terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Carlos Drummond de Andrade (Depois do jantar)


Também, que idéia a sua: andar a pé, margeando a Lagoa Rodrigo de Freitas, depois do jantar.

O vulto caminhava em sua direção, chegou bem perto, estacou à sua frente. Decerto ia pedir-lhe um auxílio.

— Não tenho trocado. Mas tenho cigarros. Quer um?

— Não fumo, respondeu o outro.

Então ele queria é saber as horas. Levantou o antebraço esquerdo, consultou o relógio:

— 9 e 17... 9 e 20, talvez. Andaram mexendo nele lá em casa.

— Não estou querendo saber quantas horas são. Prefiro o relógio.

— Como?

— Já disse. Vai passando o relógio.

— Mas ...

— Quer que eu mesmo tire? Pode machucar.

— Não. Eu tiro sozinho. Quer dizer... Estou meio sem jeito. Essa fivelinha enguiça quando menos se espera. Por favor, me ajude.

O outro ajudou, a pulseira não era mesmo fácil de desatar. Afinal, o relógio mudou de dono.

— Agora posso continuar?

— Continuar o quê?

— O passeio. Eu estava passeando, não viu?

— Vi, sim. Espera um pouco.

— Esperar o quê?

— Passa a carteira.

— Mas...

— Quer que eu também ajude a tirar? Você não faz nada sozinho, nessa idade?

— Não é isso. Eu pensava que o relógio fosse bastante. Não é um relógio qualquer, veja bem. Coisa fina. Ainda não acabei de pagar...

— E eu com isso? Então vou deixar o serviço pela metade?

— Bom, eu tiro a carteira. Mas vamos fazer um trato.

— Diga.

— Tou com dois mil cruzeiros. Lhe dou mil e fico com mil.

— Engraçadinho, hem? Desde quando o assaltante reparte com o assaltado o produto do assalto?

— Mas você não se identificou como assaltante. Como é que eu podia saber?

— É que eu não gosto de assustar. Sou contra isso de encostar o metal na testa do cara. Sou civilizado, manja?

— Por isso mesmo que é civilizado, você podia rachar comigo o dinheiro. Ele me faz falta, palavra de honra.

— Pera aí. Se você acha que é preciso mostrar revólver, eu mostro.

— Não precisa, não precisa.

— Essa de rachar o legume... Pensa um pouco, amizade. Você está querendo me assaltar, e diz isso com a maior cara-de-pau.

— Eu, assaltar?! Se o dinheiro é meu, então estou assaltando a mim mesmo.

— Calma. Não baralha mais as coisas. Sou eu o assaltante, não sou?

— Claro.

— Você, o assaltado. Certo?

— Confere.

— Então deixa de poesia e passa pra cá os dois mil. Se é que são só dois mil.

— Acha que eu minto? Olha aqui as quatro notas de quinhentos. Veja se tem mais dinheiro na carteira. Se achar uma nota de 10, de cinco cruzeiros, de um, tudo é seu. Quando eu confundi você com um, mendigo (desculpe, não reparei bem) e disse que não tinha trocado, é porque não tinha trocado mesmo.

— Tá bom, não se discute.

— Vamos, procure nos... nos escaninhos.

— Sei lá o que é isso. Também não gosto de mexer nos guardados dos outros. Você me passa a carteira, ela fica sendo minha, aí eu mexo nela à vontade.

— Deixe ao menos tirar os documentos?

— Deixo. Pode até ficar com a carteira. Eu não coleciono. Mas rachar com você, isso de jeito nenhum. É contra as regras.

—  Nem uma de quinhentos? Uma só.

—  Nada. O mais que eu posso fazer é dar dinheiro pro ônibus. Mas nem isso você precisa. Pela pinta se vê que mora perto.

—  Nem eu ia aceitar dinheiro de você.

— Orgulhoso, hem? Fique sabendo que tenho ajudado muita gente neste mundo. Bom, tudo legal. Até outra vez. Mas antes, uma lembrancinha.

Sacou da arma e deu-lhe um tiro no pé.

Fonte:
"Os dias lindos", Livraria José Olympio Editora — Rio de Janeiro, 1977.

Ciranda de Versos (O Poeta Não Morre) Parte I


O POETA
Luiza Porto

 O poeta não morre
 vira estrela, 
 no céu da boca
 de sua musa

 O POETA
Marcial Salaverry

 Se o poeta morre,
 sua alma permanece viva,
 através de sua poesia...

 O POETA
Célia jardim

 A vida do poeta
 não se perde com a morte
 vivendo de forma indireta
 com o que tem de mais forte

 O POETA
Ninha Jacques

 O poeta não morre,
 ele se torna encantado,
 com um verso apaixonado...

 O Poeta
Ilze Soares

 Nos versos de sua poesia
 o poeta será sempre lembrado
 com emoção e nostalgia.

 ELE NÃO MORREU
Sá de Freitas

 O poeta nunca morre
 Apenas se transferi para um cenário mais lindo,
 a fim de enriquecer mais a sua
 inspiração e tornar-se o poeta dos anjos.

 O POETA !
Fernando Reis Costa

 Do Poeta...vai o corpo!
 Fica a sua alma, a sua voz... 
 nos versos que escreveu
 p'ra todos nós !...

 DA PARTIDA DO POETA
Mário Osny Rosa

 Com a partida do poeta
 Sua poesia fica viva.
 Apesar da sua morte
 Disso ninguém duvida.

 PRINCIPIO DA POESIA
Schyrlei Pinheiro

 Poeta não morre,
 segue o principio dos reversos
 e revertem, nos versos,
 a vida sem fim

 DEUS CRIOU O POETA!
Bernardino Matos

 E Deus criou o poeta, o exímio trovador,
 da fragilidade humana, da arte, da perfeição,
 capaz de conviver e de sublimar a solidão, 
 pois ele é a legítima expressão do amor.

O POETA NÃO MORRE
Manuel Jorge Monteiro de Leite

 O poeta não morre, ele preregrina
 no silêncio da rumorosa imaginação.

 ANJOS - ESTRELAS
Socorrinha Castro

 Na Terra , foram anjos poetas 
 que cumpriram com amor sua missão ,
 agora , são anjos - estrelas brilhantes ,
 iluminando a imensidão .

FOI-SE O POETA
Maria Loussa

 Estancaram os versos,
 As palavras já não traduzem 
 seu pensamento,
 Em nosso peito a dor
 Trazida pela erosão do tempo.

Fonte:
http://www.avspe.eti.br/cirandas/poeta/indice.html

Contos Acumulativos (O macaco e o rabo (2))


Uma ocasião achavam-se na beira da estrada um macaco e uma cotia e vinha passando na mesma estrada um carro de bois cantando. O macaco disse para a cotia:

 — Tira o teu rabo da estrada, senão o carro passa e corta.

 Embebido nesta conversa, não reparou o macaco que ele é que corria o maior risco, e veio o carro e passou em riba do rabo dele e cortou. Estava um gato escondido dentro de uma moita, saltou no pedaço do rabo do macaco e correu. Correu também o macaco atrás, pedindo o seu pedaço de rabo. O gato disse:

 — Só te dou, se me deres leite.

 — Onde tiro leite? — disse o macaco.

 Respondeu o gato:

 — Pede à vaca.

 O macaco foi à vaca e disse:

 — Vaca, dá-me leite para dar ao gato, para o gato dar-me o meu rabo.

 — Não dou; só se me deres capim. — disse a vaca.

 — Donde tiro capim?

 — Pede à velha.

 — Velha, dá-me capim, para eu dar à vaca, para a vaca dar-me leite, o leite para o gato me dar o meu rabo.

 — Não dou; só se me deres uns sapatos.

 — Donde tiro sapatos?

 — Pede ao sapateiro.

 — Sapateiro, dá-me sapatos, para eu dar à velha, para a velha me dar capim, para eu dar à vaca, para a vaca me dar leite, para eu dar ao gato, para o gato me dar o meu rabo.

 — Não dou; só se me deres cerda.

 — Donde tiro cerda?

 — Pede ao porco.

 — Porco, dá-me cerda, para eu dar ao sapateiro, para me dar sapatos, para eu dar à velha, para me dar capim, para eu dar à vaca, para me dar leite, para eu dar ao gato, para me dar o meu rabo.

 — Não dou; só se me deres chuva.

 — Donde tiro chuva?

 — Pede às nuvens.

 — Nuvens, dai-me chuva, para o porco, para dar-me cerda para o sapateiro, para dar-me sapatos para dar à velha, para me dar capim para dar à vaca, para dar-me leite para dar ao gato, para dar meu rabo…

 — Não dou; só se me deres fogo.

 — Donde tiro fogo?

 — Pede às pedras.

 — Pedras, dai-me fogo, para as nuvens, para a chuva para o porco, para cerda para o sapateiro, para sapatos para a velha, para capim para a vaca, para leite para o gato, para me dar meu rabo.

 — Não dou; só se me deres rios.

 — Donde tiro rios?

 — Pede às fontes

 — Fontes, dai-me rios, os rios ser para as pedras, as pedras me dar fogo, o fogo ser para as nuvens, as nuvens me dar chuvas, as chuvas ser para o porco, o porco me dar cerda, a cerda ser para o sapateiro, o sapateiro fazer os sapatos, os sapatos ser para a velha, a velha me dar capim, o capim ser para a vaca, a vaca me dar o leite, o leite ser para o gato, o gato me dar meu rabo.

 Alcançou o macaco todos os seus pedidos. O gato bebeu o leite, entregou o rabo. O macaco não quis mais, porque o rabo estava podre.

Fonte:
Colhido por Sílvio Romero, em Pernambuco.
Jangada Brasil. Setembro 2010. Ano XII - nº 140. Edição Especial de Aniversário.

Adonias Filho (O Largo da Palma) 3. Um Avô Muito Velho


 Tema central: eutanásia. Abordagem lírica de um tema polêmico: amor extremado x sofrimento da amada. Morte Provocada

Foco narrativo

 Narração em terceira pessoa, centrada no personagem Negro Loio.

 O presente narrativo é o momento posterior a todos os fatos narrados:

O velho, quando aquilo aconteceu, trancou-se em si mesmo. (...) Sempre calado em seu canto... No quarto e no quintal, a tocar sua sanfona, como a esperar a morte e que todos o esquecessem.

 O narrador desenvolve dois núcleos narrativos:

 1- Núcleo Central: O Negro Loio e sua neta Pintinha.

 2- Núcleo secundário: A vida do negro Loio.

Espaços - Largo da Palma (visão animista = tratado como ser vivo); a casa do Gravatá e Mercado Modelo.

Linguagem

 Linguagem bem trabalhada, concisa, períodos curtos, incisivos. Tratamento lírico dado à narrativa e aos conflitos humanos abordados. Inversão como forma de enfatizar sentido do termo invertido "Companhias, se teve, foram duas: a sanfona e a saudade de Aparecida". Observe a junção do concreto (sanfona) com o abstrato (saudade de Aparecida).

RESUMO


O velho negro Loio sempre viveu em volta do Largo da Palma. Seu pai tinha uma venda no Mercado Modelo e tinha total confiança no filho. Tanto que ele não ligou quando Loio começou a ter um caso com uma prostituta chamada Aparecida. Ela era uma moça linda, que trabalhava como prostituta apenas aos sábados e nos demais dias tocava sanfona ou tirava a sorte de quem passava pela rua. Aliás, foi a sanfona que os ligou. Loio aprendera desde criança a tocar o instrumento.

Um certo dia, Loio pediu que Aparecida tirasse sua sorte. Ela, com o rosto sério de sempre, disse que ele “tinha uma morte em suas mãos”. Aparecida não conseguia viver sem os bares, a noite, as festas, e acabou voltando a se prostituir e se afastar de Loio. Até que um dia acharam seu corpo esfaqueado numa rua. Loio acabou se fechando em seu mundo, sempre a trabalhar na venda do pai e a tocar sanfona. Até que um dia seu pai morreu e deixou, junto com um dinheiro e um terreno, a venda como herança. Com o dinheiro ele comprou a loja ao lado da sua e conseguiu fazer com que a venda prosperasse, um dos únicos no Mercado Modelo a conseguir isso.

Algum tempo depois, Loio conheceu Verinha em um espetáculo de circo. Não demorou muito para que casassem e ele fosse morar com ela. Pouco tempo depois tiveram uma filha, Maria Eponina, e viveram todos juntos uns dez anos ali. Até que um dia Verinha acabou falecendo devido ao tifo. Algum tempo depois, sem que Loio nem reparasse, a mãe de Verinha faleceu e Maria Eponina já era uma moça e uma grande dona-de-casa.

Sem conseguir levar a venda sozinho, Loio contratou um ajudante. Chico Timóteo era um rapaz e tanto, que em pouco tempo já cuidava de tudo como se fosse sócio. Quando a mãe do moço faleceu, ele passou a comer na casa de Loio e, como era de se esperar, em pouco tempo já estava casado com Maria Eponina. Os dois tiveram uma filha, Pintinha, que se tornou o segundo amor do velho Loio. O outro era a sanfona.

Pintinha e Loio estavam sempre juntos a conversar e a tocar sanfona. Ele a levava e a buscava da escola. Mesmo quando Pintinha passou a ir com as amigas para a escola, quando ela voltava para a casa era com o avô que ficava. E quando o avô adoecia, ela era que cuidava dele. Loio fazia o mesmo se o contrário ocorresse. E assim Pintinha foi crescendo até que se tornou professora.

Sendo professora nova, colocaram-na para trabalhar em uma escola bem afastada. Pintinha nascera para a profissão e logo havia conquistado todos os alunos e professores, voltando para casa tarde da noite muitas vezes com presentes que ganhava deles. Porém, um dia ao invés de Pintinha veio um policial informando que a moça tinha sido violentada e espancada, por um milagre não morreu. Após duas cirurgias e algum tempo no hospital, Pintinha voltou para casa. Mas ela já não reconhecia ninguém e passava o dia sofrendo de dores.

Loio resolveu ir ter uma conversa franca com o médico, que lhe contou que Pintinha não tinha como se salvar. As cirurgias apenas prolongaram sua vida, mas ela estaria condenada a passar os dias sofrendo com dor até morrer. Então, ele resolve ir até a venda de um farmacêutico amigo seu no Mercado Modelo e lhe pede o veneno mais forte que tiver, dizendo que era para seu cachorro doente. Como ninguém ousaria duvidar de Loio, ele lhe entregou o veneno e lhe explicou como usar.

Chegando em casa, Loio foi deixado sozinho com a neta Pintinha, pois Maria Eponina iria sair. Sem hesitar, Loio mistura veneno com água em um copo e dá para neta beber. Ficou sentado na sala esperando a filha chegar e que viessem os gritos desesperados dela. Porém, Maria Eponina ao ver a filha morta apenas pediu que o pai trouxesse uma vela, sem nenhuma lágrima e quase sem voz.

Fontes:

Silogismo (Conceito)


O silogismo é um termo proveniente do grego antigo e significa “raciocínio”, é uma palavra muito utilizada no meio filosófico, principalmente nos estudos realizados por Aristóteles. Esse filósofo efetuou o conceito de argumentação lógica e perfeita baseada em três proposições relacionadas entre si.

A partir dessas três proposições é possível encontrar uma conclusão, sendo as duas primeiras consideradas “premissas”. A ideia de silogismo foi publicada por Aristóteles nos estudos “Analíticos anteriores”.

Todas as premissas encaminham o pensamento para a conclusão sempre havendo uma relação coerente entre as três, ou seja, uma relação de causa e consequência. Podemos dizer, que o silogismo é um argumento dedutivo constituído por três proposições que se apresentam de maneira encadeada:

Premissa maior (1ª)
Premissa menor (2ª)
Conclusão (3ª)

Temos o silogismo de aspecto formal e material. Lei a seguir um exemplo de silogismo:

“Todo homem é mortal.
Sócrates é homem.
Logo, Sócrates é mortal.”

Há silogismo sobre termos mais populares:

Exemplo 1:

“Toda gata mia.
 Ora, minha namorada é uma gata.
 Logo, minha namorada mia.”

Exemplo 2:

“Todas as baleias são mamíferos.
Alguns animais são baleias.
Logo, alguns animais são mamíferos.”

Existe o silogismo categórico irregular que é aquele abreviado ou ampliado, nesse quesito temos:

- Etima: Silogismo incompleto, onde uma premissa está subentendida.

Ex: “Eu penso, logo existo.”

- Epiquerema : Quando uma ou duas premissas são acompanhadas das suas provas.

Ex: “Todo o B é C porque é D
Todo o A é B porque é H
Logo, todo A é C”.

- Polissilogismo: Quando o argumento é constituído por dois ou mais silogismos, dispostos de modo a que a conclusão do primeiro seja uma premissa do segundo e assim sucessivamente.

Ex: “B é C
A é B
Logo, A é C
D não é C
Logo,D não é A.”

- Sorites: Quando o argumento que tem pelo menos quatro proposições com os seus termos encadeados de forma correta.

Ex: “O vertebrado tem sangue vermelho
O mamífero é vertebrado
O carnívoro é mamífero
O leão é carnívoro
Logo, O leão tem sangue vermelho.”

Além desses exemplos há o silogismo hipotético subdivido pelos grupos: condicionais, disjuntivos e dilema

- Condicionais: Neste a premissa maior não afirma nem nega de modo absoluto, mas a título condicional.

Ex: “Se chover não vamos ao futebol.
Chove”

- Disjuntivos: a premissa maior existente se apresenta sob a forma alternativa.

Ex: “Este triângulo ou é isósceles ou escaleno.
Ora este triângulo é escaleno
Logo, este triângulo não é isósceles.”

- Dilema: No dilema são apresentadas duas alternativas possíveis, mas nenhuma é desejável.

Ex: O aluno ou estudava ou não estava. Se estudava merece ser castigado porque não aprendeu a matéria como era seu dever; se não estudava merece igualmente ser castigado porque não cumpriu o seu dever.

Fonte:
http://www.infoescola.com/filosofia/silogismo/

Nilton Manoel (Silogismos)


Silogismo 1 

Deus ajuda quem cedo madruga 
Quem cedo madruga, dorme à tarde... 
Quem dorme à tarde, não dorme à noite... 
Quem não dorme à noite, sai na balada... 

Conclusão: Deus ajuda quem sai na balada!!! 

Silogismo 2 

Deus é amor. 
O amor é cego.. 
Steve Wonder é cego. 

Conclusão: Steve Wonder é Deus. 

Silogismo 3 

Disseram-me que eu sou ninguém. 
Ninguém é perfeito. 
Logo, eu sou perfeito. 
Mas só Deus é perfeito. 
Portanto, eu sou Deus. 

Conclusão:Se Steve Wonder é Deus, eu sou Steve Wonder!!! 
Meu Deus, eu sou cego!!! 

Silogismo 4 

Imagine um pedaço de queijo suíço, daqueles bem cheios de buracos. 
Quanto mais queijo, mais buracos. 
Cada buraco ocupa o lugar em que haveria queijo. 
Assim, quanto mais buracos, menos queijo. 
Quanto mais queijos mais buracos, e quanto mais buracos, menos queijo 

Conclusão: quanto mais queijo, menos queijo. 

Silogismo 5 

Toda regra tem exceção. 
Isto é uma regra. 
Logo, deveria ter exceção. 

Conclusão: nem toda regra tem exceção. 

Silogismo 6 

Existem biscoitos feitos de água e sal. 
O mar é feito de água e sal. 

Conclusão: o mar é um biscoitão. 

Silogismo 7 

Quando bebemos, ficamos bêbados. 
Quando estamos bêbados, dormimos. 
Quando dormimos, não cometemos pecados. 
Quando não cometemos pecados, vamos para o Céu. 

Conclusão: vamos beber para ir pro Céu! 

Silogismo 8 

Hoje em dia, os trabalhadores não têm tempo pra nada. 
Já os vagabundos..., têm todo o tempo do mundo. 
Tempo é dinheiro. 

Conclusão: os vagabundos tem mais dinheiro que os trabalhadores.

Fonte:
O Autor

Érico Veríssimo (trecho do livro Ana Terra )


Ana Terra, parte da obra O Tempo e o Vento, de Érico Veríssimo

(...) D. Henriqueta começou a servir o chimarrão ao marido e aos filhos. A cuia passou de mão em mão, a bomba andou de boca em boca. Mas ninguém falava. Maneco apagou a lamparina, e a luz alaranjada ali dentro da cabana de repente se fez cinzenta e como que mais fria. As sombras desapareceram do pano onde Ana tinha fito o olhar. Ela então ficou vendo apenas o que havia nos seus pensamentos. Seus irmãos tinham levado Pedro para bem longe: três cavalos e três cavaleiros andando na noite. Pedro não dizia nada, não fazia nenhum gesto, não procurava fugir, sabia que era seu destino ser morto e enterrado ao pé duma árvore. Ana imaginou Horácio e Antônio cavando uma sepultura, e o corpo de Pedro estendido no chão ao pé deles, coberto de sangue e sereno. Depois os dois vivos atiraram o morto na cova e o cobriram com terra. Bateram a terra e puseram uma pedra em cima. E Pedro lá ficou no chão frio, sem mortalha, sem cruz, sem oração, como um cachorro pesteado. Agora estava tudo perdido. 

Seus irmãos eram assassinos. Nunca mais poderia haver paz naquela casa. Nunca mais eles poderiam olhar direito uns para os outros. O segredo horroroso havia de roer para sempre a alma daquela gente. E a lembrança de Pedro ficaria ali no rancho, na estância e nos pensamentos de todos, como uma assombração. Ana pensou então em matar-se. Chegou a pegar o punhal que o índio lhe dera, mas compreendeu logo que não teria coragem de meter aquela lâmina no peito e muito menos na barriga, onde estava a criança. Imaginou a faca trespassando o corpo do filho e teve um estremecimento, levou ambas as mãos espalmadas ao ventre, como para o proteger. Sentiu de súbito uma inesperada, esquisita alegria ao pensar que dentro de suas entranhas havia um ser vivo, e que esse ser era seu filho e filho de Pedro, e que esse pequeno ente havia de um dia crescer... Mas uma nova sensação de desalento gelado a invadiu quando ela imaginou o filho vivendo naquele descampado, ouvindo o vento, tomando chimarrão com os outros num silêncio de pedra, a cara, as mãos, os pés encardidos de terra, a camisa cheirando a sangue de boi (ou sangue de gente?). O filho ia ser como o avô, como os tios. E um dia talvez se voltasse também contra ela. Porque era "filho das macegas", porque não tinha pai. Tremendo de frio Ana Terra puxou as cobertas até o queixo e fechou os olhos.

Fonte:
Revista Nova Escola: Contos

Marcelo Spalding (Figuras de Linguagem e A Escrita Criativa)


Publiquei um texto com 3 dicas para a escrita criativa. A repercussão foi grande, maior do que a média, e surgiram alguns pedidos para novos textos nesse sentido. Resolvi, então, disponibilizar o material de uma das aulas da minha Oficina de Escrita Criativa Online, sobre figuras de linguagem, algo fundamental para quem quer escrever um texto com literariedade (o que não se aplica apenas para escritores, pois de um texto jornalístico, publicitário ou acadêmico também se requer alguma literariedade).

Figuras de linguagem, como se sabe, são estratégias/recursos que o escritor pode aplicar no texto para conseguir um efeito determinado na interpretação do leitor. São formas de expressão mais localizadas em comparação às funções da linguagem, que são características globais do texto. Reconhecer figuras de linguagem, ainda que sem saber os seus nomes técnicos, ajuda a compreender a linguagem literária e o que torna um texto mais criativo.

A grosso modo, podemos dividir essas figuras em quatro grandes grupos, as de construção, de som, de palavra e de pensamento. A lista das figuras é inesgotável, mas compartilhamos alguns dos mais importantes com nosso leitor.

Figuras de construção:

Paralelismo sintático: encadeamento de funções sintáticas idênticas ou encadeamento de orações de valores sintáticos iguais. Exemplo: Funcionários cogitam nova greve e isolamento do governador. Observe que a construção "Funcionários cogitam nova greve e isolar o governador" está errada devido à falta de paralelismo.

Elipse: consiste na omissão de um termo facilmente identificável pelo contexto.

Exemplo: "Na sala, apenas quatro ou cinco convidados." (omissão de havia) 

Zeugma: consiste na elipse de um termo que já apareceu antes. Exemplo: "Ele prefere cinema; eu, teatro." (omissão de prefiro).

Anáfora: consiste na repetição de uma mesma palavra no início de versos ou frases. 

Exemplo: "Amor é um fogo que arde sem se ver; / É ferida que dói e não se sente; / É um contentamento descontente; / É dor que desatina sem doer". Este poema de Luís de Camões tem quase 500 anos e até hoje é considerado um dos melhores poemas de amor da história da literatura de língua portuguesa. Confira uma releitura feita por Renato Russo na famosa música Monte Castelo.

Monte Castelo
Renato Russo

Ainda que eu falasse a língua dos homens.
 E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.

É só o amor, é só o amor.
 Que conhece o que é verdade.
 O amor é bom, não quer o mal.
 Não sente inveja ou se envaidece.

O amor é o fogo que arde sem se ver.
 É ferida que dói e não se sente.
 É um contentamento descontente.
 É dor que desatina sem doer.

Ainda que eu falasse a língua dos homens.
 E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.

É um não querer mais que bem querer.
 É solitário andar por entre a gente.
 É um não contentar-se de contente.
 É cuidar que se ganha em se perder.

É um estar-se preso por vontade.
 É servir a quem vence, o vencedor;
 É um ter com quem nos mata a lealdade.
 Tão contrário a si é o mesmo amor.

Estou acordado e todos dormem todos dormem todos dormem.
 Agora vejo em parte. Mas então veremos face a face.

É só o amor, é só o amor.
 Que conhece o que é verdade.

Ainda que eu falasse a língua dos homens.
 E falasse a língua do anjos, sem amor eu nada seria.

Polissíndeto: consiste na repetição de conectivos ligando termos da oração ou elementos do período. 

Exemplo: "E sob as ondas ritmadas / e sob as nuvens e os ventos / e sob as pontes e sob o sarcasmo e sob a gosma e sob o vômito (...)"

Inversão: consiste na mudança da ordem natural dos termos na frase. 

Exemplo: "De tudo ficou um pouco. Do meu medo. Do teu asco."

Silepse: consiste na concordância não com o que vem expresso, mas com o que se subentende, com o que está implícito. A silepse pode ser: de gênero: Vossa Excelência está preocupado; de número: Os Lusíadas glorificou nossa literatura; de pessoa: O que me parece inexplicável é que os brasileiros persistamos em comer essa coisinha verde e mole que se derrete na boca.

Anacoluto: consiste em deixar um termo solto na frase. Normalmente, isso ocorre porque se inicia uma determinada construção sintática e depois se opta por outra. 

Exemplo: A vida, não sei realmente se ela vale alguma coisa. 

Pleonasmo: consiste numa redundância cuja finalidade é reforçar a mensagem. Exemplo: "E rir meu riso e derramar meu pranto." . Confira abaixo um divertido vídeo sobre o pleonasmo, aqui visto como um vício de linguagem, mas lembrando que ele pode ser um recurso usado intencionalmente.

http://www.youtube.com/watch?v=Qbm2w_T4laY&feature=player_embedded

Figuras de som:

Aliteração: consiste na repetição ordenada de mesmos sons consonantais.

Exemplo: "Esperando, parada, pregada na pedra do porto." 

Assonância: consiste na repetição ordenada de sons vocálicos idênticos.

Exemplo:
 "Sou um mulato nato no sentido lato
 mulato democrático do litoral." 

Paronomásia: consiste na aproximação de palavras de sons parecidos, mas de significados distintos. 

Exemplo: "Eu que passo, penso e peço." 

 Esta música de Chico Buarque consegue ter as três figuras de som na mesma letra, confira:

Atrás da Porta
Chico Buarque

Quando olhaste bem nos olhos meus
 E o teu olhar era de adeus
 Juro que não acreditei, eu te estranhei
 Me debrucei sobre teu corpo e duvidei
 E me arrastei e te arranhei
 E me agarrei nos teus cabelos
 No teu peito, teu pijama
 Nos teus pés ao pé da cama
 Sem carinho, sem coberta
 No tapete atrás da porta
 Reclamei baixinho
 Dei pra maldizer o nosso lar
 Pra sujar teu nome, te humilhar
 E me vingar a qualquer preço
 Te adorando pelo avesso
 Pra mostrar que ainda sou tua

Figuras de palavra:

Metáfora: empregar um termo com significado diferente do habitual, com base numa relação de similaridade entre o sentido próprio e o sentido figurado. A metáfora implica, pois, uma comparação em que o conectivo comparativo fica subentendido. 

Exemplo: "Meu pensamento é um rio subterrâneo." 

Metonímia: como a metáfora, uma palavra que usualmente significa uma coisa passa a ser usada com outro significado. A metonímia explora sempre alguma relação lógica entre os termos. 

Exemplo: Não tinha teto em que se abrigasse. (teto em lugar de casa)

Catacrese: ocorre quando, por falta de um termo específico para designar um conceito, torna-se outro por empréstimo. 

Exemplo: O pé da mesa estava quebrado.

Antonomásia ou perífrase: consiste em substituir um nome por uma expressão que o identifique:

 Exemplo: ...os quatro rapazes de Liverpool (em vez de os Beatles) 

Sinestesia: trata-se de mesclar, numa expressão, sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido. 

Exemplo: A luz crua da madrugada invadia meu quarto. 

Figuras de pensamento:

Antítese: consiste na aproximação de termos contrários, de palavras que se opõem pelo sentido. 

Exemplo: "Os jardins têm vida e morte." 

Ironia: é a figura que apresenta um termo em sentido oposto ao usual, obtendo-se, com isso, efeito crítico ou humorístico. 

Exemplo: "A excelente Dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças." 

Eufemismo: consiste em substituir uma expressão por outra menos brusca; em síntese, procura-se suavizar alguma afirmação desagradável. 

Exemplo: Ele enriqueceu por meios ilícitos. (em vez de ele roubou)

Hipérbole: trata-se de exagerar uma ideia com finalidade enfática. 

Exemplo: Estou morrendo de sede. (em vez de estou com muita sede). A música "Exagerado", do Cazuza, é quase um hino da hipérbole.

Exagerado
Cazuza

Amor da minha vida
Daqui até a eternidade
Nossos destinos foram traçados
Na maternidade

Paixão cruel, desenfreada
Te trago mil rosas roubadas
Pra desculpar minhas mentiras
Minhas mancadas

Exagerado
Jogado aos teus pés
Eu sou mesmo exagerado
Adoro um amor inventado

Eu nunca mais vou respirar
Se você não me notar
Eu posso até morrer de fome
Se você não me amar

Por você eu largo tudo
Vou mendigar, roubar, matar
Até nas coisas mais banais
Pra mim é tudo ou nunca mais

Exagerado
Jogado aos teus pés
Eu sou mesmo exagerado
Adoro um amor inventado

Que por você eu largo tudo
Carreira, dinheiro, canudo
Até nas coisas mais banais
Pra mim é tudo ou nunca mais

Prosopopéia ou personificação: consiste em atribuir a seres inanimados predicativos que são próprios de seres animados. 

Exemplo: O jardim olhava as crianças sem dizer nada.

Gradação ou clímax: é a apresentação de ideias em progressão ascendente (clímax) ou descendente (anticlímax). 

Exemplo: "Um coração chagado de desejos / Latejando, batendo, restrugindo."

Apóstrofe: consiste na interpelação enfática a alguém (ou alguma coisa personificada). 

Exemplo: "Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus!”

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