sábado, 27 de novembro de 2010

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo IX: Emília na Casa do Verbo Ser

Emília teve uma grande idéia: visitar o Verbo Ser, que era o mais velho e graduado de todos os Verbos. Para isso imaginou um estratagema: apresentar-se no palácio em que ele vivia, na qualidade de repórter dum jornal imaginário. — O Grito do Pica-Pau Amarelo.

— Meu caro senhor — disse ela ao porteiro do palácio —, eu sou redatora do Grito do Pica-Pau Amarelo, o mais importante jornal do sítio de Dona Benta, e vim cá especialmente para obter uma entrevista do grande e ilustre Verbo Ser. Será possível?

O porteiro mostrou-se atrapalhado, porque era a primeira vez que aparecia por ali uma repórter daquela marca. A cidade da língua costumava ser visitada apenas por uns velhos carrancas, chamados filólogos, ou então por gramáticos e dicionaristas, gente que ganha a vida mexericando com as palavras, levantando o inventário delas, etc. Mas uma jornalista, e jornalista daquele tamanho, isso era novidade absoluta.

— Vou ver se ele recebe a senhorita — respondeu o guarda.

-— Pois vá, e interesse-se pelo meu caso, que não perderá o tempo — disse Emília. — Mando-lhe lá do sítio uns bolinhos de Tia Nastácia, que são excelentes.

O venerando Verbo Ser ouviu o guarda e estranhou o pedido de entrevista; mas como tivesse muito medo da imprensa, não pôde recusar-se a receber aquela repórter.

Emília foi levada à presença dele e entrou muito tesa, com um bloquinho de papel debaixo do braço e um lápis sem ponta atrás da orelha. O venerando ancião estava sentado num trono, tendo em redor de si os seus sessenta e oito filhos — ou Pessoas dos seus Modos e Tempos. Parecia um velho de mil anos, com aquela cabeleira branca de Papai Noel.

— Salve, Serência! — exclamou Emília, curvando-se diante dele, com os braços espichados, à moda do Oriente. — O que me traz à vossa augusta presença é o desejo de bem servir aos milhares de leitores do Grito do Pica-Pau Amarelo, o jornal de maior tiragem do sítio de Dona Benta. Os coitados estão ansiosos por conhecer as idéias de Vossa Serência sobre mil coisas.

— Suba, menina! — respondeu o Verbo Ser com voz trêmula.

Emília subiu os degraus do trono, abrindo caminho a cotoveladas por entre a soldadesca atônita, e foi postar-se bem defronte do venerável ancião.

— Fale, Serência, enquanto eu tomo notas — disse ela, e começou a fazer ponta no lápis com os dentes.

O Verbo Ser tossiu o pigarro dos séculos e começou:

— Eu sou o Verbo dos Verbos, porque sou o que faz tudo quanto existe ser. Se você existe, bonequinha, é por minha causa. Se eu não existisse, como poderia você existir ou ser?

— Está claro — disse Emília escrevendo uns garranchos. — Vá falando.

Ser tossiu outro pigarro e continuou:

— Muitos gramáticos me chamam VERBO SUBSTANTIVO, como quem diz que eu sou a substância de todos os demais Verbos. E isso é verdade. Sou a Substância! Sou o Pai dos Verbos! Sou o Pai de Tudo! Sou o Pai do Mundo! Como poderia o mundo existir, ou ser, se não fosse eu? Responda!

— Não tem resposta, Serência. É isso mesmo — disse Emília, escrevendo. — Os leitores do Grito vão ficar tontos com a minha reportagem. O diabo é este lápis sem ponta. Não haverá por aí algum canivete ou faca que não seja de mesa, Serência?

Não havia canivete, nem faca, nem nenhum instrumento cortante naquela cidade de palavras, de modo que Emília só podia contar com os seus dentes. Mas tanto roeu o lápis, sem conseguir boa ponta, que ele foi diminuindo, diminuindo, até virar um toquinho inútil. Acabou-se o lápis — e foi essa a verdadeira causa de o Grito do Pica-Pau Amarelo (jornal que aliás nunca existiu) não haver publicado a mais sensacional reportagem que ainda foi feita no mundo.

O Verbo Ser falou muita coisa de si, contando toda a sua vida desde o começo dos começos. Disse que já havia morado na cidade das palavras latinas, hoje morta.

— Naquele tempo eu me chamava Esse. Depois que a cidade latina começou a decair, mudei-me para as cidades novas que se foram formando por perto, e em cada uma assumi forma especial. Aqui nesta tomei esta forma que você está vendo e que se escreve apenas com três letras. Na cidade de Galópolis virei Ètre. Em Italópolis virei Essere. Em Castelópolis sou como aqui mesmo.

— Então foi em Roma que Vossa Serência nasceu?

— Não, menina. Sou muito mais velho que Roma. Antes de mudar-me para lá eu já existia na cidade das palavras sânscritas; e antes de ir para a cidade das palavras sânscritas, eu já vinha não sei de onde. Perdi a memória do lugar e do tempo em que nasci, embora esteja convencido de que nasci junto com o mundo.

— Pois olhe — disse Emília —, está bem rijinho para a idade. . . Dona Benta, com sessenta e oito anos apenas, não chega aos pés de Vossa Serência.

— Nós, palavras, vivemos muito mais do que as criaturas humanas.

— Mas também morrem — observou Emília, apontando para o cemitério que se avistava através da janela.

— Sim. Morrem certas palavras que não são de boa raça. Um Verbo como eu não morre nunca. Muda de aspecto apenas, e emigra duma cidade para outra. Eu nunca hei de morrer.

— Assim seja, Serência! — disse Emília. — Porque se Vossa Serência cai na asneira de morrer, como iremos nós nos arranjar lá tiú mundo? Ninguém mais poderá ser coisa nenhuma. . .

Pela janela aberta via-se um trecho de rua, onde o Visconde estava a passear de braço dado a uma palavra esquisita.

— Quem é aquele figurão? — perguntou Ser, franzindo os sobrolhos.

— Pois é o nosso grande Visconde de Sabugosa, um verdadeiro sábio da Grécia. Gosta muito de Arcaísmos e outras velharias. Juro que a palavra que está com ele é coroca.

— Não é, não. Já foi coroca; hoje está remoçada. Aquela palavra é a tal Paredro, que em Roma conheci sob a forma latina Paredrus. Emigrou para cá comigo, mais ninguém quis saber dela. Os homens não a chamavam nunca para coisa alguma, e por fim a coitada teve de desocupar o beco e ir viver no bairro dos Arcaísmos. Pois sabe o que aconteceu? Um belo dia um deputado brasileiro, que era o grande romancista Coelho Neto, teve a idéia de requisitá-la para a meter num discurso. Já lhe mandamos a palavra requisitada, ainda cheia de pó e teias de aranha como se achava. Paredro entrou no discurso do deputado, fez sucesso e voltou rejuvenescida. Desde então passou a receber freqüentes chamados e acabou vindo morar de novo aqui no centro, em companhia das palavras vivas. Casos como esse, porém, são raríssimos. Em geral, quando uma palavra morre, morre duma vez.

A conversa de Emília com o Verbo Ser durou bastante tempo. Um velho velhíssimo como aquele tem muito que contar. Por fim acabaram amigos, e Emília pediu-lhe que a acompanhasse numa visitinha aos Advérbios, espécie de palavras que ela ainda não conhecia.

— Pois não. Com muito prazer — disse o venerável velho, e tomando-lhe a mãozinha saiu com ela do palácio.
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Continua ... Capítulo X: A Tribo dos Advérbios
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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por http://groups.google.com/group/digitalsource

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Marita França (Roseira Branca...!)


Roseira Branca, Roseira Branca,
Tão antiga no jardim
Do meu solar.

Quando olho para você,
Entrelaçada
No gradil de ferro do terraço,
Cheia de cachos de rosas,
Ponho-me a sonhar...

Há meio século quase,
As mãos santas e puras
Do vovô João Taborda
E de vovó Cota,
Com carinho e amor,
Plantaram a Roseira Branca –
Espuma do Mar...
A rosa remédio,
Para curar, enfeitar
E dar alegria ao seu lar.

Passou-se o tempo e mais tempo...
Você ali está.
Conte-me o que viu e ouviu,
Na poética mansão
De meus avós,
Roseira Branca – Espuma do Mar!

Fale-me baixinho...
Lembra das serenatas,
Nas lindas noites de luar?
Das canções maravilhosas,
Dos cantores, dos violinos,
Violões e bandolins?...

Peço-lhe: Não enfraqueça,
Roseira Branca.
Você tem tanto para contar
E muito, ainda, para dar.
Roseira Branca, Roseira Branca
Venha comigo sonhar!...

Fonte:
Colaboração de Carlos Leite Ribeiro

Silviah Carvalho (Adeus!)


Agora que a noite já se foi e o dia certamente não chegará
Depois de haver depositado tanto sacrificio no altar da liberdade
vejo que, o amor só descansa morto, vivo é um 'ser" em conflito
venho me despedir de tudo isso aqui, entregar meu espírito

Aurora, amiga que, precede o sol, não permita que eu o veja
a luz traz a tona aquilo que divide meu querer, deixa-me aqui
que, o vento espalhe meu sentimento. E minhas lágrimas
sejam misturadas ao orvalho e assim aniquile este sofrimento

Cada ramo molhado que tocar seus pés lembrara-se de mim
verás eles molhados de minhas lágrimas, enquanto prostrada
lutava e, dava minha vida por ti, não tenho braços que
me acolham ao pé desta montanha, ficarei aqui...

Até que seja dissipada esta luz que insiste em me manter viva
chamando-me de volta, dizendo que vale a pena sair do esconderijo
que este vento leve esta ilusão e, me ofereça um eterno abrigo

Minha voz calou-se, sou uma ave caída num canto qualquer
venho hoje, outra vez, absorver nestes últimos instantes
o cheiro do vento... Perdi a motivação e agora a fé

Não pergunte por mim, não me procures, deixe-me seguir,
Não sei para onde vou, não tenho você, nada mais importa
Quando leres saiba, esta é da sua despedida a minha resposta
Adeus!

Fonte:
http://umcoracaoqueama.blogspot.com/

Carolina Ramos (O Tombo)



Se melancia tivesse pernas, certamente seriam as de João Sereno – curtas, gordinhas, atarrancadas – um parênteses, aberto na esquerda e fechado na direita. Pernas bastante fortes para sustentar um corpo rotundo.

Quando apontava na esquina, todo o mundo sabia: – Lá bem João Sereno. Inconfundível!

E o dia em que João Sereno caiu, foi memorável! Um tombinho à-toa como outro qualquer. Desses de cair e levantar num segundo. Mas, não foi isso o que aconteceu. A queda de João Sereno foi algo de sensacional, para não ser esquecido por ninguém, que viu ou ouviu contar!

Naquela tarde histórica, vinha ele da fábrica. Passo lento, cansado, pura imagem da exaustão.

Desde que apontara no alto da rua, cumprimentava, um a um, os amigos da vizinhança com a cordialidade costumeira e o sorriso que, mesmo debaixo de chuva, prenunciava sol.

João Sereno não esperava pela escorregadela. E quem a espera? Não fosse assim, os tombos, as topadas, as imprecações e os dedões esfolados deixariam de existir.

Aquela casca de manga, esquecida traiçoeiramente no meio da calçada, foi o bastante para que a melancia humana voasse, pernas acima da cabeça, estatelando-se, em seguida, espetacularmente no solo. Tudo terminaria nessa desastrosa aterrisagem, se o declive acentuado, não desse continuidade à tragédia. A própria rotundidade do acidentado favoreceu-a. João Sereno rolou, como rolaria a melancia, que largada ao topo da ladeira! Por mais que as pernas curtas e os braços mais curtos ainda, tentassem simular tentáculos para agarrar-se a alguma coisa, só conseguiram impulsionar, com maior ímpeto, o bólido humano. Mais abaixo, foi chocar-se contra a lata de lixo reciclável, à espera da coleta, e que rolou com ele, a esparramar, na trajetória, tudo o quanto engolira.

João Sereno deixou, temporariamente, de ser sereno. Sacudindo as roupas e compondo a dignidade, não pode deixar de considerar, maldita, a casca da manga e a não menos abominável displicência do dono dela. Mestres no ensino de vôo e no resguardo dos segredos para uma boa aterrisagem.

Ganhou algumas escoriações inevitáveis. Não graves. E ganhou, também, nova alcunha.

Os velhos amigos continuaram a chamá-lo, com simpatia, de João Sereno. Os mais novos, maliciosos e irreverentes, não deixaram por menos: – mal vislumbrada, ao longe, a figura redonda, já risos abafados e cochichos maldosos, alertavam:

– Sai da frente… lá vem o João Boliche!

Pilhéria ou precaução? – A questão é que o caminho ficava, num instante, completamente livre!.

Fonte:
RAMOS, Carolina. Interlúdio: contos. São Paulo: Editor: Cláudio de Cápua. Abril/93.

Cidade da Lapa será a Capital Brasileira da Cultura 2011


O anuncio oficial da escolha da Lapa como Capital Brasileira da Cultura 2011 foi feito na manhã de 20 de novembro pelo Bureau Internacional de Capitais Culturais em Barcelona (Espanha) e pela ONG CBC – Capital Brasileira da Cultura (http://www.capitalbrasileiradacultura.org/), entidade responsável pela promoção e gestão deste título aqui no Brasil.

O Bureau Internacional de Capitais Culturais (http://www.ibocc.org/) é um organismo internacional com sede em Barcelona (Espanha) que criou e mantêm os projetos da Capital Brasileira da Cultura, da Capital Americana da Cultura, da Capital da Cultura Catalã, da Capital da Cultura Espanhola e da US Capital of Culture nos Estados Unidos, além de apoiar e incentivar projetos semelhantes em outras partes do globo.

Aqui no Brasil a gestão desta certificação é mantida e supervisionada pela CBC – Capital Brasileira da Cultura, entidade sediada em São Paulo, contando com o apoio dos Ministérios da Cultura e do Turismo e com a participação e parceria de varias entidades.

Com a escolha da Lapa no Paraná está será a sexta cidade brasileira a conquistar o posto de Capital Brasileira da Cultura, título que já foi concedido em 2006 para a cidade de Olinda (PE), em 2007 para São João Del Rey (MG), em 2008 para Caxias do Sul (RS), em 2009 para São Luis (MA) e que tem Ribeirão Preto no interior de São Paulo como atual detentora do diploma de Capital Brasileira da Cultura de 2010.

A solenidade oficial de diplomação da Lapa deverá ocorrer no início do próximo ano em data ainda a ser definida, quando representantes do município receberão das mãos de representantes da atual Capital, a cidade de Ribeirão Preto, a outorga oficial.

A escolha da cidade da Lapa se deu em reconhecimento ao seu rico patrimônio histórico e cultural, um dos mais importantes e conservados da região sul do Brasil.

Com aproximadamente 42 mil habitantes e situada a 62 km de Curitiba, a cidade possui em seu Centro Histórico 235 edifícios tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), onde se destacam o conjunto arquitetônico da antiga Rua do Cotovelo, o Theatro São João, um dos mais antigos do Brasil, o Museu de Armas, a Casa Lacerda, a Casa Vermelha e o Museu Histórico, entre outros pontos de atração e interesse. Além do teatro e de um conjunto de Museus, a Lapa possui também um Cinema sendo uma das poucas cidades do interior a ter este tipo de equipamento cultural, mantendo uma vocação para o setor audiovisual, pois regularmente muitos filmes e produções de época são rodadas e encenadas na cidade Lapa, que é o cenário perfeito para estas reconstituições históricas.

Por isso, eventos como o Festival de Cinema, que reúne milhares de pessoas nas ruas da cidade em exibições feitas ao ar livre e gratuitamente para toda a população, também contribuiram para que a Lapa conquistasse este merecido título.

No patrimônio cultural imaterial destacam-se as Congadas, a Noite Lapeana e as diversas festas religiosas e populares, além da gastronomia influenciada pelo movimento tropeirista e a famosa receita da farofa de frango.

Por ocasião da comemoração do centenário da proclamação da República em 1989, a cidade da Lapa já recebeu o título de “Capital Cívica do Brasil” em razão de ter sido cenário de importante episódio histórico durante a Revolução Federalista, em 1894.

Uma legião de 639 homens formada por forças regulares e de patriotas lapeanos, chefiada pelo Coronel Antônio Ernesto Gomes Carneiro, enfrentou bravamente e caiu diante das forças revolucionárias riograndenses formadas por cerca de 3.000 combatentes e comandadas por Gumercindo Saraiva, no famoso episódio conhecido como “Cerco da Lapa”, que durou 26 dias. A resistência desta pequena cidade e de seus heróis proporcionou ao governo de Floriano Peixoto, o tempo suficiente para reagrupar as forças necessárias para deter o exército federalista, mantendo assim a república no Brasil num momento crucial e decisivo para determinar os rumos da história.

Após a definição da cidade como futura Capital Brasileira da Cultura um comitê gestor já começa a ser formado na cidade, com representantes do poder público local e membros da sociedade civil.

Este comitê deverá organizar as primeiras ações como a escolha de um símbolo oficial que será adotada pela cidade da Lapa durante o ano de 2011, bem como outras providencias que já começam a ser estudadas como a construção de um portal permanente ou de um marco que lembre a todos em 2011 e no futuro que a Lapa foi a Capital Brasileira da Cultura. O comitê deverá se reunir já nos próximos dias e deverá receber um caderno de encargos da CBC com as diretrizes e exigências para a certificação.

Até hoje mais de 40 cidades já concorreram ao título de Capital Brasileira da Cultura. Este é um momento impar para o município e que a escolha da Lapa é um reconhecimento da importância que a Lapa tem no cenário cultural.

Fontes:
ONG CBC
Secretária de Cultura e Turismo da Lapa

Cesar Cardoso (O Sol)


No quarto andar do Mercadão de Madureira tem um loja, uma portinha, que só vende peneiras. Uma vez por mês eu vou até lá ver as novidades. Às vezes passo a tarde inteira ouvindo as explicações do dono, o Elias. Ele mesmo fabrica - ou faz, diz ele que peneiras de verdade não são fabricadas, são feitas – todas as peneiras que vende. Aprendeu o ofício com seu pai, que aprendeu com seu avô, em Portugal. Ele me conta quais as melhores madeiras, como envergá-las, que lixa usar. E os vários arames, suas flexibilidades, qual o melhor para cada tipo de peneira.

Hoje mesmo estive lá e comprei uma peneira nova. Não estava à mostra na loja, já no final da tarde o Elias foi ao depósito e voltou com ela. É feita com galho de goiabeira, que é maleável e resistente como nenhuma outra madeira. E seu arame é de uma flexibilidade que nunca vi. Além disso, a trama parece um tricô. Foi cara, mas valeu a pena.

Em casa fui fazer as tarefas de todo dia, tomar banho, preparar meu jantar, mas sempre levando a peneira comigo. Agora, coloquei-a na mesinha de cabeceira e vim me deitar, mas não consigo pegar no sono, com a mesma frase me martelando a cabeça, o tempo todo:

Será que amanhã vai fazer sol?

Fontes:
http://www.o-bule.blogspot.com/
Imagem - Habeas Data

Efigênia Coutinho (Presságio)


Vou me despindo de corpo e alma
numa entrega plena, cheia...
sem sequer dar conta que
respirava, pois o corpo tomou
proporções transcendentais
duma natureza superior
indo ao mais alto do universo
e, deitou ao manto celeste, em
meio de estrelas e o garboso luar
num bailado cadenciado entre esferas
duma transcrição de tudo que existe
acima e abaixo dos meus olhos
o ar que respiro, me cinge,
abraça, me mantém entusiástica...

Acima, profecias, oráculos, respostas
e alimento para corpo e alma,
forças ocultas que regem o destino,
sem tino ou desatino, eu atino!...

Balneário Camboriú
Março 2009

Fontes:
A Poetisa
Imagem = Magia de Luz

Isaac Asimov (Os Bons Tempos de Outrora)



Sou muito dado ao otimismo com relação à ciência e tecnologia, e, nas minhas conferências, costumo pintar uma imagem rósea do futuro, contanto, naturalmente, que os novos conhecimentos sejam usados com sabedoria (o que, devo admitir, não tem sido a norma). Nem sempre a plateia concorda comigo. Lembro-me de uma sessão de perguntas e respostas em que um jovem se levantou e contestou minha afirmação de que a tecnologia havia melhorado a qualidade de vida humana.

- Você teria sido mais feliz na Grécia Antiga? - perguntei.

- Teria - afirmou o rapaz, com a segurança que só os jovens parecem ter.

- Como escravo? - perguntei.

O rapaz se sentou sem dizer mais nada.

O problema é que as pessoas recordam os “bons tempos de outrora” - uma expressão que me causa profundo desagrado - de forma extremamente parcial. Para muitos, a Grécia Antiga significa sentar-se na ágora e bater papo com Sócrates. Roma Antiga é freqüentar o Senado e discutir política com Cícero. Eles não se lembram de que nas duas civilizações apenas uma pequena elite aristocrática se dedicava a essas atividades e a imensa maioria da população era composta de trabalhadores braçais, camponeses e escravos. É muito bonito romancear a Idade Média e sonhar em ir para a guerra usando uma armadura reluzente, mas para cada “cavaleiro andante” havia noventa e nove servos e aldeões que eram tratados pior que animais. Fico irritado com os admiradores incondicionais da América rural do século dezenove, quando tudo o que se fazia, aparentemente, era ficar sentado no quintal bebericando sidra. Além disso nos períodos de recessão não havia nenhum senso de responsabilidade social para com os desempregados; e a total inexistência de remédios eficazes, incluindo os antibióticos, fazia com que a mortalidade infantil fosse elevadíssima e a expectativa de vida muito menor que hoje em dia. Também não me deixo impressionar pelos que olham para uma mansão construída em 1907 e exclamam, com um suspiro: “Puxa, não fazem mais casas assim! Veja quantos detalhes! Veja quanto capricho!”. Perco a paciência com as pessoas que estão sempre falando dos velhos tempos, quando os artesãos tinham orgulho de sua profissão e faziam de cada objeto uma obra de arte única, enquanto que hoje em dia máquinas sem alma produzem cópias e mais cópias de artigos baratos.

Vamos colocar as coisas na sua verdadeira perspectiva. Você sabe por que era possível construir lindas mansões em 1907? Porque a mão de obra era barata, de modo que você podia se dar ao luxo de contratar dezenas de empregados para construir a mansão e dezenas de criados para mantê-la funcionando. E por que a mão de obra era barata? Porque a maioria das pessoas vivia em um estado permanente de fome e miséria. O fato de que alguns podiam ter mansões estava ligado de perto ao fato de que quase todos viviam em casebres. Da mesma forma, quando os artesãos produziam laboriosamente obras de arte, essas obras eram em número muito reduzido e constituíam o privilégio de uma reduzida casta de patrícios (ou nobres, ou banqueiros); o povo tinha que se virar mesmo era com casas de pau a pique. Se as mansões são raras hoje em dia porque a população em geral vive muito melhor, fico satisfeito com isso. Se os objetos utilitários são menos artísticos para que mais pessoas possam desfrutá-los, acho que a mudança foi para melhor. Isso me torna aquele personagem terrível, um “liberal” que se preocupa com o bem estar dos pobres, e não com os yuppies? Acho que sim, mas há mais. Meu ponto de vista também é bastante prático e egoísta.

Minha primeira mulher uma vez se queixou de que não conseguia encontrar alguém para ir à nossa casa uma vez por semana para fazer alguns serviços domésticos. Ela disse:

- Gostaria de ter vivido há um século, quando era fácil arranjar criados.

- Pois eu, não - repliquei - Porque nós seríamos os criados.

Acontece que não descendo de uma longa linhagem de aristocratas, de modo que certamente não seria um dos poucos privilegiados destinados a gozar das boas coisas da vida. O mesmo é verdade para a maioria dos que recordam com saudade os “bons tempos” de outrora, mas tenho consciência disso, e eles, aparentemente, não.

Fonte:
Isaac Asimov Magazine. Numero 1. Rio de Janeiro: Record, 1990.

Arlene Lima (Gosto de você)



Gosto de você que tem a cabeça no lugar, muito conteúdo interno, idealismo e os dois pés no chão da realidade. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais que inteligência, precisamos de afeição e doçura.

Gosto de você que ri, chora, se emociona com pequenas coisas, com um carinho, um abraço, um afago. Sem essas virtudes, a vida é de violência e tudo estará perdido.

Gosto de você que ama e curte saudades, gosta de amigos, cultiva flores, admira as paisagens e escuta. Que assume a individualidade, não reprimindo seus talentos.

Gosto de você que tem tempo para fazer atos de bondade, semear perdão, repartir ternura, compartilhar convivência, brincar, cantar, e nem pára para pensar que idade tem.

Gosto de você que faz as coisas de que gosta, mas sem fugir dos compromissos difíceis e inadiáveis, por mais desgastantes que sejam. Pode ouvir o seu coração e viver apaixonadamente. Com paciência e trabalho consegue realizar as mudanças necessárias na sua vida e no mundo à sua volta.

Gosto de você que colhe, orienta, aconselha, busca a verdade e sempre quer aprender, mesmo que seja de uma criança, de um pobre, de um analfabeto, sem deixar que o medo de perder paralise os seus planos. Sempre com ação avança em seus ideais, pois é você que decide o tipo de vida que quer levar. E caminha firme, com marchas e contramarchas, avanços e retrocessos, para um futuro promissor, melhorando a si próprio e, por consequência, melhorando tudo que está à sua volta.

Gosto de você que vai passear para esquecer as mágoas, ficando feliz porque ainda está vivo, ainda sabe sorrir, levantando a cabeça e prestando atenção nos pássaros que voam no céu, nos mostrando o amor de Deus.

Gosto de você que torna essa vida livre e bela, numa aventura maravilhosa, lutando para assegurar o futuro da mocidade e a segurança da velhice. Lutando para dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência.

Gosto de você que não se importa de fazer coisas maiores e sim melhores. Que não gasta mais do que tem, comprando muito e desfrutando pouco. Que ri mais do que irrita. Que acha mais tempo para ler um livro, orar, ao invés de ficar na frente da TV. Que conquista mais espaço interior do que exterior. Que tem mais avanços em qualidade do que em quantidade. Que em nossa época dos descartáveis mantém sua moralidade inabalável.

Gosto de você que mais ama do que é amado, que serve mais do que é servido, que toma iniciativas ao invés de achar culpados, que distribui mesmo sem ter dinheiro aos montes e que sabe dizer a todos o "EU TE AMO".

Gosto de você que nasceu entres as estrelas e as flores, marcado para a Amor e a Beleza. E se há na nossa vida algumas dores, há também a certeza - para quem sabe olhar, para quem sabe amar - de que serão mais numerosas as estrelas e as rosas.

Gosto de você

Fontes:
A Autora
Imagem = Rainwords

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.51)


Trova do Dia

Deus é Pai e Onipresente
enlaça os filhos na terra,
unindo a força da mente;
sem devaneios da guerra.
JOSIAS ALCÂNTARA/PR

Trova Potiguar

Divagando, sem guarida...
Sem destino, seminua...
A menina desvalida
vende o seu corpo na rua.
DJALMA MOTA/RN

Uma Trova Premiada

1999 > Pouso Alegre/MG
Tema > LUAR > 5º Lugar.

Nosso amor tem tal magia
que mesmo em noite sem lua,
o luar, por cortesia,
brilha só na nossa rua.
ALMERINDA LIPORAGE/RJ

Uma Poesia livre

– Manoel Rodrigues de Lima/SP –
DESEJO.

Queria muito,
saber tudo sobre as flores.
Saber
sentir seu perfume.
Saber
ver suas cores.
Assim,
saberia qual lhe ofertar.

Uma Trova de Ademar

Comprei um par de “Sapato”
por quatrocentos mil réis,
confesso que achei barato
mesmo eu só tendo um dos pés!
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

Fiz na vida o meu escudo
desta verdade sagrada:
- o nada com Deus é tudo,
e tudo sem Deus é nada.
BELMIRO BRAGA/MG

Estrofe do Dia

Vendi doistões de aguardente,
gás, arroz e mariola,
fumo, sabão, sal e sola,
pensando um dia ser gente;
de seguro fui agente,
vendi terra e avenida,
remédio e vaca parida,
tive sucesso e reverso;
se algum dia vender verso
já fiz tudo nessa vida.
MAJÓ/RN

Soneto do Dia

– Antonio Manoel A. Sardenberg/RJ
SOL POENTE.

Quando contemplo ao longe o sol poente
atrás do monte lá no infinito
sonho acordado o sonho mais bonito,
e tenho a fé de um homem forte e crente.

A luz suave, quase se apagando,
acende em mim um fogo tão ardente,
e ao pensar eu fico imaginando
o amor se pondo assim tão de repente.

O tempo passa e vem a madrugada
como um açoite castigando a gente
na aurora fria, escura e tão calada!

Oh... breve tempo tenha dó de mim
por que flagela um coração carente,
me machucando tanto, tanto, assim!

Fonte:
Ademar Macedo

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo VIII: No acampamento dos Verbos

— Agora iremos visitar o Campo de Marte onde vivem acampados os VERBOS, uma espécie muito curiosa de palavras. Depois dos Substantivos são os Verbos as palavras mais importantes da língua. Só com um Nome e um Verbo já podem os homens exprimir uma idéia. Eles formam a classe militar da cidade.

— Mas que é um Verbo, afinal de contas? — perguntou Pedrinho.

— Verbo é uma palavra que muda muito de forma e serve para indicar o que os Substantivos fazem. A maior parte dos Verbos assumem sessenta e oito formas diferentes.

— Nesse caso são os camaleões da língua — observou Emília. — Dona Benta diz que o camaleão está sempre mudando de cor. Sessenta e oito formas diferentes! Isso até chega a ser desaforo. Os Nomes e Adjetivos só mudam seis vezes — para fazer o Gênero, o Número e o Grau.

— Pois os senhores Verbos até cansam a gente de tanto mudar — disse o rinoceronte. — São palavras políticas, que se ajeitam a todas as situações da vida. Moram aqui em quatro grandes acampamentos, ou campos de CONJUGAÇÃO.

Os quatro acampamentos ocupavam todo o Campo de Marte. Cada um trazia letreiro na entrada. Emília leu o letreiro mais próximo — Acampamento dos Verbos da PRIMEIRA CONJUGAÇÃO. Em letras menores vinha um aviso: "Só é permitida a entrada aos Verbos de Infinito terminado em Ar".

— Que quer dizer Infinito? — indagou Narizinho.

— É uma das sessenta e oito formas diferentes dos Verbos, e a que dá nome a toda a tribo.

O acampamento imediato era o da SEGUNDA CONJUGAÇÃO, para os Verbos terminados em Er. O acampamento seguinte era o da TERCEIRA CONJUGAÇÃO, para os Verbos terminados em Ir. Os meninos viram um acampamento mais novo, anexo ao acampamento dos Verbos da Segunda Conjugação.

— Vamos começar nossa visita por aquele — disse Emília —, só porque ele é mais novinho e menor do que os outros.

Dirigiram-se todos para lá, mas o desapontamento foi grande. Encontraram apenas o Verbo Pôr e sua família.

— Ora essa — disse Emília. — Explique, Quindim, o que faz aí esse coruja? Por que não está no acampamento grande junto com os outros?

Quindim suspirou e começou:

— Antigamente Pôr pertencia à Segunda Conjugação e chamava-se Poer. Mas o tempo, que tanto estraga e muda os Verbos, como tudo mais, fez que apodrecesse e caísse o E de Poer. Ficou Pôr, como está hoje. Os gramáticos então criaram uma nova conjugação para ele e seus parentes Compor, Depor, Propor, Dispor, Antepor, Supor e outros. Depois outros gramáticos acharam que não estava bem criarem uma conjugação inteira para um Verbo só, e trouxeram o pobre Pôr e sua família para este anexo da Segunda Conjugação e lhe deram o nome de Verbo ANÔMALO, que quer dizer Verbo Anormal da Segunda Conjugação.

— Que complicação! Seria muito mais simples fabricarem um E novo de pau para substituir o que apodreceu — lembrou Emília.

— Parece simples mas não é. Os gramáticos mexem e remexem com as palavras da língua e estudam o comportamento delas, xingam-nas de nomes rebarbativos, mas não podem alterá-las. Quem altera as palavras, e as faz e desfaz, e esquece umas e inventa novas, é o dono da língua — o Povo. Os gramáticos, apesar de toda a sua importância, não passam dos "grilos" da língua.

— Nesse caso — insistiu Emília —, em vez de xingá-lo de Anômalo, podiam ter posto um letreirinho no pescoço do Verbo: "Ele é Poer; se está Pôr é porque o E apodreceu e caiu". Mas vamos sair do anexo e ver o acampamento da Segunda Conjugação.

Lá estava coalhado de Verbos, a ponto dos meninos nem poderem andar. O momento era bom. O batalhão do Verbo Ter, que é dos mais importantes, ia desfilar. Uma cometa soou e o desfile teve começo.

Esse batalhão compunha-se de sessenta e oito praças, ou PESSOAS, distribuídas em companhias, ou MODOS, e em pelotões, ou TEMPOS. Abria a marcha o MODO INDICATIVO, com trinta e seis soldados repartidos em seis Tempos. Na frente de todos vinha o TEMPO PRESENTE, composto de seis soldadinhos, cada qual com um Pronome no bolso. Os Verbos não sabem andar sós; vivem ligados a alguém ou alguma coisa, que é o SUJEITO; e quando o Sujeito não está presente, botam em lugar dele um Pronome.

Os nomes dos seis soldadinhos do Tempo Presente eram Tenho, Tens, Tem, Temos, Tendes e Têm, e os Pronomes que traziam no bolso eram Eu, Tu, Ele, Nós, Vós e Eles. Seis soldadinhos vivos e enérgicos, que marchavam muito seguros de si.

— Bravos! — gritou Emília. — Pelo jeito de marchar a gente vê que eles têm mesmo. . .

Em seguida veio o Segundo Tempo, cujo nome era PRETÉRITO IMPERFEITO; tinha igual número de soldadinhos, ou Pessoas, embora menos jovens e com caras menos vivas.

Chamavam-se Tinha, Tinhas, Tinha, Tínhamos, Tinheis e Tinham.

— Esses não têm: tinham!. . . — observou Pedrinho. — Por isso estão meio jururus.

Depois veio o Terceiro Tempo, chamado PRETÉRITO PERFEITO, composto igualmente de seis soldados de olhos no fundo, amarelos, magros, com expressão de medo na cara. Eram eles Tive, Tiveste, Teve, Tivemos, Tivestes e Tiveram.

— Estou vendo! — comentou Emília. — Tiveram, já não têm mais nada, os bobos. Bem feito! Quem manda. . .

— Quem manda o quê, Emília? — indagou Narizinho.

— Quem manda perderem o que tinham? Agora agüentem.

Depois desfilou o Quarto Tempo, chamado PRETÉRITO MAIS-QUE-PERFEITO. Eram também seis soldados — Tivera, Tiver as, Tivera, Tivéramos, Tiver eis e Tiveram.

Depois passou o Quinto Tempo, chamado FUTURO DO PRESENTE, e foram recebidos com palmas por serem soldadinhos dos mais alegres e esperançosos — Terei, Terás, Terá, Teremos, Ter eis, Terão.

— Estes são espertos — disse Pedrinho. — Sabem contentar a todo mundo. Viva o Futuro!. . .

Estava terminado o desfile do Modo Indicativo, que exprime o que é, ou a realidade do momento.

Houve um pequeno descanso antes de começar o desfile do MODO IMPERATIVO, que era orgulhosíssimo. Compunha-se apenas de cinco soldados carrancudos, com ar mais autoritário que o do próprio Napoleão. Eram eles o Tem, Tenha, Tenhamos, Tende, Tenham.

— Só fazem isso — explicou Quindim. — Mandam que o pessoal tenha.

— Tenha que coisa? — indagou Emília.

— Tudo quanto há. Quando o Imperativo diz para você, com voz de ditador: Tenha juízo, Emília!, ele não está pedindo nada — está mandando como quem pode, ouviu?

— Fedorento!... — exclamou a boneca com um muxoxo de pouco-caso.

Depois desfilou o MODO SUBJUNTIVO, com três Tempos, de seis Pessoas cada um. O Primeiro Tempo, de nome PRESENTE, trazia os soldados Tenha, Tenhas, Tenha, Tenhamos, Tenhais e Tenham.

Em seguida desfilou o Segundo Tempo, de nome PRETÉRITO IMPERFEITO, com os seus seis soldados — Tivesse, Tivesse s, Tivesse, Tivéssemos, Tivésseis e Tivessem. E por fim desfilou o Terceiro Tempo, o FUTURO, com os seus seis soldados — Tiver, Tiveres, Tiver, Tivermos, Tiverdes e Tiverem. E pronto! Acabou-se o Modo Subjuntivo, que é o Modo que indica alguma coisa possível.

— Qual o que vem agora? — perguntou o menino.

— Vai desfilar agora o MODO INFINITIVO — respondeu Quindim. — Esse Modo só tem dois Tempos — o PRESENTE IMPESSOAL, com um soldado único — Ter; e o PRESENTE PESSOAL, com seis soldados — Ter,

Teres, Ter, Termos, Terdes e Terem.

— Hum!... — exclamou Emília quando viu passar, muito teso e cheio de si, o soldadinho Ter, do Presente Impessoal. — Este é o tal Infinito, pai de todos e o que dá nome ao Verbo. Um verdadeiro general. Merece parabéns pela disciplina da sua tropa.

Fechava a marcha do Modo Infinito o GERÚNDIO, composto do soldado Tendo, seguido logo depois do PARTICÍPIO, composto também dum só soldado, um veterano muito velho, com o peito cheio de medalhas — Tido.

— Parece o Garibaldi — asneirou a boneca. — Escangalhado, mas glorioso.

Estava finda a revista do Verbo Ter. O rinoceronte perguntou aos meninos se queriam assistir a outras.

— Não — respondeu Narizinho. — Quem vê um Verbo, vê todos. Só quero saber que história é essa de Verbos REGULARES e IRREGULARES. Estou notando ali uma cerca que separa uns de outros.

— Verbos Regulares são os bem-comportados — explicou Quindim —, os que seguem as regras muito direitinhos. Verbos Irregulares são os rebeldes, os que não se conformam com a disciplina. Este Senhor Ter, por exemplo, é Irregular, visto como não segue o PARADIGMA da Segunda Conjugação.

— Que Paradigma é esse agora? — indagou Pedrinho.

— Cada Conjugação possui o seu Regulamento, ou Paradigma, a fim de que todos os Verbos Regulares formem as suas PESSOAS sempre do mesmo modo.

— Que Pessoas, Quindim?

— Os soldadinhos são as Pessoas dos Verbos, creio que já expliquei. Tenho, Tens, Tem, Temos, Tendes e Têm, por exemplo, são as seis Pessoas do Tempo Presente do Modo Indicativo.

— Com que então o tal Ter é irregular, hein? Não parecia.

— E além de Irregular é AUXILIAR. Os Verbos Ter, Ser, Estar e Haver são chamados Verbos Auxiliares porque além de fazerem o seu serviço ainda ajudam outros Verbos. Quando alguém diz: Tenho brincado muito, está botando o Verbo Ter como auxiliar do Verbo Brincar.

— E que outras qualidades do Verbo há?

— Muitas. Verbo é coisa que não acaba mais. Há Verbos DEFECTIVOS, uns coitados, com falta de Modos, Tempos ou Pessoas.

Há os Verbos PRONOMINAIS, que não sabem viver sem um Pronome Oblíquo adiante ou atrás, como Queixar-se. Sem esse Se, ou outro Pronome, ele não se arruma na vida.

Há os Verbos ATIVOS, que dizem o que o Sujeito faz; e há os Verbos PASSIVOS, que dizem o que fizeram para o Sujeito. A frase: Eu comi o doce está com um Verbo Ativo. A frase: O doce foi comido por mim está com um Verbo Passivo (Foi Comido).

Se formos falar tudo, tudo, a respeito de Verbos, ficaremos aqui o dia inteiro. Gentinha que muda de forma como eles fazem, dá pano para mangas! E são exigentíssimos. Uns não sabem viver sem um COMPLEMENTO adiante, e por isso se chamam Verbos TRANSITIVOS. Outros dispensam o Complemento, e por isso se chamam INTRANSITIVOS. Queimar, por exemplo, é Transitivo, porque exige Complemento. Se alguém diz: O fogo queimou, a frase fica incompleta; e quem ouve pergunta logo o que é que o fogo queimou. Essa coisa que o fogo queimou, seja mato, lenha ou carvão, constitui o Objeto Direto de Queimou.

— E os Intransitivos?

— Esses não pedem Complemento, como eu já disse. O Verbo Morrer, por exemplo, é Intransitivo. Quando a gente diz: O gato morreu, a frase está perfeita e ninguém pergunta mais nada. — Eu pergunto! — gritou Emília. — Pergunto de que morreu, e quem o matou e onde jogaram o cadáver.

Quindim coçou a cabeça.
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Continua ... Capítulo IX: Emília na casa do Verbo Ser
____________________________
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por http://groups.google.com/group/digitalsource

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

AVISO DE FÉRIAS


Prezados Internautas

Comunico que não haverão postagens contínuas do blog, em virtude de eu estar viajando por uma semana para São Paulo.

Retornarei no dia 25, quinta-feira da semana vindoura.

Conto com vossa compreensão.
José Feldman

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Torquato Neto (Poesias Escolhidas)


A RUA

toda rua tem seu curso
tem seu leito de água clara
por onde passa a memória
lembrando histórias de um tempo
que não acaba

de uma rua de uma rua
eu lembro agora
que o tempo ninguém mais
ninguém mais canta
muito embora de cirandas
(oi de cirandas)
e de meninos correndo
atrás de bandas

atrás de bandas que passavam
como o rio parnaíba
rio manso
passava no fim da rua
e molhava seu lajedos
onde a noite refletia
o brilho manso
o tempo claro da lua

ê são joão ê pacatuba
ê rua do barrocão
ê parnaíba passando
separando a minha rua
das outras, do maranhão

de longe pensando nela
meu coração de menino
bate forte como um sino
que anuncia procissão

ê minha rua meu povo
ê gente que mal nasceu
das dores que morreu cedo
luzia que se perdeu
macapreto zé velhinho
esse menino crescido
que tem o peito ferido
anda vivo, não morreu

ê pacatuba
meu tempo de brincar
já foi-se embora
ê parnaíba
passando pela rua
até agora
agora por aqui estou
com vontade
e eu vou volto pra matar
essa saudade

ê são joão ê pacatuba
ê rua do barrocão.

COGITO

eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível

eu sou eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos segredos dentes
nesta hora

eu sou como eu sou

presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim
eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranquilamente
todas as horas do fim..

LET'S PLAY THAT

quando eu nasci
um anjo louco muito louco
veio ler a minha mão
não era um anjo barroco
era um anjo muito louco, torto
com asas de avião
eis que esse anjo me disse
apertando a minha mão
com um sorriso entre dentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
vai bicho desafinar
o coro dos contentes
let´s play that

(musicada por Jards Macalé)

UM CIDADÃO COMUM

Sempre subindo a ladeira do nada,
Topar em pedras que nada revelam.
Levar às costas o fardo do ser
E ter certeza que não vai ser pago.

Sentir prazeres, dores, sentir medo,
Nada entender, querer saber tudo.
Cantar com voz bonita prá cachorro,
Não ver "PERIGO" e afundar no caos.

Fumar, beber, amar, dormir sem sono,
Observar as horas impiedosas
Que passam carregando um bom pedaço
da vida, sem dar satisfações.

Amar o amargo e sonhar com doçuras
Saber que retornar não é possível
Sentir que um dia vai sentir saudades
Da ladeira, do fardo, das pedradas.

Por fim, de um só salto,
Transpor de vez o paredão.

PANORAMA VISTO DA PONTE

Azulejos retorcidos pelo tempo
Fazem paisagem agora no abandono
A que eu mesmo releguei um mal distante.

Faz muito tempo e a paisagem é a mesma
Não muda nunca - sempre indiferente
A céus que rolem eu infernos que se ergam.

Alguns vitrais. E em cinerama elástico
O mesmo campo, o mesmo amontoado
Das lembranças que não querem virar cinzas.

Três lampiões. As côres verde e rosa
A brisa dos amores esquecidos
E a pantera, muito negra, das paixões.

Não passa um rio enlameado e doce
Nem relva fresca encobre a terra dura.
É só calor e ferro e fogo e brasa

Que insistem como cobras enroladas
Nos grossos troncos, medievais, das árvores.
Uma eterna camada de silêncio

E o sol cuspindo chumbo derretido.
O céu é azul - e como não seria?
mas tão distante, tão longínquo e azul...

BILHETINHO SEM MAIORES CONSEQUÊNCIAS

Uma retificação, meu bom Vinícius:
Você falou em "bares repletos de homens vazios"
e no entanto se esqueceu
de que há bares
lares
teatros, oficinas
aviões, chiqueiros
e sentinas,
cheinhos(ao contrário)
de homens cheios
Homens cheios.
(e você bem sabe)
entulhados da primeira à última geração
da imoralidade desta vida
das cotidianas encruzilhadas e decepções
da patente inconsequência disso tudo.
Você se esqueceu
Vinícius, meu bom,
dos bares que estão repletos de homens cheios
da maldade das coisas e dos fatos,
dos bares que estão cheios de homens cheios
da maldade insaciável
dos que fazem as coisas
e organizam os fatos
E você
que os conhece tão de perto
Vinícius "Felicidade" de Moraes
não tinha o direito de esquecer
essa parcela imensa de homens tristes,
condenados candidatos naturais
a títulos de tão alta racionalidade
a deboches de tão falsa humanidade.

Com uma admiração "deste tamanho".
-----

Fontes:
TORQUATO NETO. Os últimos dias de paupéria: do lado de dentro. Org. Ana Maria S. de Araújo Duarte e Waly Salomão. 2.ed. rev. e aum. São Paulo: M. Limonad, 1982
http://www.naoser.hpg.ig.com.br/torquato.htm
http://www.torquatoneto.com.br

Torquato Neto (1944 – 1972)



Torquato Pereira de Araújo Neto (Teresina PI, 1944 - Rio de Janeiro RJ, 1972). Cursou Jornalismo no Rio de Janeiro, por volta de 1966, mas não chegou a concluir a faculdade.

Nos anos seguintes compôs letras musicadas por Gilberto Gil ("Geléia Geral", "Louvação"), Caetano Veloso ("Deus Vos Salve a Casa Santa", "Ai de Mim", "Copacabana", "Mamãe, Coragem") e Edu Lobo ("Lua Nova", "Pra Dizer Adeus").

Entre 1970 e 1972 atuou nos filmes Nosferatu no Brasil e A Múmia Volta a Atacar, de Ivan Cardoso, e Helô e Dirce, de Luiz Otávio Pimentel. No período também criou e redigiu a coluna Geléia Geral no jornal carioca Última Hora.

Em 1973 ocorreu a publicação póstuma de seu livro de poesia Os Últimos Dias de Paupéria, organizado por Ana Maria S. de Coraújo Duarte e Waly Salomão.

Três anos depois, foram incluídos alguns de seus poemas na antologia 26 Poetas Hoje, organizada por Heloísa Buarque de Hollanda em 1976.

Em 1997 foram publicados quatro de seus poemas na antologia bilíngüe Nothing the Sun Could Not Explain, organizada por Michael Palmer, Régis Bonvicino e Nelson Ascher.

Torquato Neto foi um dos compositores mais inovadores da canção popular dos anos de 1970.

Fonte:
http://www.torquatoneto.com.br/

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.50)


Trova do Dia

Belo mar que amamos tanto,
com rendas brancas vestido.
Brindamos o teu encanto,
maravilhoso, incontido!
ARLENE LIMA/PR

Trova Potiguar

Na montanha a fala boa;
sermão com tanta verdade,
que até hoje ainda ecoa,
no ouvido da humanidade.
LUIZ DUTRA BORGES/RN

Uma Trova Premiada

2009 > Cantagalo/RJ
Tema > EUCLIDES DA CUNHA > 13º Lugar.

Prosando, Euclides da Cunha,
em "Os Sertões", pinta o porte
do sertanejo... que alcunha:
"é, antes de tudo um forte".
MARIA DA CONCEIÇÃO FAGUNDES/PR

Uma Poesia livre

– Shannya Lacerda/RN –
MARVADA

Leve daqui meus males;
a verdura de meus sonhos
acabou em morte! Leve, leve
daqui tudo o que lembrar.
Fadigas, cheiros, sonhos, roupas,
músicas, paisagens, roupas,
cheiros, brigas, recordações...
enfim, leve tudo consigo.
Pois não conseguirei levar comigo
junto às flores de meu caixão.
Vá.
Vá logo,
ou vá-se daqui também comigo!
Leve as agonias, passamentos, roupas;
para onde vou?, não as preciso. Ou preciso?
Se precisar leve-me junto.
Leve junto às roupas que trago
condensadas na pele e as que já nem sinto.

Uma Trova de Ademar

Uma promessa de amor
pode até ser esquecida,
mas, se feita ao Criador,
terá sim, que ser cumprida!
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

A amizade verdadeira
é infinita como o espaço
mas se estreita e cabe, inteira,
nos limites de um abraço.
WALDIR NEVES/RJ

Estrofe do Dia

Você reza o Pai Nosso e não entende
que pediu a Jesus na oração,
que ele só lhe dê o seu perdão
se você perdoar a quem lhe ofende.
Mas agora que você compreende,
toda vez que estiver ajoelhado
pra rezar um Pai Nosso compassado,
você lembre durante a oração,
que é preciso que exista o seu perdão
para que você seja perdoado.
JOSÉ ACACI/RN

Soneto do Dia

– Florbela Espanca/Portugal–
EU

Eu sou a que no mundo anda perdida,
eu sou a que na vida não tem norte,
sou a irmã do sonho, e desta sorte
sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
e que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
alguém que veio ao mundo pra me ver,
e que nunca na vida me encontrou!

Fonte:
Ademar Macedo

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Trova 185 - Fernando Pessoa (Portugal)

Imagem criada por João Beja. Disponível em http://jobeja.blogspot.com

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.49)


Trova do Dia

Nos teus braços eu descanso...
Quanta emoção que despertas!
Nos teus olhos de remanso
enxergo um mundo de "ofertas"!
ESTER FIGUEIREDO/RJ

Trova Potiguar

O homem, em sua maldade,
polui a água e insiste
em dar à posteridade
uma herança amarga, triste.
HÉLIO PEDRO/RN

Uma Trova Premiada

2006 > Camboriú/SC
Tema > PESCADOR > Menção Honrosa

Com sua fé que engrandece,
num milagre, o pescador,
a Cristo, então, agradece,
os seus peixes, com amor!
GLEDIS TISSOT/SC

Uma Poesia livre

– Manoel Rodrigues de Lima/SP –
BRINCAR DE AMAR.

Lua tão linda.
Noite tão clara.
Céu de carneirinhos.
Casa à dentro,
Quarto e sala.
Gestos de carinhos.
Lençóis de cetim
Almofadas estampadas,
completam nosso ninho.
Solte seus cabelos.
Tire estes seus óculos
Beba uma taça de vinho.
Tome uma atitude
Tire a minha roupa
Bem devagarinho
E bem devagarinho,
Vamos brincar de amar,
assim como quem brinca
com uma pluma.

Uma Trova de Ademar

Ao seu terno coração
fiz um apelo doído.
Apelei, mas foi em vão...
Seu amor tinha morrido!
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

Depois que briga e me culpa,
se arrepende do que fez,
e, quando pede desculpa,
começa tudo outra vez ...
ELTON CARVALHO/RJ

Estrofe do Dia

Cada vez mais eu consigo,
separar trigo do joio...
Pra quem precisa de apoio,
meu coração é um abrigo.
Desconhecido ou amigo,
mas seja lá quem ele for
no seu momento de dor
eu ponho a disposição
meu sofrido coração
para os carentes de amor.
FRANCISCO MACEDO/RN

Soneto do Dia

– Amilton Maciel/SP –
AVE DE RAPINA.

Em casa, em meu quintal não tem viveiro,
Nem telas de cercar os animais,
Mas tem aves canoras que o ano inteiro
Vêem cantar e comer frutas demais...

Além dos passarinhos, tem carneiro
E cabritinhos lindos, sem iguais!
Todos passeiam soltos no terreiro,
Convivendo com pombos e pardais!

Assim, a minha casa é divertida,
Com netinhos brincando sem medida
E encantados com os tons do beija-flor!

Dentro de casa ainda tem um gato...
E um cachorro que corre atrás do pato,
Distraindo um decrépito “com dor”!

Fonte:
Ademar Macedo

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo VII: Artigos e Numerais

— E naquela casinha minúscula? — perguntou Emília. — Quem mora lá?

— Lá moram o A, o O, o Um, Uma, umas pulgas de palavrinhas, mas que apesar disso são utilíssimas. A gente não dá um passo sem usá-las. São os ARTIGOS.

— Para que servem?

— Para individualizar um Nome. Individualizar quer dizer marcar um entre muitos. Quando a gente diz: A menina do nariz arrebitado, aquele A do começo marca, ou individualiza, esta menina que está aqui, esta neta de Dona Benta — e não uma menina qualquer. Tudo já fica muito diferente se dissermos: Menina do narizinho arrebitado — sem o A, porque então já não estaremos marcando estazinha aqui. O Artigo Um também individualiza. Em Um Macaco, o Um individualiza, ou marca, um certo macaco entre toda a macacada.

— Mas Um Macaco não diz qual é o macaco. Um Macaco pode ser este ou aquele — objetou Emília.

— Por isso mesmo o O e o A recebem o nome de Artigos DEFINIDOS, e o casalzinho Um e Uma recebem o nome de Artigos INDEFINIDOS. O Artigo O é Definido porque marca com certeza; o Artigo Um é Indefinido porque marca sem certeza.

— A coisa é um tanto complicada; mas sem explicar eu entendo melhor do que explicado demais. Vamos adiante.

Os meninos viram um imenso galpão com a seguinte tabuleta: NUMERAIS.

— Aqui também moram números, Quindim? — perguntou o menino.

— Não — respondeu Quindim rindo —, mas os homens usam palavras para expressarem os números. Os Numerais são as palavras que exprimem números, ordem, múltiplos ou frações. Eles se dividem em: CARDINAIS, como em Um, Dois, Cento e Cinqüenta, Quatrocentos, Dois Mil e Duzentos, Milhão, etc; ORDINAIS, que exprimem ordem, como Primeiro, Segundo, Décimo, Centésimo, Milésimo, etc. Podem ser também MULTIPLICATIVOS, como Dobro, Duplo, Triplo, Óctuplo, etc. E, por fim, podem ser FRACIONÁRIOS, como Meio, Metade, Terço, Quarto, Nono, Décimo, Onze Avós, Vinte Avós, Quarenta Avós, Cinqüenta Avós. . .

— Chega, Quindim — berrou Emília —, já sabemos que os números são infinitos. Senão vamos ficar a vida toda aqui. . .
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Continua ... Capítulo VIII: No Acampamento dos Verbos

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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por http://groups.google.com/group/digitalsource

Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Projeto 4 em 1) numero 4


Antonio Manoel Abreu Sardenberg
São Fidélis "Cidade Poema"
MIRAGEM

Fiz da vida tábua rasa
E do raso meu perau,
Do carvão eu fiz a brasa
Do pau-a-pique fiz casa,
Mato a cobra, mostro o pau!

Do tronco fiz a canoa,
Da vara talhei o remo,
Do papel, pipa que voa
Tudo isso é coisa à - toa,
Do nada fiz o extremo!
Com a embira fecho o saco
Do milho faço fubá,
Acredito no meu taco,
Eu dou força para o fraco,
Torço pro forte apanhar.

Da quadra fiz poesia,
Canto a beleza da rosa,
Gosto de vê-la bem prosa
Nem que seja por um dia.

Adoro ver foguetório,
Banda, retreta, folia...
Para mim bom repertório
Tem que ter todo acessório:
Verso...rima...melodia!

Da fé eu fiz a esperança,
O desejo de viver...
Da saudade, a lembrança,
Dos meus tempos de criança
Que não me deixa crescer!

Do pensamento, desejo,
A volúpia de amar,
E depois, num só lampejo,
Fabriquei milhões de beijos
Todinhos para te dar!

Vanda Dias da Cruz
Rio de Janeiro
TEMPO PARA AMAR.

Estou ficando sem tempo para encontrar meu amor
Passam todas as estações e ele não quer chegar
Por que o tempo não para? Eu fico a me perguntar...
Para que eu possa ter tempo e continuar a buscar
Quando o dia amanhece meu primeiro pensamento
É pensar que o lindo dia vai fazer eu te encontrar
Anoitece... eu fico triste...
Olhando o céu estrelado volto a ter a ilusão
Que o tempo me dará tempo para que eu possa amar
Caminhando pela praia até o cansaço chegar
Sento na areia macia para um pouco repousar
Renovando minhas forças volto a ter esperança
Que o tempo vai deixar que o meu amor apareça
De onde eu menos esperar.
E assim vai passando o tempo...
O entardecer da vida chegando..
E como um milagre recebido tu entras em minha vida
No encontro de nosso olhar a busca não foi perdida.

Fernando Pessoa (1888 - 1935) Portugal
SÚBITA MÃO DE UM FANTASMA OCULTO

Súbita mão de algum fantasma oculto
Entre as dobras da noite e do meu sono
Sacode-me e eu acordo, e no abandono
Da noite não enxergo gesto ou vulto.

Mas um terror antigo, que insepulto
Trago no coração, como de um trono
Desce e se afirma meu senhor e dono
Sem ordem, sem meneio e sem insulto.

E eu sinto a minha vida de repente
Presa por uma corda de Inconsciente
A qualquer mão nocturna que me guia.

Sinto que sou ninguém salvo uma sombra
De um vulto que não vejo e que me assombra,
E em nada existo como a treva fria.

Antônio Correia de Oliveira
TROVA

Sino, coração da aldeia;
coração, sino da gente:
um a sentir, quando bate;
outra a bater, quando sente!

Fonte:
A. M. A. Sardenberg

domingo, 14 de novembro de 2010

Nogueira Tapety (Cristais Poéticos)



SENHORA DA BONDADE

Não te quero por tua formosura
De rainha da graça entre as mulheres,
Quero-te porque és boa, porque és pura
E ainda mais porque sei que tu me queres.

A beleza exterior nem sempre dura.
E a d'alma, estejas tu onde estiveres,
Ungiras de meiguice e de doçura
Tudo em que a bênção deste olhar puseres.

Eu sou artista: encanta-me a beleza,
Em ti, porém, abstraio-a, inteiramente,
E penso amar-te assim com mais nobreza;

Pois, se te esqueço a forma e a mocidade,
É para amar em ti unicamente
A encarnação suprema da bondade.

HOLOCAUSTO

Eu devia prever que toda essa loucura
E esta dedicação com que te tenho amado,
Não podiam mover-ter a impassível ternura
Pois nunca existiu o bem com o bem recompensado.

Entretanto, bendigo a terrível tortura
E os suplícios cruciais por que tenho passado,
Pois sofrendo por ti, eu sinto que a amargura
Tem o doce sabor de um fruto sazonado.

Olha bem pra mim: vê que vinte e seis anos
Não podiam me ter por tal forma abatido
Nem roubar minha força e vigor espartanos,

Se estou precocemente exausto e envelhecido,
É do efeito fatal dos tristes desenganos
E do atroz desespero em que tenho vivido.

QUOS EGO

Nunca direi que te amo — esta expressão
É muito fraca para traduzir
Esse mundo infinito de afeição
Que de dentro do meu ser anda a florir ...

O que sinto é quase uma adoração,
Um desejo infinito de fundir
Nossos dois corações num coração
E as nossas almas numa só reunir;

É ânsia de ligar, de amalgamar
As nossas vidas que o destino afasta
E que o próprio destino há de juntar;

Uma afeição consciente e excepcional
Que é humana demais para ser casta
E demais pura para ser carnaval.

CANÇÃO DE OUTONO

Outono! Outono! ai! que tristeza
Erra pelo ar e em tudo atua
Amortalhando a Natureza
Em brumas claras como a lua.

Uma cortina branca e fria
Oculta o sol, vela o horizonte,
Despe os rosais a ventania
E a neve gela e embuça o monte.

Outono! outono! O vento Norte
Arranca as flores do arvoredo,
E a mata, triste como a morte,
Cai num silêncio que faz medo.

Ó vento mau que as incolores,
As mortas folhas carregais,
Levai também as minhas dores,
Que eu tenho já dores demais.

Já não se escuta a voz das aves
Nos pinhais todos descobertos,
Cujas sombrias e altas naves
Fazem lembrar templos desertos.

As velhas árvores despidas
São como espectros de gigantes,
Erguendo as mãos emagrecidas,
Num louco apelo aos céus distantes.

Árvores tristes desfolhadas,
De galhos hirtos, a tremer,
Lembrais mulheres desgrenhadas
Depois de noites de prazer.

Qual leão ferido e prisioneiro,
O velho mar furioso ruge,
E toda a noite, o dia inteiro
Troveja, estoura, estronda, estruge.

No mar eu vejo o grande apólogo
Do meu viver de torturado,
Quando ele fala o seu monólogo
De Hamlet estranho e revoltado.

E fico absorto a contemplar
A profundeza dessas águas,
Poucas demais para lavar
O turbilhão de minhas mágoas.

Nem uma flor brilha no campo
De onde emigrou toda a alegria,
E o céu profundo, azul e escampo
É como uma órbita vazia.

Ai! que tristeza e que saudade
Do lindo céu de minha terra
E da profusa claridade
Dos astros de ouro que ele encerra.

Outono! adoro-te a incerteza
Das cores dúbias a Rembrandt,
Envocadoras da tristeza
Que é minha musa e minha irmã.

MANHÃ DE INVERNO

Que esplêndida manhã tranqüilamente muda!
Rebrilha o ouro do sol no azul do céu turquesa,
E a grama a rebentar em pelúcia transmuda
O que há pouco no campo era rude aspereza...

Tudo o que é vegetal em verde se aveluda;
Há como um despertar por toda a Natureza
E a floresta no outono esfolhada, desnuda,
De repente retoma à perdida beleza.

Cada raio de sol, é um turbilhão de vida,
Ao contato do qual estremece a semente
Na umidade da gleba escura, adormecida...

Campânulas em flor abrem profusamente,
E a terra canta, assim, fecundada e florida,
Hinos de aroma à luz e à vida onipotente.

A TEIA DE PENÉLOPE

Penélope tecendo e destecendo a trama,
Num trabalho incessante, improfícuo e exaustivo
Simboliza este amor fatal que nos inflama
A cuja ação ela há de viver, como eu vivo.

Ao seu lado fui sempre inexprimido e esquivo,
Entretanto hoje, ausente, em mim tudo a reclama
E ela que me foi sempre um vulto fugitivo,
Há de a esta hora sentir que sua alma me chama.

Ah! capricho cruel, como dói teu efeito teu efeito
Que me isola inda mais na minha soledade
E um deserto sem fim vem semear no meu peito.

Agora, busco-a em vão na maior ansiedade;
Desgraçado que eu sou, pois nem sinto o direito
De invocá-la através desta amarga saudade.

VERÃO

O verão nesta terra é uma apoteose de ouro,
No ar, nos montes, no céu, na terra difundida,
Feericamente acesa, arde a essência de louro
Numa fulguração de flama enfurecida.

Do reino vegetal o pródigo tesouro,
Brilha febril ao sol, numa messe florida:
Heliantos e paus-d’arco, onde a abelha, o besouro
Se vão nutrir de luz em pólen convertida...

A cigarra sibila o seu chiar penetrante,
E ao longe ouve-se a voz da araponga vibrante
Que estridula e retine a estridente canção.

E seja de manhã, meio-dia ou de tarde,
O sol dominador a cuja ação tudo arde,
Ilumina, flameja: - é o senhor do verão.

TEUS OLHOS

Quanta cousa formosa arde em teus olhos claros,
Extravagantemente esquisitos e raros!

Gemas, topázios, luz, o fulvo dos desertos,
Campos longos, sem fim, de áureos trigais cobertos,
Heliantos de ouro ao sol da primavera abertos,
Paus-d’arco, recordando em seu louro que aberra
As matas do sertão feraz de minha terra,
O espírito da luz, a luz humanizada,
Mais brilhante e maior do que a própria alvorada
Que brilha, mais não vê, nem pode sentir nada!
Astros, planetas, sóis, estrelas nebulosas,
Vivas constelações fulgentes e formosas,
Em claras radiações, febris, transluminosas,
Vias-lácteas ideais, cobertas de ouro em pó,
Todo um céu para o qual sou astrônomo eu só,
E cujo original sistema planetário
Tem por centro este amor imenso, extraordinário
Que é toda a minha vida e há de ser meu calvário.
Ah! quanta cousa existe em teus olhos a arder!
Nem eu mesmo que as vejo, as posso descrever:
O outono na explosão das cores amarelas,
Essas tardes de outubro estranhamente belas,
Feitas para brilhar em geniais aquarelas.
A languidez da lua ungindo largos campos,
Onde arde zizagueando a luz dos pirilampos,
E há também o esplendor dessas manhãs de abril,
Em que a glória imortal do sol primaveril
Bóia como uma flor num grande mar de anil...
E brancuras ideais que a pena não descreve:
As reverberações fantásticas da neve,
A deslumbrante ação das auroras boreais,
E mares a ocultar sob as águas fatais
Um tesouro infinito em rubis e corais...
Ah! quanta cousa existe em teus olhos arder!
Nem eu mesmo que as vejo, as posso descrever...
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Fontes:
TAVARES, Zózimo. Sociedade dos Poetas Trágicos. Vida e obra de 10 poetas piauienses que morreram jovens. 2 ed. Teresina, PI: Gráfica do Povo, 2004.
– Fundação Nogueira Tapety

Nogueira Tapety (1890-1918)


O poeta Benedito Francisco Nogueira Tapety nasceu na fazenda Canela, em Oeiras, Piauí, no dia 30 de dezembro de 1890. Filho de Antônio Francisco Nogueira e Aurora Leite Nogueira.

Formou-se pela Faculdade de Direito do Recife, em 1911. Fez o curso jurídico assinando Benedito Francisco Nogueira. Conforme Cristino Castelo Branco, seu companheiro de faculdade, a denominação Tapety, apelido de família, ele resolveu incorporar ao próprio nome - Benedito Francisco Nogueira Tapety, literariamente Nogueira Tapety.

Promotor Público, em 1912, da antiga capital do Piauí. Conselheiro Municipal. Idealizou a criação de uma instituição de artífices que redundou, posteriormente, na União Artística Operária Oeirense.

Ano seguinte, Delegado-Geral de Teresina. Assessor do Governador Miguel Rosa.

Jornalista desde o tempo de estudante. Colaborou no "Diário de Pernambuco", do Recife. Na capital piauiense, tornou-se colaborador freqüente de "O Piauí" e enviava trabalhos para "O Diário", de Belém. Adotava o pseudônimo Mesquita Petiguara.

Orador fluente, aos 20 anos, pronunciou conferência no Teatro 4 de setembro, de Teresina, sob o título "A Luz", em que estuda o sol perante a ciência, a religião e a literatura.

Ainda em Teresina, foi professor do velho Liceu Piauiense (atual Colégio Estadual Zacarias de Góes), onde lecionou Filosofia, Psicologia e Lógica.

Ano de 1915, surgiram os primeiros sintomas do mal que o vitimaria, a tuberculose. Buscou cura na Ilha da Madeira, pertencente a Portugal.

Vate primoroso. Integra várias antologias, inclusive a de J. G. de Araújo Jorge, intitulada OS MAIS BELOS SONETOS QUE O AMOR INSPIROU. Sua musa inspiradora foi a conterrânea Marica Sá, que também morreu solteira. Viveram um romance frustrado!...

Ocupante primeiro da Cadeira nº 15 da Academia Piauiense de Letras.

Faleceu no dia 18 de janeiro de 1918 na casa-de-fazenda referida. Sepultado no Cemitério do Santíssimo Sacramento, em Oeiras.

É nome de rua, unidade escolar e conjunto habitacional em sua cidade. Em Teresina, há a rua Nogueira Tapety.

"Arte e Tormento" é sua obra póstuma publicada ao ensejo do seu centenário de nascimento, em 1990.

Povoa o imaginário de todos os que conhecem sua vida e obra.

Fonte:
http://www.fnt.org.br/nogueira_tapety-downloads.php?id=5
http://www.antoniomiranda.com.br/

Ialmar Pio Schneider (Baú de Trovas XIII)


A noite chegou depressa,
no inverno trouxe o frio;
vem a tristeza e começa
a encher meu mundo vazio.

Assim como a vida é breve
e os meus sonhos passageiros,
hoje meu ser não se atreve
em lances aventureiros...

De ti não quero mais nada,
apenas lembrança triste,
pois minh´alma apaixonada
ao teu desdém não resiste !

Eras tu, mulher querida,
o meu precioso troféu,
quando encontrei-te na vida,
parece que entrei no céu !

Eu já fiz diversas trovas
e tantas quadras também,
sempre estou compondo novas
destinadas ao meu Bem !

Eu nunca fiquei sabendo,
se tinhas um outro alguém
e por isso não compreendo
o teu silêncio também !

Hoje levantei mais tarde,
tinha pouco o que fazer;
mas, amor, você me aguarde,
que nunca a pude esquecer !...

Já fiz trovas de improviso
na distante mocidade,
mas, menestrel sem juízo,
delas só tenho saudade...

Luas cheias e as estrelas
povoam o imaginário,
sonhadores, vinde vê-las,
da noite o lindo cenário !...

Mais um ano se passou
e continua a poesia,
que Quintana dos deixou
para nossa nostalgia...

Na breve, efêmera vida,
não saibam, talvez, mas quis,
com a poesia escolhida,
sempre alguém fazer feliz !

Não considero perdida,
aquela ingênua ilusão,
que invadiu a minha vida
num momento de paixão...

Não consigo mais te ver
e procuro te encontrar,
para sentir o prazer
de finalmente te amar.

Nos caminhos da existência,
foram tristes ou risonhos,
os dias de convivência
na imensidão dos meus sonhos...

O meu amor tem segredos
que nunca pude externar;
me invadem todos os medos
de a não poder conquistar !

O pôr-do-sol pede um verso
no fim da tarde que desce,
medito e com Deus converso
nesta trova feita prece.

O sol-nascente desperta,
na imensidão do Universo,
o viajor de vida incerta
e o poeta que faz verso.

Os poemas que ficaram,
quando ingênuo e sem memória,
na sala em que o assassinaram,
hoje contam sua história.

Para conversar com Deus,
olho os céus e me comovo,
mas lembrando os beijos teus,
retorno à terra de novo !

Procurei teu coração
com toda a sinceridade,
mas retorno à solidão
para viver de saudade...

Procuro encontrar-te ainda
para saber como vais
e a tarde que agora finda
me responde: “Nunca mais !”

Quando estas quadras componho,
pensando no meu amor,
a vida parece um sonho,
para eu ser um sonhador.

Quando te vejo e sorris,
não sei que faço, senhora,
para a gente ser feliz
não há dia, nem tem hora!

Quem fizer a gentileza
de não levar por ofensa,
que me ame até na pobreza
sem esperar recompensa.

Quem tiver devotamento
pra algum amor que vier,
vai viver um bom momento,
sejam homem ou mulher.

Quis escrever um soneto,
levando mensagem nova,
mas esbarrei no quarteto,
e então compus esta trova...

Recordo a tua beleza
e também o quanto és boa,
me apaixono, com certeza,
e faço versos à-toa !

Só não compreende a ventura
de um simples beijo roubado,
uma infeliz criatura
que não foi apaixonado.

Tinha um sonho benfazejo,
ao raiar da adolescência,
ser um cantor sertanejo
para as prendas da querência.

Vou reler Mário de Andrade,
os poemas são assim;
falam a realidade:
este, portanto, seu fim.

Fonte:
O Autor

ALB/Mariana (Convite para Diuplomação e entrega de Medalha)

Roberto Pinheiro Acruche (Meus Poemas n. 6)


ESPELHO MEU

Olho o meu rosto refletido no espelho
e pergunto: Quem é você?
-Já vi você antes!... No entanto esqueci-me de perguntar quem é você!
Mas agora, vejo-lhe aparentemente diferente;
o que lhe fez mudar?
-O tempo, o vento, os dias, as noites, os sonhos, as fantasias, os amores, as paixões, as desilusões?
Quem fez estas rugas em seu rosto,
este semblante cansado?
Onde estão o sorriso e o brilho dos seus olhos?
Diga-me, quem é você?
Abra a sua alma, exponha, escancara, mostra o que tem por dentro.
Diga-me, o que fazes aqui?
Por que vieste?
Pra onde irás?
Sem respostas, afastei-me do espelho!

A NATUREZA

Mares, rios, lagos, montanhas,
árvores, animais...
Um conjunto de forças ativas
em todo o universo.
Um fenômeno energético
de potência descomunal.
Maravilha paisagística,
multicolorida,
ricamente pluralizada
capaz de produzir efeitos visuais
extraordinários,
indescritíveis pela palavra humana.
Agente da vida e ocasionadora
da morte.
Alegre, radiante, albina,
esplêndida, fulgurante...
DIVINA!

APÊLO

Mestre, não me abandone,
como preciso de Ti.
Não me deixes tão sozinho,
não me esqueça aqui...

Segure a minha mão,
quero andar com firmeza.
Entre no meu coração,
tire de mim a tristeza.

Quando meu dia chegar,
permita agora rogar,
tenha de mim compaixão...
Acolha a minha alma,
perdoa-me por vacilar,
doa-me a salvação.

DESEJO

Hoje senti uma vontade enorme
de falar com Deus!
Queria lhe dizer algo especial,
algo maravilhoso e não banal.

Pensei escrever um poema,
mas qual seria o tema?

Pensei escrever sobre a minha vida...
Mas o que interessaria a Deus
se a minha própria história está esquecida...

Falar do futuro, coisas do mundo,
do céu, da terra, do mar...
Mas o que falar?

Acabei por perceber
que falar com Deus
não basta querer.
Nem necessariamente soltar a voz
ou mesmo escrever...

Para falar com Deus
basta lhe entregar a alma,
lhe abrir o coração...
Ainda que em total silêncio!

PASSARADA

Gorjeia Passarada,
acorda a minh’alma
com o seu cantar.
Faça vibrar o meu coração
com a sonoridade do seu canto;
traduza a letra dessa melodia
de beleza incomparável;
quero entender a sua canção
e também poder cantar.
Gorjeia Passarada,
deixa a minh’alma encantada
com essa alvorada sonora
que traduz nessa hora
a melodia inigualável
que surge do seu cântico.
Gorjeia passarada...

Fonte:
O Autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n.48)


Trova do Dia

Num Brasil de ouvidos moucos
a vida perde os encantos
quando a ganância de poucos
promove a fome de tantos!...
ANTÔNIO JURACI SIQUEIRA/PA

Trova Potiguar

Eu não sei bem se é loucura,
porém me sinto feliz;
imaginando a ternura
dos versos que nunca fiz!...
JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN

Uma Trova Premiada

2009 > Cambuci/RJ
Tema > POETA/POESIA > Vencedora

Eu creio na honestidade,
na justiça clara e reta,
no fim da desigualdade...
Não sou louco!... Eu sou poeta.
OLYMPIO COUTINHO/MG

Uma Poesia livre

– Pablo Neruda/Chile –
SAUDADE.

Saudade é solidão acompanhada,
é quando o amor ainda não foi embora,
mas o amado já...

Saudade é amar um passado que ainda não passou,
é recusar um presente que nos machuca,
é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,
é a dor dos que ficaram para trás,
é o gosto de morte na boca dos que continuam...

Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade:
aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:
não ter por quem sentir saudades,
passar pela vida e não viver.

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

Uma Trova de Ademar

Todos nós somos atores
no teatro da ilusão.
Fingimos que não são dores,
as dores do coração!...
ADEMAR MACEDO/RN

...E Suas Trovas Ficaram

Enquanto choro os fracassos
que a vida me tem imposto,
o tempo imprime seus passos
sobre as rugas do meu rosto!
LAVÍNIO GOMES DE ALMEIDA/RJ

Estrofe do Dia

Pra retratar o sertão
em sete versos apenas,
mergulho na natureza
busco inspirações serenas
e qual um grande pintor
para a obra ter mais valor,
crio minhas próprias cenas!
ADEMAR MACEDO/RN

Soneto do Dia

– Rogaciano Leite/PE –
SE VOLTARES.

Como sândalo humilde que perfuma
o ferro do machado que lhe corta,
eu hei de ter minha alma sempre morta
mas não me vingarei de coisa alguma.

Se voltares um dia à minha porta,
tangida pela fome e pela bruma,
em vez da ingratidão, que desconforta,
terás um leito sobre um chão de pluma.

E em troca dos desgostos que me deste,
mais carinho terás do que tiveste,
e os meus beijos serão multiplicados.

Para os que voltam pelo amor vencidos,
a vingança maior dos ofendidos
é saber abraçar os humilhados.

Fonte:
Ademar Macedo