sexta-feira, 24 de abril de 2020

Sammis Reachers (O Tempero Colombiano)


Nos ribombares da pandemônica década de 60, meu pai, Mário Pedro da Silva, chegou ao estado do Rio, vindo da doce e estacionária vida em Arapongas, no interior do Paraná. Vinha em busca de glória e fama: sonhava ser ator. Ou cantar no rádio. Ou uma ponte que o levasse à Hollywood. Ou você pensou que a parte carnavalesca de meu nome, “Sammis Reachers Cristence” Silva, veio de uma inspiração superior? Talvez descendente de abnegados missionários ingleses, ou colonos alemães avermelhados pelo sol e pelo solo paranaense? Que tal de Herbert Richers, o falido e antes onipresente empresário da dublagem televisa (“Versão brasileira: Herbert Richers”, lembra?). Veio dos nomes nos créditos finais dos filmes que ele, meu velho jovem pai, amava, na pacatitude da já citada Arapongas, onde o cinema era tudo o que havia, a bacia das almas.

Bem, após alguns meses desavisadamente fustigantes na efervescência da capital, a inadequação de nosso herói mambembe encontrou refrigério inesperado quando ele foi convidado para ver “aquela cidade ali, do outro lado da baía”. Atravessando as águas turvazuis da Guanabara, o jovem paranaense teve uma iluminação ao conhecer a cidade onde eu vim a nascer (epa, spoiler!). A calmaria da Niterói ainda em sua meia idade lhe lembrava de alguma forma o Paraná pacatizado, pacativante, e a paixão assomou aos olhos do aspirante a James Dean.

Em pouco tempo Mario estava de mala e calça boca de sino alugando quarto de pensão em Icaraí, naquela época o bairro (que já era nobre) que reunia o melhor consórcio de aprazibilidade e centralidade.

Estabelecido,  meu pai logo conseguiu emprego na cidade sorriso e pôs-se a fazer amigos. Na própria pensão em que se instalara, havia os mais diferentes tipos.

A tal pensão tinha sua legislação, como é (epa, ao menos era) de praxe em tais repúblicas. Nada de mulheres; nada de cozinhar nos quartos; divisão de quartos? No máximo entre dois homens.

A dona da pensão era o coração pulsante do lugar, e ela mesma uma figura da mais relevante singularidade. Bogotana, filha da Bogotá de nossa vizinha Colômbia, ninguém nunca soube o que ela viera fazer naqueles idos por aqui. A suspeita que liderava as pesquisas era que a agora velha Consuelo, jovem ainda havia se apaixonado por algum cafajeste viajor, que a trouxera para as paragens brasileñas, e aqui a abandonara à própria e mala sorte.

Era ela, a querida de todos na pensão, que proporcionava o momento mágico da vida daqueles senhores, homens e rapazes que ali habitavam, durante o jantar (a pensão servia apenas café da manhã, simplório, e jantar. O almoço cada um tinha que filar ou comprar em outras paragens). A comida, sempre exuberantemente saborosa, mesmo nos dias de maior frugalidade, entorpecia os ânimos e estômagos de todos aqueles que, felizardos, a provassem. Uma cozinha primorosa, cercada como convém de segredos (era terminantemente proibido que enxeridos penetrassem na casa de dona Consuelo durante a elaboração dos pratos) e com doces toques de exotismo era ali praticada; uma cozinha que merecia até estar aberta ao público, e mais, a um público mais seleto do que àquela coletânea de solteiros que se refastelava nas panelas. Solteiros que, cientes da bênção que era sorver aquela cozinha encantadora, segredavam entre si o privilégio que era morar naquele lugar, se por mais nada, ao menos pela comida fulminante. Contrariados, evitavam estender-se em elogios, embora os mesmos fossem algo inevitáveis: temiam que a boa senhora abrisse um restaurante, caso em que certamente faria imediata fortuna, e de uma única e mesma facada lhes fosse surrupiada a estalagem e a boa comida...

Após o repasto, a alegria descia sobre os agregados; as conversas se expandiam. Tímidos passavam a palrar como canários; os já faladores eram então insuflados a animadores de auditório. As cantorias tomavam o ar de torneios, de “Festivais da Canção” onde duelavam-se sorridentes convivas. Havia algo de mágico naquele ambiente, e era sempre após o jantar que aquela magia socializadora ou destimidizadora parecia explodir.

Certa feita o silencioso Abelardo, aprendiz de oculista, e que normalmente mal despachava um “bom dia, boa noite” aos companheiros de pensão, pôs-se a rodopiar em dança, solitário, olhos cerrados, como que arrebatado; seu bailar, aplaudido pelos demais, estendeu-se portão afora da república – e lá foi o Abelardo, antes tímido que só ele, dançarolando pela calçada, ao som de algum acompanhamento musical que só ele ouvia (pois não havia música a tocar), para espanto dos poucos transeuntes daquele trecho.

E o Fernando, policial turrão e engomado, príncipe da empáfia e da arrogância militaresca, que, sempre que tocado pelos benfazejos vapores do jantar, punha-se a pedir perdão aos companheiros por seu comportamento usualmente arrogante. Certa feita receitou, de improviso, um belo poemeto em honra da amizade, declamação que o levou embaraçosamente aos soluços lacrimais.

Mas o efeito mais bizarro daquela felicidade pós-banquetal se dava sobre o Rui, pernambucano cabo da Marinha de Guerra, varonil mulherista e mui cioso de sua elevada posição (cabo, como disse) na hierarquia militar. O brincalhão e pretensamente galanteador marujo, negro de média estatura, peitoral proeminente, belos olhos de um castanho claro que ele alegava serem os terrores do mulheril, quando de barriga cheia e engolfado pelo clima descontraído que se sucedia àqueles jantares, ganhava um brilho diferente no olhar. Primeiro era seu riso, que se alongava; em seguida suas gesticulações passavam a ganhar mais vida, mais curvas; a marcialidade de seus movimentos cambiava para uma leveza quase... quase feminina. E assim, sorrindo largamente até as gargalhadas, traquejando com inesperada malemolência, o Rui, agora levantado de sua cadeira, passava então a apertar e massagear os ombros dos amigos, alisando os cabelos de um aqui, ajeitando a gola de outro ali... O que no princípio inevitavelmente descambou em algumas confusões, mas rapidamente aquela “transformação” foi absorvida pela geleia geral daquele festim diário de pós-expedientes.

O desenlace de nossa historieta teve seu início com o aperto e a correspondente esperteza de meu pai: conhecedor da proibição de cozinhar nos quartos, o jovem paranaense, talvez contaminado pela mítica malandragem carioca, resolveu transgredir a lei em nome da economia: conseguindo um pequeno fogareiro de um bocal, movido à prosaico querosene, passou a cozinhar pequenas porções de macarrão ou outras basicalidades dentro do quarto; para isso, todos os dias na hora do almoço voltava para a pensão a título de descansar justamente o “almoço” que alegara já ter consumido no centro de Niterói...

Em pouco tempo nosso herói, tão inábil na cozinha quanto um cego, passou a ressentir-se de ter que comer seu macarrão ou arroz ou o que fosse sempre maculado pela mais insossa sem-saboria. Já não sabia cozinhar; “mal” acostumado que ali fora a uma cozinha dos deuses, amargava cada colherada de sua própria comida como um condenado.

Um dia o estudante autodidata de inglês, que ainda sonhava em conhecer Hollywood, teve um insight: e se ele conseguisse dar uma espiada na dona Consuelo enquanto ela cozinhava? A velha era irredutível nesse ponto, mas ele poderia bolar algum tipo de burla para conferir como aquela maga temperava suas comidas. Não deveria ser tão difícil. Nosso mais novo malandro já não suportava a tortura de almoçar sola de sapato e jantar manjares e ambrosias...

Um belo dia meu pai saiu um pouco mais cedo do trabalho (nesta época já trabalhava como contínuo na Facit, no centro de Niterói) e dirigiu-se para a pensão. Ali, esgueirou-se pela parte detrás daquele conjunto de quartos, já com um tamborete nas mãos, para dar altura à pequena janela que fundeava a cozinha da velha, e lá se espichou ele para observar qual o segredo dos temperos da dona Consuelo. Observou por um tempo considerável enquanto a velha picava carne para um ensopadinho, cozinhava uma formidável panela de arroz e remexia um feijão que estranhamente não levava alho, mas ficava sempre delicioso. A atenção do malandrete estava concentrada no momento das temperanças, pois ali ele esperava descobrir ao menos algo que pudesse replicar, ainda que porcamente, a fim de mitigar o gosto já intragável de sua comida.

Pendurado e atento em seu tamborete, o jovem viu a idosa estrangeira sacar de dentro de um armário uma chusma de matos diversos. A velhinha pôs-se a picar bem finas algumas folhagens; meu pai estava atento: pôde reconhecer cebolinha, aipo e talvez cardamomo. Mas então a matrona bogotense ou bogotana apanhou um grande pote plástico e dele sacou uma outra erva. A velha espremeu algumas das estranhas folhas nos dedos, e pareceu sorver seu aroma por alguns instantes; depois pôs-se a arrancar pedaços daquelas folhas estreladas e jogar dentro de todas as panelas que tremelicavam no fogão.

O ex-matuto de roça e aprendiz de haute cuisine já havia visto aquela erva fina, mas não fora nas pequenas roças de fundo de quintal naquela terra roxa e fértil do Paraná, nem nas vendas e armazéns, quando sua madrasta lhe mandava ir até lá comprar este ou aquele item; quem lhe mostrara aquele tipo de tempero fora Fernando, o policial ferrabrás, que certa feita exibia numa revista de sua corporação imagens daquela exótica planta, tão em moda naqueles idos da década de 60. O desconcerto da informação, sub-reptícia e algo dura de equalizar, derrubou meu jovem pai estatelado no chão.

Enquanto caia de sua banqueta, num daqueles fenômenos de slow motion que gostam de acontecer nos momentos dramáticos de nossas vidas, o jovem cinéfilo paranaense revira em flashback toda aquela espalhafatosa alegria pós-pasto; a música, as piadas, o gracejos e traquejos e a felicidade quase mágicas que assomavam a todos os republicanos da pensão de dona Consuelo. O motivo estava agora claro, pensava o magricela enquanto pranchava suas costelas contra alguns pedregulhos do chão.

Sabe-se lá por que cargas d’água (e a que custo, meu Deus, a que custo!), dona Consuelo temperava todos os seus pratos com frescas folhas de maconha...
*     *     *     *     *     *

Deglutidos os embaraços, o jovem migrante paranaense não pensou uma segunda vez. Reuniu seus vinténs e avançou ainda mais mato adentro. Comprou uma caxanguinha em nossa São Gonçalo, longe dos exóticos temperos colombianos. Bem, nem tão longe assim, mas essa história todos conhecemos...
***************************************************************

Sammis Reachers (São Gonçalo - RJ) é poeta, escritor e editor, autor de sete livros de poesia e dois de contos. Professor de Geografia no tempo que lhe resta – ou vice-versa. Organizador de mais de 30 antologias, edita a Revista Amplitude (revista cristã de literatura e artes) e os blogs Poesia Evangélica (https://poesiaevanglica.blogspot.com/) e Mar Ocidental (https://marocidental.blogspot.com/). Pratica ainda poesia experimental no blog O Poema Sem Fim (https://opoemasemfim.blogspot.com/).

Fonte:
Texto e biografia enviados pelo autor.

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Varal de Trovas n. 248


Luiz Poeta (Transatividade Verbal)


- Você me ama, perguntei. - Amo - seu tolo!
... mas o seu verbo, que era tão... intransitivo...
ganhou ação e complemento... o seu consolo
passou a ser um pronome... reflexivo.

Revendo as regras,  expliquei que o verbo amar
é ideal, quando a  ação é transitiva,
e que o pronome essencial que a completar
tem que ser "te"... de forma  mais objetiva.

Ela me olhou - confesso, aquele olhar doeu -
e sussurrou: - Meu verbo é bem mais natural...
e o sujeito... meu amor... hoje sou "eu",
só sei, de cor, colocação... pronominal.

Se numa próclise, um romance se inicia,
uma mesóclise é a forma mais completa,
pois na conjugação a dois, amar-se-ia
na plenitude que a sintaxe  projeta.

Tornou-se enclítica nas suas exigências,
porém me disse, num tom bem coloquial:
"O seu pronome supre bem minhas carências...
mas cada verbo que conjugo é... passional.

Juro, optei pelos meus vícios...
de linguagem,
e no calor da nossa  Nova Ortografia,
os pleonasmos ganharam nova roupagem
e... hiperbolamos... nossas fisiologias.

Fonte:
Recanto das Letras

A. A. de Assis (Maringá Gota a Gota) O Jornal do Chico


No início de 1955, quando para aqui mudei, havia dois jornais em Maringá: “O Jornal”, de circulação diária, e o semanário “A Hora”. Um dia, cerca de três meses após minha chegada à cidade, peguei a monareta e fui conhecer a redação de “A Hora”, localizada numa casinha de madeira na Zona 2. Lá encontrei o Chico de Souza, mistura de gerente, vendedor de anúncios, editor e tudo o mais. Apresentei-me, disse que gostava de escrever e perguntei se ele aceitaria colaboração. “Aceito sim, disse ele, e se quiser comece agora”. Tomei um susto, claro. Chico explicou que precisava fechar a edição, mas faltava o editorial. O redator-chefe adoecera na véspera e ele estava ali sem saber o que fazer. Indaguei qual seria o assunto. “É contra o prefeito”, acrescentou, dando as razões da briga. O prefeito era o Villanova, a quem eu só conhecia de nome. Mas tudo bem: sentei-me diante de uma velha máquina Remington e em poucos instantes o artigo estava pronto. Ele leu, arregalou os olhos, chamou o tipógrafo: “Rapidinho, cara, componha este texto e ponha pra rodar”.

Só depois dessa agitada cena o Chico me convidou para tomar um cafezinho e iniciou o interrogatório: quem era eu, de onde vinha, se queria emprego no jornal e coisa e tal. Respondi que desejava apenas publicar uma crônica semanal, sem remuneração. Aceita a oferta, assim se fez. O problema foi o remorso que bateu dias após, quando vi de perto pela primeira vez o prefeito Inocente Villanova Júnior e com ele bati um papo rápido. O homem era uma simpatia, um herói lidando com os desafios de uma prefeitura sem dinheiro e com mil coisas a serem feitas a curtíssimo prazo. Nunca mais falei mal dele...

“A Hora” era um jornal valente, composto numa daquelas tipografias antigas, sem nenhum desses recursos eletrônicos que hoje fazem maravilhas. O outro informativo da cidade, bem mais moderno (tinha até linotipo e impressora rotativa), era o “O Jornal de Maringá”, do saudoso jornalista Ivens Lagoano Pacheco, ancestral do atual “Jornal do Povo”, do nosso veterano mestre Verdelírio Barbosa.

Chegava a ser surpreendente um lugar tão novinho já contar com dois jornais de boa qualidade. Mas foi ali que os primeiros jornalistas de Maringá começaram a influir decisivamente na construção da história do município. Os maringaenses mais antigos se lembram do poder de influência dos editoriais do Ivens, dos artigos de Dom Jaime Luiz Coelho, do Dr. Mário Urbinatti, do Dr. Hellenton Borba Cortes, do Dr. Altino Borba.

Além dos dois jornais, havia a Rádio Cultura, a emissora pioneira, que por vários anos foi a única porta-voz da geração que inaugurou esta jovem urbe. Depois vieram outros jornais, outras emissoras de rádio, a televisão... Legal lembrar tudo isso.

(Crônica publicada no “Jornal do Povo” – Maringá – 12-3-2020)

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

Silvia Araújo Motta (Cordel Coletivo: As Gigantes Lições do Coronavírus)


Mote do Poeta-Cordelista Marconi Araújo.
Presidente da Academia de Cordel da Paraíba.


“A lição do corona é tão gigante
que é marcante pra toda geração.”


Cordel Coletivo Virtual nº 7.133
Céu escuro! Pensei no tal CORONA:
na tristeza que traz ao mundo inteiro;
sem vacina, não vale ter dinheiro...
O comércio reclama em toda zona!
A Oração nos dá fé que vem à tona.
Vírus faz chorar, mundo tem razão:
invisível visita e tem ação...
Chuva cai na vidraça, tão constante.
“A lição do corona é tão gigante
que é marcante pra toda geração.”

****************************************

Cordel Coletivo Virtual nº 7.137

COVID  é rosa que tem flor e espinho;
na distância faz crer no puro amor,
pois VACINA contém a bela cor.
O perfume-SAÚDE vem mansinho,
trazer calma, esperança ao bom caminho.
Esta DOR vai passar, em mar aberto.
A ORAÇÃO tem PODER:_ Ditado certo!
De mãos postas, eu sigo firme e avante.
“A lição do corona é tão gigante
que é marcante pra toda geração.”

****************************************

Cordel Coletivo Virtual nº 7.139

Nós iremos vencer o CAOS da dor.
A prudência faz parte e quer cuidar 
da Família e do Outro; vamos dar 
nossa VOZ e ORAÇÕES; fazer favor.
O contágio vê MORTOS; traz pavor .
DEUS é nosso refúgio...Fé conduz;
em VERDADE semeia PAZ, guia a LUZ
para a VACINA a estrela SER brilhante. 
“A lição do corona é tão gigante
que é marcante pra toda geração.”

****************************************

Cordel Coletivo Virtual nº 7.140

Toda CRISE tem fim, quer queira ou não.
Aceitar a MUDANÇA faz seguir 
nova trilha! Quem sabe se o partir  
será BOM, pois dará maior noção:
Energia capaz de dar lição,
diferente da espera!... DEUS presente
recupera o momento em nossa mente.
Ser FELIZ traz a Paz e Amor garante.
“A lição do corona é tão gigante
que é marcante pra toda geração.”


continua…
****************************************
 
Sobre a Cordelista:
Cordel autobiográfico nº 7.135


Sou a Sílvia Professora
bem feliz, aposentada.
pela vida, apaixonada.
Violonista e escritora; 
eu também sou trovadora.
Chamam-me de sonetista.
Alguns julgam-me ensaísta.
Gosto muito de cantar;
de escrever e de dançar.
Aprendiz ...sou CORDELISTA.

Fonte:
– A Autora
Recanto das Letras

Irmãos Grimm (O Ladrão e seu Mestre)


Houve, uma vez, um homem chamado João, o qual desejava que o filho aprendesse um ofício, então foi à igreja e pediu ao bom Deus a graça que o filho encontrasse um ofício conveniente. Atrás do altar, porém, estava escondido o sacristão, que lhe sugeriu:

- Que aprenda o ofício de ladrão! O ofício de ladrão!

João virou nos calcanhares, foi para casa e disse ao filho que deveria aprender o ofício de ladrão, pois fora esse o conselho do bom Deus.

Partiram, então, os dois à procura de alguém que fosse perito nesse ofício. Andaram o dia inteiro, por fim chegaram a uma grande floresta, onde avistaram um casebre habitado por uma velhinha. João dirigiu-se a ela e perguntou:

- Não conheceis alguém que saiba ensinar o ofício de ladrão? Pois desejo que meu filho siga essa profissão.

- Oh, ele pode aprender muito bem aqui. Meu filho é mestre nessa arte. - respondeu a mulher.

E João perguntou ao filho da velha se realmente sabia a arte e podia ensinar ao seu com perfeição.

- Podes ficar descansado. - respondeu o filho da velha - Ensinarei tudo a teu filho. Volta daqui a um ano, se o reconheceres, não exigirei pagamento algum, mas se não o reconheceres, terás de pagar-me duzentas moedas.

João voltou para a casa e deixou o filho aprendendo a arte da feitiçaria e do banditismo. Transcorrido o ano marcado, o pai volveu ao casebre da floresta, mas ia profundamente aflito por não saber se reconheceria ou não o filho. Andando e choramingando, topou com um homenzinho, que lhe perguntou:

- Por quê te lastimas tanto e vais com essa cara tão triste?

- Ah! - disse João, - faz justamente um ano que deixei meu filho na casa de um ladrão para aprender o ofício. O mestre me disse para voltar daí a um ano e se fosse capaz de reconhecer meu filho ele não me cobraria nada, mas se não o reconhecesse teria de pagar-lhe duzentas moedas. Agora estou com receio de não reconhecê-lo e não sei onde poderei arranjar as duzentas moedas.

O homenzinho então lhe disse:

- Deves levar contigo um cesto de pão e sentar-te na pedra em baixo da lareira. Lá no alto, dependurada na trave, está uma gaiola com um passarinho espiando para fora. Esse passarinho é teu filho.

João seguiu o conselho do homenzinho. Levou um cesto de pão e postou-se diante da lareira. Daí a pouco saiu um passarinho da gaiola e veio bicar o pão olhando para ele.

- Olá, meu filho! Estás aqui?!

O filho ficou muito satisfeito ao ver o pai, mas o mestre resmungou:

- Foi certamente o diabo quem te sugeriu a maneira de reconhecer teu filho!

- Vamos embora daqui, meu pai. - Disse o rapaz.

Pai e filho, então, puseram-se a caminho de casa. Depois de andar bastante, viram passar uma carruagem e o filho disse:

- Vou-me transformar num belo galgo, meu pai, assim poderás arranjar dinheiro vendendo-me.

O senhor que ia na carruagem gritou para João:

- Olá, bom homem, queres vender-me o teu cachorro?

- Posso vender. - disse o pai.

- E quanto queres por ele?

- Quero trinta moedas.

- Trinta moedas! É muito dinheiro! Mas como é tão bonito pagarei o que me pedes.

Concluído o negócio, o senhor fez o cão subir para a carruagem, mas não haviam andado muito e o cão subitamente salta pela janela da carruagem e vai reunir-se ao pai. Já não era mais cachorro, voltara ao aspecto normal.

Prosseguiram juntos o caminho rumo de casa. No dia seguinte, havia feira na aldeia vizinha e o rapaz disse ao pai:

- Vou transformar-me num belo cavalo e tu poderás vender-me. Quando me venderes, tira-me antes o cabresto, ou não poderei voltar á forma humana.

João levou o cavalo à feira e eis que chega o mestre ladrão e compra o cavalo por cem moedas. Vendo tanto dinheiro, João ficou tão contente que esqueceu de tirar o cabresto. O mestre levou-o para casa e prendeu-o na estrebaria. Quando a criada ia passando perto da grade da estrebaria, o cavalo disse:

- Tira-me este cabresto! Tira-me este cabresto!

- Oh! Podes falar! - exclamou, espantada, a moça.

Foi até ele e tirou-lhe o cabresto. Imediatamente o cavalo transformou-se num pardal, que saiu voando. O mestre ladrão transforma-se, também, em pássaro e sai voando atrás dele. Alcançando pouco depois o pardal, desafia-o e batem-se, mas o mestre sai derrotado e se atira dentro da água, transformando-se cm peixe. Então o rapaz também se transforma em peixe, batem-se novamente e o mestre torna a perder. Então, ele se transforma numa galinha e o rapaz numa raposa que, com uma dentada matou a galinha, deixando-o morto para sempre. E morto continua até hoje.

Fonte:
Contos de Grimm.

quarta-feira, 22 de abril de 2020

Varal de Trovas n. 247


Aparecido Raimundo de Souza (Cada Louco com a sua Mania)


DIAS ATRÁS, MINHA FILHA Érica me ligou pedindo que eu fosse buscar minha neta Ellen, filha dela, no hospital onde estava dando plantão. Como uma doutora que a renderia não comparecera e ela precisava dobrar até as oito da manhã do dia seguinte, me solicitou que eu fosse urgente buscar a menina.

Ao chegar, me identifiquei dizendo à atendente quem eu procurava. Como já era esperado, ela chamou outra recepcionista a quem pediu que me acompanhasse até o segundo andar e me deixasse na enfermaria 234 da Ala A.

A caminho, fiquei sabendo que minha filha havia deixado ordens para que eu fosse levado até o pavimento onde ela cuidava de um paciente que acabara de vir a óbito. A jovem que me escoltou, muito simpática e atenciosa, se chamava Eva, e eu lhe disse que não havia necessidade de tanto incômodo, observando que conhecia aquele hospital melhor que os corredores de minha casa:

— É praxe. O senhor não pode subir sozinho…

Sorri e entramos no elevador. Quando chegamos à enfermaria onde Érica se encontrava, ela, sem tirar as luvas das mãos, a máscara do rosto e o estetoscópio do pescoço, veio até mim, me pediu a bênção e, como sempre, me enviou um beijo colocando o dedo indicador nos lábios.

Antes de dispensar Eva, minha filha sobrepôs uma proteção em mim e solicitou que ela, de regresso, passasse no primeiro andar e mandasse vir uma técnica em radiologia. Nesse meio-tempo, agradeci à beldade por ter me acompanhado e lhe enviei uma piscadela.

A especialista — igualmente novinha e também engraçadinha, parecia um anjo com o embuço branco — chegou, nos deu boa tarde e foi preparar o aparelho que se achava num canto do quarto. Nesse meio tempo, saímos para uma espécie de antessala dentro do próprio aposento, de onde continuamos a avistar a radiologista e o extinto, sem, no entanto, atrapalharmos o trabalho das tais chapas que seriam tiradas.

Tudo pronto e preparado. De repente, a jovem olhou para o homem que jazia sem vida na cama e disse-lhe, de um modo carinhoso, quase em sussurro, todavia num tom que conseguimos ouvir perfeitamente: “Não respire, por favor!”.

Segundos depois, terminado o procedimento com os raios X, voltou a olhar para o de cujus, do mesmo modo que antes e falou: “Ótimo! Bom menino! Desculpe o incômodo. Agora pode voltar a respirar”.

Surpresa com aquela cena, e após a radiologista ter batido em retirada, minha filha e eu nos aproximamos do cadáver:

— Papito, se esse sujeito respirar, juro ao senhor que imediatamente dou o fora daqui!

Em seguida, ela, rindo a não mais poder ao lembrar pelo ocorrido e eu, idem, subimos para a cantina no sexto andar onde minha neta nos esperava.

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

Luiz Otávio (Um Coração em Ternura…) 4


CADÊ?!

“Cadê o teu sorriso tão sadio?
E aquela gargalhada tão festiva,
Aonde está? Quem foi que t’a roubou?'

"Cadê aquela voz apaixonada,
que vivia cantando noite e dia?
Aonde está? Quem foi que t'a roubou?

"E aquele corpo esguio como um galgo,
de grande resistência e agilidade?"
Aonde está? Quem foi que t'o roubou?

— Eu tinha só vinte e um anos,
quando ela por mim passou...
... E levou tudo que eu tinha!
— Tudo a Doença me roubou!…
****************************************
 

CIÚMES...

"Bom dia!,.. Pode entrar Felicidade...
Faça de conta que este lar é seu...
Tem andado sumida, de verdade...
Enfim até que um dia apareceu..."

E ela envolvida numa claridade,
tão brilhante que até me entonteceu,
reparou tudo com curiosidade,
fitou-me muito... mas não se moveu...

Depois me perguntou com ar zangado:
"Quem é esta que vejo e vive agora,
constantemente assim sempre ao seu lado?!"

(Ela via a Saudade ao lado meu...)
E foi por isso só que foi se embora,
e para sempre desapareceu...
****************************************

NUVENS

("Dando sombra e consolo aos que padecem")
Olavo Bilac


Invejo muito — ó Nuvem — teu destino...
Pois a Vida tu vês de muita altura,
que o Mundo te parece pequenino
e nem sabes que existe a Desventura…

Pouco paras... e assim em desatino,
veloz te leva o Vento com loucura,
e em fuga tu constróis no Azul divino,
castelos de esquisita arquitetura...

Assim quero meus versos sem valia...
– Se alegres, que extasiem aos demais,
como nuvens brincando à luz do dia...

Se tristes, como nuvens que escurecem,
caiam do Céu, em chuva, nos trigais,
dando consolo e pão aos que padecem…
****************************************

TÉDIO

A tarde vai passando amarguradamente!
E tão longa ela está, tão escura e tão fria,
que congela também até a alma da gente,
tornando-a bem mais triste e lúgubre e vazia...

A tarde com certeza está também doente...
Pois eu lhe sinto bem toda a melancolia!
E as horas vão assim tão vagarosamente
que duas tardes sinto apenas num só dia...

Nestas tardes sem fim é que percebo então,
que sou bem semelhante a velho e escuro prédio,
abandonado ao mofo e eterna solidão...

– Nem mesmo o Amor "sequer me serve de remédio,
pois de Saudade e fel, encheu-me o coração,
tornando ainda maior este meu grande Tédio...
****************************************

VELA BRANCA AO CREPÚSCULO

No Horizonte cor de rosa,
num crepúsculo sem par,
como és triste, vela branca,
no verde-escuro do mar!...

Vais seguindo, tristemente,
lá longe... tão devagar...
— que não sei se estás mais perto,
do Céu azul ou do Mar...

Por que vais, ó vela branca,
neste lento deslizar ?!...
— Se a Saudade pesa tanto,
porque a foste carregar?!

Barco à vela, ao Sol poente...
Gaivotas longe a voar…
— Por que atrás de um quadro destes
veio o tédio se alojar?

Vem do Barco esta tristeza?!
Do Céu, da Tarde ou do Mar?…
— Vem de ti, oh! poeta triste…
Reflexos de teu olhar…

Fonte:
Luiz Otávio. Um coração em ternura…: poesias. RJ: Irmãos Pongetti, 1947.

Rubem Braga (O Crime (de Plágio) Perfeito)


Aconteceu em São Paulo, por volta de 1933, ou 4. Eu fazia crônicas diárias no Diário de São Paulo e além disso era encarregado de reportagens e serviços de redação; ainda tinha uns bicos por fora.

Fundou-se naquela ocasião um semanário humorístico, O Interventor, que depois haveria de se chamar O Governador. Seu dono era Laio Martins, excelente homem de cabelos brancos e sorriso claro, boêmio e muito amigo. Pediu-me colaboração; o que podia pagar era muito pouco, mas  eu não queria faltar ao amigo. Escrevi algumas crônicas assinadas. Depois comecei a falhar muito, e como Laio reclamasse, inventei um pretexto para não escrever. Seu jornal era excessivamente político (perrepista, se bem me lembro) e eu não queria tomar partido na política paulista, mesmo porque tinha muitos amigos antiperrepistas. Laio não se conformou: "Então ponha um pseudônimo!"

Prometi de pedra e cal, mas não cumpri. Laio reclamou novamente, me deu um prazo certo para lhe entregar a crônica. No dia marcado eu estava atarefadíssimo, e quando veio o contínuo buscar a crônica para O Interventor eu cocei a cabeça - tive uma ideia.  Acabara de ler uma crônica de Carlos Drummond de Andrade no Minas Gerais, órgão oficial de Minas, com um pseudônimo - algo assim como Antônio João, ou João Antônio, ou Manuel Antônio, não me lembro mais; ponhamos Antônio João. Botei papel na máquina, copiei a crônica rapidamente e lasquei o mesmo pseudônimo.

Dias depois recebi o dinheiro da colaboração, juntamente com o pedido urgente de outra crônica e um recado entusiasmado do Laio: a primeira estava esplêndida!

Daí para a frente encarreguei um menino da portaria, que estava aprendendo a escrever a máquina, de bater a crônica de Drummond para mim; eu apenas revia para  substituir  ou riscar alguma referência a qualquer coisa de Minas. Pregada a mentira e praticado o  crime, o remédio é perseverar nesse rumo hediondo; se às vezes senti remorso, eu o afogava em chope no bar alemão ao lado, e o pagava (o chope) com o próprio dinheiro do vale do Antônio João.

O remorso não era, na verdade, muito: Carlos não sabia de  nada, e o que eu fazia não  era  propriamente  um  plágio,  porque  nem  usava matéria assinada por ele, nem punha o meu nome em trabalho dele. E Laio Martins sorria feliz, comentando com meu colega de redação: "O Rubem não quer assinar, mas que importa? Seu estilo é inconfundível!"

O estilo era inconfundível e o chope era bem tirado; mas você pode ter a certeza, Carlos Drummond de Andrade, que muitas  vezes eu o bebi à sua saúde, ou melhor, à saúde do Antônio João, isto é, à nossa.

Dos 25 mil réis que Laio me pagava, eu dava 5 para o menino que batia à máquina; era muito dinheiro para um menino naquele tempo, e isso fazia o menino feliz. Enfim, lá em São Paulo, todos éramos felizes graças ao seu trabalho: Laio, o menino, os leitores e eu - e você em Minas não era infeliz.

Não creio que possa haver um crime mais perfeito.

Fonte:
Rubem Braga. A Traição das Elegantes. RJ: Sabiá,1967.

terça-feira, 21 de abril de 2020

Varal de Trovas n. 246


Paulo Mendes Campos (Segredo)


Há muitas coisas que a psicologia não nos explica. Suponhamos que você esteja em um 12.º andar, em companhia de amigos, e, debruçando-se à janela, distinga lá embaixo, inesperada naquele momento, a figura de seu pai, procurando atravessar a rua ou descansando em um banco diante do mar. Só isso. Por que, então, todo esse alvoroço que visita a sua alma de repente, essa animação provocada pela presença distante de uma pessoa da sua intimidade? Você chamará os amigos para mostrar-lhes o vulto de traços fisionômicos invisíveis:  "Aquele  ali  é papai". E os amigos também hão de sorrir, quase   enternecidos, participando um pouco de sua glória, pois é inexplicavelmente tocante ser amigo de alguém cujo pai se encontra longe, fora do alcance do seu chamado.

Outro exemplo: você ama e sofre por causa de uma pessoa e com ela se encontra todos os dias. Por que, então, quando esta pessoa aparece à distância, em hora desconhecida aos  seus encontros, em uma praça, em uma praia, voando na janela de um carro, por que essa ternura violenta dentro de você, e essa admirável compaixão?

Por que motivo reconhecer uma pessoa ao longe sempre nos induz a um movimento interior de doçura e piedade?

Às vezes, trata-se de um simples conhecido. Você o reconhece de longe em um circo, um teatro, um campo de futebol, e é impossível não infantilizar-se diante da visão.

Até para com os nossos inimigos, para com as pessoas que nos são antipáticas, a distância, em relação ao desafeto, atua sempre em sentido inverso. Ver um inimigo ao longe é perdoá-lo bastante.

Mais um caso: dois amigos íntimos se veem inesperadamente de duas janelas. Um deles está, digamos, no consultório do dentista, o outro visita o escritório de um advogado no centro da cidade. Cinco horas da tarde; lá embaixo, o tráfego estridula; ambos olham  distraídos e cansados quando se descobrem mutuamente. Mesmo que ambos, uma hora antes, estivessem juntos, naquele encontro súbito e de longe é como se não se vissem há muito tempo; com todas as  graças  da  alma  despertas, eles começam a acenar-se, a dar gritos, a perguntar por gestos o que o outro faz do outro lado. Como se tudo isso fosse um mistério.

E é um mistério.

Fonte:
Paulo Mendes Campos. O Cego de Ipanema. RJ: Ed. do  Autor, 1961.

André Kondo (A Caligrafia)


Num mar negro. Nigérrimo. As ondas quebram violentamente em alguns momentos, para acalmarem-se pacientemente em outros. Tempo. No alvo plano, uma montanha negra se eleva em questão de segundos. Tempo. A geografia nasce em singelas pinceladas, vida e morte, na ponta de um pincel. Eternidade.

Nampo contemplou o mar. Seguia um ritual meticuloso antes de iniciar uma peça de shodo*. No caminho da caligrafia não deveria haver qualquer traço negativo. Para isso, era necessário apagar qualquer sinal que pudesse macular a pureza de espírito. Era necessário que a alma deslizasse no papel como em uma caminhada com destino certo, sem desvios e imprevistos que poderiam levar a um sentimento indesejável.

As peças caligráficas de Nampo poderiam trilhar o caminho da perfeição, repousando nas paredes dos mais santificados templos e dos mais suntuosos palácios de seu tempo. Certamente, sobreviveriam, mesmo quando os tempos se tornassem outros. Para um grande mestre da arte do shodo, escrever uma peça perfeita era como traçar a própria eternidade. No sumi* negro pincelado no alvo papel, na coreografia perfeita nascia a dança dos significados. Os traços ganhavam contornos de vida.

Uma peça caligráfica é escrita para uma determinada estação do ano, sendo substituída como as folhas que caem no outono, a neve que derrete na primavera, as flores de cerejeira sopradas ao vento, os frutos colhidos, as aves que migram, as vidas que passam. Uma sazonal eternidade.

Na fugacidade desses momentos que, à primeira vista, parecem tão efêmeros, existe um traço da eternidade. Estações passam, porém, sempre retornam, em um ciclo que se repete ao longo dos milênios.

É este equilíbrio, entre o traço aparentemente efêmero do mestre de shodo e a eternidade do significado das palavras traçadas, que caracteriza uma obra-prima da arte de escrever o que não se expressa com palavras.

Às costas de Nampo, encontrava-se uma dessas peças perfeitas. Aliás, não "uma dessas", mas "a peça perfeita". Desde que a arte da caligrafia surgira, há três mil anos, nunca houve e, provavelmente, nunca haverá uma peça que se iguale àquela exposta no relicário de Nampo.

Quando aquela peça foi traçada, o mundo parou por um segundo. E, nesse único segundo, a eternidade do satori* foi alcançada. A caligrafia iluminou-se como um Buda e criou um universo, além das esferas deste mundo. Porém, para Nampo, aquelas linhas traçadas naquele papel só atestavam uma coisa: a verdade.

Em sua juventude, Nampo havia se deparado com a austeridade de uma vida que deveria alcançar a perfeição. Seu pai era o mais poderoso senhor feudal de sua época. Desejando preparar o filho para ocupar o seu lugar no poder, instruiu-o com os melhores mestres. O pai de Nampo havia conquistado o Japão com a espada, cuja arte considerava superior a todas as outras. Era na arte da espada que o pai queria que o filho se especializasse.

Se havia aulas de cerimônia do chá, era para aguçar-lhe o sentido do sabor da perfeição. Se havia aulas de música, era para afiar-lhe o ouvido para a sublime canção da vitória. Se havia aulas de sumiê*, era para aguçar-lhe os reflexos em combate. Se havia aulas de caligrafia... era para que ele pudesse escrever o seu nome na História.

Dentre todas as artes, Nampo apaixonou-se pela caligrafia. Em nenhuma outra sentia-se tão pleno quanto na arte do shodo. Porém, havia um fato que talvez o tenha levado a escolher a arte do shodo em detrimento de todas as outras: Yumi.

Yumi, sua professora de caligrafia, era uma jovem promissora, cujo talento surpreendeu até o pai de Nampo, acostumado apenas a conviver com os maiores mestres em suas respectivas artes. Havia, no traço de Yumi, uma vivacidade rara. Geralmente, os grandes mestres de shodo eram já anciãos, que passaram a vida inteira aperfeiçoando-se nesta arte de traçar sentimentos. Por isso, a jovial genialidade de Yumi tornava-se ainda mais impressionante. Tão impressionante que atraiu o amor, não apenas de Nampo, mas também de seu pai,

— Cada peça de shodo é única. Veja, podemos traçar a mesma frase, a mesma palavra, os mesmos caracteres... Porém, observe o traçado de cada uma das peças. Nenhuma peça é igual a outra. “Vê?" — Yumi explicava.

— Um dia, Yumi, traçarei uma peça de shodo exatamente igual a uma das suas.

— Acabei de explicar que peça alguma pode ser igual a outra — Yumi sorriu.

— Yumi, em todas as artes, compreendi que tudo depende do fluxo do coração. É ele quem controla a intensidade de nossos movimentos, da nossa respiração. Um dia, quero ser capaz de sentir o que você sente. Tomar-me um com você. Pois é isto o que eu mais desejo. Unir minha alma à sua— disse Nampo.

Yumi ruborizou. Sua mão perdeu a firmeza. Não conseguiria traçar o mais simples kanji naquele dia. Não sabia se sorria ou se repreendia o aprendiz, que apesar de ser filho do senhor feudal, ainda era apenas um jovem. Ainda mais jovem do que ela própria.

Nampo se esforçava para penetrar no coração de Yumi. Tal esforço apenas provocava cada vez mais o afastamento da jovem mestra de shodo. Até que, não suportando mais fugir de um sentimento que perigosamente crescia não apenas dentro de Nampo, mas dentro de si também, decidiu solicitar o seu afastamento ao seu senhor,

— Yumi, concordo em afastá-la como tutora de meu filho.

— Muito obrigada! Agradeço a compreensão e generosidade...

— Pois será, em breve, minha esposa!

Surpreendida, Yumi sabia que aquela não era uma proposta que pudesse declinar. Era uma sentença. Perpétua.

Em uma época em que o senhor feudal era senhor não apenas das terras, mas dos homens que nela viviam, em que homens se sacrificavam em seppuku com um simples gesto de seu senhor, não restou outra alternativa, senão a submissão de Yumi. E de Nampo.

Na noite anterior à união de seu pai e Yumi, Nampo a procurou. A Lua brilhava tão intensa que seria uma pena deixar de imortalizá-la em um haicai. Porém, a poesia daquela noite era outra, traçada em negras curvas. O negro da noite e não a claridade da Lua seria o mestre daquele momento.

Nampo sentia o espírito arder. Também assim queimava a alma de Yumi. Quando duas paixões tão intensas se encontram, mundos colidem e sociedades desmoronam em chamas.

A respiração, O coração disparado. As curvas se definindo. Lentamente. Cada caminho levando a um único destino: o nascer de uma peça de shodo.

— Nampo, eis a minha alma, que entrego a você...

Nampo nada disse. Quando alguém lhe entrega a alma, não há palavras. O papel estendido. As mãos quase se tocaram. Quase. No encontro das almas, o corpo nunca está presente.

A despedida.

Nampo abandonou as terras de seu pai. Vagou pelo Japão em busca de alguma paz. Acompanhava-o em sua jornada a alma de sua amada. Porém, como viver apenas com a alma, quando seu corpo também clamava por companhia? Refugiou-se em uma cabana abandonada, em um promontório distante. Nunca mais saiu dali.

No relicário, a alma-viva de sua amada: a peça de shodo de Yumi. A peça que, pacientemente, entre um shodo e outro sobre sentimentos vãos, tentava imitar. Dia após dia, no momento em que mais sentia saudade, Nampo tentava seguir os caminhos trilhados por Yumi naquela peça caligráfica. Às vezes, quase conseguia. Porém, seus destinos haviam se separado para sempre. Destarte, nunca lograva seguir os caminhos de Yumi.

Saía ao mar em um pequeno barco, comprado às custas de sua arte caligráfica. Pescava. Em canteiros que cercavam sua cabana, plantava legumes e hortaliças. Essa rotina aparentemente pequena escondia a grandiosidade da vida. O traçado dos deuses sobre a terra criava os peixes no mar, os frutos na terra. Porém, quem apenas visse peixes e frutos perderia a verdadeira essência dos traços da vida: o mar e a terra.

A cada dois meses, um emissário de uma loja do vilarejo viajava dois dias para chegar à cabana. Levava as peças caligráficas de Nampo e em troca deixava algum item essencial para o corpo do artista e outros essenciais á sua alma. Um dos itens mais importantes que ele trazia era um pequeno bloco de sumi negro, que Nampo diluía em água para traçar suas peças de shodo. Este momento para ele era sagrado. O diluir do sumi era o diluir de sua alma, que se esvaía na ponta do pincel, imortalizando-o no papel.

Por anos, essa rotina se repetiu... Anos...

Nampo, já velho, observou o emissário retornar. Ao longo do tempo, os emissários mudavam, porém, o que não mudava era o sumi, de qualidade incomparável, que Nampo recebia com incompreensível prazer. Daquela vez, o emissário demorou--se mais do que de costume. E não trouxe o sumi. Não trouxe nada além de uma carta:

Nampo, peço perdão por esta vida... 

Tudo o que pude lhe dar foi uma peça de shodo, quando o que desejava era poder dar a você o que nela estava escrito. Por anos, imaginei que seria capaz de ser forte e cumprir o meu desejo. Porém, como deve ter percebido, nunca tive essa coragem.

Nampo, devo pedir perdão por algo mais terrível ainda...

Por todos esses anos, eu o tive ao meu lado... Senti cada dia de sua vida, a cada peça de shodo que você traçava. Pois saiba que adquiri cada peça sua, cada suspiro, cada toque... E, para aumentar ainda mais a minha culpa, ousei estar ao seu lado também...

Perdão, Nampo... Por esta atitude egoísta. Cada vez que recebia uma peça de shodo sua, empenhava-me em seguir os mesmos traços. Após terminar a minha peça, espelha da sua, queimava-a junto com a madeira, para que se tomasse a fuligem que usava para fabricar os seus blocos de sumi. Empenhei-me em fazer com que o dono da loja aceitasse enviar a você apenas o sumi que eu fabricasse. Fato que ele não questionou, pois eu era uma boa cliente, comprando todos os trabalhos de shodo que você vendia por intermédio dele. Foi um arranjo fácil. O difícil foi suportar a minha mesquinharia.

Como pude viver assim todos estes anos? Como pude desfrutar de sua companhia e ainda impor a minha a você? Desconheço algo mais vil nesta vida. Por isso tudo, peço perdão.

Nampo, perdão pelos meus erros... Muito obrigado, por estar ao meu lado nestes longos anos. Nampo, perdão por partir assim, mais uma vez, e desta vez, creio, para sempre...

Se está recebendo esta carta é porque, assim como o sumi que com carinho fabriquei para você, eu também me tomei pó, para servir de sumi ao pincel dos deuses...

Yumi


Nampo olhou para o mar, olhou para a caligrafia de Yumi, pendurada em seu relicário. Ali estava escrito, com todas as curvas da vida, a palavra: amor. Nampo ansiava retribuir o presente recebido, há tanto tempo. Finalmente, o seu coração estava preparado.

Abandonando o sumi, os pincéis e o papel, abandonando sua cabana, Nampo caminhou pela praia deserta. Lembrou-se, claramente, do último momento em que vira o rosto de Yumi. Ajoelhou-se.

Com a ponta do dedo, que nunca a havia tocado, Nampo passou a traçar a areia. Finalmente conseguiu o que tanto desejava: uma caligrafia exatamente igual a de Yumi.

O que está escrito no coração é a peça de caligrafia mais sublime, a verdadeira alma da escrita da vida, pois é traçada pelo equilíbrio entre a fugacidade de um único momento... e toda a eternidade de um sentimento.

_______________________________________
NOTAS:
* Shodo ("Caminho da escritura") é a caligrafia japonesa. É considerada uma arte e uma disciplina muito difícil de perfeccionar e é ensinada como uma matéria a mais às crianças japonesas durante a sua educação primária. Provém da caligrafia chinesa e é praticado no estilo antigo, com um pincel, um tinteiro onde se prepara a tinta nanquim, pisa-papel (peso de papel) e uma folha de papel de arroz. Atualmente também é possível usar um fudepen, pincel portátil com depósito de tinta.

O shodō pratica a escritura dos caracteres japoneses hiragana e katakana, assim como os caracteres kanji, os caracteres chineses. Atualmente existem calígrafos que são contratados para a elaboração de documentos importantes. Além de exigir alta precisão e graça pelo calígrafo, cada caractere dos kanji devem ser escritos segundo uma ordem de traços específica, o que aumenta a disciplina necessária daqueles que praticam esta arte. (wikipedia)
- - - - - -

* Sumi é uma tinta de origem chinesa, tradicionalmente usada no Japão. Descoberta a sua fabricação pelos chineses como sendo uma espécie de "nanquim mais barato", e que com o comércio chegou ao Japão, onde virou uma febre, e os japoneses que aprimoraram a técnica, transformando a tinta frágil contra umidade em outra com quase a mesma composição só que com mais durabilidade, a mesma durou pouco no comércio chinês pelo fato descrito anteriormente sobre a sua durabilidade, voltando lá, a ser usado o nanquim. Enquanto o nanquim é uma tinta com origem natural, vinda de polvos e lulas que o usam como modo de defesa, a tinta sumi é a mistura de fuligem, agua e condimentos usados na sua preservação e validade como podemos dizer. A arte da utilização da tinta sumi se chama sumiê, uma arte muito antiga no Japão provavelmente sendo adquirida no século XV d.c, quando a tinta chegou ao Japão, e como era de uma fabricação muito mais barata, virou uma febre no mesmo, pois o Japão na época não era tão desenvolvido quanto a China, então deste modo, o Japão nesta area não precisou mais do comércio com a China. (wikipedia)
- - - - - –

* Sumiêarte da utilização da tinta sumi. Suiboku-ga ou Shuimohua (chinês tradicional) é uma técnica de pintura oriental que surgiu na China no século II da era cristã. Da China o sumiê foi levado ao Japão onde tornou-se mais difundido. A palavra tem raiz japonesa e significa pintura com tinta. Seu conceito não tem ligação com a pintura praticada no ocidente. Primeiro porque a arte do sumiê é uma mistura de desenho com elementos de caligrafia, que também é uma arte para os orientais. Segundo, porque o artista deve passar sua mensagem de modo resumido e sem equívocos. Daí dizer-se que é a arte do essencial. Talvez para atingir essa simplicidade que o sumiê é basicamente monocromático.

Assim como o desenho, o material usado pelo artista é bem limitado: pincéis, uma tinta especial parecida com o nanquim e papel artesanal à base de arroz. O aluno começa o aprendizado com os desenhos mais simples, quase sempre bambus. O modo de segurar o pincel e o gesto de colocar a tinta no papel deve conter um delicado equilíbrio entre a pressão da pincelada, e a maior ou menor quantidade de tinta.

Trata-se de uma arte que exige, após muito treino, grande habilidade e concentração. É por isso que poucos atingem o estágio de mestre. A representação do tema importa menos do que a composição do trabalho. Na composição, que segue regras bastante rígidas, o artista revela sua alma, a elegância do traço e principalmente a harmonia que deve existir no seu interior.

No Brasil, provavelmente o introdutor da arte do sumiê foi Massao Okinaka. Por muitos anos manteve classes de alunos interessados em aprender essa técnica tão antiga, mas absolutamente nova para os ocidentais. (wikipedia)

- - - - - –

* Satori é um termo japonês budista para iluminação. A palavra significa literalmente "compreensão". É algumas vezes livremente tratada como sinônimo de Kensho, mas Kensho refere-se à primeira percepção da Natureza Búdica ou Verdadeira Natureza, algumas vezes conhecida como "acordar". Diferentemente do kensho, que não é um estado permanente de iluminação mas uma visão clara da natureza última da existência, o satori refere-se a um estado de iluminação mais profundo e duradouro. É costume portanto utilizar-se a palavra satori, ao invés de kensho, quando referindo-se aos estados de iluminação do Buda e dos Patriarcas.

"Satori é a raison d'être (Razão de ser) do Zen, sem o qual o Zen não é Zen. Portanto todo o esforço, disciplinário ou doutrinal, é dirigido ao satori."

No Brasil, uma vez ao ano, o mestre Satyaprem orienta o Satori, método desenvolvido com similaridade à imersão dos monastérios Rinzai Zen (de silêncio e isolamento) e a auto-indagação de Ramana Maharshi, e reestruturado por Osho. Inicialmente chamado de "iluminação intensiva" (awareness intensive), trata-se de um trabalho que conduz à realização da natureza búdica – à descoberta de quem/o que se é, além do corpo, além da mente –, no qual koans rompem o nível intelectual, dando possibilidade à autodescoberta existencial.

Seu primeiro contato com o método foi em 1985, nos Estados Unidos, através de Ma Yoga Sudha, discípula e terapeuta do universo de Osho, com quem trabalhou mais tarde. Por muitos anos, Satyaprem coordenou o Satori na Osho Multiversity, na Índia, e em alguns lugares da Europa e do Brasil, país onde, desde 2001, o trabalho é exclusivamente realizado no "Festival de Carnaval com Satyaprem" e tem sido uma das maneiras com que o mestre conduz ao fim da busca, mediante o encontro com esta questão fundamental: "Quem sou eu?". (Wikipedia)


Fonte:
André Kondo. Contos do Sol Renascente. Jundiaí/SP: Telucazu Ed., 2015.

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Varal de Trovas n. 245


Carlos Drummond de Andrade (O Dono)


O dono do pequeno restaurante é amável, sem derrame, e a fregueses mais antigos costuma oferecer, antes do menu, o jornal do dia “facilitado”, isto é, com traços vermelhos cercando as notícias importantes. Vez por outra, indaga se a comida está boa, oferece cigarrinho, queixa-se do resfriado crônico e pergunta pelo nosso, se o temos; se não temos, por aquele regime começado em janeiro, e de que desistimos. Também pelos filmes de espionagem, que mexem com ele na alma.

Espetar a despesa não tem problema, em dia de barra pesada. Chega a descontar o cheque a ser recebido no mês que vem (“Falta só uma semana, seu Adelino”).

Além dessas delícias raras, seu Adelino faculta ao cliente dar palpites ao cozinheiro e beneficiar-se com o filé mais fresquinho, o palmito de primeira, a batata feita na hora, especialmente para os eleitos. Enfim, autêntico papo-firme.

Uma noite dessas, o movimento era pequeno, seu Adelino veio sentar-se ao lado da antiga freguesa. Era hora do jantar dele, também. O garçom estendeu-lhe o menu e esperou. Seu Adelino, calado, olhava para a lista inexpressiva dos pratos do dia. A inspiração não vinha. O garçom já tinha ido e voltado duas vezes, e nada. A freguesa resolveu colaborar:

— Que tal um fígado acebolado?

— Acabou, madame — atalhou o garçom.

— Deixe ver… Assada com coradas, está bem?

— Não, não tenho vontade disso — e seu Adelino sacudiu a cabeça.

— Bem, estou vendo aqui umas costeletas de porco com feijão-branco, farofa e arroz…

— Não é mau, mas acontece que ainda ontem comi uma carnezita de porco, e há dois dias que me servem feijão ao almoço — ponderou.

A freguesa de boa vontade virou-se para o garçom:

— Aqui no menu não tem, mas quem sabe se há um bacalhau a qualquer coisa? — pois seu Adelino (refletiu ela) é português, e como todo lusíada que se preza, há de achar isso a pedida.

Da cozinha veio a informação:

— Tem bacalhau à Gomes de Sá. Quer?

— É, pode ser isso — concordou seu Adelino, sem entusiasmo.

Ao cabo de dez minutos, veio o garçom brandindo o Gomes de Sá. A freguesa olhou o prato, invejando-o, e, para estimular o apetite de seu Adelino:

— Está uma beleza!

— Não acho muito não — retorquiu, inapetente.

O prato foi servido, o azeite adicionado, e seu Adelino traçou o bacalhau, depois de lhe ser desejado bom apetite. Em silêncio.

Vendo que ele não se manifestava, sua leal conviva interpelou-o:

— Como é, está bom?

Com um risinho meio de banda, fez a crítica:

— Bom nada, madame. Isso não é bacalhau à Gomes de Sá nem aqui nem em Macau. É bacalhau com batatas. E vou lhe dizer: está mais para sem gosto do que com ele. A batata me sabe a insossa, e o bacalhau salgado em demasia, ai!

A cliente se lembrou, com saudade vera, daquele maravilhoso Gomes de Sá que se come em casa de d. Concessa. E foi detalhando:

— Lá em casa é que se prepara um legal, sabe? Muito tomate, pimentão, azeite de verdade, para fazer um molho pra lá de bom, e ainda acrescentam um ovo…

Seu Adelino emergiu da apatia, comoveu-se, os olhos brilhando, desta vez em sorriso aberto:

— Isso mesmo! Ovo cozido e ralado, azeitonas portuguesas, daquelas… Um santo, santíssimo prato!

Mas, encarando o concreto:

— Essa gente aqui não tem a ciência, não tem a ciência!

— Espera aí, seu Adelino, vamos ver no jornal se tem um bom filme de espionagem para o senhor se consolar.

Não tinha, infelizmente.

Fonte:
Carlos Drummond de Andrade. 70 Historinhas.

J. G. de Araújo Jorge (O Canto da Terra) 8


O CANTO DA TERRA!

Venho das profundezas da terra, do coração da terra,
onde se fundem todos os limites
e se confundem todas as idades...

Venho de onde a terra ainda está começando e onde há de terminar
e meu canto, retemperado ao fogo primitivo,
estremecerá a superfície do mundo como os abalos sísmicos
e romperá o solo, e rugirá surdamente, como a voz profunda
dos vulcões...

Ao meu canto de lavas, desaparecerão das encostas que se altearão
as terras onde há senhores e escravos,
os campos onde alguns lavram e outros esperam;
e todos os homens atônitos perceberão
que a terra não tem donos
e que nunca dominaram o coração da terra!

E as lavas descerão pelas encostas, e o céu se encherá
     de nuvens e de chamas vermelhas
e por momentos a terra estará coberta de cinzas
e o dia anoitecerá, e a noite apagará suas estrelas...

Meu canto não terá a luz serena e apostólica da estrela do  pastor
para que não seja crucificado entre ladrões,
meu canto será a voz da terra em revolta,
a voz poderosa da terra insubmissa
que levantará o dorso em corcovas de potro bravio
contra o dominador bastardo que a esporeia
e a explora!

Por isso meu canto será violento como a terra quando estremece
e sincronizará com a destruição dos tempos, provocada
pelos que terão que sucumbir...

Por isso meu canto é a voz da terra, da terra toda
  sem limites nem profundidade
e pregará que é também preciso ser fogo e ser lava
para que os donos desapareçam, para que os sobreviventes
compreendam
que nada lhes pertence e tudo lhes pertencerá,
e um mundo melhor possa ter início...

Depois do meu canto, será o silêncio,
um novo silêncio expectante de Gênesis

Depois do silêncio, será o trabalho,
e será a música, e será o vento, e será a semente que acorda,
e a terra verde, e a água clara, e o céu azul
e a nuvem que foge...
E será a terra sem donos, trabalhada e frutificando
para todas as bocas, para todas as mãos,
e será a noite serena, e a beleza ideal e eterna
das estrelas
E será a paz…
****************************************

O SÁBIO

Em meio da algazarra atordoante das partidas,
e a zoeira das alegrias
dos risos
dos foguetes,
dos trens transbordantes de quepes,
dos navios com canhões e mastros embandeirados,

ele conteve nos olhos uma lágrima grande
e brilhante...

Se perguntassem ao homem sozinho porque estava chorando
ele havia de dizer:
- estes que riem e cantam ainda estão partindo!
Eu... já estou voltando…
****************************************

ONTEM... HOJE...
(A Jacques Raimundo)

Antes dele partir a mãe chamou-o
apertou-o no peito mal contendo o pranto,
(bem o vi...)
- E então lhe disse: parte! é o teu destino!
é a pátria que precisa de ti...
Se ele quisesse pensar
se ele quisesse se lembrar
havia de dizer:
há muito tempo,
porque matei um passarinho
e destruí-lhe o ninho
minha mãe me chamou, falo-me comovida:
- nunca mais faças isso meu filho, que a vida
só Deus pode tirar...

Se ele quisesse pensar…
****************************************

ORAÇÃO DA VOLTA
(A Artigas Milans Martínez)
  
Aqui
destas terras vazias, destes chãos enxutos
nasciam sementes
que amanhã milagrosamente
seriam flores e frutos!

Aqui, se erguiam penachos louros e ressoavam ninhos,
aqueles da cor do sol pelos campos imensos,
e estes, pela borda dos caminhos
suspensos...

Aqui, havia uma casa pequena, - uma porta, uma janela -
ao centro de um cercado,
- uma criança a brincar no jardim, tagarela,
e um penacho de fumo a subir do telhado...

E por estas ruas quietas, hoje tristes, sossegadas,
e em solidão,
ruas sem alma, sem desejos,
se ouvia o riso feliz das bocas cheias
de pão,
dos lábios cheios de beijos!

Aqui havia uma escola onde um velho mestre exercia
seu magistério,
e adiante era o recreio... a algazarra, a alegria,
da garotada livre em gritos e folganças...

Hoje , - aqui é um cemitério
e onde estão as crianças?

Aqui, havia vida, hoje, não há mais nada...
Nem penachos ao vento e nem crianças contentes...
- há somente o silêncio, as visões delinquentes,
e a longa risca vermelha de uma estrada...
................................

O mundo está perdido... a terra está vencida...

Eu mereço, Senhor, vosso castigo!

Mas não sei se maldigo os homens, se maldigo a vida,
ou se vos maldigo!

Fonte:
J. G. de Araújo Jorge. O Canto da Terra. 1945.

Sílvio Romero (O Padre Sem Cuidados)


Havia um padre que nunca tinha tido na sua vida um cuidado. Nada o preocupava, a ponto dele ter escrito em sua porta o seguinte: “Aqui mora o padre sem cuidados”.

O rei, sabendo disto, ficou muito admirado e disse que queria saber se era verdade o que aquele padre tinha escrito em sua porta. Mandou-o chamar, e logo que ele chegou e perguntou qual o fim daquele chamado, disse-lhe o rei que era saber se com efeito ele nunca tinha tido em sua vida cuidados.

Disse-lhe o padre que na verdade não havia coisa alguma que o tivesse preocupado, que passava sua vida sem ter cuidados. Então disse-lhe o rei:

— Quero que daqui a três dias o senhor venha me responder, sob pena de morte, a três perguntas que vou lhe fazer.

Despediu-se o padre e saiu do palácio já todo cheio de cuidados. Chegou em casa só pensando na sentença dada pelo rei. Veio o jantar, mas ele não quis comer, tão preocupado estava, e deitou-se em uma rede muito pensativo.

No outro dia ainda não quis almoçar, o que vendo o criado, perguntou-lhe a razão por que ele estava tão triste e sem querer comer. Responde-lhe o padre:

— Ah, criado, é que eu estou cheio de cuidados. O rei mandou-me chamar e disse-me que, sob pena de morte, eu hei de ir responder a três perguntas que ele vai me fazer. Isto me tem dado muito que pensar, pois não sei mesmo o que hei de dizer.

O criado vendo o vexame com que estava o padre, disse-lhe:

— Não tem nada, se v. reverendíssima quer, eu vou em seu lugar responder às perguntas do rei.

O padre não acreditou nem quis aceitar a proposta do criado, mas este replicou dizendo que o padre lhe desse sua batina e que podia ficar descansado, que ele prometia desempenhar bem o seu papel.

No dia designado pelo rei, o criado rapou bem a barba e o bigode, abriu uma coroa, vestiu a batina do padre e foi para a casa do rei. Este mandou-o sentar-se, e na presença de toda a corte fez-lhe a seguinte pergunta:

— Diga-me quantos cestos de areia tem ali naquele monte?

O padre sem cuidados levantou-se, olhou para o monte designado pelo rei e disse:

— Ora, rei meu senhor, é isto? Saberá vossa real majestade que ali tem um cesto de areia.

Disse-lhe o rei:

— Um só, como assim?

Tornou o padre:

— Vossa real majestade mande fazer um cesto muito grande, que abranja todo o monte, e eis aí o que digo.

Aí todas as pessoas presentes bateram muita palma e o rei ficou muito satisfeito. Depois fez-lhe a segunda pergunta, que foi a seguinte:

— Diga-me quantas estrelas tem no céu?

O padre deu umas voltas pela sala e disse:

— No céu há tantos milhões de milhões de estrelas.

E deu uma soma muito grande. O rei, que também não sabia, concordou com que o padre disse. A terceira pergunta do rei foi:

— Quero que me diga o que é que eu estou aqui pensando?

Vira-se o padre para, ele e diz:

— Vossa real majestade pensa que está falando com o padre sem cuidados, mas está falando é com o criado.

Fonte:
Sílvio Romero. Contos Populares do Brasil. RJ: José Olympio, 1954.

domingo, 19 de abril de 2020

Varal de Trovas n. 244


Rachel de Queiroz (Graúna)


Ano passado, um tanto levianamente, prometi uma graúna a um amigo. E o patrão desse amigo, que é também meu patrão, leva a me cobrar a promessa, como se tivesse algum interesse nisso — o que eu não duvido.

Bem, o problema não é a graúna; graúnas aqui abundam, há uma que reside bem próxima à janela do meu rústico escritório, e suponho que não seria difícil induzi-la a entrar num alçapão. Os passarinhos daqui da fazenda têm direito permanente de asilo nas proximidades da casa, e sentem-se em tão grande segurança que os rouxinóis fazem ninho nas estantes por trás dos livros, na gaveta da mesa de alpendre, onde o dono da casa outrora tomava o seu vinho e hoje toma sua abstêmica limonada, olhando o açude.

Andorinhas também fizeram morada num rincão do dito alpendre. Canários, até o ano atrasado, ocupavam os frechais da copa e o pé de jucá do terreiro e tinha-se em casa uma cantoria permanente, era lindo. Mas desde o ano passado foram expulsos pelos cabeças-vermelhas, também chamados galos-de-campina. Os campinas são lindos de figura e agradáveis de canto, mas não chegam nem aos pés dos canários, que nos deixaram mortos de saudades. Mas assim é a lei da natureza, e creio que mesmo se acabássemos com todos os campinas, os canários não voltariam. Eles lá têm o seu brio.

Há ainda os beija-flores e o memorável episódio do ninho na antena de TV, que deu lugar ao gesto mais lindo do mundo do então presidente da Embratel. E há, last but not least, as graúnas que me acordam de madrugada e cantam enquanto trabalho.

Bem, suponhamos então que eu, fortemente motivada pela palavra dada e pelas pressões patronais, cometa um ato de traição e aprisione a incauta e cantadeira graúna. Daí, que é que eu faço?

Começa que nem sei direito o que que graúna come. Consultei os possíveis entendidos e há discrepâncias: come bichinhos, algumas sementes, algumas frutas. Outros dizem que ela não come bichinhos, só frutas. Outros que frutas, absolutamente só sementes. Que conclusões tirar?

Mas suponhamos ainda que, vencida a barreira dietética, eu consiga alimentar a prisioneira e vá tratar de a remeter para o Rio, Digam-me, senhores, como enviar uma graúna para o Rio, desde estas lonjuras inundadas do Quixadá? Tem que haver várias baldeações e centenas de outras improbabilidades. Daqui de casa para a estação, uma viagem de meia légua com a lagoa da Carnaúba em gloriosa enchente e o riacho dos Cavalos dando nado. Na estação, poder-se-ia pegar o trem — mas já me informei: no trem não há serviço especial de transporte de graúnas. O pássaro teria que viajar de grajau como um frango, e sujeito a todos os azares, atrasos e etc. do percurso.

Inclusive roubo e esmagamento, sem falar da sede e inanição. Chegando em Fortaleza, como fazer a baldeação para o avião? Porque de ônibus não se pode cogitar, ônibus não aceitam graúnas como passageiro. E navio, além de passarem poucos. quem cuidaria do conforto da graúna durante os oito dias da travessia marítima?

Agora então a última pergunta: e a Varig, a Vasp, a Transbrasil, a Cruzeiro aceitarão como carga ou encomenda uma gaiola de talisca de coqueiro aprisionando no seu interior uma graúna viva, sem acompanhante, traída e revoltada, possivelmente fazendo greve de fome?

São estas as dificuldades, meu caro patrão Daniel, que vêm me impedindo de cumprir aquela incauta promessa. Como vê, não é por falta de graúnas e boa vontade. É apenas por falta de uma infra-estrutura nacional que nos possa garantir a operação de transporte.

Fonte:
Rachel de Queiroz. As Menininhas e outras crônicas. RJ: J. Olympio, 1976.

Augusto Vasconcelos Rubião (Baú de Trovas)


— Bom dia, Dona Alegria,
com tanta pressa, onde vais?!
— Vou plantar uma saudade
onde o Amor não volta mais!
- - - - - –

Casar é um verbo difícil
de conjugar de mãos dadas.
Às vezes, noivos ditosos,
no lar, são almas penadas.
- - - - - –

Dizem que existe feitiço
que nos deixa atormentado.
Hoje estou acreditando:
por ti ando enfeitiçado...
- - - - - –

Meu coração é relógio,
que vive sempre a bater.
Na dor está atrasado,
mas adianta no prazer.
- - - - - –

Minha terra tem mulatas
e broinhas de fubá.
Recordando os meus amores,
mais prazer encontro eu lá…
- - - - - –

Nossa casa é pequenina,
mas tem a graça de Deus.
De dia o sol a ilumina,
e de noite — os olhos teus.
- - - - - –

O meu peito é um país;
capital — o coração!
É Maria a imperatriz,
para dar-lhe a direção,
- - - - - -

Os teus seios são dois ninhos,
tão brancos como algodão;
neles vivem dois pombinhos,
em busca de um coração.
- - - - - –

Quando chegaste na igreja,
rezei a Salve-Rainha;
com as contas dos teus olhos,
cantei uma ladainha...
- - - - - –

Se a vista tivesse dente,
este mundo estava preto:
teu belo corpo seria
um descarnado esqueleto...

Fonte:
Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Ed. Minerva

Irmãos Grimm (A Rainha das Abelhas)


Certa vez, dois filhos de rei saíram em busca de aventuras e se entregaram a uma vida tão desregrada e dissoluta que nem se lembravam de voltar para casa. O mais moço, que era chamado de Bobo, saiu à procura de seus irmãos. Quando finalmente os achou, só ouviu caçoadas, porque, sendo tão ingênuo, pensava em vencer na vida, enquanto eles, muito mais espertos, não tinham conseguido.

Os três puseram-se a caminho juntos e chegaram a um formigueiro. Os dois mais velhos quiseram remexer nele para ver as formigas fugirem alvoroçadas carregando os próprios ovos, mas o Bobo lhes disse:

- Deixem os bichinhos em paz, eu não suporto que vocês lhes façam mal.

Então eles continuaram andando e chegaram a um lago onde nadavam muitos, muitos patos. Os dois irmãos queriam pegar alguns para assar, mas o Bobo não consentiu e disse:

- Deixem os bichinhos em paz, eu não suporto que eles sejam mortos.

Por fim, chegaram a uma colmeia, onde havia tanto mel que escorria pelo tronco da árvore. Os dois quiseram acender fogo embaixo para sufocar as abelhas e poder tirar o mel. O Bobo tornou a impedir, dizendo:

- Deixem os bichinhos em paz, eu não suporto que eles sejam queimados.

Afinal, os três irmãos chegaram a um castelo. Nas cavalariças havia cavalos de pedra, e não aparecia pessoa alguma. Eles passaram por todas as salas até que, no fim, encontraram uma porta com três fechaduras. No meio da porta havia, porém, um buraquinho por onde se podia espiar o aposento. Viram lá dentro um homenzinho grisalho, sentado diante de uma mesa. Eles o chamaram uma, duas vezes, mas o homenzinho não ouviu. Quando o chamaram pela terceira vez, ele se levantou, abriu as fechaduras e saiu. Não disse uma palavra, mas os levou a uma mesa ricamente preparada. Tendo os três comido e bebido, ele conduziu cada um a seu quarto de dormir.

Na manhã seguinte, o homenzinho grisalho chegou-se para o mais velho, acenou chamando-o e o guiou até uma placa, onde estavam escritas três tarefas que poderiam desencantar o castelo.

A primeira dizia que no bosque, debaixo do musgo, estavam as pérolas da filha do rei, em número de mil, que precisariam ser catadas; e, ao por-do-sol, se ainda faltasse só uma, a pessoa que as procurava se transformaria em pedra. O mais velho foi e procurou o dia inteiro. Como, porém, o dia chegou ao fim e ele tinha achado só cem pérolas, aconteceu o que estava escrito na placa, e ele se transformou em pedra.

No outro dia, o segundo irmão assumiu a tarefa, mas não se saiu melhor que o mais velho, pois só achou duzentas pérolas e ficou transformado em pedra.

Por fim chegou a vez do Bobo, que procurou no musgo; mas era tão difícil encontrar as pérolas e demorava tanto, que ele se sentou numa pedra e chorou. Nisto, apareceu o rei das formigas, cuja vida ele salvara. Vinha acompanhado de cinco mil formigas. Não demorou muito, e os bichinhos acharam todas as pérolas e as amontoaram ali.

Mas a segunda tarefa era ir pegar, no fundo do lago, a chave do quarto da filha do rei. Quando o Bobo chegou ao lago, vieram nadando os patos que ele uma vez salvara, mergulharam e pegaram a chave lá no fundo.

A terceira tarefa era a mais difícil, pois das três filhas de rei que estavam dormindo ele devia escolher a melhor. Elas eram, porém, completamente iguais, não tendo nada que as distinguisse uma da outra, a não ser por terem comido, antes de dormir, três doces diferentes: a mais velha, um torrão de açúcar; a segunda, um pouco de melado; a mais moça, uma colherada de mel.

Então chegou a rainha das abelhas, que o Bobo havia protegido do fogo, e foi provando da boca de todas três; por fim ficou pousada na boca da que havia comido mel, e assim o Bobo reconheceu qual era a filha de rei certa.

Com isso, o feitiço se desfez, tudo no castelo despertou daquele sono, e quem tinha virado pedra retomou sua forma. O Bobo se casou com a mais jovem e melhor filha do rei e, depois que o pai dela morreu, ele ficou sendo o rei; seus irmãos, porém, casaram-se com as outras duas irmãs.

Fonte:
Contos de Grimm

Agatha Christie (Resenha de Livros) 8


OS TRÊS RATOS CEGOS E OUTRAS HISTÓRIAS
The Three Blind Mice and Other Stories


Às vezes uma inocente canção infantil pode ocultar um sentido sombrio e macabro. É o caso da cantiga dos “três ratos cegos” de cauda cortada, que serve de sinistro prefixo musical para uma série de assassinatos misteriosamente cometidos numa solitária hospedaria de estrada, isolada pela neve. Os Três Ratos Cegos, irresistível história que abre esta coletânea de contos, deu origem à peça A ratoeira, sucesso de Agatha Christie há várias décadas nos palcos de Londres.

Os Três Ratos Cegos
Série de assassinatos que ocorrem em uma solitária hospedaria de estrada, isolada pela neve.
- - - - - -
Estranha Charada
Casal tenta encontrar fortuna deixada por um tio-avô. Como não conseguem, chamam a bondosa velhinha Miss Marple que os ajuda a encontrar o local da herança deixada para eles.
- - - - - -
O Crime da Fita Métrica
Mulher é assassinada e as suspeitas caem sob seu marido que irá ganhar um bom dinheiro. Até Miss Marple é envolvida no caso, tendo que desvendá-lo para acabar com todo o mistério.
- - - - - -
O Caso da Empregada Perfeita
Depois do desaparecimento de um broche, a empregada é despedida do emprego e pede a Miss Marple que a ajude a encontrar o broche, pois senão ela pode ser acusada de roubo.
- - - - - -
O Episódio da Caseira
Depois de uma gripe, Miss Marple está meio chateada e seu médico lhe dá uma pequena historieta de um assassinato e pede a Miss Marple que desvende o segredo. A velhinha resolve o problema como sempre.
- - - - - -
Os Detetives do Amor
O Sr. Satterthwaite junto com seu amigo, o coronel Melrose, investigam a morte de Sir James Dwighton, encontrado morto em sua biblioteca.
- - - - - -
O Sinal Vermelho
Durante uma sessão espírita, um espírito avisa aos participantes não voltarem para casa pois alguém irá morrer. Após a chegada da polícia, descobre-se que o crime não foi cometido por nenhum espírito.
- - - - - -
O Quarto Homem
Um advogado, um padre e um médico ficam na mesma cabine de um trem e discutem sobre uma menina que tinha quatro personalidades. Só então percebem a existência de um outro homem no quarto que conheceu a tal menina. Ele relata uma estória surpreendente sobre a menina, coisas que nenhum dos outros senhores sabia.
- - - - - -
O Rádio
Senhora começa a receber mensagens de seu marido morto enquanto ouve a programação da rádio. Na verdade um assassino estava agindo e por pouco não consegue seu objetivo.
- - - - - -
Testemunha de Acusação
Tendo sido acusado de assassinato, Leonard Vole procura um advogado que o ajude. Tudo leva a crer que o Sr. Vole realmente matou uma velha senhora para ficar com seu dinheiro. Depois das investigações, o advogado tem uma grande surpresa.
- - - - - -
O Mistério do Vaso Azul
Sempre que vai jogar golfe, Jack Hartington ouve uma voz pedindo ajuda. Segundo a voz estaria acontecendo um assassinato. Encontra uma jovem que diz sonhar com a mesma coisa e pede ajuda a Jack. Com sua bondade, Jack a ajuda e acaba em maus lençóis.
- - - - - -
A Última Sessão
Na última sessão de uma médium, ela tem que receber o espírito de uma menina, para sua mãe ficar mais tranquila. Mas algo estranho acontece e a médium sofre graves consequências.
- - - - - -
SOS
Tendo que se refugiar em uma casa, Mortimer Cleveland acaba descobrindo uma trama que irá resultar em um assassinato. Apenas ele poderá acabar com essa trama e salvar uma pobre vítima.
****************************************

CONVITE PARA UM HOMICÍDIO
A Murder is Announced


Nas pequenas aldeias costumam ocultar-se grandes paixões, capazes de cometer os piores crimes. No entanto, nessas enganosamente tranquilas comunidades rurais também moram solteironas idosas, que, enquanto fazem crochê, observam tudo, e podem valer mais do que mil policiais juntos. O exemplo mais extraordinário dessa classe de mulheres é Miss Marple, tão sagaz como Poirot e mais modesta do que ele. Defrontada a uma série de homicídios que começam com um assassinato anunciado - como se tratasse de um jogo macabro - a simpática e bondosa Miss Marple, que sabe descobrir a maldade escondida sob as mais honestas e inocentes aparências desmascara o culpado, algo que não tinham conseguido fazer os investigadores profissionais mais experientes.

Um assassinato é anunciado num jornal local… Todos pensavam que era uma brincadeira mas um assassinato acontece de verdade no local marcado, que era uma casa que estava cheia de suspeitos… Quem poderia ser o verdadeiro culpado… Nessa trama Miss Marple vai ter que desenterrar o passado dos suspeitos para descobrir o verdadeiro assassino. Ela fica numa corrida contra o tempo para que não aconteçam mais assassinatos…

**************************************** 

 INTRIGA EM BAGDÁ
They Came to Baghdad

O pior - ou o melhor? - dos defeitos da bela, inteligente e ousada Verônica Jones é a sua tendência a dizer mentiras, impulsionada pelo seu afã de criar situações romanescas, que lhe permitem fugir, imaginariamente, da existência cinza e monótona de uma datilógrafa. Porém o que não pode supor é que o destino - que, às vezes, também é um romancista - vai levá-la a Bagdá para viver uma real e perigosa aventura, na qual participam terroristas, espiões, arqueólogos, tumbas muitos antigas e o cadáver, muito recente, de um homem que morre num quarto do hotel onde ela se aloja. Induzida a improvisar-se como agente do Intelligence Service, Verônica deve se confrontar a uma poderosa e sinistra organização, de alcance internacional, cujo objetivo é desestabilizar o pacífico relacionamento entre as grandes potências, com o intuito de provocar uma Terceira Guerra Mundial. Felizmente para o mundo, lá, no centro da ação, está Verônica, que colabora decididamente, na derrota dos inimigos da paz e consegue desmascarar o mais astucioso e implacável deles.

Bagdá foi o cenário escolhido para uma conferência secreta entre os líderes das superpotências. Infelizmente, houve vazamento de informações e uma organização clandestina, instalado no Oriente Médio, está planejando sabotar esse encontro de cúpula. No meio dessa situação explosiva, aparece Victoria Jones, uma jovem que adora a perspectiva de viver uma aventura. No entanto, ela vai ter muito mais do que buscava a partir do momento em que um agente ferido morre em seu quarto de hotel. Agora, se ao menos ela conseguisse decifrar o sentido das últimas palavras do rapaz:… Lúcifer… Basrah… Lefarge…

Fonte:
http://users.hotlink.com.br/pmgi/agatha/index.html