quinta-feira, 26 de maio de 2016

Olivaldo Júnior (Conto para os que amam ou @AmorPraSempre)

No ano de 2046, o amor tinha virado peça de museu. Eu explico: a rapidez da comunicação virtual tinha suplantado a comunicação real de um tal modo que as pessoas sequer falavam umas com as outras. Tudo era na base da transmissão energético-magnética, e os homens eram cada vez mais impelidos a se comunicar sem palavras. E, sem elas, o toque foi ficando ausente das relações sociais, e o mundo intensamente high-tech cobrava seu preço dos tão maravilhados usuários de redes sociais e afins, que dominaram a cabeça, o corpo e a alma da gente. Onde entra o amor nessa história? No caso de amor entre um moço e uma moça do futuro que estão ali...

Ele, recostado na parede de um shopping ultra, super, hiper, mega moderno, mal pode esperar por ela, que já mandou telepaticamente uma mensagem para ele, com o ícone de um coração. Palavras? Elas tinham cedido lugar aos desenhos, e todo o mundo se comunicava mais por símbolos que pela fala, ou pela escrita. Tudo era um símbolo. O do amor, claro, era um doce coração, que variava entre um e outro, de acordo com o humor. O daquele casal adolescente era um coração cercado de estrelas, cada uma representando uma semana de namoro. Relações duráveis? O que era durável para um povo que já falava com o outro através do pensamento e, daqui a pouco, quem sabe, se locomoveria pelas dimensões no Expresso Quântico, que já era uma tendência em países mais adiantados que o nosso. Viajar no tempo? Isso não era coisa de cinema, mas do dia a dia. E você? Para onde quereria ir, hein?

Voltemos ao jovem esperando a namorada. Quando ela chegou, enviou para ele um beijinho metafórico, que foi prontamente respondido com outro, um pouco mais afoito, que mereceu repreensão. Certas coisas nunca mudam... O shopping, aliás, era um ambiente bem parecido com o que temos agora, mas os produtos não ficavam mais expostos. Tudo era visto e sentido em hologramas sensoriais. O que se queria era mentalmente pedido em forma de compra que, em questão de minutos, era materializado na frente do pensador, digo, comprador. Onde o romantismo de se escolher a mercadoria, pedir para entregá-la, enfim, todo o trâmite da compra? Não havia mais. Assim como o amor. Ficava-se junto porque se ficava. O amor, como questão de posse, pertença a outra pessoa, era coisa do passado, da vovó... Gostar de alguém era um luxo. Aqueles jovens passeando pelo shopping era um luxo.

Ao fim do passeio, nada de beijos. A moça percebeu uma intenção mais quente no moço e, pra fim de conversa, "blindou" sua mente, e ele ficou sem poder se comunicar com ela por quase um mês. Foi um gelo cibernético, sabe? Depois, passaram a conversar pelo WhatsApp versão 5005, que nem consigo descrever do que era capaz. Mais uma coisa não tinha mudado: a sensação de saber que era possível burlar as regras e fazer diferente dos demais contemporâneos. Marcando encontro com ela, tirou seu chip do encaixe atrás da orelha direita e pediu a ela que também fizesse o mesmo. Assim, quando se encontrassem, seriam puros, naturais. E assim se deu. Tiraram a tecnologia excessiva, a pedra, do meio do caminho, e, tão soltos quanto um verso bem livre, beijaram-se muito quando se viram.

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Fontes:
O Autor
Imagem = http://www.noticiasdeitauna.com.br

29º Jogos Florais de Ribeirão Preto/SP - 2016 (Classificação Final)

Tema:  Forja (Lírica/Filosófica)

VETERANOS

Vencedores:

1o Lugar
Therezinha D. Brisolla
São Paulo/SP


2o Lugar
Dulcídio de Barros M. Sobrinho
Juiz de Fora/MG


3o Lugar
Carolina Ramos
Santos/SP


4o Lugar
Olímpio da Cruz S. Coutinho
Belo Horizonte/MG


5o Lugar
Alba Helena Corrêa
Niterói/RJ


Menções Honrosas:

1o Lugar
Delcy Rodrigues Canalles
Porto Alegre/RS


2o Lugar
José Antonio de Freitas
Pitangui/MG


3o Lugar
Relva do Egypto R. Silveira
Belo Horizonte/MG


4o Lugar
Dodora Gallinari
Belo Horizonte/MG

 

5o Lugar
Antonio Augusto de Assis
Maringá/PR


NOVO TROVADOR

Luiz Moraes
São José dos Campos/SP

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Trovas Humorísticas
Tema: Alfinete


VETERANOS

Vencedores:


1o Lugar
Antonio Augusto de Assis
Maringá/PR


2o Lugar
Renato Alves
Rio de Janeiro/RJ


3o Lugar
Alba Helena Corrêa
Niterói/RJ


4o Lugar
Roberto Tchepelentyky
São Paulo/SP


5o Lugar
Fabiano de Cristo Magalhães Wanderley
Natal/RN

 

Menções Honrosas:

1o Lugar
José Ouverney
Pindamonhangaba/SP

 

2o Lugar
Marialice de Araujo Velloso
São Gonçalo/RJ

 

3o Lugar
Antonio Colavite Filho
Santos/SP


4o Lugar
Heder Rubens Silveira e Souza
Natal/RN

 

5o Lugar
Edmar Japiassú Maia
Nova Friburgo/RJ

 

NOVO TROVADOR

Luiz Moraes
São José dos Campos/SP

Irmãos Grimm (O Músico Maravilhoso)

Num país distante havia um músico que tocava muito bem violino. Como a vida não lhe corria muito bem, decidiu procurar um companheiro. Foi até à floresta e pôs-se a tocar, até que lhe apareceu um lobo assustando-o. O lobo disse-lhe que tocava muito bem e que gostava de aprender a tocar como ele. O músico prometeu ensinar-lhe se ele fizesse tudo o que lhe mandasse. Então ao dirigirem-se para um carvalho velho, que estava oco e que tinha uma fenda a meio do tronco, o músico disse ao lobo que se quisesse aprender a tocar violino teria que meter a pata nessa abertura. O lobo obedeceu e o músico apanhou uma pedra, entalando a pata do lobo na fenda.

Como o músico queria encontrar um companheiro, lá continuou a tocar violino com entusiasmo, até que apareceu uma raposa encantada com a música, dizendo-lhe que gostava de aprender a tocar como ele. Pelo que o músico respondeu que para isso bastava que ele fizesse tudo o que lhe mandasse e então continuaram a andar até chegarem a um caminho estreito, aí ele prendeu com os pés dois ramos de aveleira e dizendo à raposa que se quisesse aprender a tocar violino lhe desse a pata esquerda. O animal obedeceu e o homem atou uma das patas a um ramo e a outra ao segundo ramo. Ao tirar os pés dos ramos, eles endireitaram-se e a raposa ficou suspensa pelas patas.

Como ainda não tinha encontrado o companheiro para formar sociedade e ganhar a vida, sentou-se a tocar o violino. Entretanto apareceu uma linda lebre que ao gostar da música lhe pede para o ensinar a tocar. O músico promete-lhe ensinar se ela obedecer às suas instruções. A lebre aceita e deixa-o atar um cordel à volta do pescoço, prendendo-a a um tronco.

Entretanto o lobo debatendo-se consegue soltar a pata e enfurecido vai atrás do músico, encontrando pelo caminho a raposa que lhe pede para a soltar. Ao passarem perto da lebre esta gritou por ajuda e foram todos os três em busca do músico. Este entretanto, tinha atraído com a sua música um caçador que lhe pede para aprender a tocar. O músico satisfeito disse-lhe que o ensinaria de muito bom agrado, já que tocar bem um instrumento era um privilégio de homens e piscando-lhe o olho deu-lhe sinal para os animais que se aproximavam furiosos.

O caçador apontou-lhes a arma ameaçando-os pelo que assustados fugiram todos a correr.

O músico ficou todo satisfeito por ter encontrado um companheiro e assim passaram a andar de vila em vila tocando e caçando para que nunca lhes falte comida.

Fonte:
http://www.grimmstories.com/pt/grimm_contos/titles

quarta-feira, 25 de maio de 2016

José Feldman (Trovas de Louvor a uma Princesa Morta)


Susana Custódio (Poemas Avulsos)

TANGO
Na noite pejada de magia
Os dois rodopiando no salão
Os olhos sorrindo d’alegria
Transmitíamos pura emoção.

Enlaçados com elegância
Em compasso de dois por quatro
Das tuas mãos o meu corpo pendia
Espargindo do amor a fragrância.

Por todo aquele anfiteatro
Os aplausos foram-se propagando
Já da noite despontava o dia
E após o ultimo passo condutor.

A vênia em plena sedução
Não era ser somente um tango
No leito continuaríamos
A performance do nosso amor.

QUANDO

Naquele jardim, te afastaste
E já longe gritaste!
Corre para mim...
Eu, louca fui correndo,
Abriste os teus braços...me agarraste...
Rodopiando num louco frenesi!

Quando
Naquele barco
Que lento ia cortando as águas do Sado,
Com a tua viola...
Dedilhando nas cordas "Les feuilles Mortes”
E a tua voz grave cantava a doce melodia!!!
Esquecemo-nos de tudo e de todos,
E de olhos nos olhos eu te ouvia...
Amando-te cada vez mais!!!Quando
Nas dunas da praia nos deitamos
E nos amamos,
Entre beijos, carícias e gemidos!!!

Quando
Hoje olho para ti...
A saudade me invade...
EU continuo a ser EU!
E TU já não és TU!
És a sombra daquele,
Quando
No jardim...
No barco...
Nas dunas...
Me amaste!!!

ENCÔMIO À MINHA MÃE

Não sei o que mais minh’alma chora;
No momento que escrevo, eu revivo
Esta dor que é antiga e que é d’agora,
P'lo sentimento qu’ inda está tão vivo…

Mãe! Não sei porque te foste embora!
Também esta amargura que cultivo
Em mim, e do que sinto, és geradora
E esta dor é lamento muito antigo.

Meu coração encharca-se de mágoas
Recordar? – Se destes olhos brotam águas...
Oh! Mãe, minha Mãe, quanta saudade!

Vê meu carinho mãe, por piedade...
Já que partiste da minha mocidade,
Vê! Quero mostrar-te as minhas mágoas!

DESAPEGO

É este não saber o que quero,
Que me amargura,
Que me dá este desassossego
Que me persegue e em mim perdura
A vontade de tudo querer
E logo este desapego!

Esta vontade não sei de quê, é dura!
Sinto o meu peito em chaga…
Eu queria tanto um amor doçura,
Esta falta que sinto me esmaga…

Todo o meu ser é confusão,
Quero pensar e não me compreendo…
Toda esta vida é uma ilusão
Só eu sei como estou sofrendo!

Ah! Seu eu tivesse alguém a quem beijar,
Que me tirasse este desejo,
Esta ânsia de amar!

RESILIÊNCIA

Possuo a delicadeza das flores
Torno-me fera para proteger
Todos os meus divinos amores
Pois sem eles não sei viver

Posso ser dura como a rocha
Mas carrego comigo um sorriso
Que ilumina o deserto qual tocha
E vou buscar forças onde for preciso

Mesmo quando me apetece gritar
Permito que entrada da alegria
Faça no meu peito o amor aportar
Pois nos sentimentos há magia

Eu sei, nasci com o dom da paciência
Altiva, couraçada, percorro a sorte
Enigmática, mas essa é minha essência

Nada temo - ares de fraca - sou forte
As forças vêm desta resiliência
Que só se deterá perante a morte

Fontes:
Boletim Os Confrades da Poesia Nr 62 | Maio / Junho 2014
http://susanacustodio.blogspot.com.br

Susana Custódio (1949)

Susana Custódio nasceu em Lisboa em Maio de 1949, reside em Sintra desde os 18 anos. Desde os 14 anos começou a escrever alguns “rabiscos” a que ela chama “Estados de Alma”.

Estudou em Lisboa e em Londres, mais tarde viajou para Moçambique, país pelo qual viria a ter uma “Grande Paixão” que ainda hoje perdura.

Aos 27 anos ganhou um prêmio de literatura oferecido pelo Inspector Varatojo na RTP, ao escrever um conto inédito sobre a grande escritora inglesa de ficção policial Agatha Christie.

Em 2010 a convite de una editora teve a oportunidade de ver alguns dos seus poemas no livro “ Sentimentos Profundos” que dedicou a seu filho.

Lecionou por muitos anos a língua inglesa.

Membro de várias associações poéticas, como:
APP – Associação Portuguesa de Poetas;
Poetas del Mundo e cônsul de Sintra;
Poetas do Povo – Sintra;
Os Confrades da Poesia;
AVSPE Brasil;
AVBAP Brasil.

Tem vários poemas escritos e alguns contos.

Fontes:
Boletim Os Confrades da Poesia Nr 62 | Maio / Junho 2014

Carlos Lúcio Gontijo (A Vida e Morte de Todos Nós)


Todos nós somos sementes de luz espiritual semeadas na Terra pelo Criador. E assim, à medida que, aos olhos do Senhor, nos apresentamos maduros, somos colhidos para auxilia-Lo na conservação e luminosidade da verdadeira "Cidade Luz": O PARAÍSO!

Sempre achei e continuo achando um grande equívoco as páginas dos jornais, aqueles poucos que ainda abrem espaço para artigos de opinião, tratarem tão-somente da análise de assuntos políticos, dentro do radicalismo tacanho do contra e a favor, sem enveredar por qualquer tentativa de levar os leitores à reflexão sobre temas capazes de introduzir no mar de tanta discórdia social e violência alguma gota de sensibilidade e noções relativas ao invisível, que rege a nossa existência e nos dá ânimo diante da perda de pessoas queridas e amadas para o inexorável destino da morte física que a todos nós espreita.

No vazio desse trabalho jornalístico de cunho espiritual, sempre visto como assunto menor ou mesmo irrelevante, assistimos ao desespero de seres humanos diante da morte, principalmente pelo fato de as pessoas terem a sua mente absorvida pela pregação materialista da cultura construída pelo consumismo desenfreado em que vivemos.

Durante o tempo em que publicamos artigos em jornal impresso de grande circulação, jamais tivemos acanhamento em misturar temática mais espiritualizada a assuntos de essência política, abrindo-os ou terminando-os com versos e pensamentos voltados ao enlevo do espírito humano, sob a crença de que, sem incensar a alma, palavras e ideias contidas em um texto não conseguem ser integralmente compreendidas pela amplitude da mente e da razão.

Em todos os momentos de nossa vida, devemos diminuir a distância entre o Céu e a Terra, porque quanto mais nos agarramos às coisas terrenas mais nos afastamos da sensibilidade e do amor ao próximo, lastreando o caminho rumo à violência e à desvalorização da vida, que é dádiva divina concebida pelo Criador, cuja misericórdia faz da morte um processo de transformação, através do qual renascemos para o resplendor da vida eterna.

Talvez não haja nada mais político que colocar à mesa da discussão gráfica nas páginas dos jornais a luz espiritual que habita cada um de nós, como se fosse um sopro de Deus, que nos abastece, fornecendo o combustível que nos conduz até determinado ponto – uns mais cedo; outros mais tarde –, até a morte, conforme os desígnios do Senhor.

Se verdadeira é a premissa que nos indica que tudo precisa de disciplina e esforço para se tornar realidade, também é de significado inarredável o conselho que nos aponta a conveniência de que a toda realização humana convém uma elevada dose de sonhos, emoção e olhos do coração voltados à satisfação dos anseios da maioria das pessoas, quebrando a visão individualista e impregnada pelo egoísmo ao qual nos encontramos subjugados.

Enfim, não importa sua condição social, a fé que professa, a cor de sua pele ou a sua ideologia política, o fato inconteste é que o imposto sobre a vida – e que, justa e democraticamente, sobre todos recai – é a morte! Já passa da hora de a sociedade introduzir o tema no dia a dia, com naturalidade e desmitificação, até mesmo como forma de livrar os incautos das mãos de tanta gente usando o santo nome de Deus em vão e incrementando o fanatismo apocalíptico do qual alimenta o seu diabólico pastoreio.

Fonte:
O Autor

terça-feira, 24 de maio de 2016

Nilton Tuller (Pai, Desculpe a Franqueza)

PAI. Puxa ! Faz tempo que não pronuncio esse nome. Sabe, papai, eu era um menino cheio de vida. Tinha sonhos febris como os meus colegas de escola. Sim eu sonhei em ser tantas coisas lindas!!! Só não sonhei em ser o que sou hoje. Eu pensava: vou crescer, estudar, trabalhar, etc., etc.

O senhor era meu herói. Sim! Meu Pai Herói! Para mim não existia ninguém com mais autoridade que o senhor. É certo que eu estranhava quando o senhor chegava, meio alcoolizado em casa, abetumado, macambúzio e jururu. Mas, papai, eu quero dizer aqui de longe algo que trago no meu peito há muito tempo. O senhor não me preparou para enfrentar a vida. Lembra, papai? O senhor não tinha tempo para mim. É verdade que o senhor me dava presentes, eu creio que o senhor nunca se esqueceu de um presente de natal, aniversário e tantas outras vezes. Só se esqueceu da minha pessoa. Lembrou-se do que eu precisava, e até do supérfluo, mas não se lembrou do que eu era. Eu era, na verdade um órfão de pai vivo! Pai, eu não queria os seus presentes apenas, eu queria mesmo era o senhor. Queria e ansiava seu calor, o seu abraço, o seu beijo a sua atenção. Abraço!!! Nem me lembro de ter recebido um! O senhor nunca elogiou um boletim escolar que trazia para casa. Um dia a minha bicicleta descentralizou as rodas. Lembro-me como se fosse hoje. O senhor ia saindo para o escritório. Eu lhe pedi para me ajudar. Lembra, papai, o que me respondeu? “Eu não tenho tempo. Meus clientes estão me esperando”. Puxa vida! Eu senti tanto ciúmes do senhor. Afinal seus clientes eram mais importantes do que eu. O senhor e mamãe estavam tão ocupados que mal me viram crescer. Vocês tinham que satisfazer os compromissos com a sociedade. Eu me sentia só, e isto me revoltava. Nasceu dentro de mim um conflito. Eu não sabia bem se o odiava ou tentava chamar a sua atenção para o meu dilema. Eu queria tanto que o senhor soubesse que apesar de tudo, eu o amava. Hoje estou confuso, e nem sei mais o que é amor. Eu sei, papai, que o senhor não é de tudo culpado. O senhor é fruto de uma sociedade consumista e humanista. O senhor nunca me ensinou nada sobre religião, fé, Deus. Nas refeições o senhor só falava em negócios, dinheiro, ações, investimentos etc... Eu quase não via o senhor chegar. Ah! Se o senhor tivesse adivinhado que as poucas vezes que eu estava acordado, esperava que a porta do meu quarto abrisse e o senhor fosse sentar-se na minha cama e pudesse me desejar uma boa noite. Mas... o senhor passava direto para o seu aposento. Por causa disso, papai, eu por curiosidade, por auto-afirmação ou aventura, não sei, entrei para as drogas. Como o senhor não me ajudou, os traficantes me adotaram.

E então os meus sonhos se desmoronaram. Eu que o admirava tanto, passei a chamá-lo de quadrado, velho, coroa e outros adjetivos.

Hoje estou aqui atrás das grades. Sim, papai! Estou preso nas garras do vício, na malha da lei. Pior que isto. Estou preso nas minhas esperanças.

Mas... pensando melhor, pai, eu olhei agora pelas grades da prisão e vi lá fora bem alto e longe uma nesga de céu azul. Creio que há esperança. Eu quero sair daqui, papai. Quero ser livre. Liberte-se também de tudo aquilo que lhe prende, e vamos começar de novo. Vamos fazer um convênio. EU VOLTO A SER CRIANÇA, E O SENHOR VOLTA A SER PAI.

Fonte:
Academia de Letras de Maringá

Irmãos Grimm (A Bola de Cristal)

Houve, uma vez, uma feiticeira que tinha três filhos, os quais se amavam extremamente. Mas a velha não confiava neles e vivia a desconfiar de que pretendiam expropria-la. Então transformou o mais velho numa águia, a qual tinha de viver nos píncaros rochosos e só, às vezes, era vista descrevendo grandes círculos no espaço, descendo e subindo com as largas asas abertas.

Ao segundo filho, transformou numa baleia que vivia nas profundezas do mar, podendo ser vista só quando subia à tona e de suas costas saía um repuxo de água que espirrava à grande altura. Foram concedidas aos dois apenas duas horas por dia, nas quais podiam retomar seu aspecto humano.

O terceiro filho, temendo que a mãe o transformasse, também, nalgum animal feroz, urso ou lobo, fugiu de casa às escondidas.

Ele ouvira contar que no castelo do Sol de Ouro havia uma princesa encantada, que aguardava a sua libertação; mas se alguém tentasse libertá-la arriscaria a vida. Vinte e três rapazes já haviam perecido deploravelmente, ainda um podia apresentar-se e, depois desse, mais ninguém.

Sendo um rapaz destemido e arrojado, resolveu ele procurar o castelo do Sol de Ouro. Depois de andar muito tempo, sem conseguir encontrá-lo, foi parar numa grande floresta; tendo-se extraviado, não sabia como sair dela. De repente, avistou ao longe dois gigantes acenando-lhe com a mão e, quando se lhes aproximou, disseram-lhe:

- Estamos brigando por causa de um chapéu. Queremos saber a quem de direito deve pertencer. Como somos os dois de igual força, nenhum pode vencer o outro. Os homens pequenos são mais inteligentes do que nós, por isso pedimos que tu decidas.

- Como é possível engalfinhar-se assim por causa de um simples chapéu? - disse ele.

- É que não conheces as propriedades que possui. Esse é um chapéu mágico. Quem o põe na cabeça, chega no mesmo instante a qualquer lugar que deseje.

- Dai-me um pouco esse chapéu! - disse o rapaz; - vou andar até àquela distância e, quando vos chamar, correi os dois juntos. Quem chegar primeiro ganhará o chapéu.

Pegou o chapéu, botou-o na cabeça e foi andando, andando. Mas, pensando sempre na princesa, exalou um suspiro do fundo da alma e murmurou:

- Ah, quem me dera estar no castelo do Sol de Ouro!

Mal lhe saíram da boca essas palavras, eis que se achou no cume de uma montanha, bem em frente à porta do castelo.

Sem hesitar, penetrou no castelo e foi atravessando todos os aposentos até chegar a uma sala onde estava a princesa. Mas como se espantou ao vê-la! tinha o rosto de uma cor cinzenta e cheio de rugas, os olhos torvos e os cabelos vermelhos. Sem se poder conter, exclamou:

- Então, sois vós a princesa cuja beleza é exaltada no mundo inteiro?

- Oh! - respondeu ela - Esta não é a minha fisionomia real! Os olhos humanos só podem me ver assim deformada, mas se queres saber como sou realmente, olha naquele espelho: ele não engana e te mostrará a minha verdadeira imagem.

Assim dizendo, apresentou-lhe um espelho e o rapaz, olhando para ele, viu refletida a imagem da mais linda moça que pudesse existir no mundo. E viu lágrimas de intenso sofrimento escorrendo-lhe pelas faces. Então perguntou:

- Que posso fazer para te libertar desse encanto? Dize, pois eu não temo coisa alguma.

A princesa disse-lhe:

- Quem conseguir apoderar-se da bola de cristal e apresentá-la ao feiticeiro, anulará o seu poder e eu readquirirei o meu verdadeiro aspecto. - mas acrescentou: - Muitos já encontraram a morte por tê-lo tentado! Lamento, imensamente, que tu, tão jovem, queiras expor-te a tão graves perigos.

- Nada poderá deter-me. - respondeu o rapaz; - Dize-me, porém, que devo fazer para me apoderar da bola de cristal.

- Já vais saber tudo. - disse a princesa. - Se quiseres descer a montanha onde está o castelo, lá embaixo, perto de um manancial, encontrarás um feroz bisão, com o qual terás de lutar. Se conseguires matá-lo, sairá dele um pássaro de fogo, voando, o qual tem no corpo um ovo incandescente. Nesse ovo, no lugar da gema, está a bola de cristal. Mas o pássaro não deixa cair o ovo, se não for violentamente obrigado a isto. Além disso, se o ovo cair no chão, quebra-se e incendeia tudo à sua volta, destruindo-se no fogo juntamente com a bola de cristal, de maneira que, nesse caso, todo o teu trabalho terá sido inútil.

O rapaz desceu até ao manancial onde se encontrava o bisão, o qual o recebeu bufando e resfolegando, ameaçador. No mesmo instante, travou-se entre os dois uma tremenda luta e o rapaz conseguiu enterrar-lhe a espada no ventre, prostrando morta a terrível fera. Imediatamente saiu voando o pássaro de fogo, procurando elevar- se no espaço, mas a águia, que era o irmão do rapaz, chegou nesse momento através das nuvens, investiu contra o pássaro e com o bico adunco empurrou-o para o mar. A ave, vendo-se em perigo, deixou cair o ovo.

Mas o ovo não caiu no mar; caiu sobre uma choupana de pescadores situada na praia. Caindo em cima dela, imediatamente se elevou uma nuvem de fumaça e ateou- se o fogo, então se elevaram no mar ondas da altura de uma casa, despejaram-se sobre a choupana e extinguiram o fogo. Fora obra do outro irmão, transformado em baleia, que, vendo o fogo, sublevara as ondas.

Depois de extinto o incêndio, o rapaz foi em busca do ovo e, por grande sorte, o achou. Não tivera tempo de derreter, mas a casca incandescente, esfriada repentinamente pela água gelada, partira-se toda. Assim lhe foi possível extrair a bola de cristal.

Quando, finalmente, foi ter com o feiticeiro e exibiu a bola de cristal ao seu olhar, o bruxo disse-lhe:

- Meu poder está anulado. De hoje em diante serás o rei neste castelo do Sol de Ouro. E tens poder, também, de restituir a teus irmãos a forma humana.

Então o rapaz correu para junto da princesa e, ao entrar na sala em que se achava, ela surgiu-lhe pela frente em todo o esplendor de sua radiosa beleza.

Cheios de alegria, trocaram as alianças que os devia unir e viveram na mais perfeita felicidade.

Fonte:
http://www.grimmstories.com/pt/grimm_contos/titles

Olivaldo Júnior (Para gostar de poesia)

O menino, para gostar de poesia, pôs seus ouvidos na fonte e se deixou virar água. Depois, como ser água era pouco, fez-se mesmo em vapor. Lá no céu, refeito em mil partículas concêntricas, achou por bem virar chuva e, num dia de sol, deixou-se cair e, no meio do rio, na beira do mar, em todo o sertão, se fez chuva grossa, se fez chuva fina e voltou a ser água. Assim, compreendeu que, para gostar de poesia, preciso era mesmo ser a alma do verso, a base do som, senhor e sem hora para a matéria urdida, exposta em verso. Servo da água, rumou para o mar de si mesmo, onde a vida era onda, a onda era forma, a forma, uma via para gostar de poesia. Ai de quem não gosta, de quem não gasta seus olhos e não se deixa ser água como aquele menino!... A vida, que é líquida e fim, nubla os olhos de quem não quer chorar e cristaliza no peito as águas que empedram. Mágico, para gostar de poesia, o menino fez mares onde o pó sufocava, deixando vir-lhe a vida que há nas águas de si, sinal de que somos versos de um poema em uníssono, mesmo sem vermos sua forma na folha em branco dos dias. Sábio, para gostar de poesia, o menino (des)fez-se do rio e se encharcou de mar, não só de mágoa. Água, rio novinho à margem velha, fez brotar silêncio e música no bico das aves, na boca dos homens, na brusca poesia que busca ser água, córrego manso, dique, ou represa, para gostar, menino, só de poesia.

Fonte:
O Autor