terça-feira, 14 de setembro de 2021

Adega de Versos 45: Gilson Faustino Maia


 Curiosidade: Como surgiu a expressão "Cabra da peste"

    Existe mais de uma versão para a origem da expressão, que até hoje possui duplo sentido. "Em geral, é usada para designar o sujeito destemido, mas também pode ser dita em tom de ofensa, quando a valentia vira prepotência", diz o linguista Flávio de Giorgio, da PUC-SP.

No Dicionário do Folclore Brasileiro, o folclorista Luiz da Câmara Cascudo afirma que "cabra" era como os navegadores portugueses chamavam os índios que "ruminavam o bétel", uma planta com folhas de mascar.

Com o passar do tempo, o bicho pode ter virado sinônimo de homem forte por causa de seu leite, considerado mais denso e nutritivo que o da vaca. Tudo indica que a associação com "peste" surgiu por causa da má fama da cabra, considerada um animal simpático ao diabo na tradição sertaneja. Vale lembrar que os nordestinos também usam a palavra "peste" para nomear doenças graves.

Assim, o "cabra da peste" seria o sertanejo que sobreviveu superando todos os sofrimentos, "da dentição difícil, do sarampo certo, da caxumba, da desidratação inevitável, da catapora, da coqueluche, da maleita e do amarelão, e de tudo mais que atormenta a vida de um cristão nascido no Nordeste", como sugere o folclorista Mário Souto Maior no livro Como Nasce um Cabra da Peste.

"Por tudo isso, a expressão completa só deve ter surgido por volta do século 17", afirma Flávio. Mas alguns especialistas defendem outra hipótese.

A expressão seria uma variação de "cabra-de-peia", também usada para indicar a valentia do nordestino, que apanhava sem reclamar. "Depois de açoitada com a peia (chicote), a vítima era obrigada a beijar o açoite na mão do seu algoz", diz o etimologista Deonísio da Silva, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR).

Fonte da Imagem e da explicação: Blog do Arretadinho (Joaquim Dantas)

Sammis Reachers (Ei, você, me dá esse dinheiro aí)

A dupla da linha 49-2 (Fonseca x Icaraí circular) Antônio Marcone e Gilberto "Infernal", circulando num moderno veículo 'piso baixo', automático, avançava tranquilamente pela praia de Icaraí, em Niterói.

Ao aproximarem-se daquele que é o segundo ponto da praia, o motorista Marcone, homem tranquilo e boa praça, percebeu algo inusitado. Um indivíduo, notando de relance a  aproximação do ônibus, tirou sua mão do bolso da calça para fazer sinal. Ao arrancar bruscamente a mão, uma nota saiu desapercebidamente de seu bolso e caiu ao chão. Marconi comentou o fato com o 'cobra' Gilberto, apenas a título de curiosidade.

Pois bem: ao parar a viatura e abrir a porta para o embarque do cidadão, por sinal o único passageiro do ponto, Marcone fez menção de avisar ao mesmo sobre a nota. Mas, quando ia abrir a boca, Gilberto (que estava em sua roleta bem ao lado da porta dianteira, como é comum nesses veículos 'piso baixo') se antecipou e disse para o cidadão, com a maior das caras de pau:

- Por favor cidadão, você pode pegar aquela nota ali pra mim?

O coitado do indivíduo, pego de surpresa, simplesmente apanhou a sua própria nota que caíra e entregou de mão beijada a Gilberto...

Detalhe: eram míseros dois reais...

Fonte:
Ron Letta (Sammis Reachers). Rodorisos: histórias hilariantes do dia-a-dia dos Rodoviários.
São Gonçalo: Ed. do Autor, 2021.
Livro enviado pelo autor.

Concurso de Trovas da ATRN e UBT Seção Natal/RN (Trovas Premiadas)

ATRN – Academia de Trovadores do Rio Grande do Norte
UBT – União Brasileira de Trovadores


NACIONAL/INTERNACIONAL
VETERANOS

Tema: Tapera (l/f)

1º Lugar
De uma tapera caindo,
chega uma voz aos pedaços.
Canta o milagre mais lindo,
a mãe e o filho nos braços.
Albano Bracht
Toledo/PR

2º Lugar

Do que restou da tapera
sinto pesar nos meus ombros;
e a esperança ainda espera
soterrada nos escombros!
Edmar Japiassu Maia
Miguel Pereira/RJ

3º Lugar

Vai-se no tempo a quimera...
e a juntar reminiscências,
a saudade é uma tapera
habitada só de ausências!
Antônio de Oliveira
Rio Claro/SP

4º Lugar

Uma tapera, um roçado,
a rede, a viola, um cão...
e um caboclo apaixonado
num retrato do sertão...
Cipriano Ferreira Gomes
São Paulo/SP

5º Lugar

Mil prédios pela cidade
e em nenhum, porém, impera
a régia hospitalidade
que há numa humilde tapera!...
Cléber Roberto de Oliveira
São João de Meriti/RJ

6º Lugar

Minha tapera, a viola
e essa morena querida,
é tudo que mais consola
um seresteiro, na vida.
Márcia Jaber
Juiz de Fora/MG

7º Lugar

A tapera em pé resiste,
se é um reino de amor e paz.
Mas é uma ruína triste,
se é de um lar que se desfaz!
Jaime Pina da Silveira
São Paulo/SP

8º Lugar

Pelo sertão resplandece,
o predomínio, absoluto,
do intenso amor que enriquece,
a tapera de um matuto!...
Ailto Rodrigues
Nova Friburgo/RJ

9º Lugar

Na meninez, quando eu lia,
tudo ficava mais belo;
e a tapera em que eu vivia
transformava-se em castelo.
Edweine Loureiro da Silva
Saitama/Japão

10º Lugar

Não fosse a seca-megera
matar meus sonhos, meu gado,
o meu rancho - hoje tapera -
não seria abandonado!
Maria Madalena Ferreira  
Magé/RJ

11º Lugar

Se é palácio, se é tapera...
Afinal, importa o quê?
Que haja alguém à minha espera
e esse alguém seja você!
José Ouverney
Pindamonhangaba/SP

12º Lugar

Nessa tapera sem teto,
que de barro... eu mesmo fiz,
vivi recebendo afeto,
na pobreza, mas feliz!
Mário Moura Marinho
Sorriso/MT

13º Lugar

Para o espanto dos ateus
numa tapera sem glória,
nasceu um Menino-Deus
para dividir a história!
Luiz Antônio Cardoso
Taubaté/SP

14º Lugar

A riqueza genuína
da tapera ou da mansão
vem do amor que predomina,
não se mede com cifrão.
Jerson Lima de Brito
Porto Velho/RO

15º Lugar

Dos castelos de quimera
que eu, em livros, tanto vi,
nenhum, ah, nenhum, supera
a tapera onde eu nasci!...
José Manuel Veloso Galvão
São Paulo/SP

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NACIONAL/INTERNACIONAL
NOVO/A  TROVADOR/A

Tema: Tapera (l/f)


1º Lugar
A vida toda estivera
procurando a tal Ventura.
Foi numa humilde tapera
que encerrei minha procura.
Fernando Antônio Belino
Sete Lagoas/MG

2º Lugar

Tapera linda e singela,
obra-prima do pintor.
A saudade em aquarela,
com cena do interior.
Ademarcos Santana
Nossa Senhora Aparecida/SE

3º Lugar

Eu quero a serenidade
de uma tapera escondida...
Entre as heras da saudade,
lembranças de minha vida!
Maurício Moura Maranhão da Fonte Filho
Recife/PE

4º Lugar

A tapera mais simplória,
mas cheia de puro amor,
contém a infinita glória
de um palácio em esplendor!
Vera T. Rolim Chyczy
Curitiba/PR

5º Lugar

Naquela humilde tapera
tem um tesouro guardado:
um lar, onde a paz impera
na família lado a lado.
Maria Aparecida Ferreira Lima
Campinas/SP

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NACIONAL / INTERNACIONAL
VETERANOS/AS

Tema: Espanto (Humor)


1º Lugar
Zé corre à maternidade...
- Que espanto!  A cegonha o logra!
Sua filha, na verdade,
era uma cópia da sogra!!!
Carolina Ramos
Santos/SP

2º Lugar

Vendo o filho no hospital
se espanta o corno freguês:
"Agora é internacional,
tem cara de japonês."
Olympio da Cruz Simões Coutinho
Belo Horizonte/MG


3º Lugar

Vendo o velho centenário,
seu espanto sobressai:
- Vive o senhor solitário?
- Não, eu moro com meu pai!
Renata Paccola
São Paulo/SP

4º Lugar

- Amor, sou feia?  - Nem tanto;
dá pra amenizar o efeito,
mas... essa cara de espanto...
nenhum cirurgião dá jeito!
José Ouverney
Pindamonhangaba/SP

5º Lugar

Operada a catarata,
outro espanto sobreveio:
passei a ver – coisa chata! –
o quanto estou velho e feio!...
Antonio Augusto De Assis
Maringá/PR

6º Lugar

O caipira se casou,
sua esposa era um frangalho;
lá na roça ela virou
- sem espanto - um espantalho!
Geraldo Trombin
Americana/SP

7º Lugar

Nada mais me causa espanto
e nenhum medo me logra
após ver um pai-de-santo
incorporar minha ex-sogra!...
Maria Madalena Ferreira  
Magé/RJ

8º Lugar

Lembra o baile à fantasia
com raiva e espanto o gaiato:
a sogra usou no outro dia
o batom da Mulher-Gato.
Jerson Lima de Brito
Porto Velho/RO

9º Lugar

Espanto teve a "sogrinha",
assim que abriu a janela...
viu meu sogro, de calcinha,
provando o sutiã dela.
Mário Moura Marinho
Sorriso/MT

10º Lugar

Mistura de raiva e espanto,
a voz da sogra... um castigo!
- Eu me ajeito em qualquer canto,
não se preocupe comigo!
Silvia Maria Svereda
Irati/PR

11º Lugar

Barulho no elevador...
Espanto! O povo assustado...
Mas vem logo um certo odor
e o barulho está explicado...
Antônio de Oliveira
Rio Claro/SP

12º Lugar

Ela era feia, era tanto
que, toda vez que surgia,
tamanho era o meu espanto
que, amedrontado, eu corria.
Julimar Andrade Vieira
Aracaju/SE

13º Lugar

Flagrou a filha, espantada,
e o namorado com ela...
Parecia arquibancada
os vizinhos na janela!
Edmar Japiassu Maia
Miguel Pereira/RJ

14º Lugar

Relaxando a compostura,
provoca espanto em meu filho,
ver vovó sem dentadura,
comendo espiga de milho.
Dulcídio de Barros Moreira Sobrinho
Juiz de Fora/MG

15º Lugar

Na foto ela é puro encanto,
belo rosto, maquiada.  
Ao vivo, tremendo espanto,
toda a pele repuxada.
Jessé Fernandes do Nascimento
Angra dos Reis/RJ

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NACIONAL/INTERNACIONAL
NOVO/A TROVADOR/A

Tema: Espanto (Humor)


1º Lugar
Pensa do morto, o coveiro:
Nem me espanto... Fico alerta!
"Vivo", o morto, mais ligeiro:
Durma e deixe a cova aberta...
Rosângela Caron Bastos
Curitiba/PR

2º Lugar

Minha sogra foi ao poço   
dos desejos e caiu.   
Fiz o maior alvoroço...     
mas, que espanto: ela saiu!
Carla Alves da Silva
Curitiba/PR

3º Lugar

Com a preguiça, eu me espanto,  
que nem sei como contar.  
Começa quando levanto,  
finda, quando eu vou deitar.
José Airton Mellega
Piracicaba/SP

4º Lugar

Há um ano longe de ti,
depois do beijo às escuras,
com espanto percebi
a troca das dentaduras!
Lothar Antenor Bazanella
São Paulo/SP

5º Lugar

Vi moça bonita à frente,
sempre máscara no canto,
esconde a face da gente...
quando tira, causa espanto!
Júlio Augusto Gurgel Alves
Fortaleza/CE

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ESTADUAL

Tema: Andarilho (l/f)


1º Lugar
Sou andarilho do vento,
e a solidão me transporta.
Nas asas do pensamento,
o caminho não me importa.
Marcos Antonio Campos

2º Lugar

Na estrada da vida, assumo!
Meu coração sofredor...
É um andarilho sem rumo,
vagando em busca do amor.
Lucélia Santos

3º Lugar

Sem meus sonhos, perco o brilho
e, à luz da vida apagada,
sou apenas andarilho,
sem ver meus passos na estrada!
Mara Melinni

4º Lugar

Sou andarilho e, sem dores,
contorno os caminhos tortos,
procurando enxergar flores
nas cinzas dos galhos mortos.
Francisco Gabriel

5º Lugar

A trilha de um andarilho
é feita de solidão,
num caminho sem ter brilho,
só bolhas de pés no chão...
Plácido Ferreira do Amaral Júnior

6º Lugar

Pobre andarilho sem nome,
figura desconhecida;
um tangerino da fome
tangendo a fome da vida.
Carlos Alberto

7º Lugar

Sou andarilho dos sonhos
nas terras mais perigosas,
venço os dramas enfadonhos
das jornadas tenebrosas.
Marciano Batista de Medeiros

8º Lugar     

Teus chinelos andarilhos,
cuido, pai, de todos eles!...
Levaste os pés de teus filhos
junto aos teus pés, presos neles!
Professor Garcia

9º Lugar

Andarilho segue errante
carregando solidão,
procurando a todo instante
abrigar seu coração.
Aída Maria de Faria

10º Lugar
Andarilhos somos todos
na travessia terrena...
Ora mediante engodos,
ora consciência plena.
Ieda Lima

11º Lugar

Nessas esquinas do tempo,
todo andarilho conduz,
uma vida em contratempo,
sob o céu que é sua luz.
Rozanni Garcia

12º Lugar

Noite escura traz o brilho
do manto estelar distante,
mostrando ao velho andarilho
o que, de fato, é importante...!
Magnus Kelly

13º Lugar

Vaguei feito um andarilho
a procura do amor certo,
qual um cego, olhar sem brilho,
não via este amor tão perto.
Antônio Fernandes do Rego

14º Lugar    

Todo andarilho carrega
mil angústias, frustrações,
desapegado, se nega,
a viver das ilusões.
Edson de Paiva

15º Lugar

Na longa estrada, da vida,
quantas cenas, envolveu,
o andarilho, em sua lida,
em busca, de um sonho seu...
Fabiano de Cristo M. Wanderley

Trova “hors concours”
No quarto, entre as várias trilhas
do fogo da sedução,
minhas mãos são andarilhas,
mas sabem para onde vão.
Manoel Cavalcante
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ESTADUAL

Tema: Espanto (Humor)


1º Lugar
Num velório, usando um manto,
um fantasma apareceu…
Foi tanto grito de espanto
que até o morto correu.
Francisco Gabriel

2º Lugar

Seu desespero foi tanto,
quando um leão encarou
que, com seu grito de espanto,
o leão quem se borrou.
Aline Ribeiro

3º Lugar

A sogra, tem muita classe,
me espanto, com seu requinte.
Se a minha mulher, deixasse,
eu já teria, umas vinte!
Fabiano de C. M. Wanderley

4º Lugar

Para o meu maior espanto,
hoje eu vi um senador
dando esmola para um santo!
Era um cheque ao portador...
Plácido Ferreira do A. Júnior

5º Lugar

Pelo espanto da galinha,
de ciúme, o galo morrendo,
viu que na ninhada, tinha
um patinho se escondendo.
Professor Garcia

6º Lugar

Supermercado... que espanto!
Será que, agora, emagreço,
com a metade do tanto
custando o dobro do preço?!
Magnus Kelly

7º Lugar

Tem medo de quem morreu?
Pergunta um moço a velhinha,
que espantada respondeu:
Quando eu era viva tinha!
Marciano B. de Medeiros

8º Lugar

O espanto maior do mundo,
tive, quando mergulhado;
nadando num poço fundo
peguei na mão de um finado.
Professor Maia

9º Lugar

No espanto, ao ver meu portão,
o motorista embriagado,
em vez do freio de mão,
puxou o botão errado!
Mara Melinni

10º Lugar

Não se calcula o espanto,
quando alguém na procissão,
disse ter visto que o santo,
tinha balançado a mão.
Edson de Paiva
 
Magnus Kelly

Figueiredo Pimentel (A Princesa dos Cabelos de Ouro) parte II

II – AVENTURAS DO PAJEM FORMOSO NO REINO DE GABOR

Formoso tinha pressa de chegar ao reino da princesa dos Cabelos de Ouro para dar conta de sua embaixada.

Dois dias depois de sua última aventura, aportava à capital. Pediu que lhe ensinassem onde ficava o palácio, e disseram-lhe:

– Siga por esta rua, em frente, quando chegar ao fim, encontrará uma praça muito grande que tem um chafariz de mármore, o qual em vez de jorrar água, jorra leite para os pobres que a princesa manda dar. Em frente a este chafariz fica um palácio muito bonito; é aí que mora a princesa Mirtes.

O pajem seguiu pela rua que lhe haviam ensinado, ficando maravilhado ao chegar em frente ao edifício.

Nunca vira nem mesmo imaginara em sonho um palácio tão rico. Era um grande castelo todo de mármore cor-de-rosa, com portas e portais de ouro maciço. Ao redor via-se um gradil de prata lavrada de uma riqueza maravilhosa.

Vestiu-se com a roupa mais rica que tinha e dirigiu-se para o palácio levando consigo um cachorrinho que comprara à entrada de um bosque a alguns meninos que queriam atirar o animalzinho no rio.

Como dissemos, Formoso era um lindo rapaz. Apresentou-se aos guardas do palácio da princesa, dizendo-lhe o que queria, e os soldados acharam-no tão bonito, simpatizaram tanto com ele que o deixaram passar.

Lacaios foram avisar a princesa que o Formoso, o pajem de um rei vizinho, desejava uma audiência.

Mirtes ao ouvir o nome do pajem disse:

– Formoso é um nome que significa alguma coisa; não foi à toa que lhe deram esse nome. Aposto que é um pajem bonito e que me vai agradar.

– É verdade, princesa, disseram as damas de honra; é um rapaz de uma beleza extraordinária. Nós o vimos através das persianas e ficamos tão admiradas de sua beleza, que não saímos da janela enquanto ele falava com os guardas do palácio.

Mirtes mandou então buscar o seu vestido mais rico e depois de desatar os seus cabelos louros da cor do sol, foi sentar-se no trono, dizendo:

– Quero que esse pajem tão bonito diga que sou verdadeiramente a princesa dos Cabelos de Ouro.

As damas estavam com tanta curiosidade de ver Formoso, que não sabiam mais o que faziam.

A princesa, depois de pronta, sentou-se no trono e mandou que começassem a tocar vários instrumentos e cantassem baixinho, de modo que não interrompessem a conversa.

Conduziram Formoso à sala das audiências e, ele, ao entrar, ficou admirado, tão admirado de ver uma moça tão linda, a ponto de perder a voz. Encorajando-se adiantou-se um pouco, e comunicou à princesa o fim de sua embaixada.

– Formoso, respondeu ela, todas as razões que me dás para me casar com teu rei são muito aceitáveis, e eu as aceitaria de bom grado se não fosse o seguinte. Há um mês, indo eu tomar banho no rio, sem saber como, por descuido mesmo, caiu dentro d’água o anel que trazia ao dedo, com um enorme brilhante. A perda desse anel foi para mim maior que a do meu trono. Fiz um juramento de não aceitar proposta alguma de casamento, se o embaixador que para isso viesse ter comigo, não trouxesse o meu anel. Vê, portanto, o que te compete fazer. E não há nada neste mundo que me faça mudar de resolução.

Formoso ficou admirado de ouvir tal juramento e retirou-se para casa muito triste, sem saber que fazer.

Dizia o pobre rapaz.

– Onde irei achar o tal anel, e como posso encontrá-lo no fundo do rio? A princesa inventou esse juramento para me colocar na impossibilidade de reiterar o pedido de sua mão para o rei Frederico. É até uma loucura empreender encontrar uma jóia que caiu no rio.

O cachorrinho, que se chamava Sultão, lhe disse:

– Meu senhor, não desespereis assim de vossa fortuna; tendes sido muito bom, para não serdes feliz. Vamos amanhã cedinho à beira rio.

Formoso afagou o animalzinho e nada respondeu.

Sultão, assim que rompeu o dia, tanto gritou, tanto latiu, que acordou o amo e lhe disse:

– Meu amo, vesti-vos e vamos até ao rio.

O rapaz vestiu-se e caminhou insensivelmente para a margem do rio. Passeava muito triste, pensando como fazer a vontade da princesa, e já planejando o dia de sua partida, quando ouviu uma voz que dizia:

– Formoso, Formoso!

Olhou para todos os lados e não viu pessoa alguma.

Pensou que fora uma ilusão e começou a passear quando ouviu de novo:

– Formoso, Formoso!

– Quem me chama? disse ele.

Imediatamente apareceu a piaba, que lhe disse:

– Salvaste-me a vida, Formoso, um dia à beira de um rio, muito longe daqui. Prometi pagar essa dívida. Aqui tens o anel da princesa dos Cabelos de Ouro.

O pajem abaixou-se, apanhou da boca do peixe o anel, agradecendo muito. Em vez de voltar para casa, dirigiu-se imediatamente ao palácio da princesa, com Sultão, que estava muito satisfeito de ter conseguido seu senhor ir até à beira do rio.

Disseram à princesa que o jovem pajem pedia para lhe falar.

– Coitado! O pobre rapaz, disse ela, veio se despedir de mim, pois viu que o que eu quero é impossível, e vai dizer isso ao seu rei.

Fizeram entrar o pajem que disse:

– Princesa aqui está o seu anel e, portanto cumprida a sua ordem. Quer agora receber meu rei por esposo?

Quando Mirtes viu o anel ficou tão admirada que pensava sonhar.

– De fato, é preciso que sejas protegido por alguma fada, porque, sozinho, não acharias esta jóia.

– Princesa, não conheço nenhuma fada, porém, o desejo que tenho de obedecer é grande.

– Já que tens tanta vontade de me servir, faze-me outro serviço, sem o que não me casarei. Há um príncipe vizinho do meu reino que tem vontade de se casar comigo. Fez-me sabedora disso por meio de ameaças temíveis que se eu não me casar com ele desgraçará meu reino. Assim, qualquer dos meus vassalos que entra no seu país é logo morto e comido por ele. Esse príncipe é o gigante Baltasar, tão alto como a mais alta torre. Quando vai à caça, serve-se de canhões como se fossem pistolas. É o meu maior inimigo, por isso se queres que me case com o teu rei, vai matá-lo e traze-me a sua cabeça.

Formoso amedrontou-se ouvindo tanta coisa de um gigante e mais ainda quando a princesa comunicou querer que ele trouxesse a cabeça do seu inimigo.

Ficou muito tempo pensativo e depois disse:

– Pois bem, princesa, eu vou combater com Baltasar. Com certeza morrerei, porém, serei um herói.

Arranjou armas e partiu em direção ao palácio do gigante.

No caminho, todos que encontrava diziam-lhe que desistisse da empresa. Tanto falaram do gigante, contaram tantos horrores que Formoso já estava desanimado.

Nisto disse o cachorrinho:

– Meu amo, vá sem susto. Eu mordo-lhe os calcanhares, e quando o gigante se abaixar para ver o que é, meta-lhe a espada.

Enfim, chegou perto do palácio de Baltasar, onde encontrou ossos, caveiras de corpos humanos que tinha sido comidos pelo gigante.

Começou a ouvir um estrondo que mais parecia trovoada.

– Onde estão os pequenos homens para eu trincar nos dentes?

Era o gigante que aparecia mais alto do que as árvores.

Formoso respondeu:

– Aqui estou para com minha espada quebrar teus dentes.

Quando Baltasar ouviu aquilo, olhou para todos os lados e viu o pajem mais baixo que os seus joelhos. Arremessou com fúria uma bengala de ferro muito grossa, que trazia consigo, como se fosse uma varinha, e teria esmagado Formoso, se nessa ocasião não aparecesse um corvo, que, com o bico, lhe furou os dois olhos. Este, ao sentir a dor, e vendo-se cego, começou a bater a torto e a direito sem nada conseguir.

Formoso, começou a ferir as pernas do gigante, que cada vez mais se enfurecia. Tanto sangue perdeu o gigante que afinal caiu por terra; e Formoso, aproveitando, cortou-lhe a cabeça para levá-la à princesa.

O corvo que fora se empoleirar numa árvore assim que viu o gigante sem cabeça, dirigiu-se ao pajem desta maneira:

– Não me esqueci do serviço que me fizeste há tempos, salvando-me das garras de uma águia. Não te lembras, Formoso? Agora estamos pagos.

– Eu é que te devo ainda, corvo, disse o pajem. Se não fosses tu, estaria agora reduzido a migalhas.

Montou o cavalo levando na garupa a cabeça do gigante.

Assim que o pajem entrou na cidade, o povo começou a gritar:

– Venham ver o bravo Formoso que matou o gigante Baltasar.

A princesa, ouvindo aquela enorme gritaria pensou que vinham lhe comunicar a morte do pajem.

Ficou admiradíssima ao saber que trazia a cabeça do gigante.

Formoso lhe disse:

– Agora princesa, nada lhe resta senão consentir em desposar o meu amo, o poderoso rei Frederico, já que o nosso inimigo está morto.

– Consentirei em ser a esposa do teu rei, intrépido e corajoso pajem. Para isso é preciso no entanto que me prestes um último serviço. Desde já previno-te que é o mais arriscado de todos. Queres assim ou preferes dizer ao teu rei que nada conseguistes?”

– Princesa, já que comecei irei até ao fim, disse Formoso, falai que estou ao
vosso serviço.

– Pois, então, ouve:
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Nota do Blog: O autor cometeu um equívoco no original, a princípio deu o nome de Peri ao cão, mas na sequência usou Sultão. Para o leitor não se perder, optei por usar somente Sultão.
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Continua… III – Novas façanhas do pajem Formoso

Fonte:
Alberto Figueiredo Pimentel. Histórias da Avozinha. Publicado em 1896.

Estante de Livros (Aristides Theodoro; Carlos Minuano; Chimamanda Ngozi Adichie)


ARISTIDES THEODORO
O cangaceiro e outras estórias de Curiapeba


O cangaceiro é um texto denso, ao mesmo tempo simples e leve pelo jogo de metáforas e a abordagem de um assunto que se torna a cada dia mais polêmico e inusitado. Estórias de Curiapeba trata-se de estórias, causos, ditos e chistes apanhados diretamente da boca do povo e sabiamente transformados em conto pelo jagunço curiapebano, tal como o grande historiador Câmara Cascudo, que colhia o material para os seus livros no universo do folclore e da cultura popular.
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CARLOS MINUANO
Raul Seixas: Por Trás Das Canções


Um mergulho por trás das principais composições de um dos maiores nomes do rock brasileiro, com novas histórias e fotografias inéditas.  Em agosto de 2019 completa-se trinta anos da morte de Raul Seixas, considerado por muitos o pai do rock brasileiro. Mesmo após todo esse tempo sua influência na música brasileira e a paixão de seus fãs permanecem, mantendo viva a figura do Maluco Beleza e de sua obra, que segue influenciando músicos e sofrendo releituras até os dias de hoje.  Em Raul Seixas: Por trás das canções, Carlos Minuano — autor de Tons de Clô, biografia do apresentador Clodovil — vai, através das letras de Raul e de sua relação com a composição, abordar a vida e a carreira do artista de uma forma precisa e íntima, nunca feita antes. O livro também conta com depoimentos de amigos, parceiros de trabalho e familiares de Raul e com o relato de uma inusitada e incrível turnê Ouro de Tolo por dois garimpos no interior do Pará e fotos inéditas dessa viagem. Uma jornada pela memória de um dos brasileiros mais ilustres e peculiares de todos os tempos, guiada pela própria poesia única de suas composições.
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CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE
Americanah


Uma história épica de amor e de imigração, um romance arrebatador da premiada autora de Meio sol amarelo. Lagos, anos 1990. Enquanto Ifemelu e Obinze vivem o idílio do primeiro amor, a Nigéria enfrenta tempos sombrios sob um governo militar. Em busca de alternativas às universidades nacionais, paralisadas por sucessivas greves, a jovem Ifemelu muda-se para os Estados Unidos. Ao mesmo tempo que se destaca no meio acadêmico, ela depara pela primeira vez com a questão racial e com as agruras da vida de imigrante, mulher e negra. Quinze anos mais tarde, Ifemelu é uma blogueira aclamada nos Estados Unidos, mas o tempo e o sucesso não atenuaram o apego à sua terra natal, tampouco anularam sua ligação com Obinze. Quando ela volta para a Nigéria, terá de encontrar seu lugar num país muito diferente do que deixou e na vida de seu companheiro de adolescência. Principal autora nigeriana de sua geração e uma das mais destacadas da cena literária internacional, Chimamanda Ngozi Adichie parte de uma história de amor para debater questões prementes e universais como imigração, preconceito racial e desigualdade de gênero. Bem-humorado, sagaz e implacável, Americanah é, além de seu romance mais arrebatador, um épico contemporâneo.

segunda-feira, 13 de setembro de 2021

Varal de Trovas n. 523

  
 
Nota: Barnard (Christiaan Neethling Barnard) foi um cirurgião cardíaco sul africano, que realizou a primeira operação de transplante de coração de pessoa para pessoa. 

Solange Colombara (Carreata de Micro-Contos) – 5 –

PLANILHA


Era ótimo em Exatas mas ao calcular o Ativo e Passivo, por um momento suas mãos tocaram as dela. Deixaram para fazer a planilha do mês mais tarde.
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TERRORISMO

Gostava de olhar o pôr do sol ou a garoa fininha no inverno. Sua imaginação "voava"...

Nesses momentos, quase esquecia o terrorismo que vivia dentro de casa.
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ESPECTRO

Diz a lenda que a casa abandonada no cume da montanha é guardada por um espectro brincalhão e carcomido pelo tempo. As solteironas da cidade foram verificar e voltaram com um sorrisinho nos lábios.
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SÍNDICO

Tomava seu café da manhã de frente para o mar,  ouvindo o voo rasante das gaivotas. Não sentia saudade da vida na cidade grande, tampouco daquele  condomínio. Agora era o síndico da praia.
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EQUÍVOCO

As estrelas encontram-se com o luar a cada pôr do sol. E o casal apaixonado agradece todos os dias por esse equívoco do destino.

Figueiredo Pimentel (A Princesa dos Cabelos de Ouro) parte I

Quantos séculos correram depois da história que vamos narrar, não sei, nem pessoa alguma poderá sabê-lo, só se sabe que, por esse tempo, existiu o reino das Maravilhas, e nele uma jovem tão linda, que nada neste mundo se podia comparar.

Chamava a princesa dos Cabelos de Ouro, porque os seus cabelos eram louros, tão louros, que pareciam feitos de raios de sol, e tão grandes e crespos que chegavam aos pés.

O seu nome, porém, era Mirtes.

A princesa andava sempre com os cabelos desenastrados (soltos); tinha uma coroa de flores na cabeça, e usava vestidos bordados a ouro, diamantes e pérolas, de sorte que, quem a via, ficava logo apaixonado pela sua formosura.

Existia em Gabor, país vizinho, um rei ainda moço e solteiro, chamado Frederico, e possuidor de extraordinária riqueza. Sabendo da existência da princesa dos Cabelos de Ouro, conquanto nunca a tivesse visto, ficou apaixonadíssimo, resolvendo enviar um embaixador pedindo-a em casamento. Para isso mandou preparar um carro de ouro, puxando por cavalos brancos, e seguido de mais de cem criados, recomendando que lhe trouxessem a princesa Mirtes, a todo o custo.

O embaixador chegou ao reino das Maravilhas e entregou a mensagem. Mas, ou porque nesse dia não estivesse de bom humor, ou aquela comitiva toda não lhe parecesse a ela suficiente para uma princesa tão linda, o fato é que respondeu que agradecia muito ao rei Frederico, tão alta distinção, mas que não pensava ainda em casar.

O embaixador saiu, da corte muito triste por não regressar com ela para Gabor, voltando com todos os presentes que levara da parte de seu senhor.

Mirtes, que era sensata, sabia que uma moça não deve receber presentes de um rapaz, mas, para o rei não tomar essa recusa, como ofensa, aceitou apenas uma carta de alfinetes.

Assim que o embaixador chegou à cidade, onde era esperado impacientemente, todo o mundo se afligiu por não haver ele trazido a princesa dos Cabelos de Ouro; e o rei chorou, sabendo do resultado da embaixada.
***

Ora, havia na corte um pajem de beleza extraordinária, tão lindo que era conhecido pelo apelido de Formoso.

Todos o estimavam muito, menos os cortesãos invejosos que se incomodavam com a preferência que lhe dava o rei Frederico encarregando-o dos seus mais importantes negócios.

Formoso, estando uma vez a conversar num grupo, onde se falava da volta do embaixador, criticando de sua inépcia em comissão tão melindrosa, sem refletir no que dizia, assim se externou:

– Se o rei me tivesse enviado em embaixada à princesa dos Cabelos de Ouro, estou certo que a traria comigo.

Não faltaram alcoviteiros que fossem ao rei e dissessem:

– Saiba vossa real majestade que o pajem se gaba de ser capaz de trazer a princesa dos Cabelos de Ouro, assim que vossa majestade o mande. Considere bem vossa majestade no seguinte: Formoso, com isso quer ter a pretensão de ser mais belo que o nosso rei, pensando que se a princesa o visse, o amaria tanto que o acompanharia.

O rei ficou desesperado ouvindo tão pérfida intriga, e exclamou:

– Ah! esse pajem brinca com a minha desgraça! Pois bem: prendam-no na torre grande e que o deixem lá até morrer de fome.

Os soldados do rei foram à casa de Formoso, que já nem se lembrava mais do que dissera; arrastaram-no à prisão, e aí fizeram-lhe as maiores atrocidades.

O pobre rapaz só tinha um bocado de palha para se deitar; e teria morrido de sede se não fosse pequena uma fonte que corria perto da torre onde estava preso.

Um dia em que já não podia mais, exclamou suspirando:

– De que se queixa El-rei meu senhor? Nunca fui infiel, nunca o ofendi. Porque estou preso, quase a morrer de fome?

Frederico, por acaso passava perto da torre. Quando ouviu a voz daquele que tanto estimara, parou para ouvi-lo, apesar dos vassalos que estavam ao pé do rei e que odiavam Formoso, dizerem:

– Não lhe ouvidos, real majestade. Não sabe que Formoso é um tratante?

O rei respondeu:

– Deixem-me quero ouvi-lo.

Tendo escutado aquelas queixas, as lágrima subiram-lhe aos olhos.

Abriu a porta da prisão e chamou o seu pajem favorito.

Formoso veio muito triste se ajoelhar aos pés do rei dizendo:

– Que lhe fiz, senhor, para me tratar tão cruelmente?

– Zombaste de mim e do meu infortúnio, dizendo que se eu te houvesse enviado como embaixador à princesa, traze-la-ia com certeza.

– É verdade, disse Formoso, eu teria feito a princesa conhecer as qualidades de tão ilustre monarca, e estou persuadido que ela não recusaria aceitar o meu ilustre rei por esposo. Suponho que isto não é caçoar nem falar mal de vossa majestade.

Frederico achou que não tivera razão para ser tão cruel.

Mandou que lhe tirassem os ferros e levou-o consigo, arrependido da maldade que fizera.

Depois de mandar Formoso jantar em sua companhia, chamou-o aos seus aposentos e lhe disse:

– Ainda amo apaixonadamente a princesa Cabelos de Ouro, e apesar da recusa que tive, não desanimo de me vir a casar com ela. Queres ser meu embaixador?

– Senhor, respondeu o pajem: Estou pronto para cumprir vossas ordens. Se quiserdes partirei amanhã.

– Amanhã, não, disse o rei: quero mandar uma embaixada mais rica do que a primeira.

– Perdoe-me vossa majestade, mas não desejo levar comitiva alguma. Desejo apenas que me mande dar um bom cavalo e as cartas que devo entregar à princesa.

O rei abraçou-o, vendo a disposição com que estava ele de o servir.

No dia seguinte de manhã, Formoso partiu sem pompa nem ruído, pensando no meio que empregaria para fazer Mirtes dar o sim.

Levava consigo uma pasta, onde havia tudo quanto era necessário para escrever: papel, pena, tinta, lápis, etc., e quando vinha à sua cabeça um bonito pensamento, escrevia-o no seu livrinho de notas para o não esquecer e poder dizê-lo à princesa.

Assim procedendo o fiel pajem, pensava apenas na maneira de ser agradável à princesa para ver se ela consentia em se casar com seu amo.

Uma manhã, passando ele por um prado extensíssimo, apeou-se do cavalo em que ia montado, e sentou-se em uma pedra, à margem do rio que atravessava o campo. Admirava a beleza do lugar quando viu uma piaba pular fora da água e debater-se durante alguns segundos.

O pobre peixinho ia morrer quando Formoso o apanhou, atirando-o ao rio. Assim que a piaba se sentiu outra vez na água, nadou rapidamente para longe da margem, voltando, porém, logo após para dizer:

– Formoso, agradeço-te muito o serviço que acabas de me prestar. Se não fosses tu, estaria morta. Talvez algum dia te pague esta dívida.

Disse e desapareceu.

O pajem ficou admirado de ver um peixe falar, mas não se importou mais com o caso e seguiu viagem.

Em outro dia viu um corvo perseguido por uma águia.

O corvo voava para um lado e para outro, mas sempre perseguido. Estava prestes a cair no bico do seu inimigo, quando o rapaz que assistia àquela luta apanhou a espingarda e fazendo boa portaria, matou a águia.

Vendo-se livre, o corvo fugiu para longe, dizendo:

– Formoso, livraste-me de uma morte certa. Se não fosse o teu socorro estaria nas garras do meu perseguidor. Nada valho; sou apenas um pobre corvo, mas talvez algum dia te possa pagar esta dívida, porque não sou ingrato.

Mais admirado ficou ainda Formoso, vendo um pássaro falar.

Seguiu adiante e já estava muito distante, quando ouviu uma coruja piando desesperadamente.

O pajem disse consigo:

– Eis aí uma coruja que está piando demais. Com certeza caiu em algum laço que caçadores armaram.

Adiantou-se mais e viu uma grande coruja presa numa armadilha colocada no galho de uma árvore.

Tirou da bainha uma faca, que trazia e cortou o barbante que a prendia.

– Não é necessário, Formoso, fazer discursos para agradecer o bem que me acabas de fazer. Sou uma coruja que para nada presta. Mas, se algum dia precisares de mim, estarei pronta para te servir. Talvez ainda te pague este beneficio que me fizeste.

Foram estas as três aventuras mais importantes que aconteceram ao jovem pajem Formoso, no trajeto de Gabor até o palácio do reino das Maravilhas, onde residia Mirtes, a linda princesa dos Cabelos de Ouro.
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Continua… II – Aventuras do Pajem Formoso no Reino de Gabor

Fonte:
Alberto Figueiredo Pimentel. Histórias da Avozinha. Publicado em 1896.

domingo, 12 de setembro de 2021

A. A. de Assis (Saudade em Trovas) n. 4

 

Carolina Ramos (Um dia pesado)

Ao sair de casa, pela manhã, puxou ligeiramente a manga da jaqueta azul, consultando o relógio. Caso perdesse o ônibus, era certo chegar mais uma vez atrasado à firma.

Um rápido olhar ao longo da rua pôs por terra esperanças, ao comprovar que o ônibus já se fora e... por menos de um minuto, a tempo de ver-lhe o traseiro sumir na primeira curva. Que azar!

Perder uma noite de sono, olhos grudados na TV para ver as cores nacionais olimpicamente batidas... e ainda ter que enfrentar a cara feia do patrão - cada dia mais feia por conta dos contínuos atrasos - decididamente, não era fácil!!

O fuso horário da Austrália, adotado desde o início dos jogos, estava acabando com sua vida útil. O sono, brevíssimo, interrompido pelo alarido do televisor, não satisfazia às necessidades mais prementes. Acordava moído, estremunhado, abatido pela carga emocional, mais pesada ainda porque sem o relaxamento sadio propiciado por uma vitória gratificante, que apaga qualquer cansaço!

Não adiantava chorar sobre as derrotas, nem lamentar a perda da condução. Era esperar por outro ônibus, que só o levaria até metade do caminho, obrigando-o a uma baldeação para completar o percurso.

Quando desceu do primeiro ônibus, o comércio principiava a abrir portas.

Relaxava, à espera do segundo, quando foi abordado por um pivete armado de estilete, que lhe levou a carteira, o relógio e a jaqueta, deixando-o de algibeiras vazias.

Teria de voltar para casa a fim de reabastecer os bolsos murchos. Antes disso, porém, teria que esmolar alguns níqueis para a passagem, pois ficara a zero.

Ruminava o desgosto, quando novo vulto suspeito aproximou-se. Pôs-se em guarda. Suspeitas confirmadas: - Vai passando a grana logo... Isto é um assalto.

Foi então que perdeu as estribeiras, encarando o meliante:

- Que grana, cara?!... Que grana?! Seu amiguinho, ainda agora, levou minha carteira... levou minha jaqueta, meu relógio e tudo o mais que eu tinha!!! Quantas carteiras você acha que alguém leva consigo?! Não tenho nem um real!! Nem sequer para uma passagem de ônibus! Vocês são todos uns bandidos que deviam estar trancafiados no xadrez! Por que não vai trabalhar? Eu sei... eu sei... é mais fácil afanar o dinheiro honesto daqueles que molham o pão no suor de cada dia... Eu sei!...

Falava de um fôlego! Quase parou de respirar ao ser surpreendido com a atitude do larápio, que, primário e condoído com as palavras da vítima, lhe estendia uma nota de dez reais, instando para que aquele homem desesperado, e agora perplexo, a aceitasse.

Foi, justamente... quando a viatura encostou no meio fio.

Dois policiais, cara fechada e mão no coldre, não mostravam dúvidas: - Com a boca na botija, hein, cara?!

Ainda atônito e sem tempo para explicações, o ex-dono da jaqueta azul viu-se algemado e atolado num carro entre dois atletas!

De nada lhe valeram os protestos! Nem as tentativas de explicação! Fora pego em ação, tomando o dinheiro de um trabalhador que, ante a situação agravada, acelerara as canelas, sumindo como fumaça ao sopro da brisa.

- Mas, o que é isso, gente...?!! Era ele que estava me assaltando! Eu juro!!! Juro pelo que vocês quiserem!

- Cala essa boca aí, seu... seu mentiroso. Ou a coisa vai piorar muito! Quer fazer agente de bobo?! Né?!

Calou-se. Na delegacia, tudo esclarecido. E tudo acabaria em paz se Rodrigo não tivesse tido a infeliz lembrança de ligar para o patrão.

- Olá, seu Júlio, é o Rodrigo. Peço que o senhor me desculpe por mais este atraso. Depois eu explico. Ainda vou demorar um pouquinho... é que estou na delegacia... fui preso por assalto... mas...

- O quê...?! Preso por assalto ?! Eu bem que já desconfiava de você, seu malandro... sem-vergonha!... Logo vi que não era boa coisa! Sempre com essa cara sonolenta de quem gosta da noite ou... vive drogado. Um assalto!... Vejam só!... Não faltava mais nada!!... Pode ficar por aí mesmo... Que aí é o seu lugar! Por aqui, eu não quero vê-lo nem pintado... nunca mais! Está despedido... e por justíssima causa!!!

- Mas... seu Júlio... ouça... por favor...

O pasmo de Rodrigo foi quebrado por um desaforado Plac! – telefone desligado com violência!

Impossibilitado de dizer uma só palavra, Rodrigo encostou-se à parede, tão pálido quanto o seu espanto!

- Despedido?!... E por justa causa?!!!

Aos poucos, uma raiva surda, vinda do mais íntimo do seu ser, rugiu ameaçadora precipitando-se para fora! Lava de vulcão... cuja cadência foi alcançar os dois guardas que o haviam arrastado até a delegacia.

- Seus canalhas... seus... idiotas!... Eu não disse que era inocente?! Olhem só no que deu a "cabeçudagem" de vocês! Fui despedido!!! Ouviram bem?! Fui des-pe-di-do! Perdi o meu emprego, seus cabeças duras! Seus... seus...

Não encontrou classificação que o satisfizesse e nem conseguiu concluir os próprios pensamentos. A quebradeira e os chutes, simultâneos aos protestos, foram mais do que suficientes para que o trancafiassem numa cela! - Agora, sim, com culpa definida e devidamente formalizada: - Desrespeito à autoridade!

Fonte:
Carolina Ramos. Canta… Sabiá! (folclore). Santos/SP: publicado pela Editora Mônica Petroni Mathias, 2021. Capítulo 5: Contos rústicos, telúricos e outros mais.

Franccis Yoshi Kawa (A janela)

Parecia delírio quando disse que estava partindo a procura de um reino para ser o soberano. Tinha feroz determinação de conquistar um reino para poder coroar sua amada, cobrir de ouro e transformá-la em rainha. Era obsessão ou mania de grandeza, ninguém sabia. Certamente era um louco em busca de sucesso e fama. Não queria ser apenas um grão de areia solto no mundo. Partiu para conquistar o mundo sonhado, despedindo-se do amor de sua vida. O tempo passou, talvez demais. Apostava na sorte e a bola de neve rolava montanha abaixo, destruindo tudo pelo caminho em direção à linha de chegada. Parou como toda bola que rola, agiganta, bate e esborracha. Foi adentrando o portal de um castelo para chamar de seu. Finalmente havia conquistado o seu almejado reino.

Foi como acordar de um pesadelo, estava imobilizado em uma cadeira de rodas. Havia retornado de sua louca e trágica aventura. O preço que pagou para obter o que queria foi alto demais. Mas, era tudo o que queria: “Um reino com direito à coroa”. Confinado no seu quarto, olha o mundo através da janela de seu castelo. Acreditava que a riqueza era tudo que importava, mas se enganara. Se pudesse voltar atrás, teria feito diferente. Já era muito tarde para entender que o amor verdadeiro era possível sem ter nada. De repente percebe que tem tudo e ao mesmo tempo nada tem. Coberto de riqueza, olha o mundo através da janela de seu castelo. No auge de sua arrogância, havia desprezado a chance de ser feliz, achando que merecia muito mais. Não queria apenas o amor, mas cobrir de ouro sua amada. Acreditando que só assim o amor seria verdadeiro, pleno, feliz. Se soubesse que ela não queria nada disso. Nem ouro, nem reino, nem coroa. Ela queria apenas o seu amor e cansara de esperar. Se pudesse voltar no tempo olharia para aquele amor simples e singelo sendo atropelado pela avalanche que descia a montanha. Não, ela não morreu atropelada. Cansada de esperar, só o amor havia morrido.

Revoltado com o seu destino, olha a outra janela além do muro e vê alguém que também o observa. Ela se parece com aquela que almejara cobrir de riquezas e transformar em rainha. Parece, mas não é. Está debruçada no parapeito, como se fosse uma princesa prisioneira na torre de um castelo. Ela o vê e sorri retribuindo o aceno. O sorriso dela o faz sonhar novamente. Sonha com ela. Quem sabe ela seja uma princesa prisioneira de um mundo cercada de cuidados.

Ela nunca saberá que por detrás do busto que aparece na moldura da janela, esconde uma cadeira de rodas. Quem ia querer um rei estropiado? No seu sortilégio, o sonho é seu único privilégio. No sorriso de bom dia de toda manhã, um aceno de boa tarde depois e uma boa noite ao anoitecer. Em sua fantasia, ela está pensando nele de manhã, tarde e noite. É seu único sonho possível. Imagina como seria bom se pudesse abraçá-la. O desespero toma conta. Se nunca mais puder voltar a andar, os seus devaneios jamais deixarão de ser apenas um belo sonho.

Aquela ilusão de amor era como um fio invisível que o prendia à vida. Daria tudo para deixar de ser apenas um alguém emoldurado na janela de seu castelo, observando uma bola de neve que rola montanha abaixo. Não quer continuar olhando o mundo sem poder fazer nada. Quer mais, muito mais. Quer transformar o sonho de amor da princesa prisioneira em realidade. Lembra que no passado, quando era jovem, podia correr contra a vento. Era belo e certamente seria amado, mesmo sem ter nada.

No presente não tem mais a juventude, mas um rico castelo abarrotado de tesouros. Lamenta o equívoco de ter acreditado que só a riqueza traria amor e felicidade. Não sabia que podia ser feliz sendo pobre. Somente depois de receber a notícia de que estava condenado a uma cadeira de rodas, admitiu que estava equivocado. Sonha com a princesa, pensa nela toda hora. A cada aceno acompanhado de um sorriso, sua alma se enche de alegria e esperança.

Não tem coragem de revelar que está imobilizado em uma cadeira de rodas. Naquele momento o seu tesouro, sua riqueza não servem para nada. Não podia se revelar por inteiro. Quer reverter a sua história a qualquer custo. Está disposto a se desfazer de seu reino se pudesse voltar no tempo. Não quer mais tanta opulência. Só quer voltar a andar.

Quer girar o mundo ao contrário, trazer a bola de neve rolando de volta ao topo da montanha. Quer desfazer o seu reinado para poder caminhar novamente, libertar seu corpo prisioneiro. Está disposto a tudo por aquela que está debruçada na janela. Quer que ela seja o amor que nunca teve. Quer voltar a ser como antes, quando era possível ser amado, mesmo quando nada tinha.

A princesa prisioneira na torre de seu castelo acena com um sorriso. Ela também sonha com a possibilidade de ser livre e ser amada como nunca foi. Quer também se libertar da moldura da sua janela. Quer ser amada como ela é. A linda princesa também estava presa à uma cadeira de rodas.

Estante de Livros (livros de Ana Maria Machado)


AMIGOS SECRETOS


Um dos membros do "Clube da Árvore" (uma confraria de jovens que se encontram no alto de uma árvore para brincar e contar histórias) coloca um livro de Monteiro Lobato dentro do videocassete e, com isso, abre uma passagem que os liga ao mundo encantado do pai de Emília e Narizinho e de outros autores caros ao universo infantojuvenil, como Cervantes, Mark Twain e a própria Ana Maria Machado. A turma vive inúmeras peripécias com personagens da literatura. E aprende que a literatura pode ser um instrumento para a compreensão da realidade.
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MENSAGEM PARA VOCÊ

Em um trabalho de História sobre o Egito, o grupo formado por cinco alunos tira a nota mais alta. Eles ficam surpresos: afinal, nenhum deles pesquisou sobre a importância intelectual da rainha Nefertiti, menção elogiada pelo professor - essa parte do trabalho apareceu misteriosamente entre as outras. Depois disso, os jovens passam a receber mensagens de computador, celular e outros meios, todas de personagens históricos mortos há muito tempo, Elas mencionam a importância de ler e escrever. Agora eles precisam desvendar: quem será o hacker misterioso, e o que ele pretende?
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O CANTO DA PRAÇA

Arlindo ama Paloma. Mas Pedro também quer a garota. Em nome do amor, os dois amigos viram rivais, ganham seguidores, montam exércitos. No que vai dar tudo isso? Numa aventura recheada de símbolos e brincadeiras bem-humoradas com a linguagem, o leitor encontra questões pra lá de sérias, como a intolerância e a difícil busca da paz.

sábado, 11 de setembro de 2021

Benedita Azevedo (Uma lição dolorosa)

Quatro meses após a morte do pai, o filho de Jussara já estava deitado quando um vizinho da sua idade tocou a campainha. A mãe atendeu. O rapaz contara que precisaria levar um recado urgente do pai a um bairro distante, para uma pessoa que ainda não tinha telefone. Ela olhou o relógio, era quase 23 horas, disse que o filho já estava dormindo, e mesmo que não estivesse não o deixaria sair com o carro, àquela hora, pois ainda não tinha carteira e era inexperiente ao volante. O rapaz insistiu. Ela ia dizer que não o acordaria, quando o filho apareceu à porta e disse:

- Deixa-me ir mãe, tomarei cuidado!

A mãe ficou sem força para dizer não e os dois saíram no carro que já estava na garagem. Ele tinha dezessete anos e a mãe ainda estava pagando a Brasília branca que tinha comprado em doze prestações.

Não demorou meia hora, o telefone tocou. Era Célia, amiga de Jussara, mãe da melhor amiga de sua filha Joseli. O coração da mãe de Rodrigo disparou. Alguma coisa tinha acontecido para a amiga ligar àquela hora. Numa fração de segundo mentalizou toda a situação.

- Jussara, eu estou ligando...

- Aconteceu alguma coisa com meu filho? - interrompeu ansiosa.

- Ele teve um problema com o carro, mas está tudo bem. Ele só está muito nervoso e preocupado contigo.

Jussara nem pensou no carro. Só queria saber como estava seu filho.

- Ele está ai, Célia?

- Está, mas está muito nervoso. Só repete que tu não querias deixá-lo vir e que ainda não terminaste de pagar o carro.

- Deixa-me falar com ele.

Ao pegar o telefone, a primeira coisa que falou foi que não tivera culpa. Que o farol alto de um ônibus fez que batesse com o carro no meio fio e capotasse.

- A senhora nem terminou de pagar o carro, mãe. A Senhora não queria que eu viesse. A senhora tinha razão. Eu não deveria ter saído com o carro à noite.

Estava muito nervoso. O coração acelerado de Jussara só pedia que fosse apanhar o filho e o acalmasse. Um rapaz tão equilibrado que nunca lhe dera preocupações, a não ser as normais de um jovem de dezessete anos. Mas como iria? Não tinha condução. Era nisso que dava. Tentara ajudar alguém a levar um recado urgente e agora estava de mãos atadas, sem poder socorrer o próprio filho. Teria de chamar um táxi, mas como? Nunca precisara fazer isso depois que mudara para aquele bairro. Nem se lembrou do disque – informação. Tentou acalmá-lo:

- Meu filho, não pensa no carro agora. Como está o teu amigo?

- Estão todos bem, só Ricardo machucou o braço.

- Ricardo? Tu não saíste daqui com Alan?

- Eu apanhei os outros na esquina. – contou chorando.

- Fica calmo que a gente resolve tudo. Agora eu quero que tu venhas para casa. Deixa-me falar com Célia.

Ela nem esperou que Jussara falasse, disse que o levaria para casa. Em meia hora o filho entrou e abraçou-se à mãe, pedindo desculpas e prometendo trabalhar para pagar o conserto do carro. Contou que estavam com ele quatro amigos, mas só o que estava no banco do carona machucara o braço no asfalto.

No outro dia Jussara foi até o local do acidente. O dono de um bar em frente confirmou a questão do ônibus. Contou que o carro capotou três vezes e caiu em um pequeno barranco. Que os presentes pensaram que tivessem morrido todos. Quando se aproximaram os rapazes começaram a sair um por um e foram aplaudidos quando o último saiu ileso. Ela foi ver o carro de roda para o ar. Caíra sobre um amontoado de ervas trepadeiras que lhe servira como amortecedor do baque.

A Brasília 76, comprada em 1978, ficou toda amassada, mas funcionando. O filho mesmo foi levar para a oficina, pois a mãe precisava trabalhar. Não poderia comprar outra. Ainda faltavam quatro prestações a pagar. Ficou no conserto mais de sessenta dias. O pior era seguir a sua jornada de trabalho, andando nos ônibus lotados. Foi um período muito difícil.

Passado o susto, como medida didática, a mãe reuniu os amigos em casa e conversou. Falou da insistência do colega para que ela acordasse o filho. Ela para prestar um favor, após as vinte e duas horas, deixara o filho dirigir seu carro, coisa que nunca fizera antes. Que a insistência de Alan dizendo que era um recado urgente do pai lhe fizera permitir que saísse. Portanto, seria justo que ajudassem no conserto do carro, que ainda estava pagando e estava praticamente irrecuperável. Não deveria ter cedido à pressão dele, mas já que tinha acontecido, agora tinha de ser encontrada uma saída para se resolver o problema. Falou que daria uns dias para eles falarem com os pais antes de ela mesma procurá-los.

Dois ou três dias depois, o pai de Ricardo, vizinho de Jussara procurou-a em casa e disse que iria colaborar com CR$ 2.000,00. Zeca, filho de uma prima distante de Rodrigo, se propôs a colaborar com CR$ 5.000,00. O pai de Alan, o que tocou a campainha e insistiu para que o levassem de carro se propôs a colaborar com CR$ 5.000,00. O outro não tinha condições de dar nada. O conserto seria CR$ 20.000,00(vinte mil cruzeiros).

Jussara pegou a parte de Zeca e deu ao lanterneiro para a compra de parte do material. Uns quinze dias depois o pai de Ricardo deu a parte dele que foi passado ao lanterneiro. O pai de Alan disse que mandaria no final daquele mês. Ele morava em Caxias e alugou uma casa para os filhos na capital, em frente à casa da mãe de Rodrigo.

Jussara aguardou até o carro ficar pronto. Era preciso pagar o restante do conserto. Como a família do Alan não se manifestara, ela foi conversar com o rapaz.

Eram vizinhos e muitas vezes se reuniram em programações em casa de uns e de outros. Ela atravessou a rua e tocou a campainha. Estranhou que não lhe convidassem para entrar. Alan não apareceu. O irmão caçula entrou e chamou a irmã. Jussara meio sem graça, falou que o conserto do carro ficara pronto e se poderia falar com Alan? Ela grosseiramente se manifestou:

- O que nós temos com isso? O carro é seu, então se vire. Eu não vou deixar meu pai mandar dinheiro nenhum.

- Mas foi para dar um recado dele que tirei meu filho da cama, quase meia noite para levar seu irmão. E ele insistiu muito para que eu o fizesse.

- Não me interessa seus argumentos. O assunto está encerrado. Por favor, não nos procure mais e nem incomode meu pai com seus problemas.

Jussara voltou para casa e contou ao filho. Ele disse que era para deixar isso pra lá, que iria trabalhar para ressarcir a mãe. No dia de apanhar o carro já consertado, Rodrigo disse que não iria. Só se a mãe fosse junta. Ela o atendeu, mas fez questão de que ele dirigisse até em casa.

Só muito mais tarde, Rodrigo já adulto, contou que ele e os amigos tinham combinado de pedir o carro para saírem. Que realmente havia o tal recado a ser dado, mas ele já sabia que o colega iria pedir e fingira estar dormindo.

I Concurso de Trovas de Itaperuna-RJ / 2021 (Trovas Premiadas)


(classificação por ordem alfabética)

ÂMBITO NACIONAL / INTERNACIONAL

Tema: Centelha  (l/f)

NOVOS TROVADORES
 
VENCEDORES

 
01- Geraldo Amancio Pereira
Fortaleza/CE

Quem tem fé quando se ajoelha
e humildemente se inclina,
faz da prece uma centelha
e alcança a graça divina.

02- Ieda Lima
Caicó/RN

Cada um de nós enaltece
as Obras do Criador,
quando o respeito abastece
 nossa Centelha de amor.
 
03- Jaíra Presa
Santos/SP

Essa centelha de luz
que nasce dentro da gente
é ela que nos conduz
que nos joga para frente.
 
04- Maria Lúcia Spadarotto Neves
Itaperuna/RJ

Uma centelha de afeto
e uma porção de carinho
podem mudar o trajeto
de quem caminha sozinho.
 
05- Maria Mendes de Santos
Itaperuna/RJ

Pai, acenda em nós a chama
do perdão, do amor, da paz,
alento para quem ama,
centelha que nos refaz.
 
MENÇÕES  HONROSAS
 
01- Carla Alves da Silva
Curitiba/PR

Na centelha do desejo
choro o pranto da saudade.
São lágrimas em cortejo
atrás da felicidade.
 
02- Carla Alves da Silva
Curitiba/PR

Seu beijo quente retém
bem viva nossa união,
rubra centelha que vem
aquecer meu coração.
 
03- Solange Colombara
São Paulo/SP

Após profundas feridas,
mesmo olhando-me de esguelha,
suas mãos, fortes guaridas,
acenderam-me a centelha.
 
04- Veridiana Jácome
Targino/RN

Uma força nos domina
traz alento e nos acalma,
é a centelha divina
que permeia qualquer alma.
 
05- Ziney Santos Moreira
Ribeirão Preto/SP

Podemos ser a centelha
que ilumina um coração
feito o sol tocando a telha
abraçando a construção.
 
MENÇÕES ESPECIAIS
 
01- Agnes Izumi Nagashima
Londrina/PR

Vivemos na profundeza,
em tempos de escuridão.
Um gesto de gentileza
é centelha ao coração.
 
02- Antônio Rosélio Nunes Pacheco
Itaperuna/RJ

Antes era uma centelha,
mas o fogo se alastrou;
a mata toda vermelha
chora tudo que queimou.
 
03- Cléber Leandro Nardeli
Iturama/MS

O combustível da vida
é uma centelha de um sonho
que a gente põe na ferida
do coração de um tristonho.
 
04- Marcos Antônio Bezerra Cavalcanti
Natal/RN

O pensamento é centelha
da mente, o facho de luz.
Mas nem tudo que há na telha
ao bom caminho conduz.

05- Maria Lúcia Spadarotto Neves
Itaperuna/RJ

É de uma centelha apenas
 do teu amor que eu preciso
 para em noites mais amenas
 ir contigo ao paraíso!
 
ÂMBITO NACIONAL/INTERNACIONAL

Tema: Brisa (l/f)

VETERANOS
 
VENCEDORES

 
01- Henrique Eduardo Alves Pereira
Ocara/CE

Com certeza, a brisa mansa
sempre suave e inspirada,
em devaneios descansa
nos braços da madrugada!
 
02- José Ouverney
Pindamonhangaba/SP

Tua saudade é presença
que meus sonhos retempera
quando a brisa da descrença
invade as noites de espera...
 
03- Mara Melinni
Caicó/RN

O tempo que faz divisa
e altera cada estação,
não muda a força da brisa
que me aponta a direção!
 
04- Maria Helena Oliveira Costa
Ponta Grossa/PR

Suave, sopra em constância...
E eu, gratificado, aceito
a doce brisa da infância
que vem afagar meu peito!
 
05- Maurício Cavalheiro
Pindamonhangaba/SP

Quero esquecê-la... Entretanto,
o meu coração protela
porque a brisa em doce canto
pronuncia o nome dela.
 
MENÇÕES  HONROSAS
 
01- Geraldo Trombin
Americana/SP

Pouca gente a valoriza,
mas é tão acolhedora;
nas mãos do poeta, a brisa,
vira musa inspiradora.

02- Henrique Eduardo Alves Pereira
Ocara/CE

Meu inspirar não divisa
ao afirmar sem atalho:
és beijo puro de brisa
dos lábios meigos do orvalho!

03- Lucília Alzira Trindade Decarli
Bandeirantes/PR

Veio a brisa, suave, mansa
e, dela, eu pude aprender:
a paz é um bem que se alcança,
quando é brando o proceder!

04- Mara Melinni
Caicó/RN

Viver é a brisa inconstante
ora alegre, ora tão fria,
que faz valer cada instante
das manhãs de cada dia!

05- Romilton Faria
Juiz de Fora/MG‬

Pisando o antigo assoalho,
no rosto o pranto desliza,
e a saudade acha um atalho
no sopro frio da brisa.
 
MENÇÕES ESPECIAIS
 
01- Arlindo Tadeu Hagen
Juiz de Fora/MG

Um amor que nos fascina
é vento de tempestade
mas, depois, quando termina,
vira brisa de saudade.

02- Elias Pescador
São Paulo/SP

Selvagem, místico encanto,
odor suave em campo aberto:
teu amor, feito acalanto,
é brisa no meu deserto!...

03- João Paulo Ouverney
Pindamonhangaba/SP

Você, que foi tempestade
a rugir dentro de mim,
hoje é brisa de saudade
na calmaria sem fim!

04- Mário Moura Marinho
Sorriso/MT

A brisa, pela janela...
entra esfriando e nos rende,
mas sempre que apaga a vela,
entre nós, um fogo acende.

05- Messias da Rocha
Juiz de Fora/MG

A saudade se ameniza
perdida em momentos vagos,
se o leve sopro da brisa
me faz lembrar teus afagos.

06- Olga Agulhon
Maringá/PR

O mal sempre está à espreita,
testando a nossa vontade...
Plante o bem para a colheita
ser brisa e não tempestade.

07- Professor Garcia
Caicó/RN

Sopra o vento... e, em leve açoite,
os lábios da brisa mansa
tocam nos lábios da noite,
que enfim, cansada, descansa!

08- Relva do Egypto Rezende Silveira
Belo Horizonte/MG

A brisa mansa e dolente
que o meu tempo, sempre, invade,
traz o passado ao presente
para dar vida à saudade.
 
ÂMBITO ESTADUAL

Tema: Orvalho (l/f)

VETERANOS

 
01- Cléber Roberto de Oliveira  
São João do Meriti/RJ

O suor do árduo trabalho,
que de uma fronte goteja,
tem a beleza do orvalho
que pelos rosais roreja!...
 
02- Edmar Japiassú Maia
Governador Portela Miguel Pereira/RJ

Na fazenda, um espantalho
ao frio da noite exposto,
chora lágrimas de orvalho
que lhe escorrem pelo rosto!
 
03- Gilvan Carneiro da Silva
São Gonçalo/RJ

Ah, se esse orvalho que cai
de leve sobre o jardim
florescesse a flor que vai
morrendo dentro de mim!...
 
04- Paulo Roberto de Oliveira Caruso
Niterói/RJ

A formiguinha vaidosa,
junto à raiz do carvalho,
derreteu-se toda prosa
ante um espelho de orvalho.
 
05- Paulo Roberto de Oliveira Caruso
Niterói/RJ

Deus criou o mundo inteiro
em seis dias de trabalho;
do Seu suor derradeiro
foi que nos surgiu o orvalho.
 
MENÇÕES  HONROSAS
 
01- Alba Helena Corrêa
Niterói/RJ

O orvalho, nas madrugadas,
veste, de branco, as campinas:
parecem noivas ornadas
de véus e grinaldas finas!
 
02- Ariete Regina Fernandes Correia
Rio de Janeiro/RJ

Quando a manhã se acendeu
e o sol beijou todo o orvalho,
a relva então se aqueceu
com translúcido agasalho.
 
03- Edmar Japiassú Maia
Governador Portela Miguel Pereira/RJ

À noite, ao rés da colina,
o orvalho cobrindo os campos,
a Lua cheia ilumina
a festa dos pirilampos...
 
04- Juarez Francisco Moreira da Silva
Rio das Ostras/RJ

Quando o orvalho molha o rosto
na aurora da despedida,
deixa marcas de desgosto,
que marcam pra toda vida.
 
05- Sandro Pereira Rebel
Niterói/RJ

Pelo amor sempre aquecida,
és, para mim, o agasalho
que, no anoitecer da vida,
me livra do frio orvalho.
 
MENÇÕES ESPECIAIS
 
01- Abílio Kac
Rio de Janeiro/RJ

Uma flor caiu do galho
na madrugada singela
levando em gotas de orvalho,
gotas das lágrimas dela.
 
02- Gilvan Carneiro da Silva
São Gonçalo/RJ

Como se fosse um carinho
o orvalho da madrugada
pousa sobre o menininho
encolhido na calçada!...
 
03- Luciana Pessanha Pires
Itaperuna/RJ

Orvalho caindo a esmo
nas pétalas de uma flor...
Orvalho parece mesmo
o pranto de um trovador.
 
04- Sandro Pereira Rebel
Niterói/RJ

Tal qual fosse algum encanto
provindo da madrugada,
natureza se faz pranto
e em orvalho é transformada.
 
05- Sílvia Alice de Carvalho Soares
Angra dos Reis/RJ

O orvalho que cai e chora
a sua ausência sentida
machuca o meu peito e aflora
a esperança interrompida!
 
06- Talita Batista
Campos dos Goytacazes/RJ

Penso em você noite e dia,
mas feito orvalho na folha,
preciso de parceria:
que seu coração me acolha!...
 
07- Therezinha Tavares
Nova Friburgo/RJ

Seu tempo pouco perdura
no plano que a vida é feita,
mas a gota leve e pura
do orvalho é bela, perfeita.
 
08- Therezinha Tavares
Nova Friburgo/RJ

Eu venho nas madrugadas
faço as flores mais formosas,
todas são por mim amadas
sou orvalho e beijo as rosas!
 
ÂMBITO MUNICIPAL ESTUDANTIL
 
Tema: Terra

ENSINO MÉDIO
 
VENCEDORES


01- Angélica de Souza Aguiar Dias
CEJA Itaperuna

A terra pede socorro
e está sendo destruída!
Lugar por onde percorro,
a beleza, consumida!
 
02- Carlos Eduardo S. Coelho
C. E. Buarque de Nazareth

Terra de muitas riquezas,
exuberâncias e rios,
ao futuro as incertezas,
pois são grandes desafios!
 
03- Flávia Lavínia Vieira Monteiro
C. E. Buarque de Nazareth

As florestas desmatadas,
seres vivos em perigo;
labaredas alastradas,
com a vida sem abrigo.

04- Pedro Alex Amaral Moreira
CEJA Itaperuna

Fogo gera a destruição,
e dinheiro mais que a vida.
Com mais uma construção,
natureza é reprimida.
 
05- Rikelmy Matheus Ramos Moraes  
C.E. Rotary

Oh, Terra, tão majestosa,
em seus aspectos é bela!
Não a deixemos chorosa
e sempre cuidemos dela.
 
MENÇÕES  HONROSAS
 
01- Angélica de Souza Aguiar Dias  
CEJA Itaperuna

A terra está tão doente,
mesmo assim nos alimenta;
e todo o homem prepotente
a queimada representa.
 
02- Leticia Fernandes Zanon
C. E. Buarque de Nazareth

A Terra pode acabar,
aí não dá pra viver.
Se a gente não preservar,
vamos todos bem sofrer.
 
03- Lívia da Silva Cruz
Fundação São José

Nesta Terra tão amada,
desafio em toda parte.
Apesar da palhaçada
é muito fácil amar-te.

ÂMBITO MUNICIPAL ESTUDANTIL

Tema: Água

ENSINO FUNDAMENTAL (6º ao 9º ano)
 
VENCEDORES

 
01- Carlos Henrique Carvalho Gonçalves  
E. M. N. S. das Graças

Eu sou água cristalina,
não tenho cheiro nem cor,
mas sou pura adrenalina
e dou saúde e vigor.

02- Kauanny Lopes
E. M. H. Amado

A água é sempre essencial
desde o nascer de uma flor...
Ela faz o mundo igual
com mais vida mais amor.

03- Lívia Aniceto
 E. M. N. S. das Graças

Veja que a água lá no céu
é a chuva junto ao vento.
Ela faz na rua um véu,
ao correr um pé-de-vento.

04- Lucas Porteiro Pinheiro
E. M. N. S. das Graças

De longe eu avisto o rio,
em suas águas nasci;
no meu peito sinto um frio
ao lembrar que sou daqui.

05- Pedro Pimentel Corrêa
Fundação São José

A vida é água de rio,
e eu sou a gota que implora.
Cada hora é esse desafio
que se inunda bem lá fora.
 
MENÇÕES  HONROSAS

01- Kemilly da Costa Neto
E. M. H. Amado

Não importa se o momento
é de alegria ou de dor;
a água parece alimento
e refresca no calor.

02- Kethelen Santana Lopes
E. M. N. S. das Graças

Eu amo a areia da praia,
quero estar à beira–mar,
coloco, correndo a saia
e espero o tempo pra amar.

03- Miguel Gonçalves Bacellar
E. M. N. S. das Graças

Oh, como pode água ser
assim tão doce e salgada!
Como pode parecer
assim tão linda e delgada!

04- Otávio Robaina Mariano
E. M. N. S. das Graças

Em um lago tão bonito,
o Sol se pondo lá fora,
mamãe grita o filho Tito:
– Sai da água e vem embora!

05- RafaeL Vargas
E. M. H. Amado

A água traz felicidade...
Sendo assim, conserve-a bem.
Abastece a sociedade,
não podemos ficar sem.
                           
MENÇÕES ESPECIAIS

01- João Paulo Zampier Zanon
E. M. N. S. das Graças

Nossa água é tão importante
porque precisamos dela,
portanto pense bastante,
não jogue pela janela.

02- Keyla Eugenio da Silva
E. M. N. S. das Graças

Se a água tem sabor, não sei,
é útil a vida inteira;
dela sempre beberei,
se é da fonte ou da torneira.

03- Lucas Porteiro Pinheiro
E. M. N. S. das Graças

Nessa noite tão chuvosa,
em que do céu cai tanta água,
lembro a menina formosa
e o amor no peito deságua.

04- Maria Alice Cesário Garcia
E. M. N. S. das Graças

Nossa água que vem da chuva,
ela cai toda do céu;
molha a casa da viúva,
que sozinha põe seu véu.

05- Maria Clara Pereira da Silva
E. M. N. S. das Graças

Temos água com fartura,
conservo-a para viver,
pois ela dá cobertura
pra Terra sobreviver.