terça-feira, 25 de agosto de 2020

Amadeu Amaral (O Super-Homem e o "Trouxa")

Júlio de Sá passou e repassou distraidamente o guardanapo sobre os beiços carnudos, distendidos num vago sorriso tranquilo. O companheiro de mesa, que ouvira calado a abundante narrativa, aconchegou a gola erguida do sobretudo, e, com uma voz cujo timbre e cuja toada diziam, antes e melhor que as palavras, a índole de uma filosofia, de resignação e de comodismo:

— Mas isso cansa, ó Júlio, não cansa? De todas essas aventuras, de todas essas idas e vindas, viagens, festas, pândegas e idílios, o que tens tirado, decerto, é a conclusão de que não há como a gente viver na sua terra, com os seus...

Júlio de Sá cravou os olhos nos do comensal, carregando o cenho.

— Estás doido. Eu quero lá saber de sossego! Eu quero lá saber de calma, de paz, de vida metódica! Não nasci para isso, meu velho.

E o outro, apertando com as mãos a gola do sobretudo, o guarda-chuva entre os joelhos:

— Gostas então de uma vida desordenada e áspera?

— Quanto mais, melhor. A vida de carneiro não me tenta. A agitação é uma necessidade do meu temperamento. E mais: é uma maneira por que eu entendo, cá por umas ideias, que devo viver a minha vida. Se eu não fosse um exuberante por natureza, seria um agitado por convicção. Para mim a vida que merece ser vivida é a vida ultra-movimentada: movimento incessante, em todos os sentidos; expansão física, expansão afetiva, expansão dos instintos, expansão do espírito; viagens e lutas, paixões e negócios, prazeres, jogo, carraspanas, arte, mulheres, esporte, tudo, e tudo de pressa, sem parar em coisa alguma nem em parte alguma.

— Então, é convicção tua...

— Convicção, sim, senhor.

— Convicção, não, senhor. Dize que tu gostas, que o teu temperamento te leva por aí, que o teu feitio dá para essa vida dispersiva e doida. Convicção, é que não. Que diabo de convicção pode ser essa, ó Júlio! Tu confundes os termos...

— Não confundo nada. O que estou é com a boca seca. Este diabo de vinho... "Garçom", mais meia garrafa de cerveja aqui para este senhor, e vê se me arranjas aí um "Bourgogne" gelado, mais decente do que essa coisa que me deste há pouco. Digo-te que não confundo nada. Repito que, se assim não vivesse por temperamento, viveria assim por efeito de uma maneira minha de encarar as coisas. Não sou um simples praticante, sou um teorista da vida superativa. A existência repousada, assente, dentro de um quadro prefixado, com princípios gerais imutáveis e com um programa particular miudamente estabelecido, é apenas um atentado contra a natureza. A vida do homem não pode ser uma construção arquitetônica, com terreno escolhido a dedo, com plantas matematicamente organizadas, com materiais conhecidos, com destinação certa. Toma nota deste teorema negativo: a nossa vida não é uma construção. A nossa vida é apenas isto: vida — uma coisa cuja essência e cujo sentido nos escapam, que nos é superior, que nunca conseguiríamos abarcar nos limites da nossa consciência, porque esta não lhe apreende senão umas pálidas faúlhas, nem subjugar à nossa vontade, que só é forte quando se lhe submete a ela...

Todos os princípios morais com que nós pensamos dominar a matéria e o instinto se repartem em duas classes: ou são inerentes à própria índole das coisas, e nesse caso não valia a pena gastar tanto tempo e tanto esforço em compendiá-los, ou são puro artifício humano, inútil e ridículo como a pretensão de um sujeito que fosse pregar normas de movimento e de orientação ás ondas do mar. De resto, nem podemos saber quais são os princípios que existem na própria natureza e quais os que ela desconhece e rejeita. Não ha normas de vida! Nenhuma norma. Ninguém sabe se o santo que passou pelo mundo empanturrado de virtudes, dizendo palavras de concórdia e de piedade, distribuindo benefícios aos homens, não terá feito maior mal ao homem do que o bandido de alma opaca e de mãos mortíferas... Aquele que espalha esmolas e consolações pode garantir e suavizar a existência a alguns que consideraria menos dignos dela; o que cria exaltações e represálias em torno de si coopera para a formação de corações fortes, de almas altivas, de energias indômitas.

E, de pé, batendo no ombro do amigo estarrecido:

— A vida é para ser vivida. Viva cada qual a sua vida. A maior virtude que um homem pode ambicionar é a de viver — amplamente, desassombradamente, sem restrições, sem liames, sem dobras, sem receios, deixando livre ao próprio ser o máximo de expansão a que ele possa atingir. Aí tens a minha moral, e aí tens o que eu faço: vivo, num esforço contínuo, numa contínua agitação, sempre fremente, inquieto e anelante, sempre envolto na maravilhosa nuvem das sensações que me mandam os sentidos hiperestesiados, tudo vendo, tudo palpando, tudo experimentando. Vivo, numa palavra, durante o meu fugitivo minuto de existência, a própria vida eterna, magnífica e indecifrável do universo. — E sabes que mais? Vamos embora.

Júlio de Sá tomou o chapéu, e, acendendo um charuto:

— Vais para casa? Pois vamos juntos. Eu não vou a parte nenhuma. Talvez recolha também. E os dois, braço dado, saíram da claridade e da tepidez do bar, mergulhando na cerração da rua, ponteada de pequenos borrões de luz. Júlio de Sá, as mãos enfiadas nos bolsos, a bengala a emergir de um deles, encostada ao ombro, apoiava-se rudemente ao braço do companheiro pachorrento, e falava sempre, numa voz cada vez mais pastosa:

— Tu não vives, meu caro Lucas, tu não conheces a vida...

O outro tentou uma réplica. Não conhecia a vida que ele, Júlio, levava e exaltava, mas conhecia-a por uma outra face, menos fascinante talvez, mas com certeza mais nobre. Era a vida apagada, subterrânea e sofredora do maior número, a vida feita de sacrifícios quotidianos, de desejos contidos, de aspirações imoladas, de sonhos recalcados, de trabalho tenaz, absorvente, esmagador, opiniático, heroico...

E sublinhava com o gesto o ultimo qualificativo. Tinha a sua poesia, pois não tinha? Mas o Júlio, feroz:

— Poesia! A poesia do Dever, hein? Que raio de poesia tu achas numa vida artificial, toda de restrições duras, que te foi imposta sem discussão nem consulta, e que assim aceitas e praticas? A poesia da canga... a poesia da polé...

Gaguejando estas coisas, Júlio sacudia pesadamente o braço do amigo. E, num repelão forte, que o levou de brusco à parede:

— É isso que tu achas belo, meu pedaço de asno? O amigo pachorrento olhou-o na cara, insultado, e fez o gesto de quem queria desvencilhar-se e ir embora. Mas Júlio de Sá reteve-o. Ora essa! Já não se podia brincar! Deixasse de tolices. Amigos sempre....

Agora Júlio de Sá, com o chapéu atirado para a nuca, pendurava-se ao braço do camarada, resmungando desculpas entremeadas de elogios e de indiretas. Estava maçador, carinhoso e irritante. Sucumbido sob a dura prova, Lucas ia e vinha, aos boléus, jungido ao braço pesado do boêmio, ao longo da interminável rua deserta. Passou um carro. Lucas meteu-se nele com o importuno, resignado a sofrê-lo até que o largasse em casa. Abandoná-lo não podia, não seria decente. Tinha de ser naquela hora o seu arrimo; era o seu protetor forçado. O super-homem dependia, naquele momento, do seu sacrifício; sem este, talvez tivesse de dormir na rua, como um beberrão vulgar, ou num posto de polícia.

Aos solavancos do carro, sob o ar frio que zunia na coberta, Júlio espalhou-se molemente nas almofadas, as pálpebras descidas sobre os olhos mortiços. E quando chegaram à casa, saltou sozinho, quase firme, e bateu. Uma luz amarela veio de dentro, por baixo da porta, sobre a soleira. Em seguida silenciosamente, a porta abriu-se, e apareceu o vulto de uma velhinha, vagamente lambido pelo clarão, alongando de sob o xale traçado o braço que sustentava o lampião caseiro. Sorria, curvada e trêmula, na longa resignação de um velho sacrifício. Era a mãe do notívago.

Mas havia no seu semblante e na sua voz um vago e suave ressentimento. Júlio, como quem está acostumado, não lho percebeu. Percebeu-o e compreendeu-o vivamente o Lucas, que com enfado se atirou para o fundo do carro, depois de uma despedida apressada.

— Adeus, ó, super-homem!

— Adeus, ó trouxa! Medita no que eu te disse, mastigou Júlio de Sá, cuspindo grosso.

De dentro do carro, numa volta, Lucas ainda viu o filósofo, com um pé na soleira, a acender pachorrentamente um cigarro sobre a chaminé do lampião, que a velhinha lhe baixara à altura do nariz.

Fonte:  O Poeteiro

Letícia de Castro (Assassinando as Lendas Brasileiras?)

Mitos e lendas são estórias contadas oralmente através dos tempos. Permutando acontecimentos reais e históricos com acontecimentos alegóricos. As lendas e mitos procuram explicar muitas vezes acontecimentos misteriosos ou sobrenaturais. Os mitos sempre possuem um forte artefato simbólico.

Os povos antigos não conseguiam explicar os fenômenos da natureza, através de explicações científicas, principalmente pelo fato da ciência que não era tão avançada quanto é hoje, não havia tecnologia para novos descobrimentos e criavam-se mitos com o propósito de dar sentido os acontecimentos do mundo.

Assassinando as lendas Brasileiras?

Os mitos também serviam como uma forma de passar conhecimentos e alertar  as pessoas sobre perigos ou defeitos e qualidades do ser humano. Deuses, heróis e personagens sobrenaturais se misturam com fatos da realidade para dar sentido a vida e ao mundo. Muitas lendas se perderam com o tempo, a magia dos contos e mitos que embalaram antigas gerações e tradições poéticas em nosso país.

Nosso folclore está morrendo, as fábulas e contos que nos levavam para o mundo imaginário através da literatura ou de estórias contadas no intuito de um universo de aprendizado interior.

A magia dos contos foi se consumindo ao longo dos tempos e em casa os pais já não contam lendas como, por exemplo, a do saci Pererê, Iara, Corpo-seco, Boitatá entre outras inúmeras lendas folclóricas. Em muitas cidades ainda persistem tais contos como um fator cultural e importantíssimo na riqueza de nosso país, hoje devastado por culturas tecnológicas, entre tantas que se reduzem à modernidade de um mundo consumista e não mais com o brilho da leitura ou de estórias contadas pelos pais ou avós.

Essa cultura do folclore Brasileiro faz a mente do ouvinte ou leitor despertar, tirando lições para o cotidiano. Estão assassinando coisas tão belas que fazem o ser humano ser auto-analítico, contemplar seu meio e viajar sobre forçar límpidas da imaginação necessária para se emocionar ou sorrir diante das dificuldades cotidianas.

No conjunto de tudo que podemos chamar de folclore de uma terra; a comida, parlendas, danças, vestuário e muito mais, pergunto: Quantas crianças da atual geração conhecem algum cântico do nosso rico e vasto histórico de lendas brasileiras. O tempo resiste aos antigos que ainda lembram dos contos e ainda fazem-se enfeitiçado por eles. Mas nossas crianças, futuras gerações de um país inundado de costumes e culturas diversas.

A verdadeira cultura morre aos poucos perdidas nas amarras do tempo sobre as grandes cidades. O mito resiste ao tempo, caso contrário não seria um mito. Mas como resgatar essa beleza? Passando oralmente essa ampla cultura como era feita outrora, como é feito em alguns lugares distantes do Brasil.

O folclore é a cultura de um povo, de um país, de uma civilização. Essas fábulas são a essência histórica e o engrandecimento cultural, o desenvolvimento do intelecto dos futuros cidadãos do país. Se o país continuar vivendo na marginalidade cultural talvez aconteça o que nunca ninguém jamais imaginou; O assassinato do mito, o assassinato da interior de toda uma civilização e sua tradição, o assassinato da fantasia e dos contos que um dia fizeram questionar o medo ou espalharam estórias de amor.

As lendas soam de fato um aprendizado fantasioso, mas que além de sua magia faz o leitor navegar por mares questionáveis da imaginação e derrotar toda a deficiência de anticultural ainda eminente em nosso país nos dias atuais, deflagrada pela falta de oportunidade e desinteresse através das asas mórbidas das dificuldades do cotidiano.

Fontes:
Mitos e Lendas
Imagem = Fala! Universidades

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Varal de Trovas n. 357

 

Olivaldo Júnior (Felizes para Sempre)


(Conto classificado em 1º Lugar no I Concurso Literário Virtual da ACL – Academia Virtual Contemporânea de Letras – Isolamento Social - Coronavírus)
__________________________________________________


Estava tudo pronto para o casamento de Isabel e Cristiano. Ela, moreninha, desposava um moreninho também. O melhor bufê, a melhor música, a melhor igreja. Tudo havia sido exaustivamente pensado, planejado e executado. Nada fugia ao script do chamado conto de fadas moderno, ou seja, o casamento. Sabe o “Fábrica de Casamentos“? Pois a Isabel não perdia nenhum. Era fã desse reality. Havia decorado as falas, o choro, a voz de cada noiva.

O caso é que próximo à data do tão esperado dia, Isabel e Cristiano tiveram uma ingrata surpresa. Um novo tipo de vírus vinha fazendo vítimas desde a China e, com espantosa velocidade, chegando a todas as partes do mundo. Até nisso os vírus de hoje são contemporâneos e se comunicam com uma rapidez impressionante. Enfim, como forma de conter o temido Covid-19, decretou-se como medida protetiva o isolamento social no País.

− E agora?! A gente tem que se casar de qualquer jeito!, falou Isabel apertando os braços de Cristiano ante William Bonner e Renata Vasconcellos, do Jornal Nacional.

− Não sei, meu amor, mas vamos dar um jeito, respondeu Cristiano tentando acalmar os ânimos de sua noiva, a quem por exatos nove anos vinha “enrolando”, isto é, cozinhando em banho-maria, dizendo que, quando as coisas melhorassem, iriam finalmente se casar.

Os pais de Isabel, Seu João e Dona Ana, a um canto da sala, de rabo de olho, assistiam à cena, pensativos. Tinham lá para eles que iria dar zebra.
*****
    
O casório estava marcado para 28 de março, sendo que a quarentena no Estado de São Paulo, onde moravam, havia começado na terça, dia 24. Isabel, coitada, olhava para os presentes já recebidos, para o vestido já engomado e pensava que, fatalmente, não haveria festa e, muito menos, cerimônia. Cristiano, mais consciente, começou a ficar preocupado com a situação, principalmente com os pais de Isabel, já com mais de sessenta anos. Que coisa!

O noticiário mal dava conta de noticiar a quantidade diária de mortos, principalmente na Europa, mais precisamente, na Itália. O bisavô de Isabel era italiano. “Porca miséria!”, diria o danado se ainda estivesse vivo. Esse, o Covid-19 não pegava mais. E a dengue, então? Os casos não diminuíam, só faziam aumentar. Seria o fim dos tempos? Uma vela votiva não parava de queimar no altarzinho recém-armado com muito amor e carinho por Dona Ana.

− Tanto doce, tanta flor, tudo jogado fora!, suspirava sem entender muita coisa a pobre Dona Ana. Seu João, que tanto esperou para entrar com sua filha na igreja, também sentia uma dorzinha no peito quando via que a filha chorava escondida no quarto, sem entender.

− Espere, Ana, eu tenho a solução, falou Seu João para a mulher. Filha! Filha!
*****

− Vai, mãe, a live vai começar!, falou Catarina, uma das primas de Isabel, que, em seu lar, doce lar, esperava mais uma live do Facebook começar, uma das febres da quarentena.

Todos a postos, os familiares de Isabel e Cristiano, cada um em sua casa, com a tela do smartphone ligada, com o 4G meio falho devido a tantos utilizadores confinados em casa, todos que gostavam daquele casal estavam lá, “online”.

− Estamos aqui reunidos para celebrarmos o casamento, o enlace de dois filhos de Deus, Isabel e Cristiano. Estejam vocês, caros amigos e familiares onde estiverem, podem se assentar. Você também, Ana, o casamento vai começar...

Não, não era um padre que estava realizando o sonho de Isabel e Cristiano, não. Era o Seu João, com sua “roupa de ir à missa”, que, de frente para a filha e o futuro genro, tratava de “oficializar” o casório. Tempos de crise, improviso!

No fundo, sabiam que o mundo andava às voltas com uma grande ameaça e se compadeciam por isso. Porém, mesmo aquela união sendo assim, tão simples, nos fundos de casa, com noivo e noiva, um pai e uma mãe zelosos, numa live da net, estavam mesmo felizes. Não tão só por uma live... Felizes para sempre.

(Publicado no Facebook em 01/05/2020)

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

Flávio Aquino Chagas (Poemas Diversos)


APOTEOSE

Que céu azul, e belo e esplendoroso,
o céu do meu Brasil forte e querido!
Que sol aquecedor, maravilhoso,
o sol do meu País estremecido!

Que rios, que florestas colossais
enfeitam nossa Terra hospitaleira!
Que pampas, que robustos seringais
a exaltar a gente brasileira!

Que praias fascinantes, tentadoras
existem neste solo varonil!
São praias das morenas e das louras,
das ruivas, das mulatas do Brasil!

Que lindos panoramas suburbanos!
Que belas capitais dos nossos dias!
E os lagos e cascatas, e o oceano,
e as noites de luar, de poesias!...

Que belo é o meu País, de língua forte,
de gente culta, alegre, valorosa!
Hei de querer-te, sempre, até à morte,
Ó Pátria minha, livre e grandiosa!
****************************************

ARACAJÚ

Bom-dia, Aracajú, terra querida
dos sonhos meus, constantes e felizes!
Bom-dia, meu rincão de toda a vida,
pois te venero em todos os matizes!

Ausente, há cinco lustros, não deixei
de te querer, querida, um só momento!
E só a ti, ó Musa, que beijei,
eu sempre amei, com todo o encantamento!

Agora, que te abraço, com saudade,
quero dizer-te, calmo e bem baixinho:
"Não dei meu coração a outra cidade,

nem dei o meu amor a outro alguém;
foi sempre teu, só teu, o meu carinho,
pois tu bem sabes que te quero bem!"
****************************************

BODAS DE PRATA

Cinco lustros completamos,
nesta data, de carinho!
Abençoa, Santo Antônio,
nossa casa, nosso ninho!

Neste dia, festejamos
nosso lindo matrimônio.
Não sabemos viver juntos,
sem o nosso Santo Antônio!...

Santo Antônio, nosso Amigo,
escuta o que te pedimos:
Faze nossa a Terra inteira,
pelo amor que construímos!

Finalmente, Santo Antônio,
nosso caro Padroeiro
santifica o nosso lar
e os lares do Mundo inteiro!
****************************************

BRASIL

Bendita Pátria, que acolheu Vieira,
de Portugal, estrela esplendorosa;
querida Terra, linda e hospitaleira,
que deu à luz o ilustre Ruy Barbosa:

"Eu te venero, sim, do Norte ao Sul,
Rincão querido, que estudou Camões!
E mais te quero, com teu céu azul
para Euclides da Cunha e o seu "Os Sertões"!

Tu leste, sempre, o perenal Camilo,
que os lusitanos imortalizaram.
Mas tens, à frente, um Castro Alves, filho
do Chão que, outrora, os lusos dominaram!

És, de todas, a Pátria que mais quero,
Brasil amado, céu de santa lida!
E filho teu eu sou e te venero,
eternamente, sim, por toda a vida!"
****************************************

QUADRAS

Quem vive trabalhando alcança Deus,
e não sente vontade de pecar.
For que te não ocupas, filho meu,
se a vida só tem graça no lutar!
- - - - - -
O sol nasce pra todos, nós sabemos,
mas todos os que querem trabalhar.
Os homens preguiçosos, nós só vemos
à toa, mundo afora, a reclamar.
- - - - - -
Seguir as leis de Deus é um dever,
que nasce com o autêntico cristão.
Quebrar seus mandamentos é não ter
direito de alcançar a salvação.
- - - - - -
As cartas são espelhos d'alma pura
e eu sempre te escrevi, sentidamente!
Por que me não escreves, "criatura",
se sempre me amaste, loucamente?
****************************************

RECIFE

Apoteótica cidade, alvissareira,
Recife deslumbrante, bela, encantadora!
Se já te chamam de "Veneza Brasileira",
aceita o título! Tu és merecedora!

Casa Amarela, Caxangá e o Longo Pina
são bairros lindos, que enobrecem teu conceito.
Boa Viagem, reluzente, é a menina
que nos seduz e nos conquista, por direito!...

Jamais olvidarei os coqueirais de Olinda,
que te projetam, ó Recife, mundo afora!
E as pontes que se alongam, a distância infinda,
eu nunca esquecerei, "Morena Sedutora"!

Tens tudo o que se faz mister e necessário:
tens alma, coração, calor, dignidade!
Belezas mil tu tens, em todo o teu rosário
de festas, de canções, de lendas, de saudade...

Se eu fosse filho teu, em versos te diria:
Ufana-te, Recife, robusta e viril!
Não vês que o Mundo é teu e não te contraria?
És linda, és um amor, és noiva do Brasil!

Fonte:
Aparício Fernandes (org.). Anuário de Poetas do Brasil – Volume 4. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1979.

Aparecido Raimundo de Souza (Comédias da Vida na Privada) Parte Dez


CONVERSA DE BOTAS BATIDAS

O SUJEITO ATRAVESSOU a rua e veio diretamente em direção onde o Miguelino estava à espera de um ônibus que o levaria de volta para casa. Do nada, sem mais nem menos, o desconhecido sem se dar ao luxo de dizer boa tarde, mandou a indagação.  Uma meio besta, sem nexo.

— Amigo, desculpe a ousadia. Posso lhe fazer uma pergunta?

Miguelino antes de responder mediu o estranho de cima até embaixo.

— Já fez. Mas tudo bem. À vontade. Em que posso ajudar?

— Desculpe de novo. Curiosidade. Você se acha um bom motorista?

— Sim.

— Sabe tudo sobre trânsito?

— Dá para o gasto.

— Saberia explicar a diferença de um motorista excelente para um condutor bom de roda, ou discernir um volante ruim de um chofer literalmente péssimo?

Miguelino pasmou. Era só o que faltava, àquela hora da tarde.

— Como assim? Que diferença é essa exatamente a que o prezado se refere?

— Bem. O que quero, na verdade saber, é o que discerne, ou o que faz a diferença entre um ás do volante, de um bom motorista para um condutor mais ou menos e aquele simplório “James” considerado extremamente porcalhão e relapso?  

Miguelino pensou um instante.   

— O tempo da carta dele. Eu acho...

— Carta? Que carta?  

— A carta de dirigir.

— Você quer dizer carteira?           

— Isso.

— Ou seria licença? Talvez você prefira chamar o documento de habilitação, pois não?

Miguelino manteve a alternativa que achava a mais conveniente. Insistiu, pois, com firmeza no que havia falado.   

— Carta.

— Carta nada tem a ver com volante — observou o desconhecido passando da discussão à semântica. — Ou tem?

— É uma das maneiras de expressar quem vive com as mãos na massa.

— Na massa ou no volante?

Miguelino deduziu que o cidadão não batia bem da bola.  Louco de pedra ou algo pior.

— Complicado, isso — disse evasivamente.

— Nem tanto... — insistiu o recém-chegado. Há quanto tempo o amigo dirige?

— O quê?   

— Há quanto tempo dirige?

Miguelino chutou um período qualquer, sem pensar. Que diferença faria?

— Dez anos.            

— Já bateu em alguém?

— Não. Fui batido.

— Atropelou alguém?

— Me atropelaram.

O anônimo riu dessa resposta.

— Atropelado? Por quem?

Miguelino mandou bala na primeira idiotice que lhe veio à mente.

— Por um cara de cavalo.

O estrangeiro se desfez num gesto engraçado. Sorriu matreiro.

— Por um cara de cavalo?  Como é lá isso?

— Um cara lá ia pela pista no mesmo sentido que eu, puxando um vavalo...

— Como? — Vavalo ou cavalo?

— Perdão. Quis dizer cavalo.

— Pensei tivesse ouvido errado. Lembra que tipo de cavalo?

Miguelino começou a perder a paciência. “Que raios de homem chato!”.

— De quatro patas.

O outro não deixou por menos. Insistiu:

— E ele tinha rabo?

— Sim. Um bem comprido. Parecia nervoso.

— Quem parecia nervoso? O homem ou o cavalo?

Miguelino pirou na batatinha. De vez. Decididamente aquele não seria seu final de tarde de voltar para o aconchego do lar em paz e sossegado.

— O rabo!

O heteróclito coçou a orelha esquerda.

— Não entendi a colocação...

— Eu explico. O rabo do bicho não parava de se abanar.

— Amigo, um detalhe. Bicho ou animal?

— Os dois.

— E o elemento que conduzia o cavalo, lhe prestou assistência?

Miguelino nessa altura do campeonato concluiu que efetivamente o sujeito gozava da sua pessoa. Antes de mandar o infeliz para os quintos, resolveu se fazer de desentendido. Aquiesceu pressuroso:

— Ele não me deu nenhuma assistência.  O cavalo sim. Foi gentil, amável, cortês. Nunca vi igual. Com todo cuidado me acomodou nas costas dele e marchou a todo galope para o pronto socorro. Seu dono ficou sentado no meio fio, a cabeça enterrada nas mãos. Parecia chorar a criatura.

— Sei, sei... E no pronto socorro, como se deu a chegada?

— Um corre-corre danado.

— Como assim?

Miguelino não deixou a prosa esfriar. Levou na gozação. A mesma que parecia vir de seu interlocutor.   

— O cavalo, suado em bicas, entrou direto na área da recepção.  Correu até o balcão e lascou uma boa tarde à moça. Nessa hora, as pessoas que estavam ali, aguardando, na fila de espera, ao darem de cara com aquele animal, ficaram apavoradas, espantadas e boquiabertas. A debandada, por conta disso, foi geral. Um corre-corre dos diabos.

— Imagino! Continue...

— O tumulto se agigantou mais ainda quando o pobre quadrúpede, furioso com a tal da atendente —, acredite meu amigo, ela permaneceu alguns minutos totalmente congelada —, acho que a ficha custou a cair e ela de fato entender que um cavalo falava com ela, literalmente. Estatelada, como se tivesse visto o tinhoso, gritou. O cavalo, agoniado e aflito, deu uma relinchada básica, empinou estabanadamente para trás e quase não conseguiu me suster em seu colo. Não fui ao chão, por pouco.

— Colo? Você disse colo?!

— Lombo. Lombo. A debandada, nesse ponto, se generalizou mais ainda. Em questão de um abrir e piscar de olhos, não ficou viva alma na mesa da admissão para contar história. O segurança de plantão pulou por uma janela e levou junto uma funcionária que passava pano no chão. Ah, havia um senhor de cadeira de rodas...

— E ai? Vá em frente, complete...

— Esse senhor caiu sentado no cimento.

— Como? Não estava na cadeira de rodas?

— Por certo. Levada pelo medo, ou sei lá o que, a cadeira saiu em corrida desenfreada, arrastando, junto um balão de oxigênio.

— Inacreditável! Simplesmente inacreditável!

— E não parou ai.

— Teve mais?

Miguelino procurou causar impacto no que diria a seguir. Fez pose. Extremamente sério e compenetrado, lembrava uma lagartixa solitária numa parede esverdeada, mais solitária que uma mulher recém-enviuvada.

— Estou perguntando. Ficou mudo? Perdeu a língua? Desembucha. Teve mais?

— Claro. Alguém lá fora chamou a polícia.

— Sim?

— O guarda chegou, e como não tinha ninguém pra fazer perguntas, um dos militares, ato contínuo, prendeu o cavalo e eu tive que ir junto na viatura para prestar esclarecimentos na delegacia.

— Credo, que loucura! — E ai, continue. — Ao chegar à frente da autoridade...?

— Não me lembro de mais nada.

— Como assim, não se lembra de mais nada?!

Miguelino trouxe à baila a carta que escondia na manga.

— O despertador na cabeceira da minha cama começou a tocar... e eu, sobressaltado, acordei.

Fonte:
Texto enviado pelo autor, de:
Aparecido Raimundo de Souza. Comédias da vida na privada. RJ: Editora AMC-GUEDES, 2020.

domingo, 23 de agosto de 2020

Varal de Trovas n. 356

 

Stanislaw Ponte Preta (A Garota-Propaganda, Coitadinha!)


Já passava das oito horas da manhã e a garota-propaganda dormia gostosamente sobre o seu colchão de Vulcaspuma, macio e confortável, que não enruga nem encolhe, facilmente removível e lavável. Foi quando o relógio despertador começou a tilintar irritantemente (Você nunca dará corda num Mido).

A pobrezinha, que tivera de aguentar a cantada de um patrocinador de programa (Agência Galo de Ouro — quem não anuncia se esconde) que prometera um cachê melhor, caso ela ficasse efetiva na programação, levantou-se meio tonta. Fora dormir inda agorinha. Estremunhada, entrou no banheiro, colocou pasta de dentes na escova e pôs-se a escovar com força. Ah... que agradável sensação de bem-estar!

Depois do banho, abriu a cortina do box, que parece linho mas é linholene, e foi até a cozinha tomar um copo de leite. Tinha que estar pronta em seguida para decorar páginas e páginas de texto que apanhara na véspera, no departamento comercial da televisão. Abriu a geladeira de sete pés, toda impermeável, com muito mais espaço interior e que você pode adquirir dando a sua velha de entrada (a sua velha geladeira, naturalmente). Dentro não havia leite: — Não faz mal — pensou (Tudo que se faz com leite, com Pulvolaque se faz).

O diabo é que também não tinha Pulvolaque. Procurou no armário uma lata daquele outro que se dissolve sem bater, mas também não achou. Tomou então um cafezinho mesmo e correu ao quarto para se vestir e arrumar o cômodo o mais depressa possível. Iria à cidade apanhar os textos de uma outra agência que precisavam ser decorados até as três, além disso tinha que almoçar com um diretor de TV, a quem fingia aceitar a corte para poder ser escalada nos programas.

Arrumou as coisas assim na base do mais ou menos. Fechou o sofá-cama, um lindo móvel que ocupa muito menos espaço em sua residência, e procurou o vestido verde que comprara no Credifácil, onde você adquire agora e só começará a pagar muito depois. O vestido não estava no armário. Lembrou-se então que o deixara na véspera dentro da pia, embebido na água com Rinso, e o diabo é que o vestido, como ficou dito, era verde. Se fosse branco, depois ficaria explicado por que a roupa dela é muito mais branca do que a
minha.

Eram onze e meia quando chegou à cidade, graças à carona que pegara. Saltou da camioneta com tração dianteira e muito mais resistente, fez todas as coisas que precisava fazer numa velocidade espantosa e entregou-se ao suplício de almoçar com o diretor de TV.

Ali estão os dois, escolhendo o menu. Ele pediu massa e perguntou se ela também queria (Aimoré você conhece — pensou ela), mas preferiu outra coisa. Garota-propaganda não pode engordar. Comeu rapidamente e aceitou o copo de leite que o garçom sugeriu. Afinal, não o tomara pela manhã. Foi botar na boca e ver logo que era leite em pó, em pó, em pó...

Às três horas o programa das donas-de-casa. Às quatro, o teleteste que distribui brindes para você. De cinco às oito, decorar outros textos, de oito e meia às dez, tome de sorriso na frente da câmera, a jurar que a liquidação anunciada era uma ma-ra-vi-lha. Aceite o meu conselho e vá verificar pessoalmente. Mas note bem. É só até o dia 30.

Quase meia-noite e ela tendo de dançar com "seu" Pereira, do Espetáculo Biscoiteste. Um velho chato, mas muito bonzinho. O diabo era aquele perfume que saía do cangote de seu par. Um perfume inebriante, que deixa saudade.

Já eram quase três da matina quando ela voltou para o seu apartamento com sala, quarto, banheiro, box, copa, quitinete e área interna, tudo conjugado, que comprara dando apenas trinta por cento na entrada e começando a pagar as prestações na entrega das chaves. Finalmente, vai poder dormir um pouquinho.

E, aos pés do sofá-cama, faz a oração da noite: "Padre Nosso, que estais no Céu, muito obrigada pela atenção dispensada e até amanhã, quando voltaremos com novas atrações. Boa noite".

Fonte:
Stanislaw Ponte Preta. Dois amigos e um chato. Ed. Moderna, 1996

Trovas de amor 02

Organização: A. A. de Assis (Maringá/PR)

O meu amor é bonito,
é grande, imenso, sem fim!
É bem maior que o infinito,
mas cabe dentro de mim!
Gislaine Canales
- - - - - -
Amor se dá, não se vende,
não se compra, não se empresta...
Quem o compra se arrepende,
e quem o vende não presta!
Iraci do Nascimento e Silva
- - - - - -
Nosso amor é uma certeza
dentro do meu coração;
e a luz da paixão, acesa,
apaga a luz da razão!
Istela Marina Gotelipe Lima
- - - - - -
Há dois mil anos o brilho
de um grande amor sobressai:
– o sacrifício de Um Filho
pelos filhos de Seu Pai!!!
Izo Goldman
- - - - - -
Rosas tolas, tão vaidosas,
que em belas hastes vicejam...
Vem, amor, olha estas rosas,
quero que as rosas te vejam!
J. G. de Araújo Jorge
- - - - - -
Distante do olhar das ruas,
num sonho que me enternece,
em nosso céu brilham luas
que só o nosso amor conhece!...
João Freire Filho
- - - - - -
Sendo o amor uma batalha,
sentimos que, em sua trama,
não há vitória que valha
a rendição de quem ama!
João Rangel Coelho
- - - - - -
Se amor se paga com amor,
como diz ditado antigo,
meu benzinho, por favor,
acerte as contas comigo.
Jorge Murad
- - - - - -
Sempre que o amor se retira,
leva consigo a verdade.
E, pouco a pouco, a mentira
faz companhia à saudade.
José Fabiano
- - - - - -
Fizemos na vida ingrata
do nosso amor um tesouro:
os filhos nos deram prata!
Os netos nos deram ouro!
José Maria Machado de Araújo
- - - - - -
Se a vida pede uma pausa,
faça isso, por favor,
ou por amor a uma causa,
ou por causa de um amor!
José Verney
- - - - - -
Tenho um ciúme daninho
do meu amor, belo moço...
E até do seu colarinho,
porque lhe abraça o pescoço!
Lourdes Póvoa Bley
- - - - - -
Chovia naquele dia
como nunca aconteceu.
Eu liguei?... Me divertia:
teu amor me protegeu!
Lourivaldo Perez Baçan
- - - - - -
Menino mau, caprichoso,
vingativo, enganador,
insolente, mentiroso,
cego e volúvel – Amor!
Lúcia Lobo Fadigas
- - - - - -
Este amor que não buscamos,
amor – castigo e troféu,
se tem espinhos nos ramos,
tem flores que vêm do céu!
Luiz Otávio
- - - - - -
Só te peço amor sincero,
e o céu será todo nosso.
Se sou tua – que mais quero?
Se sou mulher – que mais posso?
Magdalena Léa
- - - - - -
O meu amor desmedido,
sem ter cais para ancorar,
parece um barco perdido...
longe da praia... a vagar...
Maria Lua
- - - - - -
Não deixe as cartas que eu mando
sem respostas, por favor,
porque é bom, de vez em quando,
reler mentiras de amor!
Maria Nascimento
- - - - - -
No grande páreo da vida,
o amor luta contra o ódio.
Não permita que a corrida
finde sem o amor no pódio.
Miguel Russowsky
- - - - - -
É tanto o amor que me invade
quando em seus braços estou,
que cada instante é saudade
do instante que já passou!
Newton Meyer
- - - - - -
Soprei. Apagou-se a chama.
Disse-te adeus em seguida.
– Quem diz adeus a quem ama
diz adeus à própria vida!
Olegário Mariano
- - - - - -
Era uma estrada deserta,
com muito barro... atolamos.
Não me lembro a data certa;
lembro o quanto nos amamos!
Olga Agulhon
- - - - - -
Mãos que imploram, na pobreza,
mãos que assistem seus irmãos,
quanto amor, quanta beleza
há no encontro dessas mãos!
Orlando Brito
- - - - - -
Ao que pede, à tua porta,
dá também tua afeição!
Um pouco de amor conforta
mais que um pedaço de pão!
Rodolpho Abbud
- - - - - -
Não me chames de senhor,
que não sou tão velho assim,
e ao teu lado, meu amor,
não sou senhor nem de mim!
Rodrigues Crespo
- - - - - -
No amor minha aprendizagem
com tantos erros se fez,
que não tenho mais coragem
de aprender tudo outra vez.
Sebas Sundfeld
- - - - - -
Levo no amor coisas boas,
sem jamais amar a esmo,
e amo todas as pessoas,
a começar por mim mesmo.
Sérgio Bernardo
- - - - - -
Tua alma desperta em mim
tanta calma e tanto ardor,
que, se o amor não for assim,
eu mudo o nome do amor!
Sérgio Ferreira da Silva
- - - - - -
São testemunhas caladas
de nosso amor e carinho
as duas letras bordadas
no velho lençol de linho.
Thereza Costa Val
- - - - - -

Por mais que o progresso iluda,
deturpe e inverta valor,
o que Deus fez ninguém muda:
o amor será sempre amor!
Vanda Fagundes Queiroz
- - - - - -
Se falta luz ou calor,
para isso tem saída...
A falta do teu amor
me apaga e congela a vida!
Vânia Souza Ennes
- - - - - -
Vive o mundo, hoje, perplexo,
um tempo demolidor,
em que a volúpia do sexo
destrói o encanto do amor!
Waldir Neves

Fonte:
A. A. de Assis (organizador). 60 Trovas de amor. Portal Cá Estamos Nós. http://carlosleiteribeiro.portalcen.org Agosto de 2005.

Lima Barreto (Congresso Pamplanetário)


Urubu pelado não se mete no meio dos coroados
Ditado popular

De tal forma se haviam multiplicado os congressos, que foi preciso ser original. Dentro de cada um dos oito planetas, desde o mais bronco, que me parece ser Vênus, até o mais inteligente, que naturalmente deve ser Netuno, não era possível reunir um que não fosse a milésima repartição dos outros anteriores.

Congressos nunca foram coisas de primeira necessidade; mas a necessidade do espetáculo tem em todos nós tão fortes exigências como desvios convenientes. Demais, Júpiter estava em tal estado de adiantamento que precisava mostrar-se ao sistema todo. Produzia por ano 200.000$000 de toneladas de aperfeiçoadas farpas de bambus (específico contra as dores de dentes); e os seus filósofos e escritores, graças às modernas máquinas elétricas de escrever, abarrotavam os armazéns das estradas de ferro com bilhões de toneladas de papel impresso. Houve um que, narrando todas as suas conversas e atos do ano, dia por dia, hora por hora, minuto por minuto, segundo por segundo, escreveu uma obra de 68.922 volumes, com 20.677.711 páginas, das quais 3.000.000 alvas e limpas — as melhores! — significavam as horas de seu sono sem sonhos.

O autor não omitiu nelas nem as ordens aos criados, nem tampouco as frases vulgares que trocamos ao cumprimentar. Tudo registrou porque, dizia ele, isso aumentava o peso da obra, e, portanto, o seu valor. Era unicamente Júpiter que estava assim: o resto dos satélites do Sol vivia sofrivelmente... Como, porém, houvessem descoberto que todos eles estavam ligados por uma força oculta que, embora influindo mutuamente sobre todos eles, pesava mediocremente sobre os destinos particulares de cada um; e, como também fosse preciso ser original nos congressos — Júpiter propôs, e todos os planetas restantes aceitaram, a reunião de um Congresso Pamplanetário.

Era preciso, diziam os embaixadores de Júpiter, formar um espírito planetário, em contraposição ao espírito estelar. Com isso, eles escondiam o secreto desejo de vender aos outros planetas farpas aperfeiçoadas, remédios para calos, toneladas de um literário papel de embrulhos e outros produtos similares de sua atividade sem limites, não esquecendo o fito de conquistar alguns destes últimos ou parte deles.

Todos os outros não viram bem esse propósito de Júpiter; mas este lhes venceu a resistência convencendo-os de que deviam ser originais e chamar a atenção do Universo... O mundo estelar não nos debocha? Altair não está sempre a rir-se sarcasticamente de nós?

Aldebarã não nos ameaça com seu rubor? Sirius não nos desdenha? Havemos de lho mostrar.

A reunião — ficou decidido — teria lugar na Terra. Não porque a Terra fosse muito poderosa, mas porque, nos últimos anos, ela instalara nos seus polos uma imensa buzina que gritava para as estrelas — "Sou o primeiro planeta do orbe, tenho estradas de milhões de metros: sou o paraíso do Universo", etc., etc.

A buzina era indispensável, visto que os caminhos, palácios, jardins e teatros, etc. se destinavam aos extraterrestres e tinham por fim atraí-los, no pensamento de que os estranhos viessem trazer a segura prosperidade dela — a Terra.

O seu povo, todos conhecem-no: é uma gente cheia de uma nevoenta poesia, tema, loquaz, um tanto indolente, mas liberal, por ser relaxada, e generosa, por ser liberal. São defeitos e são qualidades, mesmo porque, para os povos, não há defeitos nem qualidades; há características, e mais nada.

Os de Júpiter não são assim; são rígidos, duros e frios; e têm dois sentimentos dominadores: o do enorme, que é o seu critério de beleza, e o do dourado.

Um habitante do grande planeta, uma vez na Terra, ao ver pelo crepúsculo o céu banhado de ouro liquefeito, esperneou de tal modo e de tal modo subiu às montanhas para colhê-lo que nos antípodas houve um terremoto. Em vendo a cor do ouro, eles saem bufando, com o olhar injetado, em estado de fúria; e saem matando, estripando a indiferentes, a amigos, a parentes e até aos pais; e — curioso — só querem ouro para construir caixões de seis léguas de alturas e seis polegadas quadradas de base. Eis como sentem a beleza... A isso juntam um horror pelos gatos, um ódio idiota e histérico; no entanto, os "gatos" são bons; se velhos, têm a candura de criança; se crianças, uma grácil espontaneidade de encantar. Mesmo se não são melhores do que os seus companheiros de planeta, são perfeitamente iguais a eles.

Contudo, são doridos e auditivos, o que lhes dá a faculdade de criar uma poesia e uma música próprias, das quais os de Júpiter se aproveitam, à míngua de poder eles mesmos criar essas manifestações artísticas, pois a sua insensibilidade não o permite. Mas os jupiterianos não os toleram, porque podem os "gatos" votar, embora fossem os próprios algozes destes que lhes tivessem dado esse direito.

Por qualquer de cá aquela palha, os estúpidos jupiterianos se reúnem na praça pública e matam a pauladas, a fogo, à foice, sem forma de processo alguma, sob o pretexto de que o "gato" queria casar ou namorava uma filha deles. Lá se chama banditismo e é coisa parecida com o linchamento yankee.

Um viajante, entretanto, que lá esteve, achou esses “gatos" excepcionalmente tímidos e doces, admirando-se que lá não houvesse mais crimes, provocados pelos sofrimentos e humilhações que eles sofrem. Perseguem-nos de um modo bárbaro e covarde. Chamam-nos de poltrões, mas, quando querem guerrear, socorrem-se deles e os "gatos" se portam bem. Vem a paz, oprimem-nos, encurralam-nos mas, assim mesmo, eles crescem e multiplicam-se... Fraca raça!

Júpiter, como ia dizendo, acudiu ao grito da buzina e reuniu o congresso na Terra.

Na primeira sessão, logo os Jupiterianos falaram na fraternidade de todos os animais do Universo: homens e gatos, burros e jupiterianos, marcianos e raposos. Um principal de Júpiter até, a esse respeito, fez um discurso muito bonito. É muito cediça a manobra de Júpiter falar sempre em liberdade, fraternidade, etc. Certa vez, ele declarou guerra a Saturno, para libertar-lhe os povos. Logo, porém, que o venceu, restabeleceu a escravatura que já estava absolvida. Tal e qual a América do Norte fez com o Texas, província do México, em 1837.

Como todos esperavam, os trabalhos do congresso prosseguiram com grande atividade.

Além de tratar do estabelecimento de pontes pênseis que ligassem todos os planetas entre si, o congresso votou as seguintes conclusões sobre a perfeita fraternidade animal, estabelecido nos seguintes pontos:

a) Não se deveria mais comer qualquer animal (boi, carneiro, porco);

b) As gaiolas dos pássaros deveriam ser aumentadas do dobro, no mínimo;

c) Na caça, uma espingarda não poderia ser carregada com mais de seis grãos de chumbo;

d) Generalizar 05 jogos de bola na sociedade dos cabritos.

O programa era vasto e piedoso; e até um principal de Júpiter, a esse respeito, orou e citou largamente a Bíblia, tanto o Antigo como o Novo Testamento, fazendo pena não haver ali muitas beatas que pudessem chorar com tal homem, tão digno de vir a substituir são Vicente de Paulo, porque não é próprio citar Sáquia-Múni.

O povo da Terra — boa gente! — exultou e encheu-se de orgulho por poder mandar às estrelas este grito: "Não comemos mais bois!! Nada temos com as estrelas!"

Houve festas: banquetes e bailes para alguns; luminárias para quem quisesse ver as fantasmagorias surpreendentes nos órgãos de publicidade.

No Céu, porém, Sírius sorriu e Altair mais amarela se fez. Da Plêiade, duas estrelas empalideceram de espanto, e a Aldebarâ quis avisar aos néscios, mas não pôde.

Júpiter vendeu a todos os seus irmãos toneladas de farpas, de remédios para calos, de papel literário; e isto com alguma violência, que me eximo de contar. De passagem, digo-lhes que ele ocupou um pedaço de Mercúrio...

Se tais produtos não estavam completamente envenenados, foram, no entanto, deletérios. A Terra banalizou-se; Marte perdeu a inteligência; Vênus, o amor desinteressado; Netuno, a bravura generosa; os "gatos" de todos os planetas, contudo, vieram a gozar dos benefícios das instituições jupiterianas, isto é, foram expulsos da comunhão dos patrícios.

Sob os bons auspícios de Júpiter, foi assim que se fez a fraternidade animal em todo o sistema planetário. Sírius nunca mais cessou de sorrir.

Fonte:
Lima Barreto. Histórias e sonhos. 1920.

sábado, 22 de agosto de 2020

Varal de Trovas n. 355

 

Arthur de Azevedo (Um Desastre)


Meteu-se em cabeça do pobre Raposo que havia de ser o marido da senhorita Ernestina Soares, e verdade, verdade, ele tinha por si os pais da moça, que o sabiam possuidor de um bom número de prédios e apólices e viam na sua pessoa o ideal dos genros.

A senhorita não era da mesma opinião, em primeiro lugar porque gostava muito do primo Enéias, que não tinha apólices nem prédios, mas era um bonito rapaz e um mimoso poeta e, em segundo lugar, porque o Raposo, coitado!, pesava nada menos de cento e vinte quilogramas, isto é, tinha uma pança que o incompatibilizava absolutamente com um ideal de moça.

O Soares - honra lhe seja! - não era homem que obrigasse a filha a casar-se contra a vontade; entretanto, procurou convencê-la de que a corpulência do Raposo não era um pecado nem um delito, nem uma vergonha, e melhor vida teria ela em companhia dele que na do primo Enéias, um troca-tintas que não valia dois caracóis.

- Não, papai! mil vezes não! Exija de mim tudo quanto quiser, menos que eu me case com uma barriga daquelas!

O Soares, que tinha as suas leituras, apontou à filha o exemplo de muitos homens ilustres que foram grande barrigudos, mas tudo em vão: decididamente a pequena estava enrabichada pelo primo Enéias.

O mais que o velho obteve foi fazer com que a filha recebesse, em companhia dos pais, a visita do Raposo.

- Tu não o conheces! Olha que é um homem de espírito e um cavalheiro de fina educação! Isso de mais barriga ou menos barriga não quer dizer nada! Vou convidá-lo para vir tomar uma noite dessas uma xícara de chá em nossa casa. Durante a sua visita examiná-lo-ás de perto. Quem sabe? Talvez se modifiquem as tuas impressões. Se não se modificarem, paciência - casa-te com quem quiseres e sê pobre à tua vontade!

Na noite aprazada o landau do Raposo conduziu-lhe a pança até à casa do Soares, e o capitalista foi recebido com muita amabilidade por toda a família.

Ele sentou-se em uma delicada cadeira de braços em que parecia não caber, e durante uma hora falou da sua vida, das suas viagens, das suas aventuras por esse mundo afora com tanta loquacidade, com tanta graça, com tanta verve, que efetivamente a senhorita esqueceu-se de que ele era gordo e começou a achá-lo simpático.

No fim daquela hora o primo Enéias estava quase esquecido; mas vejam os leitores de que depende, às vezes, o destino de um homem: quando, convidado a passar à sala de jantar, onde estava servido o chá, Raposo se ergueu, ergueu consigo a cadeira que ficou apertada entre os seus quadris, extraordinariamente dilatados por um largo repouso.

O desgraçado forcejou para arrancar a cadeira e não conseguiu. O Soares aproximou-se dele e começou a puxá-la com toda a força, enquanto o Raposo, curvado, agarrava-se ao umbral de uma porta como a um ponto de apoio.

Também o Soares não conseguiu tirar o pobre Raposo daquela prisão.

- Não puxe! não puxe mais! - gritou ele. - Olhe que quebra!...

E, agachado, esgueirou-se pela escada abaixo, sem se despedir de ninguém, levando consigo a cadeira.

A porta esperava-o o landau onde ele entrou, calculem com que dificuldade, gritando ao cocheiro que o levasse à casa, enquanto alguns transeuntes, espantados, riam às gargalhadas vendo aquele barrigudo, no carro, de gatinhas, com os largos quadris comprimidos entre os braços de uma cadeira.

A senhorita, desde que o Raposo se ergueu até que o viu entrar no landau, riu tanto, tanto, que foi preciso desapertar-lhe o colete.

Uma hora depois um criado restituía ao Soares a maldita cadeira.

Naquela casa nunca mais se falou no Raposo.

 A senhorita continua a namorar o primo Enéias, que está à espera de um emprego no Povoamento do Solo para se poder casar.

Fonte:
Arthur de Azevedo. Contos vários.

Trovas de amor 01

Organização: A. A. de Assis (Maringá/PR)

Num tempo em que tanta guerra
enche o mundo de terror,
benditos os que, na Terra,
semeiam versos de amor!
A. A. de Assis
- - - - - -
Tu vais passando orgulhosa!
Nunca vi soberba assim.
– Ai de ti, por tanto orgulho;
por muito amar-te, ai de mim!...
Adelmar Tavares
- - - - - -
Nós tanto nos pertencemos,
nosso amor vai tão além...
que nós dois já nem sabemos
qual dos dois é mais de quem!
Almerinda Liporage
- - - - - -
Em meu peito ponho escoltas
contra um amor sem razão,
dando, de vez, duas voltas
na chave do coração!
Amália Max
- - - - - -
Meu amor por ti (que mágoa)
se evaporou de repente,
tal se fosse um pingo d’água
caído num ferro quente...
Américo Falcão
- - - - - -
Eu amo a vida, querida,
com todo o mal que ela tem...
Só pelo bem, que há na vida,
de se poder querer bem!
Anis Murad
- - - - - -
Se aos meus agrados te furtas,
vou noutra porta bater...
As horas de amor são curtas;
não tenho tempo a perder!
Antônio Sales
- - - - - -
Solta as cordas do rancor,
se queres a paz de volta.
Mais vale um laço de amor,
do que mil nós de revolta!
Arlindo Tadeu Hagen
- - - - - -
O amor é como fumaça:
cobre tudo em derredor;
tonteia, asfixia e... passa,
mas quando passa é pior...
Beatrix dos Reis Carvalho
- - - - - -
O pranto do amor desfeito,
motivo do meu desgosto,
rompe a barragem do peito
e se esparrama em meu rosto.
Campos Sales
- - - - - -
Ó coração, tua dor
tu mesmo é que vais buscar...
Assim que parte um amor,
vais outro amor procurar.
Carlos Guimarães
- - - - - -
No amor o tempo se gasta
com medidas desiguais:
– se estás longe, ele se arrasta,
se perto, corre demais!
Carolina Ramos
- - - - - -
Busquei no amor, não me iludo,
a desventura que quis.
Nesta vida, amar é tudo,
é mais do que ser feliz!
Cléa Marina de Meneses
- - - - - -
O amor ficou no passado...
– Hoje eu sei por que ficou:
o nosso encontro marcado,
o destino desmarcou!
Clenir Neves Ribeiro
- - - - - -
Meu amor é tão sabido,
que eu só me dou por achado
quando me sinto perdido
por encontrar-me ao teu lado...
Colbert Rangel Coelho
- - - - - -
Amar – verbo transcendente
que a gente conjuga a dois...
É um sorriso no presente
e são lágrimas, depois.
Colombina
- - - - - -
Tinha portas de poesia
e janelas de luar
essa morada que um dia
deixou meu amor entrar.
Delcy Canalles
- - - - - -
Repartido pelo meio,
à moda de bissetriz,
amando a duas não creio
que possa alguém ser feliz.
Diamantino Ferreira
- - - - - -
Só mudou em nossa vida
de amor, ternura e desvelos
a chegada impercebida
da neve em nossos cabelos!
Dorothy Jansson Moretti
- - - - - -
Mocidade, quem me dera
retomar, com teu calor,
um pouco de primavera
no meu inverno de amor!
Durval Mendonça
- - - - - -
Renunciei por amar-te
e, em parte, por não supor
que as renúncias fazem parte
de quem se parte no amor...
Edmar Japiassú Maia
- - - - - -
Pago juro, imposto, empenho,
ações de qualquer valor,
e entrego tudo o que tenho
por um instante de amor!
Eduardo A. O. Toledo
- - - - - -
Tu me propões cessar fogo
e eu te proponho atiçar,
porque o nosso amor é um jogo
que é fogo de se apagar!
Elisabeth Souza Cruz
- - - - - -
Amor – a mais bela face
das faces que a vida tem...
Uma lágrima que nasce
quando se lembra de alguém!
Elton Carvalho
- - - - - -
Meia luz... noite... a vidraça...
a cama... o beijo... e depois...
um brinde... o champanhe... a taça...
o amor... o sonho... nós dois.
Flávio Roberto Stefani
- - - - - -
Sei que os motivos são poucos,
sei que as razões também são,
mas este amor nos faz loucos
e os loucos não têm razão!
Gerson César de Souza

Fontes:
A. de Assis (organizador). 60 Trovas de amor. Portal Cá Estamos Nós. http://carlosleiteribeiro.portalcen.org Agosto de 2005.

Cora Coralina (O Cangaceiro)


Aquela cidadezinha do Norte do Estado tinha sido, em todo tempo, teatro de velhas lutas políticas, partidárias, sociais e econômicas. Muita briga feia de homem ensopara de sangue a areia daquelas ruas descalçadas. Por nada, ninharia, toma-lá-dá-cá, eram tiros, facadas, pancadaria. A impunidade era a lei vigente da terra. Um ou outro pobre, desapadrinhado, era que, dentro das grades, justificava a existência da cadeia, ali. Agora, porém, estava tudo mudado, e a cidade, pacata e sossegada. Com a descoberta dos cristais do Chiqueirão e do Pium, distante 30 léguas, o pessoal de fora, bagunceiro e de instinto criminoso, tinha se passado todo para o cristal.

A cidade tinha feito, automaticamente, a higiene dos indesejáveis. Até o delegado, que ativava maior desordem, com sua valentia, ignorância e falta de prudência, tinha ido pra lá, onde, além de autoridade do novo distrito, sustentava sua meia-praça com um garimpeiro do Piauí.

Foi o tempo em que a gente firme, alicerçada e conservadora do lugar, de acordo com o prefeito, entendeu de procurar Seu Lilico, ótima pessoa, caridosa e muito de bem, para o cargo, acéfalo, de delegado de polícia. Seu Lilico refugou de entrada. Não tinha jeito para aquilo; não tinha traquejo, não tinha preparo, não desejava se meter num cargo que só viria a lhe dar aborrecimentos.

Os amigos insistiram. Não podiam ficar sem delegado. Era da Lei e, se o cargo havia de ir para outra pessoa que comprometesse o sossego do lugar, melhor seria que ficasse com ele, Lilico, que era da confiança de todos, Um assoprozínho na vaidade vence resistências depois de boas falas. Não havia mais jeito de recusar, e Seu Lilico acabou aceitando. Como era calmo, moderado, tímido mesmo, e sempre de justa razão, passou a haver ordem na cidade e a paz de Deus entre aquelas criaturas.

Foi quando chegou ali um caboclo com ares de jagunço nordestino. Chapéu de serigoba, rebatido na testa, a meio encourado e aferrado de suas armas. Sozinho, se aboletou num rancho largado na saída da cidade e por ali se deixou ficar sem pedir trabalho, sem conversar e procurar intimidades com o povinho da redondeza.

Aquela gente, desconfiada por natureza e acostumada, de velhas tradições, com criminosos, tiros e brigas, começou a achar no indivíduo, assim fechado, traços e parecença com um facínora perigoso, meio conhecido de uns tantos.

Vieram o fuxico, a agitação, o diz-que-diz. Correu, então, que o tal era um inimigo de Seu Balduíno, dono da Loja do Sol, de quando esse vivia em Carolina, no Maranhão, e comprava couro de bode. Que, por via de mulheres, ou de negócio, tinha vindo ali para ajustar com Seu Badô uma velha conta de rancor e tiros trocados.

Ninguém sabia nada ao certo; mas assim mesmo é que sempre se fez a história dos homens. Os repórteres do boato tomaram conta do assunto e o jornal falado das esquinas, com suplemento diário, passou a ter várias edições. A cidade se achou unida e coesa. Seu Badô era negociante estimado. Homem recursado, de crédito largo e preceituoso; e os amigos tinham várias folhas lançadas no grande borrador do balcão e que passavam, automaticamente, para a conta-corrente, onde dormiam, por tempo indeterminado e prazo longo, o tranquilo sono da espera. Por esta e mais aquelas, todos cerraram fileiras e juraram que Seu Balduíno não seria desacatado,

Ficou resolvido que se devia prender o cangaceiro que, pelo jeito e contado, era mesmo o Felinho, de Carolina, conhecido na zona como chefe de bando armado.

Havendo na terra um delegado, foram falar com ele. Queriam fazer tudo dentro da lei, civilizadamente, e aquela prisão só podia ser emanada de autoridade competente. Contaram o caso do cangaceiro que tinha vindo ali para matar Seu Balduíno e arrasar com a família do negociante. Acrescentaram mais endechas, mesmo que o Felinho - decerto era ele - estava armado de 32, rifle e lapiana e que seu bando jagunço pombeava as estradas, esperando o momento de se reunir para atacar a Loja do Sol, liquidando com Seu Badô.

Seu Lilico, que nada sabia, ouviu o caso com espanto e uma vaga tremura pelas pernas. Não esperava por aquela entalada. Como era homem de brio, amigo de Seu Badô e autoridade por aclamação, não achou por onde se virar e topou a parada; tanto mais que muita gente já estava ali na sala esperando a ordem de prisão.

Seu Lilico mandou chamar o cabo e os dois soldados do antigo destacamento que tinha se passado para o garimpo. Assinou o mandado e recomendou ao cabo que tivesse muita cautela e fosse com. muito jeito.

Um fuxiqueiro logo anotou que o homem fora avisado da prisão e que estava esperando os soldados, comendo fogo e com a mão na escorva. Seu Lilico pediu licença e se retirou para o quarto. Era homem de devoção e de preceito. Foi se ajoelhar nos pés de Nossa Senhora da Abadia, pedindo para se sair bem daquele aperto e, sobretudo, que não houvesse sangue de homem derramado.

Seu Lilico era congregado. Nas procissões era da opa e da vara do pálio, vara da frente. Não dava passada ou tomava deliberação sem apelar para algum santo protetor. Além de vários quadros pelas paredes, tinha oratório no quarto e, dentro de um antigo baú de tampa pesadona, uma linda imagem, novinha, da Virgem, que mandava vir de fora e para quem apelava em suprema instância.

Tinha despachado os mantenedores da lei com ordem de prisão para o cujo cangaceiro, parecido com o Felinho, facínora perigoso. Ali, sozinho no seu quarto, abriu o bauzão de tampa pesada e rezava contrito de joelhos, debruçados para dentro, onde estava a Senhora tão linda com a criança nos braços, pedindo que fizesse tudo correr bem, que mandasse o cangaceiro se entregar sem resistência, com as armas, os balázios, o facão e os canivetes e que o bando que pombeava a cidade se dispersasse sem tiros e fosse parar lá nos Piuns.

Que ele faria a novena e a romaria do ano, a pé e curtindo sede. Rezando assim, fervoroso e contrito, batendo no peito um mea-culpa mais cheio, esbarrou com o cotovelo na tampa mal-escorada do baú, que lhe veio duro na cabeça, na hora certinha em que passava um pião de boiadeiro, correndo a cavalo pela rua de sua casa, atrás de um boi assomado e gritando:

- Arreda minha gente, arreda, que é brabeza!...

E como o boi investia, alguns disparos foram dados. Com a pancada seca na cabeça e com a cavalhada, a gritaria e os tiros na sua rua, Seu Lilico viu foi o cangaceiro dentro de casa. Ali mesmo, ajoelhado com a tampa no cocuruto e arcado para dentro do baú:

~ Não faz isso comigo não. Seu Felinho... Não faz assim não, Seu Felis... Bem eu que não queria ser delegado... Não me mata, seu cangaceiro, eu mando relaxar sua prisão...

A mulher de Seu Lilico, que estava na cozinha, ouvindo aquele vozerio surdo no quarto, empurrou a porta e entrou. Levantou a tampa pesadona do baú e tirou o marido daquela atrapalhação. Bom delegado, Seu Lilico. Por ele não vinha mal ao mundo.

Fonte:
Cora Coralina. Estórias da casa velha da ponte.

Chaguri e Bertoletti (A Internet como Espaço Virtual para o Incentivo à Literatura)

Artigo de Jonathas de Paula Chaguri (PG-UEM/FAFIPA), Vanessa Alves Bertolleti (PG-UEM), Mário Luiz Neves de Azevedo (Orientador – UEM), em 2009.

1. INTRODUÇÃO

A Internet, este poderoso instrumento de comunicação e informação, vem se disseminando velozmente no mundo inteiro. Sua utilização se faz presente em diferentes setores da sociedade carregando, na sua essência, um potencial de impulsionar processos de mudanças paradigmáticas. Parece impossível imaginar um computador sem acesso a internet. Apesar de seu surgimento ser mais recente que a invenção do computador pessoal e a sua popularização ter ocorrido algumas décadas depois, hoje, a falta de acesso à grande rede torna um computador semelhante a uma televisão sem os telejornais, telenovelas e filmes, de fato muito incompleta. Os recursos da internet aplicados no ambiente educativo podem contribuir qualitativamente no desenvolvimento de novas posturas educacionais. Entretanto, para que ela possa ser usada pedagogicamente na sua plenitude, é fundamental que o educador domine esta tecnologia, ou seja, conheça seu potencial técnico para que possa explorá-la adequadamente. Muito se têm escrito sobre a ligação da educação com tecnologia e, com isto, levantado questões acerca do papel da escola e do educador na Sociedade Informática. Conforme Schaff (1991), o termo Sociedade Informática é utilizado para caracterizar uma sociedade onde tecnologias informatizadas se fazem presentes em todos os processos de atividades sociais, ou seja, a sociedade em que vivemos. Contudo, este trabalho não se preocupa em buscar respostas a essas questões, mas sim, objetiva-se relatar alguns caminhos de como a Internet pode ser um recuso utilizado por autores eleitores para uma expansão da literatura.

2. O COMEÇO DE TUDO

De acordo com Castro & Silva (2008) a internet começou a ser idealizada e criada entre os anos 60 e 70 pelo governo norte-americano em tempos de guerra fria, com a intenção de garantir segurança e agilidade na troca de dados entre bases militares. Passaram-se algumas décadas até a rede mundial de computadores ganhar a utilidade que possui hoje. Desde o início da Internet em termos mundiais, é registrada a criação de páginas de conteúdo voltado às atividades e criações dos próprios autores. Entre elas estão os ezines ou zines[1] eletrônicos, que por sua vez são a adaptação dos fanzines/zines impressos em papel, com conteúdo artístico e cultural não necessariamente profissional (CASTRO & SILVA, 2008). Contudo, estes tipos de publicação eram difíceis de serem encontradas devido a falta de ambiente virtual da época.

Basicamente duas palavras parecem ser essenciais para caracterizar o termo Weblog[2]: velocidade e facilidade. Essas duas características que compõe o Weblog na criação das páginas, na sua publicação, atualização e principalmente na interação com os leitores. “De acordo com a idéia de publicação de conteúdo original, livre e amador, o termo Weblog  foi concebido pelo americano Jorn Barger em 1997” (CASTRO & SILVA, 2008, p. 694).

O termo Weblog é a justaposição de duas palavras inglesas web (rede, sinônimo de Internet) e log (registro). Este termo é para designar um tipo especial de site, que mostrava informações em ordem cronológica (diária), e misturava a tradicional estruturadas páginas com mecanismos de interação. Em 1998 estes tipos de páginas se multiplicaram e foram surgindo páginas na internet como The Eatonweb Porta de Brigite Eaton e Blogger.com [3] criado pela empresa Pyra Entertainment de Evan Willians, que, além de fornecer um portal para sites com os critérios acima descritos, posteriormente oferecia ferramentas para novas criações destes tipos de site, com facilidades jamais vistas na Internet. Assim, passa a surgir os primeiros editores de Weblogs na Internet. Peter Merholz, respeitado jornalista americano, em 1999 disse ser inevitável que a pronúncia de Weblog passaria para somente blog e o editor de Blog para Blogger como realmente ocorreu em todo o mundo (CASTRO & SILVA, 2008).

Desse modo, através dos primeiros Blogs em 1999 a mídia passa a dar mais atenção a essa forma de expansão de ideia de publicação de conteúdo original, livre e amador criando os primeiros softwares[4] como o Blogger.com que possibilitava a criação e manutenção de um Blog, mais fácil, sem qualquer conhecimento e/ou custo desse recurso na Internet. Neste sentido, os Blogs são páginas de Internet que são atualizadas com frequência e seus conteúdos dependem unicamente do que o autor desejar publicar. A maioria deles possui um sistema de comentários para cada entrada, sendo o post [5] do Blog em que o visitante pode exprimir sua opinião em tempo real sobre o que leu. A liberdade de expressão e a rápida recepção da resposta são o ponto forte do Blog. O autor pode publicar o que quiser, sem intermediários e obter respostas de qualquer público, anonimamente ou não.

Alguns Blogs narram apenas fatos do cotidiano irrelevantes para a maioria das pessoas. Outros têm um tema fixo, como por exemplo, um seriado de televisão. Ainda, há os que simplesmente não têm tema, abordando de tudo um pouco e ainda os jornalísticos, cômicos, políticos, críticos e dentre outros.

Houve um significante crescimento dos Blogs nos últimos anos, e isso, levou com que as ferramentas dos blogs também se expandissem para sanar as necessidades dos usuários para um melhor layout [6] do texto publicado no Blog. Assim, uma das ferramentas que consolidou o uso diário dos Blogs na Internet foi o permalinks [7] que possibilita a participação de mais de um autor em um mesmo Blog dando início aos Blogs coletivos. Também o microblogging outra ferramenta criada para dar apoio aos usuários de Blogs que por sua vez, possibilita a criação de uma página, muitas vezes interligada ao Blog de outro autor, na qual só se publica posts de até 140 caracteres.

3. OUTROS RECURSOS

Além dos Blogs, cuja criação está ao alcance de literalmente qualquer pessoa com acesso à Internet, há além das revistas e periódicos virtuais os hipertextos [8].O hipertexto possui uma natureza especial que aponta algumas características determinantes próprias.

a) O hipertexto é um texto não-linear: apresenta uma flexibilidade desenvolvida na forma de ligações permitidas/sugeridas entre nós que constituem redes que permitem a elaboração de vias navegáveis. (...)

b) O hipertexto é um texto volátil: não tem a mesma estabilidade dos textos de livros, (...) e todas as escolhas são tão passageiras quanto às conexões estabelecidas por seus leitores, sendo um fenômeno essencialmente virtual;

c) O hipertexto é um texto topográfico: não é hierárquico nem tópico, por isso ele é topográfico (...) um espaço de escritura e leitura que não tem limites definidos para se desenvolver;

d) O hipertexto é um texto fragmentário: consiste na constante ligação de porções em geral breves com sempre possíveis retornos ou fugas; carece de um centro regulador imanente, já que o autor não tem mais controle do tópico e do leitor;

(e) O hipertexto é um texto de acessibilidade ilimitada: acessa todo tipo de fonte, sejam elas dicionários, enciclopédias, museus, obras científicas, literárias, arquitetônicas etc. e, em princípio, não experimenta limites quanto às ligações que permite estabelecer;

(f) O hipertexto é um texto multisemiótico: caracteriza-se pela possibilidade de interconectar simultaneamente a linguagem verbal com a não-verbal (musical, cinematográfica, visual e gestual) (...).

(g) O hipertexto é um texto interativo: procede pela interconexão interativa (...) que, por um lado, é propiciada pela multisemiose e pela acessibilidade ilimitada e, por outro lado, pela contínua relação de um leitor-navegador com múltiplos autores em quase sobreposição em tempo real, chegando a simular uma interação verbal face-a-face (MARCUSCHI, 2002, p. 92).

Conhecendo as características desta tipologia textual fica evidente a inserção do Blog como “filiado” diretamente ao hipertexto. Na verdade todas as características hipertextuais se mostram presentes na maioria dos Blogs.  Contudo, a principal característica que difere tenuamente um Blog em relação aos outros tipos de hipertexto é a ênfase dada à interatividade. Segundo Snyder (1997) o hipertexto obscurece os limites entre escritores e leitores. Estes papéis de autor e leitor, no caso do Blog, se revezam em uma sobreposição em tempo real, levando a uma interação mais profunda e reflexiva de ambos, chegando em alguns casos a simular uma conversa face-a-face.

Tanto nos Blogs quanto em outros hipertextos o leitor é o protagonista. É ele quem escolhe seus caminhos, buscando as informações que deseja, no momento e na ordem que julgar mais interessante, ou seja, acaba a seu modo, também produzindo o texto à sua maneira. Contudo, no caso dos Blogs esta interação não se limita apenas a escolhas. Faz com que o leitor se sinta à vontade para dividir o espaço com o autor da página, colocando como desejar suas próprias ideias. Apesar de ainda não nos convencer do porquê do sucesso dos Blogs, principalmente entre os jovens, este tipo de ferramenta da Internet é um site comum e tão interessante quanto difícil de se montar. Neste ponto, portanto, parece surgir o principal motivo de seu sucesso: a facilidade de criação e atualização. Montar e atualizar um Blog são tarefas relativamente muito simples, requer o mínimo de informática e o máximo da criatividade. Basta que o interessado se cadastre gratuitamente em algum site editor de Blogs, escolha um modelo pré-definido e está apto a escrever sobre o que desejar com a certeza de seus textos estarem à disposição, instantaneamente, a milhões de pessoas mundo afora. Para atualizar há a mesma facilidade. O texto é escrito diretamente em espaços do site editor e em seguida é publicado, podendo ser inseridas figuras, fotos, ou diversas outras mídias, em uma mesma publicação.

Nada muito diferente é o sistema de comentários, disponível na maioria dos Blogs. Logo após a leitura de uma determinada publicação o visitante, por meio de um simples clique é convidado a expressar sua opinião sobre o que leu. Assim, é só escrever e publicar.

4. OS RECURSOS DA INTERNET NA EDUCAÇÃO

Conforme relata Pais (2002) o uso da informática na educação não se deve restringir às salas e laboratórios de informática. Especialmente devido ao fato de nem sempre existirem condições físicas e materiais adequados para essa prática, que abranjam todos os alunos uniformemente. A Internet é mais um recurso onde se pode encontrar vários tipos de aplicações educacionais. Conforme Moran (1998, apud FAQUETTI, & OHIRA, 1999, p. 49) destaca os seguintes recursos:

• de divulgação: a divulgação pode ser institucional, mostrando seus objetivos e o que a escola possui como também pode ser específica da biblioteca, dos professores, dos alunos ou de grupos organizados da escola que divulgam seus trabalhos, projetos ou ideias.

• de pesquisa: a pesquisa pode ser feita durante as aulas ou fora dela; na biblioteca ou nas salas de laboratório; pode ser uma atividade livre ou obrigatória, individual ou em grupo;

• de apoio ao ensino: nas atividades de apoio ao ensino pode-se obter textos, imagens, sons dirigidos ao programa desejado, utilizando-os como um elemento a mais junto com os livros, revistas e vídeos;

• de comunicação: novas práticas de comunicação são desenvolvidas nas escolas. Correio eletrônico, Web, listas e grupos de discussão são alguns dos recursos utilizados. Eles proporcionam encontros virtuais entre pessoas, possibilitam a formação de grupos específicos com interesses afins para trocas de informação.

Nesta perspectiva, a partir dos pressupostos apresentado acima é imprescindível refletir sobre o papel do professor. Como fazer com que os alunos tenham contato com novas tecnologias quando estas estão tão próximas de alguns e ao mesmo tempo tão distante de outros? Devemos considerar que a escola e a sala de aula não são as únicas instâncias do sistema de aprendizagem. O aluno recebe informações diariamente de diversas outras fontes não somente na escola, e isto, não pode ser ignorado pelo professor. Na verdade, é neste momento que surge a necessidade do aproveitamento dessas informações extra classe para um relacionamento mais profundo entre o novo e o já conhecido, efetivando assim o aprendizado por completo.

Por conseguinte, ao resgatarmos o objetivo central desse trabalho: relatar alguns caminhos de como a Internet pode ser um recuso utilizado por autores e leitores para uma expansão da literatura, nota-se que é possível propiciar incentivo a literatura como forma de cultura e de formação, utilizando meios que possibilitem a nossos alunos, leituras prazerosas e interessantes, não somente por meio de materiais impressos como livros didáticos e obras literárias, mas também, por meio de outros tipos de leitura, como a jornalística, crítica, esportiva, e sem dúvida, a ‘literária’, devido a sua importância na vida estudantil do aluno, e por ser um dos tipos de leitura mais difíceis de ser apreciada por eles. Assim, sabendo que a Internet é uma das principais fontes de leitura de nossos alunos por que não incentivar o uso de ferramentas como os hipertextos e Blogs para a expansão da literatura?

O professor jamais perderá sua autonomia, mas certamente receberá muito em troca, se orientá-los corretamente, ajudando-os a selecionar e diferenciar os bons conteúdos dos conteúdos fúteis e incompletos existentes em abundância na grande rede. Uma sugestão é promover leituras de hipertextos que contenham conteúdos literários que instiguem o aluno, aguçando sua curiosidade a pesquisar mais informações, a ponto de conseguirem por si só compreender que da diversidade, deve-se buscar qualidade. O que deve ficar evidente é a necessidade de uma atenção especial de nossa parte, educadores, às mudanças e às novidades que se fazem presentes no nosso dia-a-dia e, consequentemente, no dia-a-dia de nossos alunos. A partir do reconhecimento desta realidade fazermos o possível para aproveitá-la de modo eficiente em nossa prática docente, deixando de lado pré-conceitos que possam nos impedir de aproveitar as oportunidades. Que nos impeçam de enxergar no novo, algo instigante e ainda com muitas possibilidades a serem exploradas.

5. CONCLUSÃO

As novas tecnologias de informação, mais especificamente a Internet, têm contribuído para que mudanças paradigmáticas ocorram-nos diversos setores da sociedade. A educação também passa por este momento de transformação onde os conceitos são rediscutidos, reformulados e o novo está em construção. O uso da Internet como recurso de informação e comunicação nas instituições de ensino cresce gradativamente. Sua ampliação está vinculada a existência de uma infraestrutura adequada; ao conhecimento operacional da Internet e suas aplicações educacionais; e ao planejamento de sua inserção como instrumento de trabalho para respaldar os objetivos educacionais.

Neste sentido, o Mercado Editorial lança mão de uma união com rede de computadores a fim de propiciar uma divulgação de ideias, e até mesmo, em proporcionar uma circulação de textos literários para o alcance do público leitor. Assim, dentre os vários espaços em que se desenvolve o processo de expansão editorial de textos literários em um meio de divulgação em massa, destaca-se a“Internet”, que por meio de suas ferramentas possibilita a nossos alunos, leitura e construção de uma nova literatura, não nos moldes impressos, como revistas e livros didáticos e literários, mas em blogs, hipertextos, sites de revistas, livros e, especialmente, sob os olhos dos autores que lêem leitores que escrevem e todos que, nesse cenário, se destacam.

REFERÊNCIAS

CASTRO, A. G. M; SILVA, M. L. A Literatura Brasileira em Tempos de Internet: blogs, microblogs e outros logs. In: II Congresso de Linguagens em Interação. II CONALI. Universidade Estadual de Maringá, Anais..., 2º, 2008. p. 693-703.Maringá – PR.

FAQUETTI, M. F; OHIRA, M. L. B. A Internet como Recurso na Educação: contribuições da literatura. Revista ACB: Biblioteconomia em Santa Catarina. Florianópolis, V. 4, N. 4, 1999.

MARCUSCHI, L. A. O hipertexto como um novo espaço de escrita em sala de aula. In: Revista Linguagem & Ensino. Vol. 4. Nº 1, 2001. p. 79-111.

PAIS, L. C Educação escolar e as tecnologias da Informática.  Belo Horizonte: Autêntica, 2002.

SNYDER, I. Hypertext. The electronic labirinth. Washington. New York University Press, 1997.

SCHAFF, A. A sociedade Informática. São Paulo. Unesp/Brasiliense, 1991.
****************************************

NOTAS:

[1] Do inglês “fanzine”; tipo de impresso artesanal de conteúdo cultural/artístico.

[2] Equivalente a “registro (log) na rede (web)”, no sentido de registrar (algo escrito) na Internet.

[3] Um dos primeiros sites a hospedar e oferecer ferramentas específicas para blogs.

[4] É um programa de computador, pela qual o sistema/serviço é oferecido por determinado site.

[5] Denominado como “postagens”; cada um dos registros/textos inseridos pelo autor do blog.

[6] Parte visual design de um site, também chamada de template.

[7] Links permanentes que facilitam as referências. Nos blogs, estes links direcionam para um post específico, sem que o leitor tenha que buscar o conteúdo.

[8] É um texto eletrônico, isto é, um texto cujo espaço de escrita é a tela do computador e se pode fazer uma relação óbvia entre blog e hipertexto

Fontes:
CHAGURI, Jonathas de Paula; BERTOLLETI, Vanessa Alves; AZEVEDO, Mário Luiz Neves de. A internet como espaço virtual para o incentivo a literatura. In: SINAGEL – Simpósio Nacional de Pesquisa em Estudos Literários. 1, 2009, Maringá. Anais... Maringá, 2009, p. 591 -596.

Imagem = Prefeitura Municipal de Vila Velha/ES
https://www.vilavelha.es.gov.br/noticias/2020/07/biblioteca-virtual-com-classico-da-literatura-e-filme-ganhador-do-oscar-31093
 

Nota do blog: O artigo foi postado em sua íntegra com as devidas fontes. Apenas alguns parágrafos foram divididos para uma melhor visualização, para não ficar um bloco muito extenso.