quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Cecy Barbosa Campos (Os serões)

Larissa não era exatamente bonita, mas possuía uma beleza que transcendia. Ela ainda acreditava no ser humano e sempre conseguia enxergar em seu semelhante alguma qualidade.

Sua vida não era nada fácil. Morava num quartinho pequeno com banheiro. Era anexo à casa principal, onde uma sua amiga trabalhava. Como não dormia no emprego, conseguiu que seus patrões alugassem os dois cômodos, por um preço módico, para Larissa.

Todas as manhãs, Larissa tomava o ônibus bem cedo, rumo à fábrica de tecidos onde trabalhava. O percurso era longo, os engarrafamentos constantes, e ainda poderiam surgir outros problemas no trânsito, principalmente se chovesse. A moça, que era muito disciplinada e temia chegar atrasada, saía com bastante antecedência e, durante o trajeto, tinha tempo suficiente para sonhar.

Sonhava com o dia em que conheceria um homem respeitoso e gentil, que cuidaria dela e a protegeria. Sonhava com o seu futuro, a cuidar dos filhos, da casa e do marido.

Acreditou que seu sonho estava prestes a se realizar, no dia em que conheceu Jurandir. Trabalhador e atencioso, não podia se encontrar com ela todas as noites após o trabalho, porque tinha que enfrentar longos serões na firma, o que lhe valia como horas extras. Também, nos finais de semana, fazia "bicos" como vigia de residências quando os proprietários viajavam.

Larissa, embora entristecida, achava lindo ver o homem que amava e que acreditava ser um marido em potencial, lutando por um futuro melhor. Quando não podiam se encontrar, Jurandir passava pela fábrica, à tardinha, ao final do expediente, para levar a namorada até o ponto de ônibus, passando antes numa lanchonete e fazendo que Larissa tomasse uma vitamina de frutas e abandonasse o refrigerante, sempre solícito em relação á saúde da amada.

Criada no interior, dentro de rígidos preceitos religiosos, Larissa tinha um comportamento bastante diferente do que era habitual na cidade grande. Preocupava-se com a virgindade antes do casamento, não gostava de exageros nas roupas e na maquiagem e primava pela discrição de suas atitudes. Jurandir mostrava-se encantado e sempre elogiava sua observância aos princípios em que fora criada.

Como quase não saía de casa por causa das ausências de Jurandir, este incentivava-a, carinhosamente, a passear no shopping ou visitar algum parente para se distrair. Foi assim que num sábado, Larissa decidiu-se a participar de um churrasco em comemoração ao aniversário de uma colega da fábrica.

Chegando ao subúrbio, desceu do ônibus e verificou as instruções que tinha anotado sobre o caminho a seguir. Não era longe, mas tinha que prestar atenção ao intrincado das ruas, pois não conhecia a região. De repente, procurando a placa para verificar se estava na direção certa, distraiu-se e esbarrou num menino que de mãos dadas com o pai, seguia à sua frente. A mãe, em adiantado estado de gravidez, de braços dados com o marido, levava pela mão a filha menor, uma menina com rosto de boneca emoldurado por cachinhos dourados.

Assustaram-se todos, virando-se instantaneamente para aquela estabanada que quase derrubara o garoto vestido com a camisa do Flamengo. Quando os olhos de Larissa encontraram-se com os atônitos olhos de Jurandir, ela deu um grito de horror e pôs-se a correr, desvairada.

Sem nem pensar no churrasco, voltou para o ponto de ônibus e prorrompeu num pranto convulsivo que confundiu, penalizou ou irritou a todos os passageiros.

Chegando ao seu humilde quartinho, lançou-se à cama sem interromper o choro incessante que a deixava quase sem ar.

As horas se passavam. Não sabia quantas. Quando começou a escurecer, bateram à porta. Sem pensar nada, levantou-se da cama e semi-torporizada foi abri-la. Jurandir entra, toma-a nos braços e seca suas lágrimas com beijos apaixonados. Dá uma série de explicações confusas e não convincentes. Porém, estava ali, abraçado a Larissa, que não tinha forças para rejeitá-lo.

Criou-se uma cumplicidade estranha entre as duas mulheres de Jurandir. O tempo livre do homem, que era muito pouco, tinha que ser cuidadosamente dividido entre as duas, pois agora, os serões se tinham tornado extremamente necessários, para que ele pudesse manter as duas famílias.

Larissa teve um casal de gêmeos e, logo depois, engravidou novamente. Não poderia perder na competição e dar a Jurandir três filhos era uma questão essencial.

Os conhecidos de Jurandir estranhavam aquela situação insólita e se perguntavam qual seria o charme daquele homem para conseguir controlar as duas mulheres que, pacificamente, aceitavam fazer a divisão democrática do marido.

Fonte:
Cecy Barbosa Campos. Recortes de Vida. Varginha/MG: Ed. Alba, 2009.
Livro enviado pela autora.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

A. A. de Assis (Saudade em Trovas) n. 30: Barreto Coutinho

 

Dorothy Jansson Moretti (Aquela Velha Ponte da Barreira)

Eu estava lá e vi o primeiro trem a cruzar a ponte de madeira sobre o Rio Itararé.

Foi emocionante. A locomotiva tipo Maria-Fumaça veio se aproximando, as longas baforadas largando uma extensa espiral branca contra o céu.

O clima era de intensa expectativa; comprovava-se a resistência de uma ponte ferroviária de madeira, sobre o abismo tenebroso e legendário que é o Rio Itararé naquela sua extensão subterrânea, com suas múltiplas gargantas e grutas impressionantes, tão terríveis quanto belas.

O trem entrou devagarinho na ponte, as vigas potentes estalando ao peso do monstro de ferro. Ele foi avançando lentamente e ganhou a outra extremidade. Que emoção!

Foi uma festa aquela estreia. Havia muita gente. Minha mãe e meu pai (com sua inseparável câmera) estavam com Seu Paulo Ferreira, Dona Lucila e os filhos do casal.

Num lugar perigoso como é a Barreira, todo mundo sabe, era mais que natural a extrema vigilância que os mais velhos exerciam sobre nós, os pequenos. Mas Aimée e eu eramos duas garotinhas endiabradas. Não sei de que maneira conseguimos ludibriá-los e ali estávamos agora, bem longe das vistas de nossos pais e irmãos mais velhos, aprontando uma, que hoje me dá arrepios só de lembrar...

Paralela à grade, havia uma pequenina ponte de tábuas unidas, sem grades, que servia aos trabalhadores para o transporte de material mais leve, de um lado para o outro. Era estreita e precária, oferecendo apenas a segurança indispensável a homens adultos, afeitos como aqueles, aos perigos de uma tal construção.

Não lembro de quem partiu a genial ideia (nem fujo à responsabilidade), mas de repente eu e Aimée estávamos atravessando a tal pinguela! E às carreiras, saltando como dois cabritinhos. Num zás estavamos do outro lado, passando sobre a pavorosa garganta lá embaixo, aos gritinhos e pinotes, como se estivessemos pulando amarelinha nas calçadas de nossas casas.

E não contentes, revezavamo-nos, ficando ela numa das margens e eu na outra. A um grito de "Já!", partíamos em disparada e nos encontravamos no meio da pontezinha, saudando-nos às gargalhadas e correndo em direção à margem oposta. Uma farra!

Mas não chegamos a repetir muitas vezes a façanha. No melhor da festa fomos descobertas por nossos pais apavorados, que nos arrancaram dali e se não nos deram umas boas palmadas, foi única e exclusivamente devido ao pânico em que se encontravam, capazes somente de dar graças por terem chegado a tempo de evitar uma tragédia horrorosa...

Revejo as fotos que meu pai bateu nesse dia. Numa, o trem chegando à ponte; noutra, atravessando-a naquele instante memorável que presenciei na inocência travessa de minha infância,

Em várias fotos, ao lado da arrojada construção, aparece a pequena ponte, nosso descontraído brinquedo daquele dia inesquecível.

Hoje, nem amarrada a um cabo de aço me fariam atravessá-la. Mas houve um tempo em que eu era mais valente...

(Tribuna de Itararé - 05/09/84)

Fonte:
Dorothy Jansson Moretti. Instantâneos. São Paulo: Dialeto, 2012.
Livro enviado pela escritora.

Gislaine Canales (Glosas Diversas) XXXVIII

SERIA POUCO...


MOTE:
A vida jamais se encerra...
E é bom sermos imortais,
amar você só na terra,
seria pouco demais!
A.A. de Assis
(Maringá/`PR)


GLOSA:
A vida jamais se encerra...

em torrentes de emoção,
é luta, é uma eterna guerra
nos campos do coração!

Precisamos ser felizes,
e é bom sermos imortais.
Não tenhamos cicatrizes
para, lembrá-las, jamais!

Sei que o destino não erra
ao ceder seu tempo, enfim:
amar você só na terra,
seria pouco pra mim!

Para esse amor tão bonito,
com seus suspiros, seus ais,
até mesmo o infinito
seria pouco demais!
= = = = = = = = = = = = =

GEMIDOS...

MOTE:
A lua no céu desmaia
com os gritos ofegantes,
vindos à noite, da praia,
nos gemidos dos amantes!

Ademar Macedo
Santana do Matos/RN, 1951 – 2013, Natal/RN

GLOSA:
A lua no céu desmaia

prateada, bela, em torpor,
quando fica de tocaia,
quase em êxtase de amor!

Ela vibra de emoção
com os gritos ofegantes,
que partem do coração
e se tornam ofuscantes!

E um doce beijo, ela ensaia,
escutando esses gemidos,
vindos à noite, da praia,
lá do universo, perdidos!

A Lua, realizada
nesses infindos instantes,
escuta vozes de fada
nos gemidos dos amantes!
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BERÇO DE TERNURA

MOTE:
Adormeceste em meus braços...
E eu pude ter a ventura
de ninar os teus cansaços
no meu berço de ternura…
Carolina Ramos
(Santos/SP)

GLOSA:
Adormeceste em meus braços,
aninhado nos meus seios,
rodeado por meus abraços,
respondendo aos meus anseios!

Vivi esse doce instante
e eu pude ter a ventura
de sentir quão excitante
é essa afeição tão pura!

Unindo, assim, nossos laços,
eu tive a felicidade
de ninar os teus cansaços
fantasiando a realidade!

Como perfume de flores,
que eu te embalei com doçura,
numa balada de amores,
no meu berço de ternura...
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BARCA DE NUVENS...

MOTE:
Em barca de nuvens sigo...
e o que vou pagando ao vento
para levar-te comigo
é suspiro e pensamento.
Cecília Meireles
Rio de Janeiro RJ, 1901-1964

GLOSA:

Em barca de nuvens sigo
num mundo de fantasia.
Não corro nenhum perigo,
pois me acompanha a alegria!

Pago um preço, um quase nada...
e o que vou pagando ao vento
são ilusões de uma fada,
que eterniza o meu momento!

Eu conquisto o vento amigo
com muito amor e carinho,
para levar-te comigo
para sempre em meu caminho!

Sinto vibrar a ternura
em meu coração sedento
e a canção, que surge, pura,
é suspiro e pensamento.
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MENSAGEM

MOTE:
Dá, a vida, teus sorrisos
e, das lágrimas, te afasta!
Para atingir paraísos,
essa mensagem te basta!
Delcy Canalles
(Porto Alegre/RS)

GLOSA:

Dá, a vida, teus sorrisos
agradece a cada dia,
sorrir, não trará prejuízos,
somente paz e alegria!

Cultiva a felicidade
e, das lágrimas, te afasta!
pois a tristeza, é verdade,
à tristeza, nos arrasta!

São conselhos bem precisos,
de uma musa da poesia,
para atingir paraísos,
nossa estrada é a utopia!

Segue, assim, por onde fores,
numa atitude entusiasta
para encontrar mil amores
essa mensagem te basta!
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O ORVALHO...

MOTE:
Pleno outono...e em meu atalho,
sem um amor que me acolha,
invejo a sorte do orvalho
que se abriga em qualquer folha.
Edmar Japiassú Maia

Nova Friburgo/RJ

GLOSA:

Pleno outono...e em meu atalho,
tentando me reencontrar,
da persistência me valho
e sigo a me procurar!

Sigo só, com a alma em pranto,
sem um amor que me acolha,
buscando ouvir o acalanto
que minhas mágoas recolha!

Com meu cabelo grisalho,
prateado como o luar,
invejo a sorte do orvalho
que faz da flor o seu lar!

Sendo gotas de carinho
e tendo a sorte da escolha,
louvo o orvalho em seu caminho,
que se abriga em qualquer folha.

Fonte:
Gislaine Canales. Glosas Virtuais de Trovas XXIV. In Carlos Leite Ribeiro (produtor) Biblioteca Virtual Cá Estamos Nós. http://www.portalcen.org. Março 2005.

Rachel de Queiroz (Bogun)

Sim, o gato se chama Bogun, depois eu explico por quê. Não há como um nome inspirador para estimular a criatura, e aquele nos parecia adequado. Gato cinzento, cor de nuvem escura, olhos elétricos, pelagem de seda, de raça persa azul, tão boa e tão antiga quanto a raça dum mandarim — e, tal como mandarim, nascera ele com estrela de ouro por cima do berço.

A princípio, como pesava apenas quatrocentos gramas (e trezentos deveriam ser apenas o pelo), não se lhe podia exigir muito. Afinal era apenas um baby, um filhote desmamado antes do tempo e que um pires de leite morno deixava bêbado. Mas como já era insolente, audacioso, cônscio de si! Que vida poderia caber dentro daquele novelo de quatrocentos gramas de seda gris? Talvez fosse pouca, mas pouca embora, era como uma faísca elétrica, que é só um risco fino de luz e mata um homem. Assim o gatinho: tão débil que um sopro forte o derrubaria — mas trazia dentro de si aquela centelha de independência e individualidade, aquela consciência de si, isolando-o, identificando-o entre todos os seres do mundo – gatos e elefantes, peixes e panteras, Um aperto com dois dedos o mataria; mas enquanto o não matasse, ele era só isso, o gatinho Bogun, capaz de enfrentar o mundo inteiro, destemeroso de bichos e de homens e de quaisquer outros inimigos; capaz de bocejar displicentemente na cara de um estranho, de estender a unha afiada para o nariz do cachorrão que o farejava intrigado; e depois que o cachorro recuava, Bogun fechava os olhos, displicente, como se dissesse: "Ora, é apenas um cão..."

Nunca miou. Solta às vezes um gemido áspero, quando tem fome ou tem raiva. Se tem medo, bufa. Porém miar, jamais.

Por tudo isso ganhou o nome de Bogun. Bogun se chamava o mais valente de todos os cossacos, moço-herói de um romance de cavalaria que nós dois aqui em casa adoravamos, na nossa adolescência, Bogun, bravo como um lobo, belo como um dia de sol, orgulhoso como Satanás. Olhamos os olhos amarelos do gato — iguais aos olhos do cossaco, que eram como dois topázios (assim dizia o livro) — e achamos que ficava bem.

Hoje, Bogun cresceu. Belo, não se nega, mais belo até do que prometia quando filhote. Mas o caráter — onde? Nada da inteireza, da valentia simples, da falta de complexidade do herói. Bogun é complicado e dúbio, tortuoso e imprevisto. Sibarita e displicente. Por exemplo — de pequenino, parecia ter alma de caçador. Era capaz de perseguir durante horas uma formiga ou um besourinho. Hoje ainda caça, sim; mas só se interessa por cigarras e mariposas. Um dia, por acaso, um rato de campo lhe atravessou o caminho; ele se afastou com dignidade e nojo e, durante dias, evitou aquele trecho do quintal cruzado por tal vermina. Às vezes acompanha de longe o voo dum passarinho — mas é como um devaneio, sem desejo e sem impulso. Creio que jamais conheceu na boca o sabor do sangue vivo de um bicho, abatido pela sua garra; suponho até que sentiria asco. Ele só gosta de filé mal passado, de risoto, de peixe magro —  sem molho. Leite, só tépido. E gosta de banho, sim, adora banhos! Num gato não é uma espécie de degenerescência? Fica de olhos entrecerrados, ronronando sentado na bacia, enquanto o ensaboam. Depois consente deliciado que o enxuguem na toalha felpuda, que o escovem, que o ponham ao sol, a secar. Por fim, fofo, macio, perfumado, quente do sol, quase tirando faísca no pelo cor de aço, vem se exibir orgulhosamente na sala, arqueia o dorso, ergue a cauda frocada — para que todos vejam quanto ele é lindo e rico, e gozador, e precioso, e inimitável.

Quando afinal satisfaz a vaidade, escolhe a cadeira de palhinha (detesta almofadas, acha-as ou quentes ou vulgares) bem fina, bem fresca, boceja, encrespando a língua rósea e áspera, espreguiça-se, estira elasticamente a garra afiada, repousa a cabeça entre as patas dianteiras e dorme.

E enquanto dorme, sem um cuidado, tem a certeza de que o bando de servos, de inferiores, que somos todos nós, lhe velam o sono.

Fonte:
Rachel de Queiroz. Pedra encantada e outras histórias. RJ: José Olympio, 2011.

Lucy Hay (Dicas de Escrita) Como escrever o esboço de um Enredo = Parte III, final


Dividindo textos que já existem em uma estrutura de enredo básica

1. Divida o enredo em três atos.

Caso tenha que dividir um texto que já existe em uma estrutura de enredo básica, comece separando a história em três atos. Quase todo livro se encaixa nesse modelo, seja qual for o gênero.

Abra um documento do Word ou pegue uma folha de papel e divida-a em três seções: Primeiro ato, Segundo ato e Terceiro ato.

Geralmente, esse tipo de estrutura tem duas páginas, dependendo do tamanho do livro. Seja conciso e concentre-se nos pontos-chave do enredo.

2. Resuma a cena de introdução incitante e o incidente.

Comece a seção Primeiro ato com a introdução do livro, lembrando que essa é a cena que apresenta os personagens e a ambientação. O protagonista também aparece nela. Seja breve, escrevendo de 100 a 150 palavras. Inclua os detalhes mais cruciais, como nomes de personagens, descrições físicas e de personalidade e onde tudo acontece.

O início da estrutura do Primeiro ato deve também incluir o incidente incitante, que lança o personagem na jornada ou missão. Esse incidente também pode levar ao conflito central do livro.

Por exemplo: em O Sol é para Todos, da escritora norteamericana Harper Lee, o incidente incitante acontece quando o advogado Atticus resolve defender um homem negro chamado Tom Robinson, que foi acusado injustamente de estuprar uma mulher branca.

3. Descreva o problema ou conflito central.

A última seção do Primeiro ato deve trazer o problema ou conflito central da história, ou seja, o principal obstáculo que o protagonista precisa enfrentar. É nesse ponto que a situação fica tensa e o personagem é obrigado a tomar uma decisão ou agir de determinada forma. No geral, o incidente incitante contribui com esse problema ou conflito.

Por exemplo: em O Sol é para Todos, o conflito central é consequência do incidente incitante, quando a decisão de Atticus de defender Tom Robinson deixa seus filhos Jem e Scout vulneráveis a agressões de outras crianças e por membros da comunidade.

4. Resuma o desastre central ou clímax.

O Segundo ato leva ao desastre principal ou ao clímax da história. Esse trecho acontece na altura de ¾ ou 75% do enredo, mas pode ser antecedido por vários incidentes menores e que caracterizam a ação em ascensão.

Por exemplo: em O Sol é para Todos, a ação em ascensão acontece quando o julgamento de Tom Robinson tem início e se prolonga por uma série de capítulos. Apesar de ele ser absolvido das acusações, o pai da mulher branca, Bob Ewell, ainda planeja se vingar de Atticus. Sendo assim, o clímax ocorre quando Ewell tenta atacar Jem e Scout. Felizmente, Boo Radley salva as crianças da ira do homem.

5. Descreva a resolução ou conclusão.


O Terceiro ato traz a resolução do enredo e indica o fim da jornada do protagonista. Muitas vezes, o personagem principal termina essa trajetória com uma visão diferente ou uma nova compreensão do mundo à sua volta.

Por exemplo: em O Sol é para Todos, a protagonista, Scout, entende que julgou errado as motivações de Boo Radley e começa a simpatizar com o personagem. Ela também passa a exercer o conselho de seu pai, Atticus, de demonstrar simpatia e compreensão pelos outros, em vez de destilar ódio e preconceito.

Fonte:
Traduzido de https://www.wikihow.com/Write-an-Outline-for-a-Story

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Varal de Trovas n. 547

 

Luís Fernando Veríssimo (A Russa do Maneco)

Todos ficaram muito intrigados quando o Maneco, logo o Maneco, apareceu com uma russa. Em pouco tempo “a russa do Maneco” se tornou o assunto principal da turma. Todas as conversas, cedo ou tarde, acabavam na frase “E a russa do Maneco?” e daí em diante não se falava em outra coisa. E, claro, quando o Maneco e a russa estavam com a turma, a russa era o centro de todas as atenções. Os homens de boca aberta, as mulheres tentando ser simpáticas mas odiando a russa.

Porque a russa do Maneco era linda como só as russas conseguem ser. Olhos claros e puxados, maçãs do rosto altas, um lábio inferior cheio e um pouco mais saliente do que o de cima, pele branca como as estepes, cabelos loiros como os trigais da Georgia, ou onde quer que nasça muito trigo por lá. E o corpo, o corpo…

– Bailarina ? sentenciou uma das mulheres, como se acusasse a russa de competição desleal.

Bailarina, sim, mas bailarina de um tipo especial: com anca e peito. Pernas longas. Mais alta do que o Maneco. Quando o Maneco a abraçava ela beijava o topo da sua cabeça. (Os homens suspiravam, as mulheres se revoltavam.) E a russa só sabia uma palavra em português, além de “bom dia” e “obrigado”:

– Manequinho.

Muitos da turma não conseguiam dormir, pensando no Maneco com a loira na cama, e no “Manequinho” dito com aquele sotaque russo, por aqueles lábios russos. Logo o Maneco!

O Maneco não explicava onde e como encontrara a sua russa. Só dizia, misteriosamente:

– A coisa mais fácil de conseguir, hoje, na Rússia, é plutônio e mulher.

Dando a entender que, além de uma mulher espetacular, também estaria envolvido com o tráfico clandestino de material radioativo. As duas principais sobras da derrocada do império soviético. O que deixava a turma ainda mais intrigada.

– Vem cá: o Maneco não é funcionário público?

Era. E, que se soubesse, nunca saíra do Brasil. Mas as pessoas, afinal, podem ter suas vidas secretas. E numa das suas vidas secretas, o Maneco encontrara a sua russa. Talvez negociando plutônio enriquecido para revender a algum grupo terrorista internacional. Depois de verem a russa beijando o topo da sua cabeça, ninguém duvidava de mais nada a respeito do Maneco. Se ouvissem dizer que o Maneco estava sendo caçado pela Interpol, ou que seria o novo marido da Nicole Kidman, ou as duas coisas, não duvidariam.

E especulações sobre que outras coisas o Maneco era e fazia que ninguém sabia passaram a dominar a conversa do grupo ? sempre que o assunto não era a russa.

E um dia o Maneco apareceu sem a russa. Arrá, pensaram todos. A russa finalmente se deu conta de quem o Maneco realmente é.

Qualquer que fosse a mentira que o Maneco usara para conquistá-la, estava desmascarada. A russa deixara o Maneco, as coisas voltavam aos seus lugares.

O mundo voltava à normalidade. Estava restabelecida a lógica, segundo a qual uma russa daquelas não podia ser de um Maneco daqueles. Que fim levara a russa?

– Olha ? disse o Maneco ? russa não é fácil, viu?  – Repetiu: – Russa não é fácil!

E contou que as russas eram possessivas, e ciumentas, e atrasadas, pois não admitiam que um homem podia ter duas ou três namoradas ao mesmo tempo e…

Naquele momento gritaram do bar que havia um telefonema, uma mulher chorosa querendo falar com o “Manequinho”, e o Maneco começou a fazer sinais frenéticos e a dizer: “Diz que eu não estou, diz que eu não estou.”

Sensação na turma. O Maneco é que deixara a russa! E se com a russa o Maneco já era o assunto preferido da turma, sem a russa passou a ídolo.

Fonte:
Luís Fernando Veríssimo. Amor Veríssimo. Publicado em 2014.

Hinos do Brasil (Estados: Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul)

Hino do Estado do Rio Grande do Norte

Letra por Dr. José Augusto Meira Dantas
Melodia por José Domingos Brandão


Rio Grande do Norte esplendente
Indomado guerreiro e gentil,
Nem tua alma domina o insolente,
Nem o alarde o teu peito viril!

Na vanguarda , na fúria da guerra
Já domaste o astuto holandês!
E nos pampas distantes quem erra,
Ninguém ousa afrontar-te outra vez!

Da tua alma nasceu Miguelinho,
Nós, como ele, nascemos também,
Do civismo no rude caminho,
Sua glória nos leva e sustém!

A tua alma transborda de glória!
No teu peito transborda o valor!
Nos arcanos revoltos da história
Potiguares é o povo senhor!

Foi de ti que o caminho encantado
Da Amazônia Caldeira encontrou,
Foi contigo o mistério escalado,
Foi por ti que o Brasil acordou!

Da conquista formaste a vanguarda,
Tua glória flutua em Belém!
Teu esforço o mistério “inda” guarda
Mas não pode negá-lo a ninguém!

É por ti que teus filhos descantam,
Nem te esquecem, distante, jamais!
Nem os bravos seus feitos suplantam
Nem teus filhos respeitam rivais!

A tua alma transborda de glória!
No teu peito transborda o valor!
Nos arcanos revoltos da história
Potiguares é o povo senhor!

Terra filha de sol deslumbrante,
És o peito da Pátria e de um mundo
A teus pés derramar trepidante,
Vem atlante o seu canto profundo!

Linda aurora que incende o teu seio,
Se recama florida e sem par,
Lembra uma harpa, é um salmo, um gorjeio,
Uma orquestra de luz sobre o mar!

Tuas noites profundas, tão belas,
Enchem a alma de funda emoção,
Quanto sonho na luz das estrelas,
Quanto adejo no teu coração

A tua alma transborda de glória!
No teu peito transborda o valor!
Nos arcanos revoltos da história
Potiguares é o povo senhor!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =

 
Hino do Estado do Rio Grande do Sul
Letra por Francisco Pinto da Fontoura
Melodia por Joaquim José de Mendanha


Como a aurora precursora
do farol da divindade
foi o Vinte de Setembro
o precursor da liberdade.

Mostremos valor, constância
Nesta ímpia e injusta guerra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra
De modelo a toda terra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra

Mas não basta pra ser livre
Ser forte, aguerrido e bravo
Povo que não tem virtude
Acaba por ser escravo

Mostremos valor, constância
Nesta ímpia e injusta guerra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra
De modelo a toda terra
Sirvam nossas façanhas
De modelo a toda terra
= = = = = = = = = = = = =
“Estrofe suprimida em 1966”
Entre nós, reviva Atenas
Para assombro dos tiranos
Sejamos gregos na glória
E na virtude romanos.

Fontes:
Wikipedia
RN
RS

Benedita Azevedo (Dias de Leitura)

Lúcia era uma professora de classe especial e procurava estimular as crianças para a leitura. Andava com uma pasta cheia de livros que as crianças chamavam de biblioteca.

- Vamos turma, hoje é dia de Leitura!

- Oba! Quero ouvir a história do João e Maria - pediu Sérgio, uma das cinco crianças com as quais Lúcia trabalhava na escola.

- Eu quero a do Patinho feio – atropelou Luisinho; ele tinha dificuldades para andar, devido à paralisia infantil que o acometera aos 3 anos - vestia uma linda jaqueta vermelha, gorro azul com vermelho e luvas azuis.

- Eu quero a do gigante, aquele do pé de feijão – choramingou Paulinha, vestindo um macaquinho amarelo e gorro de pompom da mesma cor.

- Tia Lúcia, eu queria a história da Cinderela e a carruagem de abóbora – solicitou Solange, com seu cachecol amarelo e o gorro com pompom vermelho.

- Tia Lúcia, será que tem aquela historinha que fala porque o canguru salta em duas patas? – mais uma vez solicita Sérgio, todo agasalhado, usando óculos, com pinta de intelectual.

- Será que na sua biblioteca tem a história do Pinóquio? Eu gosto quando o nariz dele cresce. Quem manda ser mentiroso, não é tia? – Comentou Paulinha, encolhendo-se de frio, ajeitando as luvas amarelas e colocando o gorro-cachecol.

- Será que dá para contar a lenda do Negrinho do pastoreio, aquele que foi enterrado no formigueiro? – pediu Solange, com seu gorro de listras vermelhas e brancas, enterrado até as sobrancelhas.

As crianças não davam folga para Lúcia falar. Todos falavam atropelando-se verbalmente. Por fim ela que observava a reação de cada um, pediu que eles a ouvissem.

- Eu tenho um lindo livro de capa azul, cheio de estrelas cor de ouro, onde poderemos passear por todas essas lindas histórias e até viajar no arco-íris.

- Viajar no arco-íris? Aquele todo colorido? Mas a gente pode mudar, tia! Quando alguém viaja nele, quem é homem pode virar mulher e quem é mulher pode virar homem quando chegar do outro lado! – tagarelou Flora que se mantivera calada até aquele momento.

- Mas no meu arco-íris, não acontece isso não! A gente embarca no meio de um campo cheio de flores, viaja pelas estrelas e pode passar por todas as histórias que vocês querem ouvir.

- Então vamos logo, entrar no livro de estrelas e viajar no arco-íris. – falaram as crianças em coro.

- Vamos lá, todos estão bem agasalhados? Pois viajaremos por lugares muito frios. – anunciou a tia Lúcia, já bem agasalhada, com seu casaco de lã grossa, botas e um lindo gorro, para proteger suas orelhas do frio. - Visitaremos “João e a Maria” fugindo do quarto da bruxa. O patinho feio virando um lindo Cisne. João chegando às nuvens no pé de feijão e descendo com o saco de ouro. A Cinderela no seu lindo vestido de tafetá dourado bordado com pedras preciosas e os sapatinhos de cristal, dançando com seu príncipe. Depois encontraremos o Pinóquio com seu grande nariz e a fada de cabelos azuis, que o fez descobrir que não valia a pena mentir. Pegamos o Pinóquio e vamos até o Rio Grande do Sul salvar O Negrinho do Pastoreio do formigueiro.

Lúcia sentou-se no meio da sala com todas as crianças. Abriu o livro azul com estrelas douradas e em pouco tempo todos viajavam pelas histórias, da preferência de cada um.

Minha Estante de Livros (“Senhora”, de José de Alencar)


Sendo um dos últimos de Alencar, Senhora é um romance urbano que retrata o casamento por interesse numa sociedade de aparências do século XIX, mesma época em que o autor vivia. Nessa obra pertencente à época literária do Romantismo já é possível observar características do Realismo e do Naturalismo. Através dos diálogos e discussões entre Fernando e Aurélia, podemos notar a visão crítica que estes possuem da sociedade, onde o casamento não é apenas por amor, e mais por interesse.

O romance pertence a segunda metade do século XIX, onde a sociedade vivia de aparências e contradições. Alencar critica a sociedade, não de uma perspectiva esperançosa de mudanças, mas de perspectivas atuais e sem soluções aparentes. O casamento por interesse era um costume social muito criticado pelo autor.

A obra Senhora, de José de Alencar é dividida em quatro partes. A primeira delas, nomeada de “O preço do casamento”, começa descrevendo uma jovem moça chamada Aurélia, rica e frequentadora de bailes da alta sociedade. Aurélia, sendo órfã e herdeira de uma grande fortuna, estava sempre acompanhada de sua parenta D. Firmina e acreditava que todos só se interessavam por ela por causa de sua beleza e do seu dinheiro.

Em um baile de costume, Aurélia começou a se questionar sobre sua educação e seu destino. Escreveu uma carta ao Sr. Lemos dando-lhe a missão de arrumar seu casamento com o atual noivo de Adelaide Amaral, o Fernando Seixas. Seixas era pertencente a uma família de situação pouco favorável e pretendia arrumar um casamento com uma moça rica para oferecer melhores condições para sua mãe e suas irmãs, e também para seus luxos.

Lemos faz a proposta de casamento a Seixas, que mesmo sem conhecer a noiva, recebe um adiantamento do alto dote e aceita o compromisso. Quando foi apresentado à Aurélia, Seixas sente uma profunda humilhação, pois em tempos passados tinha rompido um noivado com ela para ficar noivo de Adelaide, que era mais rica. Na noite de núpcias, Aurélia chama seu então marido de homem vendido.

Na segunda parte, chamada “Quitação”, é contada a história de Aurélia. D. Emília era sua mãe e Pedro Camargo, seu pai. Pedro era filho bastardo de um rico fazendeiro e casou-se com Emília sem conhecimento de seu pai. Anos depois, acaba morrendo e seu pai não conhece sua neta. D. Emília fica em má situação para criar sua filha. Nesse momento, Seixas se elege como pretendente de Aurélia e assume o compromisso de se casar com ela. Porém, se arrepende por ter se apaixonado por uma moça pobre e órfã e assume compromisso com Adelaide, moça rica na sociedade. Perto de falecer, o avô de Aurélia a procura e deixa para ela toda sua fortuna. Após a morte de sua mãe, Aurélia tem como tutor Sr. Lemos, seu tio, e como acompanhante, D. Firmina.

A terceira parte tem como título “Posse” e descreve a rotina de Aurélia e Fernando enquanto casal. Eles vivem uma vida de aparência; desfilam de mãos dadas, trocam carinhos e gentilezas diante de bailes ou de amigos. Mas quando estão sozinhos, trocam palavras ferinas e acusações. Fernando se vê como um escravo de Aurélia, tendo ela como sua dona e a obedece em todos os seus desejos.

Na quarta e última parte, “Resgate”, temos os principais acontecimentos da trama. Os desejos não realizados de Aurélia e Fernando são passados pelo autor com muito erotismo. Porém, por orgulho, Fernando e Aurélia não se deixam envolver. Podemos notar nessa parte a visível transformação de Fernando que passa a recusar o luxo que tanto já desejara. Fernando passa então a trabalhar dedicadamente e faz um negócio importante, em que arrecada um valor e devolve para Aurélia todo o dinheiro do dote. Ele então pede o divórcio. Comprovada a mudança de Fernando, Aurélia lhe mostra o seu testamento escrito no dia do casamento, onde é deixada para Fernando toda sua fortuna e é declarado o seu amor por ele. O casamento então se consuma e os dois se tornam um casal de amantes.

ANÁLISE


Aurélia, personagem principal do livro Senhora, de José de Alencar, participa da tríade do autor – juntamente com Lucíola e Diva – em que representa o “perfil de mulher” da sociedade brasileira através de uma visão romântica. Através desse perfil, Alencar busca compreender os sentimentos e os motivos que os impulsionam, através do relato minucioso dos pensamentos e ações da mulher. Aurélia, sendo pobre, era frágil, meiga, compreensiva e sonhadora. Após a decepção que teve com Fernando ao ser abandonada em troca de um casamento por interesse, passa a ser fria, calculista e temperamental. Aurélia faz questão de, por vaidade, mostrar à sociedade que é rica e dona de Fernando.

Já Fernando inicia o enredo sendo um homem extremamente interesseiro e sedutor que mesmo estando apaixonado por Aurélia, desmancha seu noivado com ela para assumir compromisso com Adelaide, que era rica. Porém, ao se casar com Aurélia e se sentir humilhado diante da situação, ocorre uma transformação em sua personalidade. Para se transformar no par de Aurélia e completar o romance com um desfecho feliz, essa mudança de comportamento é necessária ao enredo. Fernando passa a ser um homem compromissado com o trabalho e tem por objetivo principal devolver à Aurélia o valor correspondente ao dote que recebeu, para assim ficar livre.

Senhora faz parte da fase literária que chamamos de Romantismo. Entretanto, em várias passagens e através dos personagens do enredo, podemos notar características pertencentes ao estilo do Realismo já se mostrando. Alencar faz uma dura crítica ao costume da época em que casamento muitas vezes não era visto como uma união de um casal apaixonado e sim como um negócio, em que dotes são pagos.

Personagens


Aurélia Camargo
: Jovem rica de 18 anos órfã, chama atenção de todos pela sua beleza e excentricidade. Muitos moços da sociedade a desejam como esposa, porém, ela pede a seu tio que faça um acordo com Fernando Seixas e casa-se com ele. Aurélia demonstra inteligência e planejamento de suas ações, para que tudo saia conforme seus planos.

Fernando Seixas
: Jovem de 18 anos que, apesar de sua família viver de maneira muito simples, tinha uma pose e um lugar de respeito na sociedade. Interesseiro, procura casamento com uma moça rica para melhorar sua situação financeira. É servidor público. Só após o casamento com Aurélia é que começa a ocorrer uma transformação em sua personalidade.

D. Emília: mãe de Aurélia, casa-se com Pedro por amor e deixa sua família para viver esse amor.

Lemos: Irmão mais velho de D. Emília que só aparece após saber que sua sobrinha herdou uma valiosa herança. A pedido de Aurélia, arruma seu casamento com Fernando.

Pedro Camargo: filho bastardo de Lourenço Camargo, casa-se escondido de seu pai com D. Emília e morre, deixando Aurélia órfã.

D. Firmina: mora com Aurélia e a faz companhia.

Adelaide
: Ex-noiva de Fernando, é apaixonada por Torquato e por ele ser pobre, só consegue se casar com a ajuda de Aurélia.

Torquarto Ribeiro
: moço pobre e apaixonado por Adelaide, foi muito amigo de Aurélia quando ela era pobre.

Eduardo Abreu: Apaixonado por Aurélia, paga as despesas do sepultamento de D. Emília, mesmo estando viajando.
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José de Alencar nasceu no Ceará em 1829 e em 1830 muda-se para o Rio de Janeiro, junto com sua família. Aos 14 anos, mudou-se para São Paulo, onde inicia sua faculdade de Direito. Destacou-se como um grande romancista de nossa literatura, além do romance urbano Senhora, publicou outras tendências de romance, como o romance indianista Iracema e o romance regionalista O gaúcho. Além de escritor, foi também crítico teatral e político. Morreu aos 48 anos em 1877, na cidade do Rio de Janeiro.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Solange Colombara (Portfólio de Spinas) 15


 

Helena Kolody (Mendigos)


Para lá da ponte preta, havia só duas casas.

Logo depois da ponte, o casebre da Bruta Béstia. E muito mais longe, no mato cerrado, a choupana do lazarento, sempre fechada.

Quando o bando de crianças ia colher guabirobas, quase sempre encontrava a Bruta Béstia, a caminho da cidade. Era uma italiana grande e feia, de nariz vermelho, cabelos emaranhados fugindo do lenço sujo. Trazia sempre um filho ao colo. Seguiam-na os outros filhos, os menores vestidos apenas com uma camisinha que mal chegava ao umbigo. Era uma tropilha bizarra.

A mais velha, ruiva, de olhos gateados; o segundo, louro; havia um quase mulato. Ranhentos e sarnosos, dava nojo olhá-los.

Ninguém sabia o nome da mulher. Aparecera Deus sabe donde e como exclamasse frequentemente: “bruta béstia!”, pegara-lhe o apelido.

A alegria da criançada era gritar-lhe, pelas costas e prudentemente à distância:

— Bruta béstia!

A mulher virava-se como se alguém a houvesse mordido.

— Bruta béstia é a tua mãe!

E desfiava um rosário de impropérios.

A gurizada guinchava de gosto. Quanto mais feios os palavrões, maiores as gargalhadas.

A raiva da mulher ia amainando. Então, como quem atira ao fogo uma braçada de lenha, tornavam a gritar:

— Bruta Béstia!

Reacendia-se-lhe a cólera.

Afinal, a mulher desistia da luta, arrebanhava os filhos e seguia rumo à cidade, onde ia esmolar. Ir juntar guabirobas era melhor que o melhor dos brinquedos. Meninos e meninas, munidos de cestas, varavam o Matinho — assim o povo chamava o grande terreno desabitado, que ficava para cá da ponte preta.

Os meninos marinhavam pelas enormes guabirobeiras e sacudiam-lhes os galhos. O capim ficava juncado de guabirobas graúdas e amarelas. Começava, então, a disputa pelas melhores.

— Essa “gavirova” é minha.

— Fui eu que vi primeiro.

Às vezes, um pé vingativo esmagava a fruta.

— Ói a tua gavirova!

Mas as cestas se enchiam. Na volta, as crianças vinham a chupar as frutas melhores. Muitas vezes, acontecia de chegarem em casa com umas poucas guabirobas feias e amassadas.

Só quando começavam a escassear as frutas do lado de cá é que passavam, com certo receio, para o outro lado da ponte preta, onde a estrada deserta corria pelo mato cerrado. Mas a tentação era grande. Um informava:

— Eu sei de uma gavirovêra, lá do outro lado... Dá cada gaviróva deste tamanho!

E lá iam todos.

Ao avistarem o casebre do morfético, instintivamente se afastavam. Às vezes, o mais curioso ia espiar pelas frestas.

De longe, gritava-lhe a irmã:

— Espera, Toninho, que vô contá pra mamãe!

O lázaro era o papão da cidade. As mães ameaçavam os filhos. Não vá pra rua, que o lazarento te pega. As crianças iam mesmo, mas tinham um medo do lazarento! Corria a notícia de que os leprosos procuravam passar aos outros a sua moléstia, acreditando que assim ficassem limpos. Mas aquele leproso nunca fizera mal a ninguém. Vinha sempre mendigar na cidade.

Lembro-me bem da primeira vez que o vi. Eu havia chegado do sítio por aqueles dias e fui brincar na praça, com outra menina. Eu nunca tinha visto praça. Aquela era um grande gramado, ensombrado de árvores e cortado em diagonal por uma ruazinha. Era domingo e havia muitas meninas brincando na praça.

Ao chegarmos, uma se destacou e veio ao nosso encontro.

— Quem é essa menina?

— É a neta de D. Jandira.

A outra foi logo convidando:

— Vâmo brincá de pega?

Fez-se o círculo. A menina foi tirando a sorte:

Um, dois, três, quatro,
Quantos pelos tem o galo
Acabado de nascer?
Um, dois, três, quatro.

Aquelas em que terminava a quadrinha, iam saindo.

Afinal, ela anunciou:

— Mãe é a Lila. O “frái” é o coreto. Não vale correr na rua.

Eu fiquei atrapalhada. Baixinho, perguntei à companheira:

— Onde é o coreto?

— Ali, naquela casinha redonda, no meio da praça — disse alto a menina, apontando o coreto.

As outras riram. Senti que fiquei vermelha.

Afinal, começou o brinquedo.

Os gritos das perseguidas pela “mãe” enchiam a praça. A miúdo, soava, em triunfo: mãe! E lá ia um tapa nas costas da alcançada.

Mudavam os papéis e recomeçava a correria. De quando em quando, uma gritava: “frái!” e sentava-se, ofegante, na escadinha do coreto.

Eu estava quase à parte e acabei por ficar apreciando o jogo.

A certa altura, uma avisou:

— Ói o lazarento!

Num fechar de olhos, debandaram todas.

Fiquei ali, apatetada. Lazarento!

Só então, reparei naquele homem que vinha pela rua da praça. Passou bem perto de mim, enorme e vermelho. O rosto era dum rosado vivo, os olhos lacrimejantes, os lábios e o nariz muito inchados, as orelhas crescidas e pendentes. A roupa parecia querer rebentar, de tão justa. Na mão enorme, levava um bastão, com que ajudava os passos. Andava devagarinho, arrastando os pés, embrulhados em trapos ensanguentados e metidos em chinelas. Não olhava para ninguém e parecia não ouvir.

Debalde as meninas, agrupadas no outro extremo da praça, esganiçavam, num coro desatinado:

— Lazarento!

Naquele dia, Toninho fora sozinho ao mato colher guamirim. Fartara-se daquela frutinha de sabor acre, que lhe deixara pretos os dentes, a boca, os dedos. Na volta, passou rente à casa do leproso e não pude deixar de ir olhar pelas frestas.

Estava entretido na sua bisbilhotice, quando se sentiu agarrado. Ao voltar o rosto, deu com a cara vermelha do morfético, que o apertou contra si e esfregou a sua face no rosto do menino.

Toninho estava mudo de horror.

— Dez com este! — disse, em triunfo, a voz rouca do leproso. Solto, o menino largou-se a correr, gritando e limpando o rosto.

E nunca mais se viu o lazarento na cidade, nem se soube do seu paradeiro.

Fonte:
Luís Bueno (org). O tempo visto daqui : 85 cronistas paranaenses. Curitiba, PR: Secretaria de Estado da Cultura, 2018.

Professor Garcia (Poemas do Meu Cantar) Trovas – 15 –

 Ante um conselho que é justo
eu me curvo e me ajoelho
e pago por qualquer custo
o custo de um bom conselho!
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Aos corpos que, entre os farrapos
dormem sujos pelo chão...
Restam-lhes pois entre os trapos,
velhos trapos de ilusão!!!
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Ao vencer tempo e distância,
a velhice, abraço e aceito;
mas os bons tempos da infância
são crianças no meu peito!
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Busquei, na fonte de um templo,
a paz de um novo horizonte;
e achei essa paz no exemplo
que há no silêncio da fonte!…
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Deus pôs no amor tanta essência,
que, o seu grande Benfeitor,
não permite que a ciência
ponha limites no amor!
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Esse dia me distrai,
e enche-me de amor, de afetos;
dos afetos, por ser pai
das filhas e dos meus netos!
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Há uma paz no olhar da mata
quando a brisa em leve açoite,
soprando a velha cascata
embala o pranto da noite!
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Lembrando os tempos antigos,
mesmo apesar da distância...
Escuto os passos amigos
dos meus amigos de infância!
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Levi, ao ver que me olhava,
confesso aqui, entre nós,
que era o neto que faltava
na vida de seus avós!
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Mãe, é poema de amor
que, a qualquer filho se apega;
alívio que afasta a dor
da cruz que o filho carrega!
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Mãe - nessas tuas letrinhas
ouço os mais lindos fonemas
que formam todas as linhas
dos versos dos meus poemas!
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Nos momentos mais grotescos,
quando chove no sertão...
A chuva pinta arabescos
de esperanças pelo chão!
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Nossos sonhos sintetizam
a paz de todos os temas
que, docemente, deslizam
nos versos dos meus poemas!
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Nos teus bilhetes queimando
vi com certo desconforto...
Frases de amor me acenando
das cinzas de um sonho morto!
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O entardecer se assemelha
a um fogaréu tão bonito,
que a tinta de cor vermelha
se espalha em todo o infinito!
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Os teus cansaços não vão
impedir que o teu suor,
seja o fermento do pão
que te alimenta melhor!
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Por esse amor que carrego,
não vejo maldade alguma;
sou tão cego, quanto um cego
que não vê coisa nenhuma!
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Prefiro os caminhos tortos
aos enlevos mais risonhos,
a ver os meus sonhos mortos
entre as cinzas de outros sonhos!
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Qual velho papel carbono,
quase sem tinta e sem cor...
Vai-se o meu sonho sem dono
buscando sonhos de amor!
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Quando escuto a tua voz,
há um silêncio que me acalma!...
E, é nesse instante, entre nós,
que escuto a voz de minha alma!
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Sinto na mãe que se enlaça
nos braços de uma criança...
Que um sonho de amor se abraça
aos bracinhos da esperança!
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Soprei cinzas!... E, ao soprá-las,
entre as cinzas da lembrança...
Escutei todas as falas
do meu tempo de criança!
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Sou como as folhas sem dono
que se arrastam pelo chão,
nas tardes tristes de outono
depois que os ventos se vão!
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Tua carta de alforria
eu queimei sem embaraços,
porque quero todo dia
ser escravo de teus braços!
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Vivo cercado de afetos!
Na paz do mesmo endereço...
Vejo em meus filhos e netos
a vida em seu recomeço!
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Fonte:
Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020.
Livro enviado pelo autor.

Emiliano Perneta (Sensações e bizarrias)


Não sou sectário de nenhum sistema filosófico. Não sigo Schopenhauer, nem sigo Augusto Comte. Sou às vezes mais pessimista que o primeiro, porque acrescento à sua frase: “A vida não merece ser vivida” a seguinte: “Não devíamos ter nascido”. Sou mais otimista que o segundo, porque há dias em que rio tão feliz e satisfeito, tão alegre e vibrante, que parece que o universo inteiro ri comigo. Glória, áurea vaidade, que se desfaz no túmulo, no nirvana!

É um engano dizer-se que o artista ambiciona a glória. A glória consiste neste contentamento íntimo, duradouro e eterno, que o artista traz dentro de si, de poder criar obras-primas e executá-las.

Eu devia ter entrado para a Academia aos 13 anos de idade, porque só nessa idade eu poderia suportar as tolices dos meus colegas, berrar nas eleições, entusiasmar-me na festa 11 de agosto.

Como um homem custa a descobrir uma coisa que estava em si mesmo há tempo! Ele proclamava a mortalidade, o desespero dos conhecimentos dos mistérios, e entretanto ele mentia, porque sempre no fundo da sua alma, não sei onde, ele conservava a esperança de que viria a saber destes mistérios, e só agora é que ele descobriu isso!

Dizei tudo quanto tendes de dizer enquanto é cedo, porque senão tempo virá em que tudo ouvireis, tudo quererei dizer e não o podereis.

Dá-se um fato, o imbecil sempre o compreende torto; não lho expliqueis, é pior, compreende de outro modo, mais estupidamente ainda. Como um homem de espírito se torna fútil no meio de imbecis!

Evolução! Isto não passa de uma cruz que a imbecilidade põe aos ombros dos homens de talento e que estes conduzem pela via infinita e dolorosa do Progresso. Eu não sei fazer inveja aos outros porque não a sinto. Ou por outra: sinto-a de um modo tão esquisito, com tanta nobreza, que a raros poderia fazer experimentar o mesmo sentimento.

Quando ouço um imbecil dizer uma barbaridade, que é o que sempre ele diz, a respeito da poesia ou qualquer outra coisa sagrada, eu tenho vontade de protestar. Mas se avanço a primeira frase, paro logo desanimado, com uma preguiça mortal de remover aquela estupidez mais pesada que uma montanha.

Olho para o céu. Está escuro e odiento. Nestas ocasiões, sinto uma irritação nervosa contra a fatalidade que me condenou a viver sob esta abóbada — de camadas gasosas e de mistérios — a mesma irritação que sentiria se visse-me preso num subterrâneo.

O único modo de ser-se amigo dos homens e principalmente de seu dono — é ser-se baixo, adulador, paciente, humilde e serviçal como um cão. É por isso que o cão é o emblema da amizade.

Religião! Tirai-me este peso dos ombros. Eu, às vezes, sinto em mim todo o cansaço da humanidade sob esse fardo eterno.

Fonte:
Luís Bueno (org). O tempo visto daqui : 85 cronistas paranaenses. Curitiba, PR: Secretaria de Estado da Cultura, 2018.

domingo, 6 de fevereiro de 2022

Versejando 100

 

Eduardo Affonso (Na Pressão…)

Não tenho medo de solidão.

Não tenho medo de cair no banheiro, bater a cabeça no tento de mármore do box e só me encontrarem quando eu já tiver escorrido pelo ralo e não restar nem o esqueleto, porque os cachorros terão levado os ossos para a sala e tudo que restará de mim será um fêmur meio roído, na boca do Tião.

Não.

Eu tenho medo é de panela de pressão.

A panela de pressão é uma esfinge. Uma bomba-relógio. Um campo minado.

Meu pai, homem intimorato, daqueles de andar com duas armas – uma na canela, outra embaixo do sovaco – só foi derrotado pelo câncer e pela panela de pressão (não nessa ordem, obviamente).

Ele entrava na cozinha apenas para perguntar por que é que o almoço ainda não estava pronto. Ele almoçava às 11 horas em ponto, para poder estar no Fórum pontualmente ao meio-dia. Por volta de 10h45, começava o inferno astral da minha mãe:

– Conceição, já são quase 11 horas. Cadê o almoço, Conceição?

Minha mãe suspirava resignada, e cozinhava, de modo que às 10h59 a primeira travessa chegasse à mesa, onde meu pai já a esperava, de garfo e faca na mão.

Um dia – morávamos em Visconde do Rio Branco – meu pai extrapolou sua jurisdição.

Invadiu a cozinha e resolveu pular os intermediários e pressionar diretamente a panela de pressão.

A panela, claro, não tinha a paciência infinita da minha mãe.

Seguiu-se uma explosão. Quando cheguei em casa não entendi o que havia acontecido, ou de onde surgira aquele teto cravejado de feijão.

Ninguém se feriu, e, tirando o feijão e o teto, salvaram-se todos. Meu pai deve ter entendido que ninguém está acima das leis da física. Que tudo neste mundo tem seu tempo, cada coisa tem sua ocasião.

O feijão com arroz, aquele dia, foi só arroz, quebrando – ao que eu saiba, pela primeira e única vez – uma milenar tradição.   Minha mãe saboreou, grão por grão, essa vitória, obtida por interposta panela.

Fim do flexibeque.

Um lar só é um lar quando tem tapetinho na porta e panela de pressão. O tapetinho eu não tenho, mas comprei a panela, há alguns anos. Trouxe-a para casa como quem abre os portões para um cavalo de Tróia, sabendo o que ele guarda na barriga.

Usei-a poucas vezes, durante as faringites – quando uma sopa descia bem melhor que um sanduíche. Mas sempre o fiz com respeito, quase com reverência.

Levanto a válvula com a ponta dos dedos e espero que a panela desabafe, se acalme, sinta que está entre amigos. Depois, dou-lhe uma ducha de água fria, para aquietar-lhe os ânimos. Ela ainda resmunga um pouco, solta algum vapor pelas ventas, e só quando parece pacificada é que dou um passo para trás e destravo a tampa.

Tem funcionado.

Hoje, vencendo um trauma de décadas, cozinhei feijão. Escapamos incólumes: eu, a panela, o teto, o fogão.

Mais algumas experiências bem sucedidas com essa criatura explosiva e já me sentirei capaz de arriscar alguma coisa com uma mulher de Escorpião.

Manuel Du Bocage (Sonetos) V

“ÂNSIAS TERRÍVEIS, ÍNTIMOS TORMENTOS”


Ânsias terríveis, íntimos tormentos,
Negras imagens, hórridas lembranças,
Amargosas, mortais desconfianças,
Deixai-me sossegar alguns momentos.

Sofrei que logre os vãos contentamentos
Que sonham minhas doidas esperanças;
A posse de alvo rosto, e loiras tranças,
Onde presos estão meus pensamentos.

Deixai-me confiar na formosura,
Cruéis ! Deixai-me crer num doce engano,
Blasonar de fantástica ventura.

Que mais mal me quereis, que maior dano
Do que vagar nas trevas da loucura,
Aborrecendo a luz do desengano ?
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“CANTA AO SOM DOS GRILHÕES O PRISIONEIRO”

Canta ao som dos grilhões o prisioneiro,
Ao som da tempestade o nauta ousado,
Um, porque espera o fim do cativeiro,
Outro, antevendo o porto desejado;

Exposta a vida ao tigre mosqueado
Gira sertões o sôfrego mineiro,
Da esperança dos lucros encantado,
Que anima o peito vil, e interesseiro;

Por entre armadas hostes destemido
Rompe o sequaz do horrífico Mavorte,
Co’ triunfo, co’a glória no sentido:

Só eu (tirano Amor! tirana Sorte!)
Só eu por Nise ingrata aborrecido
Para ter fim meu pranto espero a morte.
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“FIEI-ME NOS SORRISOS DE VENTURA”

Fiei-me nos sorrisos de ventura
Em mimos femininos, como fui louco!
Vi raiar o prazer, porém tão pouco
Momentâneo relâmpago não dura.

No meio agora desta selva escura,
Dentro deste penedo úmido e ouço,
Pareço, até no tom lúgubre, e rouco
Triste sombra a carpir na sepultura:

Que estância para mim tão própria é esta!
Causais-me um doce, e fúnebre transporte,
Áridos matos, lobrega floresta!

Ah! Não me roubou tudo a negra sorte;
Inda tenho este abrigo, inda me resta
O pranto, a queixa, a solidão e a morte.
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“OLHA , MARÍLIA, AS FLAUTAS DOS PASTORES”

Olha , Marília, as flautas dos pastores,
Que bom que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-te! Olha não sentes
Os Zéfiros brincar por entre as flores?

Vê como ali, beijando-se os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores!

Naquele arbusto o rouxinol suspira,
Ora nas folhas a abelhinha para,
Ora nos ares sussurrando gira:

Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu te não vira,
Mais tristeza que a morte me causara.
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“OH TREVAS, QUE ENLUTAIS A NATUREZA”

Oh trevas, que enlutais a Natureza,
Longos ciprestes desta selva anosa,
Mochos de voz sinistra, e lamentosa,
Que dissolveis dos fados a incerteza.

Manes, surgidos da morada acesa
Onde de horror sem fim Plutão se goza,
Não aterreis esta alma dolorosa,
Que é mais triste que vós minha tristeza;

Perdi o galardão da fé mais pura,
Esperanças frustrei do amor mais terno,
A posse de celeste formosura.

Volvei pois, sombras vãs, ao fogo eterno,
E lamentando a minha desventura,
Movereis a piedade o mesmo inferno.
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“TRISTE QUEM AMA, CEGO QUEM SE FIA”

Triste quem ama, cego quem se fia
Da feminina voz na vã promessa!
Aspira a vê-la estável! Mais depressa
O facho apagará, que espalha o dia.

Alada exalação, que na sombria
Tácita noite os ares atravessa,
Foi comigo a paixão volúvel dessa
Que o peito me afagava, e me feria.

Do desengano o bálsamo lhe aplico,
E a teus laços, Amor, sem medo exponho
Dos benéficos céus o dom mais rico.

Vejo mil Circes plácido, risonho;
E se fé me prometerem, ouço e fico
Como quem despertou de aéreo sonho.

Fonte:
BOCAGE, Manuel Maria Barbosa Du. Soneto e outros poemas. SP: FTD, 1994. Disponível na Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro

Irmãos Grimm (A mochila, o chapeuzinho e a corneta)


Era uma vez três irmãos que foram ficando cada vez mais pobres. Até que chegaram ao ponto de passar fome.

- Isto não pode continuar assim! - disseram eles, afinal.

- É melhor irmos pelo mundo afora tentar a sorte.

Puseram-se, então, a caminho. Andaram muito e pisaram muito chão, sem que se apresentasse a sorte. Assim chegaram um dia, a uma floresta muito grande, em meio da qual se elevava uma montanha. Ao se aproximarem, viram que toda ela era de prata. Disse, então, o mais velho:

- Encontrei a sorte que desejava e não quero outra maior.

- Recolheu toda a prata que podia carregar e voltou para casa.

Os outros dois, porém, disseram:

- Exigimos que a sorte nos dê algo mais que prata.

E, sem tocar no metal, seguiram adiante.

Depois de andar durante mais dois dias, chegaram a uma montanha que era de puro ouro. O segundo irmão ficou a pensar, indeciso: "Que devo fazer? Levar o ouro de que preciso para o resto de minha vida, ou seguir adiante?

Afinal resolveu-se. Encheu os bolsos e, despedindo-se do irmão, voltou para casa.

O terceiro ficou a pensar: "O ouro e a prata não me dizem grande coisa e continuarei procurando a sorte. Talvez ela me reserve coisa melhor."
    
Continuou caminhando e, três dias depois, chegou a uma floresta maior ainda que as outras; esta agora não terminava nunca e, como não achava nada para comer nem beber, esteve a ponto de morrer de fome. Trepou, então, numa árvore bem alta para ver se descobria o limite daquela floresta mas não conseguiu enxergar outra coisa senão as copas das árvores que se estendiam infindáveis.

Dispôs-se a descer e disse a si mesmo: "Se pudesse, ao menos, encher o estômago mais uma vez.”

E eis que, ao tocar o chão, viu, com assombro, debaixo da árvore, uma mesa magnificamente posta, coberta de abundantes pratos de  que se desprendia um aroma apetitoso.

"Desta vez - pensou - meus desejos se cumpriram no momento oportuno." E, sem pensar em quem poderia ter trazido aquele banquete, acercou-se da mesa e comeu até fartar-se.

Quando terminou, teve uma ideia. "Seria uma pena que esta linda toalhinha se estragasse aqui no bosque", e, dobrando-a com cuidado, guardou-a. Depois prosseguiu sua jornada e, à noite, quando tornou a sentir fome, quis por a toalha à prova. Estendeu-a e disse:

- Quisera que voltasse a cobrir-te de boa comida!

Mal expressou esse desejo, a toalha se cobriu de pratos, cheios de saborosíssimas iguarias.

- Sei agora, - disse ele - onde cozinham para mim. Isso é melhor do que a montanha de ouro e a de prata.

Mas não satisfez com a toalhinha mágica; achou que ela não bastava para retirar-se e viver tranquilamente em sua casa e continuou a jornada em busca da sorte.

Certa noite encontrou, num bosque solitário, um carvoeiro coberto de fuligem. Estava fazendo carvão e tinha ao fogo umas batatas que lhe  deviam servir de janta.

- Boa noite, melro negro! - disse, saudando-o.- Como vives nesta solidão?

– Todos os dias, para mim, são iguais. - respondeu o carvoeiro. - De noite, sempre há batatas para  a janta. Se te apetece, te convido.

   - Muito obrigado! - disse o viajante. - Não quero privar-te de tua refeição, pois não esperavas convidados. Mas, se contentas com o que tenho, sou eu que convido.

- E quem irá trazer-te a comida? Vejo que nada carregas contigo e, em duas horas de caminho, não há quem possa dar-te alguma coisa.

- Mesmo assim teremos uma ceia - respondeu o outro- tão boa como jamais tiveste igual.

E, tirando a toalhinha da mochila, estendeu-a no chão e disse:

- Toalhinha, cobre-te!

No mesmo instante apareceram cozidos e assados, tudo quente como recém-saído da cozinha. O carvoeiro arregalou os olhos, mas não se fez de rogado. Serviu-se, metendo bocados cada vez maiores na boca tisnada. Depois de jantarem, o carvoeiro falou, satisfeito.

- Escuta aqui, gostei da tua toalhinha; seria de grande utilidade para mim aqui na floresta, onde ninguém cozinha algo apetitoso. Proponho-te uma troca! Ali, naquele canto, está pendurada uma mochila de soldado. É, na verdade, velha e de feia aparência, mas possui qualidades prodigiosas. Como não mais preciso dela, poderia trocá-la pela tua toalhinha.

- Primeiro quero saber que qualidades prodigiosas são essas de que falas - retrucou o rapaz.

- Vou  dizer-te. - explicou o carvoeiro. - Sempre que bateres nela com a mão, verás surgir à tua frente um cabo e seis soldados, armados até os dentes, que farão tudo o que ordenares.

- Está bem! Já que não tens outra coisa, aceito a troca! - disse o outro.

Deu a toalha ao carvoeiro e, pondo a mochila ao ombro, despediu-se.

Depois de haver andado um pouco, resolveu experimentar as qualidades mágicas da sua mochila e deu-lhe uma batida. No mesmo instante apareceram os sete guerreiros. O cabo perguntou-lhe:

- Que ordena meu amo e senhor?

- Marchem, a toda pressa, de volta ao carvoeiro e exijam que lhes entregue minha toalhinha mágica.

Os soldados deram meia volta e pouco depois estavam de regresso com a toalha que haviam tirado do carvoeiro. O rapaz, então, mandou que se retirassem e prosseguiu caminho, confiando em que a sorte ainda se mostraria mais propícia.

Ao por-do-sol, encontrou outro carvoeiro que estava também, preparando sua refeição.

- Quer jantar comigo? - convidou o homem tisnado. - Batatas com sal, mas sem gordura. Se aceitas, senta-te a meu lado!

- Não! - retrucou o rapaz. - Quero que sejas tu o meu convidado.
   
E tirou a toalha que, depois de estendida, ficou logo cheia com os mais deliciosos manjares. Alegres da vida, comeram e beberam juntos. Quando terminaram a refeição, o carvoeiro disse:

- Sobre aquele banco, ali, está um chapeuzinho velho e sovado, mas que possui propriedades espantosas. Quando alguém o põe e lhe dá uma volta na cabeça, aparecem doze canhões, em fileira, que começam a disparar derrubando o que há por diante, sem ninguém possa resistir a seus efeitos. A mim, de nada serve e bem o trocaria pela tua toalha.

- Não é mau. - respondeu o rapaz e, apanhando o chapéu, colocando-o na cabeça, entregando, ao mesmo tempo, a toalhinha.

Mal, porém, andara um trecho do caminho, bateu na mochila e ordenou aos soldados que lhe trouxessem, novamente , a toalhinha. "Uma coisa traz outra, - pensou - e parece que minha boa sorte ainda continua.”

Seus pensamentos não o haviam enganado. Ao fim de uma hora, encontrou mais outro carvoeiro que, como os anteriores, o convidou a comer suas batatas sem gordura. Ele lhe ofereceu, também, uma janta extraordinária à custa da toalha mágica, e o carvoeiro ficou tão entusiasmado que propôs trocá-la por uma cornetinha dotada de qualidades ainda superiores às do chapeuzinho: quando a tocavam, todas as muralhas e baluartes caíam por terra, reduzindo cidades a montes de escombros. O jovem aceitou a troca mas, pouco depois, ordenou a seus soldados trazerem de volta a toalha, com o que ficou de posse da mochila, do chapeuzinho e da cornetinha.

"Agora, – disse para si mesmo - sou um homem feito e é tempo de voltar para casa a ver como estão passando meus irmãos.”

Ao chegar à cidade onde moravam, viu que seus irmãos haviam construído uma bela casa e se entregavam à boa vida com o ouro e a prata que tinham encontrado. Apresentou-se a eles, mas , de vestes rasgadas, chapeuzinho roto e a velha mochila, os outros dois se negaram a reconhecê-lo como irmão. Riram-se dele, dizendo:

- Pretendes te fazer passar pelo nosso irmão que desprezou o ouro e a prata porque desejava coisa melhor? Não há dúvida que voltará com grande magnificência; numa carruagem, como verdadeiro rei, e não feito um mendigo!

E assim correram com ele de casa. Indignado, o rapaz pôs-se a bater na mochila até que cento e cinquenta homens se apresentaram, perfilados, diante dele. Ordenou que cercassem a casa de seus irmãos e deu ordens a dois soldados para apanharem varas de marmelo e com elas surrarem os dois insolentes até que estes reconhecessem quem ele era.

Tudo aquilo provocou uma enorme balbúrdia. Os habitantes do povoado correram a prestar socorro aos dois agredidos , mas nada puderam fazer  contra os soldados do jovem.

O caso  chegou, finalmente, aos ouvidos do rei, ao qual zangado, enviou um capitão à frente de sua companhia, com ordem de expulsar da cidade aquele desordeiro. Mas o homem da mochila reuniu, num instante, uma tropa mais numerosa ainda, e rechaçou o capitão com todos os seus homens, obrigando-os a retirar-se com os narizes ensanguentados.

Mesmo assim, disse o rei:

- Ainda poderemos liquidar com esse aventureiro.

E, no dia seguinte, enviou contra ele um grupo maior, mas sem obter melhor resultado do que na véspera. O adversário lhe opôs mais gente e, para terminar mais depressa, deu umas voltas no seu chapeuzinho. Imediatamente a artilharia entrou em ação, derrotando os homens do rei  pondo-os em fuga.

- Agora não darei a paz, - pensou o jovem - até que o rei me dê sua filha em casamento e eu fique governando o país em seu nome.

Mandou comunicar sua decisão ao rei e este disse à sua filha:

- A necessidade obriga. Que remédio me resta senão ceder ao que ele exige? Se quero obter a paz e conservar a coroa em minha cabeça, devo entrega-te.

Celebrou-se, pois o casamento, mas a princesa sentia-se aborrecida pelo fato de ser o marido um homem vulgar que andava sempre com um chapéu roto à cabeça e uma velha mochila aos ombros. Com muito gosto ter-se-ia desfeito dele. Dia e noite ficava a cismar como satisfaria seu desejo.

Pensava ela: "Estarão na mochila suas forças mágicas?" E começou a tratá-lo com fingido carinho.

Quando o coração do marido se abrandou, ela lhe disse:

- Se ao menos tirasses essa velha mochila... Ela não te fica bem e faz com que me envergonhes de ti.

- Minha querida, - respondeu-lhe o marido - esta mochila é meu maior tesouro. Enquanto eu a possuir, não temo nenhum poder do mundo!

E revelou à mulher os poderes mágicos da mochila.

Ela, então, enlaçou o marido como para beijá-lo, mas, com rápido movimento, tirou-lhe a mochila dos ombros e escapou-se. Depois, sozinha, pôs-se a bater-lhe e ordenou aos soldados que detivessem o seu antigo senhor e o expulsassem do palácio. Os homens obedeceram e a ingrata esposa enviou, ainda, outros mais, com ordem de fazê-lo sair do país. O rapaz estaria perdido se  não tivesse o chapeuzinho. Assim que pode libertar as mãos, deu-lhe um par de voltas e, no mesmo instante, a artilharia começou a entrar em ação, destruindo tudo. A princesa não teve outro remédio senão apresentar-se, pedindo misericórdia.

E como pediu com tanto carinho prometendo corrigir-se, o marido concedeu-lhe a paz. E ela fingiu tão bem que ele se convenceu de que era profundamente amado. E um dia acabou confessando à mulher que, caso alguém se apoderasse de sua mochila, nada poderia contra ele enquanto não lhe tirasse, também, o chapeuzinho.

E aí então, de posse de seu segredo, ela aguardou que o marido adormecesse e arrebatou-lhe o chapeuzinho. E por mais uma vez, ordenou que o expulsassem.  

Mas ao pobre rapaz ainda restava a cornetinha, num acesso de cólera, se pôs a tocá-la com toda as suas forças. Imediatamente começaram a ruir por terra, muralhas, fortificações, cidades e vilas, acabando com o rei e sua filha. E caso não houvesse parado depois de tocar um pouquinho, tudo se transformaria num montão de ruínas, sem ficar pedra sobre pedra.

Ninguém mais se atreveu a lhe oferecer resistência, tornando-se ele o soberano de todo o país

Fonte:
Irmãos Grimm. Contos. vol.1. Publicados em 1812.

Isabel Furini (O Chapéu na literatura)

“Pode ser até que nem mesmo o chapéu seja complemento do homem, mas o homem do chapéu.”
  Do conto: Capítulos do chapéu de Machado de Assis

Falar de chapéus é falar de um acessório que, além de proteger a cabeça do Sol e do vento, pode aumentar o glamour das pessoas. Em literatura elementos como bolsas, relógios, luvas, bengalas, chapéus e outros, podem servir para destacar a singularidade de algum personagem.

Em alguns locais do mundo as festas de casamento exigem que as mulheres escolham elegantes chapéus. O chapéu é muito usado nas históricas cidades da Europa, como Londres, por exemplo, onde as nobres cabeças são muitas vezes ornadas com belos chapéus - como símbolo de elegância.

Um chapéu tem que ser adequado para o tipo de rosto, para potencializar o charme... e até a altura. Sim, segundo alguns autores essa era a função do chapéu de Napoleão: torna-lo mais alto aos olhos dos outros.

Na literatura o chapéu também fez sua aparição em grandes livros. Por exemplo, quem não lembra de Sherlock Holmes, o famoso detetive inglês e seu chapéu. Miss Marple, a idosa também detetive, usava um chapéu surrado.

Talvez como disse Machado de Assis no conto citado (Capítulos do chapéu): “O princípio metafísico é este: — o chapéu é a integração do homem, um prolongamento da cabeça, um complemento decretado a eterno; ninguém o pode trocar sem mutilação.”
 
E qual é essa força que o chapéu empresta ao ser humano? É força da escolha, de se distinguir, singularizar. Um homem de chapéu destaca-se na multidão.
 
Também em livros infantis aparecem personagens usando chapéus. O chapeleiro louco do livro Alice no País das Maravilhas usa uma cartola muito especial, com um pano amarrado e uma carta. Também podemos lembrar de Chapeuzinho Vermelho. E as bruxas? Elas quase sempre estão representadas com um chapéu preto pontudo. Já os gnomos são representados com um gorro colorido. O imaginário representa Papai Noel, também com um gorro.

Dick Tracy, Indiana Jones e Freddy Krugger (personagem de A Hora do Pesadelo) são caracterizados usando chapéu.

A belíssima Brett Ashley, na obra O Sol Também se Levanta, de Ernest Hemingway, usava um chapéu masculino sem perder a feminilidade. Ao contrário, com esse ornamento a sua beleza e sensualidade pareciam aumentar.

Em O Lustre de Clarice Lispector, um chapéu é citado no início da história. No final Virginia, a protagonista, morrerá e será reconhecida por aquele chapéu marrom. O chapéu adquire um simbolismo especial. É como um personagem do livro.
 
O romance de Menalton Braff, Moça com Chapéu de Palha (2009), também traz a imagem de uma mulher usando um chapéu. Em A Insustentável leveza do ser, de Milan Kundera, lemos: “Por isso, quando Sabina colocou diante dele o chapéu-coco na cabeça...”

Bill McGovern, o personagem de Stephen King também usava chapéu. Lemos: “O chapéu marrom surrado que estava usando lhe dava um ar elegante, como o de um repórter de filme policial dos anos quarenta.” (...)

Os Três Mosqueteiros de Alexandre Dumas usavam chapéus de abas largas com uma pluma decorativa.

Em Don Quixote de la Mancha lemos: “Como no caminho lhe começou a chover, receoso ele de que lhe estragasse o chapéu, que naturalmente seria novo, pôs-lhe por cima a bacia.”
 
Um fato interessante é que na cidade de Oviedo (Astúrias) Espanha, existe um concurso e literatura chamado Cuentos e Sombreros (Contos e Chapéus), promovido pela chapelaria Albiñana.

O chapéu, como acessório dos personagens e como elemento que pode revelar um forte simbolismo, já conquistou o seu espaço na cabeça de alguns protagonistas e de seus autores.

Grande ou pequeno, masculino ou feminino, elegante ou bizarro, o chapéu pode ser encontrado não só nas vitrines das chapelarias, mas também na literatura.