sexta-feira, 21 de junho de 2019

Academia Peruibense de Letras (Poesias Escolhidas)


EDWALDO CAMARGO RODRIGUES
Cadeira n. 28

Morar no litoral

A casa tão sonhada à beira-mar. Da rede
estendida no alpendre ensombrado por densas
samambaias, diviso as gradações extensas
das serras a distância esvaírem-se. Cede

aos poucos o calor da tarde. Vindo a sede
saciar, os colibris das campânulas pensas
dos lises ao redor voam. Tornam-se intensas
as sombras vesperais. E a calma que precede

a noite enfim se instala, ao cessar repentina
a arenga da cigarra. Acendo a lamparina,
e logo a multidão de frementes falenas

espalha em torno a mim misteriosa alternância
de sombras e clarões. E é como desde a infância
eu tenho desejado: esta ventura apenas.

Elizabeth Cury Bechir Watanabe
Cadeira n. 34

Rio Itanhaém

Vislumbrando a beleza
da boca da barra,
o rio, que realeza!
Barcos retornando,
fim de pescaria
temporal anunciando...

Admirada paisagem
refletida no espelho
das águas do rio.
Momento prazeroso,
profunda paz...

Sapucaitava mais verdejante
cercado de seus habitantes
nesta tarde pacata,
esbanjando tranquilidade...

ESTHER FELICIDADE R. ROMANO
Cadeira n. 13

Perfume de âmbar

Teu suave perfume de âmbar
Inebria meus sentidos
Teu corpo vibra
Ao toque de tua mão
Me perco no universo
Desse amor tão lindo
Envolvida em teus braços
Nessa mágica paixão

Adormeço serena
Nesta noite inebriante
Sentindo em teu peito meu abrigo
Ouvindo o pulsar do teu coração
Essa doce lembrança
Guardarei comigo
Desses momentos sublimes
Que passei contigo.

JOÃO LÍBERO ROSA MARQUES
Cadeira n. 31

O Retorno

Lentamente o homem abriu o portão.
Parou, resistiu à imensa vontade de voltar,
E angustiado pensou como seria a reação dela,
Ao vê-lo voltar depois de tanto tempo.
O cachorro latiu, alerta, quando abriu o portão.
Ao reconhecê-lo, o amigo fel parou de latir
E começou a pular freneticamente, contente.
O homem ajoelhou, abraçou o cachorro,
E, emocionado, começou a soluçar.
Após se recompor, levantou-se, olhou,
E lentamente foi em direção a casa.
Passou pela porta devagar e estacou.
A sala estava silenciosa e fresca,
Com um leve cheiro de cera e lavanda,
Exatamente como ele sempre lembrava.
Olhou feliz e com os olhos marejados
Para os quadros e fotos na parede,
De tantas lembranças e tão familiares.
A mulher parada na porta do corredor
Olhava ansiosamente para ele, que,
Absorto, olhando as fotos e os quadros,
Não a ouviu entrar, quando de repente,
Um soluço baixo o fez olhar em sua direção.
Soluçando, a mulher abriu os braços amorosa,
Dizendo que o amava e que era bem vindo!
Ele rompeu num choro convulsivo e libertador,
E toda sua angustia e medo se foram.
Quando ela o abraçou com grande amor,
Disse que estava arrependido e pediu perdão.
E chorando falou: - Eu te amo, Mãe e voltei pra ficar!

JOSÉ ROMEU DUTRA
Cadeira n. 22

Minha Jovem

Deitei em teu colo,
Em tuas areias,
Adormeci.
Na brisa que o vento traz,
A mistura de aromas,
Da mata,
Do mar.
Aos olhos,
O imponente,
O majestoso,
Sempre inspirador,
Itatins.
Verdejante sentinela,
Guardando às costas,
A terra procurada,
Riqueza de teu seio,
Peruíbe,
Minha jovem amada.

MARTHA ZELIA ZACHAR FUJITA
Cadeira n. 18

Muito além

Sonhei que andava na praia,
e nas águas via passar
cenas da minha vida...
Nas ondas que quebravam,
via os momentos difíceis,
onde me sentia morrer...
Mas, a vida continua
e somos eternos aprendizes...
Amar a si mesmo,
para saber amar ao próximo...
Não viver sem ver a vida.
Não sofrer pelo passado.
O presente é passageiro...
A existência perde
o sentido do existir.
Forte diante da vida,
aceito o tempo que sobra
para ainda ser feliz.
A vida não é em vão…

TEREZINHA F. DO NASCIMENTO DANTAS

A Rosa do Abismo

Por que chora rosa do abismo
Perdida em um recanto só;
Entre as árvores da mata
Neste abismo que dá do?

Choro a solidão
De ter perdido o meu paraíso;
Perdida neste abismo
Não diviso um sorriso.

Trago uma recordação
Do mundo em que vivi;
Era a mais bela das rosas
Beleza igual, nunca vi.

Um dia eu fui banida
Pelo Senhor do jardim;
Porque era muito orgulhosa
Da beleza que havia em mim.

O Senhor então me disse:
Vai para o abismo aprender;
A humildade é uma virtude
Pra nunca mais esquecer.

Me achava melhor que as outras
Humilhava sem compaixão;
Hoje neste abismo me sinto
Sou livre, nesta prisão!

Fonte:
Academia Peruibense de Letras. ROSA DO ABISMO.  9ª Coletânea da Academia Peruibense de Letras. São Paulo/SP: All Print Editora, 2018.

Afonso Arinos (A Tapera da Lua)


No tempo em que as amazonas andavam ainda pelas margens do seu grande rio, havia uma tribo de índios cuja aldeia ficava junto de uma lagoa tranquila, nas fraldas da serra chamada então Taperê e hoje do Acunã. Uma guerra infeliz reduziu a tribo a dois sobreviventes, irmão e irmã dos mais belos de sua raça, que ficaram sozinhos no alto da montanha.

Então disse ao irmão a irmã:

— Ó meu querido irmão! Como és homem e forte, ficarás aqui no alto do Taperê enquanto eu desço à nossa aldeia, às margens da lagoa. Armei tua rede nos castanheiros e deixei ao lado as minhas lindas flechas. As flores das parasitas que crescem nos ramos suavizarão o teu sono com o seu aroma. Adeus!

— Adeus até quando?

— Até quando te acordarem os mais belos pássaros, cantando à luz da manhã.

E a índia desceu com o passo incerto, os olhos tristes de veada ferida, mostrando na estranha palidez um aperto no coração.

Ao entardecer, seu corpo leve de adolescente balouçava na rede selvagem, ataviada de penas multicores, que os raios do sol poente irisavam. Enoitou-se a aldeia e já o oitibó tinha saído do seu esconderijo, quando a moça, tremula, ofegante, arrastada por uma força estranha, procurou o caminho da serra, em demanda da rede armada nos castanheiros.

Ela sentiu amor! Foi no momento
Em que sozinha, em meio à natureza
Ouviu a selva segredar ao vento,
A estrela à cascata, à correnteza!

Ninguém conhecerá o segredo desse meu tormento! suspirava ela. Amá-lo-ei na treva; serei de dia sua irmã!

Quando à rede chegou, a branda aragem
Do sassafrás batia pelas frestas;
Escuridão no céu, pálida arfagem,
Saltos nos matos das cutias lestas...

E toca a rede... a rede se estremece...
— Quem és? Sussurra um beijo e a voz falece...

Três vezes a índia apaixonada subiu a montanha e três vezes voltou à deserta aldeia escondendo na solidão e no negrume da noite o segredo do seu criminoso amor.

Mas na última vez o moço gentio, querendo desvendar o mistério, usou de um estratagema: tingiu o rosto com as tintas do urucum e do jenipapo, que vicejavam ali, para marcar a face da cauta visitante, ao primeiro beijo.

E quando ao nascer do sol, já na sua aldeia, à margem da lagoa, a moça enamorada foi mirar-se no espelho das águas — horror! — viu no próprio rosto as manchas negras do seu crime.

Então, salta sobre o arco, toma das setas de combate e desprende a primeira para o céu. Outra a seguiu e mais outra e outra e — ó milagre dos gênios que habitam as montanhas azuis! — uma longa e aérea cadeia se formou como uma escada de flores convidando-a a subir aos paramos.

Ela subiu e transformou-se em Lua. Desde então, triste e solitária, errando pelo espaço, mira-se nas águas da lagoa, na corrente dos rios e nas vagas do mar, a ver se ainda tem as manchas do rosto.

Fonte:

Caldeirão Poético XXV


ALPHONSUS DE GUIMARAENS  
Ouro Preto/MG, 1870 – 1921, Mariana/MG

Deixa que o olhar...

Deixa que o olhar do mundo enfim devasse
Teu grande amor que é teu maior segredo!
Que terias perdido, se, mais cedo,
Todo o afeto que sentes, se mostrasse?

Basta de enganos! Mostra-me sem medo
Aos homens, afrontando-os face a face:
Quero que os homens todos, quando eu passe,
Invejosos, apontem-me com o dedo.

Olha: não posso mais! Ando tão cheio
Desse amor, que minh`alma se consome
De te exaltar aos olhos do universo.

Ouço em tudo teu nome, em tudo o leio:
E, fatigado de calar teu nome,
Quase o revelo no final de um verso.

AUGUSTO DOS ANJOS  
Cruz do Espírito Santo/PB, 1884 – 1914, Leopoldina/MG

 A Aeronave

Cindindo a vastidão do Azul profundo,
Sulcando o espaço, devassando a terra,
A Aeronave que um mistério encerra
Vai pelo espaço acompanhando o mundo.

E na esteira sem fim da azúlea esfera
Ei-la embalada n'amplidão dos ares,
Fitando o abismo sepulcral dos mares,
Vencendo o azul que ante si s'erguera.

Voa, se eleva em busca do infinito,
É como um despertar de estranho mito,
Auroreando a humana consciência.

Cheia da luz do cintilar de um astro,
Deixa ver na fulgência do seu rastro
A trajetória augusta da Ciência.

CRUZ E SOUZA  
Florianópolis/SC, 1861-1898, Antonio Carlos/MG

O Coração

O coração é a sagrada pira
Onde o mistério do sentir flameja.
A vida da emoção ele a deseja
Como a harmonia as cordas de uma lira.

Um anjo meigo e cândido suspira
No coração e o purifica e beija...
E o que ele, o coração, aspira, almeja
É sonho que de lágrimas delira.

É sempre sonho e também é piedade,
Doçura, compaixão e suavidade
E graça e bem, misericórdia pura.

Uma harmonia que dos anjos desce.
Que como estrela e flor e som floresce
Maravilhando toda a criatura!

GUILHERME DE ALMEIDA  
Campinas/SP, 1890 – 1969, São Paulo/SP

Barcos de Papel

Quando a chuva cessava e um vento fino
Franzia a tarde tímida e lavada,
Eu saía a brincar, pela calçada,
Nos meus tempos felizes de menino

Fazia, de papel, toda uma armada;
E, estendendo o meu braço pequenino,
Eu soltava os barquinhos, sem destino,
Ao longo das sarjetas, na enxurrada...

Fiquei moço. E hoje sei, pensando neles,
Que não são barcos de ouro os meus ideais:
São feitos de papel, são como aqueles,

Perfeitamente, exatamente iguais...
- Que os meus barquinhos, lá se foram eles!
Foram-se embora e não voltaram mais!

HUMBERTO DE CAMPOS  
Miritiba (hoje Humberto de Campos)/MA (1883 – 1934) Rio de Janeiro/RJ

O Irapuru

Dizem que o irapuru, quando desata
A voz - Orfeu do seringal tranquilo -
O passaredo, rápido, a segui-lo,
Em derredor agrupa-se na mata.

Quando o canto, veloz, muda em cascata,
Tudo se queda, comovido, a ouvi-lo:
O canoro sabiá susta a sonata,
O canário sutil cessa o pipilo.

Eu próprio sei quanto esse canto é suave;
O que, porém, me faz cismar bem fundo
Não é, por si, o alto poder dessa ave:

O que mais no fenômeno me espanta,
É ainda existir um pássaro no mundo
Que se fique a escutar quando outro canta!

JORGE DE LIMA 
União dos Palmares/AL, 1853 – 1953, Rio de Janeiro/RJ

O Acendedor de Lampiões

Lá vem o acendedor de lampiões da rua!
Este mesmo que vem infatigavelmente,
Parodiar o sol e associar-se à lua
Quando a sombra da noite enegrece o poente!

Um, dois, três lampiões, acende e continua
Outros mais a acender imperturbavelmente,
À medida que a noite aos poucos se acentua
E a palidez da lua apenas se pressente.

Triste ironia atroz que o senso humano irrita:
Ele que doira a noite e ilumina a cidade,
Talvez não tenha luz na choupana em que habita.

Tanta gente também nos outros insinua
Crenças, religiões, amor, felicidade,
Como este acendedor de lampiões da rua!

MACHADO DE ASSIS 
Rio de Janeiro/RJ, 1839 – 1908

Círculo Vicioso

Bailando no ar, gemia inquieto vaga-lume:
- "Quem me dera que fosse aquela loura estrela,
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela! "
Mas a estrela, fitando a Lua, com ciúme:

- "Pudesse eu copiar o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela..."
Mas a Lua, fitando o Sol, com azedume:

- "Mísera! Tivesse eu aquela enorme, aquela
Claridade imortal, que toda a luz resume! "
Mas o Sol, inclinando a rútila capela:

- "Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta azul e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vaga-lume?"

OLAVO BILAC   
Rio de Janeiro/RJ, 1865 – 1918

Benedicite!

Bendito o que, na terra, o fogo fez, e o teto;
E o que uniu a charrua ao boi paciente e amigo;
E o que encontrou a enxada; e o que, do chão abjeto,
Fez, aos beijos do sol , o ouro brotar do trigo;

E o que o ferro forjou, e o piedoso arquiteto
Que ideou, depois do berço e do lar, o jazigo;
E o que os fios urdiu; e o que achou o alfabeto;
E o que deu uma esmola ao primeiro mendigo;

E o que soltou ao mar a quilha, e ao vento o pano;
E o que inventou o canto; e o que criou a lira;
E o que domou o raio; e o que alçou o aeroplano...

Mas bendito, entre os mais, o que, no dó profundo,
Descobriu a Esperança, a divina mentira,
Dando ao homem o dom de suportar o mundo!

Antônio de Trueba (A Portaria do Céu)


I

O tio Paciência era um pobre sapateiro remendão, o qual ganhava honradamente o pão de cada dia, mete que mete a sovela e puxa que puxa o fio, em um portal de Madrid, e devia o apelido por que era conhecido à resignação com que sempre tinha sofrido os muitos trabalhos, que o Senhor lhe havia dado.

Ao tempo da constituição de 1820, era já rapaz dos seus quinze ou dezesseis anos, mas tinha a inocência de uma criança de oito, e como ouvisse a cada passo dizer que todos os homens eram iguais, perguntou ao mestre se aquilo seria verdade.

— Não acredites nessas coisas, lhe respondeu o mestre. Só no céu é que os homens são iguais.

Sentiu o rapaz que não acontecesse outro tanto na terra, mas consolou-se com a ideia de que o eram no céu, e quando algum freguês da loja convidava o mestre para beber uma pinga na taberna próxima, dizia com os seus botões o pobre aprendiz:

 — Pena é que não sejamos todos iguais na terra, como sucede no céu, porque se assim fosse, por certo que o freguês me não diferençaria do mestre, e, como ele, iria eu também agora à taberna beber a minha pinga; mas, acabou-se... paciência... no céu seremos todos iguais.

Passados dois anos, coube-lhe a sorte do recrutamento; então mais do que nunca teve ele motivo para lamentar que os homens não fossem iguais na terra como no céu, por isso que na sua companhia havia soldados distintos, e cabos, sargentos e oficiais, que provavam ser verdade aquilo que o mestre lhe tinha dito acerca da igualdade humana; porém consolava-se ainda o pobre rapaz, pensando que no céu se acabariam as distinções, e todos seriam iguais.

Deixou de servir o rei, e aproveitando-se do pouco que sabia do ofício de sapateiro, estabeleceu-se num portal, e ali passou o resto dos seus dias, conformando-se com as privações que sofria, na esperança de ir para o céu e gozar então dessa igualdade, que não encontrara na terra.

No andar nobre da casa, cujo portal ocupava, vivia um marquês, que por certo muito o houvera magoado com o espetáculo da sua opulência, se não fora um excelente homem, e a não ser tamanha a sua paciência, e sobre tudo tão arraigada no seu coração a esperança de lhe poder dizer um dia no céu: “meu amiguinho, aqui todos nós somos iguais.”

Não era porém só o marquês que lhe fazia sentir, que não fossem todos os homens iguais na terra; até os seus amigos mais íntimos queriam diferençar-se dele. Estes amigos eram o tio Mamerto e o tio Macário, homens de tão boa conduta, que não podia o tio Paciência viver sem a sua honrada companhia.

O tio Mamerto tinha uma paixão desenfreada pelos touros, e passava por ser muito entendido em matéria tauromáquica.

Quando, no reinado de Fernando VII, se criou uma escola para ensinar esta ciência, esteve o bom do homem quase a ser nomeado lente catedrático da faculdade, e este precedente era o bastante para que ele se considerasse superior ao tio Paciência, o qual, reconhecendo esta superioridade, se consolava pensando que, se o seu querido amigo e ele não eram iguais na terra, o seriam por certo no céu.

O tio Macário era muito feio, mas casou com uma mulher lindíssima, porém levadinha da breca.

Ao cabo de vinte anos de um viver amargurado, morreu-lhe o demônio da mulher, e o pobre homem ficou tão descansado que lhe parecia ter entrado no céu; passados tempos, enamorou-se de outra rapariga, que não ficava a dever nada à primeira, e casou segunda vez, apesar de todos os esforços que o seu amigo, o tio Paciência, fez para lhe tirar isso da cabeça. Ora, como o tio Paciência nunca tinha conseguido que as mulheres se agradassem dele, ao passo que do tio Macário se agradavam aos pares, julgava este ter certa superioridade sobre o primeiro, que, da sua parte, não deixava também de a reconhecer, e que deveras se teria afligido com isso, se não fora a lembrança de que o seu bom amigo e ele seriam iguais no céu, já que na terra o não podiam ser.

O tio Mamerto era capaz de ir até ao fim do mundo para assistir a uma corrida de touros; tanto assim, que até costumava dizer: “Parece-me que trocava de bom grado a glória eterna por uma boa tourada”, ao que o tio Paciência replicava sempre, agastado: “Homem, não digas heresias, que não vá Deus castigar-te.”

Um dia em que os pássaros caiam das árvores, assados pelo sol, havia em Getafe uma corrida de garraios; o tio Mamerto, foi vê-los, à pata, segundo o seu costume, e, de volta a casa, acamou com uma febre, que o levou desta para melhor vida.

No mesmo dia estava muito mal, na cama, o tio Macário, por causa de uma tremenda coça que a mulher lhe tinha dado, porquanto se a primeira mulher lhas dava grandes, a segunda não lhe ficava atrás. A mulher, que nunca perdia a ocasião de lhe comunicar uma boa notícia, deu-se pressa em lhe participar, que o tio Mamerto tinha esticado a canela, e ouvindo isto, o pobre Macário, que já não estava para muitos sustos, esticou também a sua.

Como eu já disse, não podia o tio Paciência viver sem os seus dois amigos, porque lhes queria muito. Estranhando que, em todo o dia, eles lhe não tivessem aparecido para palestrar um pouco e fumar um cigarro na sua companhia, quando à noitinha deixou o trabalho, foi procurá-los, e soube então que ambos tinham morrido. Essa notícia causou-lhe um abalo enorme, e, naquela mesma noite, tomou atrás deles o caminho do outro mundo, com a grande consolação de que ia finalmente para onde todos os homens eram iguais.

Toda a vizinhança sentiu muito a morte do tio Paciência, pois todos depositavam tamanha confiança na sua honradez e no seu caráter dócil e serviçal, que, quando careciam de trocar algumas notas do banco de Espanha, encarregavam disso o tio Paciência, que era capaz de morrer arrebentado, para dar conta da incumbência.

Na manhã seguinte à morte dos três amigos, o bruto do criado particular do marquês, quando entrou no quarto, teve a imprudência de dizer a seu amo que o sapateiro do portal morrera, ao saber que dois amigos seus tinham faltado quase de repente. E como o marquês era um fidalgo muito apreensivo, e corriam uns certos rumores de cólera em Madrid, assustou-se tanto com a saída de sendeiro do bruto do criado, que, poucas horas depois, era cadáver, com grande desgosto da pobreza do bairro. E por todas as partes se se ouvia dizer: “Estes homens, assim, nunca deviam morrer.”

II

O tio Paciência empreendeu a jornada do céu, muito contente com a esperança de gozar da glória eterna, de viver em um mundo onde todos os homens eram iguais, e finalmente de encontrar ali os seus queridos amigos Mamerto e Macário. Com relação porém a este último pensamento não deixava ele de ter suas dúvidas, porque dizia lá para os seus botões:

 — E se lhe não querem abrir as portas do céu?! Eles foram sempre homens de bem às direitas; mas o demônio da paixão de Mamerto pelos touros, e a tolice do Macário de casar segunda vez, tendo-se saído tão mal da primeira, fazem-me recear que lhes deem com a porta na cara.

Para sair um tanto de dúvida, perguntou a um viandante se tinha visto passar por ali dois sujeitos, com estes e aqueles sinais; e como ele lhe respondesse afirmativamente, prosseguiu o tio Paciência no seu caminho, mais alegre que umas páscoas.

O caminho do céu era escabroso e áspero, e essa era por certo a razão porque nele se não encontrava senão gente pobre e habituada à fadiga.

Impressionado o tio Paciência por não ver nenhum figurão, entre tantos caminhantes, dizia, de si para si:

— Não admira que os homens ricos não façam esta viagem, porque teriam de fazê-la no cavalinho de São Francisco. Se pudessem empreendê-la de carruagem, os diabos me levem, se não víamos por aqui mais trens do que no Prado e na Fonte Castelhana.

O tio Paciência interrompeu as suas reflexões ao ver aproximar-se, vindo do lado do céu, um homem, que chorava como um bezerro, e dava mostras da maior desesperação. Era nada mais nem nada menos do que o tio Mamerto.

O tio Paciência sentiu uma pancada no coração, anunciando-lhe alguma desgraça, quando reconheceu o seu amigo.

 — O que tens tu, homem? perguntou ele ao tio Mamerto.

 — Que demônio hei de eu ter! Se eu não fosse um bruto, como não há segundo, não me fechavam para sempre as portas do céu!

 — Mas então como foi isso? explica-te com a breca, que me tens o coração em talas. Aposto que não foi senão por causa da maldita paixão pelos touros.

— Parece-me que concorreu.

 — Vamos, por quem és, conta-me o que se passou.

 — Cheguei à portaria do céu, e encontrei ali uma porção de gente, que estava à espera de vez para entregar os passaportes para o outro mundo. O porteiro, que visava os papéis, com a sua grande calva à mostra, e o seu molho de chaves na mão, levava a coisa com toda a pachorra, e moía-os com perguntas, primeiro que permitisse a entrada. Eu, que, como é bem natural, estava morto por me ver lá dentro, disse com os meus botões: — Este velho, com os seus vagares, é capaz de me conservar aqui de fora até à noite. Pois deixa estar, que se te pilho distraído, atiro comigo lá para dentro, ainda que depois me cortes uma orelha, como fizeste ao pobre Malco. Estava eu a pensar neste expediente, quando vejo o porteiro armar uma questão com um pobre diabo, a quem não deixava entrar, com o pretexto de ter sido apaixonado de touros. Aí temos nós os touros! disse eu, ao ver aquilo. O velhote é capaz de me fazer esperar uma eternidade, e por fim, se chega a saber que também fui afeiçoado às touradas, nega-me a entrada, como aconteceu com o outro. E que faço eu? Assim que o porteiro deu uma volta: zás! raspo-me lá para dentro. Já dava graças a Deus pela minha resolução, e vai senão quando o porteiro, dá-lhe na cabeça contar quantos estavam na portaria, e conhece que lhe falta um.

— Falta-me aqui um! grita enraivecido, e aposto uma orelha que não é senão o madrileno. Ou ele não fosse de Madrid, o maroto, que se escoou lá para dentro como um gato: deixa estar que já vamos ajustar contas!

— Ó meu senhor, disse da banda um adulador, que tinha assim jeitos de cortesão, quer que eu lho saque de lá para fora por uma orelha?

— Deixemos-nos de orelhas, respondeu o velhote; e chamando uns músicos, a quem falava com muito agrado, porque parece que lhe tinham sido recomendados por Santa Cecília: Toquem lá a música da saída do touro!

Os músicos começam de tocar, e eu (sempre sou muito bruto!) ao ouvir aquele toque, julgo que há corrida de touros na portaria, e saio muito lépido a vê-la; de repente, o porteiro fecha a porta e deixa-me ficar de fora, com uma cara de palmo e meio, dizendo-me:

— Vá já para o inferno, seu meliante, que uma paixão por touros como essa, não pode Deus perdoá-la.

E aqui tens tu, querido Paciência, como eu vou caminho do inferno por causa da minha maldita mania pelas touradas!

O tio Paciência prorrompeu em amargo pranto ao ver a infelicidade do seu velho amigo, e esteve quase a pregar-lhe um sermão, mas não o fez por se lembrar de que era pregar no deserto; ambos continuaram, por último, o seu caminho; o tio Paciência o do céu, que era costa acima, e o tio Mamerto o do inferno, que era costa abaixo.

 — Querem ver que também me acontece alguma na portaria? O tal senhor porteiro tem um geniozinho endemoninhado!

Isto dizia o tio Paciência, seguindo sempre o seu caminho, quando avistou outro homem, que vinha do lado do céu. Este não se carpia, nem se arrepelava; trazia porém a cabeça baixa, e denotava profunda tristeza.

 — Esperem! disse o tio Paciência. Os diabos me levem se aquele não é o tio Macário! Pois quê? Não é senão ele!

Com efeito, o tio Macário era o da cabeça baixa.

Os dois amigos abraçaram-se comovidos.

 — Tu por aqui, Paciência! disse o tio Macário. Para onde vais, homem?

 — Ora, para onde hei de eu ir? Vou para o céu.

 — Duvido muito que lá entres.

 — Então por quê?

 — Porque é dificílimo entrar lá.

 — E em que consiste a dificuldade?

 — Consiste em ser o porteiro o velho mais caturra, que eu tenho visto. E para prova, basta o que se deu comigo.

 — Conta depressa.

 — Uma frioleira! Chegamos, eu e outro, à porta; chamamos, e aparece-nos o porteiro, com a sua grande calva e o competente molho de chaves na mão.

— Que é o que querem? pergunta ele.

— Essa não está má! o que havemos nós de querer senão entrar?

— Você é casado ou solteiro? pergunta o velho ao meu camarada.

— Casado, responde o tal sujeito.

— Nesse caso pode entrar, que basta essa penitência para um homem ganhar o céu; e isto por maiores que sejam os pecados, que haja cometido.

E o meu companheiro entrou lá para dentro.

— Cáspite! disse eu com os meus botões; se aquele ganhou o céu por se ter casado uma vez, com mais razão o devo eu ter ganho por me haver casado duas. E larguei atrás do meu companheiro.

— Onde vai o senhor? perguntou o porteiro, detendo-me por uma orelha.

— Homem, o senhor deve estar farto de o saber! Vou para o céu.

— É casado ou solteiro?

— Casado duas vezes à falta de uma.

— Duas vezes?!

— Sim, senhor, duas vezes.

— Pois vá para as profundas do inferno, que tolos desse lote não têm entrada no céu.

E aqui vou eu, amigo Paciência, caminho do inferno! São coisas que só a mim acontecem!...

 — É bem feito, disse o tio Paciência, entre compadecido e indignado da parvoíce do seu amigo. Não te dizia eu que não podia obter perdão de Deus quem duas vezes se casasse?

O tio Paciência já não ia muito satisfeito e tranquilo, ao aproximar-se das portas do céu, porque as notícias que recebera do geniozinho do tal porteiro, eram, na verdade, para intimidar o mais pintado.

 — Vamos, tio Paciência, dizia ele, é preciso que não desmintas, nesta ocasião, o apelido que te puseram, porque, se consegues catequizar o porteiro, colas-te lá dentro, e depois é que já ninguém te dá volta. O velhote é esquisito de gênio, caturra e curioso como todos os porteiros... Mas também, deve a gente lembrar-se de que o pobre do homem é tão velho, que já não pode com os calções, e devemos ser indulgentes para com os velhos como para com as crianças, porque os extremos tocam-se. Demais, a paciência é uma virtude, que o próprio Jesus recomendava ao apostolo São Pedro, como se vê da seguinte cantiga:

Era São Pedro na calva
perseguido do mosquito,
e o Mestre lhe dizia:
 — Tem paciência, Periquito!

Ao terminar estas reflexões, avistou o tio Paciência as portas do céu, e estremeceu de alegria, lembrando-se de que estava já a meio quilômetro de Distância do mundo onde todos os homens eram iguais.

Chegou finalmente à portaria, e viu que não havia lá viva alma, o que deveras lhe agradou, porque assim não se expunha a morrer arrebentado, como quando ia trocar notas ao banco de Espanha.

Deu uma aldrabada pequena na porta, e um velho, que não tinha um pelo na cabeça, abriu o postigo e perguntou-lhe:

 — O que quer você daqui?

— Ora, o Senhor lhe dê muito boas noites, lhe tornou o tio Paciência, com a maior humildade, tirando o chapéu. Como passou? Passou bem?

 — Muito bem, muito obrigado. Mas o que queria o senhor?

 — E a senhora e os meninos estão de saúde?

 — Homem, despache daí, diga o que quer.

 — O senhor não tem senão desculpar... mas... nada... eu... vinha ver se o senhor me deixaria entrar.

 — Sente-se aí, nesse banco, e espere que venha mais gente, que não se pode andar sempre a abrir e a fechar esse maldito portão, que é mais pesado que um marido jogador.

 — Está bem, senhor, essa é boa; faça favor de perdoar.

 — Não há de quê.

O velhote fechou o postigo, e o tio Paciência, a quem as últimas palavras, que ouvira, deram alma nova, sentou-se num banco, e começou o seguinte solilóquio, para passar o tempo:

— O tal senhor porteiro é realmente um grande caturra. Quem diabo podia supor que o homem se esquentaria por eu o cumprimentar como Deus manda! Mas apesar de ter o gênio um tanto assomado, bem se conhece que é um santo. Pois, senhor, esperemos aqui, no banco da paciência.

Estava o tio Paciência entretido a apertar um cigarro, quando, ouvindo uma tremenda aldrava na porta, que por pouco a fazia em hastilhas, ergueu a cabeça, e viu então que a pessoa, que com tanta arrogância chamava, era nem mais, nem menos, que o seu vizinho marquês.

 — É melhor bater com a cabeça! gritou de dentro o porteiro, ao ouvir aquele barulho. Quem é o bruto que chama assim?

 — O excelentíssimo senhor marquês de Pelusilla, grande de Espanha de primeira classe, cavaleiro de todas as ordens criadas e por criar, senador do reino, etc., etc.

Mal isto ouviu, o porteiro abriu de par em par a porta, quebrando pelo espinhaço com muitas reverências, e exclamando:

— Perdoe vossa excelência se o fiz esperar algum tempo, mas... é que eu não supunha, que tivéssemos por cá tamanha honra. Queira vossa excelência entrar, que, pela balburdia que lá vai por dentro, é de crer que já tenha corrido a notícia de que temos por estes bairros o cavalheiro mais ilustre e mais rico de toda a Espanha.

Com efeito o céu estava alvoroçado com a chegada do marquês, para o qual começava a improvisar-se uma recepção esplêndida. Repicavam os sinos, e os foguetes cortavam o ar em todas as direções; já não havia uma varanda, nem uma janela de onde não pendesse um cobertor de damasco, ou quando menos uma colcha de chita, modesta, mas vistosa. As imprensas vomitavam versos (ih! que nojo!) em louvor do marquês; os garotos esganiçavam-se todos a dar vivas a sua excelência; as virgens largavam a costura, e vestindo-se de branco, e pondo na cabeça a sua grinalda de flores, lançavam mão da lira, e tocavam e cantavam como desesperadas; desde as charangas das ruas até a orquestra do teatro real, todas as músicas faziam ouvir as suas harmonias; em suma, era tudo festa, júbilo e regozijo. Até o próprio porteiro, quando voltou a fechar a porta, deu um pulo de contente, exclamando:

 — Bravíssimo! Hoje é dia de atirar uma cana ao ar!

 — Sim, como não atires a cabeça!... rosnou por entre os dentes o tio Paciência, indignado com o que estava presenciando.

Repetiam-se lá por dentro as manifestações de alegria, e o estrondo dos festejos, e o tio Paciência, que assistia àquele entusiasmo, continuava nestes termos o seu solilóquio:

— E esta!... Ainda me custa a acreditar o que por aqui vai com a chegada do marquês! Com que, passo toda a minha vida a sofrer com santa paciência os trabalhos e humilhações da terra, imaginando que no céu todos os homens são iguais, e que, por conseguinte, me verei aqui livre de todos os meus pesares e apoquentações, e no fim de contas, chego às portas do céu e recebo logo a prova mais irritante de desigualdade, que pode imaginar-se! Com que então, aqui, como na terra, a mim, porque sou um pobre sapateiro, fazem-me estar, como um espantalho, à espera na portaria, e ao marquês, só porque é marquês e rico, e por vir carregado de cruzes e calvários, abrem-se-lhe, de par em par, as portas, e recebem-no com repiques de sinos, com foguetes, músicas, versos, e colchas de seda nas janelas!... Isto realmente é para fazer ferver o sangue nas veias a um santo!... Porém, paciência, senhor Paciência!... Se consigo afinal entrar lá para dentro, o que já me vai parecendo bem difícil, posso reputar-me feliz, porque ali deve passar-se divinamente, a julgar pelo pouco que vi, quando o velho deu passagem ao marquês, e pela baforada, que sai, quando abrem ou fecham a porta ou o postigo.

O barulho que este fez ao abrir-se, tirou o tio Paciência das suas meditações; fez-se ver a calva do porteiro, o qual vinha examinar se já havia gente reunida, à espera, na portaria.

 — O que faz você aí? perguntou o porteiro, reparando no tio Paciência.

 — Senhor, respondeu humildemente o tio Paciência, estava esperando...

— Se as lebres esperassem tanto!...

 — Como o senhor não aparecia...

 — Tem razão, tem... são tantas as coisas em que tenho que pensar, que de todo se me varreu da ideia... Eu vou já abrir, amigo. Ora!... mas porque não chamou por mim, homem de Deus?!...

 — O senhor bem vê que... como sou um pobre sapateiro...

 — Qual sapateiro, nem qual cabaça! aqui no céu todos os homens são iguais.

 — Deveras?! exclamou o tio Paciência, dando um salto de alegria.

 — Pois, então!... Não faltava mais nada senão andarmos aqui com categorias! Isso é bom lá para a terra! Vamos, entre cá para dentro.

O porteiro nem por isso abriu toda a porta, como quando entrou o marquês, mas o suficiente para que pudesse passar um homem. O tio Paciência acercou-se da cancela, lançou um relancear d'olhos lá para dentro, e deteve-se ali, dolorosamente surpreendido. As virgens não largavam a costura, nem os rapazes saíam da escola; não havia uma triste sineta que tocasse; os foguetes não rasgavam as nuvens; as músicas não deixavam ouvir as suas harmonias; nem sequer uma pobre colcha de chita adornava as janelas, nem tampouco as imprensas vomitavam versos!...

O porteiro, que não tinha nada de tolo, adivinhou o doloroso espanto do tio Paciência, e acudiu a desvanecê-lo, dizendo-lhe:

 — Que quer isso dizer, homem? Então fica para aí pasmado, em vez de entrar cá para dentro?.

 — Não me disse o senhor, ainda há pouco, que no céu todos os homens eram iguais?

 — Disse, sim senhor, e daí?...

 — Então... como é que ao marquês...

 — Homem, você se não é tolo, parece-o! Pois não leu na sagrada escritura, que é mais fácil entrar um camelo pelo buraco de uma agulha do que um rico no céu?...

 — Não, senhor, não sabia isso.

 — Pois pode acreditar que é a pura verdade. Sapateiros, ferreiros, lavradores, mendigos, gente, em suma, farta de trabalhar e de padecer, chega aqui a todo o instante, e não temos que estranhar a sua chegada. Já outro tanto não acontece com os ricos e os fidalgos; passam-se séculos sem vermos o focinho a um figurão, como esse que veio hoje, de modo que, quando algum nos aparece por cá, anda tudo numa poeira! Ora, venha, ande lá para dentro, que já é tempo de descansar.

O tio Paciência transpôs o limiar da porta, e não podendo com a alegria, que o dominava, caiu de joelhos, e exclamou, erguendo as mãos para o Senhor, que saia ao seu encontro:

 — Senhor! Bendito sejais vós, que dais a bem-aventurança eterna aos que padecem na terra!

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