quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas de Ano Novo n. 438)

Uma Trova Nacional

Que se alegre este meu povo
sempre lutador e audaz;
que o meu BRASIL no ano novo
alcance o progresso, em paz!
–LARISSA LORETTI/RJ–

Uma Trova Potiguar

Mensageiro do evangelho
o Ano Novo, eu suponho
seja o próprio ano velho
vestido de um novo sonho!
–HELIODORO MORAIS/RN–

Uma Trova de Ademar


Ao Trovador meu irmão,
mando um abraço apertado;
pra vocês, de coração...
Um Ano Novo “Arretado!”
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Que o Ano Novo nos dê,
à maneira que puder,
o Bem que eu quero a você
e o Bem que você me quer!
–ALCY RIBEIRO S. MAIOR/MG–

Simplesmente Poesia

Mais um Ano...
–DELCY CANALLES/RS–


Mais um ano que se vai,
carregando os sonhos meus,
e eu fico, só esperança,
buscando o sonho sonhado,
nessa busca que me cansa,
querendo encontrar-te, enfim,
pra vivermos , lado a lado,
eu e tu, tu junto a mim!
Mas ano, após ano, passa,
e este sonho, qual fumaça,
se desfaz na amplidão...
E eu continuo sozinha,
a teimar com a sorte minha,
a  viver  em  solidão!

Estrofe do Dia

Quero desejar ao povo
de todas as regiões,
que tenham nesse Ano Novo
muitas realizações;
e que os nossos corações
se superlotem de paz,
pra não ter guerra jamais
peça a Deus que nos ajude,
com paz, amor e saúde
que o resto... Vamos atrás.
–ADEMAR MACEDO/RN–

Soneto do Dia

Crença
 –DIVENEI BOSELI/SP–


No mar revolto a lua jorra o brilho
e a luz que tremeluz em cada barco
ajuda clarear o estreito trilho
que leva a multidão no espaço parco.

Vindos da praia, onde se fez rastilho,
fumaça e estrondos; descrevendo um arco,
uma após outra, em confuso estribilho,
profusas cores festejando o marco.

Eu levo antúrios, vou descalça e crente,
só com amigos, sem nenhum parente,
pular as bravas ondas dessas águas.

O mar se agita mais, a lua espreita,
e a voz da Janaína, desta feita,
promete um ano só de amor. Sem mágoas!
Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Lima Barreto (Os Enterros de Inhaúma)

Certamente há de ser impressão particular minha não encontrar no cemitério municipal de Inhaúma aquele ar de recolhimento, de resignada tristeza, de imponderável poesia do Além, que encontro nos outros. Acho-o feio, sem compunção com um ar momo de repartição pública; mas se o cemitério me parece assim, e não me interessa, os enterros que lá vão ter, todos eles, aguçam sempre a minha atenção quando os vejo passar, pobres ou não, a pé ou em coche-automóvel.

A pobreza da maioria dos habitantes dos subúrbios ainda mantém neles esse costume rural de levar a pé, carregados a braços, os mortos queridos.

É um sacrifício que redunda num penhor de amizade em uma homenagem das mais sinceras e piedosas que um vivo pode prestar a um morto.

Vejo-os passar e calculo que os condutores daquele viajante para tão longínquas paragens, já andaram alguns quilômetros e vão carregar o amigo morto, ainda durante cerca de uma légua. Em geral assisto a passagem desses cortejos fúnebres na rua José Bonifácio canto da Estrada Real. Pela manhã gosto de ler os jornais num botequim que há por lá. Vejo os órgãos, quando as manhãs estão límpidas, tintos com a sua tinta especial de um profundo azul-ferrete e vejo uma velha casa de fazenda que se ergue bem próximo, no alto de uma meia laranja, passam carros de bois, tropas de mulas com sacas de carvão- nas cangalhas, carros de bananas, pequenas manadas de bois, cujo campeiro cavalga atrás sempre com o pé direito embaralhado em panos.

Em certos instantes, suspendo mais demoradamente a leitura do jornal, e espreguiço o olhar por sobre o macio tapete verde do capinzal intérmino que se estende na minha frente.

Sonhos de vida roceira me vêm; suposições do que aquilo havia sido, ponho-me a fazer. Índios, canaviais, escravos, troncos, reis, rainhas, imperadores - tudo isso me acode à vista daquelas coisas mudas que em nada falam do passado.

De repente, tilinta um elétrico, buzina um- automóvel chega um caminhão carregado de caixas de garrafas de cerveja; então, todo o bucolismo do local se desfaz, a emoção das priscas eras em que os coches de Dom João VI transitavam por ali, esvai-se e ponho-me a ouvir o retinir de ferro malhado, uma fábrica que se constrói bem perto.

Vem porém o enterro de uma criança; e volto a sonhar.

São moças que carregam o caixão minúsculo; mas assim mesmo, pesa. Percebo-o bem, no esforço que fazem.

Vestem-se de branco e calçam sapatos de salto alto. Sopesando o esquife, pisando o mau calçamento da rua, é com dificuldade que cumprem a sua piedosa missão. E eu me lembro que ainda têm de andar tanto! Contudo, elas vão ficar livres de um suplício; é o do calçamento da rua do Senador José Bonifácio. É que vão entrar na Estrada Real; e, naquele trecho, a prefeitura só tem feito amontoar pedregulhos, mas tem deixado a vetusta via pública no estado de nudez virginal em que nasceu. Isto há anos que se verifica.

Logo que as portadoras do defunto pisam o barro unido do velho trilho, adivinho que elas sentem um grande alívio dos pés à cabeça. As fisionomias denunciam. Atrás, seguem outras moças que as auxiliarão bem depressa, na sua tocante missão de levar um mortal à sua última morada neste mundo; e, logo após, graves cavalheiros de preto, com o chapéu na mão, carregando palmas de flores naturais, algumas com aspecto silvestre, e baratas e humildes coroas artificiais fecham o cortejo.

Este calçamento da rua Senador José Bonifácio, que deve datar de uns cinqüenta anos é feito de pedacinhos de seixos mal ajustados e está cheio de depressões e elevações imprevistas. É mau para os defuntos; e até já fez um ressuscitar.

Conto-lhes. O enterro era feito em coche puxado por muares. Vinha das bandas do Engenho Novo, e tudo corria bem. O carro mortuário ia na frente, ao trote igual das bestas. Acompanhavam-no seis ou oito caleças, ou meias caleças, com os amigos do defunto. Na altura da estação de Todos os Santos, o cortejo deixa a rua Arquias Cordeiro e toma perpendicularmente, à direita, a de José Bonifácio. Coche e caleças põem-se logo a jogar como navios em alto-mar tempestuoso. Tudo dança dentro deles. O cocheiro do carro fúnebre mal se equilibra na boléia alta. Oscila da esquerda para a direita e da direita para a esquerda, que nem um mastro de galera debaixo de tempestade braba. Subitamente, antes de chegar aos "Dois Irmãos", o coche cai num caldeirão, pende violentamente para um lado; o cocheiro é cuspido ao solo, as correias que prendem o caixão ao carro, partem-se, escorregando a jeito e vindo espatifar-se de encontro às pedras; e - oh! terrível surpresa! do interior do esquife, surge de pé - lépido, vivo, vivinho, o defunto que ia sendo levado ao cemitério a enterrar. Quando ele atinou e coordenou os fatos não pôde conter a sua indignação e soltou uma maldição: "Desgraçada municipalidade de minha terra que deixas este calçamento em tão mal estado! Eu que ia afinal descansar, devido ao teu relaxamento volto ao mundo, para ouvir as queixas da minha mulher por causa da carestia da vida, de que não tenho culpa alguma; e sofrer as impertinências do meu chefe Selrão, por causa das suas hemorróidas, pelas quais não me cabe responsabilidade qualquer! Ah! Prefeitura de uma figa, se tivesses uma só cabeça havias de ver as forças das minhas munhecas! Eu te esganava, maldita, que me trazes de novo à vida!"

A este fato, eu não assisti, nem ao menos morava naquelas paragens, quando aconteceu; mas pessoas dignas de toda a confiança me garantem a autenticidade dele. Porém, um outro muito interessante aconteceu com um enterro quando eu já morava por elas, e dele tive notícias frescas, logo após o sucedido, por pessoas que nele tomaram parte.

Tinha morrido o Felisberto Catarino, operário, lustrador e empalhador numa oficina de móveis de Cascadura. Ele morava no Engenho de Dentro, em casa própria, com razoável quintal, onde havia, além de alguns pés de laranjeiras, uma umbrosa mangueira, debaixo da qual, aos domingos, reunia colegas e amigos para bebericar e jogar a bisca.

Catarino gozava de muita estima, tanto na oficina como na vizinhança.

Como era de esperar, o seu enterro foi muito concorrido e feito a pé, com um denso acompanhamento. De onde ele morava, até ao cemitério de Inhaúma, era um bom pedaço; mas os seus amigos a nada quiseram atender: Resolveram levá-lo mesmo a pé. Lá fora, e no trajeto, por tudo que era botequim e taverna por que passavam, bebiam o seu trago. Quando o caminho se tornou mais deserto até os condutores do esquife deixavam-no na borda da estrada e iam à taverna "desalterar". Numa das últimas etapas do itinerário, os que carregavam, resolveram de mútuo acordo deixar o pesado fardo para os outros e encaminharam-se sub-repticiamente para a porta do cemitério. Tanto estes como os demais - é de toda a conveniência dizer - já estavam bem transtornados pelo álcool. Outro grupo concordou fazer o mesmo que tinham feito os carregadores dos despojos mortais de Catarino; um outro, idem; e, assim, todo o acompanhamento dividido em grupos, tomou o rumo do portão do campo-santo, deixando o caixão fúnebre com o cadáver de Catarino dentro abandonado à margem da estrada.

Na porta do cemitério, cada um esperava ver chegar o esquife pelas mãos de outros que não as deles; mas nada de chegar. Um, mais audaz, após algum tempo de espera, dirigindo-se a todos os companheiros, disse bem alto:

- Querem ver que perdemos o defunto?

- Como? perguntaram os outros, a uma voz.

- Ele não aprece e estamos todos aqui, refletiu o da iniciativa.

- É verdade, fez outro.

Alguém então aventou:

- Vamos procurá-lo. Não seria melhor?

E todos voltaram sobre os seus passos, para procurar aquela agulha em palheiro...

Tristes enterros de Inhaúma! Não fossem essas tintas pinturescas e pitorescas de que vos revestis de quando em quando de quanta reflexão acabrunhadora não havíeis de sugerir aos que vos vêem passar; e como não convenceríeis também a eles que a maior dor desta vida não é morrer...

Fonte:
Lima Barreto. Contos completos. Companhia das Letras.

António Botto (Egoísmo)

Chove. A velha está no seu esconderijo. Mas não está só; rodeiam-na suas três filhas que querem sair mesmo a chover. E a velha raposa, de um lado para o outro, trabalhadora, inquieta, vigiando as maldades das filhas, acabou por se cansar e sentou-se molengona a abrir a boca e a fechar os olhos.

     - Mãe, conta-nos uma história; mas não uma história moral; está a chover, e quando há chuva a moral não sai muito limpa...

     - Disparates, respondeu a mãe. Uma história sem moral é como uma capoeira sem galinhas. Vou, pois, contar uma história, mas é preciso que as meninas estejam com atenção:
Era uma vez uma nossa parenta que possuia a mania de colecionar só objetos brilhantes: pedaços de cristal, metais, botões, jóias, esmaltes, e em poucos meses a casa dela era um verdadeiro museu variado e valioso. E quando alguém lhe passava ao pé da porta, só de pálpebras cerradas poderia resistir a tanto brilho ali concentrado. A colecionadora mal comia. Alimentava-se a olhar para os diamantes brancos e azuis que eram os que mais distinguia na sua paixão pelos brilhos. Mas uma noite de Inverno choveu tanto, tanto, tanto que o mundo quase se desfazia alagado em tanta chuva. Uma noite, não enganei-me: foram três dias e três noites - fechada, sozinha, sem alimentos, e sem poder consegui-los...

     - Morreu de fome, já se vê, disse a filha mais novinha.

     - Não, respondeu a raposa. Pôs-se a gritar e ouviram-na.

Ao cabo de algum trabalho, lá conseguiram chegar ao famoso esconderijo e socorreram-na como foi possível: dois frangos por sete lascas de brilhantes, e outras trocas assim. Mas salvou-se, e era o importante.

     - É perto daqui, minha mãe?, perguntou a do meio.

     - Ainda que esteja perto, ainda que lhe toquemos com o dedo, tudo quanto não é nosso está na lua, entendeste?

Fonte:
Os Contos de Antonio Botto. RJ: Livraria Bertrand.

J. G. de Araújo Jorge (Trevos de Quatro Versos) 1

SOBRE A TROVA

Tudo é trova: a flor, a onda,
A nuvem que passa ao léu
E a lua, trova redonda
Que a noite canta no céu!

Ah, trova com quem me enleio...
- Tens um gingado qualquer
Que lembra esse bamboleio
Do corpo de uma mulher...

A todos prende e cativa,
E não se rende a qualquer...
- É pequena, mas esquiva...
... Não fosse a trova, mulher...

TROVAS

Sejam felizes ou não
Cantando instantes diversos,
As trovas do coração,
são trevos de quatro versos.

Rico eu sou, mesmo sem ouro
E da riqueza, dou provas,
- eis aqui o meu tesouro:
Minha sacola de trovas.

Tão simples, as trovas são
Cantigas com que a alma expande
Tudo o que há no coração
Do poeta - um menino Grande.

Meu terço feito de trovas
Que em versos fico a compor,
Com ele rezo, e dou provas
Do meu culto ao teu amor!

EU FAÇO VERSOS

 Eu faço versos assim
Como quem respira ou canta,
A poesia nasce em mim
Como do chão nasce a planta...

E como que por encanto
Minha dor se vai embora
Pois estas trovas que eu canto
São feitas... como quem chora...

De mãos dadas com as lembranças
Com o mar, com a noite, com a lua
Faço versos, como as crianças
Fazem ciranda na rua…

TUAS MÃOS...

Ternura de cinco pontas
Viva, estranha, inquieta flor...
Tuas mãos são duas contas
Do meu rosário de amor.

Delicados diademas
Trabalhadas obras-primas...
...Tuas mão sãos dois poemas
Rimando, em vermelhas rimas...

Ah, mãos tão frágeis, parecem
Pedir arrimo e guarida...
E entretanto, se quisessem
Guiariam minha vida…

GLÓRIA ?

Minha maior alegria
minha glória humilde e nua
é ver a minha poesia
fazer ciranda na rua...

 Por certo que me comovo,
nem glória existe maior :
ouvir um poeta o seu povo
dizer seus versos de cor !

A POESIA

Poesia, flor de mistério
que brota do coração
e abre as pétalas de etéreo
no céu da imaginação.

Vivo a vida cada dia,
vida comum, sem engodos,
por isto a minha poesia
reflete a vida de todos

A poesia que desejo
tiro de mim como aquela
cantiga do realejo
se alguém roda a manivela…

SOLIDÃO

Por certo a pior solidão
É aquela que a gente sente
Sem ninguém no coração...
No meio de muita gente...

Praias longe, em solidão
Fora de todas as rotas,
Tal como o meu coração
Só como o sonho... das gaivotas…

A VIDA

Gota d'água transparente
que brilha, cresce...e que cai!
Assim a vida da gente
que num instante se vai!

A Vida, - mistério vão
sombra agora, depois luz,
- estranho traço de união
ligando um berço... a uma cuz!

A Vida - uma onda que avança
e volta, vai-vem do mar...
Quando vai, quanta esperança!
Quanta amargura, ao voltar!

A Vida - visão fugaz,
praia chã, mar que alteia,
onda que faz e desfaz
os seus cabelos de areia...

A Vida - ansiosa escalada
sobre a paisagem do mundo
Tanto esforço para nada
se há sempre abismo no fundo!

Às vezes penso que a vida
que há tanta gente a querer
só existe, - indefinida -
pra gente poder morrer...

Ó pobre vida suicida!
Teu destino é uma ironia
se o que chamamos de vida
é um morrer de cada dia!

Numa amizade perdida,
num amor que se desgraça,
a morte desconta a vida
a cada dia que passa!

Há uma ironia, contida
nas contigências da sorte:
- quanto mais se vive a vida
mais se avança para a morte.

Vive a vida bem vivida
e ao mais, esquece e revela,
que a gente leva da vida
a vida que a gente leva…
Fonte:
J.G. de Araujo Jorge . Trevos de Quatro Versos". 1. ed. Livraria São José, 1964

Carlos de Oliveira (Uma Abelha na Chuva)

Análise da obra

 Obra de imaginação eficaz e rigorosa, o romance Uma abelha na chuva, de Carlos de Oliveira observa o mundo real através de tenso trabalho verbal iluminador do grande símbolo de tragédia e das referências simbólicas defluentes que alguma crítica encontra nas palavras tão autorais como são “paisagem” e “povoamento”.

 Da sintaxe simbólica da tragédia com a luta gandarense (paisagem e povoamento, afinal), segue o livro o seu trajeto tenso de símbolos, como o afirmam os pares opositivos fogo / água, mel / cinzas, mel / tabaco, abelha / água, mel / chuva, fonte / rio ou mar / poço, com variações de significação de acordo com as representações e os momentos textuais.

 O signo trágico assenta na utilização articulada de palavras-símbolo, assumindo cada uma as metamorfoses decorrentes da narrativa. A tragédia resulta da interação dos elementos que transformam o mel em fel, tudo arrastando para a corrosão e para as cinzas. Em paisagem cinérea, armadilhado o povoamento pelo destino trágico, a morte de Clara é decidida pela paixão e pela impossibilidade de ser fecunda num espaço dominado pela secura e pelo incontato. O mel cede ao fel e à "moeda de ouro", com a perfeição do círculo e o valor da perenidade, é também Jacinto, assim designado por onomástica significativa que convoca a perfeição, a beleza e a preciosidade. A morte anunciava-se desde há muito: o pisar das folhas caídas e a devoração desse “oiro” pelos vermes diziam já a morte de Jacinto, corpo jovem que foi bode expiatório de uma comunidade improdutiva e viciosa.

 Afinal, o tempo dos senhores, numa narratividade cíclica feita da vacuidade dos serões e das crises conjugais de Álvaro e Maria dos Prazeres, esmaga o tempo dos dominados que progride para o aniquilamento. E nem assim cessa a esperança, a luta.

 O código temporal do romance caracteriza-se pela linearidade da história e pelo ordenamento. A par, a conflitualidade e a frustração relacional propiciam o recurso à analepse (volta ao passado), que afirma através da imagem da água o primado da ancestralidade face a um tempo doloroso do presente de que conhecemos cerca de quatro dias. A constância dos fluxos aquáticos ao longo da obra, afinal, símbolo claro do fluir do tempo, traz consigo a imagem da irreversibilidade.

 Portanto, o código temporal e o repertório simbólico de Uma abelha na chuva contribuem decisivamente para a unidade de uma das mais importantes obras da literatura portuguesa do século XX.

 Este romance representa a assimilação sincrética da maioria dos temas versados antes, sem se desviar do humanitarismo socialista orientador de todas as obras de ficção do autor e do neo-realismo português em geral.

 Como nos três romances anteriores, Uma abelha na chuva localiza-se na região da Gândara, nos arredores de Coimbra.

 O romance tem como foco as trágicas conseqüências psico-sociais resultantes da união forçada entre a doente aristocracia da província e a burguesia rural.

 Temos uma obra depurada de excessivo localismo, o que Carlos de Oliveira não conseguiu em nenhum outro romance.

 A união de Maria e Silvestre representa o choque de duas classes integradas no contexto sócio-econômico da Gândara. Porém, a problemática interna destas personagens e as repercursões dessa problemática nas outras personagens da obra transcendem o pequeno mundo gandarês, sem por isso deixar de refleti-lo.

 A opressão do pobre pelo rico, uma constante do neo-realismo português, ainda está presente neste livro. No entanto, agora é tratada com incomum maestria mediante o recurso a um apto simbolismo que se patenteia no título e percorre toda a obra, não só lhe conferindo um caráter transcendente, mas, como no caso do símbolo da chuva, contribuindo para a sua estrutura orgânica.

 O romance quer demonstrar que não existe significativa mudança social que não produza sofrimento; e o pobre, devido à sua condição de subserviente e a certa ironia do destino, acaba sempre por ser a verdadeira vítima dos ódios e tragédias dos poderosos: um bode expiatório no verdadeiro sentido da frase. Nota-se que o motivo do sacrifício de vítimas inocentes percorre todo o romance. Mas até mesmo os próprios opressores são vitimados por desígnios de outrem ou por circunstâncias para além do seu próprio controle, embora a simpatia do narrador poucas vezes esteja com eles. É o caso de Maria dos Prazeres e até certo ponto de Álvaro. No fundo, e aqui se começa antever o caráter universalista do romance, não se trata de "uma", mas sim de um microcosmo de "abelhas" humanas na chuva.

 Apesar de seus momentos de tragédia, Uma abelha na chuva deixa transparecer um tom de zombaria, principalmente na crítica à sociedade provinciana retratada no romance: o burguês abastado, proprietário de uma casa em que não tem onde dormir porque a mulher trancou a porta do quarto; dois assassinos trapalhões que têm medo de trovoadas e carregam para longe o corpo da vítima no meio de uma tempestade, quando poderiam tê-lo escondido em qualquer lugar; o aprendiz que, no momento de maior tensão, abandona o mestre para correr atrás de um burro; uma beata encarregada de vestir os anjos e a outra que lhe fornece asas, túnicas, sandálias e resplendores.

Simbologia

A abelha - o casal Álvaro / D. Maria dos Prazeres são identificados como “abelhas cegas obcecadas", tal como o são os seus amigos íntimos. Deste modo, encontra-se explicitamente posto em causa, pela via da simbolização, o equilíbrio de um estrato da sociedade (o dominante no microcosmos social deste romance) corrompido por força de uma aliança de interesses inconciliáveis, o que explica a amarga conclusão do Dr. Neto, de que, tendo ajudado, "anos e anos aquela obra de pintar e repintar, a colméia dos Silvestres" não atendera "a que lá dentro o enxame apodrecia". Portanto o símbolo da abelha serve, numa primeira utilização, para salientar, pela negativa, o que, de degradado e imperfeito existe num determinado nível social.

O mel - evoca a idéia de perfeição e de doçura e também o da transformação. Ao nível de Álvaro e D. Maria dos Prazeres "todos eles fabricam fel", é junto do par Jacinto / Clara que o mel (isto é, a doçura, a perfeição apoiada no tempo) é suscetível de ser encontrado: tanto a gravidez de Clara como os projetos de ambos e até o envolvimento espacial em que estes últimos são considerados apontam para um futuro de otimismo (ou seja, de doçura idêntica a do mel) que o decorrer do tempo social e histórico propiciará.

A água e a chuva - esta evoca globalmente o sentido da agressividade (relacionada com o tema da opressão). Agressividade, porque com a sua presença gera o desconforto das personagens e acentua os seus conflitos. A água é também fonte e rio. A fonte, enquanto imagem da água que jorra e corre da terra, evoca o passado recôndito que flui da memória de certas personagens. A fonte é imagem próxima da infância e quando se transforma em rio passa a evocar, com toda a nitidez, o escoar de um tempo que quanto mais afastado da infância mais conspurcado se apresenta. Mas quando está em causa o desfecho das relações Jacinto / Clara, a água é também mar e poço, cenários particulares, de morte que a ambos atinge. Quando Jacinto é lançado às águas do mar, a personagem acaba por penetrar no elemento que ao seu comportamento habitual convém: no mar, símbolo da dinâmica da vida, do seu movimento e constantes mutações, exatamente na linha do pensamento de Jacinto, enquanto personagem norteada pelo desejo de transformar o mundo pela medida dos seus projetos. E, para além de Clara, Jacinto fecunda sobretudo o movimento de revolta popular que estilhaça os vidros do casal marcado pelo estigma da infertilidade. A morte de Jacinto, encerrando um ciclo de vida individual abre (fecunda) um ciclo de vida coletivamente assumida.

Álvaro Silvestre / D. Maria dos Prazeres - passado; presente perdido; classe social ameaçada; morte do grupo improdutivo; destruição; opressão; vingança; solidão.

Jacinto / Clara - presente destruído; futuro alcançado; vitória do grupo produtivo; comunhão; semente promissora.

 Aparentemente, o romance encerra com uma mensagem de pessimismo traduzida na eliminação daquela (Clara) que com o símbolo da abelha mais explicitamente se identifica; porque, com efeito, é ela que integra os sentidos da produtividade laboriosa e da fertilidade.

 Os episódios finais do romance e a sua leitura simbólica clarificam o sentido do pessimismo. Abre-se a possibilidade de uma inversão de juízos, quando se conclui que entre a aparência (a colmeia repintada, isto é, a organização e compromissos sociais que sustentam, os Silvestres) e a realidade (o enxame apodrecido, ou seja, a existência social e psicológica degradada) a relação é de oposição. Por outro lado, aquilo que à primeira vista inculca destruição e morte pode finalmente não o significar:

 "A abelha foi apanhada pela chuva..." A destruição da abelha não implica necessariamente a do enxame. Existe uma relação simbólica evidente entre abelha / Clara, atingida pela força destruidora da água, mas a morte de uma abelha isoladamente não só não compromete a sobrevivência e coesão social do enxame que a perdeu, como sobretudo faz dessa abelha semente de um processo de transformação da vida que evitará a existência de futuras abelhas na chuva.

 Clara = abelha.

 Uma abelha morre = ficam as outras.

 Clara morre = ficam as outras pessoas.

 A chuva = a classe opressora, a força da opressão.

 Colmeia apodrecida = colmeia morta = classe social a desaparecer.

 Colmeia verde = cidade verde = esperança na vitória = a consciência do povo desperta preparada para a luta.

As Abelhas - simbolizam as "trabalhadoras disciplinadas e incansáveis". Asseguram a continuidade da espécie ao trabalharem para a colmeia fazendo o mel. A colméia remete para o lar, para a casa que simboliza a concha, o bem-estar a proteção.

 Em oposição às abelhas temos o casal Álvaro Silvestre e Maria dos Prazeres (esta referência é feita por Dr. Neto), que diz "todos eles fabricam fel; abelhas cegas, obcecadas". As abelhas cegas remetem para o único objetivo deste casal que são os interesses econômicos que os levam "a roubar ao balcão, nas feiras, nas soldadas dos trabalhadores e na legítima de meu irmão", confissão. A abelha obcecada serve para vincar o que de negativo e imperfeito existe porque uma abelha cega não é útil para a colméia. Este casal também não é útil à sociedade porque para além de todos estes defeitos não asseguram a perenidade, a continuidade do nome e da riqueza pois é um casal infértil. Ainda, através de Dr. Neto, este diz que ajudou "anos e anos, aquela obra de pintar e repintar, a colméia dos Silvestres, sem atender a que lá dentro o enxame apodrecia".

 A colméia remete para o lar, para a casa que simboliza a concha, o bem-estar a proteção que são sensações que não existem na casa dos Silvestres porque se vive num ambiente degradado, corrompido perverso, sendo que este último se afigura na personagem de Álvaro quando veio avisar o mestre Antônio. O ambiente da casa dos Silvestres é tão viciado que não pode produzir nada de bom. Por tudo isto são o oposto das abelhas pois não há equilíbrio na sua casa e só produzem fel.

Comparação as abelhas - Clara que juntamente com Jacinto forma um casal equilibrado onde reina a harmonia, tal como na colméia. Jacinto tem o nome da flor da qual Clara se alimenta para produzir mel, o filho. O zangão é Jacinto que após a cópula com a abelha, morre. No último capítulo, a referência é a de que a abelha foi apanhada por uma chuva forte, da qual não consegue sair ou abrigar-se pelo que tentou debater-se, mas acabou por morrer. Tudo estava contra ela, por isso não conseguiu defender, era uma luta injusta.

 Dr. Neto também tem todas as qualidades da abelha, além de ser ele próprio apicultor.

A água - A chuva é o sinônimo de agressividade no ambiente social e está presente nos conflitos pessoais e nos momentos mais importantes da ação. Nos momentos de grande desconforto, de grande tensão, a chuva está patente, aumenta a sua densidade consoante o conflito está acentuado.

 A fonte quando a água jorra e corre da terra simboliza a evocação de memórias do passado: quando Álvaro Silvestre recorda a sua infância como refúgio; um tempo de bem-estar por oposição ao desconforto do presente. Para Maria dos Prazeres a fonte é também a imagem do passado, mas depois torna-se num rio.

 O mar é o espaço para onde o corpo de jacinto é atirado. Simboliza a dinâmica da vida, pelos seus movimentos de ondas, e Jacinto acaba por ter um fim que se enquadra na dinâmica que era a sua vida, repleta de projetos por concretizar.

 Do poço se recolhe a água que é vida, sendo por isso um espaço de origem da vida. No entanto, Clara atira-se ao poço, acabando por provocar-lhe a morte, como se fosse castigada pela ousadia de projetar uma outra vida sem o apoio do seu pai.

Os Nomes

Álvaro Silvestre: pelo fato de ser curto revela que não tem linhagem. Álvaro vem de "alvo" que significa branco, puro, honesto e virtuoso. Silvestre significa que é próprio da selva, que é selvagem, bravio, agreste e inculto.

Maria dos Prazeres Pessoa de Alva Sancho... Silvestre: o seu nome extenso representa a sua linhagem. Prazeres só mentais.

Tempo

 A cronologia da ação concentra-se em cerca de três dias. Este fato, porém, não deve induzir-nos ao erro, já que, se materialmente o tempo da ação é reduzido, em dois outros aspectos ele apresenta-se mais dilatado. Em termos históricos, na medida em que a analepse projeta muitas vezes as ações do passado sobre as do presente. Em termos psicológicos, porque a focalização interna sujeita os eventos às vivências das personagens cuja óptica comanda a representação narrativa. Este tempo revela-se, pois, muito mais extenso devido às inúmeras evocações do passado.

1º Período: entre as cinco horas de uma quinta-feira do mês de Outubro (cap. I) e a manhã do dia seguinte (cap. XVI).

2° Período: duração de 24 horas do dia de sexta-feira (cap. XVI - XXVI)

3° Período: o dia de sábado até o amanhecer de domingo (cap. XXVII - XXXV)

 A cena dialogada instaura um tempo discursivo isocrônico e surge quando se apresentam ações ligadas aos momentos de confronto entre as personagens, às reflexões que originam monólogos, aos serões e à preparação e consumação do assassínio de Jacinto. A cena dialogada põe a nu, muitas vezes, a incomunicabilidade entre as personagens.

 O tempo psicológico diz respeito ao modo como as personagens do romance vivem o passar do tempo. As analepses traduzem uma vivência interior por parte das personagens que refugiando-se no passado, fogem a um presente insuportável.

Espaço

 Geograficamente, a ação é localizada com alguma precisão. As localidades referidas no romance, como Montouro, S. Caetano e Fonterrada localiza-se na região de Cantanhede, na zona litoral do distrito de Coimbra.

 O espaço interior é o quarto do casal Álvaro Silvestre / D. Maria dos Prazeres e o palheiro onde se passam os amores de Jacinto e Clara.

 A tese do romance pode sintetizar-se assim: não existe uma significativa mudança social que não produza sofrimento; e o pobre, devido à sua condição de subserviente, acaba por ser a verdadeira vítima dos ódios e tragédias dos poderosos.

 O espaço psicológico manifesta-se através do monólogo interior de algumas personagens, revelando-se, assim, os conflitos vividos pelos protagonistas na sua consciência.

Narração

 A representação da história é conduzida por um narrador onisciente, capaz de penetrar no universo psicológico, social e cultural que determina o comportamento das personagens, e principalmente pela utilização da focalização interna, isto é, concedendo um papel dominante à perspectiva subjetiva e parcial que as personagens têm da própria história.

 A focalização interna (ou seja, a representação da história através do ponto de vista de uma ou mais personagens), aquela que o narrador utiliza de modo mais insistente; a focalização onisciente, como processo de vigência de uma visão (a do narrador) transcendente à história, é concedida uma função meramente acessória; a focalização externa, na condição de modo de apresentação do exterior de personagens e eventos, apenas esporadicamente surge atualizada como signo da representação.

 Quando abre a narrativa, é em focalização externa que é apresentada a personagem em ação: "Pelas cinco horas duma tarde invernosa de outubro, certo viajante entrou em Corgos, a pé, depois de árdua jornada...". Para além desta referência outra surge no capítulo XIII que serve para apresentar uma outra personagem: "...saltou da boleia para receber as ordens da dona da charrete, uma senhora pálida, de meia idade, agasalhada num xaile de lã e com manta de viagem enrolada nas pernas: — Perguntem no café se o viram."

 Além destas duas ocorrências, pode dizer-se que não mais se repete o recurso à focalização externa, como processo representativo autônomo.

Ação

 A ação principal está intimamente ligada à ação secundária, sendo esta emocional e evidentemente trágica, ao passo que aquela é física, surdamente dramática.

 A ação principal apresenta as relações impossíveis e altamente conflituosas de D. Maria dos Prazeres e Álvaro Silvestre; a ação secundária é constituída pelo amor de Jacinto e Clara, violentamente truncado. Por esta razão, é na ação secundária que surpreendemos uma intriga com uma série de acontecimentos encadeados de forma casual e com um desfecho sem retorno: diremos, então, que estamos perante uma ação fechada.

 Quanto à ação principal, é aberta, porquanto, retratando retalhos de vida, não nos aponta solução nenhuma para as personagens.

 Neste aspecto, Uma abelha na chuva integra-se perfeitamente na tradição geral do romance neo-realista português, refletindo cenários sociais e históricos que não apresentam uma ação completa, mas «fatias» de vidas acidentadas.

 Na ação principal marcada por momentos arrastados, se encontra de forma bem evidente uma caracterização social e psicológica; com efeito, se nos detivermos nos capítulos VII - X e XXXII - XXXIV, verificaremos que estes dois serões se seguem, respectivamente, ao denso episódio na redação do jornal e subseqüente viagem e à morte do Jacinto e subseqüente manifestação popular. E verificaremos que é durante esses serões que há um esboço de convívio social onde se discutem acontecimentos e aspectos "lá de fora", assim como se revelam características das personagens secundárias. Mesmo assim, essa espécie de conforto momentâneo "a quebreira do lume, o rumor insistente da chuva pela noite, a comodidade das cadeiras de braços bem almofadas" não são suficientes para amenizar sequer as tensões que dominam os donos da casa. Mesmo no desenrolar desses serões saltam fagulhas de revolta ou de fúria, reflexo do sofrimento contido no peito dos protagonistas, como quando Álvaro Silvestre reflete sobre a morte:

...os outros regressam a casa e eu para ali fico, sufocado, sozinho, a morrer outra vez, porque via tudo isso como se as coisas se passassem e ele com consciência, como se ouvisse o rumor da noite em que o velavam o latim do padre Abel no cemitério, as pazadas de terra a cair no caixão, o fervilhar irreparável dos vermes.
 Atirou-se ao brandy para não gritar.

 Ou quando se dá de conta, finalmente, que na sua vida chegou a um beco sem saída:

Caminhou para a porta, oscilando tanto que parecia aluir a cada passo, e desatou aos gritos, sem ninguém saber se pedia ou protestava: Onde é que há brandy nesta casa? Onde é que há brandy nesta casa?

 É a estes momentos de prolongamento da ação, em que tudo parece parado no tempo, que chamamos catálises, onde há ao mesmo tempo uma caracterização social e psicológica.

 Pelo contrário, há todo um conjunto de seqüências onde impera o movimento, isto é, a dinâmica dos acontecimentos. Observando atentamente esta extensa parte de Uma abelha na Chuva, podemos verificar que elas constituem unidades estruturais bem equilibradas, uma vez que a sua extensão é relativamente idêntica; vejamos então que as três etapas que determinam a constituição da ação secundária se encontram distribuídas de forma harmoniosa, como se pode ver nos capítulos XVII - XX (correspondem aos indícios), nos capítulos XXI - XVI (correspondem as conseqüências).

 Na ação desta obra podemos também analisar o sentido genérico que as seqüências manifestam, sendo este sentido o da violência, revelado, contudo, de forma variadas. É assim que, em várias seqüências, essa violência se revela eminentemente física: a "agressão" de que são objeto os quadros da família Alva por parte de Álvaro Silvestre (Cap. XIII), tendo uma dimensão simbólica, não deixa de pertencer a mesma linha que o assassinato de Jacinto ou o suicídio de Clara, assumindo sempre essa violência o sinal do deflagrar de irreprimíveis conflitos de raiz psicológica e social. Por outro lado, há outras sequências que se integram também, embora de forma indireta, em situações violentas, como é o caso da seqüência inicial em que a aversão contida nos sentimentos dos protagonistas "estala" no estranho diálogo entre ambos e o diretor do jornal.

O jornalista aproveitou para mudar de conversa:
 — Forte aguaceiro. Estala.
 Álvaro Silvestre anuiu logo:
 — Boa bátega, sim senhor.
 Só ela preferiu continuar a bater no mesmo prego:
 — A boa bátega que te podia ter apanhado no caminho. Já pensaste nisso?
 Fechou os olhos de puro desalento: cala-te, Maria, cala-te.

 Podemos compreender finalmente que a violência de sentimentos entre o casal é transferida para a chuvarada que se abate sobre Corgos, do mesmo modo que, no capítulo VI, quando D. Maria dos Prazeres chicoteia a égua, esta não é o seu verdadeiro destinatário, mas o marido, que cochila a seu lado. Essa mesma violência revolve-se no interior dos protagonistas, sem se revelar exteriormente, quando Silvestre surpreende o diálogo entre Jacinto e Clara ou quando é atormentado pelo sentimento de culpa que resulta da denúncia feita ao pai da rapariga.

Personagens

 Certas personagens de Uma abelha na chuva parecem ter sido inspiradas por pequenos fidalgos, padres, sacristães, beatas, lavradores, barbeiros, camponeses, criados, cegos, em que não é difícil reconhecer traços de Maria dos Prazeres, Padre Abel, do sacristão Antunes, do lavrador Álvaro Silvestre, do cocheiro Jacinto e de mestre António, o santeiro cego, entre outros.

 Na tensa atmosfera do romance, predominam as relações de opressão que muitas vezes se manifestam através dos "expedientes, espertezas, graças, truculências" de que o ser humano lança mão a fim de garantir seu domínio sobre os demais: "A alma humana posta a nu e meio mundo a enganar o outro meio", como observou o autor, Carlos de Oliveira.

Personagens da ação principal

D. Maria dos Prazeres

 Álvaro Silvestre

 Dr. Neto

 D. Violante


 Nesta ação destaca-se as relações de antagonismos entre D. Maria dos Prazeres e Álvaro Silvestre, enquadradas pelos dois pares de personagens que com estas coexistem: Dr. Neto e D. Violante.

 O Dr. Neto é apresentado pelo narrador, caracterizando-o de modo direto, isto é, dando sobre ele informações mesmo antes de ele aparecer (cap. IX). Ficamos sabendo então que o Dr. Neto "amava a realidade e só daí é que partia para as abstrações"; era um observador materialista, até para explicar a sua atitude virtualmente amorosa em relação à D. Cláudia, de que afirmava: "Sou um heredo-sifilítico; a D. Cláudia, uma constituição linfática, fragilíssima; pois bem, casamo-nos, e depois que filhos deitaremos ao mundo?".

 Mas o Dr. Neto não se fixava apenas no concreto. De acordo com a tradicional e universal leitura simbólica dos povos, o médico via no mel o simbolismo da perfeição suprema, o símbolo daquilo que a vida pode produzir de belo e saboroso. Mas ele não é só o apaixonado pelas abelhas e o seu trabalho, é também médico "atascado até ao pescoço na vida de Montouro", o agricultor que "sabia bem o que custava uma espiga de milho, aos homens e à terra". Esta é, incontestavelmente, uma descrição de personagem na linha neo-realista: o narrador que tudo sabe informa sobre a dureza do trabalho da terra, do trabalho da própria terra no seu processo de germinação e o trabalho intenso das abelhas na fabricação do mel. Embora no romance não se fale das relações de trabalho numa análise um pouco mais profunda, essas relações são nítidas quando colocamos a obra no tempo da sua produção (1953), fazendo-a assim desempenhar uma função social que não deixou, na época, de despertar a censura política.

 Quanto a D. Claudia, pouco há a dizer que o narrador não tenha dito já:

Pálida e medrosa... a D. Cláudia temia a natureza, a chuva, o sol, o mar, o vento, ignorava as flores... E a própria vida humana, as relações sociais, os pequenos equívocos da convivência, as conversas mais acaloradas assustavam-na.

 Pode-se dizer que ela pedia desculpa à vida por estar viva e tudo nela era fantasia e irrealidade. Por isso, "ia protelando o casamento e o Dr. Neto concordava". Também as relações entre o padre Abel e D. Violante se traduziam em termos de incompatibilidade não evidente. No aspecto físico, como se fosse um indício de algo que não pretende ser conhecido, estes "dois irmãos" não têm qualquer semelhança, como nos diz o narrador no capítulo VII.

A criada abriu a porta que dava para o pátio por uma escadaria lateral de pedra e a D. Violante e o padre Abel entraram. Parecidos como um ovo com um aspecto. Sempre os via juntos, ela maciça e baixa, o padre esgrouviado, D. Maria dos Prazeres tinha um sorriso de dúvida: realmente... ninguém dirá que são irmãos.

 Para além da diferença física, também temos que levar em conta o murmurar da sociedade em que estas personagens se inserem e que sobre elas exerce a suspeita de que vivem em como amantes:

As beatas de Montouro garantiam... e embora lhe tivessem perdoado a ele há muito, reservavam ainda a D. Violante um ódio velho... chamavam-lhe a irmã do padre, num sublinhar irônico do parentesco que deixava em aberto as suposições mais escabrosas.

 Vemos então que é real o antagonismo interpretado pelos dois pares que envolvem Álvaro Silvestre e D. Maria dos Prazeres, embora ele se expresse apenas em termos estáticos, uma vez que surge formulado quase sempre de modo descritivo, revelado apenas como enquadramento dos conflitos vividos pelos protagonistas, a estas personagens não pode caber obviamente uma função tão atuante como a que é própria do casal Álvaro Silvestre e D. Maria dos Prazeres:

...hei-de aturar-te até ao fim da vida, até que Deus me leve deste inferno que é a tua casa. Tenho nojo de ti, nojo, entendeste bem?

 "Até ao fim da vida" é uma eternidade, a eternidade do tempo quando a vida transporta essa marca indelével de inferno que é o casamento para uma católica como Maria dos Prazeres, efetivamente, a casa de Álvaro é o inferno, ao contrário de uma verdadeira casa, tranqüilizadora, protetora, local de refúgio, reconfortante, nada que se assemelhe à descrição do inferno.

 O espaço onde vivem estes dois seres não tem qualquer semelhança com uma casa. Sabemos bem por meio da analepse que surge logo no início, numa gradação sugestiva, o processo interior em que ela recorda a entrada no inferno da casa de Álvaro Silvestre:

Primeiro. A fonte brotou ténuamente, muito ao longe, na infância, depois, a agua mansa turvou-se ao longo do caminho, do tempo, com o lixo que lhe forma atirando das margens, agora é cachoante, escura, desesperada.

 Nesse recordar, os bens da família Alva foram "levados pela voragem". Para a personagem contam somente os fatos que a afetam; o que subjaz ou simplesmente ultrapassa os fatos não lhe interessa. É aí que o narrador assume um papel atuante, tentando veicular idéias, à maneira neo-realista. Por isso, ao longo do tempo, a transformação realizou-se: uma classe deu lugar a outra e a sua compatibilização é impossível. A luta, no casal Silvestre, mantém-se, a nível pessoal e social: é a luta entre a aristocracia e a burguesia.

 Para Maria dos Prazeres, o próprio calor físico é importante; mas também não tem mais esse calor físico e afetivo. Tem agora o quarto frio, o do inferno, da casa de Álvaro, pois que:

A casa, toda ela, gelava... No escritório do marido, na sala de jantar, fora possível conseguir um mínimo de aconchego.. No quarto não...

 Dr. Neto, o médico "conhecia bem o inferno que era a vida dos Silvestres. É visível esse inferno logo no primeiro serão, em que Álvaro Silvestre afundou-se nos almofadões da cadeira de verga, ao pé do lume. Tinha o brandy à mão" (cap. VIII).

 À medida que o tempo do serão vai passando, Álvaro bebe cada vez mais sob o olhar de desprezo da mulher "até ao brusco despejar do brandy na garganta". Com a chegada o Dr. Neto (cap. X), revela-se outro aspecto do caráter de Álvaro, pela pena onisciente do narrador: "a morte é perder as terras, a loja, o dinheiro, para sempre; e apodrecer, devorado pelos vermes... atirou-se ao brandy para não gritar." E até ao fim do romance a aguardente está presente como o próprio Silvestre, tornando-o cada vez mais alheio ao que o rodeia, mas, ao mesmo tempo, mortificado por todos os fantasmas que o habitam e o destroem. Por isso, é "uma concha de silêncio" (cap. III) perante a mulher, quando ela o apanha no escritório do jornal, prestes a acusá-la do roubo dos pinhais de Leopoldino; mas é também um obcecado quando (cap. XI), terminado o serão, "poisou o castiçal na secretária e... preparava-se para os dois problemas que tinha a resolver": a construção de um jazigo que o impedisse de ficar solitário na terra e a desculpa que teria que dar ao irmão pela venda fraudulenta dos pinhais.

 No capítulo XXX, esse silêncio faz-se voz quando Maria dos Prazeres chega perto dele com um frasco de amoníaco ao nariz para o tirar do torpor em que o álcool o deixou. Irritaram-se, insultaram-se, tentando Álvaro subestimar a origem aristocrática da mulher. "Quem é que está bêbado, sua fidalga de trampa?... Muito Conde, muita léria, mas há vinte anos que me comes as sopas", enquanto esta o reduz à categoria de cocheiro merecedor de levar chicotadas: "Os cocheiros conhecem-se bem pelas palavras."

 Há momentos em que um relâmpago de luz desperta em Álvaro, quando perante o insulto da mulher, ele pensa: "Como é possível... Ela está a insultar-me, mas eu amo-a, apesar de tudo, amo-a tanto... que..." E, quanto a Maria, há momentos em que uns laivos de remorso parecem lamentar que tudo seja desta forma: "Nunca lhe estendi a mão para um pouco de compreensão recíproca" (cap. VIII).

 Afinal, que ódio terrível os une que não deixou vir á superfície um sentimento que poderia nunca os ter separado?

No consultório quando o último doente saiu, o Dr. Neto encostou-se á janela e enrolou o cigarro. Também ele tinha ajudado, anos e anos, aquela obra de pintar, repintar, a colmeia dos Silvestres, sem atender a que lá dentro o enxame apodrecia.

Personagens da ação secundária

Clara

 Jacinto


 Clara, filha de mestre Antônio, é uma jovem saudável, bonita, apaixonada por Jacinto, o cocheiro dos Silvestre, aquele que D. Maria dos Prazeres vê como "uma moeda de oiro, rebrilhando à luz do sol".

 É num dos encontros entre ambos que se ficamos sabendo que a jovem espera um filho do namorado, que, no entanto, parece sinceramente apaixonado e quer casar com ela. Esse casamento também não é fácil realizar-se uma vez que o pai da moça vê na filha a sua única possibilidade de sair da miséria em que tem vivido, casando-a, (vendendo-a), a um lavrador abastado que a "compre" pela sua beleza.

 No cap. XV ficamos sabendo que Álvaro Silvestre ouve o diálogo entre os dois jovens e que, subitamente, um raio fere de morte os seus ouvidos: o nome de sua mulher é pronunciado com ironia e resquícios de ciúme, respectivamente por Jacinto, que refere o olhar cobiçoso com que a patroa o olha, e por Clara, que vê na "outra" uma potencial inimiga...

 Mas o jovem par, desconhecedor do que se passa fora do palheiro, continua suas promessas de amor, aprontando uma fuga que impeça as ameaças do velho pai e que, ao mesmo tempo, revela a força que o amor e otimismo pode imprimir em quem o sente.

 Os dois jovens representam, pois, a coragem de lutar por aquilo em que acreditam e a confiança total na sua capacidade de realização.

António

 Marcelo


 O capítulo XVIII é uma espécie de separação entre as personagens. É neste capítulo que Álvaro Silvestre, envolto no nevoeiro dos seus remorsos, dos seus fantasmas, das suas fraquezas, parece recobrar ainda forças para tentar libertar-se delas através de um sentimento finamente centralizado em alguém que está à sua mercê: a vingança.

 Não é a primeira vez que o assalta tal sentimento, que, contudo nunca é posto em prática pelo medo, medo quase irracional que sente de D. Maria dos Prazeres, contra quem não ousa frontalmente levantar-se, a não ser pontualmente, pela injúria do álcool.

 É possível ferir de morte a mulher, destruindo-lhe o encanto dos seus olhos: destruir Jacinto é um meio de dar algum sossego à sua alma, libertando de vez os demônios que o enlouquecem. O retrato do pai parece até acicatá-lo com o seu sorriso, meio irônico, meio repreensivo, e voltam à memória saturada do lavrador farrapos de conversas, sobras de bofetadas que o pai lhe dava para o fazer agir, lutar pela vida. Pois está decidido: "Concentrou no ruivo toda a força do seu pensamento... Nem mais, Álvaro Silvestre".

 A partir do capítulo XVIII toda a tragédia se precipita rapidamente: pôs em prática o seu plano, pela primeira vez na vida com decisão, chamou o cego António, contou-lhe da "sangria desatada" pôs-lhe a "pulga atrás da orelha", e a sua filha e o meu cocheiro estavam deitados na palha do curral onde vossemecê recolhe o gado.

 Agitando agora o velho Antônio, ensimesmado nos seus pensamentos, durante o dia, propondo sem quê nem porquê a filha ao seu ajudante Marcelo, a troca de ajuda num plano que o rapaz não entende, ainda... mas que, só de sonhar a recompensa, lhe parece milagre, sabendo como sabe quais os desejos do mestre em casar a filha com um lavrador abastado, Marcelo porém saberá o preço que terá de pagar para ter Clara e mesmo quando, num momento bem curto, pensa que "é uma sobra quase indistinta", logo se decide porque "custa menos a ferir que um homem verdadeira à luz do dia". Em última análise, o que toma verdadeiros significado no fim do capítulo XXIV é o diálogo:

E a rapariga? Ainda é minha?
 Arreia-lhe e veremos.
 [...]
 Acertaste-lhe?
 Agora tem de ma dar.
 Acertaste-lhe ou não?
 Tem de ma dar, mestre António...

 Aqui pode notar-se a insistência, preocupada de Marcelo que revela um objetivo bem definido dos dois homens, levando-os no entanto a caminhos diferentes. O capítulo XXV é terrível, pela sua condensação: terminado o crime, quando Marcelo julga alcançar a mulher amada, mestre Antônio, embora sem mais explicações, diz uma frase lapidar: "Julgo que a perdeste." (será que o velho tem a percepção do destino imediato da filha, face à tragédia que acaba de cair sobre ela?...)

O povo de Montouro

 Este povo, com o regedor à frente "como demônios irritados", revela a exaltação, "vozes desmedidas embatiam nas paredes". Perante esta nova situação, a fragilidade de Álvaro Silvestre revela-se em toda a sua natureza: apavorado, descontrolado, vê-se confrontado com a cólera popular em quem ele vê o carrasco do seu crime: a denúncia a mestre Antônio. E, uma vez mais, Maria dos Prazeres se agiganta na sua inquebrantável altivez, falando tão duramente à população que esta se acovarda e vai saindo, aos poucos, "às golfadas" (cap. XXX). Os capítulos finais dão-nos conta da ação secundária no seu fechamento (assassínio de Jacinto e suicídio de Clara) e da ação principal na sua continuidade: tudo vai servir para perseguir alguns dos populares como o regedor "uma autoridade que permite tais desmandos não é autoridade não é nada" e Antunes "...e o sangue do Antunes é ruim" e considerar o povo como um atentado permanente ao bem-estar da "gente de bem", à moral, à família... consignado na frase "Mancebia, arruaças, assassínio" proferida por uma das personagens das relações de Maria dos Prazeres. A conversa retoma os aspectos habituais, como se tudo se cumprisse num círculo, e a apatia de Álvaro Silvestre é, de súbito, perturbada pela revolta que se vaza no desejo louco de beber; "onde é que há brandy nesta casa? Onde é que há brandy nesta casa?" (cap. XXXIV).

 Só o Dr. Neto se sensibiliza perante a sorte de Clara, que salvara em pequena e que agora nada pode impedir da desdita total. E quando, perante a afogada, reconhece a sua impotência perante a injustiça dos homens e de Deus, não é capaz de desistir, "mas continuou até o suor lhe correr pela cara. E as lágrimas também, apesar da sua velha convivência com a morte".

Fonte:
Texto parcial proveniente de apontamentos do Prof. António Melo
http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/u/uma_abelha_na_chuva

Monteiro Lobato (Reinações de Narizinho) Cara De Coruja – IX – A partida

O relógio bateu seis horas.

— Como é tarde! — exclamou Branca de Neve. — Tenho de estar no castelo às sete para receber dois príncipes que vêm jantar conosco.

— E nós também — disseram Rosa Vermelha e Rosa Branca. — Temos à noite a visita do Pássaro Azul.

Cinderela também tinha de retirar-se, de modo que foi um rodopio de abraços e beijos e palavras de despedidas — tudo num grande atropelo.

— Adeus! adeus! — dizia Narizinho, passando dos braços de uma princesa para os de outra. — Voltem outra vez, agora que sabem o caminho...

Pedrinho, que havia cochichado muita coisa para Peter Pan, despediu-se dele dizendo:

— Quando voltar, veja se traz o crocodilo que comeu o capitão Gancho. Tenho muita vontade de ver um crocodilo dessa espécie.

A Aladim lembrou o desafio:

— Venha com a sua lâmpada. e areie bem ela, ouviu?

Emília andava de mãos em mãos. Nunca foi tão beijada e mimada. Quando chegou o momento de despedir-se do Pequeno Polegar, cochichou-lhe ao ouvido uma porção de coisas sobre dona Carocha e aconselhou-o a fugir novamente e vir morar com eles ali no sítio.

Depois que todos partiram, a casa ficou mais vazia do que nunca. Na sala, só os dois meninos e a boneca. No terreiro, só a mocha mascando as suas palhas e Rabicó acabando de comer a sua raiz de mandioca.

Os dois meninos trocavam impressões.

— De quem mais gostei foi de Branca de Neve – disse Narizinho. — Como é boa e linda! Contei-lhe que estive com a aranha que lhe fez o vestido de casamento Branca ficou muito admirada. Pensou que dona Aranha tivesse morrido daquele desastre na perna. Como Branca é branca! Nunca imaginei que pudesse haver uma criatura alva assim. Parece feita de coco ralado...

— E eu gostei muito do Gato de Botas — disse Pedrinho. – Já Aladim me pareceu um tanto prosa. Pensa que aquela lâmpada é a maior coisa do mundo.

Nisto Emília, que havia rolado para debaixo da mesa deu um grito de espanto.

— Olhem o que está aqui! A lâmpada de Aladim! Com a pressa, ele esqueceu-se de levá-la.. .

— É verdade! — exclamou Pedrinho no auge da alegria.

— Esqueceu-se e agora a lâmpada é minha!...

— E está aqui também a varinha de condão de Cinderela! — berrou de novo Emília mostrando o precioso talismã. Com a pressa, ela esqueceu-se da vara e a vara é minha. Vou brincar de virar o dia inteiro.

— E olhem o que está aqui atrás do armário! — gritou por sua vez Narizinho. — As botas de sete léguas do Gato de Botas. São minhas — e quero ver quem me pega!...

Ficaram todos três no maior contentamento, a mirar e remirar aquelas maravilhas e a fazer projetos de aventuras ainda mais extraordinárias que as que os livros contam. No melhor do enlevo, porém, ouviram uma batidinha trêmula na porta, tuc, tuc, tuc...

Emília foi abrir. Era uma baratinha de mantilha — a célebre dona Carocha...

— Que é que a senhora deseja? — indagou Emília.

— Boa tarde! — disse a velha, fingindo não reconhecer a boneca e sentando-se para descansar. — Sou dona Carocha, a que toma conta de todos esses personagens do mundo maravilhoso.

— Já sei — observou a menina, de mãos na cintura e prevendo complicações. — Mas que é que a senhora quer?

— Vim buscar a lâmpada de Aladim, a vara de condão de Cinderela e as botas do Gato de Botas. Esses maluquinhos, com a pressa de voltar, esqueceram-se desses objetos.

Foi um desapontamento geral. Emília quis mentir, dizendo que não havia ali nem bota, nem vara, nem lâmpada nenhuma. Narizinho teve ímpetos de morder a velha. Pedrinho chegou a olhar para o bodoque. Mas dona Benta estava na salinha próxima; e dona Benta fazia muita questão de que seus netos respeitassem os mais velhos.Por isso resignaram-se a entregar aquelas preciosidades.

— Pois leve — disse Narizinho, contendo-se a custo. — Mas fique sabendo que o que lhe vale é vovó estar ali na salinha. Ah, se não fosse isso...

Dona Carochinha nada disse. Foi tratando de pegar a vara, a lâmpada, as botas e até o espelho mágico que Branca de Neve dera à boneca. Em seguida raspou-se, ressabiadamente.

Mas antes que ela chegasse à porteira Emília explodiu:

— Cara de coruja seca! Cara de jacarepaguá cozinhada com morcego e misturada com farinha de bicho cabeludo, ahn!... e botou lhe uma língua tão comprida que dona Carochinha foi arregaçando a saia e apressando o passo...
–––––––
Continua... I – O Irmão de Pinóquio

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas de Ano Novo n. 437)

 - Uma Trova Nacional  -

Vem chegando mais um ano
e com ele uma esperança:
Planeta sem nenhum dano,
nem maus-tratos co’a criança!
–ESTER FIGUEIREDO/RJ–

 - Uma Trova Potiguar  -


Ano Novo, vida nova
eis o que mais eu queria:
a cada dia uma trova
e um soneto todo dia!
–FRANCISCO MACEDO/RN–

 - Uma Trova de Ademar  -


Eu vou pedir para o povo
em preces e em orações;
muita paz neste Ano Novo...
Muito amor nos corações!
–ADEMAR MACEDO–

 - ...E Suas Trovas Ficaram  -


Ano Novo, nova vida
e muita poesia nova,
desejo a elite que lida
na lapidação da Trova!
–CLARINDO BATISTA/RN–

 - Simplesmente Poesia  -

Agora
–ELIANA JIMENEZ/SC–


Agora posso respirar
e sorrir
e jantar.
Agora posso ir
pra um lugar
divagar.
Agora posso ver
o meu eu
renascer.
Agora posso parar
de sonhar
e lutar.
Agora estou livre
para ser
e vencer.
Agora estou bem
para o ano
que vem.

 - Estrofe do Dia  -

A vocês caros poetas
desejo nesta poesia,
muito dinheiro no bolso
saúde, paz e harmonia;
pra você e pro seu povo
eu desejo um ano novo
cheio de paz e alegria...
–JOSÉ ACACI/RN–

 - Soneto do Dia  -

Balanço
 –DARLY O. BARROS/SP–


Outro ano finda! É tempo de balanço,
de contabilizar o acumulado
de erros e acertos – para tanto, os lanço,
dispondo-os em colunas, lado a lado.

Sobre o montante, então, o olhar relanço,
para exultar , ao ver  que o resultado
atesta um expressivo e claro avanço,
em relação a acertos do passado.

“Não há estratégia alguma!”, diz meu peito,
é a resultante do que eu tenho feito
de tempos para cá: reaplicar

os dividendos de um investimento
que me garante mais que cem por cento
sobre o meu patrimônio: o verbo amar...
Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Evelyn Heine (Poesias Divertidas para Crianças )

DOENCITE

Às vezes a gente acorda
Achando tudo errado:
Nariz tapado,
Olho embaçado,
Braço cruzado.

Tontura, enxaqueca...
Tem nhaca de todo lado.
Quem será que me botou
Todo esse mau-olhado?
Dorzinha esquisita,
Será que é sério?
Ai, corpo humano...
Quanto mistério!
Depois, tudo passa!
Vai como veio!
E até acho graça
De tanto receio!

ÁGUA DOCE, DOCE ÁGUA

De mar é feita a terra,
De água é feita a gente.
Abaixo o desperdício!
Poupar água: coisa urgente!

Clara, doce ou gelada,
Verde, azul ou transparente,
Sem a água não há nada.
Nem floresta, nem semente.

Água doce mata a sede,
Água doce é a que lava.
Cachoeira, rio ou fonte...
Só não pode ser salgada.

Tanto bate até que fura,
Diz ditado popular...
Cuida dela! Você jura?
Vamos economizar!

BI, BI, FON, FON!

Carro cachorro louco
Late, buzina, avança!
Um rosnando para o outro
Feito briga de criança.
Pra que isso, minha gente?
Paz é mais inteligente!

Na estrada ou na rua 
O caminho vai e volta. 
Passa a vida das pessoas, 
Passa o sol, passa a paisagem. 
Passam carros coloridos, 
O destino na bagagem. 
“Quem fica parado é poste”, 
Como diz José Simão. 
Para o trânsito dar certo, 
Tem a sinalização. 

Eu vou, tu vais, ele vai.
Nós vamos, vós ides, eles vão.
Cada um tem seu caminho,
Mas não vale contramão!

Se eu pego a contramão,
Passo no sinal fechado,
Está feita a confusão.
É encrenca pro meu lado.

Vai falar no celular, 
Ou mudar de estação? 
Então é melhor parar! 
Dirigir pede atenção. 

Pra que serve tanta placa?
Tem até uma com vaca.
Menino, montanha, “E” com “X”...
Tem flechinha pra cá e pra lá...
Eu pergunto e meu pai diz:
“Serve para organizar”.

MÃE... A MINHA É DIFERENTE!

Dizem que mãe é tudo igual.
Só muda o endereço.
Mas a minha é mais legal,
A melhor que eu conheço.

Minha mãe é diferente,
Com sotaque engraçado.
Ela faz tudo ao mesmo tempo,
Deixa o tempo até cansado.

Conversa com todo mundo de uma vez,
Faz pergunta e nem ouve a resposta.
Você fala, ela já está longe,
Mas é assim que a gente gosta.

Do seu jeitinho, nos conquistou
A todos os filhos, genros e netos.
Um favor nunca negou.
Dá conselhos sempre espertos.

Sua mãe também deve ser única, sem igual.
Aposto que é especial!
Porque mãe é feita de encomenda pra gente,
Só o amor é que é igual.

OLHA A CARETA!


Amanda era uma menina bonitinha.
Cheia de sardinha. Cabelo de trancinha.
Tão engraçadinha!
Mas foto dela, não tinha.
Na hora de tirar fotografia, só fazia estripulia.
Não ria.
Nem sorria.
Sabe o que é que aparecia?
Só careta! De todo jeito... Nariz torto, boca torta, só folia.
A cara mesmo, ninguém via.
O pai pedia:
– Risadinha, minha filha!
Aí ela estufava as bochechas o mais que podia. Ficava com cara de melancia.
A mãe dizia:
– Faz "X", filhinha!
Mas não fazia. Nem pra vovó, nem pra titia.
"Ninguém me manda", sacudia Amanda.
Mas um dia, um belo dia, a danadinha arranjou um namorado. E ele pediu uma foto. Pra guardar na carteira, com os adesivos de estimação, um chiclete e duas moedas.
– Xi... não tenho. – disse Amanda, desenxabida.
– Ora, então tira. – pediu o namorado.
– Não posso. – tristinha, disse ela...
– ...Agora estou banguela!

QUER BRINCAR?

Alegria de criança
É tão fácil, tão gostosa!
Qualquer sonho se alcança.
E a vida é cor-de-rosa.

O brinquedo ou a caixa,
Tudo serve pra brincar.
Tudo sempre se encaixa
Nesta fase de inventar.

Pega-pega, esconde-esconde, mau-mau...
Gato mia, polícia e ladrão...
Brincadeira mais legal
Vem da imaginação.

Você brinca o dia todo
E com tudo que aparece.
Se adulto é quem brinca,
Dizem dele: “Este não cresce!”

Mas criança se diverte
De um jeito diferente.
Ela leva mais a sério
A missão de ser contente.

Qualquer coisa nessa vida
Pode virar brincadeira.
Chuva, rio, nuvem surgida...
Qualquer coisa que se queira.

Quando você for grande
Continue a diversão.
Com bola, pintura ou casinha...
Existe uma profissão!

Até mesmo com palavras
A gente pode brincar.
Está vendo esta poesia?
                     Eu brinco é de rimar!
Fonte:
http://www.divertudo.com.br/historias.htm#poesia

António Botto (Política)

     Dizem que as lebres dormem com os olhos abertos. Não sei se é verdade, nem para o caso isso tem importância de maior. O que é certo é que esta lebre de que vou falar, dormia uma tarde, à beira de um rio, quando as águas a atingiram rodeando-a lentamente... Espavorida, debateu-se entre o lodo e a água, mas, por mais esforços que fizesse, não pôde libertar– se daquela inesperada ameaça mortal. E ficou-se quase morta estendida, inerente, mal podendo respirar. Valeu-lhe o vento ter mudado e as águas tomarem novo curso...

     Nisto, uma rã muito verdinha, vai ter com ela, sorrateira, e faz este comentário:

     - Que parva!, que grande parva! Nadava, e era tão simples!

     A lebre não estava morta. Com o sol, com o ar, tomou alento e ergueu-se até que chegou à sua toca. E desde então tomou tamanho susto pela água, que quando via uma gota de orvalho a faiscar nas relvas ou no arvoredo, ficava nervosa, perturbada, e já não sabia o que havia de fazer. Às vezes, recordava o palavreado da rã ouvido como um sonho e desejava encontrá-la para lhe contar duas tesas.

     E, se bem o desejou, melhor o conseguiu. A pobre rã apareceu-lhe na curva de um caminho a coxear e a gemer.

     - O que foi isso?, perguntou a lebre.

     - Ai, menina, deixe-me cá. Um cão, um maldito cão que encontrei à pouco, atirou-se a esta minha perna que por um triz não se partiu... Mas, repare: não posso andar... Ai, a minha rica perninha; ai que dor, não posso andar! E se o dono do cão não se opõe, era uma vez uma rã...

     - Idiota, grandessíssima idiota!, responde a lebre, desdenhosa: Se o remédio era tão simples, tão simples, tão natural: Correr, deitar a correr! Sim, correr e nada mais!

     Assim disse a lebre que não sabia nadar à rã que não sabia correr. Uma e outra se julgaram como, em geral, na vida, sempre sucede: cada qual pensando em si só por si avalia o que aos outros acontece.

Fonte:
Os Contos de Antonio Botto. RJ: Livraria Bertrand.

A. A. de Assis (Lançamento da Revista Virtual de Trovas, n. 145, janeiro de 2012)

INESQUECÍVEIS

Eu vi o rio chorando
quando te foste banhar,
por não poder, te banhando,
dar-te um abraço e ficar...
ADELMAR TAVARES

A vida o tempo devora;
o próprio tempo não dura.
Colhe a alegria de agora,
para a saudade futura!
HELENA KOLODY

Eu... você... as confidências...
o amor que intenso cresceu...
e o resto são reticências
que a própria vida escreveu...
LUIZ OTÁVIO

Meu coração, vacilante,
ressoa em cada batida.
– Igual a um tambor distante
marcando o passo da vida.
NEWTON MEYER

Não tenho calma!... Não posso
esquecer tão de repente,
o grande amor que foi nosso
e hoje em dia é meu somente...
NYDIA IAGGI MARTINS

Meu amor, que mau pedaço
eu passo quando demoras...
Meu coração perde o passo,
atrás do passo das horas!...
WALDIR NEVES

Tornar-se um trovador conhecido não é difícil. Mas você
precisa ajudar, pelo menos divulgando as suas trovas.

BRINCANTES

Qualquer vivente se esbarra
nesta evidência que aterra:
– é no balanço da farra
que o bom farrista se ferra!
ANTÔNIO JURACI SIQUEIRA – PA

Por ironia, um defeito
a manicure consome:
não consegue dar um jeito
no marido “unha-de-fome”!
ARLINDO TADEU HAGEN – MG

Pergunta a mestra ao menino,
aluno meio confuso:
– A porca... tem masculino?
– Tem, fessora... o parafuso!
EDMAR JAPIASSÚ MAIA – RJ

– Perdão! Perdi a cabeça...
E a esposa assim retrucou:
– Tudo bem, não se aborreça...
Azar é de quem a achou!
JOSÉ FABIANO – MG

– Carro velho, meu amor,
dá trabalho: além de feio,
no morro, falta motor;
na ladeira... falta freio!
JOSÉ OUVERNEY – SP

Quando a mulher não sacia
sua “fome de leão”,
come na sogra  ou na tia...
boas de forno e fogão!
Mª MADALENA FERREIRA – RJ

Foi à loucura a torcida
porque a mulher do goleiro,
em gandula convertida,
dava bola ao time inteiro...
NEWTON VIEIRA – MG

Com a internet, hoje em dia,
até o maestro desanda.
A banda-larga o inebria,
vicia, e ele larga a banda...
OSVALDO REIS – PR

LÍRICAS E FILOSÓFICAS

Quanto mais rápido passa
o tempo a mim concedido,
mais grato eu sou pela graça
de cada instante vivido!
A. A. DE ASSIS – PR

Deus, demonstrando poder,
quando a mulher engravida,
transforma a dor em prazer,
na celebração da vida!
ADEMAR MACEDO – RN

Enquanto a vida se enfeita
com sorrisos e saudades,
vou preparando a colheita
das lembranças e saudades.
ALICE BRANDÃO – RS

Quando vejo uma casinha
sem nenhum luxo e de chão,
lembro a criança que eu tinha
dentro do meu coração...
AMILTON MACIEL – SP

Delírio é lira do poeta,
a rima do trovador.
É liturgia completa,
quer na alegria ou na dor.
ANDRÉA MOTTA – PR

As promessas que fizeste
nem a lua abençoou.
Tudo não passou de um teste,
pois você nunca me amou.
ÂNGELA STEFANELLI – RJ

As saudades não têm fim,
a luz do sol se apagou...
Secou a flor do jardim,
o trem da vida passou.
ARI SANTOS DE CAMPOS – SC

Do PhD ao leitor mais simples, todos
entendem a trova. E gostam dela... muito.

No trem da felicidade
vamos todos embarcar.
Aceita qualquer idade...
Nunca pare de sonhar!
ARLENE LIMA – PR

Estar perto, mas distante;
amar sem poder “amar”...
Em que trama torturante
fomos nós nos enfiar!
BRUNO PEDINA TORRES – RJ

Ante o talento me ajoelho...
E o teu talento invulgar,
tanto me serve de espelho
como me serve de altar.
CLÁUDIO DE CÁPUA – SP

Penso que assim como os trilhos
levam e trazem o trem,
o pai conduz os seus filhos
pelo caminho do bem.
CLÊNIO BORGES – RS

No dejes pasar la vida
sin flores en tu enramada,
ni lo que Dios te convida
de una bella madrugada.
CRISTINA CHÁVEZ – MÉXICO

Um coração que se isola
cava a própria solidão
e não há melhor escola
que o convívio com o irmão.
DÁGUIMA DE OLIVEIRA – MG

Espero que sempre a lua,
apesar da timidez,
se nos mostre toda nua,
toda nua, a cada vez.
DIAMANTINO FERREIRA – RJ

Foi capricho ou devaneio,
quando eu lhe disse: “Não sei”!
Orgulhoso – ele não veio;
caprichosa – eu não voltei!
DILVA DE MORAES – RJ

Dizemos que o tempo voa,
e enquanto filosofamos,
ele vive aí... à toa,
e somos nós que voamos!
DOROTHY J. MORETTI – SP

Não te rendas nunca à dor,
se o teu bem tem rumo incerto,
pois, muitas vezes, no amor,
esse longe é muito perto!
EDUARDO A. O. TOLEDO – MG

Vivo sempre a divagar,
no silêncio em que me abrigo:
– Ah que bom poder voltar,
e estar outra vez contigo!
ELIANA JIMENEZ – SC

A noite passa e o luar
permanece em mim, refém,
quando a Lua vem brilhar
no doce olhar do meu bem
ELISABETH SOUZA CRUZ – RJ

Moisés caminhou, por certo,
da forma que Deus queria.
É fácil andar  no deserto
tendo-se Deus como guia.
EVANDO MARINHO SALIM – RJ

Mar e terra acasalados,
na sacrossanta medida,
fazem sal, sêmen sagrado,
para dar sabor à vida.
FRANCISCO MACEDO – RN

Meu verso é meu companheiro
no cenário da ilusão
e o universo, imenso, inteiro,
se torna pequeno então!
GISLAINE CANALES – SC

Milhares de pessoas ouvem e leem as nossas
trovas: que bem enorme lhes fazemos nós!


Batem-me à porta, são muitas,
e fico a me questionar:
por que visitas fortuitas
se já nem sei mais amar?
HUMBERTO DEL MAESTRO – ES

Se o amor não pode conter-se,
entre nós, não há receios.
Gosto de vê-lo perder-se
na doçura dos meus seios.
IEDA LIMA – RN

Pior que não ver estrelas
sobre os caminhos que eu trilho
é olhar para o céu e vê-las,
mas não enxergar seu brilho...
IZO GOLDMAN – SP

Diz-me esta ruga esculpida,
entalhe que o tempo fez,
que a primavera da vida
só nos floresce uma vez.
JAIME PINA DA SILVEIRA – SP

Voltei. Cabisbaixa eu vinha,
com o orgulho lá no chão...
Melhor do que estar sozinha
e coberta de razão!
JEANETTE DE CNOP – PR

Na clausura da existência,
das prisões que nos impomos,
um devaneio é a essência
do que pensamos que somos!
J. B. XAVIER – SP

Para iludir solidão,
cantando falsos enredos,
abraço o meu violão
passando as dores aos dedos.
JOÃO B. X. OLIVEIRA - SP

Vivo em busca de carinho,
em castelos de ilusão...
Tanto tempo estou sozinho,
quem me aquece é a solidão.
JOSÉ FELDMAN – PR

Não culpe, nunca, o destino
pelas quedas e fracassos.
Não se censura um menino
que cai nos primeiros passos!
LISETE JOHNSON – RS

Quando o ocaso traz tristeza,
meu refúgio mais frequente
é espalhar fotos na mesa:
ver o passado... presente!
LUCÍLIA DECARLI – PR

Passa o tempo num instante
e dele jamais se esquece,
pois fica sempre o importante:
o velho amor permanece.
LUIZ CARLOS ABRITTA – MG

Se eu me for antes de ti...
levarei, dos nossos traços,
cada noite que vivi
na cortina... dos teus braços.
MARA MELINNI GARCIA – RN

Quando a noite vai embora,
a aurora vem, de mansinho,
despertando fauna e flora
na mata e no ribeirinho.
MARCOS MEDEIROS – RN

Ruínas... sonhos contidos
no penoso caminhar...
Passos trôpegos, sofridos,
à noite esperam sonhar.
Mª DA CONCEIÇÃO FAGUNDES – PR

O teu carinho constante
é  musica a me embalar
encantando o meu instante
e me fazendo te amar.
Mª LUIZA WALENDOWSKY – SC

Na tribo dos trovadores, entre irmãos te sentirás.
Quanto mais fraterno fores, melhor trovador serás! (aaa)


Se de novo o amor palpita,
o velho se faz criança...
E como a vida é bonita
no retorno da esperança!
Mª THEREZA CAVALHEIRO – SP

Contemplar o mar infindo,
entender sua poesia,
ver o sol se despedindo,
é sentir paz e alegria.
MARINA VALENTE – SP

Meu amor da mocidade
foi efêmera ilusão;
dele só resta a saudade,
nas cinzas de uma paixão.
MAURÍCIO FRIEDRICH – PR

A fé que você procura,
às vezes sem solução,
encontrará na ternura
que existe no coração.
NEIVA FERNANDES – RJ

Os teus olhos patrocinam
pensamentos variados;
todos aqueles que animam
os sonhos dos namorados.
NÍLTON MANOEL – SP

Quanto sonho não vivido
do jeito que foi sonhado!
Mas tudo tem mais sentido
quando, enfim, é conquistado.
OLGA AGULHON – PR

Nada recebe quem nega
dar amor ou coisa assim;
só colhe flores quem rega
dia e noite o seu jardim.
OLYMPIO COUTINHO – MG

Ao te encontrar, velha agenda,
lá no fundo da gaveta,
meu passado se desvenda:
és a minha “caixa preta”.
RENATO ALVES – RJ

Sou rio, minha querida,
correndo para o seu mar,
para adoçar sua vida
com pena de me salgar.
ROBERTO ACRUCHE – RJ

Minha infância – que linguagem!
Se no céu relampejava,
eu sentia, nessa imagem,
que Deus me fotografava!
ROZA DE OLIVEIRA – PR

"Os lírios do Campo olhai",
diz a Sagrada Escritura.
Feliz aquele que cai,
mas mantém a mente pura.
ROSE MARY ASSUMPÇÃO – PR

No refúgio desmanchamos,
quando ficamos a sós,
esses nós que carregamos
no fundo de todos nós!
SELMA PATTI SPINELLI – SP

Brincando, na meninice,
uma árvore plantei...
Na solidão da velhice,
à sua sombra eu chorei...
THEREZINHA BRISOLLA – SP

Na vida eu prefiro o jogo,
não de azar, de sedução...
e, em vez de cartas, o fogo
que incendeia uma paixão.
VANDA ALVES DA SILVA – PR

Numa riqueza sem fim,
nasce a força da bondade,
como as flores do jardim
na sua simplicidade!
VIDAL IDONY STOCKLER – PR

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