quarta-feira, 2 de maio de 2012

Clevane Pessoa (Velhos Olhos, Novos Olhos)


Potiguar, da pequena cidade de São José do Mapibu, Clevane Pessoa de Araújo Lopes expõe toda a sua sensibilidade pulsante e lirismo psicológico nos quinze poemas que compõem o livro Velhos olhos, novos olhos.

Em As lavandeirinhas a autora faz um tributo às lavadeiras, com um belo lirismo, retratando a atividade dessas profissionais quase folclóricas, com muita graça. Apesar de citar as lavadeiras das margens do rio São Francisco e outras, o poema universaliza tais mulheres trabalhadoras. Clevane também trás para a roda, o próprio rio, ou lagoa, além da fauna que cerca o “tanque” natural.

Mas nem só de lirismo vive a poesia de Clevane. No poema Infância perdida, infância roubada, a autora trata com sobriedade e sem perder o tom poético, a triste situação de milhares de crianças que acabam sendo privadas de sua juventude.

A poesia mística, presente na obra Velhos olhos, novos olhos, faz o leitor passear pelo estilo pós-conversão dos poetas Murilo Mendes e Jorge de Lima. Tal elemento está representado no Poema de natal. Entretanto, as referências diretas a personagens religiosos se restringem ao componente anjo e lógico, ao menino (Jesus, certamente).

Em certos momentos da poesia de Clevane, o eu lírico mergulha em estados melancólicos e até pessimistas. No caso da poesia Rompimento, o motivo é um amor despedaçado. Não que as experiências citadas sejam inspiradas em passagens pessoais da autora, pelo contrário. Clevane deixa claro nessa poesia que o enredo declamado em seus versos é inspirado no episódio de outra pessoa.

Mais adiante, inclusive, a autora chega a ponto de esclarecer em uma nota, após o poema de sugestivo nome, À beira do precipício, que “a poesia não tem nada a ver comigo, é que gosto de interpretar a todas as mulheres, sempre que posso...”. E pelo que vemos em Velhos olhos, novos olhos, pode mesmo.

Fonte:
texto enviado pela autora 

Histórias que o Povo Conta (O Macaco e a Onça)


Nesse tipo de história, os personagens são animais, mas agem como se fossem gente. Costumam aparecer disputando alguma coisa, como o macaco e a onça que você vai conhecer a seguir. Esta espécie de conto também é chamada de fábula, principalmente quando termina com uma lição de moral explícita.

O macaco e a onça

 A onça era o bicho mais bravo e malvado da floresta. Comia anta. Comia capivara. Comia tatu. Comia queixada. Comia veado. Só não comia o macaco, pois esse a onça não conseguia pegar, de jeito nenhum.

 - Um dia eu agarro esse malandro - dizia ela lambendo os beiços.

 Quando foi um dia, a onça teve uma idéia.

 Subiu no alto de uma pedra e chamou a bicharada da floresta. Avisou que ia dar uma festa. Mas tinha uma coisa. A onça fazia questão:

 - Quero que cada bicho traga sua mãe.

 - Pra quê? - perguntou a anta.

 A onça fez cara de inocente. Inventou que era para ver quem gostava e quem não gostava da própria mãe:

 - Quem não trouxer, já sei que não gosta! A bicharada caiu na conversa fiada da onça.

 Mas o macaco ficou desconfiado. Voltou para casa e escondeu a mãe no galho mais alto do tronco mais alto da árvore mais alta do morro mais alto da floresta.

 O dia da festa chegou.

 A bicharada apareceu toda contente, cada um trazendo a sua mãe.

 Que desgraceira!

 A onça deu um bote e foi comendo tudo quanto foi mãe de bicho que encontrava no caminho.

Quando estava de pança cheia, encontrou o macaco:

 - Cadê sua mãe?

 O macaco encheu os olhos de cuspe, botou a mão no peito, fez careta e começou a berrar:

Ai de mim, ai de mim
Minha pobre mãe morreu
Minha mãe era um quindim
Veio uma onça e comeu

 O macaco gritava, chorava e ria.

 A onça ficou com raiva, pois não tinha comido nem a mãe do macaco nem, muito menos, o macaco.

 Tempos depois, a malvada teve outra idéia.

 - Agora eu cato o danado!

 Ficou escondida bem no caminho que o macaco pegava todos os dias.

 No fim da tarde, o macaco apareceu.

 Sentiu um cheirinho estranho no ar.

 "Aqui tem onça", pensou ele.

 Para ter certeza, parou, olhou bem para o chão e gritou:

Caminho, cadê você
Caminho, quero passar
Caminho, se não responde
Vou já pra outro lugar

 O caminho, claro, continuou quieto, parado no chão.

 O macaco sacudiu os ombros, deu meia-volta e fingiu que ia embora.

 Ao ver o macaco escapar mais uma vez, a onça disfarçou e fez voz de estrada:

 - Uh! mucucu. Num vui imbura num. Pudi pussur qui iu istu uqui.

 Ao ouvir aquela voz fingida, o macaco caiu na gargalhada:

Cai fora, onça, cai fora
Cai fora, não vem com essa
Cai fora que eu vou-me embora
Cai fora, que eu estou com
 pressa!

 Disse isso, saltou num galho e sumiu rindo e dançando no meio das folhagens.

 A onça ficou tiririca. Arreganhou os dentes e resmungou baixinho:

 - Um dia eu te pego, pelintra!

 Passou o tempo. A onça teve outra idéia. Subiu no alto de uma pedra e chamou a bicharada. Disse:

 - Descobri que tem uma santa morando na floresta. Vamos fazer um altar pra botar a santa.

 Mandou a bicharada juntar madeira e construir um altar. Explicou que no dia seguinte a santa ia aparecer.

 A bicharada tinha medo da onça, por isso achou melhor obedecer.

 A onça disse mais:

 - Amanhã, todo mundo aqui. Se a santa estiver no altar quero ver a bicharada cantando, dançando e tocando pandeiro.

No outro dia, logo cedo, a onça se enrolou num pedaço de linho branco, subiu no altar e ficou lá se fingindo de santa.

 A bicharada, quando chegou, ficou espantada:

 - Não é que apareceu uma santa mesmo? - disse a anta.

 - Milagre! - gritou o papagaio.

 - Eta coisa danada de boa! - disseram todos.

 E a bicharada, feliz da vida, ficou cantando, dançando e tocando pandeiro em volta do altar.

 A onça parada lá no alto só espiava. O macaco escutou aquela folia e resolveu ver o que estava acontecendo.

 A onça sabia que o macaco era curioso. Sua idéia era agarrar o bicho quando este se aproximasse do altar.

 Mas o macaco era esperto. Olhou para a santa. Olhou de novo. Olhou outra vez e logo desconfiou. Só de pirraça, saltou da árvore no chão e começou a rezar, a dançar e a cantar:

Me salva, santa, me salva
Que a onça quer me pegar
Me ajuda, santa, me ajuda
Que a onça vai me matar

 E o macaco foi dançando e foi chegando perto. De repente, de surpresa, catou uma pedra no chão e atirou bem na cara da onça:

Sai daí, santa malvada
Sai desse pano de linho
Vai embora, onça pintada
Vai embora do meu caminho

 Rosnando furiosa, com a fuça machucada, a onça saltou do altar mas não pegou coisa nenhuma. O macaco, ligeiro feito um corisco, sumiu no matagal cantando:

Um bicho quer me prender
Mas não vai
Um bicho quer me caçar
Mas não vai
Um bicho quer me comer
Mas não vai
Um bicho quer me matar
Mas não vai

Fonte:
Azevedo, Ricardo. Histórias que o povo conta : textos de tradição popular. São Paulo : Ática, 2002. - (Coleção literatura em minha casa ; v.5)

Roberto Pinheiro Acruche (Livro de Poemas)


A SAUDADE

Saudade... Qual é a sua cor?
Por que estou sentindo-a
tão junto a mim e não consigo vê-la?
Não me atormente ainda mais
com este silêncio,
além desta dor que me rasga o peito.

Porque você não aparece
e desvenda logo esse mistério?
Você sabe onde me encontrar!

Vou estar nos mesmos lugares,
sentado na areia olhando o mar
ou nos mesmos bares
consumindo a noite.

E se acaso não me encontrares
pergunte pra solidão...
Somente ela saberá dizer
o meu paradeiro.
Mas não demore mais;
faça antes da tristeza
me levar por inteiro!...

ARCA DOS SONHOS

As horas passam
e eu me curvo diante
do tempo
que também passa... Que passa!...
E eu preso na arca dos sonhos,
fantasiando a vida.
Quando acordar
desta aspiração
liberto do devaneio,
quem sabe ainda haverá tempo
para realizar os sonhos?
E se não houver tempo
e se não realizar meus sonhos,
valeu à pena ter sonhado!

AUSÊNCIA

A tua ausência transforma a noite em um suplício,
faz a formosura da lua desaparecer no infinito
e as estrelas no céu perderem o brilho.

A solidão minha constante companheira
cresce no silêncio que constrói um assombroso vazio,
enquanto as canções evolucionam a saudade.

E não há como se esquecer do passado
quando a caminhada era ornamentada
pela beleza das flores e perfumada em todos os momentos...
Mesmo quando a natureza disseminava as tempestades, com chuvas, trovões e ventos.

A brisa tinha a fragrância dos lírios
e os teus suspiros eram o meu alento.

A tua ausência, sentida nesse momento,
quando o pensamento
é todo reservado a ti,
faz explodir no peito a angústia
dessa solidão que abruma
ainda mais, essa noite triste e vazia.

QUANDO

Quando as gotas d’água
romperem as pedras dos meus caminhos,
cicatrizarem no meu peito as feridas
provocadas pelos espinhos
da desilusão...
Quando o tempo
arrancar do meu coração
as seqüelas da falsidade
e a perfídia for tragada
pela fidelidade...
Quem sabe,
encontrarei razão para viver
e os meus versos
falarão de um outro amor?

Fonte:
Poemas enviados pelo autor

Rubem Braga (Meu ideal seria escrever...)


        Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cinzenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse - ôai meu Deus, que história mais engraçada!" E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida  de moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria - "mas essa história é mesmo  muito engraçada!"

        Que um casal que estivesse em casa mal-humorado, o marido bastante aborrecido com a mulher, a mulher bastante irritada com o marido, que esse casal também fosse  atingido  pela  minha  história.  O marido a leria e começaria a  rir, o que aumentaria a irritação da mulher.  Mas depois que esta, apesar de  sua má-vontade, tomasse conhecimento da história, ela também risse muito, e ficassem os dois rindo sem poder olhar um  para o outro sem rir mais; e que um, ouvindo aquele riso do outro, se lembrasse do alegre tempo de namoro, e reencontrassem os dois a alegria perdida de estarem juntos.

        Que nas cadeias, nos hospitais, em todas as salas de espera a minha história chegasse - e tão fascinante de graça,  tão  irresistível, tão colorida e tão pura que todos limpassem seu coração com lágrimas  de  alegria;  que o  comissário do distrito, depois de ler minha história, mandasse soltar aqueles  bêbados e também aquelas pobres mulheres colhidas na calçada e lhes  dissesse - "por favor, se comportem, que diabo! eu não gosto de prender ninguém!"

E que assim todos tratassem melhor seus empregados, seus  dependentes  e seus semelhantes em alegre e espontânea homenagem à minha história.

        E que ela aos poucos se espalhasse pelo mundo e fosse contada de mil  maneiras, e fosse atribuída a um persa, na Nigéria, a um australiano, em Dublin, a um japonês, em Chicago - mas que em todas as línguas ela guardasse a sua  frescura, a sua pureza, o seu encanto surpreendente; e que no fundo de uma aldeia da China, um chinês muito pobre, muito sábio e muito velho dissesse:  "Nunca  ouvi  uma  história assim tão engraçada e tão boa em toda a minha vida;  valeu a pena ter vivido até hoje para ouvi-la; essa história não pode ter sido  inventada por nenhum homem, foi com certeza algum anjo tagarela que a contou aos ouvidos de um santo que dormia, e que ele pensou que já estivesse morto; sim, deve ser uma história do céu que se filtrou por acaso até nosso conhecimento; é divina".

        E quando todos me perguntassem - "mas de onde é que você tirou essa história?" - eu responderia que ela não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: "Ontem ouvi um sujeito contar uma história.. .”

        E eu esconderia completamente a humilde verdade: que eu inventei toda a minha história em um só segundo, quando pensei na tristeza daquela moça que está doente, que sempre está doente e sempre está de luto e sozinha naquela pequena casa cinzenta de meu bairro.

Fonte:
Para gostar de ler. Vol. 3. SP: Ed. Ática, 1978.

Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Entre Amigos)


Abraço
ANTONIO MANOEL ABREU SARDENBERG
São Fidélis/RJ - "Cidade Poema"

Chegou como aragem mansa
Em manhã de primavera
Era a mais doce quimera
A mais intensa esperança
A desejada bonança
Que um homem quer e espera!

No rosto abria um sorriso,
Um semblante angelical
Um mundo pleno e total
Era o próprio paraíso
Nunca senti nada igual!

Nos seus olhos cor de mel
Trazia a luz que irradia
Lindo toque de magia
O mundo de esplendor
Que eu sempre quis um dia

Seus braços aconchegantes
Era um buquê de carinho
O afago de um ninho
A ternura de amante
O perfume do jasmim
Emoção mais fascinante
Que senti dentro de mim.

E assim, bem de mansinho,
Nossos braços se enroscaram.
E ficamos bem juntinhos
Atados como num laço...
Então eu pude sentir
Minha razão de existir
Nesse terno e doce abraço.

Serenata
ROSEMARY PETERS/PR

Permita que eu feche
os meus olhos,
pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora,
e cantando pus-me a esperar-te

Permite que agora emudeça:
que me conforme em ser sozinha.
Há uma doce luz no silencio,
e a dor é de origem divina.

Permite que eu volte o meu rosto
para um céu maior que este mundo,
e aprenda a ser dócil no sonho como
as estrelas no seu rumo ...

Confissões de amor...!
CIDUCHA/SP

Tu és o meu amor!
Que navega meu mar
purificado de lua,
tão certo como o vento
que vem e passa,
sedento de horizonte...

Tu és o meu amor,
que se enquadra no limite certo,
da minha ternura e bem querer...
Um encantado,
que haverá de colher
a flor primeira da madrugada
raio de luz a colorir meu dia!

Tu és o meu amor!
Um iluminado,
que banirá a sombra
do meu olhar ferido,
acalentará meu desamparo,
na saga do sonho bandido,
e serás sempre...
Sempre...
Sempre...
O meu Amor querido!

Cântaro da Dor
ZENA MACIEL/PE

Aos pés da deusa poesia
rasgo o véu das fantasias
Derramo o cântaro da dor
no amargo cálice da saudade.

Nas folhas virgens de ilusão
escrevo versos de solidão
Deito no colo das letras
rimas molhadas de lágrimas.

Com as carícias das palavras
afago o solitário coração
que sofre por não entender
o jogo obsceno da vida.

Visto as anáguas do tempo
para ver o entardecer dos
pensamentos, que choram,
diante do funeral dos sonhos

Alma Viva
ILKA VIEIRA/RJ

Quero da vida o encontro com a magia da arte
Colher dela a sabedoria insigne do silêncio
Sair ilibada em passeio poético por toda parte
Soprando pétalas do meu coração "florêncio"

Quero da vida vagar lúcida, sentindo-me louca
Chamando quem não conheço à luz da natureza
Na troca de prosa sem pressa ou de pressa pouca
Compartilhar a ópera silvestre em sua grandeza

Quero da vida envelhecer jovem sem esmolar cuidados
Repintar sonho desfeito, rir de sonho errante
Descalçar meus pés e deixá-los seguir descasados
Na brincadeira entre passado e impulsos doravante

Quero da vida rejuvenescer velha à brisa do mar
Tornar-me onda, passarada, barco à deriva...
Poeta triste, morto e ressuscitado para amar...
Ilha habitada, corpo aquecido, Alma Viva !o!

Fonte:
Poemas enviados por A. M. A. Sardenberg

Esopo (Fábula 8: O Javali e o Burro)


Um dia, um burro encontrou um javali e, como estava alegre e bem disposto, zurrou e cabriolou em frente deste. "Como estás, meu amigo, como estás?", zombou o burro.

O javali ficou aborrecido com estas familiaridades e eriçou o pêlo, arreganhando os dentes.

"Ora esta, amigo! Que impertinência!".

Estava para se atirar ao burro quando, controlando-se, disse: "Vai-te embora, estúpida criatura! Não me custava nada vingar-me de ti, mas não vale a pena sujar as minhas presas com um burro tão tolo!"

Moral da história

É indigno dum espírito elevado argumentar com gente sem nível nem coragem.

Fonte:
Fábulas de Esopo. Coleção Recontar. Ed. Escala, 2004.

terça-feira, 1 de maio de 2012

A. A. de Assis (Estados do Brasil em Trovas) Pará

Wagner Marques Lopes / MG ( A FAMÍLIA em trovas), parte 7

Pintura de Jose Ferraz de Almeida Junior

Família e novos caminhos

Se o mundo se desatina
em ações torpes, malvadas,
a família mais se inclina
a propor outras estradas.

Família e seu eterno lema

Família – mil teoremas
para explicar seu porvir.
Ela traz eterno lema:
“amar para progredir”.

Lições de pai

No coração e retina
guarda o filho bons roteiros,
sabendo que o pai lhe ensina
com os exemplos verdadeiros.

O sim e o não em família

Família que se desdobra
nas artes da educação,
torna-se sábia de sobra
para dizer “sim” ou “não”.

Fonte:
trovas enviadas pelo autor

J. G. de Araujo Jorge (Arco-Íris)


Hoje
estou chovendo
Mas não é o meu pranto
que molha meus olhos.

É uma doce paz, intocada
e feliz
e me deito na chuva, olhos abertos,
como menino que fui,
leve e puro,
tão longe.

Hoje
estou chovendo,
e a visão
de tua lembrança, como um raio de sol
lança uma serpentina de arco-íres
no coração.

Fonte:
J G de Araujo Jorge. "O Poder da Flor" . 1a ed.1969.

A. A. de Assis (Revista Virtual Trovia n. 149 - maio de 2012)


Inesquecíveis

Depois que, mãe, tu partiste,
como uma santa em seu véu,
o céu que eu via tão longe
ficou mais perto, e mais céu...
Adelmar Tavares

A mesa, agora, deserta,
no bule, o café já frio...
E pela porta entreaberta
a dor de um grande vazio!
Francisco Macedo

Surpreendente maravilha
a que agora me acontece:
minha mãe é minha filha
na medida em que envelhece!
Jesy Barbosa

Minha mãe verteu mais pranto
que a Mãe de Nosso Senhor...
A Virgem chorou um Santo,
minha mãe – um pecador.
José Maria M. de Araújo

A mulher sempre é mais pura,
mais bonita e mais completa,
quando a ponho na moldura
dos meus olhos de poeta.
Orlando Brito

Esta carta te escrevi
com sangue de minhas veias...
Espero, ao menos, de ti,
que com lágrimas a leias!
Oscar Soares

"O mundo em que vivemos tem necessidade de beleza para
não cair no desespero.” – Paulo VI, in Mensagem aos artistas


Brincantes

Trabalho só é bacana
se tiver, por sua vez,
uma folga por semana
e férias de mês em mês!
Ademar Macedo – RN

Aprendo com meu enólogo:
rascante só na sangria.
Se o verso não vem análogo,
quebro a jarra em que jazia...
Antonio Cabral Filho – RJ

Buraco de fechadura,
na minha infância inocente,
era a perfeita moldura
das belas primas da gente!
Héron Patrício – SP

Eta mulher jogo duro!
Por mais que eu implore e tente,
não me garante o futuro...
só quer saber de... presente.
João Costa – RJ

Em lendas da humanidade,
a maçã tem sua vez:
Com Newton e a... gravidade,
e com Eva e a... gravidez!
José Fabiano- MG

Segredo é um substantivo
oculto e mais que perfeito
que eleva ao superlativo
predicados do sujeito!
José Ouverney – SP

Quando ocorre um descaminho,
é normal que se suponha:
– ou foi falta de carinho...
ou carência de vergonha!
Osvaldo Reis – PR

Tentando aparentar trinta,
o cinquentão se “ferrou”.
Comprou um estoque de tinta,
mas… o cabelo acabou.
Wandira F. Queiroz – PR

Líricas e filosóficas

É mais que um beijo, é uma prece,
aquele beijo miudinho
com que a mãe afaga e aquece
os seus filhotes no ninho!
A. A. de Assis – PR

Pela ambição do poder,
até guerra o homem faz.
Traz a morte, por não ver
que o poder está na paz!
Adélia Woellner – PR

Namorando a natureza,
como quando era menino,
sigo a trilha na certeza
de encontrar novo destino.
Agostinho Rodrigues – RJ

Se o medo é um adversário
de um sono bom, rotineiro,
a fé, amigo, ao contrário,
é sempre um bom travesseiro.
Amilton Monteiro – SP

Num cantinho iluminado
pela luz da solidão,
um coração desprezado
espera outro coração.
Antonio Juraci Siqueira – PA

Desvelo é aquele cuidado
com que o poeta, a seu jeito,
passa uma noite acordado
buscando um verso perfeito.
Arlindo Tadeu Hagen – MG

Doce trova, companheira:
criatura e criação,
chega de toda maneira
e aporta em meu coração!
Carmen Pio – RS

Com poemas, sons ou telas
e inspiração desmedida,
o artista torna mais belas
as belas coisas da vida!
Carolina Ramos – SP

Mãe viva, mãe que partiu...
todas merecem louvores;
seu amor sempre floriu
na rima dos trovadores.
Conceição de Assis – MG

Quando a tristeza maltrata
minhas horas de abandono,
bebo o luar cor de prata
e me embriago no sono!
Delcy Canalles – RS

Farol aceso no monte
faz da noite quase dia.
Espalha luz no horizonte,
servindo aos nautas de guia.
Diamantino Ferreira – RJ

Partes, levando a metade
da metade que eu já sou,
deixando inteira a saudade
na metade que restou...
Divenei Boseli – SP

Meu barco segue à deriva,
no rumo do inconsciente;
navego na expectativa
de me encontrar novamente.
Djalma Mota – RN

Persuasiva e eloquente,
saudade fala de afeto
com sete letras, somente,
que valem todo o alfabeto.
Dorothy J. Moretti – SP

A chuva cai... bate mansa...
molha as ruas da cidade...
lava tudo... só não cansa
de regar minha saudade!
Eduardo A. O. Toledo – MG

A prudência é uma balança
que equilibra a nossa vida
ao dosar, com temperança,
a tentação desmedida.
Eliana Jimenez – SC

Vivo em constante conflito,
entre o delírio e a razão:
– meu sonho alcança o infinito...
meus pés... tropeçam no chão.
Elisabeth Souza Cruz – RJ

Em cada beijo roubado,
que roubo de ti, meu bem,
sinto o gosto do pecado
que o beijo roubado tem!
Francisco Garcia – RN

Para abrandar desatinos
e a violência dos marmanjos,
Deus põe em nossos meninos
a inocência dos seus anjos!
Gabriel Bicalho – MG

Nossa solidão a dois,
é tão grande, tão sem fim,
que eu sinto o nosso depois
bem antes morrer em mim...
Gislaine Canales – SC

Sou da poesia um projeto,
mas alguns versos componho,
e neles gravo, discreto,
tudo o que sinto e o que sonho.
Humberto Del Maestro – ES

As lembranças de nós dois
fui guardando nas caixinhas...
para descobrir, depois,
que em verdade...eram só minhas!
Istela Marina – PR

Ausência do bem, o mal
só traz sofrimento a quem
não conhece o especial
prazer que é se querer bem!
Jeanette De Cnop –PR

Contemplando a natureza,
pergunto-me ao refletir:
Como, insano, tal beleza
pode o homem destruir?
Jessé Nascimento – RJ

Relembrando a mocidade
te vejo a cada momento,
no feitiço da saudade
que adorna o meu pensamento.
Joamir Medeiros – RN

O rio, da fonte ao mar,
rega a vida em seu redor.
Cuidar dele é, pois, tornar
mais belo o mundo, e melhor.
Jorge Fregadolli – PR

Tantos passos caminhei
por labirintos incertos.
Hoje nas trovas achei
como vencer os desertos.
José Feldman – PR

Deus sabe, mas não diz onde
se encontra a chave perdida
do mistério que se esconde
no lado oposto da vida.
José Lucas de Barros – RN

Partiu, deixando o seu traço
no meu caminho dos sós…
– A saudade é esse espaço
que existe sempre entre nós.
José Valdez – SP

Ao digitar trovas, use inicial maiúscula somente no primeiro verso.
Nos demais versos, só se for nome próprio ou início de frase.


Tudo é possível no sonho,
bem longe da realidade.
É a ele que me transponho
para matar a saudade.
Mª Lúcia Fernandes – RJ

Fito o espelho... e o que constato?
Rugas... tristezas... enfim,
o verdadeiro retrato
do que a vida fez de mim!
Mª Madalena Ferreira – RJ

Se te alegra eu ser culpada
por um mal que nem conheço,
aceito a culpa, calada,
e finjo até que mereço.
Maria Nascimento – RJ

O amor é sorriso... ou pranto.
O amor é nuvem... ou sol.
O amor é lágrima... ou canto.
O amor é treva... ou farol.
Mª Thereza Cavalheiro – SP

Fui ao encontro marcado
num tempo que já passou...
Sei que é parte do passado,
marcado no que hoje sou...
Mário Zamataro – PR

Tenho por certo, em verdade,
bem vivo, embora pungente,
que a mais pungente saudade
é aquela de alguém presente!
Maurício Friedrich – PR

Tempo de mãozinha dada,
eles dizem que passou,
mas isso não me diz nada,
pensa assim quem nunca amou.
Messody Benoliel – RJ

A maior sabedoria
de quem sabe o seu saber
é saber que a cada dia
sempre tem o que aprender.
Nei Garcez – PR

Livros não mudam o mundo. Quem muda o mundo são as
pessoas. Os livros só mudam as pessoas. – Mário Quintana


A utopia, em minha mente,
traduz-se desta maneira:
– um lugar inexistente
que existirá, caso queira!...
Newton Vieira – MG

Tudo agora é tão comum,
nada dói na consciência...
Mas não há motivo algum
que justifique a violência.
Olga Agulhon – PR

Ao mesmo tempo em que mata,
mata e faz viver também...
Saudade é dor que maltrata,
maltrata fazendo bem!
Pedro Emílio – RJ

Dou-te atenção e carinho,
tu me dás indiferença,
pois, mesmo estando pertinho,
me negas tua presença.
Renato Alves – RJ

A poesia é pura imagem
vestida em traje de gala;
metafísica linguagem
através da qual Deus fala!
Roza de Oliveira – PR

Entre todos os recantos
é aqui que me sinto bem:
– o meu lar tem tais encantos
que outros lugares não têm!
Sônia Martelo – PR

No lar do pobre, indefeso,
relegado em agonia,
esperança é o fogo aceso
na panela ao fim do dia!
Selma Patti Spinelli – SP

Prestigiar quem muito faz pela trova
é também um modo de trabalhar pela trova.


No aceno discreto e mudo
que entre lágrimas fizeste,
teus olhos disseram tudo
do amor que nunca disseste.
Thalma Tavares – SP

Já que o amor rejuvenesce,
por que viver de saudade?
Coração não envelhece
e sonho... não tem idade!
Terezinha D. Brisolla – SP

Na minha busca amorosa,
não invejo amor alheio,
pois mesmo a vida ditosa
tem seus espinhos no meio.
Vanda Alves – PR

Revezam-se em nossas rotas
sombra e luz, contras e prós,
e as vitórias e derrotas
começam dentro de nós...
Vanda Fagundes Queiroz – PR

Causador da minha insônia,
motivo do meu sorriso,
sem nenhuma cerimônia...
me transporta ao paraíso!
Vânia Ennes – PR

Em que pese o dissabor
na turbulência da lida,
existe a fonte do amor
agraciando nossa vida.
Vidal Idony Stockler – PR

O mundo tem seus deleites,
mas este a muitos supera:
é bom demais dar aceite
na amizade bem sincera.
Wagner Lopes – MG

Partiste... e o meu desencanto
vendo ruir a ilusão,
escorre em gotas de pranto,
orvalhando a solidão.
Wanda Mourthé – MG
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Olga Agulhon (O Presente do Vovô)


Eu era a caçula de seis irmãos e morávamos na fazenda que meu pai possuía, perto da cidade.

Estudávamos na escolinha que havia na cabeceira da fazenda, perto da qual também existiam uma pequena mercearia e a igrejinha. Ali eram feitas grandes quermesses e vinha gente de toda a vizinhança, o que realmente lotava o lugar, pois em nenhuma das fazendas de café havia menos que cinco famílias.

Como eram gostosas aquelas festas! A de São João era um estouro. Tinha a reza do terço, hasteamento das figuras dos santos nos mastros, queima de fogos, quadrilha, comidas típicas, fogueira e outros folguedos. À meia-noite, várias pessoas passavam descalças sobre as brasas da fogueira. Lembro-me de que, desde muito pequena, brigava contra o sono para estar acordada nesse momento. Pensava que um dia também teria a coragem e a fé, que, segundo os praticantes, eram os únicos segredos para não queimar os pés.

O Natal, então, era pura alegria. Ficávamos sempre encantados com o presépio da igreja e emocionados com o momento que representava o nascimento de Jesus, quando uma criança da comunidade, vestida de anjo, entrava na gruta para colocar o menino Jesus na manjedoura. Todos batiam palmas com intensidade, muitos deixavam rolar algumas lágrimas e alguns, dentre eles minha mãe, choravam mesmo.

Quando voltávamos para casa, o Papai Noel já havia deixado o presente ao lado do sapatinho posto na janela.

Meu avô Antônio cantava e tocava sanfona em todas essas festas. Todos gostavam dele e, muitas vezes, convidavam-no para contar causos, como diziam os colonos.

As pessoas reuniam-se no terreirão da fazenda, sob a luz das estrelas e do lampião de gás, para ouvi-lo contar suas histórias, que faziam pequena a noite, trazendo mais rápido o raiar dos dias de domingo.

Quando minha avó morreu, vô Antônio tornou-se amargo e triste. Já não brincava conosco, nem cantava, nem tocava, nem contava histórias.

As festas, sem a sua presença, não tinham mais a mesma alegria, e as noites tornaram-se mais longas. Talvez quisesse que todos sentissem, tal como ele, a falta da vovó. Achavam falta dele e lembravam do motivo de sua ausência e de sua tristeza. Conseqüentemente, recordavam da vó Ana. Era assim que eu pensava, ou penso agora, não sei.

Vovô realmente não se conformava com a morte da companheira de mais de cinqüenta anos. Dizia não poder imaginar o que teria feito para que ela partisse sem ele.

Prometeu, então, que esperaria por ela em silêncio, para poder ouvir quando ela o chamasse.

Disse-me, um dia, que só tocaria novamente a sua sanfona quando vovó viesse buscá-lo. Tocaria e cantaria para ela e para se despedir de nós e deste mundo.

As pessoas, inclusive meus pais, achavam que vovô havia ficado louco, ou melhor, que ele já estava caduco, gagá. Diziam que ele, de tanto inventar histórias, chegara ao ponto de inventar uma na qual realmente acreditava.

Eu não entendia, porque todos os que diziam essas coisas também sempre disseram que vovô era um homem honesto, honrado e que sua palavra valia tanto quanto uma nota promissória. Então, vovô não mentia e, portanto, eu acreditei nele.

O certo é que se passaram mais de três anos e vovô permanecia quase sem conversar, sentado na varanda, em sua cadeira de balanço, com a sanfona ao lado.

Naquela noite, véspera de Natal, estávamos todos reunidos na varanda, clara pelo brilho da lua cheia, passando o tempo com conversa fiada até que chegasse a hora de dormir e o Papai Noel pudesse entrar sem ser visto.

Quando o sono já se aproximava, notei que vovô sorria, olhando longe, lá fora, para o carreador.

De repente, pegou a sanfona e começou a tocar e cantar baixinho, com a voz sem treino, rouca e cansada.

Assim que terminou a canção, fechou os olhos; e permaneceu ali, com a sanfona sobre o colo e um sorriso no rosto, segundo a minha lembrança de menina.

Meus pais choraram muito, mas eu não consegui encontrar motivo para ficar triste; só achei que ele tinha recebido o seu presente antes da hora.

Ninguém viu vovó vir buscá-lo, como ele dizia que aconteceria, mas acreditei ter sentido a sua presença. Então me explicaram que isso era coisa de crianças pequenas, que do mesmo modo que os vovozinhos, já gagás, confundiam suas histórias e seus sonhos, confundiam a realidade e a fantasia; e acreditavam em Papai Noel.

Novamente não entendi, porque aquilo que senti, sabia ter sentido.

Ao amanhecer, o presente do Papai Noel estava lá, ao lado do sapatinho posto na janela.

Fonte:
Academia de Letras de Maringá

Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Cidade de Santos)


Dedico esse poema a todos os Santistas, em especial aos amigos e amigas poetas que nos receberam (Eu, Hildebrando e Ivanet) no Espetinho do Floriano

Oh! Santos de tantas santas,
Santos de belas meninas,
Santos de lindos olhares,
De barcos singrando os mares
E alegres bares nas esquinas.

Oh! Santos de lindos jardins
Adornando as enseadas,
Seu perfume é de jasmim,
Sua beleza é sem fim,
Deixa a vida apaixonada!

Santos da balsa que traz
Alguém que se espera tanto
Santos de luz e de paz
Santos de tantos encantos!

Santos de grandes poetas
Que bordam versos brilhantes,
Santos de grandes atletas,
Santos de Reis e profetas,
Santos de ternas amantes.

Fonte:
Poema enviado pelo autor