sábado, 10 de julho de 2010

Lucilene Machado (A Morte Nossa de Cada Dia)


Acordo para mais um dia. Tudo igual. Cruzo com as mesmas pessoas, com os mesmos carros... passo pelas mesmas ruas com a mesma pressa e, sem reparar muito, vou atravessando o tempo sem criar espaço para desenhar a vida.

Cansada, entrego-me ao abraço da noite como se fosse uma despedida. Cada dia morro um pouco. Paro diante do espelho como uma última atitude diária. Escovo vagarosamente os fios de cabelo na tentativa de alinhar as diferenças. Foram cortados de forma assimétrica. Corte de navalha, fio por fio. Ficaram tão diferentes uns dos outros. Escovo também os anos que a navalha do tempo não corta. Eles vão se ondulando pelo corpo e fazendo caracóis na alma. A idade é um arreio que ninguém desata. Deixa o coração sôfrego pelas batidas futuras.

Diante do espelho não ouso sonhos grandes. Meu olhar interrogativo parece exigir decisões para as quais não me sinto preparada. Vou ficando distante. Há silêncios pesando sobre minhas pálpebras. De repente, vejo uma tarde dentro dos meus olhos. Uma tarde verde que não aconteceu. Quantas horas perdidas modelando uma esperança? A infinita ternura da minha insônia. Os olhos semicerrados vigiam o tempo sonhando surpresas. Talvez nunca virão. Os desenganos vão matando o desejo. As emoções vão ficando mecânicas. Perdas irreparáveis. Arrependo-me por não ter amado mais quando podia. O viver intenso me escapou. Nunca percebo se estou amando. Só quando a saudade se aproxima penetrando além da superfície, é que constato a veracidade da situação. Aí nego. Nego-me veementemente. Já até desenvolvi uma habilidade em me auto-enganar. É uma espécie de suicídio. Vai-se matando a própria afetividade, pouco a pouco para não doer tanto e depois, supõe-se, a vida volta a ser bela.

Há muito cansaço no ar. Um cansaço que vem dos edifícios vizinhos abrindo clareiras pela cidade adormecida. É a triste paz da noite sobre as ruas. Há vozes caladas sobre o asfalto. Flores caídas sobre as calçadas. Cristais quebrados de um azul de lua. É doloroso morrer sozinha, sobretudo em setembro quando as flores oferecem perfume ao vento. Mas a vida é feita de morte. Pequenas mortes que vão matando a inocência e cobrindo de luto as tardes verdes.

Mas amanhã quando a aurora voltar, será tudo igual. Todos dispersos pelo mundo, enfrentando a selva, o imprevisto, o grito. Amanhã seremos todos selvagens. Embora de uma mesma espécie, cada um em sua jaula. Cada um vítima de uma serpente que devora o lirismo do dia-a-dia. Amanhã seremos dirigidos pela insígnia da vaidade e das ausências. O hoje será apenas uma imagem de um álbum de família empoeirado. E eu continuarei representando aquela que não sou enquanto morre um pouco aquela que sou.

Fontes:
Academia Sul-Mato-Grossense de Letras
Imagem = http://diariovirtualdeumlouco.blogspot.com

Urda Alice Klueger (Os Campos de Érico Veríssimo IV)



(Para Jorge Gustavo Barbosa de Oliveira)

E então, num dia, numa tarde, eu estive lá, dentre eles, neles, e caminhei por eles num dos que foi um dos grandes encantamentos da minha vida, e era como caminhar pelo país das fadas, pois aqueles eram os mágicos campos de Érico Veríssimo, e eu esperara desde os 12 anos para um dia conseguir chegar lá, sem nunca crer muito que tal fosse possível, pois como pode acreditar em campos pessoas como eu, que passam suas vidas dentro de um Vale? Fui, no entanto, no último inverno, e fazia uma temperatura de 1,5 graus Centígrados, e a verdura daqueles campos que deviam ter amanhecido cobertos de geada era uma coisa tão impressionante, como se de esmeraldas fossem feitos e como se nunca tivessem sido tocados pelo gelo, que fiquei meio em dúvida se eles eram de verdade, mesmo, ou se, quem sabe, eu divagava, caminhava por campos imaginários, somente sonhados pela mente de um escritor único...

Uma estrada atravessava os campos, e fui caminhando pela beirada dela, bem longe, bem longe, não tão longe quanto meu coração pedia, pois queria, além do espaço, atravessar o tempo, e encontrar, de repente, na beirada da estrada, andando comigo, o padre que possuía um punhal que era como que um estigma, e que criou um menino que ficaria para todo o sempre com o nome de Pedro Missioneiro... Pois é, depois da destruição das Missões, Pedro Missioneiro muito errou por muitos campos, à deriva, na espera do seu destino, e como ali eram os campos de Érico Veríssimo, com toda a certeza ele andara por ali também, e o que me faltava era a possibilidade de atravessar o tempo, tão poucos séculos, para caminhar por ali com a candura daquele Pedro gerado por uma índia nas antigas Missões, e que, com certeza, era antepassado de tantas daquelas gentes que viviam naquela cidade rodeada dos campos, e no entorno da cidade que era também rodeado pelos campos...

Eu mal acreditava que estava ali mesmo, onde tanta coisa tinha acontecido na História e no meu imaginário que vinha desde a infância, que daqueles campos se alevantara tamanha onda de energia quando um menino chamado Érico Veríssimo aprendera o be-a-bá e deixara de só imaginar, para começar a escrever o fantástico mundo que legou a mim e a tantos pelo mundo afora, e que lá no escondido do meu Vale eu fora atingida por aquela onda, e nunca mais, depois, pudera ser como antes!

A emoção me fechava a garganta, e eu pensava se lá do alto do gelado céu azul daquele dia Érico Veríssimo estaria podendo ver que os campos dele, agora, tinham muitas coisas novas, como aquela comprida fita que se desenrolava no meio do verde e que era uma ferrovia, e que atravessando aquela fita havia outra, que era uma fita de asfalto e que levava a outra coisa nova naqueles campos chamada universidade – que diriam os padres das Missões se soubessem que o saber, um dia, já não seria teocrático? Pois os padres das Missões muitas coisas também sabiam e ensinavam, e um lugar especializado no ensinar e aprender não era uma idéia nova naqueles campos - mas agora a ciência tomara o lugar da teocracia. Só que na hora não refleti muito nisto, não – o encantamento que me possuía me fazia como que flutuar entre Pedro Missioneiro e uma legião de outros personagens que dele descendiam ou não, subindo e descendo coxilhas vestidas de verde, e era tão fantástica aquela realidade de estar, de verdade, um dia, andando pelos campos de Érico Veríssimo, que fui colhendo um matinho cá, um galhinho lá, flores inesperadas dentro daquela vegetação de inverno, desde delicadas camélias até hirsutas flores de espinhos, todas tão lindas, tão etéreas, mesmo as hirsutas, que segurá-las era como ter as mãos levitando. No alto de uma coxilha, já quase ao pôr do sol, parei para conversar com um homem velhinho que guiava uma pequena carroça com uma pequena carga – quem seria ele, na verdade? Qual seu parentesco com Pedro Missioneiro? Não sei, mas sei que ele era de verdade e estava ali, e me perguntou:

- Por que você está colhendo esse mato?

E eu entendi que ele não tinha consciência de ser o personagem que era, mas mesmo assim lhe expliquei:

- São flores dos campos de Érico Veríssimo!

Era complicado, para ele, entender aquilo, mas ele me olhou com bondade, como decerto olham até hoje os descendentes de Ana Terra.

Então, voltei para o meu Vale e trouxe aquelas flores. Arranjei-as dentro de um frasco de vidro, colei nele uma etiqueta onde está escrito “Flores dos campos de Érico Veríssimo” – e como sabia que as flores acabariam ficando secas e parecendo não ter importância, colei ao redor do frasco pequenas borboletas emprestadas de Quintana, para que ficasse sempre muito clara a magia que emana dali. Eu me emociono até às lágrimas, quando olho para elas. Aquelas flores são a certeza de que não sonhei, e que um dia, de verdade, andei até muito, muito longe, pelos reais campos de Érico Veríssimo!

Blumenau, 12 de Janeiro de 2008.

Fonte:
Stammtisch Confraria e Patotas

Urda Alice Klueger em Preto e Branco, por Luiz Eduardo Caminha


Produzir livros e crônicas qualquer um pode. Sim, se tiver condições de sobrepujar as exigências de um mercado que, no Brasil, é ainda oneroso, ou ainda atravessar as barreiras dos editorialistas, eu concordaria. Mas há um senão em Urda. Sua produção tem, sobretudo, qualidade. E aí, a coisa muda. Produzir com qualidade é outros quinhentos. Pois Urda o faz. Qualquer que sejam seus livros, qualquer que seja a crônica, da vez ou não, ela se supera pela qualidade do que escreve. E isto, faz uma enorme diferença.

Leitora contumaz e escritora compulsiva, talvez sejam estas as virtudes que a diferenciem. A sensação que se te é que Urda vive para escrever. Parafraseando Gandhi quando diz que “a oração é a respiração da alma”, para Urda, talvez escrever seja a respiração de seu ser existencial. O oxigênio que lhe clareia a mente.

Entretanto, aí está uma outra diferença. Urda não apenas escreve e lê. Além disto, está sempre envolvida em movimentos sociais, em manifestações culturais, acampa, viaja e, não bastasse, cuida com zelo das publicações de outros autores que leva a público através de sua Editora, a Hemisfério Sul.

Ela mesma se define uma escritora e afirma: “não sou poeta”. Mas a poesia parece permear seus textos. E não sou apenas eu quem diz isto. Vejamos o que Luiz Carlos Amorim escreve sobre Urda:

“O romance está muito bem representado na Literatura Catarinense, por uma moça loura, brejeira e loura como outras nascidas em Blumenau, mas com uma grande diferença: ela escreve. Escreve coisas com sabor de poesia, com sabor de vida, uma fonte inesgotável de emoção e sensibilidade. Ela escreve obras-primas. Essa moça é Urda Alice Klueger, que já publicou títulos como "Verde Vale", o seu primeiro grande sucesso, com sucessivas edições, a saga dos primeiros colonizadores em Santa Catarina, uma canção verde da cor do amor e da serenidade, da cor da ternura; "As brumas dançam sobre o Espelho do Rio", "No Tempo das Tangerinas", "Vem, Vamos Remar", "Te Levanta e Voa", "Cruzeiros do Sul", "Recordações de Amar em Cuba II", "A Vitória de Vitória" - o primeiro livro infanto-juvenil da romancista e, lançado recentemente, "Entre Condores e Lhamas". "As Brumas dançam Sobre o Espelho do Rio" é poesia em prosa, é um hino de liberdade e à natureza, é uma canção de amor - amor como podemos concebê-lo em todas as suas formas”.

E vai mais além o comentário:

POETISA DA PROSA

Os romances de Urda têm o poder de prender o leitor da primeira à última página, fazendo com que a gente os leia de um fôlego só. Não importa o tema: a força narrativa da autora, a construção dos personagens, humanos e autênticos, o cuidadoso e minucioso trabalho de delinear os cenários, o engendramento da trama, consistente e verossímel, fazem de Urda a escritora mais importante desta Santa e bela Catarina.

Cecília Meirelles já disse, em seu "A Arte de Ser Feliz" que é preciso saber olhar para ver." E Urda sabe olhar a natureza e ver que "a manhã vem com muitas brumas, mas depois o sol chega se espreguiçando todo de tanta beleza, devagar, com uma lentidão cheia de prazer, vai tocando a branquidão que o rio forma para o alto, para longe, de encontro aos morros distantes, onde elas acabam por se desfazer numa beleza transcendental...

Urda também transcende o romance trazendo, como historiadora que é, a história para suas estórias. Vejam, por exemplo, o que diz o professor e historiador Viegas Fernandes Costa:

Muito já se escreveu a respeito da escritora Urda Alice Klueger, mas pouco se falou sobre a historiadora Urda. Na verdade, a obra da historiadora confunde-se com a obra da escritora, já que seus livros refletem uma preocupação com o tempo e o cotidiano...

Em toda esta trajetória literária, a influência da história nos textos da escritora Urda Alice Klueger é cada vez maior, porém as influências da romancista sobre a historiadora também permanecem com força, tornando-se impossível desvincular uma da outra.

Mas Urda não é um fenômeno literário apenas por produzir com qualidade. Há que se alicerçar melhor esta tese e nada como os números para ratificar o que afirmo. Afinal, são 19 livros, mais de 500 crônicas publicadas no Brasil e em Portugal, um livro tema de um filme. Muitos de seus livros são referência nas provas de Literatura da Universidade Federal de Santa Catarina e da UDESC. Dos livros, o primeiro, “Verde Vale”, já está em sua 11ª. Edição, “No tempo das tangerinas”, na 10a., “Vem, vamos remar”, “Blumenau, a loira cidade no sul” e “Crônicas de Natal e Histórias da minha Avó”, todos na 4ª. prensagem. E já que estamos na internet, um outro número que impressiona é traduzido pelo site de consultas do “Google”. Ao digitar o nome da escritora aparecem nada menos que 3.470 referências. E tem mais, muito mais.

Fonte:
Stammtisch Confraria e Patotas

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Concursos da UBT São Paulo - Versão 2010


CONCURSO NACIONAL /INTERNACIONAL

Tema: FEITIÇO

Âmbito Nacional: VENCEDORES

Feiticeiro sem magia
ou bruxo sem qualidade,
eu não aprendo a alquimia
da poção “Felicidade”!

ARLINDO TADEU HAGEN
Belo Horizonte – MG

Para ter o compromisso
do amor de certa mulher,
eu, que não creio em feitiço
faço o feitiço que houver!
ARLINDO TADEU HAGEN
Belo Horizonte – MG

Facilmente me dominas,
bastando apenas piscar...
- É o feitiço das meninas
que brincam no teu olhar!
A. A. DE ASSIS
Maringá – PR

Nem mesmo o sol nos desperta
do feitiço sem pudor,
que nos envolve e acoberta
nas madrugadas de amor!
ÉLEN DE NOVAIS FÉLIX
Niterói – RJ

Por teu feitiço ou magia,
mesmo sabendo quem és,
troquei a minha alforria
e fui escravo a teus pés...
ERCY MARIA MARQUES DE FARIA
Bauru – SP

Noel, em tarde tranquila,
compondo um samba sutil,
fez o Feitiço da Vila
enfeitiçar o Brasil!...
HERMOCLYDES SIQUEIRA FRANCO
Rio de Janeiro – RJ

Do teu feitiço um cativo,
por livre-arbítrio me fiz;
mas juro por Deus que vivo
num cativeiro feliz!
JOSÉ TAVARES DE LIMA
Juiz de Fora – MG

Aos erros, não fique omisso,
nem tente aos outros culpar:
- a pedra não faz feitiço
para a gente tropeçar!
NEIDE ROCHA PORTUGAL
Bandeirantes – PR

Desprezei-te, fui omisso,
quis um “caso” passageiro...
Mas o Amor fez o feitiço
virar contra o feiticeiro!
RENATO ALVES
Rio de Janeiro – RJ

Quando o amor se distancia
e o sonho fica apagado,
não há feitiço ou magia
que salve o encanto quebrado...
THEREZA COSTA VAL
Belo Horizonte – MG

Tens tal feitiço no olhar
que, em nosso adeus, por encanto,
foram gotas de luar
que escorreram do teu pranto!
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte – MG

Tema: FEITIÇO

Âmbito Internacional: VENCEDORES

Feitiço do feiticeiro
cura todas as “mésinhas”,
se não for um trapaceiro,
cura as tuas, mais as minhas...
ANTÓNIO DOS SANTOS BOAVIDA PINHEIRO
Lisboa – Portugal

Todo o pobre sabe bem
como dobrar vencimentos;
feitiço é viver com cem
e precisar de duzentos.
ANTÓNIO JOSÉ BARRADAS BARROSO
Parede – Portugal

O teu olhar feiticeiro,
quando se cruzou com o meu,
fez um feitiço certeiro
que o meu coração prendeu.
EMILIA PEÑALBA DE ALMEIDA ESTEVES
Porto - Portugal
CONCURSO ASSINANTES DO “INFORMATIVO”

Tema: DESEJO

Âmbito Nacional: VENCEDORES

Um contraste eu sempre vejo
neste teu beijo febril
pois ao matar um desejo
eu ressuscito outros mil!
ARLINDO TADEU HAGEN
Belo Horizonte – MG

Você voltou e hoje eu vejo
que o meu abraço de então
foi muito mais de desejo
do que, de fato, perdão!
ARLINDO TADEU HAGEN
Belo Horizonte – MG

São meus desejos sedentos
fantoches do coração
se movendo ao movimentos
das linhas da tua mão!
ARLINDO TADEU HAGEN
Belo Horizonte – MG

O amor é perene chama,
desejo, só a posse almeja...
Quem deseja, às vezes ama,
porém, quem ama... deseja!
ÉLBEA PRISCILA DE SOUSA E SILVA
Caçapava – SP

Quando me dizes, sem pejos,
sensual em demasia,
que és um rio de desejos...
Ser teu mar... Como eu queria!
JOSÉ TAVARES DE LIMA
Juiz de Fora – MG

“Tenta esquecê-la”... Alguém fala.
O meu desejo, porém,
de algum dia conquistá-la,
não ouve a voz de ninguém!...
JOSÉ TAVARES DE LIMA
Juiz de Fora – MG

Alta noite e tu não vinhas...
Em desejos, só, no leito,
estrelas eram tachinhas
martirizando o meu peito.
MOACYR FIGUEIREDO
Florianópolis – SC

De que vale eu ficar mudo,
os desejos sufocar,
se os meus olhos dizem tudo
quando encontram teu olhar.
MOACYR FIGUEIREDO
Florianópolis – SC

Na madrugada, em teus braços,
o nosso amor se faz pleno.
E o desejo, com seus laços,
torna este mundo pequeno.
RELVA DO EGYPTO REZENDE SILVEIRA
Belo Horizonte – MG

Se o desejo me arrebata,
preceitos são esquecidos:
vivo paixão insensata
na linguagem dos sentidos.
RELVA DO EGYPTO REZENDE SILVEIRA
Belo Horizonte – MG

Quando o desejo desponta
e a razão tenta se opor,
eu brinco de faz de conta
e levo em frente esse amor!
RITA MARCIANO MOURÃO
Ribeirão Preto - SP

Não malogre o seu desejo...
Nem pense que é uma vergonha,
pois é nas asas de um beijo
que chega à lua... quem sonha!
ROBERTO RESENDE VILELA
Pouso Alegre – MG

O fascínio antigo existe
nesse amor que não tem prazo
e o desejo em nós persiste,
sem limite e sem ocaso...
THEREZA COSTA VAL
Belo Horizonte – MG

Na espera há doces demoras,
quando eu desejo te ver.
O relógio, ao som das horas,
solfeja, em vez de bater...
VANDA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba – PR

Que bom seria um enlace
entre a mente e o coração:
o que a gente desejasse
também quisesse a razão!
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte – MG

Tema: DESEJO

Âmbito Internacional: HOMENAGEM

Um desejo bem guardado
trago dentro do meu peito:
o de ser só bem amado
pelo bem que eu tiver feito.
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ílhavo – Portugal
CONCURSO ASSOCIADOS DA SEÇÃO SÃO PAULO - SP

Tema: ORVALHO

Âmbito: VETERANOS

De manhã, se a vista espalho
para olhar coisas mimosas,
vejo pérolas de orvalho
sobre as pétalas das rosas...
ANALICE FEITOZA DE LIMA

Ela do trem me acenando,
secava os olhos morenos,
enquanto os meus orvalhando,
já não viam seus acenos!
CAMPOS SALES

Uma gotinha de orvalho...
E o poeta percebeu
que era lágrima do galho
chorando a flor que morreu!
CAMPOS SALES

Pai, abençoa meu filho
que pelas drogas foi morto;
o orvalho não perde o brilho
nas folhas de um galho torto!
CAMPOS SALES

Manhã de inverno, gelada,
e, em ação, se põe o orvalho,
criando falsa florada
na ponta seca de um galho...
DARLY O. BARROS

Oh! minha mãe, quando eu falho,
tua lágrima rolada,
é qual pérola de orvalho
sobre a rosa machucada!...
DOMITILLA BORGES BELTRAME

Cai o orvalho, de mansinho,
nesta aridez do sertão...
e o povo aceita o carinho
que ameniza a insolação!
GIVA DA ROCHA

Seria a vida mais doce
e as dores bem mais amenas,
se toda lágrima fosse
um pingo de orvalho apenas...
JAIME PINA DA SILVEIRA

Gota de sonho e magia,
sopro de um anjo... tão leve...
orvalho, suave poesia,
que a noite, inspirada, escreve.
MARIA HELENA CALAZANS MACHADO DUARTE

Hora do adeus... sutilmente,
eu disfarço o meu desgosto,
quando o orvalho, gentilmente,
lava a lágrima do rosto!...
MARILUCIA REZENDE

A madrugada encontrou
um pobre e triste espantalho
e, comovida, o enfeitou
com ricos cristais de orvalho.
MARINA BRUNA

Se, a foto, o orvalho umedece
- depois que o amor teve fim –
à minha ilusão parece
que ainda choras... por mim!
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

À noite, se estou contigo
e o sereno a rede orvalha,
em teus braços eu me abrigo
e o teu amor... me agasalha!
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Faze o bem, mesmo a quem falha
ao cruzar os teus caminhos...
Repara que Deus orvalha
as rosas e os seus espinhos.
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
Tema: ORVALHO

Âmbito: NOVOS TROVADORES

Sentado naquela praça,
enquanto o sono não vem,
sinto que o orvalho me abraça
e me faz lembrar de alguém.
EDUARDO DOMINGOS BOTTALLO

Não sei se é lenda ou verdade
que Cristo se entristeceu,
chorou pela humanidade
e assim o orvalho nasceu.
EDUARDO DOMINGOS BOTTALLO

A gotícula de orvalho
congelada, fragilmente,
enfeita o velho carvalho
qual diáfano pingente...
J. B. XAVIER

Vendo o orvalho na campina,
enfeitando a madrugada,
pude ver a mão divina
sobre a noite enluarada...
J. B. XAVIER

Vai-se embora todo o orvalho
com o sol esfuziante,
deixando o velho carvalho
sem um único diamante...
MARIA DE LOURDES PAIVA REIS

Orvalho, brilho de prata
sob a densa luz da lua,
que em solene passeata
faz espelho em minha rua...
MARIA DE LOURDES PAIVA REIS

Condoído, o sol, tão doce
secou a folha da flor,
pensando que o orvalho fosse
uma lágrima de amor...
MARIA DE LOURDES PAIVA REIS

Grande Noel, ao compor,
atento no seu trabalho,
pingava gotas de amor
até nas gotas do orvalho.
WALDIR GERSON GRANZOTTI

Quando há seca em nossa roça,
pedimos em oração,
que, ao menos, o orvalho possa
vir molhar o nosso chão.
YEDDA MAIA RAMOS PATRÍCIO

A quem cultiva um jardim
a natureza lhe ensina:
se a estiagem não tem fim,
orvalho é bênção divina.
YEDDA MAIA RAMOS PATRÍCIO

Os teus olhos, orvalhados
pela emoção do momento,
são dois sóis iluminados
pela luz do sentimento!
YEDDA MAIA RAMOS PATRÍCIO
CONCURSO HUMORÍSTICO ASSOCIADOS DA SEÇÃO SÃO PAULO - SP

Tema: APITO

Âmbito: VETERANOS E NOVOS TROVADORES


Sempre que o noturno apita,
rangendo nos velhos trilhos,
desperta o marido e a Dita,
que vão aumentando os filhos...
CAMPOS SALES

Casal novo, bom de cria,
trinta meses, três nenéns!
É que havia a ferrovia
e ouvia o apito dos trens...
DIVENEI BOSELI

Num elevador lotado,
um som cavo, muito agito
e um guarda ruborizado:
“foi descontrole... do apito”.
EDUARDO DOMINGOS BOTTALLO

“Apitando” mais que flauta,
- e com sonora potência -,
O Zé nem olha na pauta,
Vai de cor... na “flautulência”!
HÉRON PATRÍCIO

- Mas, “seu” guarda, por favor,
ao apito obedeci.
Culpado é o muro, senhor,
que não deu ré... e eu bati!!!
MARIA HELENA CALAZANS MACHADO DUARTE

Engoliu o seu apito
durante um jogo agitado...
Agora, o juiz aflito,
apita do lado errado!!!...
MARILUCIA REZENDE

- Apite se alguém chegar!
Pediu o amante vaidoso...
Mal podia imaginar,
que o vigilante era o esposo!!!...
MARILUCIA REZENDE

Escuta o apito e pergunta:
- Eu entrei na contramão?
Não, não, diz o guarda... e ajunta:
- Vai entrar é no talão!
MARISA RODRIGUES FONTALVA

Diz que é soprano... e padece
com muito cristal quebrado,
pois sua voz mais parece
apito desafinado...
RENATA PACCOLA

Aqueles a quem indago,
- e a resposta não me vem –
Será que apito de gago
a-pi-pi-ta assim tam-bém?
SELMA PATTI SPINELLI

O torcedor se consome!...
E a cada apito infeliz,
se é feito o gol, grita o nome
que é dado... à mãe do juiz!
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Fonte:
http://www.ubtsp.com.br/page5.aspx

98º Concursos de Quadras do Clube da Simpatia (Olhão - Portugal )


Tema: JARDIM

PREMIADOS

1º Prêmio

No jardim da minha vida,
meus filhos são minhas flores.
Vivo a ternura nascida
entre mim e os meus amores!
GISLAINE CANALES - BRASIL

2º Prêmio
Basta olhar com muito amor,
para se ver tudo assim:
em cada rosto uma flor
e o mundo um grande jardim:
ARGEMIRA FERNANDES MARCONDES - BRASIL

3º Prêmio
Enquanto um menino existe,
um passarinho, um jardim,
o mundo, apesar de triste,
distante estará do fim.
ANTÓNIO AUGUSTO DE ASSIS - BRASIL

MENÇÕES HONROSAS

Esta vida é um jardim
onde ninguém é capaz,
depois de chegar ao fim
poder voltar para trás…
MARIA ALIETE CAVACO PENHA - PORTUGAL

No Mundo da Fantasia,
eu construi um jardim:
com versos...rimas...poesia,
que sorriam para mim!
DELCY CANALLES - BRASIL

Viver é estar num jardim
a colher o que plantarmos:
espinho ou flor de jasmim,
se bem ou mal semearmos.
ÂNGELA TOGEIRO - BRASIL

Pus sementes de sorriso
No meu jardim de bonança:
Construi um paraíso
Colhi risos de criança…
FERNANDO MÁXIMO - PORTUGAL

Fonte:
Colaboração de A. A. de Assis

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Artur Azevedo (Entre a Missa e o Almoço)



Entreato cômico

Representado no Teatro Recreio Dramático, em 25 de outubro de 1907.

Rio de Janeiro. Atualidade.

Sala em casa da viscondessa. Boa mobília, quadros, objetos de arte, etc. Porta ao fundo dando para o jardim. Duas portas à direita, janela à esquerda.

CENA I

PEDRO, depois ARNALDO
(Ao levantar o pano, Pedro, o copeiro da casa, espana os móveis; alguns momentos depois, ouve-se uma campainha elétrica. Ele vai à porta do fundo e olha para fora).

PEDRO - Oh! O sr. dr. Arnaldo! Entre, sr. doutor! (Arnaldo entra). Como tem passado vossa senhoria? Vossa senhoria não se lembra de mim? Sou o Pedro... o Pedro, que foi copeiro de vossa senhoria!ARNALDO - Ah!

PEDRO - Tenha a bondade de sentar-se.

ARNALDO - Obrigado. Estou bem.

PEDRO - A sra. d. Alice está boa?

ARNALDO - Creio que sim.

PEDRO - Não fique querendo mal à sra. d. Alice, não senhor; mas a sra. d. Alice foi muito injusta para comigo.

ARNALDO, quase interessado, a seu pesar: - Por quê?

PEDRO - Pois vossa senhoria não se lembra que ela me despediu sem razão?

ARNALDO - Não sei disso.

PEDRO - Eu fazia muito bem a minha obrigação; não havia motivo de queixa; entretanto, o pretexto foi que o meu serviço era mau. (Sorrindo). Depois vim a saber de tudo...

ARNALDO, desta vez interessado: - Tudo quê?

PEDRO - Quem me disse foi seu Ferreira.

ARNALDO - Quem é seu Ferreira?

PEDRO - O homem da venda. A cozinheira contou que eu era "onze letras" de vossa senhoria, que trazia recadinhos em segredo a vossa senhoria... Ora seja tudo por amor de Deus!...

ARNALDO - Bom! Isso não tem importância.

PEDRO - Como não tem importância? Tem importância, sim senhor! Eu sou um pobre criado de servir, um homem de cor, mas nunca foi Mercúrio de ninguém!

ARNALDO - Isso lá vai...

PEDRO - Nunca tive patroa mais ciumenta que aquela! Vossa senhoria vivia muito apoquentado!

ARNALDO, a quem desagrada a conversa, naturalmente por ser com quem é, - O visconde está em casa?

PEDRO - Está sim senhor... está ali (Apontando para a direita baixa), no seu gabinete, ocupado com a sua advocacia!... Oh! O sr. visconde trabalha muito! Às 6 da manhã já está de pé... Senta-se à mesa de trabalho e desunha até às 11, mesmo aos domingos, como hoje!

ARNALDO - Está sozinho?

PEDRO - Sozinho. A sra. viscondessa foi ouvir missa ali na matriz. É verdade que a missa está a acabar, e a sra. viscondessa não tarda ai com as amigas.

ARNALDO - As amigas?

PEDRO - Sim, senhor. Todos os domingos, depois da missa, ela traz consigo, da igreja, quatro ou cinco senhoras da vizinhança, que vêm tomar café e conversar, aqui na sala, sobre todos os assuntos da semana... é assim uma espécie de folhetim... (Animado por um quase sorriso de Arnaldo) Cortam na pele das outras... e principalmente das outras, que é um gostinho. Se vossa senhoria assistisse, escondido, a uma dessas conversas entre a missa e o almoço, divertia-se a valer! são terríveis! Sabem de tudo quanto se passa na casa alheia! A sra. viscondessa é a que menos fala, mas parece que dá o cavaquinho por ouvir falar. É uma boa senhora, vossa senhoria não acha?

ARNALDO - Acho que você não perderia nada se também falasse menos. Ande, leve o meu cartão ao visconde, e pergunte-lhe se me pode receber.

PEDRO (que recebe o cartão, sai pela direita e volta logo depois.) O sr. visconde pede a vossa senhoria que entre. (Arnaldo, que examinava os quadros, sai pela direita baixa. Ouvem-se os sinos da igreja próxima.) Chi! Acabou a missa e a sala não está completamente espanada! (Espana às pressas.) A sra. viscondessa, vendo um poucochinho de pé, faz um tempo quente! Bom! Pronto! Agora é tratar do café!

(Olhando para fora ao passar pela porta do fundo). Era tempo: aí vem o folhetim'... (Sai pela direita alta).

CENA II

A VISCONDESSA ISALTINA, DUDU, LUÍSA, LAURA E ELISIÁRIA

(Bem trajadas todas, mas em cabelo. Traz cada uma o seu livro de missa. A viscondessa vai para os cinqüenta. Dudu tem apenas dezessete anos. É mal-educada. Luísa, sua mãe, é quarentona. As outras são senhoras de vinte e cinco a trinta anos.)

A VISCONDESSA, entrando - Vão entrando sentem-se. Eu vou lá dentro ver o café.

(Entram outras. Dudu vai para a janela).

ELISIÁRIA - Viscondessa, não se esqueça de recomendar que tragam a minha xícara com muito pouco açúcar! (A viscondessa sai pela direita alta).

LUÍSA - Tomara que o de hoje esteja melhor e o do domingo passado. Café, ou muito bom ou nenhum! (De repente, vendo Dudu à janela) Sai da janela, Dudu!

DUDU - Ora, mamãe!

LUÍSA - Não ouves! (Dudu sai da janela).

ELISIÁRIA - Há quatro, não: há cinco!

LAURA - Vocês também! Creio que há três!

ELISIÁRIA - Há cinco! Tem ouvido muita missa com aquela toilette!

LUÍSA - Pudera! O marido está pronto!

DUDU - Pronto para quê?

LUÍSA - "Pronto" quer dizer sem dinheiro.

DUDU - Nesse caso, também papai está pronto...

LUÍSA - Cala a boca, menina!

CENA III

AS MESMAS, A VISCONDESSA, PEDRO

(A viscondessa entra da direita alta, acompanhada por Pedro, que traz o café numa bandeja
de prata.)

A VISCONDESSA, às senhoras que estão de pé - Então, sentem-se!

(Estão sentadas todas. Pedro oferece-lhes café. Todas se servem).

ELISIÁRIA - Qual é a que tem pouco açúcar?

PEDRO - Esta. (Enquanto as senhoras tomam café, Pedro espera ao fundo, com a bandeja na mão. Luísa ao provar a sua xícara, faz uma careta).

VISCONDESSA - Está bom?

LUÍSA - Esplêndido!

LAURA - Magnífico!

ISALTINA - Delicioso!

DUDU, com ironia - Supimpa!

LUÍSA - Dudu!

(Pedro recolhe as xícaras vazias)

ISALTINA, pondo a sua xícara na bandeja - Estou tão habituada a este cafezinho depois da missa, que não poderia mais passar sem ele!(Pedro sai pela direita alta, levando a bandeja. Silêncio).

DUDU solenemente - Está aberta a sessão! (Todos riem).

LUÍSA - Dudu!

VISCONDESSA - Esta menina tem lembranças! Pois bem, está aberta a sessão. Quem pede a palavra!

ISALTINA - Eu!

VISCONDESSA - Tem a palavra.

ISALTINA - Quero dar-lhes uma grande novidade.

TODAS - Qual?

ISALTINA - Uma novidade de sensação! Preparem-se!

VISCONDESSA - Estamos preparadas.

ISALTINA - A Alice Viegas separou-se anteontem do marido!

TODAS - Hein!

VISCONDESSA - Que está dizendo, Isaltina? Isso pode lá ser!

LUÍSA - Não é possível!

ISALTINA - É o que lhes digo: separaram-se! A Alice está em casa dos pais, no Andaraí. Vão tratar do divórcio!

VISCONDESSA - Quem lhe deu essa noticia?

ISALTINA - Pessoa fidedigna: o médico da casa que assistiu, sem querer, ao final da cena de rompimento, e depois foi ao Andaraí para ver a Alice, que estava excessivamente nervosa.

VISCONDESSA - O Dr. Getúlio?

ISALTINA - Esse mesmo. Como sabem, é meu compadre. Foi, como todos os sábados jantar comigo ontem e contou-me tudo.

DUDU - Ora! Briga de marido e mulher não dura. Qualquer dia têm saudades. um do outro e fazem as pazes!

LUÍSA - Cala a boca menina!

VISCONDESSA - É difícil de acreditar! O Arnaldo Viegas vivia com a mulher como dois pombinhos...

LAURA - Não quer dizer nada.

ISALTINA - As aparências iludem. Eles ultimamente não se podiam ver...

ELISIÁRIA - Pode ser tudo verdade. A minha engomadeira, que serviu em casa deles não há multo tempo, disse-me que andavam sempre como o cão e o gato.

VISCONDESSA, em tom repreensivo - E você calada, Elisiária?

ELISIÁRIA - Esqueci-me de lhes dizer.

ISALTINA - Em todo o caso, não creio que a razão esteja com o marido...

DUDU, arrebatadamente - Por quê?

LUÍSA - Cala a boca, Dudu! Não te metas onde não és chamada!

LAURA - Conheço perfeitamente Alice; fomos companheiras de colégio; é uma senhora acima de qualquer suspeita.ELISIÁRIA - Quem sabe lá? Tem se visto tanta coisa extraordinária!...

VISCONDESSA - Sim, tem-se visto muita coisa... mas não há dúvida que até hoje ninguém lembrou de dizer mal de Alice.

ISALTINA, apoiando - Ninguém. Não gosto dela nem ela de mim, mas devo ser justa! Ninguém, nem mesmo nós!...

LAURA - Por que é que você não gosta dela? Alice é tão boazinha!...

ISALTINA - Não duvido; mas de tempos a esta parte começou a tratar-me por cima do ombro, fingindo que não me vê quando me encontra em qualquer parte, minha amiga, mas não me quis dizer por que.

DUDU - Então seria melhor que não a prevenisse!

LUÍSA - Cala a boca, Dudu!

DUDU - Eu, quando me tratam mal, quero por quê!

LUÍSA - Então?

DUDU - Ora, mamãe! Estou dizendo alguma asneira?

LUÍSA - Estas conversas não são para senhoritas.

DUDU - Então por que a senhora me trouxe?

(Vai de mau modo para a janela).

ISALTINA - Sou tão superior a essas pequenices, que a defendo, mesmo sem conhecer os motivos da separação!

VISCONDESSA - Conheço de perto o Dr. Arnaldo, que é contraparente do visconde. É um moço distintíssimo, correto, bem-educado, e nada consta que o desabone.

ELISIÁRIA - A Alice tem um grande defeito.

TODAS, com interesse - Qual?

ELISIÁRIA - É muito ciumenta. A esse respeito a minha engomadeira contou-me coisas muito interessantes.

LUÍSA, vendo Dudu à janela - Dudu, sai da janela! Oh, que menina teimosa!...

VISCONDESSA - Deixa-a. Que tem?

LUÍSA - O filho do Oliveira estava na igreja e não tirava os olhos dela. Naturalmente anda a rondar. - Dudu!

DUDU, saindo da janela - Ora, mamãe!... Não sei o que faça!... Se fico aqui, não devo ouvir a conversa, que é gênero livre; se vou para a janela, não devo estar na janela! Que coisa! (Senta-se amuada a folhear um álbum de retratos).

LUÍSA - Coisa ruim!...

LAURA - Também eu creio que sejam os ciúmes o motivo da separação. O Dr. Viegas vivia num cortado!

ISALTINA - Minha cara, não há desconfiança de esposa que não tenha razão de ser. Isso de ciúmes infundados é uma história inventada pelos senhores homens. A Alice era ciumenta porque provavelmente o marido lhe dava razão para isso.

VISCONDESSA - Deus me livre de defender homens, mas hão de convir; há casos em que a injustiça de certas senhoras...

ISALTINA - As vitimas somos sempre nós!

ELISIÁRIA - Sempre? Isso é muito absoluto!

ISALTINA - Será, mas é assim mesmo. Nesse ponto sou intransigente. Defendo contra os homens até as minhas próprias inimigas!...

VISCONDESSA - É levar muito longe o feminismo ou o espírito do sexo.

ISALTINA - Não há maridos irrepreensíveis... e compreende-se: eles saem, vão a toda são parte, são livres, e não há ninguém que não abuse da liberdade... Isso está na massa do sangue humano... E nós ficamos em casa, metidas entre paredes...

DUDU - Entre quatro paredes? Pois sim! Há senhoras casadas que apanhando os maridos na rua...

LUÍSA - Cala a boca, Dudu.

ISALTINA - Se o Dr. Arnaldo Viegas aparecesse aqui neste momento, eu interpelá-lo-ia e vocês veriam se tenho ou não tenho razão!

(Abre-se a porta da direita baixa e aparece Arnaldo Viegas. Espanto geral. Todas as senhoras se levantam.)

CENA IV

AS MESMAS, ARNALDO VIEGAS

ARNALDO, tomando a cena depois de uma larga pausa - O Dr. Arnaldo Viegas aqui está, minha senhora, e pronto para responder à interpelação... Ouvi sem querer... Estava naquele gabinete em conferência com o visconde, e ao sair...

VISCONDESSA - Não sabíamos. A sua presença foi para nós uma surpresa, e o seu aparecimento produziu um efeito verdadeiramente teatral (rindo-se). Mas não faça caso do que disse a Isaltina.

ISALTINA - Ah! Eu não recuo, viscondessa! Os homens não metem medo!...

ARNALDO - O mesmo não digo eu das mulheres, mas faz v. exa. muito bem e, uma vez que deseja interpelar-me, interpele-me à vontade!

DUDU - Quero ver como d. Isaltina descalça essa bota!

LUÍSA - Dudu!

ARNALDO - O assunto da interpelação não pode ser outro senão o lamentável incidente, quese acaba de dar na minha casa, e do qual foi testemunha, em parte, o Dr. Getúlio, compadre de v. exa. - mas vossas excelências estavam sentadas... levantaram-se quando eu entrei... queiram sentar-se. Também eu me sento. (Sentam-se todos). Pois, é verdade, minhas senhoras, separei-me de minha mulher. Era dela que falavam? Destruiu todo o meu laborioso sonho de futuro... "Destruiu" é um modo de dizer: destruído estava ele há muito tempo. Agora mesmo solicitei do visconde que se encarregasse do meu processo de divórcio... Divórcio? Quando poderia eu pensar que o meu amor tivesse um epílogo judiciário! (Silêncio). Enganei- me? Não era esse o objeto da interpelação?

ISALTINA - Era, sim, senhor. Eu defendi sua senhora. O doutor bem sabe que ela, não sei por que, deixou de simpatizar comigo; portanto, não sou suspeita... Qual dos dois é o culpado? Ela? Duvido!

ARNALDO - Somos culpados ambos, ela e eu. Ela, porque era injusta, porque fazia da nossa casa um inferno e não me deixava trabalhar, e porque, casado há quase três anos, não tratei de corrigir desde os primeiros dias, os seus defeitos de educação. Alice entendeu que eu deveria ser, não o seu esposo, não o seu companheiro, amante, leal e dedicado, mas o escravo dos seus caprichos, das suas fantasias, das suas ilusões. Fiz todos os esforços para viver só para ela e para o trabalho, mas não consegui. Se continuássemos ligados um ao outro, em pouco tempo estaríamos velhos e gastos. Não nos compreendíamos, e já não nos amávamos. Não tínhamos filhos, éramos ricos, o melhor que podíamos fazer era procurar cada qual outro rumo. Foi o que fizemos.

ISALTINA - Mas Alice é uma senhora honesta.

ARNALDO - Quem diz o contrário? Posso dar o melhor testemunho da sua honestidade, empregando a palavra honestidade na acepção em que v. exa. a empregou, isto é, tenho certeza de que Alice, depois de casada, nunca pensou noutro homem que não fosse eu.

LUÍSA - Dudu, vai para a janela.

DUDU - Que coisa! (Vai para a janela).

ARNALDO - Ela é honesta, e também eu o sou, conquanto, ela e v. exas. não creiam.
(Murmúrios de protestos). Mas a honestidade não basta para fazer a ventura de um casal; é preciso também o amor. Desde que este desapareceu para dar lugar à mentira e à hipocrisia, só as conveniências sociais me obrigariam a aceitar uma situação intolerável e eu - com perdão de v. exas. - declaro que não sacrifico a minha vida à sociedade, nem o meu quinhão de felicidade a essa moral despótica que é a desgraça dos fracos. Não sou fatalista, não creio na boa ou má sorte dos indivíduos, e acho que toda a criatura humana, quando mais não seja senão pelo instinto de conservação, tem o direito de remover quantos obstáculos as circunstâncias oponham à sua felicidade. O destino é um preconceito.

VISCONDESSA - Mas não me parece que o seu caso seja caso para divórcio.

ARNALDO - O divórcio não foi instituído exclusivamente para os desonestos. Serve também para os infelizes... para os que se ligaram por um equivoco. Apenas lamento que o não tenhamos ainda absoluto e completo e Alice e eu não possamos recobrar senão parte da nossa liberdade.

LAURA, tristemente - Alice era muito ciumenta.

ARNALDO - Ainda bem que v. exa. o sabe. Foram os seus ciúmes que envenenaram a nossa existência conjugal e deram cabo do nosso amor. Não eram zelos, que os zelos são um condimento melindroso de toda a afeição sincera; eram ciúmes, ciúmes terríveis, extravagantes, absurdos, odiosos, - ciúmes que me ofendiam profundamente e muitas vezes me colocavam numa situação desairosa e ridícula, - ciúmes de todas as senhoras com que eu falava - ciúmes das mulheres desconhecidas que se sentavam a meu lado no bonde ou no teatro: - ciúmes das amigas, das parentes, das criadas e até das cozinheiras....

ISALTINA - Não é crível que tantos ciúmes fossem à toa, não é crível que o doutor não lhe tivesse dado, ao menos, uma vez, razão para...

DUDU, deixando a janela - Isso agora é impertinência!

LUÍSA - Dudu!...

ARNALDO, depois de uma pausa, tomando uma resolução e aproximando a sua cadeira da de Isaltina - Ouça bem, minha senhora, e responda. Invertamos os papéis, agora quem interpela sou eu. Uma noite tive a honra de encontrá-la no Casino, durante uma partida, do Clube dos Diários, e troquei algumas palavras com v. exa. lembra-se?

ISALTINA - Perfeitamente. Foi o ano passado.

ARNALDO - Pois bem, as minhas palavras foram inconvenientes?... Eram palavras que v. exa. não pudesse ou não devesse ouvir?

ISALTINA - Oh, doutor!... essa pergunta!...

ARNALDO - Peço a v. exa. que me responda: algum dia faltei ao respeito devido a v. exa.?

ISALTINA - Nunca...! Nem eu o permitiria!

ARNALDO - Algum dia estive a sós com v. exa?

ISALTINA - Comigo?! Nunca!

ARNALDO - Algum dia v. exa. recebeu carta minha ou recado meu? Algum dia lobrigou nos meus olhares ou nos meus gestos a manifestação de um desejo impuro?

ISALTINA - Nunca!

ARNALDO - Pois bem, na opinião da minha mulher, v. exa. foi minha amante! (Levanta-se).

TODAS - Oh! (Levantam-se todas, menos Isaltina).

ARNALDO - Ela muitas vezes lançou à cara os meus amores com v. exa. e fartou-se de dizer a muita gente, inclusive ao Dr. Getúlio, compadre de v. exa. Pergunte-lho!

ISALTINA - Estou petrificada!

VISCONDESSA - O caso não é para menos.

ARNALDO - Creio que me justifiquei perfeitamente. Peço a v. exas. permissão para me retirar.. Viscondessa... minhas senhoras... (Cumprimenta).TODAS - Doutor... (Arnaldo sai).

CENA V

AS MESMAS, menos ARNALDO

ISALTINA, levantando-se e prorrompendo em pranto - Por esta não esperava eu!

DUDU - Pois eu esperava!

LUÍSA - Dudu!

VISCONDESSA - Não chore... Não há razão para tanto!...

ISALTINA - Estou muito nervosa.

VISCONDESSA - Isso passa, não é nada. Minhas amigas, o Dr. Arnaldo Viegas respondeu tão bem à interpelação que podemos, creio, votar uma moção de confiança.

TODAS, menos Isaltina - Apoiado!

DUDU - Está levantada a sessão!

Fonte:
CD Digerati CC003.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Trova 161 - Apollo Taborda França (Curitiba/PR)

Fonte:
Trova sobre imagem obtida em http://riscando7.blogspot.com/2010/01/lazer.html

Apollo Taborda França (Baú de Trovas)


Meu coração é valente,
Não chora o mal que me fez...
E diz que bem de repente,
Termina a sua altivez!

Quando a gente ama não sente,
O mal que fazem prá nós
Escondemos d' alma silente,
Num secreto albornoz!

Coração que ama não chora
Males que afligem a gente;
Exalta e nunca deplora
A mágoa dura, pungente!

Melhor fora não amar,
Não ficaria à mercê...
Não seria mais vulgar,
De pensar tanto em você!

O teu sorriso menina
É feiticeiro demais...
Tão forte qual vitamina,
Muito alvoroça meus ais!

Das rosas do meu jardim,
Maria sempre a mais bela...
Perfuma mais que o jasmim,
Que floresce em torno dela!

Borboletas, aves, flores,
que bem nutrem os florais...
Dão contornos às silhuetas
Dos esbeltos pinheirais!

Aves grandes e pequenas,
De refulgentes roupagens...
Cores que vão às centenas,
Celebrizando as plumagens!

Página triste da vida,
Não se guarda na lembrança...
Sim, aquela bem querida,
Que nos trouxe a esperança!

Cada página da vida,
Faz lembrar um grande amor...
É você, minha querida,
A que guardo com fervor!
--------------

Fonte:
FRANÇA, Apollo Taborda. Trovas Maravilhosas. Curitiba: O Formigueiro, 1986.

Bernardo Sá Barreto Pimentel Trancoso (Diálogos: A Ilha)


- Quem és - pergunta o Sol - no azul brilhante
Que o céu, mesmo distante, cede ao mar?
Por que persistes tanto em ser gigante,
Se és menos que o meu brilho, a refratar?

- Sou ilha. Esse meu verde exuberante
Faz aves, por aqui, virem pousar.
Meu lar, acolhedor, traz navegante
Que a areia, um só instante, quer beijar.

- Se atreves a afirmar que não és só?
Tuas matas e terras, não são vãs?
No mar, lembra-te ilhota, és vil, és pó.

- Não feito tu, estrela das manhãs,
De quem a solidão provoca dó:
Tu vens, e vão dormir tuas irmãs.

Fonte:
http://www.elsonfroes.com.br/sonetario/trancoso.htm

Lima Barreto (Clara dos Anjos)


Análise da obra

Concluído em 1922, ano da morte de Lima Barreto, o romance Clara dos Anjos é uma denúncia áspera do preconceito racial e social, vivenciado por uma jovem mulher do subúrbio carioca.

O Realismo-naturalismo, que tanto influenciou Lima Barreto na composição de Clara dos Anjos, é cientificista e determinista, considerando que as ações humanas são produtos de leis naturais: do meio, das características hereditárias e do momento histórico. Portanto, os romances naturalistas procuravam, através da representação literária, demonstrar teses extraídas de teorias científicas. Para isso, o Naturalismo buscou compor um registro implacável da realidade, incluindo seus aspectos repugnantes e grotescos. São exatamente esses os aspectos que mais chamam à atenção na narrativa exagerada de Clara dos Anjos.

Em Clara dos Anjos relata-se a estória de uma pobre mulata, filha de um carteiro de subúrbio, que apesar das cautelas excessivas da família, é iludida, seduzida e, como tantas outras, desprezada, enfim, por um rapaz de condição social menos humilde do que a sua. É uma estória onde se tenta pintar em cores ásperas o drama de tantas outras raparigas da mesma cor e do mesmo ambiente. O romancista procurou fazer de sua personagem uma figura apagada, de natureza "amorfa e pastosa", como se nela quisesse resumir a fatalidade que persegue tantas criaturas de sua casta.

Espaço

O romance passa-se no subúrbio carioca e Lima Barreto descreve o ambiente suburbano com riqueza de detalhes, como os vários tipos de “casas, casinhas, casebres, barracões, choças” e a vida das pessoas que ali vivem.

Ao descrever o subúrbio, Lima Barreto aborda o advento dos “bíblias”, os protestantes que alugam uma antiga chácara e passam a conquistar novos fiéis para seu culto:

Joaquim dos Anjos ainda conhecera a "chácara" habitada pelos proprietários respectivos; mas, ultimamente, eles se tinham retirado para fora e alugado aos "bíblias"… O povo não os via com hostilidade, mesmo alguns humildes homens e pobres raparigas dos arredores freqüentavam-nos, já por encontrar nisso um sinal de superioridade intelectual sobre os seus iguais, já por procurarem, em outra casa religiosa que não a tradicional, lenitivo para suas pobres almas alanceadas, além das dores que seguem toda e qualquer existência humana.” E reflete sobre a nova seita:

“Era Shays Quick ou Quick Shays daquela raça curiosa de yankees fundadores de novas seitas cristãs. De quando em quando, um cidadão protestante dessa raça que deseja a felicidade de nós outros, na terra e no céu, à luz de uma sua interpretação de um ou mais versículos da Bíblia, funda uma novíssima seita, põe-se a propagá-la e logo encontra dedicados adeptos, os quais não sabem muito bem por que foram para tal novíssima religiãozinha e qual a diferença que há entre esta e a de que vieram.”

A crítica às “novas seitas cristãs” revela também a ojeriza de Lima Barreto à influência americana no Brasil. Como o colocou Antônio Arnoni Prado, o autor de Clara dos Anjos “interessou-se pelos Estados Unidos, em virtude do tratamento desumano que este país dispensava aos seus cidadãos de cor. (…) Censurou duramente a discriminação racial americana, assim como o expansionismo imperialista dos ‘yankees’, que, através da diplomacia do dólar, ia, a seu ver, convertendo o Brasil num autêntico protetorado.” Nada mais profético.

Personagens

Marrameque - Poeta modesto, semiparalisado, Marramaque freqüentara uma pequena roda de boêmios e literatos e dizia ter conhecido Paula Nei e ser amigo pessoal de Luís Murat.

Lima Barreto denuncia, na figura de Marramaque, a influência das rodas literárias, grupos fechados que abundam no Brasil; a cultura da oralidade, dos que aprendem “muita coisa de ouvido e, de ouvido, falava de muitas delas”, tendo um cultura superficial, de verniz; e o azedume dos que não conseguem brilhar nas “rodas de gente fina”.

Clara: a “natureza elementar” - Clara era a segunda filha do casal, “o único filho sobrevivente…os demais…haviam morrido.” Tinha dezessete anos, era ingênua e fora criada “com muito desvelo, recato e carinho; e, a não ser com a mãe ou pai, só saía com Dona Margarida, uma viúva muito séria, que morava nas vizinhanças e ensinava a Clara bordados e costuras.”

O autor reitera sempre a personalidade frágil da moça – sua “alma amolecida, capaz de render-se às lábias de um qualquer perverso, mais ou menos ousado, farsante e ignorante, que tivesse a animá-lo o conceito que os bordelengos fazem das raparigas de sua cor” – como resultado de sua educação reclusa e “temperada” pelas modinhas:

Clara era uma natureza amorfa, pastosa, que precisava mãos fortes que a modelassem e fixassem. Seus pais não seriam capazes disso. A mãe não tinha caráter, no bom sentido, para o fazer; limitava-se a vigiá-la caninamente; e o pai, devido aos seus afazeres, passava a maioria do tempo longe dela. E ela vivia toda entregue a um sonho lânguido de modinhas e descantes, entoadas por sestrosos cantores, como o tal Cassi e outros exploradores da morbidez do violão. O mundo se lhe representava como povoado de suas dúvidas, de queixumes de viola, a suspirar amor.”

Essa “natureza elementar” de Clara se traduzia na ausência de ambição em melhorar seu modo de vida ou condição social por meio do trabalho ou do estudo:

Nem a relativa independência que o ensino da música e piano lhe poderia fornecer, animava-a a aperfeiçoar os seus estudos. O seu ideal na vida não era adquirir uma personalidade, não era ser ela, mesmo ao lado do pai ou do futuro marido. Era constituir função do pai, enquanto solteira, e do marido, quando casada. (…) Não que ela fosse vadia, ao contrário; mas tinha um tolo escrúpulo de ganhar dinheiro por suas próprias mãos. Parecia feio a uma moça ou a uma mulher.”

A descrição de Clara reforça os malefícios da formação machista, superprotetora, repressiva e limitadora reservada às mulheres na nossa sociedade. Ecoa, portanto, a descrição de Luísa, do romance O Primo Basílio, de Eça de Queirós, ou a Ana Rosa de O Mulato, de Aluísio de Azevedo. Todas são, na verdade, herdeiras diretas da figura de formação débil, educada nas leituras dos romances românticos, que é Emma Bovary, criada por Gustave Flaubert no romance inaugural do Realismo, Madame Bovary (1857).

Cassi: o corruptor - Por intermédio de Lafões, o carteiro Joaquim passa a receber em casa o pretendente de Clara, Cassi Jones de Azevedo, que pertencia a uma posição social melhor. Assim o descreve Lima Barreto:

Era Cassi um rapaz de pouco menos de trinta anos, branco, sardento, insignificante, de rosto e de corpo; e, conquanto fosse conhecido como consumado "modinhoso", além de o ser também por outras façanhas verdadeiramente ignóbeis, não tinha as melenas do virtuose do violão, nem outro qualquer traço de capadócio. Vestia-se seriamente, segundo as modas da rua do Ouvidor; mas, pelo apuro forçado e o degagé suburbanos, as suas roupas chamavam a atenção dos outros, que teimavam em descobrir aquele aperfeiçoadíssimo "Brandão", das margens da Central, que lhe talhava as roupas. A única pelintragem, adequada ao seu mister, que apresentava, consistia em trazer o cabelo ensopado de óleo e repartido no alto da cabeça, dividido muito exatamente ao meio — a famosa "pastinha". Não usava topete, nem bigode. O calçado era conforme a moda, mas com os aperfeiçoamentos exigidos por um elegante dos subúrbios, que encanta e seduz as damas com o seu irresistível violão.”

O padrinho Marramaque, que já lhe conhecia a fama, tenta afastá-lo de Clara quando percebe seu interesse. Na festa de aniversário da afilhada, provoca Cassi e deixa claro que ele não é bem-vindo ali e que seria melhor que se retirasse. Cassi vinga-se de modo violento: junta-se a um capanga e ambos assassinam Marramaque. Clara, que já suspeitava das ameaças do rapaz ao padrinho, passa a temê-lo, mas ele consegue seduzi-la, principalmente ao confessar seu crime, dizendo que matou por amor a ela.
Malandro e perigoso, Cassi já havia se envolvido em problemas com a justiça antes, mas sempre fora acobertado pela sua família, especialmente sua mãe, que não queria que fosse preso. Assim, conseguia subornar a polícia e continuar impune, mesmo depois de ter levado a mãe de uma de suas vítimas ao suicídio e da perseguição da imprensa.

O exagero narrativo de Lima Barreto torna-se patente ao descrever a figura do sedutor. Branco, sardento e de cabelos claros, é a antítese de Clara. Como o apontou Lúcia Miguel Pereira: “Até os animais da predileção de Cassi, os galos de briga, são apresentados com visível má vontade: ‘horripilantes galináceos’ de ‘ferocidade repugnante’.”

Joaquim dos Anjos - carteiro, acredita-se músico escreveu a polca, valsas,tangos e acompanhamentos de modina. polca: siti sem unhas; valsa: mágos do coração.

Uma polca sua - "Siri sem unhas" - e uma valsa - "Mágoas do Coração: - tiveram algum sucesso, a ponto de vender ele a propriedade de cada uma, por cinqüenta mil-réis, a uma casa de músicas pianos da Rua do Ouvidor. O seu saber musical era fraco; adivinha mais do que empregava noções teóricas que tivesse estudo.

Aprendeu a "artinha" musical da terra do seu nascimento, nos arredores de Diamantina, em cujas festas de igrejas a sua flauta brilhara, e era tido por muitos como o primeiro flautista do lugar. Embora gozando desta fama animadora, nunca quis ampliar os seus conhecimentos musicais. Ficara na "artinha" de Francisco Manuel, que sabia de cor, mas não saíra dela, para ir além (p.21/22)

Natural de Diamantina, filho único. A convite de um inglês, pesquisador, foi para o Rio de Janeiro e lá ficou. Confiava em todos que o rodeavam.

"Um dos traços mais simpáticos do caráter de Joaquim dos Anjos era a confiança que depositava nos outros, e a boa fé. Ele não tinha, como diz o povo, malícia no coração. Não era inteligente, mas também não era peco; não era sagaz, mas também não era tolo; entretanto, não podia desconfiar de ninguém, porque isso lhe fazia mal à consiência." (p.115)

Dona Engrácia - era católica, romana, filhos trazidos na mesma religião, era caseira, insegura, e rude.

Calado - músico e compositor brasileiro (polcas "Cruzes, minha prima!")

Patápio Silva - "Uma polca sua - "Siri sem unha"- e uma valsa - "Mágoas do coração" - tiveram algum sucesso, a ponto de vender ele a propriedade de cada uma, por cinqüenta mil-réis, a uma casa de música e piano da Rua Ouvidor." (p.21).

João Pintor - era um cidadão que visitava "os bíblias" aqueles que pregavam o evangelho. "era preto retinto, grossos lábios, malares proeminentes, testa curta dentes muito bons e muitos claros, longos braços, manoplas enormes, longas pernas e uns tais pés que não havia calçado."(p.25).

Mr. Shays - chefe da seita bíblica, homem tenaz cheio de eloqüência bíblica faz seus adeptos ouvir a palavra. Quando os adeptos se acham preparados põem-se a propagá-la.

Eduardo Lafões - religiosamente ia aos domingos à casa de Joaquim para jogar o solo. Eduardo Lafões gostava dos assuntos do comércio. Era um homem simplório, que só tinha agudeza de sentidos para o dinheiro. Vivendo sempre em círculos limitados, habituado a ver o valor dos homens nas roupas e no parentesco, ele não podia conceber que torvo indivíduo era o tal Cassi; que alma suja e má era dele, para se interessar generosamente por alguém.

Manuel Borges de Azevedo e Salustiana Baeta de Azevedo - pais de Cassi. O pai não gostava dos procedimentos do filho, enquanto a mãe, cobria-lhe as desfeitas com as proteções.

Dona Margarida Weber Pestana - viúva, mãe de Ezequiel, descendente de Alemão; ela, russa. Casou no Brasil com tipógrafo que falecera dois anos após o casamento. Era dona de uma pensão, mulher corajosa.

"O Senhor Ataliba do Timbó deu em certa ocasião em persegui-la com ditinho de Amor chulo. Certo dia, ela não teve dúvidas: meteu-lhe o guarda-chuva com vigor. À noite, no intuito de defender as suas galinhas da sanha dos ladrões, de quando em quando, abria um postigo, que abrira na janela da cozinha, e fazia fogo de revólver. Era respeitada pela sua coragem, pela sua bondade que era mulato, mais tinha os olhos glaucos, translúcidos, de sua mãe meio eslava, meio alemã, olhos tão estranhos - olhos tão estranhos e nós e, sobretudo, ao sangue dominante no pequeno." (p.60)

D. Laurentina Jácone - gostava de rezar, ficar zelando a igreja.

D. Vicêntina - cartomante.

"Além desta, havia uma digna de nota: era Dona Vicência. Morava na vizinhança também e vivia a deitar cartas e cortar "cousas feitas". O seu procedimento era inatacável e exercia a sua profissão de cartomante com toda a seriedade e convicção."(p.60)

Praxedes Maria dos Santos - gostava de ser tratado por doutor Praxedes. Foi um dos convidados de Joaquim. Era um homem bom. Ficou indeterminada das correspondência de Clara com o Cassi.

Etelvina - crioula, colega de Clara, notou a impaciência de Clara porque o rapaz Cassi ainda não chegara à festa.

Leonardo Flores - grande poeta.

Velho Valentim - era português.

Barcelos - um português fichado na detenção.

Arnaldo - era um colega do grupo dos valdevino (desoculpados que andava com Cassi).

"Cassi explicou-lhe então que devia ir, naquela tarde, à venda do Nascimento, cuja rua e cujo número lhe deu. Chegando lá, simularia ter ido procurar por "Seu" Menezes, que ele conhecia.

- Se ele não estiver? - indagou Arnaldo.

- Você diz que fica à espera e ouve o que se conversa lá. Nela, devem estar, entre outros o aleijadinho que anda sempre fardado. Ele não conhece você, como os outros, conforme espero. O que você ouvir, guarda e me conta. Se Meneses aparecer, você diz que quero falar com ele, negócio de interesse dele
." (p.91).

Menezes - o dentista da família. Intermediário dos bilhetes e cartas de Cassi para Clara. Senhor Monção - caixeiro vendedor; Belmiro Bernedes & Cia. - "tocava realejo", era um moço português, simpático, educado, e bom porte.

Helena - tia de Marramaque, econômica, prendada, costurava para o arsenal do governo.

D. Castolina - mulher de Meneses.

Leopoldo - marinheiro. Cedo, saiu de seio da família para melhorar de vida. Há 30 anos não via família. Meneses com a sua pobreza tratou de visitar o imrão já que eram os únicos vivos da família.

Enredo

Clara é uma mulata pobre, que vive no subúrbio carioca com seus pais, Joaquim e Engrácia, mulher “sedentária e caseira.” Joaquim era carteiro, “gostava de violão e de modinhas. Ele mesmo tocava flauta, instrumento que já foi muito estimado em outras épocas, não o sendo atualmente como outrora”. Também “compunha valsas, tangos e acompanhamentos de modinhas.” Além da música, a outra diversão do pai de Clara era passar as tardes de domingo jogando solo com seus dois amigos: o compadre Marramaque e o português Eduardo Lafões, um guarda de obras públicas.

Clara engravida e Cassi Jones desaparece. Convencida pela vizinha, dona Margarida, que procurara na tentativa de conseguir um empréstimo e fazer um aborto, ela confessa o que está acontecendo à sua mãe. É levada a procurar a família de Cassi e pedir “reparação do dano”. A mãe do rapaz humilha Clara, mostrando-se profundamente ofendida porque uma negra quer se casar com seu filho. Clara “agora é que tinha a noção exata da sua situação na sociedade. Fora preciso ser ofendida irremediavelmente nos seus melindres de solteira, ouvir os desaforos da mãe do seu algoz, para se convencer de que ela não era uma moça como as outras; era muito menos no conceito de todos.”

O autor representa, na figura de Clara e no seu drama, a condição social da mulher, pobre e negra, geração após geração. No final do romance, consciente e lúcida, Clara reflete sobre a sua situação:

O que era preciso, tanto a ela como às suas iguais, era educar o caráter, revestir-se de vontade, como possuía essa varonil Dona Margarida, para se defender de Cassi e semelhantes, e bater-se contra todos os que se opusessem, por este ou aquele modo, contra a elevação dela, social e moralmente. Nada a fazia inferior às outras, senão o conceito geral e a covardia com que elas o admitiam...”

E, na cena final, ao relatar o que se passara na casa da família de Cassi Jones para a sua mãe, conclui, em desespero, como se falasse em nome dela, da mãe e de todas as mulheres em iguais condições: “— Nós não somos nada nesta vida.”

Fonte:
http://www.passeiweb.com

Bernardo Sá Barreto Pimentel Trancoso (Soneto)


DEFINIÇÕES:

Soneto – Pequena composição poética composta de 14 versos, com número variável de sílabas, sendo o mais freqüente o decassílabo, e cujo último verso (dito chave de ouro) concentra em si a idéia principal do poema ou deve encerrá-lo de maneira a encantar ou surpreender o leitor. Pode ter a forma do soneto italiano (o mais praticado) ou do soneto inglês. (…). Fonte: Houaiss

Soneto – Composição poética, formada por quatorze versos geralmente distribuídos por dois quartetos e dois tercetos. S. estramboto: soneto com três tercetos, usado no século XVII. S. inglês: soneto formado por três quartetos independentes e um dístico. Fonte: Michaelis

COMO ESCREVER UM SONETO

Introdução

É quase um desaforo tentar ensinar regras a alguém que pretende escrever um poema, onde cada verso produzido resulta de uma inspiração que, além de individual, é uma manifestação do pensamento livre. Em outras palavras, não dá para dizer a um poeta “seja metódico em seus versos”. Deve partir do próprio poeta a iniciativa de seguir ou não as regras que existem nos sonetos.

A maioria dos poetas citados nessas páginas não se limitou a elaborar sonetos. Alguns deles, eu creio, foram atraídos pela história e pela sonoridade dessa composição. Um soneto é uma obra curta criada para transmitir uma mensagem em seus catorze versos, divididos em dois quartetos (grupos de quatro versos) e dois tercetos (três versos), ou três quartetos e um dístico (dois versos).

Métrica

Em primeiro lugar, os versos devem possuir a mesma métrica, ou seja, o mesmo número de sílabas poéticas. Uma sílaba poética é bem diferente de uma sílaba comum. É possível unir duas ou mais palavras em apenas uma sílaba poética. Veja o verso abaixo: “Busque amor, novas artes, novo engenho…” (Luis de Camões). Tente ler esse verso devagar, como se fosse uma só palavra, e vá contando quantas pausas existem até a última sílaba tônica.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Bus/que a/mor,/no/ vas/ ar/ tes,/ no/ vo en/ge/ nho

Você encontrou as dez sílabas poéticas, certo? Repare que a expressão “busque amor”, ao invés das quatro sílabas comuns (bus-que-a-mor), tem na poesia apenas três sílabas. Costuma-se ensinar as sílabas poéticas como sendo a forma em que são “ouvidos” os versos, por isso a sonoridade é importante em um soneto.

Camões escreveu seus sonetos (e Os Lusíadas também) usando sempre dez sílabas poéticas. Outro exemplo pertence a Vinícius de Moraes: “De tudo, ao meu amor serei atento…”. Poeticamente, o verso acima é dividido assim:

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
De/tu/ do ao /meu /a/ mor/ se/ rei/ a/ ten/ to

Versos com dez sílabas poéticas são chamados decassílabos. Outra forma famosa de escrever são os versos alexandrinos ou dodecassílabos (doze sílabas), conforme exemplo: “Sinto que há na minha alma um vácuo imenso e fundo…” (Machado de Assis). Tente perceber as doze sílabas. Se não conseguir, veja abaixo como o verso é dividido.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Sin /to/ que há /na/ mi/ nha al/ ma um/ vá /cuo i /men/ so e/ fun /do

Curiosamente, Olavo Bilac, um dos maiores poetas brasileiros, tinha em seu próprio nome um verso alexandrino: Olavo Brás Martins dos Guimarães Bilac. Dizem que ele já nasceu predestinado à poesia. Coincidência ou não, meu nome completo também é um verso alexandrino: Bernardo Sá Barreto Pimentel Trancoso.

Posicionamento de rimas

Além do número de sílabas, outra característica importante de um soneto é a ordem em que os versos rimam, ou posicionamento de rimas. Para os quartetos, existem três formas principais de posicionamento:

Rimas entrelaçadas ou opostas – abba (o 1º verso rima com o 4º, o 2º rima com o 3º):

“Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a ingratidão – esta pantera -
Foi tua companheira inseparável…”
(Augusto dos Anjos)

“Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido,
Porque quanto mais tenho delinqüido,
Vos tenho a perdoar mais empenhado…”
(Gregório de Matos)

Rimas alternadas – abab (o 1º verso rima com o 3º, o 2º rima com o 4º):

“Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha…”
(Olavo Bilac)

“Quando em teus braços, meu amor, te beijo,
se me torno, de súbito, tristonho,
é porque às vezes, com temor, prevejo
que esta alegria pode ser um sonho…”
(Martins Fontes)

Rimas emparelhadas – aabb (o 1º verso rima com o 2º, o 3º rima com o 4º):

“No rio caudaloso que a solidão retalha,
na funda correnteza na límpida toalha,
deslizam mansamente as garças alvejantes;
nos trêmulos cipós de orvalho gotejantes…”
(Fagundes Varela)

“Nada vai separar; existem laços.
Nem vai desenlaçar, nem nos espaços
Entre os passos que, juntos, damos sós,
Nem antes dos abraços, nem após…”
(Bernardo Trancoso)

Os tercetos, por sua vez, são mais flexíveis com relação ao posicionamento das rimas. Fernando Pessoa, por exemplo, usou a estrutura cdc ede nos tercetos a seguir:

“Há saudades nas pernas e nos braços.
Há saudades no cérebro por fora.
Há grandes raivas feitas de cansaços.
Mas – esta é boa! – era do coração
que eu falava… e onde diabo estou eu agora
com almirante em vez de sensação?…”

William Shakspeare, por sua vez, escrevia, ao invés de dois tercetos, um quarteto e um dístico (cdcd ee).

“But thy eternal Summer shall not fade,
Nor lose possession of that fair thou ow’st,
Nor shall Death brag thou wander’st in his shade,
When in eternal lines to time thou grow’st,
So long as men can breathe or eyes can see,
So long lives this, and this gives life to thee…”

Outros exemplos de posicionamento de rimas nos tercetos são cde cde, um dos mais famosos, cde edc e também cce dde. Ao passear pelos sonetos dessas páginas, tente notar que estilo o autor empregou em seus versos.

Escolha o que achar melhor para o seu soneto.

Até aqui falei de métricas e de rimas, encontradas na quase totalidade dos sonetos clássicos. Há sonetistas modernos, entretanto, que aboliram esses conceitos, usando versos brancos (sem rima) em suas composições. Martins Fontes escreveu o Soneto Monossílabo, onde cada verso tem uma sílaba apenas.

“Negro jardim onde violas soam
e o mal da vida em ecos se dispersa:
à toa uma canção envolve os ramos
como a estátua indecisa se reflete…”
(Carlos Drummond de Andrade)

Sonoridade

O último componente importante de um soneto é a sonoridade, isto é, onde estão as sílabas tônicas (ou fortes) de cada verso. Quando combinadas, essas sílabas fazem com que o soneto se pareça com uma suave canção. Quanto à sonoridade, os versos decassílabos classificam-se em dois tipos: heróicos e sáficos.

“Já Bocage não sou!… À cova escura
Meu estro vai parar desfeito em vento…”
(Bocage)

Esses são versos decassílabos heróicos, porque as sílabas poéticas tônicas são a sexta e a décima, indicadas em negrito. Todos os 8816 versos de “Os lusíadas” são decassílabos heróicos. Um verso decassílabo sáfico, por sua vez, reforça a quarta, a oitava e a décima sílaba poética: “Vozes veladas, veludosas vozes…” (Cruz e Souza)

Finalmente, os versos alexandrinos possuem a quarta, a oitava e a décima-segunda sílaba poética como sílabas fortes, ou a sexta, a décima e a décima-segunda.

Conclusão:

O que mais torna um soneto possível? A inspiração, o tema, o conhecimento das palavras e das rimas, que serão mais ricas quanto mais rico for o vocabulário do sonetista. Por isso, a leitura de outros sonetos, poesias e livros é importante. A minha intenção é um dia poder publicar o seu soneto entre essas páginas. Escreva! Assim, você estará dando um passo rumo à eternidade das palavras e dos versos que compõem a nossa tão grandiosa literatura

Fonte:
Academia de Letras de Maringá. Obtido no site http://www.sonetos.com.br/

terça-feira, 6 de julho de 2010

Silviah Carvalho (Renúncia)


Amando-te mais que a vida,
Sigo meu caminho,
Nem posso dizer que existo,
Pois neste mundo me vejo sozinha.

Se ao menos pudesse vê-lo um dia,
E olhar nos seus olhos e sentir teu calor,
Talvez sobrevivesse essa falta de você,
Essa falta de amor.

Lágrimas caem do meu rosto,
Como cai lá fora a chuva constante,
Lágrimas de um sofrimento absurdo,
Que me martiriza a cada instante.

Sinto que cheguei fora do tempo aqui,
Ou o tempo teve pressa e não esperou por mim,
Agora, amando-te mais que a mim mesma,
Desisto de ti.

Para provar que te amo,
Renuncio minha felicidade para que sejas feliz,
Renuncio os sonhos que sonhei com você,
Renuncio minha paz, para que em paz você possa viver.

Porei vendas em meus olhos,
Para que eles não mais te procurem,
Atarei meu coração á mim,
Para que desesperado não fuja para ti.

Renuncio a vida, e tudo que eu sempre quis,
E quando secarem minhas lágrimas,
De chorar por ti, não pense que te esqueci.

Será o silêncio da renúncia,
Que eu mesma fiz,
Renunciei tudo, por ti.
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Fontes:
Colaboração da Autora
Imagem = http://ncahino.blogspot.com/

Literatura Brasileira (Parte 15 = A Produção Contemporânea)


Produção contemporânea deve ser entendida como as obras e movimentos literários surgidos nas décadas de 60 e 70 e que refletiram um momento histórico caracterizado inicialmente pelo autoritarismo, por uma rígida censura e enraizada autocensura. Seu período mais crítico ocorreu entre os anos de 1968 e 1978, durante a vigência do Ato Institucional nº 5 (AI-5). Tanto que, logo após a extinção do ato, verificou-se uma progressiva normalização no país.

As adversidades políticas, no entanto, não mergulharam o país numa calmaria cultural. Ao contrário, as décadas de 60 e 70 assistiram a uma produção cultural bastante intensa em todos os setores.

Na poesia, percebe-se a preocupação em manter uma temática social, um texto participante, com a permanência de nomes consagrados como Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto e Ferreira Gullar, ao lado de outros poetas que ainda aparavam as arestas em suas produções.

Visual - O início da década de 60 apresentou alguns grupos em luta contra o que chamaram "esquemas analítico-discursivos da sintaxe tradicional". Ao mesmo tempo, esses grupos buscavam soluções no aproveitamento visual da página em branco, na sonoridade das palavras e nos recursos gráficos. O sintoma mais importante desse movimento foi o surgimento da Poesia Concreta e da Poesia Práxis. Paralelamente, surgia a poesia "marginal", que se desenvolve fora dos grandes esquemas industriais e comerciais de produção de livros.

No romance, ao lado da última produção de Jorge Amado e Érico Veríssimo, e das obras "lacriminosas" de José Mauro de Vasconcelos ("Meu pé de Laranja-Lima", "Barro Blanco"), de muito sucesso junto ao grande público, tem se mantido o regionalismo de Mário Palmério, Bernardo Élis, Antônio Callado, Josué Montello e José Cândido de Carvalho. Entre os intimistas, destacam-se Osman Lins, Autran Dourado e Lygia Fagundes Telles,

Na prosa, as duas décadas citadas assistiram à consagração das narrativas curtas (crônica e conto). O desenvolvimento da crônica está intimamente ligado ao espaço aberto a esse gênero na grande imprensa. Hoje, por exemplo, não há um grande jornal que não inclua em suas páginas crônicas de Rubem Braga, Fernando Sabino, Carlos Heitor Cony, Paulo Mendes Campos, Luís Fernando Veríssimo e Lourenço Diaféria, entre outros. Deve-se fazer uma menção especial a Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto), que, com suas bem humoradas e cortantes sátiras político-sociais, escritas na década de 60, tem servido de mestre a muitos cronistas.

O conto, por outro lado, analisado no conjunto das produções contemporâneas, situa-se em posição privilegiada tanto em qualidade quanto em quantidade. Entre os contistas mais significativos, destacam-se Dalton Trevisan, Moacyr Scliar, Samuel Rawet, Rubem Fonseca, Domingos Pellegrini Jr. e João Antônio.
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Parte 3 - Barroco = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-3-o-barroco.html
Parte 4 - Arcadismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-4-o.html
Parte 5 - Romantismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-5-o.html
Parte 6 - Realismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-6-realismo.html
Parte 7 - Naturalismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-7.html
Parte 8 – Paranasianismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-8-o.html
Parte 9 – Simbolismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/06/literatura-brasileira-parte-9-o.html
Parte 10 - Pré-Modernismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/07/literatura-brasileira-parte-10-pre.html
Parte 11 - Semana de Arte Moderna - http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/07/literatura-brasileira-parte-11-semana.html
Parte 12 - Modernismo - primeira fase = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/07/literatura-brasileira-parte-12.html
Parte 13 – Modernismo – segunda fase = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/07/literatura-brasileira-parte-13-o.html
Parte 14 – Pós-Modernismo = http://singrandohorizontes.blogspot.com/2010/07/literatura-brasileira-parte-14-pos.html
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Fonte:
http://www.vestibular1.com.br

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Heitor Stockler (Palmeira)


Minha Canção do Berço Natal

Palmeira, onde nascí
Pequena e linda entre os dois rios da minha infância,
Vê que, apesar de longa ausência e da distância,
Eu penso em ti!

Meu coração não erra
Quando, batendo aflito e de saudade cheio,
Evoca e chama a meninice, em doce enleio
E o amor da terra,

Esse rocio imenso
Que é um patrimônio a te envolver em mil venturas,
Porque te veio de uma fonte das mais puras,
Que era o bom senso

Conclamados, assim,
Jamais esqueço, num dia cinco de novembro
Cheguei à vida e vieram muitos, se me lembro,
Tal como vim.

Eram tantos e tantos,
Trazendo ideais bem como os meus, todos felizes,
Pisando flores ou curando cicatrizes.
Almas de santos.

Formosa companhia,
Uma brigada, uma legião de travessura,
Mas, só com ela, tão ardente e de alma pura,
Bem me sentia.

E anos e mais anos,
Naquele âmbito restrito da cidade,
Passava o tempo, sem pensar na mocidade,
Nos desenganos.

Era ditosa a vida...
Da Rua das Tropas a ao Cemitério,
Nenhum recanto, para mim, tinha mistério.
Fase querida!

Mas, sempre aventuroso,
Saía em busca de paisagem mais tranqüilas
Nos arredores, nos povoados e nas vilas
Ou mato umbroso.

Fiel aos caprichos meus,
Vezes a pé, ou a cavalo ou de carroça,
Eu palmilhava desde a Lapa a Ponta Grossa,
E São Mateus,

Na divisa legal,
No Tibagí, nos Papagaios, no Iguaçú,
Chapéu de palha, sapatão de couro cru
E o meu bornal.

Inquieto caminhante
Voltas eu dava ao município do meu berço,
Sempre ditoso, prazenteiro, guapo e terso
Mas, sem rompante.

Palmeira onde nascí,
Pequena e linda entre os dois rios da minha infância...
Vê que, apesar da longa ausência e da distância...
Eu te consagro, eu te venero, eu vivo em ti!.

HINO À PALMEIRA:
Letra de Heitor Stockler de França
Música de José Shön

- I -
Palmeira, revivamos teu passado
Tuas nobres e sublimes tradições
As Fases de tua vida e do teu Fado
Que Fulgem no esplendor dos teus Brasões
- II -
Façamos das tuas glórias claro espelho,
Rota em flor, no presente e no porvir,
Um Missal com exemplos do evangelho,
aos filhos desta terra sempre a unir
-III-
Lembremos tua feição de Lugarejo
Ansioso de ser Vila e ser Cidade,
Que assim vislumbrou Fortuito ensejo,
Fez-se um recanto de felicidade
-IV-
Chamemos à memória os Ancestrais,
Audazez bandeirantes da grandeza,
Que ao fundarem as Rondas e os Currais,
Geraram disciplina e a riqueza
-V-
És sempre Essa Palmeira acolhedora
Que aos filhos de outras Plagas propicia
Fartura, bem estar e promissora
Era de paz, de amor e de alegria
-VI-
Palmeira, altiva, Edênico rincão,
com boas auras tutelas nosso lar...
Por isso, te erigimos um altar
Florido em festa em nosso coração.
====================================

A Cidade de Palmeira

Palmeira é um município brasileiro do Estado do Paraná, próximo á cidade de Ponta Grossa famosa por ter sido berço da Colônia Cecília.

Em 1819, o vigário Antônio Duarte dos Passos recebeu por doação do Tenente Manoel José de Araújo um terreno para edificar uma igreja que seria a Matriz de uma nova freguesia dos Campos Gerais, em 7 de abril de 1819, considerada a data oficial da fundação de Palmeira. Porém, somente a 3 de julho de 1820 é que iniciou-se a construção da igreja. Em 8 de setembro é transferida oficialmente a freguesia de Tamanduá para Palmeira com o nome de Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Palmeira. As obras da Igreja Matriz são concluídas em 1837 quando é feita a sua inauguração. Em 15 de fevereiro de 1870 a freguesia é levada à condição de Vila de Nossa Senhora da Conceição da Palmeira. A partir da elevação de Palmeira à condição de Vila, adquiriu o direito de ter autoridades executivas e legislativas municipais. O primeiro presidente da Câmara de vereadores foi o Padre José Antônio Camargo e Araújo e o primeiro Prefeito foi o Capitão João Padilha de Oliveira.

A região já era povoada por ricos fazendeiros portugueses, antigos Bandeirantes Paulistas que se fixaram na região, caboclos e negros descendentes de escravos. A partir de 1878, por iniciativa dos governos provincial e imperial começam a se fixar na região outras colônias de imigrantes:

Russos Alemães: começaram a chegar em 1878 e formaram 7 núcleos ou colônias de povoação. Se dividiam em católicos e luteranos. Muitos abandonaram a atividade agrícola e passaram a se dedicar ao serviço de transporte de mercadorias com carroções. Outros passaram a trabalhar em obras públicas e outras ainda em atividades urbanas.

Poloneses: chegaram a partir de 1888. Agricultores por excelência, se espalharam pelo município formando várias colônias.

Italianos - Anarquistas: chegaram em 1890, motivados por Giovani Rossi para implantar a primeira Colônia Anarquista da América, mundialmente conhecida como "Colônia Cecília". A mesma acabou alguns anos depois por motivos internos e externos, os imigrantes italianos se transferiram para várias regiões do Brasil, contribuindo decisivamente para o surgimento do movimento sindical em nosso país. Ficam em Palmeira apenas três famílias.

Alemães Menonitas: chegam em 1951 e fundam a Colônia Witmarsum e a Cooperativa Mista Agropecuária Witmarsum Ltda. que é grande produtora de leite e seus derivados e de frango com a marca Cancela.

Russos Brancos: chegaram em 1958 e se fixaram na localidade de Santa Cruz, entre Ponta Grossa e Palmeira, dedicando-se a atividade agrícola.

Sírio-Libaneses, Palestinos, Egípcios e Japoneses: chegaram no início do século XX. Os Sírio Libaneses se dedicaram ao comércio e os Japoneses ao comércio e a agricultura.

Fontes:
Poesias de autores Palmeirenses do Instituto Histórico e Geográfico de Palmeira
http://www.radioipiranga.com.br/palmeira.html
http://pt.wikipedia.org/