quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Carlos Drummond de Andrade (Amar)


1º Prêmio de Trovas "Chico Anísio 2012 – UBT/Maranguape (Resultado Nacional/Internacional e Estadual) Parte 2: Humoristicas – Tema: Humor


NACIONAL/INTERNACIONAL

VENCEDORES (1º ao 5º lugares):

1º. Lugar:

 Dei à sogra, com amor,
 uma vassoura importada
 mas a velha, sem humor,
 me sentou a vassourada.
 Dulcídio de Barros Moreira Sobrinho 
Juiz de Fora/MG

2º. Lugar:

 Escrevo e bebo cachaça.
 Fazer humor é meu fim.
 Se a trova não leva graça
 acabam rindo de mim.
Abílio Kac 
Rio de Janeiro/RJ

3º. Lugar:

 Papagaio falastrão
 de mau humor, irritado,
 repetia: “hei patrão,
 você já foi descartado!”
 Therezinha Tavares 
Nova Friburgo/RJ

4º. Lugar:

 Por vê-lo em farras constantes,
 com humor, fez a surpresa:
 - Querido, se chegar antes,
 deixa a luz, de fora, acesa.
 Therezinha Dieguez Brisolla 
São Paulo/SP

5º. Lugar:

 Tem gente cuja risada,
 em vez de alegrar, dá medo.
 – Até pra contar piada
 faz cara de humor azedo...
A. A. de Assis 
Maringá/PR

MENÇÕES HONROSAS (6º ao 10º lugares):

6º. Lugar:

 Um xodó com outro alguém,
 causa humor, dá euforia,
 mas dá nó cego também,
 se a patroa desconfia.
 Fabiano de Cristo Magalhães Wanderley 
Natal/RN

7º. Lugar:

 Com muito humor, o gabola
 insiste numa cantada,
 mas hoje tanto se enrola,
 que apenas canta... e mais nada!!!
 Ercy Maria Marques de Faria 
Bauru/SP

8º. Lugar:

 Achando que faz humor,
 aquele “cara de pau”
 diz à sogra, sem temor:
 - Sonhei com seu funeral!
 Glória Tabet Marson 
São José dos Campos/SP

9º. Lugar:

 Parece humor, ou piada,
 mas é vero o conteúdo,
 pobre diz que não tem nada,
 mas, se chove, perde tudo...
 Fabiano de Cristo Magalhães Wanderley 
Natal/RN.

10º. Lugar:

 Tendo patroa gostosa,
 com bom humor o chofer,
 de folga, relaxa e goza,
 todo dia que ela quer!...
 Marisa Rodrigues Fontalva 
São Paulo/SP

MENÇÕES ESPECIAIS (11º ao 15º lugares):

11º. Lugar:

 Traído por seu amor,
 o marido da Manuela,
 ficou de tão mau humor
 que deu uma chifrada nela!
 Adalberto Prado 
Maringá/PR

12º. Lugar:

 − Suspende a cachaça ou morre!
 – Com humor, Zé, no boteco,
 agora só toma porre
 suspendendo seu caneco!
 Wanda de Paula Mourthé 
Belo Horizonte/MG

13º. Lugar:

 Seu péssimo humor é tal,
 e é tal seu jeito ranzinza,
 que curte, do carnaval,
 somente a quarta de cinza...
 A. A. de Assis 
Maringá/PR

14º. Lugar:

 Com humor fica o velhinho
 se a tua saia rodada,
 de comprimento curtinho
 lhe acende a vela apagada.
 Victor Manuel Capela Batista 
Barreiro/Portugal

15º. Lugar:

 Minha sogra vive rindo,
 gosta de fazer humor...
 falsamente vou sorrindo:
 cada piada, um horror!
 Abílio Kac 
Rio de Janeiro/RJ

DESTAQUES (16º ao 20º lugares):

16º. Lugar:

 Com humor à citadina,
 trabalhando cá e lá,
 sendo esperta cafetina,
 a tal “coisa” ela não dá!...
 Marisa Rodrigues Fontalva 
São Paulo/SP

17º. Lugar:

 Num ambiente animado
 só reinavam paz e amor,
 surgiu a sogra ao meu lado
 e acabou com meu humor.
 Argemira F. Marcondes 
Taubaté/SP

18º. Lugar:

 Um mestre da natação
 gosta de contar piada...
 Em seu humor campeão,
 ele ri, e o povo... nada!
 Renata Paccola 
São Paulo/SP

19º. Lugar:

 Foi humorista de fato
 Chico Anísio o piadista,
 que, na vida, em qualquer ato,
 pôs seu “humor” sempre à vista.
 Zeni de Barros Lana 
Belo Horizonte/MG

20º. Lugar:

 Com falso senso de humor
 mas só por bajulação,
 chamava até de senhor
 o cachorro do patrão!
 Josafá Sobreira da Silva 
Rio de Janeiro/RJ

ÂMBITO: ESTADUAL 

TEMA: HUMOR 

VENCEDORES (1º ao 5º lugares): 

1º. Lugar: 

Quem quiser fazer humor 
faça do jeito que eu faço 
simule ser um ator 
pinte a cara de palhaço. 
Raimundo Rodrigues de Araújo 
Maranguape/CE 

2º. Lugar: 

Diz o obeso a certa amiga 
com humor e voz profunda: 
Hoje estou com mais barriga 
e amanhã, com menos bunda. 
Deusdedit Rocha 
Fortaleza/CE 

3º. Lugar: 

Uma velha desfrutável 
que detinha grande humor 
com seu amante imprestável 
perdeu todo o seu pudor. 
Ana Maria Nascimento 
Aracoiaba/CE 

4º. Lugar: 

Para um travesti gostoso, 
sem ousar fazer humor 
disse o velhote fanhoso: 
Necessito de um amor! 
Ana Maria Nascimento 
Aracoiaba/CE 

5º. Lugar: 

Foi não foi se descasava 
para um novo compromisso, 
e no humor vaticinava: 
“eu ainda morro disso”! 
Deusdedit Rocha 

MENÇÕES HONROSAS (6º ao 10º lugares): 

6º. Lugar: 

Munido de grande humor 
um juvenil bem dotado 
disfarçava com primor 
o seu lado afeminado. 
Ana Maria Nascimento 
Aracoiaba/CE. 

7º. Lugar: 

Com “Penetrato de Amor”, 
à noite, sempre ao deitar; 
garanto que o mau Humor 
não terá vez no seu lar! 
Nemésio Prata Crisóstomo 
Fortaleza/CE 

8º. Lugar: 

Se é para fazer humor 
é melhor chamar aquela, 
que tem cara de terror 
e a venta tipo moela. 
Raimundo Rodrigues de Araújo 
Maranguape/CE 

9º. Lugar:

O teu humor não tem graça 
sou mais um bode berrando 
é um porre de cachaça 
uma ressaca chegando. 
Luiz Carlos de Abreu Brandão 
Maranguape/CE 

10º. Lugar:

Na Farmácia da Alegria 
remédio para tristeza 
tem nome de fantasia: 
Bom Humor. É uma beleza! 
Nemésio Prata Crisóstomo 
Fortaleza/CE 

MENÇÕES ESPECIAIS  (11º ao 15º lugares): 

11º. Lugar: 

Quando o humor vem da arte pura 
trazendo riso e mensagem, 
não tem laivos de frescura 
e sequer de baitolagem. 
Deusdedit Rocha 
Fortaleza/CE 

12º. Lugar: 

Bom Humor em injeção 
comprimidos, ou xarope, 
é a melhor prescrição 
para tristeza a galope! 
Nemésio Prata Crisóstomo 
Fortaleza/CE 

13º. Lugar: 

Rir é o melhor remédio 
vai no festival de humor, 
você não terá mais tédio 
complete fazendo amor. 
José Aureilson Cordeiro Abreu 
Maranguape/CE 

14º. Lugar: 

Melhor do que o teu humor 
é se sentar na calçada 
é ir dormir com calor 
e acordar sem dormir nada. 
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão 
Maranguape/CE. 

15º. Lugar: 

Deu adeus, o meu humor. 
ninguém quer mais semear 
em meus olhos, um ardor 
é só fumaceira no ar. 
Olga Rosália Silva Pedrosa 
Maranguape/CE 

DESTAQUES (16º ao 20º lugares): 

16º. Lugar: 

Teu humor é aplaudido 
vi muita gente sorrindo, 
mas eu, sou mais um grunido 
de uma cachorra parindo. 
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão 
Maranguape/CE 

17º. Lugar: 

Tamanha foi a gargalhada, 
pois o humor era fremente 
a calça ficou molhada 
por dilatar a vertente. 
José Aureilson Cordeiro Abreu 
Maranguape/CE 

18º. Lugar: 

Coceira da bacurin 
é igual ao meu humor 
se você não quer assim 
fique longe por favor. 
Luiz Carlos de Abreu Brandão 
Maranguape/CE 

19º. Lugar: 

Só faltei morrer de rir. 
foi quando o artista Agenor 
fingiu roncar e grunir 
em um festival de humor. 
Olga Rosália Silva Pedrosa 
Maranguape/CE 

20º. Lugar: 

O teu humor é um porre 
falta de ar, até goteira 
vem, me acode, me socorre 
tu és pior que frieira. 
Luiz Carlos de Abreu Brandão 
Maranguape/CE 

Fonte:
Moreira Lopes, da UBT/Maranguape

Érico Veríssimo (Uma entrevista, 2 anos antes de sua morte)


Pintura de Tânia Hanauer
*Esta entrevista foi publicada originalmente no jornal Opinião (SP), de 05/02/1973, com o título: Sou contra a censura, e republicada em VERÍSSIMO, Érico. A liberdade de escrever: entrevistas sobre literatura e política. São Paulo: Globo, 1999, de onde foi extraída. 

 Porto Alegre, Érico Veríssimo falando ao Opinião:

"Quero começar com um elogio (...). Agora vem a reclamação. Quase todas as perguntas que vocês me fazem na realidade exigem como resposta um longo ensaio. Ora, não sou ensaísta. Um romancista é antes de mais nada um intuitivo. Quando ele se aventura a analisar seus próprios livros, a fazer a sua exegese, mete os pés pela mãos. Se há uma coisa que não me preocupa nem me ocupa agora é a interpretação dos livros que já escrevi e publiquei. Dados esses esclarecimentos, vamos às respostas".

- A História é a matéria básica da sua ficção em pelo menos dois livros seus: O tempo e o vento e Incidente em Antares. Qual a importância da realidade histórica para a sua literatura? 

Ninguém pode fugir à História... e lá se foi o primeiro lugar-comum. Clara ou oculta, essa "senhora", está presente em todos os meus romances. Sempre considerei importante. Não só ela mas também esse cavalheiro, mais misterioso ainda, sem o qual ela não poderia existir: o Tempo. Como é possível desenvolver, fazer viver um personagem, um grupo social, fora do tempo e da História? Como se poderia contar uma fábula num vácuo temporal e espacial? Claro, com artifícios de linguagem, com refinamento de técnica, é possível dar ao leitor a impressão de que o romance não tem quando nem onde. Acho que qualquer autor tem o direito de escrever o que entende, o que sabe, esquivando-se do que lhe pode confundir o espírito. O importante é que o livro seja bom. É preciso não esquecer que a História não é sinônimo perfeito de Política ou que a política não pode ou deve ser sempre partidária. No meu caso particular, tenho sido naturalmente levado em minhas ficções para problemas políticos que vivi, em geral, como espectador. Graças aos meios de comunicação modernos, hoje em dia os acontecimentos nos chegam de todos os quadrantes do mundo com mais rapidez e força.

- No Prefácio de O reino deste mundo, Alejo Carpentier postula para o romancista latino-americano a necessidade de incorporar à sua ficção a "realidade mágica". O senhor o faz, em certa medida, em Incidente em Antares. Acha que esse também é um caminho para a nossa ficção?

Conheci Alejo Carpentier em 1954, quando ele estava exilado na Venezuela por causa da ditadura do sargento Batista. É um grande romancista (Alejo, não Batista). Concordo com ele quanto à fatalidade, digamos assim, que nos impeliu para o "realismo mágico". Note-se que o adjetivo "mágico" aqui significa também "absurdo". Nossa América Latina é um território de prodígios, de maravilhas e misérias, de sustos e êxtases. Nela tudo pode acontecer. Seu tamanho, suas selvas e cordilheiras, sua gente sofrida e estranha, sua História nos induzem a uma realidade que pouco tem a ver com o "normal" cotidiano. Principalmente a América espanhola. Todos os "impossíveis" que nos narra o incomparável Gabriel Garcia Márquez em "Cem anos de solidão" tornam-se uma realidade que o leitor aceita. Não creio que tenha feito propriamente "realismo mágico" em "Incidente em Antares". O realismo mágico verdadeiro é o desses romancistas hispano-americanos (Cortázar, Carpentier, Borges...e quantos outros mais?). É todo um clima que pervaga o romance ou o conto do princípio ao fim. Se acredito que esse "realismo mágico" pode ser um caminho para a nossa ficção? Ora, todos os caminhos nos estão aberto. É muito perigoso traçar roteiros definitivos para qualquer literatura. Pensemos, por exemplo, no Rio Grande do Sul, na nossa paisagem verde e desafogada, na nossa população de origem européia, na nossa pobreza folclórica, na nossa quase ausência de "mistério à flor da terra" e havemos de concluir que o realismo mágico aqui seria algo postiço. Mas está claro que temos muitos assuntos ainda inexplorados no nosso Estado. Josué Guimarães acaba de atirar-se corajosamente a um deles em "A ferro e fogo", primeira parte de uma trilogia sobre a colonização alemã no R.G. do Sul, e da qual nos deu recentemente o primeiro volume: "Tempo de solidão". Recorrendo aos que me leem, esse romance é feito com grande economia verbal, eu diria mesmo escrito em preto e branco, Josué Guimarães consegue nele criar uma atmosfera, o que me parece das coisas mais difíceis em ficção.

- De Clarissa a Incidente em Antares haverá, certamente, uma evolução na sua literatura. Quais as linhas-mestras dessa evolução?

Eu lhe pediria que eliminasse, de saída, a expressão linhas-mestras, que me assusta um pouco e pode me embrulhar o espírito. Usando de uma simplificação que os psicólogos não aprovam, direi que tenho dentro de mim um poeta, um romântico em turras permanentes com um realista dotado de veia satírica. Em Clarissa predominou o poeta, ou se preferirem, o pintor aquarelista. Logo depois o satirista chutou o poeta e escreveu Caminhos cruzados. A seguir, ambos se uniram e produziram Um lugar ao Sol. Pode-se passar a vida escrevendo novelinhas-poemas como Clarissa se fecharmos os olhos a certos aspectos sórdidos e negativos da vida. Gosto muito do ditado anglo-saxão segundo o qual " é preciso um pouco de tudo para fazer-se um mundo". É preciso saber que as condições econômicas de minha vida pessoal, particular, influenciaram muito os romances que escrevi entre 1933 e 1940. Observe-se como meus personagens dos livros dessa época preocupavam-se com as contas a pagar no fim do mês. Eu trabalhava longa e duramente durante mais de 12 horas por dia. Traduzia livros de várias línguas para o português (mais de 40), inventava histórias para programas de rádio para a infância, armava páginas femininas para o Correio do Povo, tudo isso enquanto trabalhava na revista e na editora da Livraria do Globo. Isso explica a pressa com que escrevi meus próprios romances naquela década de 30. Considero essa fase de minha carreira um período de exercícios em que me preparei, consciente ou inconscientemente, para a obra com que comecei a sonhar depois de 1935 e que acabou sendo publicada a partir de 1949 sob o título geral de O tempo e o vento. Depois de Olhai os lírios do campo, romance cheio de defeitos, mas com grande carga emocional, comecei a ganhar royalties que melhoraram minha situação econômica. Pude trabalhar mais devagar e tive mais tempo para ler... e para me ver e julgar.

- Na publicidade de Incidente em Antares usou-se a frase: "Num país totalitário este livro seria proibido". O senhor submeteria um livro seu à censura? Por que?

Já disse muitas vezes que jamais submeterei um livro meu à censura prévia. Acho isso degradante, além de absurdo. Se André Gide, que leu a grande obra de Marcel Proust ainda em originais, não recomendou a sua publicação à editora Gallimard, que esperança podemos ter num comité de críticos literários improvisados e composto de membros da polícia federal ou de qualquer outra polícia, ou mesmo da Academia Brasileira de Letras. Repito que sou contra a censura, mas devo qualificar essa minha posição. Só merece liberdade quem tem consciência de sua responsabilidade profissional.

- Ao escrever Incidente em Antares o senhor se apoiou, naturalmente, numa certa interpretação histórica da realidade brasileira contemporânea. A seu ver, quais os fatos decisivo que conduziram ao movimento militar de 1964?

A revolução de 1964 de certo modo começou nos tempos em que se tentou impedir que Juscelino Kubitschek, legalmente eleito, tomasse posse. Atingiu um momento de alta periculosidade quando Jânio Quadros renunciou. Desse momento em diante, os dados estavami irremediavelmente lançados: o resto era questão de oportunidade, e essa oportunidade foi fornecida pela inabiidade de políticos da situação como, por exemplo, Leonel Brizola, que dizia muitas coisas certas, mas com a entonação errada e de maneira estabanada e inoportuna. Os políticos profissionais têm - não esqueçam - sua grande dose de culpa em todo esse processo que levou à revolução de 1964 e que começou pouco antes da proclamação da Repúbica. Nos anos que se seguiram, o Exército foi tantas vezes chamado a intervir nas revoluções tramadas pelo políticos (que mandavam soldados para a caserna mal conquistavam o poder) que, como era de se esperar, um dia arraigou-se a idéia na cabeça dos militares.

- Vargas é personagem de Incidente em Antares. A seu ver, o varguismo como ideologia e estilo político está completamente morto?

O varguismo está em "artigo de morte", como diria Manuel Bernardes. (Não confundir com o Presidente Arthur Bernardes). Isso não quer dizer que a imagem de Getúlio esteja apagada de todas as mentes. Mas não creio nem desejo que o varguismo como estilo político volte a vigorar entre nós. Digo isso sem rancor, pois gostava pessoalmente do homem Getúlio, embora reconhecendo os erros que cometeu. Acho que foi dos personagens mais dramáticos da Hsitória do Brasil em todos os tempos. Sinto ainda uma ponta de tristeza quando o imagino (como fazia Dona Quita Campolargo, em Incidente em Antares) em sua última noite de solidão e abandono no Palácio do Catete.

- A última cena de Incidente em Antares é um estudante que vai escrever a palavra "liberdade" num muro e é baleado pela polícia. De que maneira o senhor encara as restrições atuais à participação política da classe estudantil?

Pensei que essa cena tivesse deixado bem claro o meu pensamento a respeito do assunto. Sou favorável à participação, não só da classe estudantil, como também de todas as outras classes do Brasil na nossa vida política, através do sufrágio universal e da possibilidade de candidatar-se a um cargo público. Nunca fui partidário do terrorismo, que não leva a nada de construtivo, mas por outro lado, sempre repudiei a tortura cmo método (ou como esporte) e sou positivamente contrário à condenação de quem quer que seja por "delitos de opinião". Ninguém é criminoso por ter idéias... a não ser que se trate de idéias que levem deliberadamente ao niilismo, ao crime, ao caos.

- O seu estilo sempre foi dos mais despojados da literatura brasileira, aproximando-se bastante do jornalístico. O senhor considera isso uma fórmula peculiar sua ou uma normativa a ser seguida por todos os escritores que buscam maior comunicação com o público?

É a minha maneira de ser. Mas acho que cada escritor deve ser o que é, escrever como entende, usar mais ou menos adjetivos, frases mais curtas ou mais longas. Acredito também que às vezes é o assunto de um livro que dita o seu estilo. Comunicar-se a gente com o público é muito importante. Há em literatura duas coisas igualmente perniciosas e nem sei qual a pior. Uma é tornar-se vulgar, chulo, chão, sensacionalista para conquistar um público mais vasto. A outra é fazer-se hermético para ser entendido somente pelas elites, pelos eleitos. Mas repito que os escritores são como são. Cada qual deve ser dono de seu nariz: errar ou acertar por conta própria.

- Um balanço da cultura brasileira em 1972 demonstra que esse não é um momento particularmente criador, seja na música popular, no cinema, no teatro e na ficção, terrenos em que nos mostrávamos férteis há dez anos. A seu ver, a que se deve essa inibição generalizada?

Não sei com certeza se em matéria de criatividade estamos atravessando um período pobre na música popular, no cinema, no teatro e na ficção. Mas o que posso dizer claramente é que a censura não ajuda em nada o criador, e que a pior censura é aquela que acaba infiltrando-se aos poucos nas nossas cabeças, como um cavalo, ou melhor, um burro de Tróia. A criação é um ato de amor e de liberdade. Houve na História, eu sei, escravos que produziram obras de arte, mas isso não quer dizer que se possa trabalhar num ambiente de "não pode", "é proibido", "dá cadeia". Olhem para os países que têm censura e me digam o que aconteceu à sua arte e à sua literatura. Vejam o que se está fazendo na Rússia com Soljenitzyn e outros escritores. É uma indignidade. E quem faz isso são os homens que cresceram, tornaram-se adultos durante os regime stalinista de terror e obscurantismo, isto é, gente que nunca conheceu a liberdade de pensar e de criar. E a extrema direita é tão má quanto a extrema esquerda. Sim, vocês têm razão, a inibição que perturba nossos artistas plásticos e nossos escritores, compositores, pensadores, jornalistas é causada pelo clima criado pela censura. Pessoalmente não fui ainda censurado, mas isso não me faz feliz, pois não quero, como meia dúzia de outros escritores, ser exceção num país de quase cem milhões de habitantes.

- Mais ou menos a partir de 1968 vivemos em clima de euforia, "em ritmo de Brasil grande", na fórmula oficial. A seu ver, se justifica esse clima de otimismo?

Acho que se justifica. Nesses últimos anos, o Brasil tem crescido e em alguns setores as melhoras são visíveis a olho nu. Está claro que só temos estatísticas oficiais e nunca sabemos ao certo do que se passa nos bastidores da política. Não posso negar a Transamazônica, a melhor qualidade dos serviços postais e muitos outros empreendimentos. O que eu acho é que tudo isso se poderia fazer num regime democrático, dentro da velha Constituição, contanto que ela fosse realmente cumprida a rigor.

- O primeiro livro da trilogia O tempo e o vento descreve a incorporação do índio à civilização luso-brasileira. A seu ver, através de que formas se deu essa integração?

Não sei. Desculpe-me. Não sei. Façam essa pergunta a um especialista.

- O gaúcho valente e altivo parece historicamente desaparecido há muito tempo, embora o rio-grandense de hoje tenha herdado alguma coisa dele. Quais os traços dominantes na psicologia e no comportamento do rio-grandense médio em 1972?

O gaúcho altivo, valente, varonil, nobre, bom amigo, generoso é um arquétipo. Hoje em dia alguns (ou muitos?) rio-grandenses procuram viver de acordo com essa imagem idealizada. Ouço de turistas que o gaúcho é hospitaleiro, simpático, serviçal. Os Centros de Tradições Gaúchas deviam procurar estimular essas qualidades, dando menos atenção ao aspecto da indumentária gauchesca. A mistura de sangue é muito grande entre o nosso povo. O contingente de sangue italiano e alemão é considerável nos habitantes deste Estado. A incidência do tipo humano de pele e cabelo claros é grande entre nós. E não preciso dizer que nossa maneira de falar é inconfundível: quadrada, escandida, meio seca. Linguagem de carnívoro.

- O Rio Grande do Sul sempre foi um dos Estados mais politizados do Brasil. A que se deve isso?

Nunca tinha pensado nisso. Talvez essa politização se deva a nossa condição de fronteira (influências do Prata) e ao fato de termos sido durante mais de um século o campo de batalha do Brasil. Ocorre-me que temos sido um viveiro de líderes políticos. (nem todos bons) A figura de Castilhos, sobre quem Sérgio da Costa Franco escreveu um magnífico ensaio biográfico, é ímpar. Borges de Medeiros foi a encarnação da política positivista. Castilhos foi pai espiritual de Borges, e Borges pai de Getúlio, de Flores da Cunha, de Oswaldo Aranha e João Neves da Fontoura. Não esqueçamos o vulto interessantíssimo de Pinheiro Machado. E o de Luiz Carlos Prestes. É, parece que vocês têm razão. O Rio Grande é (ou era) um Estado altamente politizado.

- Esta politização está aumentando ou diminuindo?

Creio que está diminuindo.

- Qual a grande epopeia do Brasil atual (o acontecimento grandioso, significativo e de projeção para o futuro)?

Faça esta pergunta ao meu filho daqui a trinta anos. Minha tendência no momento é dizer que o grande herói desta hora é o povo, o homem comum, que, se continua vivo, é de teimoso. 

Fonte:
(este site está atualmente desativado)

Stella Carr (Segredo de Cientista)


Lino vinha todo dia espiar pra ver se crescia de novo o rabo do bicho que ele tinha prendido na porta, sem querer. 

Então descobriu: lagartixa bota ovo! Encontrou no racho do muro, onde o animalzinho fora se esconder fugindo dele, os ovos moles e esbranquiçados. Pegou, curioso, um pouco enojado. 
Depois esmagou um a um contra a parede pra ver o que tinha dentro.

Daí começou a reparar nos bichos pequenos. Desenterrava minhocas. Prendia moscas no copo e ficava olhando.

– Não põe porcaria no copo onde se bebe – a mãe bronqueava.

Então descobriu as formigas. Com um pau, cutucava o formigueiro.

Um dia entrou em casa gritando, os insetinhos subindo pelas pernas. A avó botou um ungüento (remédio de gente velha, que ela guardava em potes na gaveta da mesa de cabeceira). Então Lino aprendeu a abrir o formigueiro com cuidado, sem pisar em cima. Tirava os ovos brancos de dentro, olhava, examinava.

– É curiosidade científica dele! – o pai dizia. E deu-lhe uma lente.

Contava pra todo mundo que o filho ia ser cientista.

A mãe, barriga imensa, vivia carregando o tricô pela casa. Ela e a avó estavam sempre ocupadas, entretidas com as receitas de mais uma roupinha. Agora, com a lente, Lino passava os dias observando lagartas e caracóis; aprisionava grilos e borboletas, abria casulos.

Mas foi depois que descobriu os ovos de aranha que o jeito do menino mudou.

Dos ovos da aranha tinham saído vivas dezenas de minúsculas aranhinhas, que se espalharam correndo por todo lado. Então ele quebrou todos os ovos da geladeira, pra ver se tinha bicho vivo dentro. Dessa vez levou bronca, que isso já era demais. Tinha virado mania. Ficou triste, emburrado, não falou mais com a mãe, nem com a avó. E olhava pra mãe desconfiado...

"Onde será que ela guarda?" – pensava. E toca a procurar. Mexia em tudo, abria os armários, olhava debaixo das roupas, nas gavetas.

– Não mexe aí, menino. São meus guardados. Que mania! – a avó reclamava.

Nas coisas da avó, não estavam. Olhou no cesto de lãs, na caixa de agulhas... Quem sabe estavam nos potes de remédio? Se ao menos ele soubesse como eles eram...

Começou a curiosidade pelos livros nas estantes. Olhava as figuras, tinha livros com mapas, índios, um montão de números. Pior: tinha livros sem figuras.

Subiu numa cadeira para alcançar mais em cima. Um dia Lino achou o que queria: a figura mostrava um feto pequenino, todo encolhidinho dentro da barriga de uma mulher, como as formiguinhas dos ovos brancos. Só que era avermelhado.

"Então são assim os ovos da mãe? E se eu encontrasse e quebrasse todos?" Voltou a procurar adoidado.

Foi quando a mãe disse que ia para a maternidade.

– Só por uns dias, pra buscar seu irmãozinho.

E a vovó foi junto.

"Então os ovos... Aquele barrigão... Foi por isso que não achei em casa!"

Lino estava triste, confuso. Sentia falta da mamãe e da vovó, e tinha uma coisa ruim dentro dele, que apertava.

À noite o pai chegou e quis saber por que ele tinha chorado. ("Como é que o pai sabia?")

– Menino de quatro anos não chora assim à toa. Ainda mais quando vai ser cientista! – o pai falou: – Ainda mais agora, que vem um irmãozinho pra brincar com ele.

Então Lino achou que devia contar pro pai. Só ele podia ajudar! Lembrou dos ovos de aranha, com todas aquelas aranhinhas saindo de dentro, de uma só vez. E contou pro pai. Falou tudo.

Naquela noite, Lino e o pai tiveram uma longa conversa, de "homem para homem". 

Fontes:
Revista Nova Escola
Imagem = http://www.eb1-monte-caparica-n2.rcts.pt/prog1per.htm

Teatro de Ontem e de Hoje (Bar Doce Bar)


O espetáculo, de linguagem cômica e despretensiosa, inicia com sucesso a moda do chamado besteirol, tendência teatral carioca própria dos anos 80.

Escrito, dirigido e interpretado por Pedro Cardoso e Felipe Pinheiro, o texto usa como ponto de partida, para as cenas independentes que encadeia, o ambiente de um botequim onde os músicos, os atores e até o iluminador bebem e contam as piadas que os dois atores interpretam. Esse mote libera o espetáculo de qualquer preocupação com a relação entre os quadros. Quando as portas do teatro se abrem, o grupo já está em cena, esperando o público no bar, onde há vinho branco e vodka. E eles explicam de saída: "É um espetáculo que só se agüenta de cara cheia". A partir daí, nada escapa da gozação. 

Há o striptease de um bêbado, a aparição de uma cantora anã, o quadro de um tiete inveterado, uma furtiva interrupção do humor para um tímido que tenta se aproximar de uma moça. A cena mais antológica do espetáculo apresenta Felipe Pinheiro pedindo um suco num balcão para um hipotético vendedor que atende uma hipotética aglomeração de fregueses. O texto é uma única frase - "moço, me dá um suco" - que passa pelas mais variadas intenções, acompanhando a persistente tentativa do jovem.

O espetáculo começa a temporada ocupando o horário de meia-noite, às sextas e aos sábados. O público, que começa muito reduzido, se amplia e o grupo termina fazendo cinco sessões semanais. O espetáculo vira moda. Pedro Cardoso recebe o Prêmio Mambembe de ator revelação. Segundo o crítico Flávio Marinho, Felipe Pinheiro e ele são os grandes responsáveis pelo sucesso do espetáculo. "O primeiro, transpirando malícia, é capaz de arrancar uma gargalhada com um monossílabo ou um olhar. O segundo, uma grata revelação de ator, tem recursos vocais e corporais que compõem um leque multicolorido de possibilidades. Olho nele: ainda vai dar o que falar".[1]

Os jovens atores contam ao crítico Yan Michalski que a idéia do espetáculo surge quando eles se apresentam com o Pessoal do Cabaré em São Paulo: "Só tínhamos trabalho à noite, e como ao lado da casa onde morávamos havia uma obra barulhenta, acordávamos cedo, com um longo dia pela frente sem nenhum compromisso. Para matar o tempo, procurávamos divertir um ao outro contando piadas. Contando e representando. Aos poucos, começamos a pensar como essas piadas ficariam no palco".[2]

Notas
1. MARINHO, Flávio. Acertos em cena. Visão, Rio de Janeiro, n. 28, p. 50, 12 jul. 1982. 
2. PESSOAL do Cabaré. Citado por MICHALSKI, Yan. Quatro festas para o enterro de um bar. Jornal do Brasil, 1 maio 1983.

Fonte:

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 734)


 Uma Trova de Ademar  

Na floresta, a “derrubada” 
deixa em minha alma sequela, 
pois a dor da machadada 
dói mais em mim do que nela. 
–Ademar Macedo/RN– 

 Uma Trova Nacional  

A pena, que escreve a trova, 
e alegra a gente, na Terra, 
Dá pena, pois, como prova, 
Também declara uma guerra!... 
–Hélio de Castro/PR– 

 Uma Trova Potiguar  

Pela dor da decepção 
eu já me recuperei, 
só falta a devolução 
de um amor que eu te entreguei! 
–Manoel Cavalcante/RN– 

 Uma Trova Premiada  

2008- Nova Friburgo/RJ 
Tema: ESCOLHA- 4º Lugar 

O amor que escolhi um dia
expõe-me à língua do povo?
Dane-se o povo! Eu faria
a mesma escolha, de novo!
–Newton Vieira/MG– 

 ...E Suas Trovas Ficaram  

Amanhece...O Sol se inclina 
para a serra e, sem pudor, 
tira-lhe o véu da neblina, 
beijando-a...cheio de ardor! 
–João Freire Filho/RJ– 

 U m a P o e s i a  

Deus fez a relva sombria, 
fez o tatu à burguesa, 
o campo da natureza 
a mais bela ecologia, 
mas o homem de hoje em dia 
não lhe procura zelar, 
está poluindo o ar 
pondo resíduo no leito; 
Deus fez tudo tão bem feito 
e o homem quer desmanchar. 
–Raimundo Caetano/PB– 

 Soneto do Dia  

ARCO-ÍRIS. 
–Hermoclydes S. Franco/RJ– 

Ao regar, em meu lar, plantas e flores 
numa linda manhã primaveril, 
a esquecer-me os percalços que, entre dores, 
dão à vida, de fato, um cunho hostil, 

eis que um raio de sol, suave e gentil, 
colore o jato d’água em sete cores, 
de mutantes matizes, qual sutil 
arco-íris – encanto dos pintores!... 

Que alegria! Que orgulho tão profundo! 
Sentir tal maravilha, num segundo, 
no milagre ocorrido em meu jardim! 

Os mistérios sem fim da natureza, 
insondáveis sabemos, com certeza, 
só acontecem... Se Deus quiser assim!… 

José de Alencar (Ao Correr da Pena) Rio, 8 de janeiro de 1855: A Última Noite de 1854


Et une annèe entière a replié ses ailes
Dans l’ombre d’une seule nuit! 
 (Lamartine)

Ainda vos lembrais do ano passado? Ainda não esquecestes a última noite de 1854?

Era uma noite de luar, mas turva e carregada. O céu cobria-se de nuvens. A natureza estava calma e sossegada. As horas corriam silenciosamente.

Deu meia-noite. Um ano terminava, um ano começava. Mas nem um sinal, nem um vestígio atestava essa grande revolução do tempo que se acabava de consumar.

Tudo continuava tranqüilo. A noite seguia o seu curso ordinário, e a lua deslizava solitária por entre as nuvens cinzentas e carregadas que alastravam o céu.

Que importava, com efeito, que essa hora que soava marcasse o termo de um ano? Que importava que a fraca inteligência do homem procure limitar a obra de Deus?

O tempo corre eternamente; os dias se sucedem como os meses, como os anos e os lustros. Um século que acaba, uma idade que finda, um mundo que desaparece, é sempre a rápida transição de um segundo, é apenas um instante que passa.

Todos nós sabemos isso; todos nós vamos correr o tempo com indiferença; e entretanto o coração nos palpita com emoção quando ouvimos soar esta hora fatídica da meia-noite, que marca o fim e o começo de um ano.

É quase impossível reprimir nesse instante solene um movimento involuntário, que nos faz volver um olhar saudoso ao passado e procurar no fundo d’alma algum vago pressentimento, alguma promessa risonha, que nasce subitamente como o novo ano que começa.

Na vida de alguns homens esse rápido instante é o cântico de um belo poema. Recordações dos dias que passaram, saudades de uma quadra feliz, culto respeitoso a algumas reminiscências sagradas, aspirações de glória e de ambição, fé em Deus, esperança no futuro, todas estas grandes coisas lhes perpassam confusamente na fantasia, brilham rapidamente, e se extinguem como esses fogos brilhantes que sulcam as trevas nas noites calmas e serenas.

Para aqueles que ainda se deixam involuntariamente dominar pela poética e graciosa ficção do ano-bom, este dia é um oráculo cheio de presságios e de vaticínios. Quanto desejo querido, quanto voto ardente, não vem afagar no fundo desses corações aquela primeira aurora do ano! Neste dia pensa-se naquilo que mais se ama no mundo, janta-se no seio da família, visita-se os amigos e troca-se mutuamente as boas entradas de ano, os presentes de amizade, as étrennes.

E assim no meio de tudo isto, no meio desses cuidados e desses prazeres, dos receios e das esperanças novamente criadas, esquecemos a verdadeira e talvez única realidade deste dia. Um ano que passa – um outro ano que vem, e com ele a idade e a velhice..

Bem entendido, não falo aqui de certa gente, que desejaria que um ano fosse um minuto, e que passasse como uma hora de tédio, ou um dia de convalescença. Parece incrível, porém não é menos verdadeiro.

Logo em primeiro lugar temos o pretendente à senatoria, que se acha na idade crítica dos trinta e nove anos. Vem depois o órfão que espera os vinte para requerer suplemento de idade, e  empolgar a herança paterna. Finalmente a menina que desterra as malditas calças e o vestido curto, e entra no rol das moças em estado de casar; e o estudantinho de latim, que todos os dias procura no queixo as promessas de um buço rebelde, e que suspira pelo dia em que se emancipará do colégio e conquistará a santa liberdade da academia e o direito de fumar o seu charutinho.

É preciso não esquecer o sujeito que tem os seus cinqüenta e nove anos, e que deseja os sessenta para ver-se livre da guarda nacional e do recrutamento; nem também o empregado público que suspira pelo último ano para a jubilação, e o juiz de direito que está a completar o tempo de ser promovido à primeira entrância.

Para esses o novo ano é sempre alegre e feliz; é o ano da salvação. Mas para nós, que não estamos nesse caso, que nos prometerá este ano, que nasceu no meio da chuva como um sapo, tendo por madrinha a lua cheia ?

Será isto, mau agouro, como entendem as velhas, ou será ao contrário um presságio de abundância e fertilidade, que nos livrará da carestia dos gêneros e não nos deixará mais à mercê das usuras de alguns marchantes?

Creio antes esta última versão. Já não me fascinam essas promessas brilhantes que nunca se realizam. Embora turvo e carrancudo, o ano novo para mim se anuncia cheio de futuro e de propriedade para o meu país.

Ninguém sabe que encantadores mistérios, que risonhos segredos ocultas no teu seio. Ninguém sabe quanto primor, quanta graça, quanto mimo de beleza, tuas asas de ouro esparzirão sobre alguma cabecinha virgem que ainda brinca com os sonhos da infância!

Vêm, novo ano! Vem como o hábil artista do tempo dar os últimos toques a alguma bela estátua moldada pela natureza, e arredondar a curva graciosa, as ondulações suaves de umas formas encantadoras!

Vem, como o sopro de Deus, como o fogo do céu, desabrochar uma rosa ainda em bastão; perfumar a florzinha delicada que apenas começa a abrir os seios às auras da vida, e tecer de fios de ouro os dias de uma existência pura e tranqüila!

Vem igualmente dar um pouco de juízo a muita cabecinha louca que aí anda às voltas por este mundo, tirando o juízo a quem o tem! Vem fértil de maridos, de bailes, de teatros, de modas, de casamentos. Traze-nos da Europa algumas boas cantoras; e não te esqueças de substituir a anarquia que hoje reina no teatro por uma ópera digna de ti e da boa sociedade desta corte. Para isto já tens o projeto de uma nova companhia lírica no Teatro de S. Pedro Alcântara, o qual podes realizar perfeitamente.

Quando tiveres feito todas estas coisas, meu caro, tem paciência, toma a vassoura e a carrocinha, e trata de varrer e de limpar as ruas da cidade, no que farás um grande serviço. Estimarei que removas ao menos a lama de algumas ruas, porque então ser-me-á possível  especializar as outras, e defender-me assim da censura que me fizeram nesta folha e no Jornal do Comércio por ter falado geralmente; como se a culpa fosse minha, de não poder achar uma exceção à falta de asseio! 

Acho escusado dizer-te que dispensamos o calor de oitenta graus, as febres de qualquer cor que sejam, as guerras por mais interessantes que te pareçam. Quando muito, para quebrares a monotonia do tempo, ficas com o direito salvo de elevares a temperatura até o ponto de desejar-se o sorvete e os gelados; e de produzir algumas intermitentes, para que os médicos não esqueçam de todo a ciência. Em vez de guerras do Oriente, podes fazer aparecer alguns processos monstros, daqueles que passam a quarta geração, e que os advogados ingleses dão de dote às suas filhas.

Se quiseres este programa essencialmente conciliador podes contar comigo. Escrever-te-ei as mais pomposas efemérides de que haja notícia no mundo; e em dezembro far-te-ei um epitáfio, digo, um retrospecto, que ocupará as colunas do Correio Mercantil durante oito dias consecutivos.

E para começar vou já cuidando em traçar a história desta primeira semana que começa pelas étrennes e acaba pelas cantilenas dos Reis. A chuva, as tardes de trovoadas, o tempo enfarruscado, entristeceram quase todos estes dias.

Na sexta-feira, porém, uma bela noite de luz, fresca e agradável, parecia convidar as alegres procissões que lembram a antiga tradição dos três reis magos, vindos do Oriente guiados por uma estrela para adorar o Menino Jesus.

Hoje, como todos os antigos costumes, esta festa vai caindo em desuso. Já quase não se vêem nesta corte aquelas romarias folgazãs, aqueles grupos de pastorinhas, aquelas cantigas singelas que vinham quebrar o silêncio das horas mortas.

A noite de Reis atualmente é apenas a noite das ceias lautas, dos banquetes esplêndidos; de maneira que, a julgar da tradição pelas festas de agora, dir-se-ia que os reis magos eram três formidáveis comilões, que vieram do Oriente unicamente para tomarem um fartão de peixe, de ostras, de maionese e gelatinas.

Em todas as épocas o homem teve a balda de desfazer no presente e de encarecer o passado. “No nosso tempo era outra coisa” dizem os velhos desde o princípio do mundo. Entretanto, seja pelo que for, seja que aquilo que passou exerça sobre a nossa imaginação um prestígio poderoso, o que é verdade é que nossos pais sabiam divertir-se melhor do que nós.

Outrora todas as festas tinham o seu quê de original, o seu cunho particular que as distinguia uma da outra. O Natal era a festa do campo; tinha a sua missa do galo à meia-noite, as suas alegres noitadas ao relento, os seus presepes toscos, mas encantadores. Logo depois vinham os Reis com as suas cantigas, as suas romarias noturnas, as suas coletas para o jantar do dia seguinte. São João tinha as suas fogueiras, os seus horóscopos à meia-noite. Ao Espírito Santo armavam-se as barraquinhas, e faziam-se leilões de frutos e de aves.

Presentemente todas as festas se parecem. Um baile, uma ceia, e tudo feito. Desde o princípio ao fim do ano vai-se ao baile ou ao teatro. Isto ainda seria suportável, se procurassem conformar esta espécie de divertimento à estação que reinasse.

Agora, Poe exemplo, que entramos na força do verão, como não seriam agradáveis alguns bailes  campestres, onde se dançasse à fresca, entre as árvores, nalgum pavilhão elegante levantado no meio de jardins? As moças trajariam seus lisonjeiros vestidinhos brancos próprios da estação; os cavaleiros usariam de um  toilette de verão. Nada de rigorismos diplomáticos e de penteados  sobrecarregados de enormes jardineiras.

Há nesta corte uma Sociedade Campestre que se podia incumbir de realizar esta idéia; porém infelizmente parece que ela vai marchando rapidamente para sua completa extinção. De campestre só tem o título; no mais é uma sociedade como as outras, com a diferença que dá as suas partidas num pavilhão muito sujo, muito velho e de muito mau gosto.

Houve a lembrança o ano passado de reabilita-la, e para isso comprou-se um terreno para uma casa; distribuíram-se as ações pelos sócios, e recebeu-se a primeira prestação. Planejou-se, calculou-se, e por fim não se fez nada, na forma do costume. O terreno está a vender, e os sócios que esperem pelas calendas gregas para serem reembolsados do seu dinheiro.

Entretanto parece-me que a sociedade ainda tem muitos elementos que se podem aproveitar; e que, se alguém procurasse dar-lhe um salutar impulso, poderíamos vir a ter uma reunião bem agradável. Então a sociedade devia limitar as suas partidas campestres aos seis meses de verão, e deixar os outros seis meses para os bailes aristocráticos do Cassino e para os saraus brilhantes que costumam aparecer naquela quadra do ano.

Temos conversado tanto e sobre tantas coisas, que deixo ainda muita idéia bonita que aí fica com as outras no fundo do tinteiro, esperando a sua vez de se entenderem sobre o papel. Para as idéias é este um dia de baile; a pena faz-lhes o toilette, como uma criada grave; e, depois de bem vestidinhas e bem elegantes, largam-se pelo mundo a namorar, a torto e a direito, a fazer epigramas e a dizer graças, a bolir este e com aquele, até que um dia ninguém faz mais caso delas.

Antes, porém, de deixar-vos, minha gentil leitora, quero dar-vos as minhas étrennes, embora não vos lembrásseis de mandar-me as festas. O meu cadeau é uma notícia, que creio haveis de apreciar tanto quanto ela merece. Com o novo ano vai continuar (ou já continuou) a ser publicado um lindo jornal italiano e português, do hábil professor  Galleano Ravara. Já prevejo com que prazer acolhereis a fride, que, como uma boa mensageira, irá falar-vos a doce e rica linguagem do Tasso, do Dante  e de Petrarca, e recordar-vos aquelas palavras de Romeu e Julieta, quando ouviam cantar o rouxinol e a cotovia ao raiar da alvorada.

Por enquanto contentai-vos com estas doces recordações que vos avivarão saudades da Stoltz e das belas noites do nosso teatro italiano. Dizem, porém, que daqui a algum tempo tereis mais do que simples reminiscência: prometem-vos uma cena lírica, onde verdadeiros artistas executarão as obras-primas dos maestros antigos e modernos. Cumprir-se-ão tão belas promessas?

Como sabeis, formou-se nesta corte uma associação para montar no Teatro de S. Pedro de Alcântara uma companhia italiana de primeira força. Já foram publicadas nesta folha as bases da nova sociedade que intenta levar a efeito aquele projeto.

No estado em que se acha a nossa cena lírica, semelhante idéia é um grande benefício. A nova empresa vem promover uma salutar emulação entre os dois teatros, e destruir o monopólio que até agora tem existido, com grave prejuízo do público.

Além deste melhoramento, que resulta do simples fato da concordância, a organização de uma sociedade deste gênero pode trazer muitas vantagens importantes. Os bons espetáculos, o exemplo e a lição de artistas de mérito, hão de necessariamente desenvolver entre nós o verdadeiro estudo da música italiana, e aproveitar muito aos talentos nacionais que aparecerem.

Se a nova sociedade realizar as suas idéias, se, em vez de amostras líricas, nos der verdadeiras óperas, ainda continuará a admitir-se a absoluta necessidade de uma subvenção do governo? Ainda haverá empresa desinteressada que receba 120 contos de réis do tesouro para carregar com um déficit enorme?

Estes exemplos de filantropia desaparecerão infelizmente; porém o governo economizará por ano uma centena de contos, que poderá destinar à construção de um teatro nacional ou de uma pequena ópera, feita pelo modelo dos melhores teatros da Itália e da Alemanha.

A nova empresa tem de lutar com imensas dificuldades; mas se conseguir vence-las, o teatro de S. Pedro de Alcântara virá a ter as suas belas noites, e  reunirá no seu pequeno salão a fina flor da sociedade desta corte.

Que importa que estas noites custem mais caro?

Todos conhecerão que este aumento de preço é puramente nominal, uma noite em que, além de uma brilhante reunião se tem o prazer de ouvir a verdadeira música de Rossini, de Verdi e de Bellini, de Donizetti e de Meyerbeer, vale mais do que quatro ou cinco noites de ensaios no Provisório, onde algumas vezes se canta para os bancos e para os camarotes vazios.

Entretanto cumpre que a sociedade, desprezando os funestos precedentes do nosso teatro, guarde toda a lealdade nos seus empenhos com o público, e se esforce por manter aquela ordem e regularidade tão necessária à comodidade dos espectadores e aos próprios interesses da sociedade.

Assim, os espetáculos devem ter dias certos e determinados na semana, e começarem a horas precisas, nunca excedendo de meia-noite.

Seria muito útil que se estabelecesse também o costume de interromper os espetáculos durante os dois ou três meses da força do verão. Esta interrupção, cuja vantagem ainda não se compreendeu entre nós, facilita à empresa o estudo e preparo de novas óperas, e dá-lhe tempo de contratar novos artistas na Europa.

Realizando a nova sociedade estas condições, pode contar da nossa parte com um apoio fraco, mas leal. Ao contrário, se não corresponder às suas brilhantes promessas não se poderá livrar de uma grave censura; e os nomes que nela se acham empenhados terão de responder ao público e à imprensa pelos males que possam ocasionar ao nosso teatro.

Fonte:
José de Alencar. Ao Correr da Pena. SP: Martins Fontes, 2004.

Jornais e Revistas do Brasil (A Vida Fluminense: folha joco-séria-illustrada)


Período disponível: 1868 a 1874 
Local: Rio de Janeiro, RJ 
Continuação de: 
O Arlequim

Continuado por: 
O Figaro : folha illustrada

A revista ilustrada A Vida Fluminense foi lançada, na corte, no dia 4 de janeiro de 1868, em continuidade a O Arlequim, que, por sua vez, sucedera ao Bazar Volante (1863), criado pelo desenhista francês Joseph Mil. Editada por Augusto de Castro e Antônio de Almeida, este último padrasto do grande Ângelo Agostini, que também participaria da sociedade tão logo chegou de São Paulo, onde teve problemas com a justiça por criticar asperamente o clero e a aristocracia escravista, nos irreverentes O Diabo Coxo e Cabrião.

 A publicação, que durou sete anos (período relativamente longo para a época), buscaria um tom mais brando, como informava a apresentação ou editorial do primeiro número: “Para agradar a todos os paladares (…) será uma folha joco-séria, publicará retratos, biografias, caricaturas, figurinos de modas, músicas, romances nacionais e estrangeiros, artigos humorísticos, crônicas, revistas, etc.”. Sua linha editorial iria girar em torno da vida social da corte, de críticas políticas amenas ou de assuntos palpitantes como a Guerra do Paraguai. Transitava da política aos fatos cotidianos, com destaque, porém, para as ilustrações e narrativas bem-humoradas.

 Charges e outras formas de desenhos já circulavam em alguns periódicos do país desde, pelo menos, 1837, quando Manuel de Araújo Porto-Alegre publicou no Jornal do Commercio a primeira charge de que se tem conhecimento. Com Ângelo Agostini, A Vida Fluminense inovaria ao lançar “As Aventuras de Nhô Quim ou Impressões de uma Viagem à Corte”, “história em capítulos”, como a chamou o autor, que é considerada o primeiro quadrinhos brasileiro. Com narrativa e desenhos em sequência, não apresentava, no entanto, as falas dos personagens em balões, nem traços gráficos indicando movimento. Por sua importância o dia 30 de janeiro de 1869 – dia em que “As aventuras de Nhô Quim” (o primeiro personagem brasileiro de quadrinho) foram lançadas – tornou-se o Dia Nacional do Quadrinho.

 Além de Agostini, trabalharam na Vida Fluminense Cândido Aragonês de Faria e o também italiano Luigi Borgomainério, dois outros grandes artistas da época. No mesmo período circularam também importantes periódicos como o Ba-ta-clan, dirigido por Charles Berry e ilustrado por J. Mill e M. Michon, O Mosquito, de Cândido de Faria, e A Comédia Social, do pintor Pedro Américo. A Vida Fluminense foi editada em formato diferente dos seus similares, tanto no que se refere ao tamanho – 33 x 25 cm –, como no número de páginas, doze em vez das recorrentes oito páginas. Já no ano seguinte, porém, esse número não se sustentou e a publicação voltou às oito páginas usuais.

 Em 1875, último ano em que circulou, a revista fez significativa reformulação, passando, segundo Joaquim Marçal Ferreira de Andrade, em História da fotorreportagem no Brasil: a fotografia na imprensa do Rio de Janeiro de 1839 a 1900, “a apresentar uma nova logomarca – uma xilogravura de Salvioni, artista italiano de Turim – além de uma impressão chapada de fundo e uma série de cercaduras com motivos fitomorfos em algumas de suas páginas.” Prezando sua qualidade, incomodada com os concorrentes e sem falsa modéstia, a própria revista (leia-se Agostini) advertia: “Graças ao lápis de seus caricaturista, esta folha readquire o lugar que lhe compete, e honra a imprensa hebdomadária da capital. Como sempre, fugirá de ser pasquim de torpezas, e não viverá de cópias, tomadas com singular desembaraço às publicações estrangeiras, conforme praticam alguns jornais [leia-se, em especial, a rival Semana Illustrada, dos irmãos Henrique e Karl Fleiuss e de Karl Linde) desta corte.” (A Revista Fluminense, 2 jan. 1875, p.2)

 Embora haja lacunas na coleção, o acervo da Biblioteca Nacional abrange volumes referentes aos oito anos incompletos de circulação de A Vida Fluminense.

Fonte:
http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/vida-fluminense-folha-joco-séria-illustrada

Geraldo Majela Bernardino Silva (Funções da Mensagem Literária) Parte 2


LINGUAGEM CONOTATIVA

- A linguagem serve para exteriorizar sentimentos e idéias, é uma expressão carregada de afetividade.

- Na obra literária tem, além de sua significação e valor lingüísticos, um significado e valor acrescidos: o literário, para o qual as formas lingüísticas servem somente de veículo de objetivação, e só alcançam seu pleno significado na relação com o conjunto total da obra. Esta linguagem expressiva depende profundamente da emoção pessoal e das circunstâncias. Com isso as construções gramaticais se alteram ou experimentam uma troca acidental de significação.

- Polissemia = plurissignificação.

CONOTAÇÃO: - Possibilidade de um signo, dependendo do contexto, apresentar mais de um significado,  propiciar  várias  interpretações.  Implica  uma abertura, um leque de                                significados a partir de um mesmo significante.

FUNÇÕES DA LINGUAGEM

A linguagem é um veículo de comunicação empregado como um recurso mnemônico (de desenvolvimento da memória) para a representação de idéias, de suas relações e de seus significados. Algumas dessas idéias são representativas de objetos físicos: procuram designar e descrever coisas e objetos. Mas o “significado” é um atributo da mente humana e não dos objetos que eles representam. Existe, portanto, uma relação íntima entre percepção, significado, idéia, juízo e emoção.

Todos os atos conscientes de comunicação implicam em certos suportes básicos que consistem num determinado complexo simbólico físico que elicia (afasta) o significado. Portanto, a linguagem existe como simbolização física de idéias. Os atos de comunicação se realizam com o propósito de compartilhar idéias específicas e significados em emissor e receptor.

O significado existe pois:

a)- como uma associação de idéias, quer dizer, como uma função da mente humana.

b)- tem seu referente em objetos físicos ou eventos.

A linguagem é, portanto, expressão da vida e o mais autêntico produto do intelecto: verdades científicas são comprovadas, juízos e raciocínios são depurados e intelecutalizados mediante um grande esforço do pensamento.

Mas nem sempre os pensamentos são de ordem essencialmente intelectiva. São muitas vezes, impulsos acompanhados de emoções que conduzem os homens a ações ou que os refreiam. São expressões ou repressões de desejos, de volições, de impulsos vitais.

O psicólogo alemão Bühler distingue três funções básicas para as palavras: “representação”, “exteriorização” e “apelo”:

São as seguintes as principais funções atribuídas às relações entre linguagem e seus objetivos. 

FUNÇÃO CENTRAL:

1- FUNÇÃO DE COMUNICAÇÃO : DENOTATIVA - REFERENCIAL - COGNITIVA OU
                                                            INFORMATIVA.

A palavra como “representação”: Muitas vezes, o propósito do emissor é revelar o que “conhece” a respeito de um fato, de um assunto, de uma realidade. Segundo Bühler, as palavras serão utilizadas, nesse caso, como “representação”dos conhecimentos do emissor sobre aquela realidade.

É a utilização de um código para a transmissão de uma mensagem a fim de permitir aos homens seu inter-relacionamento. A linguagem é utilizada como instrumento de comunicação. Está centrada no conteúdo da mensagem.

Na obra literária, ela envia a um contexto, quer dizer, não no mundo percebido e imaginado pelos elementos da comunicação (emissor e receptor) mas, somente ao criado pelo discurso em si. Não é a realidade designada que interessa, mas seu modo de apresentação no discurso. Por analogia ao mundo real, conhecido, constrói-se o universo imaginário como ele é, assim, o leitor concorda com as colocações do autor (critério de verossimilhança). No dizer de Jean Dubois, a referência  não  é  feita  com  o  objeto  real,  mas  com  um  objeto  do  pensamento.

Imagine uma situação do cotidiano: você e alguns amigos resolvem passar o fim de semana em contato com a natureza. Decidem que o melhor programa seria um acampamento. Mas ainda têm dúvida quanto ao local a ser escolhido. Você resolve opinar (usando, é claro, a língua oral):

“Acho que acampar perto de um rio é uma boa. Lá a gente pode pescar e nadar. 

Nesta época, costuma dar muito peixe e a água fica limpinha.”

Você usou as palavras para representar o que sabe a respeito do local que sugeriu, revelando conhecer certas vantagens que favorecem o tipo de programa que escolheram.

Essa função da linguagem, que os lingüistas denominam “informativa” (ou referencial), está centrada no referente, ou seja, no conteúdo transmitido ou mensagem.

A função informativa se observa, não apenas em situações de comunicação em língua oral, mas também na língua escrita, principalmente em textos técnicos e jornalísticos.
Veja alguns exemplos:

“O sexo do filho é determinado pelo pai. Os espermatozóides pertencem a duas categorias: os Ginospermas, dotados de um cromossomo chamado X, que darão origem a uma menina, e os Androspermas, com um cromossomo denominado Y, e que darão origem a um menino. Mas apenas o acaso (conforme o que a ciência conseguiu demonstrar até hoje) é responsável pela fecundação do óvulo feminino por parte de um espermatozóide portador de um cromossomo X ou de um cromossomo Y.”            (BELOTTI, Elena Gianini - O Descondicionamento da Mulher - Rio, Vozes, 1975 -p.13). 

Outro exemplo de função informativa:

“Os números do desastre educacional brasileiro começam a ser revelados. Temos ainda 40% de analfabetos ou semianalfabetos, segundo cálculos otimistas. E a evasão dos alunos, no fim do curso primário, chega a 80%.”
(ISTO É, no 123, p. 47)

A função informativa pode ainda aparecer em textos literários, em prosa ou em verso:

“Aqui faz muito calor.
 No Nordeste faz calor também.”
(BANDEIRA,Manuel. “Brisa”)

Outro exemplo literário:

“Meu avô era um homem que sabia explicar tudo com clareza, sem ralhar e sem tirar a razão da gente.” (VEIGA, J.J. “Os Cavalinhos de Platiplanto”).

Observando certos recursos lingüísticos utilizados pelo emissor, podemos, como recebedores, determinar a função informativa na mensagem enunciada. Esses recursos são:

- na língua oral: o tom de neutralidade, de isenção emocional, na enunciação da mensagem;

- na língua escrita:  a pontuação;
                                 - a elaboração sintática visando à maior objetividade e precisão na maneira 
                                    de transmitir a informação.
Das considerações feitas e da observação dos exemplos, podemos concluir que:

a função da linguagem será INFORMATIVA, quando as palavras forem empregadas como representação de conhecimentos do emissor a respeito de um assunto, de uma pessoa, de uma realidade.

Continua...