quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Machado de Assis (A Chinela Turca)

Vede o Bacharel Duarte. Acaba de compor o mais teso e correto laço de gravata que apareceu naquele ano de 1850, e anunciam-lhe a visita do Major Lopo Alves. Notai que é de noite, e passa de nove horas. Duarte estremeceu, e tinha duas razões para isso. A primeira era ser o major, em qualquer ocasião, um dos mais enfadonhos sujeitos do tempo. A segunda é que ele preparava-se justamente para ir ver, em um baile, os mais finos cabelos loiros e os mais pensativos olhos azuis, que este nossa clima, tão avaro deles, produzira. Datava de uma semana aquele namoro. Seu coração deixando-se prender entre duas valsas, confiou aos olhos, que eram castanhos, uma declaração em regra, que eles pontualmente transmitiram à moça, dez minutos antes da ceia, recebendo favorável resposta logo depois do chocolate. Três dias depois, estava a caminho a primeira carta, e pelo jeito que levavam as cousas não era de admirar que, antes do fim do ano, estivessem ambos a caminho da igreja. Nestas circunstâncias, a chegada de Lopo Alves era uma verdadeira calamidade. Velho amigo da família, companheiro de seu finado pai no exército, tinha jus o major a todos os respeitos. Impossível despedi-lo ou tratá-lo com frieza. Havia felizmente uma circunstância atenuante; o major era aparentado com Cecília, a moça dos olhos azuis; em caso de necessidade, era um voto seguro.

Duarte enfiou um chambre e dirigiu-se para a sala, onde Lopo Alves, com um rolo debaixo do braço e os olhos fitos no ar, parecia totalmente alheio à chegada do bacharel.

— Que bom vento o trouxe a Catumbi a semelhante hora? perguntou Duarte, dando à voz uma expressão de prazer, aconselhada não menos pelo interesse que pelo bom-tom.

— Não sei se o vento que me trouxe é bom ou mau, respondeu o major sorrindo por baixo do espesso bigode grisalho; sei que foi um vento rijo. Vai sair?

— Vou ao Rio Comprido.

— Já sei; vai à casa da viúva Meneses. Minha mulher e as pequenas já lá devem estar: eu irei mais tarde, se puder. Creio que é cedo, não?

Lopo Alves tirou o relógio e viu que eram nove horas e meia. Passou a mão pelo bigode, levantou-se, deu alguns passos na sala, tornou a sentar-se e disse:

— Dou-lhe uma notícia, que certamente não espera. Saiba que fiz... fiz um drama.

— Um drama! exclamou o bacharel.

— Que quer? Desde criança padeci destes achaques literários. O serviço militar não foi remédio que me curasse, foi um paliativo. A doença regressou com a força dos primeiros tempos. Já agora não há mais remédio senão deixá-la, e ir simplesmente ajudando a natureza.

Duarte recordou-se de que efetivamente o major falava noutro tempo de alguns discursos inaugurais, duas ou três nênias e boa soma de artigos que escrevera acerca das campanhas do Rio da Prata. Havia porém muitos anos que Lopo Alves deixara em paz os generais platinos e os defuntos; nada fazia supor que a moléstia volvesse, sobretudo caracterizada por um drama. Esta circunstância explicá-la-ia o bacharel, se soubesse que Lopo Alves algumas semanas antes, assistira à representação de uma peça do gênero ultra-romântico, obra que lhe agradou muito e lhe sugeriu a idéia de afrontar as luzes do tablado. Não entrou o major nestas minuciosidades necessárias, e o bacharel ficou sem conhecer o motivo da explosão dramática do militar. Nem o soube, nem curou disso. Encareceu muito as faculdades mentais do major, manifestou calorosamente a ambição que nutria de o ver sair triunfante naquela estréia, prometeu que o recomendaria a alguns amigos que tinha no Correio Mercantil, e só estacou e empalideceu quando viu o major, trêmulo de bem-aventurança, abrir o rolo que trazia consigo.

— Agradeço-lhe as suas boas intenções, disse Lopo Alves, e aceito o obséquio que me promete; antes dele, porém, desejo outro. Sei que é inteligente e lido; há de me dizer francamente o que pensa deste trabalho. Não lhe peço elogios, exijo franqueza e franqueza rude. Se achar que não é bom, diga-o sem rebuço.

Duarte procurou desviar aquele cálix de amargura; mas era difícil pedi-lo, e impossível alcançá-lo. Consultou melancolicamente o relógio, que marcava nove horas e cinqüenta e cinco minutos, enquanto o major folheava paternalmente as cento e oitenta folhas do manuscrito.

— Isto vai depressa, disse Lopo Alves; eu sei o que são rapazes e o que são bailes. Descanse que ainda hoje dançará duas ou três valsas com ela, se a tem, ou com elas. Não acha melhor irmos para o seu gabinete?

Era indiferente, para o bacharel, o lugar do suplício; acedeu ao desejo do hóspede. Este, com a liberdade que lhe davam as relações, disse ao moleque que não deixasse entrar ninguém. O algoz não queria testemunhas. A porta do gabinete fechou-se; Lopo Alves tomou lugar ao pé da mesa, tendo em frente o bacharel, que mergulhou o corpo e o desespero numa vasta poltrona de marroquim, resoluto a não dizer palavra para ir mais depressa ao termo.

O drama dividia-se em sete quadros. Esta indicação produziu um calafrio no ouvinte. Nada havia de novo naquelas cento e oitenta páginas, senão a letra do autor. O mais eram os lances, os caracteres, as ficelles, e até o estilo dos mais acabados tipos do romantismo desgrenhado. Lopo Alves cuidava pôr por obra uma invenção, quando não fazia mais do que alinhavar as suas reminiscências. Noutra ocasião, a obra seria um bom passatempo. Havia logo no primeiro quadro, espécie de prólogo, uma criança roubada à família, um envenenamento, dous embuçados, a ponta de um punhal e quantidade de adjetivos não menos afiados que o punhal. No segundo quadro dava-se conta da morte de um dos embuçados, que devia ressuscitar no terceiro, para ser preso no quinto, e matar o tirano do sétimo. Além da morte aparente do embuçado, havia no segundo quadro o rapto da menina, já então moça de dezessete anos, um monólogo que parecia durar igual prazo, e o roubo de um testamento.

Eram quase onze horas quando acabou a leitura deste segundo quadro. Duarte mal podia conter a cólera; era já impossível ir ao Rio Comprido. Não é fora de propósito conjeturar que, se o major expirasse naquele momento, Duarte agradecia a morte como um benefício da Providência. Os sentimentos do bacharel não faziam crer tamanha ferocidade; mas a leitura de um mau livro é capaz de produzir fenômenos ainda mais espantosos. Acresce que, enquanto aos olhos carnais do bacharel aparecia em toda a sua espessura a grenha de Lopo Alves, fugiam-lhe ao espírito os fios de ouro que ornavam a formosa cabeça de Cecília; via-a com os olhos azuis, a tez branca e rosada, o gesto delicado e gracioso, dominando todas as demais damas que deviam estar no salão da viúva Meneses. Via aquilo, e ouvia mentalmente a música, a palestra, o soar dos passos, e o ruge-ruge das sedas; enquanto a voz rouquenha e sensaborona de Lopo Alves ia desfiando os quadros e os diálogos, com a impassibilidade de uma grande convicção.

Voava o tempo, e o ouvinte já não sabia a conta dos quadros. Meia-noite soara desde muito; o baile estava perdido. De repente, viu Duarte que o major enrolava outra vez o manuscrito, erguia-se, empertigava-se, cravava nele uns olhos odientos e maus, e saía arrebatadamente do gabinete. Duarte quis chamá-lo, mas o pasmo tolhera-lhe a voz e os movimentos. Quando pôde dominar-se, ouviu o bater do tacão rijo e colérico do dramaturgo na pedra da calçada.

Foi à janela; nada viu nem ouviu; autor e drama tinham desaparecido.

— Por que não fêz ele isso a mais tempo? disse o rapaz suspirando.

O suspiro mal teve tempo de abrir as asas e sair pela janela fora, em demanda do Rio Comprido, quando o moleque do bacharel veio anunciar-lhe a visita de um homem baixo e gordo.

— A esta hora? exclamou Duarte.

— A esta hora, repetiu o homem baixo e gordo, entrando na sala. A esta ou a qualquer hora, pode a polícia entrar na casa do cidadão, uma vez que se trata de um delito grave.

— Um delito!

— Creio que me conhece...

— Não tenho essa honra.

— Sou empregado na polícia.

— Mas que tenho eu com o senhor? de que delito se trata?

— Pouca cousa: um furto. O senhor é acusado de ter subtraído uma chinela turca. Aparentemente não vale nada ou vale pouco a tal chinela. Mas há chinela e chinela. Tudo depende das circunstâncias.

O homem disse isto com um riso sarcástico, e cravando no bacharel uns olhos de inquisidor. Duarte não sabia sequer da existência do objeto roubado. Concluiu que havia equívoco de nome, e não se zangou com a injúria irrogada à sua pessoa, e de algum modo à sua classe, atribuindo-se-lhe a ratonice. Isto mesmo disse ao empregado da polícia, acrescentando que não era motivo, em todo caso, para incomodá-lo a semelhante hora.

— Há de perdoar-me, disse o representante da autoridade. A chinela de que se trata vale algumas dezenas de contos de réis; é ornada de finíssimos diamantes, que a tornam singularmente preciosa. Não é turca só pela forma, mas também pela origem. A dona, que é uma de nossas patrícias mais viajeiras, esteve, há cerca de três anos no Egito, onde a comprou a um judeu. A história, que este aluno de Moisés referiu acerca daquele produto da indústria muçulmana, é verdadeiramente miraculosa, e, no meu sentir, perfeitamente mentirosa. Mas não vem ao caso dizê-la. O que importa saber é que ela foi roubada e que a polícia tem denúncia contra o senhor.

Neste ponto do discurso, chegara-se o homem à janela; Duarte suspeitou que fosse um doudo ou um ladrão. Não teve tempo de examinar a suspeita, porque dentro de alguns segundos, viu entrar cinco homens armados, que lhe lançaram as mãos e o levaram, escada abaixo, sem embargo dos gritos que soltava e dos movimentos desesperados que fazia. Na rua havia um carro, onde o meteram à força. Já lá estava o homem baixo e gordo, e mais um sujeito alto e magro, que o receberam e fizeram sentar no fundo do carro. Ouviu-se estalar o chicote do cocheiro e o carro partiu à desfilada.

— Ah! ah! disse o homem gordo. Com que então pensava que podia impunemente furtar chinelas turcas, namorar moças louras, casar talvez com elas... e rir ainda por cima do gênero humano.

Ouvindo aquela alusão à dama dos seus pensamentos, Duarte teve um calafrio. Tratava-se, ao que parecia, de algum desforço de rival suplantado. Ou a alusão seria casual e estranha à aventura? Duarte perdeu-se num cipoal de conjeturas, enquanto o carro ia sempre andando a todo galope. No fim de algum tempo, arriscou uma observação.

— Quaisquer que sejam os meus crimes, suponho que a polícia...

— Nós não somos da polícia, interrompeu friamente o homem magro.

— Ah!

— Este cavalheiro e eu fazemos um par. Ele, o senhor e eu fazemos um terno. Ora, terno não é melhor que par; não é, não pode ser. Um casal é o ideal. Provavelmente não me entendeu?

— Não, senhor.

— Há de entender logo mais.

Duarte resignou-se à espera, enfronhou-se no silêncio, derreou o corpo, e deixou correr o carro e a aventura. Obra de cinco minutos depois estacavam os cavalos.

— Chegamos, disse o homem gordo.

Dizendo isto, tirou um lenço da algibeira e ofereceu-o ao bacharel para que tapasse os olhos. Duarte recusou, mas o homem magro observou-lhe que era mais prudente obedecer que resistir. Não resistiu o bacharel; atou o lenço e apeou-se. Ouviu, daí a pouco, ranger uma porta; duas pessoas, — provavelmente as mesmas que o acompanharam no carro, — seguraram-lhe as mãos e o conduziram por uma infinidade de corredores e escadas. Andando, ouvia o bacharel algumas vozes desconhecidas, palavras soltas, frases truncadas. Afinal pararam; disseram-lhe que se sentasse e destapasse os olhos. Duarte obedeceu; mas ao desvendar-se, não viu ninguém mais.

Era uma sala vasta, assaz iluminada, trastejada com elegância e opulência. Era talvez sobreposse a variedade dos adornos; contudo, a pessoa que os escolhera devia ter gosto apurado.

Os bronzes, charões, tapetes, espelhos, — a cópia infinita de objetos que enchiam a sala, era tudo da melhor fábrica. A vista daquilo restituiu a serenidade de ânimo ao bacharel; não era provável que ali morassem ladrões.

Reclinou-se o moço indolentemente na otomana... Na otomana! Esta circunstância trouxe à memória do rapaz o principio da aventura e o roubo da chinela. Alguns minutos de reflexão bastaram para ver que a tal chinela era já agora mas que problemática. Cavando mais fundo no terreno das conjeturas, pareceu-lhe achar uma explicação nova e definitiva. A chinela vinha a ser pura metáfora; tratava-se do coração de Cecília, que ele roubara, delito de que o queria punir o já imaginado rival. A isto deviam ligar-se naturalmente as palavras misteriosas do homem magro: o par é melhor que o terno; um casal é o ideal.

— Há de ser isto, concluiu Duarte; mas quem será esse pretendente derrotado?

Neste momento abriu-se uma porta do fundo da sala e negrejou a batina de um padre alvo e calvo. Duarte levantou-se, como por efeito de uma mola. O padre atravessou lentamente a sala, ao passar por ele deitou-lhe a bênção, e foi sair por outra porta rasgada na parede fronteira. O bacharel ficou sem movimento, a olhar para a porta, a olhar sem ver, estúpido de todos os sentidos. O inesperado daquela aparição baralhou totalmente as idéias anteriores a respeito da aventura. Não teve tempo, entretanto, de cogitar alguma nova explicação, porque a primeira porta foi de novo aberta e entrou por ela outra figura, desta vez o homem magro, que foi direito a ele e o convidou a segui-lo. Duarte não opôs resistência. Saíram por uma terceira porta, e, atravessados alguns corredores mais ou menos alumiados, foram dar a outra sala, que só o era por duas velas postas em castiçais de prata. Os castiçais estavam sobre uma mesa larga. Na cabeceira desta havia um homem velho que representava ter cinqüenta e cinco anos; era uma figura atlética, farta de cabelos na cabeça e na cara.

— Conhece-me? perguntou o velho, logo que Duarte entrou na sala.

— Não, senhor.

— Nem é preciso. O que vamos fazer exclui absolutamente a necessidade de qualquer apresentação. Saberá em primeiro lugar que o roubo da chinela foi um simples pretexto...

— Oh! decerto! interrompeu Duarte.

— Um simples pretexto, continuou o velho, para trazê-lo a esta nossa casa. A chinela não foi roubada; nunca saiu das mãos da dona. João Rufino, vá buscar a chinela.

O homem magro saiu, e o velho declarou ao bacharel que a famosa chinela não tinha nenhum diamante, nem fora comprada a nenhum judeu do Egito; era, porém, turca, segundo se lhe disse, e um milagre de pequenez. Duarte ouviu as explicações, e, reunindo todas as forças, perguntou resolutamente:

— Mas, senhor, não me dirá de uma vez o que querem de mim e o que estou fazendo nesta casa?

— Vai sabê-lo, respondeu tranqüilamente o velho.

A porta abriu-se e apareceu o homem magro com a chinela na mão. Duarte, convidado a aproximar-se da luz, teve ocasião de verificar que a pequenez era realmente miraculosa. A chinela era de marroquim finíssimo; no assento do pé, estufado e forrado de seda cor azul, rutilavam duas letras bordadas a ouro.

— Chinela de criança, não lhe parece? disse o velho.

— Suponho que sim.

— Pois supõe mal; é chinela de moça.

— Será; nada tenho com isso.

— Perdão! Tem muito, porque vai casar com a dona.

— Casar! exclamou Duarte.

— Nada menos. João Rufino, vá buscar a dona da chinela.

Saiu o homem magro, e voltou logo depois. Assomando à porta, levantou o reposteiro e deu entrada a uma mulher, que caminhou para o centro da sala. Não era mulher, era uma sílfide, uma visão de poeta, uma criatura divina.

Era loura; tinha os olhos azuis, como os de Cecília, extáticos, uns olhos que buscavam o céu ou pareciam viver dele. Os cabelos, deleixadamente penteados, faziam-lhe em volta da cabeça um como resplendor de santa; santa somente, não mártir, porque o sorriso que lhe desabrochava os lábios, era um sorriso de bem-aventurança, como raras vezes há de ter tido a terra.

Um vestido branco, de finíssima cambraia, envolvia-lhe castamente o corpo, cujas formas aliás desenhava, pouco para os olhos, mas muito para a imaginação.

Um rapaz, como o bacharel, não perde o sentimento da elegância, ainda em lances daqueles. Duarte, ao ver a moça, compôs o chambre, apalpou a gravata e fez uma cerimoniosa cortesia, a que ela correspondeu com tamanha gentileza e graça, que a aventura começou a parecer muito menos aterradora.

— Meu caro doutor, esta é a noiva.

A moça abaixou os olhos; Duarte respondeu que não tinha vontade de casar.

— Três cousas vai o senhor fazer agora mesmo, continuou impassivelmente o velho: a primeira, é casar; a segunda, escrever o seu testamento; a terceira engolir droga do Levante...

— Veneno! interrompeu Duarte.

— Vulgarmente é esse o nome; eu dou-lhe outro: passaporte do céu.

Duarte estava pálido e frio. Quis falar, não pôde; um gemido, sequer, não lhe saiu do peito. Rolaria ao chão, se não houvesse ali perto uma cadeira em que se deixou cair.

— O senhor, continuou o velho, tem uma fortunazinha de cento e cinqüenta contos. Esta pérola será a sua herdeira universal. João Rufino, vá buscar o padre.

O padre entrou, o mesmo padre calvo que abençoara o bacharel pouco antes; entrou e foi direto ao moço, engrolando sonolentamente um trecho de Neemias ou qualquer outro profeta menos; travou-lhe da mão e disse:

— Levante-se!

— Não! Não quero! Não me casarei!

— E isto? disse da mesa o velho, apontando-lhe uma pistola.

— Mas então é um assassinato?

— É; a diferença está no gênero de morte: ou violenta com isto, ou suave com a droga. Escolha!

Duarte suava e tremia. Quis levantar-se e não pôde. Os joelhos batiam um contra o outro. O padre chegou-se-lhe ao ouvido, e disse baixinho:

— Quer fugir?

— Oh! Sim! exclamou, não com os lábios, que podia ser ouvido, mas com os olhos em que pôs toda a vida que lhe restava.

— Vê aquela janela? Está aberta; embaixo fica um jardim. Atire-se dali sem medo.

— Oh! Padre! disse baixinho o bacharel.

— Não sou padre, sou tenente do exército. Não diga nada.

A janela estava apenas cerrada; via-se pela fresta uma nesga do céu, já meio claro. Duarte não hesitou, coligiu todas as forças, deu um pulo do lugar onde estava e atirou-se a Deus misericórdia por ali abaixo. Não era grande altura, a queda foi pequena; ergueu-se o moço rapidamente, mas o homem gordo, que estava no jardim, tomou-lhe o passo.

— Que é isso? perguntou ele rindo.

Duarte não respondeu, fechou os punhos, bateu com eles violentamente nos peitos do homem e deitou a correr pelo jardim fora. O homem não caiu; sentiu apenas um grande abalo; e, uma vez passada a impressão, seguiu no encalço do fugitivo. Começou então uma carreira vertiginosa. Duarte ia saltando cercas e muros, calcando canteiros, esbarrando árvores, que uma ou outra vez se lhe erguiam na frente. Escorria-lhe o suor em bica, alteava-se-lhe o peito, as forças iam a perder-se pouco a pouco; tinha uma das mãos feridas, a camisa salpicada do orvalho das folhas, duas vezes esteve a ponto de ser apanhado, o chambre pegara-se-lhe em uma cerca de espinhos. Enfim, cansado, ferido, ofegante, caiu nos degraus de pedra de uma casa, que havia no meio do último jardim que atravessara.

Olhou para trás; não viu ninguém, o perseguidor não o acompanhara até ali. Podia vir, entretanto; Duarte ergueu-se a custo, subiu os quatro degraus que lhe faltavam, e entrou na casa, cuja porta, aberta, dava para uma sala pequena e baixa.

Um homem que ali estava, lendo um número do Jornal do Comércio, pareceu não o ter visto entrar. Duarte caiu numa cadeira. Fitou os olhos no homem. Era o Major Lopo Alves.

O major, empunhando a folha, cujas dimensões iam-se tornando extremamente exíguas, exclamou repentinamente:

— Anjo do céu, estás vingado! Fim do último quadro.

Duarte olhou para ele, para a mesa, para as paredes, esfregou os olhos, respirou à larga.

— Então! Que tal lhe pareceu?

— Ah! excelente! Respondeu o bacharel, levantando-se.

— Paixões fortes, não?

— Fortíssimas. Que horas são?

— Deram duas agora mesmo.

Duarte acompanhou o major até à porta, respirou ainda uma vez, apalpou-se, foi até à janela. Ignora-se o que pensou durante os primeiros minutos; mas, a cabo de um quarto de hora, eis o que ele dizia consigo: — Ninfa, doce amiga, fantasia inquieta e fértil, tu me salvaste de uma ruim peça com um sonho original, substituís-te-me o tédio por um pesadelo: foi um bom negócio. Um bom negócio e uma grave lição: provaste-me ainda uma vez que o melhor drama está no espectador e não no palco.

Fonte:
http://paginas.terra.com.br/arte/ecandido/mestre26.htm

Jakob Wassermann (1873 - 1934)


Nasceu em Fürth, cidade industrial próxima de Nuremberg, Alemanha, a 10 de março e 1873, e morreu em Alt-Aussee, Áustria, a 1 ° de janeiro de 1934. Filho de modesto comerciante judeu, abandonou cedo a vida comercial imposta pelos pais para participar ativamente da vida alegre e despreocupada de Munique. Sua juventude foi desordenada e aventureira, solitária e difícil. Seus primeiros artigos, contos e novelas foram publicados num semanário ilustrado de Mônaco, Simplicissimus, de orientação polêmica e satírica.


A democracia era para Wassermann a única forma digna da vida humana. Imbuído de cultura alemã, mas consciente de suas origens judaicas, sofreu muito pelo anti-semitismo dos alemães. Com o nazismo, provou o amargor do exílio, sendo igualmente destituído de sua cadeira na Academia Prussiana de Letras. Seu primeiro romance publicado, Os Judeus de Zirndorf (Die Juden von Zirndorf, 1897), trata de um episódio da história dos judeus alemães no século XVII. A preocupação com as tradições judaicas e seu enraizamento na cultura alemã também caracterizaram o conteúdo de seu segundo romance, História da Jovem Renata Fuchs (Geschichte der jungen Renate Fuchs), publicado em 1900.

Com Kaspar Hauser ou A Preguiça do Coração (Kaspar Hauser oder die Trägheit des Herzens, 1903) e O Homenzinho com os Gansos (Das Gänsemännchen, 1915), Wassermann inaugurou a segunda fase de sua carreira, centrada nos problemas morais e na relatividade da justiça pública. Mas foi Christian Wahnschaffe (1918) - romance de inspiração dostoievskiana sobre a luta de um idealista puro contra a corrupção do meio ambiente - que projetou definitivamente seu nome nos centros intelectuais do mundo. Seguiram-se Ulrike Woytich (1923), Faber ou os Anos Perdidos (Faber oder die Ver orenen Jahre, 1924), Laudin e os Seus (Laudin und die Seinen, 1925) e sua indiscutível obra-prima, O Processo Maurizius (Der Fall Maurizius, 1928), história de um erro judiciário e do empenho de um jovem para libertar o homem que seu próprio pai condenara. O romance constitui um soberbo retrato da época da república de Weimar e, segundo Otto Maria Carpeaux, "obra inspirada por um alto senso de justiça fundamentado em seguro conhecimento da causa e dos motivos psicológicos". Jakob Wassermann escreveu ainda: Etzel Andergast (1931), seqüência de O Processo Maurizius, alguns contos notáveis, reunidos no volume O Espelho de Ouro (Der Goldene Spiegel, 1911) e uma autobiografia (Meu Caminho como Judeu e Alemão).

Fontes:
Wassermann, Jakob. O processo Maurizius. Tradução de Octavio de Faria e Adonias Filho. São Paulo: Abril SA, 1982.
http://paginas.terra.com.br/arte/ecandido/jakob2.htm
Foto =
http://www.britannica.com

Jorge Antonio Mendes (O destino chega com o verão)

Olhava as pessoas da sala e parecia que o calor aumentava. Todos estavam furiosos, queixavam-se do calor, de tudo, da vida, inquietos. Um radinho tocava músicas sertanejas e para nos azucrinar mais ainda, também informava a temperatura. Trinta e cinco graus. Tinha vontade de parar de pensar. Sair dali correndo e atirar-me na primeira poça d'água que encontrasse. Beber uma cerveja gelada. Fugir. Levei a mão à nuca, senti o suor correndo, e fiquei assim por algum tempo. Tempo suficiente para lembrar-me da Débora. Os pensamentos surgiram como relâmpagos, onde eu apenas captava o que me interessava e mais me convinha.

Por um momento, tive a sensação que estava deslizando pelo pescoço dela.

Suavemente.

Nem me lembro mais como conheci Débora. Somente sei que foi na festa de passagem do século. Surgiu na minha frente, linda, insinuante, e aquela boate tornou-se pequena para nós. Mas isto não importa muito, pois acho que a coincidência de nosso encontro, talvez não tivesse sido tão coincidente assim. Com os meus 58 anos e ela com 26, formamos um casal que chamava mais atenção pela diferença de idade, do que por outras coisas. Mas a verdade é que me apaixonei. De cara. Era como se tivesse ganhado na loteria, mesmo que não precisasse disto, pois vivia bem financeiramente, desde aquele desfalque que dei na firma... E ela surgiu assim, como um prêmio para mim. Era a juventude vindo ao meu encontro. Como poderia não me apaixonar? Podia resgatar todo um passado de infelicidades amorosas e com uma mulher bem mais nova que eu. Em uma semana estávamos apaixonados. Em um mês achávamos que tínhamos nascido um para o outro. E eu cada vez mais cego para as circunstâncias. Decidimos ir morar numa cidade litorânea. Aluguei uma casa para passarmos o verão. E aí os problemas começaram a surgir. Fazia dois meses que morávamos juntos. Não me importava com o dinheiro que dava para ela. Estava completamente extasiado com aquela mulher que fazia tudo o quê eu queria.

Um dia me falou que um ex-namorado a tinha ameaçado de morte, alguns anos atrás, caso não reatasse o namoro com ele e mostrou-me a ocorrência policial. E ele, agora, voltara e pedia dinheiro para afastar-se, definitivamente, de sua vida. Não dei a quantia que ela pediu, mas a minha desconfiança surgiu intensa. Senti que as coisas não eram tão fáceis assim, como eu estava pensando. E comecei a vigiá-la.

Maldita desconfiança, problema insolúvel e que me persegue eternamente.

Quem procura problemas, sempre acha. Encontrei mais um. Quando descobri que eles estavam armando alguma coisa para mim, fiquei mais atento. Um dia ouvi-a dizer ao seu amigo, no telefone, que estava na hora de dar o golpe no velho. Minha vida mudou. Do amor surgiu o ódio e deste a vingança.

E naquela noite, enquanto explodiam os foguetes na praia, enquanto o calor se fazia eterno, nos amamos, eu acariciando seu corpo, moreno, suado, a mão subindo, chegando ao seu pescoço, acariciei-o suavemente, senti sua carne, vi seus olhos abrindo-se cada vez mais, e fui pressionando o pescoço até não conseguir mais.

Após dois dias, recebi a visita do amigo de Débora, dizendo ter certeza que eu a tinha matado. Olhei, demoradamente, para ele e disse que também tinha certeza que existia uma ocorrência policial de ameaça de morte dele para com ela. Ficamos, por alguns momentos, que pareceram minutos, nos olhando, ele virou-se e foi embora para sempre.

E agora estou aqui, nesta repartição pública, para prestar depoimento sobre o sumiço de Débora. O calor é intenso. Nunca vi um mês de março assim. Vou dizer que não sei o seu paradeiro. Que fomos apenas namorados. Vou falar que este velho aqui, nem imagina onde está a Débora. Velho. Imagina, eu velho? Como fiquei magoado quando ela me chamou de velho. Nestes momentos, tenho tido muita sorte, pois não é a primeira vez que acontece isto e achar desculpas para certos atos é o meu forte. E se um dia a verdade surgir, vou pensar em algo. Até lá, quem sabe, as coisas estejam diferentes em minha vida. Vou arranjar uma namorada de minha idade.

Pelo menos não corro o risco de ser chamado de velho.

— Senhor Valério, pode passar, o delegado quer falar com o senhor.

Entro na sala dizendo:

— Que caloraço, doutor.
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Sobre o Autor
Jorge Antonio Mendes (1957), mora em Novo Hamburgo — RS, onde é comerciante. Tem dois livros publicados: "O Resgate das Ilusões" — novela literária, 1993, e "Objetos de Valor" — contos, 1995. Foi premiado em vários concursos de contos — o primeiro em 1975 — e, desde então, não parou de escrever e de se interessar por literatura.

Fonte:
http://www.releituras.com

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Daniel Piza (Machado de Assis - O pai da prosa brasileira)

Tudo nele tem razão de ser, o que o deixa extremamente alerta para incorporar improvisos

Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) não teve filhos, mas transmitiu às novas gerações o legado de sua obra. É o pai da literatura brasileira e não apenas num gênero, o do romance, principalmente a partir de Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881). É também o pai da crônica - se Rubem Braga foi o príncipe, é porque antes houve um rei -, o pai do ensaio - pois de seu Instinto de Nacionalidade (1873) nasceram os Sérgios Buarques e Antonios Candidos - e o pai do conto - que sua primeira biógrafa, Lúcia Miguel Pereira, considerou exageradamente como o melhor de sua obra. Por isso tudo e mais alguns motivos, ele é, enfim, o pai da prosa brasileira moderna.

Alguns escritores têm jeito, outros têm estilo, disse Graciliano Ramos. E, numa injustiça consigo mesmo, acrescentou que tinha jeito; quem tem estilo, no Brasil, é Machado. Mas, afinal, o que era o estilo de Machado? Estilo não é apenas o conjunto de recursos de linguagem mais utilizados por um escritor; é o uso desses recursos para a expressão articulada de seu ponto de vista único, de sua visão pessoal de mundo. E poucos como Machado lançaram mão de figuras e ritmos com tamanha consciência que não podemos alterar uma vírgula sem prejudicar sua força e integridade. Tudo nele tem razão de ser, o que o deixa extremamente alerta para incorporar improvisos.

Um dos recursos que mais caracterizam a prosa de Machado é a maneira com que usa as metáforas. As metáforas foram usadas e abusadas no romantismo para criar imagens simbólicas que levassem ao que então se chamava de "sublime", a uma intensidade emocional máxima. No Machado maduro, pós-romântico, as metáforas se concretizam ironicamente; voltam do campo idealista para sua materialidade. O exemplo mais famoso é do início de Brás Cubas: "Com efeito, um dia de manhã, estando a passear na chácara, pendurou-se-me uma idéia no trapézio que eu tinha no cérebro. Uma vez pendurada, entrou a bracejar, a pernear, a fazer as mais arrojadas cabriolas de volatim que é possível crer. Eu deixei-me estar a contemplá-la. Súbito, deu um grande salto, estendeu os braços e as pernas, até tomar a forma de um x: decifra-me ou devoro-te."

Outra passagem conhecida em que a meditação desmancha metáforas e mostra ironias é de Dom Casmurro: "Escobar veio abrindo a alma toda, desde a porta da rua até ao fundo do quintal. A alma da gente, como sabes, é uma casa assim disposta, não raro com janelas para todos os lados, muita luz e ar puro. (...) Não sei o que era a minha. Eu ainda não era Casmurro, nem Dom Casmurro; o receio é que me tolhia a franqueza, mas, como as portas não tinham chaves nem fechaduras, bastava empurrá-las, e Escobar empurrou-as e entrou. Cá o achei dentro, cá ficou, até que..."

Não à toa é que Cubas descreve o morrer como "estudar a geologia dos campos santos". As metáforas de Machado servem para desconstruir o comportamento romântico e/ou religioso, devolvendo o símbolo à imagem. Em alguns momentos ele leva o jogo com as metáforas a tal ponto que é capaz de criar um diálogo entre dois burros sobre o bonde elétrico (em crônicas) ou mostrar Deus e o Diabo conversando sobre a ópera que fariam em parceria (Dom Casmurro) ou fazer a célebre história em que agulha e linha trocam opinião sobre seus papéis morais (no conto Um Apólogo). Se Machado escreve alegorias, não é para fins edificantes ou barrocos, mas inspirado na literatura satírica iluminista de autores como Voltaire e Diderot.

Na mesma linha entram suas paródias e citações da Bíblia. Machado escreveu paródia do Sermão das Montanhas ("Bem-aventurados os que não descem"), citou o Eclesiastes em muitas ocasiões como no capítulo final de Dom Casmurro, satirizou o clero em figuras como a do padre glutão do mesmo livro. Outras crenças foram ironizadas, como o espiritismo e o hipnotismo. As menções eruditas - a pensadores, romancistas, músicos e personagens históricos - também são comuns, mas nunca como recurso "de autoridade", para dar verniz sofisticado à história. Quando o Conselheiro Aires escreve em seu Memorial que releu Shelley e Thackeray e que "um consolou-me do outro, este desenganou-me daquele; é assim que o engenho completa o engenho, e o espírito aprende as línguas do espírito", deixa claro o contraste entre romantismo e realismo que está na raiz das preocupações literárias de Machado.

Outra figura tipicamente machadiana é o "understatement", o modo como diz coisas importantes sem parecer que as diz. Casmurro, o narrador, é mestre nisso. Quando conta que depois do casamento com Capitu vive "dias de felicidade e glória" e que "ao fim de dois anos de casado, salvo o desgosto grande de não ter um filho, tudo corria bem", o leitor atento percebe: como é que tudo pode correr tão gloriosamente se existe um desgosto grande? Casmurro conta isso entre vírgulas, num aposto, como se fosse algo secundário na frase e em sua vida. Mas sabemos que não é. E Machado lida como ninguém com as expectativas do leitor, com as informações que lhe dá ou deixa de dar - ou então dá sem a devida hierarquia, sem a corriqueira explicitude.

Há uma série de modos que Machado usa para fazer suas descrições mais sugestivas, sombrias, ambíguas. Um deles, pouco analisado, é a própria construção sintática. Um exemplo excelente de Brás Cubas está no capítulo do delírio, outra grande metáfora ou alegoria desfeita pela ironia. É quando Pandora diz: "Levo na minha bolsa os bens e os males, e o maior de todos, a esperança, consolação dos homens. Tremes?". Ao usar "o maior de todos", Machado nos levanta a dúvida: maior de todos os bens ou maior de todos os males - ou de ambos? O mesmo vale para o último capítulo, Das Negativas, quando, depois de enumerar derrotas e consolos de sua biografia, o defunto Cubas diz: "Ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas." Cabe ao leitor julgar se esse pequeno saldo é positivo ou negativo.

Com essas maneiras peculiares de aplicar metáforas, paródias, apostos e ambigüidades, Machado queria justamente fugir às dicotomias. Não só aquelas vigentes em seu tempo e lugar, mas também as eternas dicotomias, a "eterna contradição humana" - entre bem e mal, alma e corpo, etc. Isso, no entanto, não significava ficar em cima do muro ou buscar um meio-termo confortável, conformista; muito ao contrário. Para ir além das dualidades banais, Machado precisou explorar o idioma em toda sua complexidade, o que só é possível para quem o tem como orgânico e elástico, não como algo congelado em dicionários.

Outro dilema que Machado superou, em conseqüência disso, foi aquele entre norma culta e norma coloquial. Ele fez uma grande e criteriosa mistura entre ambas. Para entender como escreveu de modo mais próximo da fala, sem pompas, sem academicismos, basta comparar qualquer página sua com a de um contemporâneo que por sinal admirava, Coelho Neto. Até hoje lingüistas reagem à falta de purismo de Machado. Olhando o mundo como olhava, não poderia ser diferente. Machado era um crítico das ilusões de pureza, de plenitude, de totalidade, de conciliação perfeita dos contrários. Esse é seu maior assunto

É por isso tudo que escreve frases como "Dessa terra e desse estrume nasceu esta flor". Ou que usa num mesmo parágrafos termos "nobres" como "perpetuidade" e termos "chulos" como "jururu". Ou que Cubas confessa que em seu cérebro "cruzavam-se pensamentos de vária casta e feição". E acrescenta: "Não havia ali a atmosfera somente da águia e do beija-flor; havia também a da lesma e do sapo." Essa mescla de registros, tão mal compreendida até hoje, é seu maior trunfo lingüístico. É com ela que Machado consegue criar a "simultaneidade" de naturezas que Pascal não admitia.

Antipuritano, Machado também "suja" o texto com uma variedade enorme de sinais gráficos; sua pontuação não exclui nada, os dois pontos, o travessão, o ponto-e-vírgula, a exclamação, as reticências... Seus períodos podem ser tão curtos quanto uma palavra ou tão extensos quanto um parágrafo. E em geral há um contraponto entre breves e longos: "Não havia lua; mas nossa amiga aborrecia a lua - não se sabe bem por quê -, ou porque brilha de empréstimo, ou porque toda a gente a admira, e pode ser que por ambas as razões. Era uma de suas esquisitices" (Trio em Lá Menor).

Poeta e dramaturgo frustrado, Machado soube dar novo uso a esse aprendizado juvenil. Seu ouvido para as palavras é excelente, como se vê nos trechos em que dá voz romântica aos narradores: "Vi-a sair de uma cadeirinha, airosa e vistosa, um corpo esbelto, ondulante, um desgarre, alguma cousa que nunca achara nas mulheres puras." Seus adjetivos nunca são redundantes, nunca usados somente para completar a métrica. E o teatro aparece nos enredos ou em cenas específicas, como aquela em que Bentinho desvia a atenção de José Dias dizendo que o botão de sua calça está aberto - e que soa extraída de uma comédia de salão como as que Machado escrevera aos 20 e poucos anos.

É também para não cair em dualidades que Machado usa com freqüência expressões como "sem... nem..." ou "nem... nem..." ou "mas também". Em Dom Casmurro, por exemplo, o narrador descreve sua vida pós-Capitu como "sem encantos nem espinhos", o que quer dizer que o problema de Bento era acreditar que existem encantos sem espinhos, homem iludido e covarde que é, sempre pronto a acreditar em sua própria felicidade. E, quando ele sente ciúme dos braços de Capitu, ela os veste com um tecido "que não cobria nem descobria inteiramente". Nos contos, os exemplos também são muitos: "Nem entusiasmo nas primeiras horas, nem horror depois da primeira semana; algum prazer e certo fastio" (Um Homem Célebre); "Não se pode dizer que era bonita; mas também não era feia" (Uns Braços).

Machado também não respeita a pureza dos gêneros, o que explica que tenha sido pai da prosa brasileira em quase todos eles. Seus romances têm passagens que poderiam ser destacadas e publicadas isoladamente como crônicas (a exemplo do capítulo da Confeitaria do Custódio em Esaú e Jacó) ou contos (História de Dona Plácida em Brás Cubas). Escritor elíptico, que deixa lacunas no texto em vez de trabalhar por acumulação (como um Eça de Queirós trabalhava), ele adota formas fragmentárias, principalmente os capítulos curtos. Cada um, por sinal, na linha de Cervantes e Sterne, tem seu título, muitas vezes contendo uma auto-referência irônica.

Os nomes dos personagens tampouco são casuais. A mãe de Bento se chama Glória, a "santíssima", segundo o superlativo que o filho poria em sua lápide. Capitu na verdade se chama Capitolina, aquela que na Roma Antiga era capaz de convencer os outros de sua suposta inocência pelas artimanhas do discurso. O compositor que não consegue ir além das polcas em Um Homem Célebre se chama Pestana. Cubas, na terceira acepção do dicionário Houaiss, significa um sujeito malandro, esperto, dado a fantasia. Pedro é o irmão monarquista do republicano Paulo em Esaú e Jacó. O alferes de O Espelho se chama Jacobina. Por tática simbólica ou humorística, os nomes sempre são significativos.

Foi com a filosofia e o humor que Machado superou a ficção romântica sem aderir aos dogmas do realismo. O idioma foi o maior beneficiado. O que Machado tem, afinal, é o dom de fazer frases: "Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada mais." Como as pessoas que escrevem em inglês não conseguem esquecer a música das palavras de Shakespeare, nós que escrevemos em português - mesmo inconscientemente - temos uma dívida com Machado a cada período. Cromático e sintético, seu estilo é inspirador, mas inimitável; modelar, mas único. Como são os melhores pais.

Fontes:
http://www.sorocult.com , extraído do Jornal A Folha de São Paulo on line
Caricatura = http://fragacaricaturas.blogspot.com

Augusto dos Anjos (Santuário Poético)

A esmola de Dulce
Ao Alfredo A.

E todo o dia eu vou como um perdido
De dor, por entre a dolorosa estrada,
Pedir a Dulce, a minha bem amada,
A esmola dum carinho apetecido.

E ela fita-me, o olhar enlanguescido,
E eu balbucio trêmula balada:
- Senhora, dai-me u’a esmola - e estertorada
A minha voz soluça num gemido.

Morre-me a voz, e eu gemo o último harpejo,
Estendo à Dulce a mão, a fé perdida,
E dos lábios de Dulce cai um beijo.

Depois, como este beijo me consola!
Bendita seja a Dulce! A minha vida
Estava unicamente nessa esmola.
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A esperança

A Esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença.
Vão-se sonhos nas asas da Descrença,
Voltam sonhos nas asas da Esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito,
Sirva-te a crença de fanal bendito,
Salve-te a glória no futuro - avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,
Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da morte a me bradar: descansa!
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A dança da psiquê

A dança dos encéfalos acesos
Começa. A carne é fogo. A alma arde. A espaços
As cabeças, as mãos, os pés e os braços
Tombara, cedendo à ação de ignotos pesos!

É então que a vaga dos instintos presos
— Mãe de esterilidades e cansaços —
Atira os pensamentos mais devassos
Contra os ossos cranianos indefesos.

Subitamente a cerebral coréa
Pára. O cosmos sintético da Idéa
Surge. Emoções extraordinárias sinto...

Arranco do meu crânio as nebulosas.
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!
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A floresta

Em vão com o mundo da floresta privas!...
- Todas as hermenêuticas sondagens,
Ante o hieróglifo e o enigma das folhagens,
São absolutamente negativas!

Araucárias, traçando arcos de ogivas,
Bracejamentos de álamos selvagens,
Como um convite para estranhas viagens,
Tornam todas as almas pensativas!

Há uma força vencida nesse mundo!
Todo o organismo florestal profundo
É dor viva, trancada num disfarce...

Vivem só, nele, os elementos broncos,
- As ambições que se fizeram troncos,
Porque nunca puderam realizar-se!
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A fome e o amor

A um monstro

Fome! E, na ânsia voraz que, ávida, aumenta,
Receando outras mandíbulas a esbangem,
Os dentes antropófagos que rangem,
Antes da refeição sanguinolenta!

Amor! E a satiríasis sedenta,
Rugindo, enquanto as almas se confrangem,
Todas as danações sexuais que abrangem
A apolínica besta famulenta!

Ambos assim, tragando a ambiência vasta,
No desembestamento que os arrasta,
Superexcitadíssimos, os dois

Representam, no ardor dos seus assomos
A alegoria do que outrora fomos
E a imagem bronca do que inda hoje sois!
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A idéia

De onde ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites duma gruta?!

Vem da psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!

Vem do encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida às cordas do laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica ...

Quebra a força centrípeta que a amarra,
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No mulambo da língua paralítica
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A ilha de Cipango

Estou sozinho! A estrada se desdobra
Como uma imensa e rutilante cobra
De epiderme finíssima de areia...
E por essa finíssima epiderme
Eis-me passeando como um grande verme
Que, ao sol, em plena podridão, passeia!

A agonia do sol vai ter começo!
Caio de joelhos, trêmulo... Ofereço
Preces a Deus de amor e de respeito
E o ocaso que nas águas se retrata
Nitidamente reproduz, exata,
A saudade interior que há no meu peito.

Tenho alucinações de toda a sorte...
Impressionado sem cessar com a Morte
E sentindo o que um lázaro não sente,
Em negras nuanças lúgubres e aziagas
Vejo terribilíssimas adagas,
Atravessando os ares bruscamente.

Os olhos volvo para o céu divino
E observo-me pigmeu e pequenino
Através de minúsculos espelhos.
Assim, quem diante duma cordilheira,
Pára, entre assombros, pela vez primeira,
Sente vontade de cair de joelhos!


Soa o rumor fatídico dos ventos,
Anunciando desmoronamentos
De mil lajedos sobre mil lajedos...
E ao longe soam trágicos fracassos
De heróis, partindo e fraturando os braços
Nas pontas escarpadas dos rochedos!

Mas de repente, num enleio doce,
Qual se num sonho arrebatado fosse,
Na ilha encantada de Cipango tombo,
Da qual, no meio, em luz perpétua, brilha
A árvore da perpétua maravilha,
A cuja sombra descansou Colombo!

Foi nessa ilha encantada de Cipango,
Verde, afetando a forma, de um losango,
Rica, ostentando amplo floral risonho,
Que Toscanelli viu seu sonho extinto
E como sucedeu a Afonso Quinto
Foi sobre essa ilha que extingui meu sonho!

Lembro-me bem. Nesse maldito dia
O gênio singular da Fantasia
Convidou-me a sorrir para um passeio.
Iríamos a um país de eternas pazes
Onde em cada deserto há mil oásis
E em cada rocha um cristalino veio.

Gozei numa hora séculos de afagos,
Banhei-me na água de risonhos lagos,
E finalmente me cobri de flores...
Mas veio o vento que a Desgraça espalha
E cobriu-me com o pano da mortalha,
Que estou cosendo para os meus amores!

Desde então para cá fiquei sombrio!
Um penetrante e corrosivo frio
Anestesiou-me a sensibilidade
E a grandes golpes arrancou as raízes
Que prendiam meus dias infelizes
A um sonho antigo de felicidade!

Invoco os Deuses salvadores do erro.
A tarde morre. Passa o seu enterro!...
A luz descreve ziguezagues tortos
Enviando à terra os derradeiros beijos.
Pela estrada feral dois realejos
Estão chorando meus amores mortos!

E a treva ocupa toda a estrada longa...
O Firmamento é uma caverna oblonga
Em cujo fundo a Via-Láctea existe.
E como agora a lua cheia brilha!
Ilha maldita vinte vezes a ilha
Que para todo o sempre me fez triste!
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A lágrima

- Faça-me o obséquio de trazer reunidos
Cloreto de sódio, água e albumina...
Ah! Basta isto, porque isto é que origina
A lágrima de todos os vencidos!

-"A farmacologia e a medicina
Com a relatividade dos sentidos
Desconhecem os mil desconhecidos
Segredos dessa secreção divina"

- O farmacêutico me obtemperou. -
Vem-me então à lembrança o pai Yoyô
Na ânsia física da última eficácia...

E logo a lágrima em meus olhos cai.
Ah! Vale mais lembrar-me eu de meu Pai
Do que todas as drogas da farmácia!
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In "Augusto dos Anjos: Poesia e Prosa", de Zenir Campos Reis, Ed. Ática, São Paulo, 1977.
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A louca
A Dias Paredes

Quando ela passa: - a veste desgrenhada,
O cabelo revolto em desalinho,
No seu olhar feroz eu adivinho
O mistério da dor que a traz penada.

Moça, tão moça e já desventurada;
Da desdita ferida pelo espinho,
Vai morta em vida assim pelo caminho,
No sudário de mágoa sepultada.

Eu sei a sua história. - Em seu passado
Houve um drama d’amor misterioso
- O segredo d’um peito torturado -

E hoje, para guardar a mágoa oculta,
Canta, soluça - coração saudoso,
Chora, gargalha, a desgraçada estulta.
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A luva
Para o Augusto Belmont

Pensa na glória! Arfa-lhe o peito, opresso.
-O pensamento é uma locomotiva-
Tem a grandeza duma força viva
Correndo sem cessar para o Progresso.

Que importa que, contra ele, horrendo e preto
O áspide abjeto do Pesar se mova!...
E só, no quadrilátero da alcova,
Vem-lhe à imaginação este soneto:

"A princípio escrevia simplesmente
Para entreter o espírito...Escrevia
Mais por um impulso de idiosincrasia
Do que por uma propulsão consciente.

Entendi, depois disso, que devia,
Como Vulcano, sobre a forja ardente
Da Ilha de Lemnos, trabalhar contente,
Durante as vinte e quatro horas do dia!

Riam de mim, os monstros zombeteiros,
Trabalharei assim dias inteiros,
Sem ter uma alma só que me idolatre...

Tenha a sorte de Cícero proscrito
Ou morra embora, trágico e maldito,
Como Camões morrendo sobre um catre!"

Nisto, abre, em ânsias, a tumbal janela
E diz, olhando o céu que além se expande:
"-A maldade do mundo é muito grande,
Mas meu orgulho ainda é maior do que ela!

Ruja a boca danada da profana
Coorte dos homens, com o seu grande grito,
Que meu orgulho do alto do Infinito
Suplantará a própria espécie humana!

Quebro montanhas e aos tufões resisto
Numa absoluta impassibilidade",
E como um desafio à eternidade
Atira a luva para o próprio Cristo!

Chove. Sobre a cidade geme a chuva,
Batem-lhe os nervos, sacudindo-o todo,
E na suprema convulsão o doudo
Parece aos astros atirar a luva!
Fonte:
Soares Lustosa. In Jornal de Poesia.
http://www.secrel.com.br

Palavras e Expressões mais Usuais do Latim e de outras Línguas Estrangeiras

Letra B.
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Abreviações:
Lat = latim; fr = francês; ing = inglês; Dir = direito; esp = espanhol; gr = grego

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baby
ingl Bebê; criança de peito.

beati pauperes spiritu
lat Bem-aventurados os pobres de espírito. Primeira das bem-aventuranças evangélicas citada por São Mateus no capítulo V, versículo 3, e que inicia o sermão da montanha. No contexto do Evangelho significa: Bem-aventurados os simples.

beati possidentes
lat Felizes os que estão de posse. Locução celebrizada por Bismarck, que adotou a política do fato consumado como fonte de direito.

bella matribus detestata
lat As guerras detestadas pelas mães. (Horácio, Odes, 11, 24-25).

benedicite
lat Rel Catól Bendizei. Invocação ritual, antes das refeições, que começa por esta palavra. Usada principalmente em conventos, comunidades religiosas e colégios.

bis dat qui cito dat
lat Dá duas vezes quem dá prontamente. Sêneca elogia a espontaneidade das dádivas.

bis de eadem re non sit actio
lat Dir Não haja dupla ação sobre a mesma coisa. V litispendência.

bis repetita placent
lat As coisas repetidas agradam. Horácio refere-se ao emprego de figuras literárias repetidas quando bem aplicadas.

bona fide
lat De boa fé: Enganar-se, proceder bona fide.

bon mot
fr Boa palavra; dito divertido.

bon ton
fr Bons modos; boas maneiras.

bonum vinum laetificat cor hominis
lat O bom vinho alegra o coração do homem. Modificação do texto do Eclesiástico XL, 20, cujas palavras são: Vinum et musica laetificant cor (o vinho e a música alegram o coração).

bout d'essai
fr Ponta de experiência. Cinema. Pequena parte final do filme que o assistente operador corta e revela imediatamente para orientação da tomada da cena seguinte.

bye-bye
ingl Adeus, adeusinho.

Fonte:
http://www.portrasdasletras.com.br

Erivelto Oliveira de Sales (Só um cadinho de prosa...)

No principiozinho criou nosso Sinhozinho o ceuzinho e a terrinha, mas elazinha num tinha nadinha de nada. Já imaginou se Moisés tivesse escrito o Pentateuco todo no diminutivo? Bem, que mal teria? Nenhumzinho, penso eu. Afinal, é uma belezinha essa tal linguagem diminuta, sim? A própria Bíblia, em 2 Samuel, 12:3, usa algumas palavrinhas assim: (...) mas o pobre não tinha coisa nenhuma, senão uma cordeirinha... Além de se valer da expressão pequenino noutras passagens. Ora, para alguns religiosos o Padre Cícero não é Padinciço?

Os Diminutivos servem para agradar... Deixa eu te fazer um cafunezinho, meu amorzinho! Elogiando: Que feijãozinho bom! Ô coisinha tão bonitinha do papai! Ironizando ou desmerecendo algo ou alguém: Olha só que carrinho mais sem graça! (na verdade é um carrão). Seu penteado está uma gracinha! Só se for o penteado da Medusa. Abreviando: Aguarde só um segundinho! Essa é uma das mentirinhas mais deslavadas que eu conheço. Por que eles não dizem logo pra esperar Um Minutão? Espera só um pouquinho... O pouquinho (un petit peu, em francês) são eternidades. Amenizando: A injeção vai doer só um tiquinho... Nesse caso, nem o diminutivo vai te livrar da dorzinha...

O poetinha Vinicius de Moraes usava essa sutilidade para fazer amizades mais rapidinho. Chamava seus parceiros musicais de Tonzinho (Tom Jobim), Carlinhos (Carlos Lyra), Eduzinho (Edu Lobo), e o Toquinho, que já era diminuto, ele o chamava de Toco! Carlinhos Lyra, quando conversou com o poetinha pela primeira vez, pediu que Vinicius colocasse umas letrinhas em suas músicas. Estava feita a parceria...

Guimarães Rosa adorava uma diminutância. Repare o nome da personagem Miguilim. O nome é Miguel, e o mais comum é que se usasse Miguelzinho. Mas o Rosa preferia o sufixo im em vez de inho, inha, zinho, zinha. Daí beijim, passarim, cabelim, partim, sozim, lugarim et cetera. Miguilim é a estória de um garotinho de oito anos, nascido e crescido num lugarzinho do interior de Minas, em plena fase das descobertas da visão do mundo. O poeta e crítico Augusto de Campos escreveu sobre esse pormenor na obra do Rosa no livro Guimarães Rosa em Três Dimensões.

Agora, se você pegar o Grande Sertão: Veredas... Ali Rosa criou diminutivos antológicos. Minha amiga Dricca está lendo a fabulosa aventura de Riobaldo, e tenho certeza de que ela está se deliciando com coisas assim: miúdo satanazim/ pois essezinho, essezim/ de pouquinho em pouquim/ bala é um pedacinhozinho de metal/ sozinhozinho/ de manhãzim/ mindinhas idéias/ o rio Soninho/ veredazinhas e veredinhas/ ave-mariazinha/ os finos ventos maiozinhos/ tolicezinhas/ as arvoreszinhas ruim-inhas de minhas... E, a minha preferida: o Brejinho-do-Brejo!

Curt Meyer-Clason, o tradutor alemão de Rosa, em carta ao próprio, revela a impossibilidade da tradução: O alemão tornou-se um idioma duro e sem coração. Os diminutivos são usados por aqui quase que tão-somente no sentido irônico (...) Qual a sua opinião, por que esta aversão contra os diminutivos: o medo atroz de Witsch (o editor alemão) de que os leitores iriam rir dele vendo-o como um pequeno burguês sentimentalóide e um reacionário? (02/04/1965).

No Japão, um país em diminutivo, segundo contou minha amiga Erikinha, é assim: pequeno = chiisai / osanai (infantil) / hikui, kogara (na estatura) / mini = kogata no. (Em alguns casos eles usam a palavra estrangeira adaptada, ex.: mini sukato, para mini saia/ mínimo = saisho no, motto mo chiisai/ miúdo = goku chiisai, komakai. Tá entendido? E no Tupi, como é? Os sufixos usados são o –im e o –i. É assim: pedra é itá, pedrinha é itá–‘im; criança é pitanga, criancinha é pitang-‘im; além do adjetivo mirim: ‘y é rio, e ‘y-mirim é riozinho. Lindinho, sim?

Já ouviu expressões como andandinho, correndinho, comendinho, bebendinho e chovendinho? Pois é, o uso dessas formas peculiares, em que o verbo é flexionado, é comum para pessoas de algumas cidades do interior, como Capão Bonito (não é, Dricca?), Capela do Alto e Porangaba. Em Sorocaba e Votorantim também. Mas é novo? Olhe, lá no poema Cobra Norato (1931), do Raul Bopp, está assim: Quero estarzinho com ela/ Querzinho de ficar junto.

E por falar em cidades... Dê só uma espiadinha nesses nomezinhos: Alagoinha (PB, PE, PI, BA); Barreirinha (AM); Barroquinha (CE); Brejinho (PE) e Brejão, também em PE; Chopinzinho (PR); Chorozinho (CE); Lavrinhas (SP) e Lavras (MG); Matão (SP) e Matinhos (PR); e Comercinho, Porteirinha, Riachinho e Ressaquinha, todas da minha queridinha Minas Gerais. Uai, eu sou mineiro! Mineirinho!

Fonte:
Grupo Sorocult (Sorocaba/SP).
http://www.sorocult.com

Erivelto Oliveira de Sales (Balzaquiana, eu?)

Abracadabra! As palavras têm poderes, sim senhora. A escrita egípcia hieroglífica é um notável exemplo etimológico. Hieróglifo é um nome composto por hieros, a escrita, e gluphein, ou seja, gravar. Logo, a arte sagrada de gravar (na pedra). Escrita dos deuses. Os egípcios tinham até um deus da escrita, Thot.

Abre-te, Sésamo! A expressão mágica faz parte das Mil e Uma Noites, proferida por Ali Babá para abrir a porta da caverna e encontrar um tesouro. Quantas palavras já foram usadas com poderes sobrenaturais por toda a história? Fiat Lux! Deus disse, e a luz apareceu. No livro de Hebreus, 4:12, diz assim: Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração.

Na literatura há inúmeros exemplos em que a palavra é um instrumento poderoso, podendo ser usada para o bem e para o mal. Clarice Lispector escrevia inebriada pela ação da palavra: Nunca esquecer que a palavra é fruto da palavra. A palavra tem que se parecer com a palavra. Atingi-la é o meu primeiro dever para comigo. E a palavra não pode ser enfeitada e artisticamente vã, tem que ser apenas ela.

No livro Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, há um conto chamado Famigerado. É uma aula do Mestre Rosa para quem quiser se deleitar com os efeitos, tramas, suspenses, humores e desenlaces a partir de uma palavra não assimilada, não compreendida, não captada. A dedução, muito comum em leituras de todo naipe, é astuta e oscilante. Acatafásica pode ser um elogio ou uma ofensa à leitora. Que fazer? Apelar para um sétimo sentido feminino dedutível? Convém ir ao dicionário, pois do contrário... Bem, do contrário, você terá que se contentar com sua imaginação. Ou morrer com a dúvida. As palavras também são traiçoeiras. Será?

Valdevinos? Só pode ser nome de gente, desde que tirando o s. Vovô Valdevino! Nada mal. Ou quem sabe será o nome de uma tribo indígena nalgum canto remoto do Brasil? Ou uma grife italiana. Ou uma porção de alguma espécie de molusco. Balabrega? Essa é fácil: uma bala que é vendida na Feira da Barganha, vinda do Paraguay, bem ruizinha de chupar. Ou uma corruptela para Uma Balada Brega, como me disse uma aluna.

Mirmecófago é um túmulo moderno. Antigamente chamava-se sarcófago. Ou será um instrumento cirúrgico usado em clínicas de alto padrão? Quiasma? Trata-se de uma interjeição vinda do português de Portugal. Quicuio? Claro que também é uma interjeição, mas de baixo calão. Mixteque? Mix quer dizer mistura. O teque deve ser uma bebida exótica. Mistura de Bebida Exótica! Renrém é o barulho que as ocas fazem quando o índio e a indiazinha conversam à noite. Weltanschauung é espirro, em alemão. O nosso Atchim!

Choutear era o verbo para chutar, usado no futebol do século 19. Aí o técnico gritava para o artilheiro fominha: Chouteia logo essa pelota pro gol! Xantorréia? Essa não é fácil... Ah, sim, é um tratamento contra a seborréia (ou a diarréia) a partir de Xampus. Zeribando é o sujeito que está no vermelho, sem vintém. Ou uma expressão para um bando que acabou. Alopatia? A mais fácil de todas! O mesmo que Alopamãe, Alopopai, Alopavó, Alopoamor... Essa até a Balzaquiana saberia responder...

Utopia é o nome para um exame médico complexo, segundo um aluno meu. Leréia é o nome de uma prima do interior com quem a gente brincava de oftalmologista. Borrasca é a pronúncia para borracha, só que em russo. Despostigar é um verbo da primeira conjugação usado em cerimônias militares para descansar a tropa perante o general. Ferrabrás é o nome da primeira empresa de trem de Sorocaba. Exornado é o sujeito que foi expulso de algum lugar. Atávico é quem sofre do Mal de Atávia, doença degenerativa que impede a pessoa de pronunciar as vogais. Haliêutica e Ludopédio são palavras que Sir Ricardón adora ouvir.

Então, minha pacóvia leitora, você vai ou não dormir com o dicionário a partir de agora? Cuidado com as pseudo-induções. Ao menos você sabe quem foram Viterbo, Morais, Aurélio e Hoauiss, yes?

Fonte:
Grupo Sorocult (Sorocaba/SP).
http://www.sorocult.com

Erivelto Oliveira Sales (1976)

(autobiografia)

É mineiro de Três Corações. Nasceu no Hospital São Sebastião, no dia 30 de janeiro de 1976. É aquariano, mas acredita em signos superficialmente. Ou, só o suficiente. Em Elohin, que é Deus, ele crê profundamente.

É graduado em Letras Português pela Uniso, Sorocaba, desde 2005, quando findou o curso, e desde 2006, quando eliminou as parcelas pendentes. É cronista. Sobretudo intertextual. Gosta de ser chamado de Cronista. Mas já ganhou um concurso de poesia, o que lhe dá um leve e despretensioso constrangimento. Pois poesia não é para os jovens: porque sei que a filosofia não é para os jovens/ e a poesia (para mim) vai ficando cada vez mais parecida com a filosofia... Haroldo de Campos, em meninos eu vi.

Gosta de citar Haroldo de Campos, Guimarães Rosa, e Millôr Fernandes. Considera-se um humorista em fase experimental por toda a vida. Aprecia música. Aprecia mais ainda o silêncio, até porque, como já se disse: o silêncio proposital dá a maior possibilidade de música... (Guimarães Rosa).

Atualmente trabalha numa indústria química, lecionando Português e Literatura Brasileira aos colegas de trabalho (informalmente – ou às escondidas). Espera que o governo estadual tome tento e dê um ou mais bastas para a saúde da educação brasileira e abra logo de uma vez concursos para professores efetivos. Que história é esta de dar aula como eventual?

É casado com Andréia. Ainda não tem filhos, pois acredita que dias piores virão. Também não tem cachorro, gato, papagaio ou passarinho. No entanto, pretende comprar uma calopsita para sua esposa, presente de aniversário de casamento.

Não assiste a futebol há mais de uma década. E gostaria de, sinceramente, não precisar mais colocar esse a preposicionado aí antes de futebol.

É Cronista Intertextual, Leitor Insipiente de Dicionários e Poeta em estado de pedra.

Fonte:
Grupo Sorocult (Sorocaba/SP).
http://www.sorocult.com

Expo Literária de Sorocaba – 2008”

Mário Prata, Gabriel Pensador, Arnaldo Antunes e Ziraldo, entre outros nomes de grande expressão na área de literatura e fomentação cultural, vão rechear a 2ª Expo Literária da Prefeitura de Sorocaba. A programação completa do evento foi anunciada na manhã desta segunda-feira (6), no Palacete Scarpa/Secretaria da Cultura, pelo prefeito de Sorocaba (veja a lista de eventos no arquivo abaixo, emSumário Executivo).

"O evento é uma grande oportunidade de, cada vez mais, valorizarmos e incentivarmos leitura do sorocabano, principalmente de nossas crianças e adolescentes", destacou o prefeito, lembrando ainda que, neste ano, o evento homenageia os cem anos de nascimento de Machado de Assis.

Acompanhado pelos secretários da Cultura e da Educação, ele explicou que a Expo Literária de Sorocaba acontecerá nos dias 30 e 31 de outubro e 1º de novembro na Biblioteca Municipal. Dividida em três tendas (Machado de Assis, Dom Casmurro e Iaiá Garcia), a mostra reunirá nada menos do que 48 atrações, entre bate-papo com escritores, contação de histórias, palestras e recreações.

Com a instalação de tendas, espaços para exibição de filmes e shows, a Biblioteca Municipal irá dispor de várias opções para o visitante conferir as novidades literárias e se interagir com os autores convidados e também os escritores locais.

A abertura oficial da 2ª Expo Literária de Sorocaba está agendada para o dia 29, às 19h, com a palestra "Aprendendo e Empreendendo", a ser proferida pelo consultor Fernando Dolabela. Informações pelo telefone 3228.1955.
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No dia 13 de setembro de 2008, no auditório da Biblioteca Municipal, aconteceu uma reunião com vários escritores sorocabanos com as organizadoras da próxima Expo Literária, Tânia Kalil e Margareth Moreno Comitre Silveira responsáveis pela Biblioteca, que falaram sobre como será a próxima Expo, que será realizada nos dias

- 30, 31 de outubro de 2008 das 8h às 20h30 e
- 01 de novembro de 2008 das 10h às 16h30.

Durante a reunião comunicaram aos presentes que os escritores interessados em participar do evento deverão comparecer à biblioteca para se inscreverem. Disseram que os mesmos poderão participar de duas maneiras: apenas colocando seus livros à venda ou também se utilizando dos espaços oferecidos pelo evento para que mostrarem seus trabalhos de forma ativa e também para fazerem lançamentos de seus livros.

O que é a "Expo Literária de Sorocaba"

A “Expo” é uma realização da Prefeitura Municipal de Sorocaba através da união das forças da Secretaria da Cultura e da Educação. Ela nasceu em 2007 da união dos trabalhos destas secretarias com os escritores da cidade de Sorocaba, que deram corpo e alma ao evento no ano de sua criação.

Todo o custo do evento é patrocinado pelas duas secretarias e nasceu para dar amplo espaço para as questões literárias no geral e para divulgar a literatura local e seus escritores, desejando ser um espaço único e especial dentro da área literária e cultural.

A “Expo Literária de Sorocaba – 2007” foi marcada pela alegria da criação e realização, já que escritores e entidades literárias da cidade se deram as mãos para que um projeto audacioso, importante e necessário para a cidade de Sorocaba fosse posto em prática. Assim, o Secretário da Cultura, Sr Anderson Santos, fez acontecer o que há muito tempo era sonhado pela classe literária da cidade.

Podem participar expondo e vendendo seus livros, apenas os escritores sorocabanos, mas o evento reúne também vários escritores da região, muitos deles também colunistas do site Sorocult.

A Expo oferece palestras com escritores locais e outros bastante conhecidos no cenário literário nacional. Oferece saraus apresentados pelas entidades literárias da cidade, exposição de trabalhos artísticos, atividades educativas infantis e favorece amplo espaço para bate-papos entre os escritores.

Sobre a “Expo Literária de Sorocaba – 2008”

Já estão abertas as inscrições para os escritores que queiram participar da próxima Expo. O tema deste ano foi escolhido para homenagear o centenário da morte de um dos maiores escritorres brasileiros, Machado de Assis.

A organização do evento comunicou que neste ano todo o evento acontecerá fora do espaço físico da Biblioteca Municipal sendo que apenas o auditório dela será utilizado pelos escritores para apresentações de seus trabalhos e performances. Para tanto, contará com a montagem de várias tendas grandes e bastante confortáveis, ao redor dela.

Uma delas será para 500 pessoas onde acontecerão palestras, contação de histórias e outras apresentações culturais e literárias variadas.

Outra tenda, com capacidade para 80 pessoas e com ar condicionado, será para a exibição de filmes (cinema) .

Haverá mais uma no parque de diversões do Paço Municipal para atividades lúdico-educativas como pintura de rosto e jogos variados.

Haverá ainda uma tenda gigante que abrigará stands para livrarias, editoras, entidades literárias locais e venda de livros dos escritores sorocabanos. Nesta tenda haverá também uma mostra dos trabalhos da Secretaria da Educação de Sorocaba com uma exposição dos trabalhos de alunos da Rede Municipal de Ensino.

Obs: As coordenadoras gerais falaram também aos presentes que o sr Secretário da Cultura de Sorocaba, anunciará em breve os nomes dos palestrantes convidados para participarem da Expo 2008.

Segue abaixo o regulamento para os escritores sorocabanos que queiram participar do evento. Os agendamentos devem ser feitos com antecedência na Biblioteca com as coordenadoras Tânia ou Margareth.

Expo Literária de Sorocaba - 2008

De 30 de outubro a 01 de novembro

Local : Biblioteca Municipal "Jorge Guilherme Senger" de Sorocaba
Endereço : Rua Ministro Coqueijo Costa 180, Alto da Boa Vista, Sorocaba/SP
Data : Dias 30 e 31 de outubro , 5ªfeira, das 8h às 20h30
e dia 1º de novembro, sábado das 10h às 16h30

Informações: fone (15) 3228-1955 com Tânia Kalil.

Regulamento para participação dos escritores “sorocabanos” na Expo Literária de Sorocaba - 2008

Resumo da 1ª Reunião com os escritores sorocabanos no dia 13 de setembro de 2008 na Biblioteca Municipal de Sorocaba, enviado pela coordenação geral do evento.

Orientações para participação dos escritores sorocabanos
1. Exposição e venda de livros por conta da organização:

O escritor deverá entregar na secretaria da Biblioteca entre os dias 22 a 24 de outubro os livros para exposição e venda sendo:

- 06 volumes de cada título (máximo de 03 títulos).
- preencher a ficha e assinar o regulamento.
- os livros e o pagamento serão devolvidos a partir do dia 04 de novembro na secretaria da biblioteca.

2. Exposição e venda de livros por conta do autor ou da entidade a que pertence

- o escritor ou a entidade deverá entregar na secretaria da Biblioteca um oficia solicitando um stand e relacionando os escritores envolvidos até o dia 17 de setembro
- a venda e a mobília do stand serão de responsabilidade da entidade ou dos escritores

3. Performance do escritor no auditório da Biblioteca dia 01 de novembro das 10h às 15h30 – tempo de apresentação máximo de 30 minutos

O escritor ou a entidade interessado em expor seu trabalho deverá:

a. Encaminhar um ofício na secretaria da Biblioteca informando a performance, quais as necessidades áudio visuais para a apresentação, inclusive o tempo de duração

b. Cada interessado deverá ser responsável pelo seu público

c. O tempo de duração de cada apresentação dependerá do número de interessados

d. As apresentações deverão respeitar rigorosamente o tempo permitido

e. Os ofícios poderão ser entregues até o dia 25 de setembro na secretaria da Biblioteca

f. Todos os ofícios devem ser endereçados à Profª Tânia Kalil, coordenadora da programação

Prêmio Anual Sorocaba de Literatura

O prêmio foi instituído através da Lei nº 2395 de 02 de julho de 1985 e é um prêmio outorgado ao melhor livro lançado no ano anterior à sua entrega. A escolha do livro a ser premiado é feita por uma comissão formada por representantes de várias entidades da cidade e o ganhador recebe uma medalha, um diploma específico da própria premiação e um valor em dinheiro que atualmente é de R$500,00. A premiação voltou a acontecer no ano de 2007, quando ficou estabelecido que a entrega dele seria realizada na Expo Literária de Sorocaba. Desta forma, em 2008 a premiação fará parte também da programação da abertura da Expo.

Informações :

Biblioteca Municipal "Jorge Guilherme Senger"
Endereço: Rua Ministro Coqueijo Costa, 180, Alto da Boa Vista, Sorocaba/SP . Fone (15) 3228-1955

Fonte:
Coordenação Geral da Expo.
http://www.sorocult.com

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Rodamundinho 2008 à venda

Exemplares do Rodamundinho 2008 estão à venda. A antologia Rodamundinho, lançada durante a 4ª Semana do Escritor de Sorocaba, devido a pedido de amigos e familiares dos participantes, continua a venda. O Rodamundinho é uma coletânea infanto-juvenil que reúne 25 autores de até 15 anos de idade. É uma seleção de textos com poesias, contos e crônicas, sobre amor, natureza, escola, família, viagens, entre outros.

O projeto recebeu inscrições no início do mês de maio de 2008, foram selecionados 25 autores de Sorocaba e Região para participarem gratuitamente dessa antologia. Cada jovem participou com quatro páginas do livro que contém 114 páginas. Todo o projeto tem o objetivo de estimular a leitura e a escrita aos jovens. No dia do lançamento os participantes receberam, gratuitamente, quatro exemplares do Rodamundinho 2008 e um do Roda Mundo 2008.

O projeto foi idealizado pelo escritor sorocabano, Douglas Lara e pelo ex-presidente da Fundec Alexandre Latuf, com o patrocínio do editor Mylton Ottoni. A organização é da jornalista Cintian Moraes, apoio do suplemento infanto-juvenil Cruzeirinho do Jornal Cruzeiro do Sul, do Gabinete de Leitura Sorocabano e da Fundec.

A antologia está à venda por R$ 18,00. Os interessados podem entrar em contato pelos telefones (15) 3227.2305 ou 3226.4178.

Cintian Moraes - jornalista - (15) 8119.2476
cintian.moraes@yahoo.com.br

Fonte:
E-mail enviado por Douglas Lara.
Notícias de Sorocaba e região no
http://www.sorocaba.com.br/acontece

Fahed Daher (Poesias Avulsas)

Acróstico

Bandos passaram, de ilusões variadas,
A se esbater e a procurar abrigo,
Ri-me de todas, nãos lhes fui amigo
Bondoso e terno, foram-se estioladas.

Algumas trago ,ainda, mal guardadas,
Rotas e tristes a seguir comigo,
Astros sem luz no vasto, infindo e antigo
Firmamento brutal das madrugadas.

Emerge, agora, em minha solidão,
Límpida, bela e pura ,outra ilusão
Indicando-me a vida desejada;

Passam-se os dias e ela não decresce,
Projeta-se, se eleva e me enternece,
Obrigando-me a ver que és minha amada.

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Mulher

Você surgiu
do fundo dos tempos,
obra prima de Deus.
Não sei se da costela de um Adão,
ou da sublimidade de uma estrela,
ou a primata em plena evolução...
Mas em você o mundo se revela.
Foi o fogão, foi o tanque,
a lenha, o tacho...
Foi o filho, a cama, o riso
para o macho...
Ombros estreitos,
longos cabelos,
traz nos seus peitos
tantos desvelos.
O século passou
e o homem não ergueu
o templo da bonança
que um dia prometeu.
A máquina chamou você,
você atendeu,
entrou na produção, também,
e ali cresceu.
Lá no banco é o seu sorriso,
no escritório a sua graça,
no volante o seu juizo,
que linda você na praça.
Arquiteta, enfermeira,
empresária, motorista,
doméstica, lavadeira...
Você tem alma de artista.
Mulher do mundo moderno,
seja lá você o que for,
não há nada mais eterno
que o fogo do seu amor.
Não deixe que se perca no serviço
o frescor deste amor, sublime viço;
buscando nessa luta a nova trilha,
não esqueça que é a base da família.
Unindo a máquina ao beijo,
a pá unida à doçura,
o ideal ao desejo,
a garra unida à ternura...
Será tão belo, por certo,
o mundo que está por vir.
Se nesse mundo eu desperto,
eu só quero lhe servir.
====================================
Bárbara

Amo!
E porque amo sorrio.
Quero!
E por querer me empenho.
Não sei se por amar
ou por querer
eu tenho:

Sua paciência que acalma,
os seus beijos que me exaltam,
suas carícias que amansam,
o seu ser onde me encontro.

Serei um rei?
Não sei!
Talvez de um sonho,
de uma quimera...
Se de um império
ou de uma era...
Se sou um rei,
me entreguei
prisioneiro
de você.
============================
Meu Amigo

Eu sei que não foi fácil entende-lo,
pois do seu tempo ao meu houve mudança
e eu não sabia ver no seu desvelo
a projeção, em mim, de uma esperança.

Foi meu amigo, também pude sê-lo...
Mas nobre e firme na perseverança,
no ar severo você punha o selo
do amor, da disciplina, da esperança.

Chegada a minha vez de estar na idade
que você tinha, quando eu era moço,
posso entender, por mim, sua ansiedade.

Perdoa-me se errei ou se fui grosso,
pois hoje mais preciso com saudade,
sua presença ó Pai!
Que Pai Colosso.
=========================

Meu Pai Amigo

Quero você por companheiro e amigo,
embora eu viva em outras companhias;
quero você, de calças “jeans”, comigo,
um tênis bem legal, cabelo solto
e a alma destravada.

Faça de conta que é um adolescente,
sem compromisso de assinar o ponto,
nem compromisso de pagar o banco,
solto para viver.

Ao menos nuns instantes desta vida
quero escutar seus passos na calçada,
ouvir seu assobio destoado,
contar-lhe uma anedota engraçada
e ouvir seu riso alegre.

E sentaremos numa choparia,
veremos a passagem das garotas
que você gosta, mas disfarçaria
como quem não viu.

E de repente escutar histórias
de quando você tinha a minha idade,
contando até mesmo das maldades
sem pretender me aconselhar demais,
apenas me contar.

E eu contarei, também, os meus segredos,
você me escutará atento e quieto
e eu falarei bem livre , bem sem medo.
aliviando as angústias e incertezas,
que afligem a minhalma.

É fato que serei desobediente
algumas vezes, na hora da chegada,
como você fazia com seu pai,
burlando ,alguma vez , hora marcada,
mas não abusarei.

Mas com certeza nós discutiremos
opiniões políticas, morais
e me dirás que não entendo nada
e direi que você não sabe mais
doque já soube um dia.

E vamos nós jogar o futebol,
passo-lhe um drible, você se aborrece
e passa-me um carrinho desastrado,
fica mancando e se compadece,
achando que é um azar.

Acho bom ter você por companheiro,
ensinando-me a vida e a honestidade;
amigo, mas mantendo a disciplina,
e, conhecendo a minha insegurança,
sem humilhar, comigo você ensina
o caminho do amor.
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Sobre o autor

Nascido em Curitiba, Paraná, décimo filho de casal de libanesas vindos , jovens imigrantes e evoluindo no Brasil às custas de muita persistência e trabalho.

Fahed Daher, formado em medicina pela Universidade do Paraná, exercendo a profissão na especialidade de otorrinolaringologia, frequentando diversos cursos e congressos médicos.

Membro da Associação Médica de Apucarana- da Associação Médica do Paraná. Da Associação Médica Brasileira- Da sociedade Brasileira de Otologia. Da Sociedade Brasileira de Oftalmologia. Da sociedade Paranaense de otorrino.

Tenista, praticante de natação sem ser nadador, gosta de montaria, viagens atividades comunitárias, rotariano, tendo sido governador do distrito 4710, Paraná, anos 95/96 - Palestrante e conferencista.

Na vida social e cultural, foi presidente da APAE, criador de Fundação de ensino técnico, formando mão de obra operária, Presidente diocesano do movimento familiar Cristão, Orador da turma de formatura em medicina. Orador oficial na Plaça de San martin, em Buenos Aires, representando as caravanas brasileiras naquela cidade. Titular ca cadeira 33 da Academia de Letras, Ciências e Artes de Londrina, Paraná. Efetivo da Academia José de Alencar, em Curitiba. Presidente fundador da Academia de Letras , Artes e Ciências Centro- Norte do Paraná, em Apucarana.- Efetivo do Centro de Letras do Paraná, em Curitiba . Membro ds Sociedade Brasileira de Médicos Escritores.- Membro da União Brasileira de Trovadores.-Membro do Elos Clube de Londrina (Pr).

Livros publicados: - Oração de formatura - Pureza Pecado poesia I- Pureza Pecado Poesia II. Idílios Idéias Ideais. - Amor Ideal rebeldia.- Participante de 08 coletâneas de poemas.- Participante da obra de Pompília Lopes dos Santos,na obra sesquicentenário da poesia Paranaense. Cronista publicado em 17 jornais do Paraná e 20 jornais do Brasil
.

Fontes:
Soares Feitosa. Jornal de Poesia. http://www.secrel.com.br
http://www.geocities.com/lipoesias/enviadas/fahed.html
http://www.avspe.eti.br/poetas/fahed_biografia.htm

Sir Arthur Conan Doyle (Sherlock Holmes: Um Estudo em Vermelho)

No mundo inteiro dificilmente se encontrará alguém que não conheça Sherlock Holmes, talvez o mais famoso e genial detetive de todos os tempos. Durante o século 19 seu nome se tornou um ícone em quase todas as linguas do mundo, garantindo a ele mais admiração e respeito que os reais detetives da atualidade. Mas isso não surpreende pois seus métodos de investigação não podem ser imitados por ninguém.

Sherlock Holmes foi criado por Sir Arthur Conan Doyle, autor britânico, em fins do século 19. Um Estudo em Vermelho foi a primeira prova das habilidades de nosso imortal herói.

A sala de estar estava cheia de ouvintes: havia, por exemplo, alguns homens da Scotland Yard que buscavam fama e respeito dos londrinos que diriam "quão bem eles haviam investigado o caso". Subitamente dois garotos entram na sala acompanhados de um velho.

"Deixe-me apresentá-los ao assassino!", gritou Sherlock Holmes apontando o velho, que era um dos poucos proprietários de carruagem de Londres. A longa e misteriosa estória estava pronta para iniciar. O velho, Sr Jeferson Hope, não tinha nada a dizer pois era incapaz de esconder qualquer detalhe de Sherlock Holmes.

Vingança, velhos ódios e ressentimentos tinham um papel muito importante a desempenharem na estória. O caso tinha se iniciado a muito tempo atrás longe da Inglaterra, mas as consequências deste passado não morreram até Jeferson Hope estar apto a vingar o que seus inimigos haviam feito a sua amada e ao pai dela.

O Sr Hope não era um prisioneiro típico que chora, tenta lutar e recusa-se a admitir que o jogo esta terminado. Ele era um velho moribundo que não se importava com o que lhe aconteceria no futuro.O fato de seus inimigos terem pago, através de suas mãos, pelos trágicos acontecimentos do passado era suficiente. Ele queria nada mais do que contar toda a verdade e morrer redimido.

A complicada verdade torna-se clara mais tarde quando Sherlock Holmes tem a oportunidade de explicar suas investigações ao Doutor Watson. Meu livro quase caiu ao chão quando percebi quão simples tudo realmente havia sido. "O maior erro que pode ser cometido é fazer as coisas mais complicadas do que elas realmente são", Sherlock Holmes explica. Mesmo nos dias de hoje cada palavra sua ainda é verdade: as pessoas tornam tudo difícil quando elas mesmas fazem parecer difícil.

Doutor Watson, que sempre trabalhou com Sherlock Holmes tentando ajudá-lo, ficou também boquiaberto. Ele era uma pessoa muito inteligente e calma, entretanto inábil em perceber os detalhes "claros" como pegadas e cinzas de diferentes tipos de cigarro. Ele só podia escutar e observar como seu amigo trabalhava. Sherlock Holmes, que não era o companheiro ideal, estava pronto a responder qualquer pergunta. Ele não queria esconder sua genialidade e inteligencia de ninguém, mas acima de tudo, ter seus talentos notados.

Mesmo em sua vida diária o comportamento de Sherlock Holmes era quase auto didata. Ele tinha muitas opiniões fortes que todos deviam aceitar. "Eu não tenho que ser interessado em nada", era um de seus pensamentos favoritos. Emoções e relacionamentos com outras pessoas não significavam nada para ele. Doutor Watson era talvez a única excessão.

Acredito que Sherlock Holmes era, apesar de seu comportamento orgulhoso, uma pessoa que merece todo o respeito do mundo. Ele devotou sua vida a capturar assassinos e outros criminosos, fazendo seu trabalho fiel e cuidadosamente. Já seu primeiro caso "Um Estudo em Vermelho" deixa claro que ele sabia exatamente o que estava fazendo. Ele não era somente um jovem e inexperiente garoto mas um super inteligente detetive.

O modo como o Sr Conan Doyle conduz e descreve os eventos e pessoas em seu primeiro romance merece todo meu respeito. Suas descrições exatas me fizeram sentir como se eu fizesse parte do que estava acontecendo. Até as pessoas, descritas tão cuidadosamente, me fizeram imaginar outras coisas que não foram mencionadas: como elas falavam, que tipo de voz tinham e como elas realmente se pareciam. A linguagem era também clara e vívida com frases não muito complicadas de entender.

Se voce quer ler algo muito emocionante e que não o deixe entendiado voce deve realmente ler "Um Estudo em Vermelho" ou outras estórias de Sherlock Holmes. Com seus enigmas muito complicados eles lhe oferecerão uma boa oportunidade de voce usar sua imaginação. A resposta da pergunta "quem fez isso" nunca está escondida atrás da próxima porta; a casa inteira tem que ser investigada.

Fontes:
http://www.netsaber.com.br/resumos/

Salman Rushdie (1947)

Sir Salman Rushdie KBE (Bombaim, 19 de Junho de 1947) é um ensaísta e autor de ficção britânico de origem indiana. Cresceu em Mumbai (antiga Bombaim) e estudou na Inglaterra, onde se formou com predicado (with honours) no King's College, Universidade de Cambridge. O seu estilo narrativo, mesclando o mito e a fantasia com a vida real, tem sido descrito como conectado com o realismo mágico. Rushdie casou-se com a famosa atriz e modelo indiana Padma Lakshmi, de quem anunciou divórcio em julho de 2007.

Rushdie foi condecorado em 15 de junho de 2007 como Cavaleiro Comandante do Império Britânico (Knight Commander of the British Empire), fato que provocou diversos protestos no mundo islâmico.

Obras

Estreou na literatura em 1975 com o romance Grimus.

Dono de um estilo próprio e dominando excelentes técnicas de narração, Rushdie já era um autor consagrado quando venceu o Prémio Booker em 1981 com a obra Os Filhos da Meia-Noite.

Tornou-se incomparavelmente mais famoso após a publicação do livro Versículos satânicos(em Portugal) Versos satânicos (no Brasil), em 1989, que causou controvérsia no mundo Islâmico, devido a este livro ter sido considerado ofensivo ao profeta Maomé. A 14 de Fevereiro de 1989, a fatwa ordenando a sua execução foi proferida pelo Aiatolá Ruhollah Khomeini, líder do Irã, chamando o seu livro de "blasfêmia contra o Islão". Para além disso, Khomeini condenou Rushdie pelo crime de "apostasia" - fomentar o abandono da fé islâmica - o que de acordo com a Hadith é punível com a morte. Isto porque Rushdie comunicava através do romance que já não acreditava no Islão. Khomeini ordenou a todos os "muçulmanos zelosos" o dever de tentar assassinar o escritor, os editores do livro que soubessem dos conceitos do livro e quem tomasse conhecimento de seu conteúdo, conforme a fatwa. Devido a este fatos Rusdhie foi forçado a viver no anonimato por muitos anos.

A obra infanto-juvenil Haroun e o Mar de Histórias foi escrita pelo autor como uma forma de explicar ao seu filho por que razão tinha perdido a liberdade de expressão.

Com o seu primeiro romance pós-fatwa, intitulado O Último Suspiro do Mouro, foi vencedor do Prémio Whitebread.

Bibliografia
Grimus (1975)
Os Filhos da Meia-Noite Midnight's Children (1980)
Vergonha Shame (1983)
O Sorriso do Jaguar The Jaguar Smile: A Nicaraguan Journey (1987)
Versos Satânicos The Satanic Verses (1989)
Haroun e o Mar de Histórias Haroun and the Sea of Stories (1990)
Pátrias Imaginárias Imaginary Homelands: Essays and Criticism, 1981-1991 (1992)
Oriente, Ocidente East, West (1994)
O Último Suspiro do Mouro The Moor's Last Sigh (1995)
O Chão que Ela Pisa The Ground Beneath Her Feet (1999)
Fúria Fury (2001)
Step Across This Line: Collected Nonfiction 1992-2002 (2002)
Shalimar, o Equilibrista (Brasil) Shalimar, the clown (2005)

Fontes:
http://pt.wikipedia.org
Foto = http://www.martinfrost.ws