que de pinga em pinga
ele me dê um tropeço.
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

É um alpinista de fama,
mas dele a vida debocha:
por ironia se chama
Caio Rolando da Rocha.
WALDIR NEVES/RJ

Estrofe do Dia

– Namorei Aparecida,
mas mãe não gostava dela,
Eu só namorava ela
na casa da Margarida,
Minha mãe, muito sabida,
ia lá pra ver se via,
Por uma porta eu saia,
por outra mamãe entrava.
Quando eu ia ela voltava,
quando eu voltava ela ia.
JOSÉ MELQUÍADES/PB

Soneto do Dia

– Glauco Mattoso/SP –
SONETO NACIONAL.

Petróleo agora é nosso! Temos carro
em casa fabricado! A agricultura
bateu novo recorde! Na cultura
ninguém nos bate em jeito, manha e sarro!

A fundo, se analiso, logo esbarro
em outro panorama: a sinecura,
a exploração, o culto à raça pura,
debaixo do cinismo mais bizarro!

País da falsidade e do fajuto,
o nosso é vergonhoso, pois em nada
fingir necessitava, tendo o bruto

produto que detém! Se uma cambada
seu povo não roubasse, nenhum puto
diria que o Brasil só dá piada!

Fonte:
Ademar Macedo

José Feldman (Agradecimento)

Agradeço o envio dos livros para leitura crítica:
- Maria Lúcia Siqueira (Asas ao Anoitecer)
- Vicencia Jaguaribe (Ancoragem em Porto Aberto)
- Yussef Khalifman, pela doação do livro de Roza de Oliveira (As Imagens do Ar nos poemas de Tasso da Silveira)
- Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais (Suplemgnto Literário n.1.330)
Fonte da Imagem:

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.40)


Trova do Dia

Tantos passos caminhei
por labirintos incertos.
Hoje nas trovas achei
como vencer os desertos.
JOSÉ FELDMAN/PR

Trova Potiguar

Quando Deus criou o mundo
Deu chance a todas matizes
Mas com seu saber profundo
Não disse a cor aos juízes
MARCOS MEDEIROS/RN

Uma Trova Premiada

2010 > São Paulo/SP
Tema > FEITIÇO > Vencedora

Facilmente me dominas,
bastando apenas piscar...
- É o feitiço das meninas
que brincam no teu olhar!
A. A. DE ASSIS/PR

Uma Poesia livre

– Djalma Mota/RN –
SOLIDÃO

Sozinho...
Nunca havia sentido tanta solidão.
No fim da noite,
quando quase tudo silencia,
um tempestade carregada do vazio,
recai sobre o meu corpo debilitado.
Não encontro sequer,
um sinal que motive uma minúscula alegria.
Nem mesmo o meu velho violão.
Quero mergulhar esse sentimento
nos copos adormecidos das bebidas indesejáveis...
... Um copo... Uma pausa...
... De volta ao sentimento,
mais um copo e, um copo a mais,
suficiente à companhia das horas sombrias.
É tarde! Ou seja, quase madrugada.
Minha consciência embriagada,
ainda assim reconhece:
– Pára! É o limite!
Deste modo,
retorno ao mundo desencantado
das velhas ilusões – o meu mundo real,
onde tomo conhecimento
das minhas desventuras.
Eis a sina de um ser sozinho!

Uma Trova de Ademar

A mensagem mais bonita
e de uma força tamanha,
há dois mil anos foi dita
lá no sermão da montanha!
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

Não estranhes que o Mar largo
seja salgado demais:
é devido ao pranto amargo
que se chora em cada cais.
DIMAS LOPES DE ALMEIDA/PORTUGAL

Estrofe do Dia

Cavalo fica pra sela,
Batente para janela,
Fogão ficou pra panela,
Cangaceiro pro sertão;
Cadeira ficou pra réu,
Cabeça para chapéu,
Noiva ficou para o véu
E eu para cantar quadrão.
LOURIVAL BANDEIRA/CE

Soneto do Dia

– Alceu Wamosy/RS –
ÚLTIMA PÁGINA.

Todo este grande amor que nasceu em segredo,
e cresceu e floriu na humildade mais pura,
teve o encanto pueril desses contos de enredo
quase ingênuo, onde a graça ao candor se mistura.

Entrou nos nossos corações como a brancura
de uma réstia de luar numa alcova entra a medo.
Nunca teve esse fogo intenso de loucura,
que há em todo amor que nasce tarde e morre cedo.

E quando ele aflorou tímido e pequenino,
como uma estrela azul no meu, no teu destino,
não sei que estranha voz ao coração me disse,

que este amor suave e bom, de pureza e lealdade,
sendo o primeiro amor da tua meninice,
era o último amor da minha mocidade.

Fonte:
Ademar Macedo

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Trova 184 - Neide Rocha Portugal (Bandeirantes/PR)


Imagens obtidas na internet com montagem para inclusão da trova. Autores desconhecidos.

Apollo Taborda França (O Poeta no Papel)


AS QUATRO ESTAÇÕES

O ano tem quatro Estações,
Regendo seus privilégios…
Apuram as emoções,
Renovam seus sortilégios.

Muitos não gostam do INVERNO,
É frio e traz dissabores…
Mas, para amor é bem terno,
Debaixo dos cobertores.

Na PRIMAVERA, das flores,
Dos frutos, da passarada…
O céu deslumbra-se em cores,
Quando desponta a alvorada.

Nosso VERÃO é delícia,
É graça, força e calor…
Funciona como um colírio,
Diante de tanto esplendor.

OUTONO tem a magia,
De bem gravar a lembrança:
Claro, sutil, é um guia
Que nos conduz à esperança!

A SAÚDE COLORIDA

Iguais flores nos canteiros
São as frutas coloridas…
Que beleza os limoeiros,
Supra-sumo das “batidas”.

Uva branca, suculenta,
Nutriente vegetal…
Retempera a alma sedenta,
Tem poder medicinal.

Mais a laranja e a ameixa
Frutas boas sazonais…
Algo assim que não se deixa,
São riquezas naturais.

Abacaxi e a banana,
Gostosíssima a cereja…
Também, o caldo de cana,
O mamão quem não deseja.

Que dizer dos abacates,
Deliciosos eles são…
Das cebolas, dos tomates,
Saudáveis na refeição.

As cenouras amarelas,
As alfaces, o pepino…
Saborosas berinjelas,
Num conjunto muito fino.

As frutas e as verduras,
Quanta cor e paladar…
Verdadeiras contexturas,
De um viver bem salutar.

Quem quiser estar contente,
Sempre alegre e com amor…
Dessas coisas se alimente
Pois, garantem o vigor!

O COLORIDO DAS FLORES

O jardim cheio de flores,
Dá-nos grande sensação…
Por conter mais de mil cores,
Nos enleva em oração.

Tem as lindas encarnadas,
As azuis, as multicores…
Todas elas perfumadas
Espargindo seus olores.

Ao romper da primavera,
Esplendor é sem igual…
Medra bem melhor a herança
E a glicínia original.

Quando chove, que beleza,
O canteiro vira em festa…
A rosa na sua nobreza,
O cravo, lírio, a glesta.

A violeta e margarida,
Sempre-viva e mosquitinho…
A camélia tão querida,
É macia como o arminho.

Há, também, copo-de-leite,
O suave amor-perfeito…
Suas linhas têm enfeite,
Que lhes dá alto conceito.

Num mundo de fantasia,
Natureza fulge em cor…
Flores têm a primazia
Nas lembranças do amor.

Aos olhos é tudo encanto,
Muito mais ao coração…
Todos nós vibramos tanto,
Contemplando a Criação!

O SISTEMA SOLAR

Nosso SISTEMA SOLAR
No colorido decerto,
É da beleza um altar,
Deslumbrando a céu aberto.

Tem o SOL todo imponente
Muita luz, sadio calor,
Dando forças ao vivente
E perfume à linda flor.

Em seguida está MERCÚRIO,
De amarelo-esmaecido,
Do comércio, o bom augúrio.
E do amor sendo o cupido.

VÊNUS – a Estrela D’Alva
E, também, a do Pastor,
Para ela grande “salva”,
Consagrando seu alvor.

O nosso planeta TERRA
O escolhido para a vida,
Tantas grandezas encerra,
Leva o tempo de vencida.

E bem místico é MARTE
Sendo o quarto do sistema,
Deus da guerra, estandarte,
Na poesia belo tema.

JÚPITER, ainda um mistério,
Um colosso em nosso céu,
A girar num acrotério,
Continua um fogaréu.

É SATURNO o mais bonito,
Tem anéis resplandescentes,
Rica gema no infinito,
Empolgando as nossas mentes.

Bem ao longe fica URANO,
Com seu tom verde-azulado,
Segue firme no seu plano,
Do Universo outro legado.

Verde disco é NETUNO,
Um planeta singular,
Respeitá-lo, oportuno,
Pois evoca o Deus do mar.

PLUTÃO, lá na extremidade,
Bem oculto à nossa vista,
Descoberto há pouca idade,
Com ele se fecha a lista!

Fonte:
FRANÇA, Apollo Taborda. O nosso mundo colorido. Curitiba: O Formigueiro, 1986.

Pedro Ernesto Filho (O Poeta no Papel)


SAUDADE

Saudade é foto amarela
que um filho guardou dos pais,
depois que os pais faleceram
da foto ele foi atrás,
de tanto guardar, perdeu;
procurou, não achou mais

AS ÁRVORES MAIS RESISTENTES COSTUMAM MORRER DE PÉ

Mote produzido por ocasião da missa de trinta dias rezada em sufrágio da alma da genitora do autor, em 08.06.1998. Ele escreveu os versos, mas as emoções não deixaram que os declamasse naquele momento. Trata-se de ligeira referência à vida simples e religiosa de sua inesquecível mãe Efigênia Vieira de Aquino, exemplo de esperança, que morreu sem perder sua lucidez. É, portanto, um decassílabo que busca valorizar a árvore da vida.

Buscou se apoiar no arco
do carisma e da bonança,
da pedra da esperança
fez seu verdadeiro marco,
sua vida foi um barco
nos oceanos da sé,
defendeu a paz até
deixar os sobreviventes
- As árvores mais resistentes
costumam morrer de pé.

O seu passado eu contemplo
com forças das emoções,
no mundo das orações
foi defensora do templo,
sua vida foi exemplo
aos seguidores da fé,
hoje sua história é
lida por seus descendentes
- As árvores mais resistentes
costumam morrer de pé.

Foi forte seu coração,
nos últimos dia de vida
sua voz foi suprimida
mas seu pensamento não,
demonstrava na feição
as graças do Nazaré,
e que agradecia até
as visitas dos parentes
- As árvores mais resistentes
costumam morrer de pé.

Se alguém fizesse um alarde
por lhe faltar o sustento
e ela escutasse o lamento
sobre aquele inverno tarde,
ela aconselhava, aguarde
o dia de São José,
pois aquele Santo é
protetor dos penitentes
- As árvores mais resistentes
costumam morrer de pé.

Ante qualquer imprevisto
sua história sobressai,
reencontrou com meu pai
e hoje está dizendo a Cristo
que a roupa escura que visto
preta da cor de café
não é mais tristeza, é fé,
fruto de suas sementes
- As árvores mais resistentes
costumam morrer de pé.

E SE EU TIVESSE MORRIDO NINGUÉM CHORAVA POR MIM!

O autor sonhou perdido nas matas, enfrentando as mais difíceis situações, porém superando todas elas. No sonho, percebeu que não havia preocupação por parte de ninguém e por isto, ao acordar-se, escreveu este mote em sete sílabas. Aliás, situação como esta somente em sonho poderia acontecer.

Já me vi pelo sertão
sem saber onde eu estava,
comendo, quando encontrava
frutas tombadas no chão;
só escutava o trovão
e o assobio do soim,
num campo de gergelim
estive a noite perdido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim.

Sofri de uma fera ingrata
perseguição numa gruta,
tive que enfrentar a luta
com meu punhal cor de prata;
depois de uma hora exata
eu consegui lhe dar fim,
e cansado, fiz: Atchim!!!
aí voltou meu sentido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Cheguei a um riacho cheio,
sem fazer das águas caso,
pensando que fosse raso
tentei passar pelo meio;
a onda me fez de esteio
a um tronco de beijamim,
pelos seus galhos enfim
fui bastante protegido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Cansado de andar a pé
e ao penetrar num roçado,
peguei um burro peiado,
fiz dele um transporte, até;
era um burro canindé,
velhaco, brabo e ruim,
deu pulo até que no fim
deixou-me ao solo estendido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Senti na minha chinela
espinhos de arapiraca,
uma cobra jararaca
pegou na minha canela;
eu que sou curado dela
nada tive de ruim,
um besouro de cupim
penetrou no meu ouvido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Lá encontrei muito gado
que pastava na campina,
um touro da ponta fina
voltou-se para o meu lado;
era um novilho malhado
pintado de surubim;
eu me deitei no capim
e ele se deu por vencido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Segui nova direção
e cheguei a uma bodega,
um cão quase que me pega
quando abri um cancelão;
um pistoleiro e ladrão
atirou pra me dar fim,
com coragem, sem motim,
defendi-me do bandido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

De tanta angústia e maltrato,
às doze horas do dia,
sofri tremenda agonia
e dormi dentro do mato;
fui visto por um beato
que voltava de um jardim,
deu-me dois chás de alecrim
sem doce, com comprimido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Cheguei numa moradia
e cumprimentei os presentes,
perguntei por meus parentes
e assim alguém respondia:
Vi alguns com alegria
ontem à noite em um festim,
contou tim-tim por tim-tim
do que tinha acontecido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim!

Vizinho fez diversão
que até ficou na memória,
meus tios contavam estória
do tempo de Lampião;
até mesmo o meu irmão
não guardou seu bandolim,
só mamãe dizia assim:
Perdi meu filho querido
- E se eu tivesse morrido
ninguém chorava por mim

AS COISINHAS DO SERTÃO

Este poema retrata a conversa firme de um camponês com um homem da cidade. Por tanto se interessar pelas belezas do campo, o homem da rua passou a somente ouvir o que o sertanejo dizia e dava expansão ao assunto sempre interrogando: fale mais das coisinhas do sertão. Pode-se dizer também que se trata de mote de uma linha.

Eu conversei com um crítico
vivido na capital,
falou do Brasil Político,
do nosso mundo atual
e da indústria nuclear,
quando eu chamei pra falar
de costume e tradição,
ele disse: Isso eu não sei,
e assim eu mencionei
as coisinhas do sertão.

Eu falei sobre a beleza
de um amanhecer dourado,
do lençol da natureza
de manchas padronizado.
Falei da barra vermelha
que parece uma centelha
enfeitando a amplidão,
da nuvem ficando atrás.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei da lua cheia
silenciosa e redonda
e da neve cor de areia
que desce encobrindo a onda,
da brisa civilizada
que parece uma empregada
varrendo o que há no chão,
hora leva, hora traz.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu lhe disse: Isto não é
sertão propriamente dito,
sertão é mesmo um chalé
num pé de serra esquisito,
que seu dono sendo pobre
julga-se feliz e nobre
por existir união
e amor dos filhos aos pais.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei sobre a caçada
em que o homem corajoso
tocaia de madrugada
andando silencioso;
passa serras, sobe morros,
seus amigos são cachorros,
espingarda e munição;
e seu abrigo, os vegetais.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei sobre o vaqueiro
e sua fama também,
pois seu perfume é o cheiro
que a ponta da rama tem;
seu transporte é o cavalo;
seu musical, o badalo
e o berrar da criação;
seus amigos, animais.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

E quando eu falei de adjuntos,
ele disse: O que é isso?
São cinqüenta homens juntos
fazendo qualquer serviço;
almoçam pelo roçado,
contam casos do passado
para enrolar o patrão,
e cada um diz o que faz.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei da mulher que pisa
milho pra fazer almoço,
do menino sem camisa,
baladeira no pescoço;
do gafanhoto faminto,
do sofrimento do pinto
nas garras do gavião,
dos chãos cobertos de sais.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei da cantoria
do contador de viola
que mostra sabedoria
sem conteúdo de escola.
Falei da mulher rendeira,
da cigana rezadeira
que faz a sua oração
espantando o satanás.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei de serenata,
de reisado e pescaria,
do sertanejo que trata
toda mulher por Maria;
se for homem chama Zé,
gosta muito de café,
detesta fumo pagão,
só dá valor ao que faz.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei do pé-de-bode,
do reco-reco e pandeiro
com que se faz um pagode
no clarão do candeeiro;
rapaz exibindo nota
mas para pagar a cota
sempre surge confusão,
quando um não faz, outro faz.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei do campo e estepe
por onde passeia o gado,
do chiar do currulepe
do velhinho aposentado;
do triturar do mimoso,
de estórias de trancoso
nas debulhas de feijão,
do candeeiro de gás.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei da voz de comando
no grito do comboeiro,
dos animais repousando
na sombra do juazeiro.
Falei do caminho estreito,
do bodoque que é feito
de vara, cera e cordão,
torto na frente e atrás.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei do sol causticante
que atrasa a safra seguinte,
do caboclo ignorante
que se casa antes dos vinte.
Falei da rama madura,
do voar da tanajura
quando promete verão,
uma na frente, outra atrás.
-Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei da vaca velhaca
quando seu bezerro esconde,
o vaqueiro imita a vaca
para ver se ele responde.
Falei de doença e praga,
lagarta que mais estraga
a cultura do algodão,
das estradas carroçais.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei da força do açoite
que o vento bravo inicia,
do lençol preto da noite
cobrindo os olhos do dia.
Da mesinha de gaveta,
do matuto e o cometa
e a sua superstição,
do medo que a cobra faz.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei sobre a raposa
nas aspas de uma arataca,
do carcará que repousa
na cabeça de uma estaca.
Falei do milho amarelo,
depois fiz um paralelo
entre inverno e o verão,
que em duração são iguais.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Falei do sol que desbota
a folha do vegetal,
do bem-te-vi que pinota
nas clinas de um animal,
de farinhada e moagem,
de uma antiga carroagem
que tem o boi por tração,
boi na frente e carro atrás.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

Eu falei sobre o baralho
e o que suas cartas vogam,
da banca e do agasalho
onde quatro homens jogam;
a dama ganha dos seis,
valete perde pra o reis,
de tudo o sete é mandão,
onze pontos vale o ás.
- Ele disse: Fale mais
das coisinhas do sertão.

E disse ele: Eu não sabia
isto que você falou,
mas aprender eu queria
e tenso me perguntou:
Como aprendeu tudo isto?
Eu lhe respondi: Foi Cristo
que me deu inspiração.
E perguntou ele: Isto é arte?
- Eu disse: E também faz parte
das coisinhas do sertão.

Fonte:
http://www.perfilho.prosaeverso.net/