quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Paulo Mendes Campos (Balé do pato)

Sete horas da manhã quando o guarda-vidas Alexandrino, moreno bem brasileiro, chegou à praia de Botafogo. Sorte sua, pois o fiscal apareceu como se acabasse de materializar-se. Era homem de fiscalizar os minutos.

Manhã de vento, mais para fria e nebulosa, anunciando pouco serviço. Com uma vareta o guarda-vidas começou a desenhar na areia um excelente elefante, no qual tinha jogado ao passar no café da esquina. Só faltava o rabo quando a vaga veio e devorou o elefante. Alexandrino dedicou-se a criar o coração de Jesus envolto em labaredas de amor, e ficou só.

Não por muito tempo, pois, erguendo a cabeça, viu que entrava para dentro da praia uma linda senhora loura, vestida com simplicidade esportiva e elegância. Até aí tudo normal. Mas acontecia que a bonita senhora chorava a cântaros, tocando o coração do bom Alexandrino. Assim mesmo, até aí tudo mais ou menos normal. Mas acontecia uma coisa mais grave: a mulher trazia nos braços brancos um pato, preto e gordo. A golpes de pescoço e das patas membranosas, o pato se rebelava, grasnando dramaticamente.

Na folhinha da casa de Alexandrino tinha uma estampa linda - Leda e o Cisne - e ele se riu do prazer engraçado que existe nas analogias estéticas. Discreto, o guarda-vidas assumiu um ausente perfil profissional e ficou por ali paquerando. A senhora passou por ele: olhos azuis, vermelhos de choro, lágrimas caindo em cima do pato, o pato berrando, automóveis buzinando, aviões decolando, mar bramindo - um desconcerto insano. Apesar dos pesares, ela ao passar o cumprimentou polidamente:

"Bom dia, senhor".

Tem fala de francesa, adivinhou Alexandrino.

A senhora entrou dentro d'água, molhando as sapatilhas de pano, inclinou-se, molhando a barra da saia, e assentou cuidadosamente o pato sobre o mar, como se fosse um pato de dar corda.

Depois de tentar manter a cabeça do pato virada para o lado do Pão de Açúcar, a mulher largou o bicho e levou as mãos às orelhas, como se o pato pudesse explodir, num gesto mesclado de aflição e esperança.

Deu-se que o pato avançou um pouquinho só para o mar, virou logo o rabo e nadou em busca da praia. Madame tentou sustar-lhe a passagem, estendendo-lhe duas mãos abertas, mas ficou batida no lance como um lateral europeu marcando Garrincha*. Mané (Alexandrino batizou o pato em cima da finta) deu mais umas vigorosas patadas e atingiu a areia, onde começou a correr - quem, quem - na direção da avenida das Nações Unidas. Esbaldando-se em lágrimas, a gentil senhora disse em francês uma palavrinha de cinco letras.

O dever de Alexandrino é salvar criaturas que se afogam no mar, mas dessa vez ele inverteu o caminho, correndo para salvar o pato que os automóveis decerto iriam atropelar. O pato subiu desengonçado o passeio e já ia cruzando a rua, quando o gari que passava agarrou Mané pelo pescoço num gesto seco e impecável. Foi tão depressa tudo que Alexandrino ficou estatelado diante do gari e sorriu depois com uma compreensão infinita. O outro servidor, num relâmpago, abriu a portinhola da carrocinha, deu um beijo no bico do pato e o meteu lá dentro. Assoviando o "Samba duma nota só", foi levando a carrocinha como se não tivesse acontecido nenhum milagre naquela manhã em Botafogo.

Na praia, como a estátua de amargura do soneto, a mulher ficou chorando. Contou a Alexandrino que chorava porque o marido dela tinha fugido. O banhista continuou não entendendo nada.

- Meu marido, senhor, foi-se embora - repetiu madame com um sotaque que a fazia mais desconsolada.

Alexandrino hesitou um instante, mas teve a coragem de colocar o problema que o tumultuava:

- Mas, madame, era seu marido... aquele pato preto?

- Oh, claro que não, senhor. Mãe-de-santo mandou jogar pato no mar. Venho de entrar pelo cano, senhor.

Ela explicou entre soluços: num terreiro de Vigário Geral tinham lhe falado que lançasse um pato na praia de Botafogo às sete horas em ponto duma sexta-feira; se o pato nadasse para o mar, marido voltaria; se fugisse para a terra, adeus marido. E choramingava:

- Le canard a nagé vers la plage... le canard  a nagé vers la plage...**

Entre compadecido e sagaz, Alexandrino vislumbrou um plano perfeito:

- Mas acontece, madame, que nos casos como esse o pato não pode ser preto.

- Perdão, senhor.

- Tem de ser branco.

- Senhor compreende macumba?

- Pai-de-santo, madame.

A francesa parou de chorar e perguntou onde poderia comprar um pato àquela hora. Ali no comecinho da rua São Clemente ficava um aviário. Um quarto de hora depois, ela voltava com um pato, branco e soberbo como o cisne de Leda.

Repetiu-se a cerimônia de lançamento de pato ao mar, e o pato, para alvoroço de ambos, nadou assustado para fora, e por lá ficou em evoluções mansas. A mulher, emocionada, segurou as duas mãos de Alexandrino, deu-lhe um beijo quase na boca, correu para a calçada, entrou num Peugeot verde-garrafa e arrancou em disparada.

Alexandrino despiu incontinenti a camiseta, nadou umas braçadas, deu um mergulho e reapareceu com o pato agarrado pela perna. Na perna ainda estava o cartão com o preço do pato: Cr$ 1 800.

Alexandrino se rindo de puro gosto trouxe o pato para a praia, enfiou o indicador na boca e proferiu um assovio longo e agudo com modulações. Como por encanto, um pretinho de doze anos brotou do café do outro lado, cruzou em velocidade incrível as pistas todas e freou a um passo de Alexandrino com o fôlego em forma:

- Lumumbinha, meu nego: leva este pato aqui lá em casa e manda a patroa caprichar no molho pardo. Passa aqui na volta e apanha uma nota.
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* Garrincha: Manuel Francisco dos Santos (1933-1983), grande talento do futebol brasileiro reconhecido mundialmente. Ponta-direita famoso por seus dribles desconcertantes.

** Le canard a nagé vers la plage: "O pato nadou em direção à praia"


Fonte:
Paulo Mendes Campos. O colunista do morro. RJ: Ed.  do Autor, 1965

Luiz Damo (As Faces da Trova) – 7 –

A saudade, tão discreta,
abala e nos causa dor,
mesmo não sendo direta
sempre afeta o nosso humor.
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Diz. o pequeno infrator;
nunca serei condenado!
Pois tem muito corruptor
que nunca acabou julgado,
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Em junho tem São João,
Pedro, Paulo e Santo Antônio,
este, pela tradição,
mediador do matrimônio.
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Enquanto nos deleitamos
com caprichos abissais,
das alturas vislumbramos
escombros e nada mais.
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É tão forte a dor do parto!
Diz à mãe, quem a conforte...
Sim, lhe responde e a reparto,
às que dizem, ser da morte!
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Forte luz sobre o horizonte
trouxe tantos imigrantes,
ígneo facho, ao sonho fonte
de paz aos perseverantes.
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Jamais o homem se acovarde
e impeça alguém de crescer,
nem a colheita retarde
pro fruto não se perder.
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Mais que dar um copo d'água
a quem sede voraz sente,
é não ser fonte de mágoa,
nem da dor uma vertente...
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Morte, um eterno Inimigo,
surge e ataca com desdém,
manda prover um jazigo
Na necrópole do além.
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Não permaneça caído
mas tente se levantar,
mesmo sendo dolorido
pode ser um mal-estar.
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Na vida somente vence
quem luta com dignidade,
porque a vitória pertence
a quem se arma da verdade.
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Nunca faças dos fracassos
o escuro fulcro do enterro,
mas do decurso dos passos
um laço de amparo e esmero,
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O escritor, agradecido,
reconhece em seu leitor,
que o doce fruto colhido
foi, ser lido como autor.
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O homem, de tudo tem medo,
desde a sombra que projeta
e a noite, com seu segredo,
mais insegurança injeta.
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O homem na dor a sofrer,
nada resta que o conforte,
está pronto pra morrer,
mas não preparado à morte.
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Partes de um sonho rompido
soltas ao longo da estrada,
são de alguém que tem caído
no curso da caminhada.
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Pelos campos da humildade
quem planta e for aguerrido,
não falta a oportunidade
para o fruto ser colhido.
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Pôr o ato em banho-maria,
ou volvê-lo em pano-quente,
é ter medo da água fria
por julgá-la estar fervente.
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Que a leitura companheira
não se afaste do leitor
e este, por mais corriqueira,
entenda a voz do escritor.
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Que o respeito varra à vida
tudo quanto causa a dor
e deixe a estrada varrida
com a vassoura do amor.
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Se as flores forem colhidas,
os jardins se descolorem,
sem as roseiras floridas,
os aromas também morrem.
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Se o escritor ficar gravado
com cuidado em seu leitor,
foi, por ter se transformado
no seu grande inspirador.
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Sob a ação devastadora
de um vendaval fulminante,
resta a dor assustadora
da defesa inoperante.
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Só quem luta sabe o quanto
pesa a dor de uma derrota,
seu rosto banhado em pranto
reflete o que ela denota.
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Toda a caneta denota
uma história a ser descrita,
se for prova, mostra à nota,
o poder que tem a escrita.
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Vibrante e excelsa Caxias
do Sul, com força total,
vivo rito de alegrias
num alegre ritual...

Fonte:
Luiz Damo. As faces da trova. Caxias do Sul/RS: Ed. Do Autor, 2021.
Livro enviado pelo autor.

Lima Barreto (Contos Argelinos) A Firmeza de Al-Bandeirah; O Desconto

A FIRMEZA DE AL-BANDEIRAH


Abu-Al-Dhudut não usurpou o trono de AI-Patak sem que houvesse grande oposição por parte dos espíritos eminentes e mesmo de províncias inteiras do país.

A todas estas, ele subjugou e dominou, excetuando o canato de Al-Bandeirah cuja riqueza e prosperidade eram muito admiradas no país.

Esse canato era governado por quatro ou cinco famílias que, sob o pretexto de terem feito a independência de Al-Patak e o proclamado sultanato, se sucediam no governo da província e a exploravam em seu proveito, tanto nos altos cargos, como no monopólio de bancos, indústrias e a exportação de tâmaras.

Sob o disfarce de auxiliar a lavoura desse fruto, os membros dessas quatro ou cinco famílias conseguiam dos soberanos privilégios e auxílios pecuniários que engrandeciam as suas indústrias, tornavam sem concorrentes os seus produtos e favoreciam grandes lucros nas suas explorações agrícolas.

Temendo que Abu-Al-Dhudut não continuasse, como os seus antecessores, a lhes dar tudo o que pediam, armaram uma grande oposição ao seu governo, agitaram os espíritos e fizeram com que muita gente perdesse haveres, cargos e até a vida.

Abu-Al-Dhudut, quando se viu seguro no trono, tratou de invadir a província e castigá-la conforme entendesse.

Organizou tropas e dispôs as coisas de forma a vencer os recalcitrantes de Al-Bandeírah.

O povo dessa província pôs-se como uma só pessoa ao lado dos oligarcas que o governavam com muita habilidade e tal era esta que ninguém podia supor que o que eles defendiam eram os seus interesses particulares de donos de bancos, de chefes de casas comerciais, de proprietários de minas e fábricas, de ricos cultivadores de tâmaras.

O entusiasmo e o ardor da população pela causa de sua autonomia eram tais que tudo fazia esperar que a guerra civil rebentasse. Mas, como os membros das famílias que governavam Al-Bandeirah eram antes de tudo homens de negócios, de especulação comercial e não tinham interesse em guerrear, mas sim amedrontar Abu-Al-Dhudut de modo a que este não perturbasse as suas existências regaladas, trataram de arranjar as coisas de modo mais cômodo, tanto mais que o sultão continuava no seu propósito de intervenção.

Pondo de parte tudo o que tinham afirmado com tanta altivez, procuraram um príncipe da família de Abu e arranjaram, por alguns milhares de piastras e outros dons, que não houvesse a invasão projetada.

Dessa maneira eles continuaram a fruir e a aumentar as suas riquezas, embora tivessem arrastado, com a agitação que fizeram, com os juramentos que juraram, muita gente à miséria, à enxovia e à morte.
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O DESCONTO

Como foi contado aos leitores, o canato de Al-Bandeirah, depois de arrotar muita farofa, que fazia e acontecia, acabou por comprar a não-invasão das tropas de Abu-Al-Dhudut por bom dinheiro.

Essa província de Al-Bandeirah, como se sabe já, é governada por vários magnatas e algumas famílias, entre aqueles conta-se o cide Cinsin Ben-Nhato, que é, a bem dizer, o general da oligarquia do canato.

Ele, quando os tais cultivadores de tâmaras gastam á vontade e ficam encalacrados, corre ao sultão e diz cheio de choro e lábia:

— Majestade; os cultivadores de tâmaras estão morrendo de fome; o produto da venda não paga as despesas que dá o seu cultivo; os grandes empregam toda a sua fortuna para que ele baixe.

Aí ele faz uma pausa e continua alteando a voz:

— E preciso que Vossa Majestade cá ao encontro das necessidades dessa pobre gente que tanto concorre para a grandeza do reino que é de Vossa Majestade.

— Mas como, cide?

— Como? Dando-lhes dinheiro, Majestade.

— Não tenho. O meu tesouro está esgotado.

— Majestade: o poder de Vossa Majestade é grande e há um meio.

— Qual?

— Vossa Majestade decrete um imposto sobre os mendigos do reino que haverá dinheiro para socorrer os miseráveis cultivadores de tâmaras.

Os sultões todos lhe fazem a vontade e os de Al-Bandeirah se blasonam de ricos e trabalhadores.

Há outros casos que hei de contar-lhes, mas agora quero lembrar um muito típico.

Os tais de Al-Bandeirah tinham, como já foi narrado, comprado um príncipe irmão de Abu-Al-Dhudut para que este não invadisse com as suas tropas o canato. O príncipe, que era seguro, foi em pessoa buscar o preço do negócio. Trotou várias e muitas léguas em camelo e chegou à capital da província ex-semi-rebelde.

Falou ao clã e este mandou ordem ao seu tesoureiro, para que lhe pagassem trezentos e cinquenta mil piastras.

O irmão de Abu foi logo á presença do funcionário que lhe disse:

— Príncipe! Vossa Alteza poderá ir para o palácio de Vossa Alteza que o dinheiro irá lá ter.

De fato assim foi e um empregado do tesouro lá chegou com os sacos de ouro.

Esperou este que o príncipe contasse o dinheiro. Acabou e exclamou furioso:

— Mas faltam trinta e cinco mil piastras.

— Príncipe! É a minha porcentagem. Dez por cento.

O irmão de Abu calou-se.

Fonte:
Lima Barreto. Histórias e sonhos. Belém/PA: Unama. Publicado originalmente em 1920.

Estante de Livros (Tarzan: O filho das selvas, de Edgar Rice Burroughs)


Tarzan é um personagem de ficção criado pelo escritor estadunidense Edgar Rice Burroughs na revista pulp All-Story Magazine em 1912 e publicado em formato livro em 1914. O personagem apareceu em mais vinte e cinco livros e em diversos contos avulsos, vários livros autorizados por outros autores e inúmeros trabalhos em outras mídias, autorizadas e não autorizadas. Outros escritores que escreveram versões autorizadas foram Barton Werper, Fritz Leiber e Philip José Farmer.

Tarzan é filho de aristocratas ingleses que desembarcam em uma selva africana após um motim. Com a morte de seus pais, Tarzan é criado por macacos ("manganis", na linguagem dos símios, criada por Burroughs) na África; seu verdadeiro nome é John Clayton III, Lorde Greystoke. Tarzan é o nome dado a ele pelos macacos e significa "Pele Branca". É uma adaptação moderna da tradição mitológico-literária de heróis criados por animais. Uma destas histórias é a de Rômulo e Remo], que foram criados por lobos e posteriormente fundaram Roma.

Por ter sobrevivido na selva desde sua infância, Tarzan mostra habilidades físicas superiores às de atletas do "mundo civilizado", além de poder se comunicar com os animais.

A visão da África criada por Burroughs tem pouco a ver com a realidade do continente, pois ele inventa que a selva africana esconderia civilizações perdidas e criaturas estranhas. Burroughs, entretanto, nunca esteve na África.

A versão cinematográfica de Tarzan como o bom selvagem ("Mim Tarzan, Você Jane"), na interpretação de Johnny Weissmuller, não reflete o personagem original dos romances, que é gracioso e altamente sofisticado.

Tarzan é filho de um lorde e dama britânicos que foram abandonados na costa atlântica da África por amotinados. Quando Tarzan era criança, sua mãe morreu e seu pai foi morto por Kerchak, líder da tribo símia por quem Tarzan foi adotado. Logo após a morte de seus pais, Tarzan tornou-se uma criança selvagem e sua tribo de símios é conhecida como os Mangani, grandes símios de uma espécie desconhecida pela ciência. Kala é sua mãe símia.

Burroughs acrescentou histórias que ocorrem durante a adolescência de Tarzan em seu sexto livro de Tarzan, Jungle Tales of Tarzan. Tarzan é seu nome mangani; seu nome em inglês é John Clayton, Visconde Greystoke (segundo Burroughs em Tarzan, Lord of the Jungle; Conde de Greystoke em fontes menos canônicas, notavelmente o filme de 1984, Greystoke). Na verdade, o narrador de Burroughs em Tarzan of the Apes descreve Clayton e Greystoke como nomes fictícios - sugerindo que, dentro do mundo fictício que Tarzan habita, ele pode ter um nome real diferente. Como um jovem adulto de dezoito anos, Tarzan conhece uma jovem americana chamada Jane Porter. Ela, seu pai e outros membros do grupo estão abandonados na mesma área costeira da floresta onde os pais humanos de Tarzan estavam vinte anos antes. Quando Jane retorna aos Estados Unidos, Tarzan deixa a floresta em busca dela, seu único e verdadeiro amor.

Em The Return of Tarzan, Tarzan e Jane se casam. Em livros posteriores, ele vive com ela por algum tempo na Inglaterra. Eles têm um filho, Jack, que leva o nome do mangani de Korak ("o assassino"). Tarzan desdenha do que ele vê como a hipocrisia da civilização, e ele e Jane voltam para a África, fazendo sua casa em uma propriedade extensa que se torna uma base para as aventuras posteriores de Tarzan.

Conforme revelado em Tarzan's Quest, Tarzan, Jane, a amiga de macaco de Tarzan, Nkima, e seus aliados ganharam algumas das pílulas de Kavuru que concedem imortalidade ao consumidor.

Caracterização


Mowgli de Rudyard Kipling foi uma influência provável em Tarzan, incluindo sua facilidade com primatas não-humanos.

Burroughs criou uma versão elegante da figura do homem selvagem em grande parte livre de falhas de caráter ou defeitos. Tarzan é descrito como sendo alto, atlético, bonito e bronzeado, com olhos cinzentos e longos cabelos negros. Ele quase não usa roupas, exceto uma tanga. Emocionalmente, ele é corajoso, inteligente, leal e firme. Ele é apresentado como se comportando eticamente na maioria das situações, exceto quando busca vingança sob a motivação da dor, como quando sua mãe Kala é morta em Tarzan of Apes, ou quando ele acredita que Jane foi assassinada em Tarzan the Untamed. Ele está profundamente apaixonado por sua esposa e totalmente dedicado a ela; em numerosas situações em que outras mulheres expressam sua atração por ele, Tarzan declina educadamente, mas com firmeza, suas atenções.

Quando apresentado a uma situação em que um indivíduo ou parte mais fraca está sendo atacada por um inimigo mais forte, Tarzan invariavelmente fica do lado da parte mais fraca. Ao lidar com outros homens, Tarzan é firme e vigoroso. Com amigos do sexo masculino, ele é reservado, mas profundamente leal e generoso. Como anfitrião, ele é igualmente generoso e gracioso. Como líder, ele comanda lealdade devotada. De acordo com essas características nobres, a filosofia de Tarzan abrange uma forma extrema de "retorno à natureza". Embora ele seja capaz de passar dentro da sociedade como um indivíduo civilizado, ele prefere "despir o fino verniz da civilização", como Burroughs costuma dizer. Sua vestimenta preferida é uma faca e uma tanga de couro de animal, sua morada preferida é qualquer galho de árvore conveniente quando ele deseja dormir, e sua comida preferida é carne crua, morta por ele mesmo; melhor ainda, se ele puder enterrá-lo por uma semana, para que a putrefação tenha a chance de amaciar um pouco.

A filosofia primitivista de Tarzan foi absorvida por inúmeros fãs, entre os quais Jane Goodall, que descreve a série de Tarzan como tendo uma grande influência em sua infância. Ela afirma que achava que seria uma esposa muito melhor para Tarzan do que sua esposa fictícia, Jane, e que, quando começou a morar e estudar os chimpanzés, estava cumprindo seu sonho de infância de viver entre os grandes símios, assim como Tarzan.

Competências e habilidades

A agilidade, a velocidade e a força de Tarzan permitem que ele mate um leopardo..

A criação na selva de Tarzan lhe dá habilidades muito além daquelas dos humanos comuns. Isso inclui escalar, agarrar-se e pular, assim como qualquer grande macaco, ou melhor. Ele usa ramos e balanços de trepadeiras para viajar a grande velocidade, uma habilidade adquirida entre os símios antropoides.

Sua força, velocidade, resistência, agilidade, reflexos, sentidos, flexibilidade, durabilidade, resistência e natação são extraordinárias em comparação com os homens normais. Ele lutou com grandes macacos e gorilas adultos, gorilas, leões, rinocerontes, crocodilos, pitões, tigres, cavalos marinhos do tamanho de um homem (uma vez) e até mesmo dinossauros (quando visitou Pellucidar). Tarzan é um rastreador habilidoso e usa seus excepcionais sentidos de audição e olfato para seguir presas ou evitar predadores, e mata apenas por comida, mas é um ladrão experiente quando invade aldeias tribais africanas ou caças que Tarzan julgou ser brutal e merecedor de sem pena, pegando suas lanças, escudos, arcos, facas e, o mais importante, pontas de flechas metálicas. Um aguçado senso de audição permite que ele escute conversas entre outras pessoas próximas a ele.

Extremamente inteligente, Tarzan era letrado em inglês antes de poder falar a língua quando conheceu outros falantes de inglês como Jane Porter. Sua alfabetização é autodidata depois de vários anos em sua adolescência, visitando a cabana de seus pais mortos e olhando e deduzindo corretamente a função de cartilhas de livros infantis. Os livros foram trazidos para a África por sua mãe morta que pretendia ensinar seu próprio filho. Ele eventualmente lê todos os livros da coleção de livros portáteis de seu falecido pai e tem plena consciência da geografia, história mundial e sua árvore genealógica, mas não consegue falar inglês até conhecer seres humanos, pois nunca ouviu como o inglês deveria soar. como quando falado em voz alta. Ele é "encontrado" por um francês viajante que lhe ensina os fundamentos da fala humana e o leva de volta à Inglaterra.

Tarzan pode aprender uma nova língua em dias, falando muitas línguas, incluindo os grandes símios, francês, finlandês, inglês, holandês, alemão, suahili, muitos dialetos bantos, árabe, grego antigo, latim antigo, maia e as línguas dos Homens Formigas e de Pellucidar.

Ao contrário de representações em filmes em preto e branco da década de 1930, depois de aprender a falar uma língua nos romances, Tarzan/John Clayton é muito articulado, reservado (ele prefere ouvir e observar atentamente antes de falar) e não fala inglês como os clássicos filmes retratam ele. Ele pode se comunicar com muitas espécies de animais da selva, e tem se mostrado um impressionista habilidoso, capaz de imitar perfeitamente o som de um tiro.

No Brasil

Dezoito livros de Tarzan foram publicados no Brasil pela Companhia Editora Nacional a partir de 1933, na coleção Terramarear. As traduções foram feitas por importantes escritores, como Monteiro Lobato, Godofredo Rangel, Manuel Bandeira e outros. Na década de 1970, a Editora Record relançou oito desses volumes, com capas de Burne Hogarth. No final da década de 1980, foram publicados pela editora Tempo Cultural. Esses livros foram traduzidos do espanhol e não do inglês. Já em Portugal, a editora Portugal Press, de Lisboa, editou a obra completa do herói.

Em janeiro de 2014, o livro Tarzan dos Macacos foi republicado pela Jorge Zahar Editor com tradução de Thiago Lins e ilustrações de Hal Foster em decorrência do lançamento do filme animado alemão Tarzan: A Evolução da Lenda e o centenário do lançamento do romance em livro.

Os filmes

O primeiro Tarzan do cinema foi Elmo Lincoln, no filme Tarzan, O Homem Macaco ou Tarzan dos Macacos (Tarzan of the Apes), de 1918. Lincoln também estrelou o filme seguinte, O Romance de Tarzan ou Os Amores de Tarzan (The Romance of Tarzan, 1918) e o seriado As Aventuras de Tarzan (The Adventures of Tarzan, 1921, quinze episódios).

Na era muda foram produzidos quatro filmes e quatro seriados com o herói; além de Lincoln, ele foi interpretado, entre outros, por Gene Pollar e James Pierce.

O primeiro Tarzan do cinema sonoro foi também o mais famoso: o nadador estadunidense Johnny Weissmuller, que encarnou o herói em doze fitas, primeiro na MGM, depois na RKO. O refinado lorde dos livros foi transformado por Weissmuller em um selvagem que conseguia apenas grunhir e emitir frases monossilábicas, do tipo "me Tarzan, you Jane" (que ele, a bem da verdade, nunca disse. O que ele disse no filme Tarzan, O Filho das Selvas/Tarzan the Ape Man foi, simplesmente "Tarzan… Jane", apontando para si mesmo e depois para Jane Porter).

Weissmuller é responsável por emitir, pela primeira vez, o famoso grito de vitória de Tarzan. Esse grito, que seria reproduzido por todos os Tarzans subsequentes, não passava de uma hábil mixagem dos sons de um barítono, uma soprano e de cães treinados.

Devido à censura da época, os trajes de Weissmuller e, principalmente, de O'Sullivan foram aumentando de tamanho de filme para filme; a censura também é responsável pela ausência de filhos da dupla, que não era legalmente casada: Boy (vivido por Johnny Sheffield), introduzido em O Filho de Tarzan (Tarzan Finds a Son!, 1939) não era filho do casal e, sim, adotado, conforme mostra o título original. Nos livros, no entanto, Tarzan e Jane são pais do menino Korak, que chega à idade adulta nos romances finais.

Depois de atuar em Tarzan e a Caçadora (Tarzan and the Huntress, 1947), Johnny Sheffield disse adeus ao papel de Boy, porque já estava com dezesseis anos. Ele foi para a Monogram e fez os doze filmes da série Bomba, o Filho das Selvas/Bomba The Jungle Boy (um personagem inspirado em Tarzan, publicado em uma série de livros publicada entre 1926 e 1938), entre 1949 e 1955.

Quando já não possuía o físico necessário para viver o herói, Weissmuller estrelou a série Jim das Selvas/Jungle Jim para a Columbia. Foram dezesseis filmes entre 1948 e 1955. Nesse ano, o herói foi para a televisão, onde foram feitos vinte e seis episódios de meia hora cada, com um Weissmuller já gordo e envelhecido.

Outros Tarzans que ficaram famosos foram Lex Barker, que substituiu Weissmuller a partir de 1948 e Gordon Scott, que é considerado por alguns críticos como o ator que melhor interpretou o herói. Já Mike Henry é visto como o mais parecido com os desenhos de Burne Hogarth.

Das atrizes que interpretaram Jane, a única lembrada é Maureen O'Sullivan, que fez os seis primeiros filmes da série com Johnny Weissmuller e depois saiu porque não queria ficar presa à personagem. Jane não aparece em todos os filmes de Tarzan: ela esteve em apenas um dos cinco filmes com Gordon Scott e esteve ausente de todas as produções com os Tarzans Jock Mahoney, Mike Henry e Ron Ely.

Foi noticiado que a personagem Cheeta, a macaca (Cheeta, na verdade era um macho) que protagonizou os filmes da década de 1930 e 1940 e do seriado para televisão da década de 1960, faleceu em 2011, aos 80 anos de idade, notícia essa, entretanto, colocada em dúvida por uma reportagem da agência de notícias Associated Press, pela ausência de documentos que comprovem se tratar do mesmo primata, além de outras inconsistências apontadas.

Os quadrinhos


Em meados da década de 1920, surgiu um projeto de uma tira de jornal de Tarzan, a princípio, o publicitário Joseph Neebe queria chamar o ilustrador J. Allen St.John, que já fazia artes dos livros de Tarzan, com a recusa dele, Neebe escolheu um artista que trabalhava em peças publicitárias, Hal Foster, que foi o primeiro artista a desenhar o herói em tiras de aventura: a estreia foi na em novembro de 1928 na revista inglesa Tit-Bits, em 7 de janeiro de 1929, estreou nos jornais americanos, coincidentemente essa também foi a data de estreia da adaptação de outro herói dos pulps, Buck Rogers, foram publicadas as sessenta tiras diárias de "Tarzan of the Apes" assinadas por Foster.

Foster só voltaria ao personagem em 1931, desenhando páginas dominicais coloridas. Ele é responsável por várias inovações de inspiração cinematográfica: campo e contra-campo, grandes planos e contra-luz. Ele seguiu fielmente os livros de Burroughs e nunca usou balões e, sim, textos incorporados aos quadrinhos em legendas ou recordatórios. A partir de 1937, Foster foi substituído por Burne Hogarth.

Influenciado por Michelângelo e pelo expressionismo alemão, Hogarth utilizou seus conhecimentos de anatomia para mostrar uma explosão de músculos, um turbilhão de movimentos, paisagens atormentadas mas vibrantes, selvas fantasmagóricas e raízes com formas monstruosas. Ele desenharia essas páginas até 1950, quando foi substituído pelo também importante Bob Lubbers, mas voltou em 1972, com uma nova versão da história de Tarzan em forma de livro, quatro anos depois, foi a vez de uma adaptação de Jungle Tales of Tarzan, ambos os trabalhos são considerados proto-graphic novels.

Rex Maxon começou uma longa série de aventuras de Tarzan ainda em 1929, quando Foster se recusou a desenhar "The Return of Tarzan". Dono de um traço duro, que melhorou com o tempo, Maxon desenhava tiras diárias, distribuídas para os jornais do mundo inteiro, mas se encarregou também de páginas dominicais durante vinte e oito semanas em 1931, enquanto Foster não voltava. Maxon desenhou Tarzan até 1947.

A partir de 1968, no entanto, tanto as tiras diárias quanto as páginas dominicais foram entregues a outro artista : Russ Manning, que também desenhou as histórias de Korak, o filho de Tarzan. Mestre absoluto do preto e branco, Manning desenvolveu uma visão moderna do herói, sem os barroquismos de Hogarth.

Vários outros desenhistas se dedicaram ao personagem, muitas vezes anonimamente: Joe Kubert, Dan Barry, John Lehti, Reinman, Ruben Moreyra, Jesse Marsh, John Celardo, John Buscema, Bob Lubbers etc. Dentre os autores, destaca-se Gaylord DuBois. Poucos artistas conseguem capturar a essência da figura humana em sequências de ação como Joe Kubert. Seu expressivo talento encontra-se plenamente exposto nas HQs do Tarzan da década de 1970.

Tarzan apareceu em muitas revistas em quadrinhos em vários editoras. Em 1947, o personagem foi publicado pela Dell Comics em parceria com Western Publishing. O Tarzan da Dell pouco tinha a ver com os livros Edgar Rice Burroughs, era mais parecido com o Tarzan dos cinemas. Pelo selo Whitman, a Western publicou uma série de Big Little Books do personagem.

Inspirado nos filmes estrelados por Johnny Weissmuller, o filho de Tarzan era Boy, que substituía o Korak, presente nos livros, na década de 1960, Boy substituído por Korak.

Em 1962 a parceira entre a Dell e Western foi desfeita, logo foi criado pelo Western, o selo Gold Key Comics. Tarzan foi um dos títulos publicados pela Gold Key.

Entre Dezembro de 1964 Julho de 1965, a Charlton Comics publicou a revista Jungle Tales of Tarzan, a editora pensava que com a morte do criador em 1950, o herói estive em domínio público. Em 1972, a DC consegue a licença de Tarzan e inicia uma série de quadrinhos produzida por Joe Kubert, a primeira edição da revista é a número 207, continuando a numeração da Dell. Em 1977, a DC publica seu último número de Tarzan, encerrada na edição 259, nesse mesmo ano o personagem passa a ser publicado pela Marvel Comics, na Marvel a numeração é reiniciada, a revista teve 29 edições e possuía arte de John Buscema.

Dark Horse Comics publica várias séries Tarzan desde 1996 até os dias atuais, incluindo republicações de editoras anteriores como a Western/Gold Key, em parceria com a DC, publicou dois crossover de Tarzan com Batman e Superman: Batman/Tarzan: Claws of the Cat-Woman e Superman/Tarzan: Sons of the Jungle Tarzan também lutou contra os Predadores, alienígenas da série de filmes em Tarzan vs. Predator: At the Earth's Core.

Em dezembro de 2011, a Dynamite Entertainment lançou a série Lord of the Jungle, estrelada por Tarzan, a editora evitou usar o nome do personagem na capa, a fim de não violar a marca registrada, mesmo que o personagem esteja em do domínio público. No entanto, em 2012, a Edgar Rice Burroughs, Inc. processou a editora.

Em 2012, a Edgar Rice Burroughs, Inc. iniciou a publicação de webcomics em seu site oficial; incluindo Tarzan pelo roteirista Roy Thomas e o ilustrador Tom Grindberg e Tarzan of The Apes, também roteirizada por Thomas, ilustrada por Pablo Marcos com letras e cores de Oscar Gonzales. Em 2013, Dynamite Entertainment publicou um crossover com outro personagem do autor, John Carter de Marte na minissérie Lords of Mars. Em 2014, o filho de Tarzan, Korak, ganhou uma webcomic solo, roteirizada por Ron Marz e ilustrada por Rick Leonardi.

Em 2015, o selo Sequential Pulp Comics da Dark Horse publicou a graphic novel Jungle Tales of Tarzan, escrita por Martin Powell e ilustrada por Pablo Marcos, Terry Beattye outros. A capa foi desenhada por Daren Bader. No mesmo ano, a Dynamite anunciou um crossover de Tarzan e Sheena.

Os Quadrinhos no Brasil

No Brasil, a primeira publicação do herói deu-se no número 31 do Suplemento Juvenil, de 10 de outubro de 1934, com Tarzan, O Filho das Selvas, a história desenhada por Harold Foster cinco anos antes. Com o sucesso, as tiras foram reunidas no álbum "A Primeira Aventura de Tarzan em Quadrinhos", relançado em 1975 pela EBAL. Em seguida o Suplemento Juvenil passou a publicar A Volta de Tarzan e depois histórias de Rex Maxon e Burne Hogarth.

O primeiro número da revista dedicada exclusivamente ao herói data de julho de 1951 e trazia uma foto de Lex Barker na capa. A revista seria a mais duradoura da história da EBAL, tendo sido editada, de várias formas em cores, em preto e branco, formatinho, formato americano, tamanho padrão, mensal, bimestral etc—até 1989.

A EBAL lançou também diversas edições especiais. A Editora Abril publicou histórias baseadas no filme animado da Disney.

Em maio de 2010, a Devir Livraria anuncia o lançamento da versão traduzida de Joe Kubert, englobando em um único volume do número 207 ao 214, com introdução do próprio autor. Em 2015, a Pixel Media (selo de quadrinhos da Ediouro Publicações) publica a graphic novel Jungle Tales of Tarzan com o título "Tarzan: Contos da Selva". Em março de 2021, a editora francesa Soleil Productions pulbicou Tarzan, seigneur de la jungle por Christophe Bec (roteiro) e Stevan Subic (desenhos).

Rádio

Nos Estados Unidos, Tarzan era o herói de dois programas de rádio populares: o primeiro entre 1932 e 1936 com James Pierce no papel-título; o segundo entre 1951 e 1953, estrelado por Lamont Johnson.

Televisão

Ron Ely interpretou Tarzan em uma cultuada série que teve cinquenta e sete episódios entre 1966 e 1968. Alguns episódios duplos foram fundidos e exibidos nos cinemas.

Em 1989, foi lançado o telefilme Tarzan in Manhattan, estrelado por Joe Lara, entre 1991 e 1994, foi exibida a série franco-canadense-mexicana Tarzán, estrelada por Wolf Larson, entre 1996 e 1997, Joe Lara volta a interpretar o personagem em Tarzan: The Epic Adventures, apesar disso, a série não possui cronologia com o telefilme.

Entre 2001 e 2003, foi produzida pela Walt Disney Company a série animada A Lenda de Tarzan (The Legend of Tarzan), com os personagens do longa de animação de 1999.

Em 2017, uma série animada em CGI foi lançada na Netflix.

Trabalhos inspirados em Tarzan

Tarzan inspirou uma série de personagens selvagens nos pulps, filmes e quadrinhos chamados de tarzanides e garotas das selvas. Alguns desses, como Kwa e Ka-Zar, eram cópias diretas ou vagamente veladas; outros, como Polaris of the Snows, eram personagens semelhantes em diferentes configurações. Destes personagens, o mais popular foi Ki-Gor, o tema de cinquenta e nove romances que apareceram entre o inverno de 1939 e a primavera de 1954 na revista Jungle Stories da Fiction House.

Fonte:
Wikipedia

terça-feira, 21 de setembro de 2021

Arquivo Spina 51: Cleusa Piovesan

Jaqueline Machado (Homenagem ao Bicentenário de Anita Garibaldi)


Ana Maria de Jesus Ribeiro. Assim se chamava a mulher mais famosa da causa farroupilha, dessa causa tão importante, que teve o seu início no ano de 1835.      

Ana nasceu em 30 de agosto de 1821, em  Morrinhos, arredores de Laguna – SC.

Por imposição de sua mãe, casou-se aos quatorze anos com o sapateiro Manoel Duarte de Aguiar. A relação era conflituosa e durou apenas quatro anos.     

Quando o italiano Giuseppe Garibaldi, que a essas alturas já era reconhecido como um herói, chegou em Laguna com as tropas farroupilhas de Davi Canabarro e Joaquim Teixeira Nunes, conheceu Ana, que também era revolucionária. Os dois se apaixonaram fulminantemente. Realizava-se ali, um encontro de almas. De almas gêmeas, pois um parecia emitir o reflexo da luz do outro.

Para poderem desfrutar de seu amor, os dois fugiram para Itaparica. Iniciava-se assim, um épico romance repleto de lutas e aventuras. Em um combate travado em Santa Catarina, Ana, que agora era chamada de Anita, por Garibaldi, entra para a guerra e prova a sua bravura.  Entre um evento revolucionário e outro, Anita, tem o seu primeiro filho: Menotti. Pouco tempo depois, Giuseppe e Anita se casam.  

Alguns anos se passam e ela já cansada e com três filhos, não abandona o seu espírito de guerreira. Devido às cavalgadas noturnas e a alimentação inadequada, Anita contraiu febre tifoide e ficou muito doente. Mesmo com a saúde debilitada, segue com o marido e as crianças para Nice. Lá, eles lutam pela unificação da Itália. A saúde da heroína piora e, em 1849, com apenas vinte oito anos de idade, ela morre nos braços de seu amado. Italianos, uruguaios, libertários e os farrapos brasileiros republicanos, choraram a sua morte. Chamada de a heroína dos dois mundos, ela está enterrada em Roma, na colina de Janículo.

Essa guerreira incrível, nos deixou como legado, nos ares do Rio Grande, faíscas de paixão expelidas por suas armas de fogo. Gestos de ousadia pela atitude em fugir para viver o seu verdadeiro amor, capacidade de aprender, ao vencer tantas batalhas. E, acima de tudo, CORAGEM de ser feliz em plena guerra. Anita tinha um "q" de deusa... por isso tornou-se brilhante em tudo o que fazia... e mesmo doente, morreu vitoriosa...Por esses motivos e tantos mais, me curvo orgulhosa aos pés do altar da história dela que, por terra, rios e mares teve em vida, as bênçãos sagradas de Atena, Sekhmet,  Ártemis e Iansã...     
    
Salve, salve, salve, ANITA GARIBALDI! Uma mulher valente pra valer!

Solange Colombara (Cristais Poéticos) 3

NOSSOS MOMENTOS


Amo seu cheiro de avelã,
Amo seu gostoso hálito de hortelã.
Amo quando sorri.
Sem palavras pronunciar
Sinto que me ama, quando meu nome chama.
Amo nossas despedidas.
O gosto que fica em nossos corpos
Sempre fará com que voltemos...
Para juntos, saborearmos novamente,
Nosso momento.
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PROMESSA

Nos prometemos um dia trocarmos
Um abraço tão apertado
Capaz de sentirmos os pés saírem do chão.

Nos prometemos um dia trocarmos
Um olhar tão profundo
Capaz de nossas almas tocar.

Nos prometemos um dia trocarmos
Um beijo tão doce
Capaz de preencher nosso hálito de chocolate, o ar.

Nos prometemos um dia
Não pedirmos nada em troca,
Além de, naquele nosso momento,
Sentirmos apenas o tempo parar.
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SAUDADE

Tanto a dizer,
Com um abraço
Ou um olhar.
Nó na garganta,
Boca seca,
Olhos a lacrimejar.
Desejo de ver,
Envolver nos braços
E beijar.
É tanta, tanta,
Que quando chega
Perde-se o ar.
Difícil explicar,
Fácil demonstrar.
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SEU SORRIR

Seu sorriso é tão contagiante
Que quando você sorri
O mundo inteiro sorri junto.

Seu sorriso é tão contagiante
Que quando você sorri
O mundo inteiro canta alegremente.

Seu sorriso é tão contagiante
Que quando você sorri
O mundo inteiro para

E sonha,..
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SEUS POEMAS

Os poemas que você escreveu para mim
Jamais existirão.
É como se o vento soprasse
E os levasse em outra direção.

Os poemas que você escreveu para mim
Jamais existirão.
Quando penso ler alguns na linha do horizonte
O sol vem, deita, adormece meus sonhos.

Os poemas que você escreveu para mim
Jamais existirão.
Lindos versos de amor...
Frutos da minha imaginação.

Fonte:
Solange Colombara. Meus momentos de hiato. SP: Areia Dourada, 2019.
Livro enviado pela poetisa.

Lima Barreto (Contos Argelinos) Elkazenadji ; O Juramento

ELKAZENADJI


O reinado de Abu-Al-Dhudut foi curto, mas cheio de episódios interessantes que o cronista argelino Cide Mohâmmed Ben-Alá conta do modo mais ingênuo ao mesmo tempo florido, capaz de fazer o delicioso encanto dos mais habituados à literatura árabe.

A tradução que vamos dando, além da resumida, fana muito o viço da luxuriante floração do original; mas, se tempo houver e editor, havemos de dar uma completa, respeitando o mais possível as palavras do autor argelino, assim como o seu rendilhado pensamento. Contemos.

Escolheu Abu-Al-Dhudut, nos últimos dias de seu reinado, para ser o seu kazenadji (ministro dos negócios internos do reino), um levantino de nome Cide Ércu Ben-Lânod muito estimado pelas suas letras e sabido nelas como o mais douto ulemá.

Cide Ércu Ben-Lânod tinha vivido muito tempo em Marselha, como cônsul de Abu-Al-Dhudut; e, fosse pela sua origem infiel, fosse pelo tempo que levou naquela cidade de França, o certo é que contraiu todos os vícios dos cristãos, especialmente dos francos. Feito kazenadji, ganhando muitos presentes e dispondo do tesouro do sultão, era de esperar que Cide Ercu Ben-Lânod aumentasse as mulheres do seu harém e vivesse sabiamente entre elas, como mandam o Profeta e os livros sagrados. Não tinha em grande conta os preceitos do Corão e, apesar dos conselhos de um dos seus sogros, Cide Glei Ben-Sério, continuou nos seus sacrílegos hábitos de passar as noites fora de sua casa, em visitas amaldiçoadas a certos lugares da feitoria francesa que ficava perto da capital de Al-Patak. Não contente com ir ele a tão daninhos lugares, seduziu muitos bons muçulmanos a fazer o mesmo. Um destes era o kaïa, Pessh Ben-Hoa, que vem a ser entre nós o chefe da polícia militar. Não deixava este funcionário de, todas as noites, acompanhar Cide Ércu Ben-Lânod nas suas profanações às regras e preceitos do Profeta.

Ambos, chegados que eram à feitoria, logo se encaminhavam para uma grande casa de uma velha francesa, de nome Susah-Hana, a que chamavam Cidade das Flores; e entregavam-se a todos os pecados que a religião proíbe.

Deixavam-se arrastar pelo vício de beber licores espirituosos, coisa que mais depressa faz com que entreguemos as nossas almas aos espíritos malfazejos; e cercavam-se de mulheres infiéis, mediante alguns cequins de ouro, com as quais tinham propósitos mais próprios de se os ter com as verdadeiras esposas.

A religião do Profeta dá a tal respeito tão grande liberdade que não se podia acreditar que aqueles fiéis tivessem prazer em fazer semelhante coisa, fora da comunhão dos crentes.

Mas Cide Ercu Ben-Lânod tinha tomado tal gosto por aquele vinho dos francos que borbulha e ferve como os gases danados das entranhas da terra, que não havia meio de deixar de ir uma noite à casa da velha Susah-Hana.

O kaïa (o chefe da polícia militar) também se havia habituado e não deixava de acompanhar o kazenadji. Certa noite, em que eles tinham bebido bem doze odres do tal vinho, estando, como de costume, na Cidade das Flores, Cide Ercu Ben-Lânod deu em altercar com o seu companheiro:

— Tua tropa não presta pra nada! Os franceses sim é que têm tropa.

O kaïa, que era um chefe orgulhoso e patriota, ficou indignado com o despropósito do ministro e respondeu:

— Se tu queres ver, Cide Ercu Ben-Lânod, vou agora mesmo formá-la e cercar o palácio de Abu-AI-Dhudut.

O kaïa, meio trôpego e balançando-se que nem uma fragata franca no porto de Argel, levantou-se, veio até à porta, chamou um spahi (soldado de cavalaria) e deu as suas ordens.

Os dois ficaram dormindo e a força do kaïa cercou o casbá (palácio do sultão), como lhe tinha sido ordenado.

Foi um espanto geral e as tropas do agha (ministro da Guerra) acudiram; houve combate, morrendo de parte a parte cerca de dois mil homens.

Cide Ércu Ben-Lânod e o kaïa Sirdar Pessh Ben-Hoa despertaram na tarde seguinte e nunca a cidade pôde saber por que motivo as tropas do último tinham cercado o casbá e guarnecido as estradas que iam ter a ele.
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O JURAMENTO

Logo que Abu-Al-Dhudut se apossou do trono de Al-Patak, todos os seus companheiros e amigos quiseram também fazer o mesmo nos remos vassalos, embora muitos dos soberanos destes tivessem ajudado Abu na sua usurpação.

O primeiro agha (ministro da Guerra) ansiava por ocupar o governo do canato* de Al-Súgar, região rica e vasta, que até ali era governada pelo cã Ross Al-Xeiroso.

Este príncipe não se incomodava muito com a administração dos seus domínios e vivia em passeios e festas, fora da sua capital.

Poderoso e rico, tinha ajudado muito Abu-Al-Dhudut a subir no trono de Al-Patak, de forma que todos supunham que as pretensões do agha não seriam favorecidas pelo novo sultão.

O agha, porém, não se incomodou com os serviços que Ross Al-Xeiroso tinha prestado a seu amo e senhora e tratou de encher o canato de Al-Súgar de spabis, bombardeiros e outras tropas irregulares, sob o pretexto de que as tribos do deserto ameaçavam a capital do canato e Ross Al-Xeiroso nada fazia, deixando-se ficar entregue aos prazeres e folguedos.

Este príncipe, vendo que o agha continuava nos seus propósitos de usurpação, pediu uma audiência a Abu-Al-Dhudut, no que foi imediatamente atendido.

Recebeu-o Abu no divã do casbah (palácio imperial) e fez todas as promessas ao príncipe vassalo:

— Ross Al-Xeiroso, juro pelos santos livros, pelo Corão, que prefiro pôr termo aos meus dias do que te ver fora do governo de Al-Súgar.

Ross Al-Xeiroso saiu seguro de que continuaria no governo e que seu filho herdaria a sua coroa de príncipe, mantendo a sua descendência nela.

Em breves dias, porém, soube que agha tinha mandado mais tropas para os seus domínios. Correu de novo a Abu-Al-Dhudut, que lhe reiterou as promessas feitas.

Ross Al-Xeiroso voltou a divertir-se alguns dias, quando teve notícias que o agha, à frente das tropas que para lá tinha enviado, tomara conta do governo de Al-Súgar e, como cã, fora reconhecido por todos, inclusive por Abu-Al-Dhudut.

Esperou ainda alguns dias a ver se o sultão se matava; ele, porém, continuou a viver a melhor das saúdes. Ross Al-Xeiroso, contudo, espera até hoje que Abu-Al-Dhudut cumpra a sua palavra santa de sultão e chefe dos crentes.
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* Canato ou canado – é um ente político governado por um cã, palavra que, em mongol e em turco, significa "líder tribal" ou senhor de um território - seja um principado, reino ou mesmo um império.

Fonte:
Lima Barreto. Histórias e sonhos. Belém/PA: Unama. Publicado originalmente em 1920.

segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Versejando 77

 

Carolina Ramos (O Golpe)

Quando viu a bagagem deslizar de manso para o bojo do avião, admitiu que cinquenta por cento de seu plano dera certo. Plano de cinco fases, cuidadosamente elaborado anos a fio, à espera do momento propício para o desfecho.

Trabalhara como um leão a vida toda, sem nunca lograr ser rico. E, somente sendo rico, teria condições de tornar concreto seu mais acalentado sonho; - Viajar e escrever! – binômio mágico que traduzia integralmente a essência de tudo o quanto aspirava na vida!

Mas... viajar, como?! Tinha nada mais que o necessário para sobreviver! E escrever, como? – se o tempo gasto para garantir-lhe a sobrevivência não lhe deixava a menor sobra?! Nem migalhas restavam para que pudesse comprar, com liberdade, aqueles míseros minutos que, afinal, eram tão somente improvisados graças aos instantes roubados ao sono e que lhe permitiam sentar-se ao computador e digitar pensamentos acumulados na massa cinzenta de um cérebro irresistivelmente engajado no mundo das letras, desde que nascera!

Com base nestas ponderações, surgira a primeira célula do seu ousado plano. Deixou que ela se expandisse e evoluísse, em surdina, trabalhando muito e muito, nas horas mortas, sonolento e determinado a levar avante, a qualquer custo, aquele plano urdido em segredo. Plano quase maquiavélico... mas que o tomaria rico, em tempo hábil!

Mais cedo que o programado, conseguiu um pé-de-meia. Murcho, furado... mas... sempre alguma coisa.

Com esse começo, abriu algumas contas na rede bancária. E depois destas, outras. E outras tantas, mais tarde.

Graças ao bom-papo, infiltrou-se nas gerências. Fez amigos. Ter amigos, naquele caso, era fonte de renda. Apadrinhou-se.

Conseguiu favores, cheques especiais com limites não sonhados – polpudos empréstimos de pai para filho... E muita coisa mais.

Em dado momento, somando cifras e parcelas, em sua maioria virtuais, reconheceu que estava rico!

Chegava a hora de por em execução a segunda fase do arriscado plano: - Vendeu a casa em que morava. Pediu prazo para desocupá-la. Enquanto isso, preparou a modesta bagagem. Desfez-se de tudo o que lhe pareceu supérfluo.

Com pesar, deu o cachorro, leal amigo, a um outro amigo, tão leal quanto ele. Escolheu a dedo roteiros e agências de viagens. Preparou o passaporte com os vistos especiais, indispensáveis.

Às vésperas do embarque, sacou polpudamente tudo o que tinha em caixa, indo até quase o limite dos cheques especiais de todas as contas bancárias das quais era correntista.

Pediu empréstimos. Ao embolsá-los, viu seus sonhos crescerem além do que imaginara! Abriu contas no Exterior.

E, então, a terceira fase do plano impôs-se. Cômoda... e bem menos trabalhosa que as anteriores:

– Refestelado numa classe executiva, atirou-se ao espaço, rumo às maiores capitais e principais cidades europeias. – Deliciado com os encantos do Velho Mundo, deu larga volta ao redor dele, sentindo-se um nababo! Sem medir e nem poupar coisa alguma!

Divertiu-se como se a vida estivesse para acabar! Não perdeu um só espetáculo digno de ser visto! Não se excedeu na compra de roupas, joias ou presentes, mas... comeu e bebeu do bom e do melhor! Adquiriu alguns livros. As bibliotecas sempre exerciam sobre ele fascínio especial, em qualquer tempo. Jamais entrara numa, sem sair com um ou dois volumes sob o braço. Mesmo que da própria mesa não usufruísse de igual fartura.

Reconhecia que a fome do saber era mais compulsiva que a fome física.

Mochila murcha... E sem um centavo nas algibeiras, retomou, certo dia, ao ponto de origem.

Trazia de volta, nos olhos maravilhados, paisagens e visões inesquecíveis!

Entesourara, na alma feliz, emoções sem conta!... Riquíssimo tesouro que a vida jamais lhe conseguiria roubar!

– Daí, para a parte final do plano, apenas um passo.

Na praça de origem, seu nome fervia escaldado nos caldeirões do mundo financeiro!

Sem a menor tentativa de defesa, admitiu a inadimplência irresponsável.

Uma vez julgado e condenado por estelionato, foi trancafiado num xadrez.

Por que voltara?! Por que não se perdera nos labirintos do Velho Mundo, ficando por lá mesmo?!

– Explicara: – Não era desonesto! Era apenas um devedor consciente... que não só admitia a dívida, mas também a absoluta impossibilidade de quitá-la!

Queria, sim, com todo empenho, pagar à sociedade tudo o quanto lhe devia! E, já que não tinha bens, a cadeia era o lugar mais do que apropriado para a expiação da sua culpa. Por isso mesmo entregava-se... Aceitava a pena que lhe quisessem dar... sem qualquer relutância.

Levou para a cela grande volume de blocos de papel, algumas esferográficas e aquela modesta e ultrapassada máquina de escrever, companheira inseparável das vigílias literárias anteriores, antes de embrenhar-se nos ínvios labirintos virtuais, passados para trás pelas dificuldades apresentadas.

Outro companheiro fiel foi com ele – o radiozinho de pilha – pequena janela por onde entravam os ecos da vida lá de fora – e do qual jamais se separaria.

Começava assim a quinta e última fase do seu bem elaborado plano:

– Teria casa, comida, roupa lavada e privilégios adquiridos de um diploma... até ali mal aproveitado, reconhecia. Tudo isso e muito mais calculadamente conquistado e garantido por lei! Enrustidas nesse acervo, as promessas de horas e horas de ócio infinito!

Horas livres de compromissos e obrigações. Horas inteiras ao seu inteiro dispor! Para escrever e escrever como e quanto quisesse!

Sentiu-se rico!... Por ter conseguido tempo de sobra para narrar, sem ser interrompido, as fartas impressões colhidas e vividas fora daquelas grades! E sem relógios por perto a lhe imporem limites, sem telefones a lhe atazanarem os ouvidos e sem ninguém a lhe dar ordens ou cobrar datas. Sua única responsabilidade: – manter-se vivo e ativo para trabalhar por conta própria, sem patrões!

Teve absoluta certeza de que, afinal – longe de sentir-se preso, estava, como nunca, livre por inteiro!

Aspirou fundo, como a querer engolir todo o ar do mundo! E, dono do espaço e dono de si mesmo... abriu, satisfeito, as asas do pensamento!...

Aquele seu ousado e bem elaborado plano... dera certo!... E ponto final!

- Ponto final?! Claro que não! Não foi assim que tudo terminou.

Os tempos haviam mudado... E o arquiteto daquele sonho desassombrado sequer notara!

– Tudo estava diferente! Quem devia, pagava, entre grades, as despesas da "hospedagem" e com o próprio suor do seu trabalho – nada de ócio gratuito!

E foi assim... que aquele plano, elaborado com minúcia extrema, acabou por fracassar redondamente, uma vez que o trabalho imposto jamais deu folga para que a ousadia do ingênuo escritor pudesse funcionar como sonhara.

Tarde demais, entendeu ele a sabedoria do dito popular: – "O crime não compensa!"

Fonte:
Carolina Ramos. Canta… Sabiá! (folclore). Santos/SP: publicado pela Editora Mônica Petroni Mathias, 2021. Capítulo 5: Contos rústicos, telúricos e outros mais.
Livro enviado pela autora.

Barão de Itararé (Versos Diversos) 2

INCONTENTADO


Apenas um olhar, pedi-Ihe um dia,
Para acalmar meu coração no peito.
Mil olhares, assim como queria,
Recebi-os, que olhares não rejeito.

Depois, pedi um sorriso... E ela sorria,
Duma maneira tal, dum certo jeito,
Que, apesar de sorrir como eu pedia,
Não me achava, contudo, satisfeito.

Depois pedi-lhe am beijo... convencido
Que ela fosse negar) mas a imoral
Permitiu que a beijasse em plena face.

Outras coisas pedi. E, aborrecido,
Por não me ter negado, eu, afinal,
Pedi, por  Deus, que nunca mais me olhasse.
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MEU FRAQUE

No guarda-roupa eu tenho um belo fraque,
Meu traje predileto de passeio.
Quando de tarde o visto, até receio
Que a minha namorada se embasbaque.

Quando me quero dar certo destaque,
Vai aos bailes comigo e não faz feio.
Amigo da miséria, resgatei-o
Duas vezes que foi ao bric-a-brac.

Um fraque assim no mundo igual não há
Parece novo, pois ninguém dirá,
Que já cinquenta invernos completou.

Esse meu fraque fica-me tão justo,
Que quando o visto, eu mesmo, às vezes, custo,
Acreditar que foi do meu avô...
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MEU LEITO

Naquele canto escuro está meu leito,
Cama de vento, um colchão pegado...
nessa pobre cama que me deito,    -
Quando venho da rua fatigado.

Nessa mesma cama que hei sonhado
Muito sonho d'amor, que está desfeito...
D’uma feita sonhei que fui eleito
Senador, mas não sei por qual Estado.

Muito embora não tenha travesseiro,
O sangue não me sobe... nem me desce,
Circulando em seus rítmicos harpejos.

Passaria deitado o dia inteiro,
Se essa cama de vento não tivesse
Tantas pulgas e tantos percevejos...
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 SONHO DOURADO


Se eu fosse rico, casaria contigo…
Na certa, que a proposta aceitarias...
E te juro que em mim encontrarias
Marido fiel e dedicado amigo.

Depois, juntos, iríamos viajar...
Não na Europa, que lá tu não me vias.
Mas podíamos fazer todos os dias
Uma volta no bonde circular.

O mundo todo morreria de inveja.
Sozinhos ficaríamos na vida,
Passeando sempre de vestidos novos.

Mas eu sou pobre qual ratão de igreja...
Consola-te comigo, pois, querida,
Porque a homem põe e... o diabo come os ovos.
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TEU OLHAR

Deixa beber na luz do teu olhar,
A inspiração para fazer meus versos.
Não te importes... Deixa o povo falar...
O mundo é assim... Os homens são perversos.

Mas que tens, hoje? Que te fiz, querida?
Não me trates assim, não sejas má.
Deixa beber a luz apetecida...
Revira bem os olhos para cá.

Ah! Teu olhar tem algo de sublime,
Que não vejo no resto das mulheres
E que a palavra do homem não exprime.

Por esse olhar, passado de ternura,
Dou um dente, meu bem, e, si quiseres,
Sou capaz de dar toda a dentadura...

Fonte:
Apporelly (Barão de Itararé). Pontas de cigarros: livro de versos diversos. Rio de Janeiro: O Globo, 1925.  (II Parte – Cobras e Lagartos)

Lima Barreto (Contos Argelinos) Sua Alteza Imperial Jan-Ghothe

Abu-Al-Dhudut gozava placidamente o trono do país de AlPatak, que ele tinha usurpado da maneira mais inconcebível.

Sabia que era impopular, que o povo ridicularizava com canções satíricas a sua pessoa desgraciosa e proclamava também os seus méritos intelectuais com anedotas hilariantes.

Isto, porém, não o aborrecia, porque, tendo a mesa farta, um harém sortido e sobretudo honras das tropas, dos caids e presentes dos príncipes estrangeiros, ele se satisfazia e se julgava um grande sultão igual àqueles que ilustraram o trono de Al-Patak.

De quando em quando, tinha desejos de se fazer notável e tomava alvitres singulares. Certa vez quis ser protetor das letras e fundou uma academia no seu palácio. Nem de propósito: Dhudut juntou nela tudo quanto foi mau rimador na cidade.

Em outra, entendeu em dar casas baratas a toda gente e gastou na construção delas tanto dinheiro que foi preciso lançar pesados impostos para que o tesouro não ficasse vazio. Tal coisa veio redundar no seguinte: o artífice pagava mais barata a casa, mas comprava pelo dobro a passagem e os alimentos. Assim mesmo, os engrossadores proclamaram-no él-mézuar, que quer dizer, segundo alguns — o pai dos operários.

Para uma única coisa ele tinha jeito: era para criar aduladores. Calcularam os sábios que cada adulador custava, uns pelos outros, ao tesouro público cinco libras por dia e que, com eles, Abu-Al-Dhudut gastou no seu curto reinado cerca de vinte mil contos na nossa moeda.

Impopular e odiado, por causa de suas vexações e crueldades, quis ter dedicações; e, para isso, abriu as portas das prisões aos criminosos condenados e não prendia os que eram apanhados em flagrante.

A capital do Estado ficou assim entregue aos malfeitores que, não contentes com a espórtula que recebiam do chefe de polícia — kaïa — extorquiam, sob ameaça, dinheiro aos mercadores.

Para os cargos do governo, para os principados vassalos, ele nomeava parentes obscuros e sem saber, chegando até a fazer ulemá do Beit-El-Mal, juiz das heranças, um seu primo que não sabia ler o Corão.

O povo de Al-Patak é manso e ordeiro, por isso ele vivia sossegado, tramando violências com o seu vizir Pkent-Phin', um homem cruel e violento, que fora na sua mocidade criador e castrador de cavalos.

Não contava, portanto, com nenhum levante do povo e passava a vida na mesa e no harém, em passeio e festas, sem cuidados nem incômodos. Os seus parentes também levavam a vida da mesma forma, tanto mais que haviam ficado ricos com as riquezas do Estado e com os presentes que recebiam em troca de proteção a este ou àquele.

Um dia veio, porém, que, não se sabe como, o povo se levantou, levou a tropa de vencida, varou as muralhas que cercavam o palácio de Abu-Al-Dhudut e tratou de pô-lo na rua.

Embora o sultão tivesse ficado com muito medo, não quis logo sair pelo caminho escuso que lhe ensinava haver o seu fiel eunuco Brederodes. Quis ainda carregar algumas riquezas e correu aos subterrâneos do palácio.

Esperava encontrar lá cequins de ouro, aos sacos; diamantes, pérolas, rubis, topázios, safiras, barras de ouro, enfim, riquezas sem número que haviam sido amontoadas pela longa geração de vinte sultões.

Desceu escadas secretas, sempre acompanhado do seu fiel Brederodes, enquanto o povo ululava diante das portas do palácio e as mulheres do harém ganiam e soltavam gritos estridentes, os quais não lhe davam nenhuma pena.

Descia com febre e obsedado.

Chegado que foi ao tesouro, o guarda veio abrir-lhe a porta chapeada, couraçada e lenta de mover nos gonzos.

O sultão logo perguntou:

— Onde estão os diamantes, escravo?

O guarda respondeu:

— Saberá Vossa Majestade que o Vosso sublime irmão, sua Alteza Imperial Jan-Ghothe, levou-os todos?

— E os cequins? e a prata? e as pedrarias?

O guarda, com todo o respeito e muita calma, respondeu:

— Saberá Vossa Majestade que o vosso sublime irmão, sua Alteza Imperial Jan-Ghothe, levou tudo.

Abu-Al-Dhudut quase desmaiou; e, chorando, disse para o eunuco:

— Brederodes, como sou desgraçado! Não ficou nada para mim!
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Continua…

Fonte:
Lima Barreto. Histórias e sonhos. Belém/PA: Unama. Publicado originalmente em 1920.

Marcelo Spalding (Dicas para a criação de personagens na ficção)

Um dos temas mais instigantes da ficção, a construção de personagens. Muitas vezes, a primeira ideia que nós temos é de uma personagem que queremos criar. Não é por acaso, nesse sentido, que tantos livros e filmes têm no título o nome do protagonista (Frankestein, Dom Casmurro, Dom Quixote, Batman, Peter Pan).

Há diversas técnicas para construção da personagem e diversas tipologias das personagens. A mais simples e útil para começarmos a pensar tecnicamente em nossos personagens é a que distingue as personagens planas das personagens esféricas. A terminologia vem de Edward Morgan Forster, citado por Antonio Cândido em A Personagem de Ficção.

Personagens planas são aquelas que não mudam com as circunstâncias e são facilmente identificados na narrativa. Em geral, são coadjuvantes, mas há muitos protagonistas (especialmente em histórias maniqueístas) que comportam-se de forma plana: super-heróis, vilões, princesas, bruxas. A personagem plana é aquela que é sempre boa, é sempre má, é sempre apaixonada, é sempre sacana. Não há variação de caráter, ele não hesita. Nos casos mais radicais, essas personagens são meros estereótipos que funcionam na narrativa como parte do cenário (o mordomo, o ladrão, a vizinha gostosa). No humor e nas histórias infantis esse tipo de personagem costuma fazer muito sucesso. Talvez essa seja uma das explicações do sucesso permanente de Chaves.

Personagens esféricas: são as personagens modernas, capazes de surpreender de maneira convincente. É o herói que tem medo, raiva, rancor, é o vilão que mostra sua face humana, é a esposa romântica e apaixonada que olha para o vizinho ao lado. Segundo Cândido, a marcha do romance moderno foi no rumo de uma complicação crescente da psicologia do personagem; deste ponto de vista, poderíamos dizer que a revolução sofrida pelo romance no século XVIII consistiu numa passagem do enredo complicado com personagem simples para o enredo simples (coerente, uno) com personagem complicada. Basta compararmos o Ulisses na Odisseia de Homero com o Ulisses de Joyce. Ou o Super-Homem com o Batman.

É interessante notar, nesse sentido, que mesmo nas narrativas infanto-juvenis há uma maior complexidade na elaboração dos personagens. Em Shrek, por exemplo, as personagens clássicas, estereotipadas, são satirizadas, dando lugar a um ogro como herói e a uma ogra como princesa. Em Os Incríveis, os heróis são proibidos de usar seus poderes e vivem como uma família de classe média. Em Monstros S/A, são exatamente eles, os monstros, os protagonistas da história. Isso sem falar nas sombrias versões juvenis de Chapeuzinho Vermelho e Branca de Neve.

Por outro lado, o grande erro na construção de um personagem é o maniqueísmo. Originalmente, o termo remonta a uma filosofia religiosa sincrética e dualística que divide o mundo entre Bem, ou Deus, e Mal, ou o Diabo (Santo Agostinho, por exemplo, a princípio fora influenciado pelas ideias maniqueístas, mas terminará por combatê-las).

Em suma, hoje dizemos que uma obra maniqueísta é aquela que divide as personagens em bons e maus, sendo os bons sempre muito bonzinhos e os maus, sempre muito maus. As personagens, assim, são sempre planas, nunca complexas. Os exemplos mais tradicionais encontramos nos blockbusters hollywoodianos e nas novelas da Globo, que chegam a ter o núcleos dos bons e o dos maus.

Ocorre que, sem entrar em discussões sociológicas ou psicológicas, na vida real nós não somos apenas bons ou apenas maus, até porque sendo assim não sobreviveríamos nesse mundo por muito tempo. Em geral, as pessoas têm medos, receios, preconceitos, ansiedades, e transmitem isso em pequenos detalhes, lutando para fazer o bem, mas naturalmente comportando-se de forma duvidosa vez que outra. Não estou falando que as pessoas seriam capazes de matar, mas tampouco seriam humilhadas e mal tratadas sem sequer levantar a voz ou transformar o choro em raiva, como acontece em tantas cenas de novela.

Dessa forma, um texto feito de forma maniqueísta não é verossímil, pelo menos desde meados do século XVIII. Sendo assim, a não ser que de forma planejada e proposital, evite enredos maniqueístas e protagonistas planos. As exceções clássicas são a comédia e as obras para o público infantil, mas vale refletir sobre por que as crianças hoje se identificam tanto com o Shrek e tão pouco com o príncipe, os jovens apreciam tanto com o sombrio Batman e tão pouco o belo Super-Homem.

Um exemplo de construção verossímil da personagem, embora maniqueísta, é o já citado Peter Pan. O menino pode voar, mas só se tiver pensamentos felizes, além de ser fundamental a presença da fada Sininho. É a partir desses dois elementos que Peter Pan, soprando o pó de pirilimpimpim em Wendy, poderá voar com ela e seus irmãos. Peter Pan, assim, pode voar, mas enfrentará diversos perigos, pois não é imortal, não tem super-poderes, não é invisível. Se de uma hora para outra se tornasse, haveria uma quebra na relação de confiança com o espectador. E o mais interessante, nesse caso, é o final melancólico, quando Peter Pan acena para Wendy do lado de fora da janela de sua casa, alijado daquele mundo dos humanos que crescem: o contrato ficcional foi mantido, Peter Pan é o menino da Terra do Nunca, ainda que os demais meninos perdidos tenham ido morar com a família de Wendy.

Outro exemplo da literatura/cinema que consegue mesclar realidade e ficção com relativa destreza é Harry Potter, série capaz de arrebatar primeiro as crianças, depois essas crianças crescidas e agora elas já como leitores maduros e universitários. Já na primeira cena vemos o menino procurando a estação sete e meio do trem, se não me engano, para entrar no mundo dos bruxos. Suas magias dependem de sua varinha, e Potter só pode voar com a vassoura ou ficar transparente com a capa, elementos que vão guiando o leitor/espectador ao longo de toda a série.

A regra de ouro na construção de histórias fantásticas, portanto, é a verossimilhança. Dos conflitos, do cenário e especialmente das personagens.

Fonte:
Texto enviado pelo autor, do Portal Escrita Criativa.

domingo, 19 de setembro de 2021

Adega de Versos 46: Vanice Zimerman

 

Olivaldo Júnior (Revoada de Palavras) 1

MARINA


Do alto de sua janela, Marina regava as plantinhas ao chegar em casa. Moça, pele clara, com um ótimo emprego, parecia se destacar no mercado publicitário a cada dia. Era feliz.

As visitas pipocavam no apartamento de Marina, que adorava receber bem. Havia inclusive notícias de homens e mais homens interessados nela, que parecia levitar nos ares.

Orgulho dos pais, certo dia, não foi trabalhar. Logo ela, que não faltava nunca! Uma amiga desconfiou de seu sumiço, foi até sua casa. Não, a corda não tinha faltado. Silêncio.
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O MENINO E A AURORA SOBRESSALENTE

Para o Henrique

Era um menino que se chamava Henrique. Atendendo ao chamado da natureza, ele cresceu, mas, por dentro, era o mesmo, um menino. Sei que é difícil permanecer menino, quando todas as forças do mundo querem nada menos do que nos retrair e nos tornar cada vez mais duros e insensíveis ao próximo. O próximo, para o Henrique, era o próximo mesmo, o semelhante, aquele que para um pouco para ouvir o próximo, mesmo ausente, distante.


Hoje, esse menino já crescido perdera o pai para o câncer. Hoje o dia está bem triste, cinzento, sem muita luz, nem poesia. Estive há poucos dias com esse amigo, que, conformado com o que o destino reservara ao pai, me sorria, aliás, como sempre fazia. Sorria como se a vida fosse uma luta em que não há vencedor, apenas oponentes, um em cada lado da linha, porém, oponentes que se justapõem, pois se complementam nessa luta diária, constante.

Henrique. Eis o nome do menino que é adulto, posto à prova constantemente pela vida, que é de morte. Não da morte que nos mata com um só golpe, mas da morte que nos enclausura em seu casulo, para que, de dentro dele, possamos voar, tenhamos longas e lepidópteras asas, tão borboleantes quanto a aurora sobressalente que só um menino consegue guardar em suas íris. Que essa aurora sobressaia nos céus do Henrique e de sua família.

Fonte:
Textos enviados pelo autor

Ronnaldo de Andrade (Album de Spinas*) 1

6x7


Sumiste, de repente,
aterrando uma pedra
no simplório sapato

deste que agora, de fato,
manca com bolhas no pé.
É! Faltou-me ter mais tato
no romance. Sofro o efeito
do meu sã, verdadeiro ato!
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BOTÃO X ROSEIRA

Velhice: grande dádiva,
presente perfeito para
quem sabe envelhecer.

Quando enxerga a vida florescer,
se vive experiência, tem sonhos,
as mãos rugosas ganham poder.
Gera-se (é comum) tantas vidas,
tantos vivem tanto — Sem viver!
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NA AUSÊNCIA DO SEU CORPO
ENTREGO-ME ÀS FANTASIAS


Pensando em você
fico na madrugada
a numerar estrelas.

Ausculto cânticos alegres de corujas,
a ventania pronunciado-me seu nome
causar sensações... Não sei dizê-las!
Reputo as pardas paisagens noturnas
sem eu nem sequer compreendê-las!
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NÃO HÁ PROGRESSO SEM DESTRUIÇÃO

Naquele estreito caminho
caminhei inúmeras vezes;
hoje descomunal estrada!

O progresso apareceu de madrugada
extirpando árvores, rasgando a terra,
barulhento, com a rapidez exagerada.
Esticando o caminho, toda paisagem
foi, para minha amargura, modificada!
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QUANDO SE VIVE O PRESENTE
COM SAUDADE DO PRETÉRITO


Embaixo da braúna,
cheio de ferrugens,
aquele velho arado.

Amigo, companheiro de minhas labutas,
dos momentos inimagináveis de solidão;
ouvinte imparcial, quase sempre calado.
Hoje estamos ultrapassados, é verdade:
somos museus daquele tempo passado.
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*Algumas Regras da Estruturação do Spina

O Spina é um poema constituído por duas estrofes. A primeira estrofe é iniciada, necessariamente, por uma acepção trissílaba. Com três versos com três palavras em cada.
A segunda estrofe é composta de cinco versos com cinco palavras em cada, e não há a obrigatoriedade de ser iniciada por uma acepção trissílaba.
O sistema rímico é ABC//DECFC ou ABC//CDCEC.
Algumas conjunções estão proibidas no SPINA.
1) Aditiva: e;
2) As adversativas: mas/ porém/ todavia/ contudo/ no entanto/ entretanto;
3) A conclusiva e explicativa: pois;
4) Nas causais fica vetada unicamente: pois Nas subordinativas, censura-se somente uma. Ela faz parte das conjunções causais: pois;

Mais regras do Spina no link
https://singrandohorizontes.blogspot.com/2020/07/ronnaldo-de-andrade-spina-nova-forma.html


Fonte:
Spinas enviados pelo poeta.

Fabiane Braga Lima (Caixinha de Crônicas) 1

NAQUELA NOITE


Naquela noite, não restava mais nada, a minha mente foi voltando ao normal, enxerguei a vida, não havia mais o medo de ficar presa no meu subconsciente. Fui enxergando aos poucos, onde tinha me perdido, fui me encontrando aos poucos. Deu uma vontade grande de chorar, quis voltar, mas não havia mais nada, apenas destroços e meus versos feitos nas madrugadas. Como é triste, e dolorido saber que deixamos de viver por meras ilusões, como é triste saber que perdemos tempo, pois eu perdi. Nada faz sentido, é como um relógio empoeirado e quebrado, presa no tempo. E quando realmente acordei, não me lembrava de mais nada, precisava cuidar do meu psicológico. Naquela noite, não ouvia vozes, nas quais me perturbavam, não havia sombras do passado. Naquela noite, eu acordei e resolvi viver. Foi preciso a arte me esmagar para que eu pudesse sentir que tenho alma, e sede de vida...!
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ENIGMA

Repugnante e sem razão, sou eu sem você. Então, surge do nada, dominada por este amor desmedido, me entrego. Encantada com seus mistérios, e seu jeito de me acalentar em teus braços, meu corpo o deseja.

De repente, todo desejo desaparece! Estou enlouquecendo, tu se tornaste um vício, preciso encontrar os desígnios da tua alma, e tua melhor parte! Mas, todo este sentimento é muito forte, fico eu intacta, como se estivéssemos entrelaçados, mas só escuto eco, apenas eco e mais nada.

No oculto! Sacia-me no silêncio, sinto minha pele arder por te querer, assim, desmedida. Profanação! Minha cura e loucura, mistérios da alma o grito intenso no silêncio!

Aquieto-me e penso: — Nem todas as verdades são para todos os ouvidos, nem todas as mentiras podem ser reconhecidas como tais.

Desvendar te não ouso!
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A VIDA ME DEU OUTRA CHANCE

Creio que a vida me deu outra chance... Quantas vezes tropecei, caí e depois me levantei. Como um pássaro caído, alcei voo, errante e sem destino! Morri e renasci, nas minhas andanças, nos meus infindos e fantasiosos devaneios. Acordei em desatino, pude ver com os meus olhos e sentir na minha pele todas as dores. Pensei: - Que valor tem um poeta que fala de dor! O mundo já vive assombrado, necessita de amor e não de dor. Eu vivo na certeza e na tristeza daqueles que se foram por um maldito vírus. Vivo numa realidade assombrada, mas grata por estar viva!

Fantasio meus devaneios, para não sangrar a dor da realidade reinante. Tento e quero levar um pouco de amor para este mundo. Revigoro-me a cada dia para que o amor seja o meu objetivo. Se eu cair e não me levantar mais! É porque caminhei sobre espinhos e me feri. Mas eu sempre quero estar de pé, pois! Eu vivo. EU VIVO.

Fonte:
Textos enviados por Samuel da Costa.