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terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Ialmar Pio Schneider (Soneto-Oração)


Aos familiares dos entes queridos falecidos na tragédia de Santa Maria - RS - 29.01.2013 - . - 

Transcorrem dias tristes, enlutados, 
e as pessoas se voltam à oração; 
que Deus conforte os pais desesperados, 
porque só n´Ele existe a salvação. 

Nós somos seres, filhos bem-amados
do Pai Maior que paira na amplidão, 
por Quem sempre seremos resgatados
e a retornarmos à ideal mansão. 

É difícil viver, tenhamos fé, 
embora atravessemos maus momentos
em que podemos vacilar até... 

Possamos enfrentar os sofrimentos
nesta terrena vida, de viagem, 
pois estamos aqui só de passagem...

Fontes:
O Autor
Charge de Carlos Latuff obtida no Blog do Tarso

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Ialmar Pio Schneider (Sonetos)



VENTO DO MAR 

 Vento que sopras furibundo 
 e vens meus sonhos despertar, 
 as tristezas de todo o mundo 
 parece que trazes do mar... 

 Ouvindo o lamento profundo 
 sempre constante a marulhar, 
 quedo-me triste, me confundo 
 co’a voz misteriosa do mar... 

 Altas horas, cada segundo 
 teimas o meu corpo abraçar, 
 quando em reflexões me aprofundo 
 para obter segredos do mar…

SONETO 

Comemora-se no Brasil, o Dia Nacional da Leitura (a partir de 2009 - Lei nº 11.899). 

A distração do espírito é a leitura 
e os grandes mestres nos ensinam tal; 
nas obras-primas, vasto cabedal 
a mente encanta e o pensamento apura... 

A existência tem fases de amargura, 
pois há um confronto assaz fenomenal: 
de um lado luta o bem e de outro o mal 
e o que vence por fim é o que perdura. 

Escrevam, romancistas, seus romances ! 
Cantem, poetas, salutar poesia ! 
Porquanto houver na vida tantos transes, 

não vão morrer as páginas aflitas 
e nem há de ficar a imagem fria 
das criações pra todo sempre escritas.

DIA DA CRIANÇA

Julgavas que este amor não encontrasse 
pedras e espinhos pela estrada afora, 
mas são os sofrimentos e a demora 
o que fazem eterno o que é fugace. 

Repara-me nos olhos e na face 
para ver quanta mágoa me devora, 
por não ter alma cândida e sonora 
a fim de ser o que teu sonho amasse. 

Deixemos de torturas e cansaços, 
reclina-te serena nos meus braços, 
confia em mim na maior esperança... 

Faz de conta que nada mais existe, 
então verás alguém que foi tão triste 
convertido na mais alegre criança…

SONETO   ÍNTIMO

 Enfrenta teu destino sem alarde; 
 que ninguém saiba o que te vai na mente... 
 Não te lastimes, murmurando: “É tarde !” 
 Esquece o teu passado, indiferente... 

 Também não fujas, como vil covarde, 
 à luta que te espera, e simplesmente 
 pede ao Senhor que te proteja e guarde 
 em Sua bondade infinda, onipotente. 

 Encontrarás, enfim, sabedoria 
 para atingir a meta projetada, 
 sem falso orgulho, mágoa ou rebeldia; 

 porque tua fé com força redobrada 
 renascerá com flores de alegria, 
 enfeitando pra sempre tua estrada.

CATULLO DA PAIXÃO CEARENSE 
Soneto em homenagem póstuma – In Memoriam 

Faz-me lembrar o tempo de menino, 
no lar paterno, lá na velha aldeia, 
com minha mãe, irmãos e irmãs, na ceia, 
de noitezinha, ao bimbalhar do sino... 

Depois, eu contemplava a lua cheia 
e perguntava aos céus: qual meu destino, 
neste mundo que roda e cambaleia, 
com momentos de luz e desatino?!... 

E ouvia a minha voz na voz do vento, 
dizendo que eu tivesse paciência, 
estudasse, aprendesse e na paixão 

de adquirir maior conhecimento, 
ingressasse no reino da sapiência... 
Que lindo era o Luar do meu Sertão !…

Fonte:
O Autor

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Mário Quintana (A Voz)


Ialmar Pio Schneider (Soneto Aflito)


Quisera aqui deixar escrito de passagem
aquele enlevo que nos uniu num momento;
depois tomaste um rumo e seguiste viagem
como quem parte, assim levada pelo vento...

Hoje procuro ouvir na tênue voz da aragem
um suspiro talvez; ou quem sabe um lamento
emitido por ti, tal qual uma mensagem
que me permita, enfim, lograr o meu intento...

Mas vão-se as estações: inverno, primavera,
verão e outono; e ainda estou sozinho e triste,
na aflição infernal de quem sofrendo espera...

Se ouvires, por acaso, um pássaro canoro
entoar uma canção que tu jamais ouviste,
recorda-te que ao te lembrar ainda imploro !

Fonte:
O Autor

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Mário Quintana (A Coisa)


Antonio Brás Constante (Zero a Esquerda ou Fora de Série?)


“Ninguém cometeu maior erro, do que aquele que errou ao fazer tudo errado”.
Antonio Brás Constante

Números. Números. Números. Não passamos de um conjunto numérico, perdido em uma equação qualquer. Uma equação ainda não totalmente resolvida, conhecida como vida. O ser humano na sua essência é feito de números. Somos compostos orgânicos com bilhões de células disto, sei lá mais quantos bilhões de outras células formando aquilo, etc.

Os números determinam padrões na sociedade. Somos classificados por um número variável chamado: “idade”, e nos dizem que devemos agir conforme esta idade. Ou seja, em alguns casos somos muito velhos, em outros nos acham muito novos e ainda em outros temos a idade certa, mesmo que seja para algo que naquele momento não nos interessa.

Apesar de não nos darmos conta, nós somos geralmente atraídos pelos números que compõe as outras pessoas. Por exemplo, na busca por relacionamentos amorosos, muitos procuram saber sobre a altura, peso, quadril, busto, idade e até conta bancária de seus pretendentes.

Ainda na parte dos relacionamentos, podemos imaginar a seguinte situação: você sai para passear com sua amada. Resolve levá-la a um lugar especial, onde possam namorar, trocando beijos e carícias. Então você, aproveitando aquele momento lindo, totalmente enlouquecido de amor, dá uma, duas, três, até quatro idéias de como o futuro seria maravilhoso se vocês ficassem juntos para sempre. É a matemática do amor, agindo nos pensamentos do enamorados.

Também no trabalho somos um mero número, conhecidos no sistema como o funcionário de matricula tal, que tem o RG tal e o CPF etecétera e tal. Em qualquer novo plano diretor, onde haja necessidade de cortes para maximizar custos, o fator humano é logo substituído por algum índice matemático, e de um instante para outro passamos de nove para seis, ou seja, nossa vida vira de cabeça para baixo.

A própria empresa é um emaranhado de números, que aparentemente parece ser feita de tijolos e movida através de carne e sangue, mas que no fim de cada semestre passa a ser um relatório contábil repleto de números e indicações positivas ou negativas, traçando geralmente perfis pouco amistosos sobre ações futuras.

Um assunto como este pode até causar insônia, algo que tentamos amenizar contando carneirinhos lanosos, que para desespero de qualquer fazendeiro, conseguem pular cercas com extrema facilidade. Em outros casos apenas contamos com algum tipo de calmante. Então percebemos que nossa saúde também é vista através de números, que medem pressão, batimentos cardíacos, taxa de glicose, entre outros tantos pontos que flutuam em nossos exames. Se notarmos, a própria política começa com a escolha de números, onde muitos se elegem apenas para fazer número e, principalmente, desviar números.

Sua classe social, sua localização em sua rua ou mesmo no universo (latitude e longitude), ou o máximo de caracteres que devo digitar neste texto, tudo é formado por números. Podemos dizer que Deus é um número. Talvez o número mais básico que exista e por isso tão complexo. Algo similar ao computador, que é capaz de efetuar maravilhas, feitas a partir da combinação de dois únicos dígitos (0s e 1s) que formam o código binário.

Enfim, na matemática da vida, não devemos ser apenas mais um número. Devemos somar esforços, dividir os problemas na busca de soluções, subtrair pensamentos negativos, e elevar a enésima potência às energias e ações positivas, passando a ser multiplicadores de algo melhor, deixando de ser um zero a esquerda para nos tornamos pessoas fora de série.

Fonte:
www.recantodasletras.com.br/autores/abrasc

Casa do Poeta de Canoas (Sarau de Aniversário)


A Casa do Poeta de Canoas realizará 

Sarau de Aniversário 

28/09/2012, Sexta-feira, às 19 horas 

no Conjunto Comercial Canoas

Rua 15 de Janeiro, 481 - Centro / Canoas

Gostariamos de contar com o prestígio da presença de todos nosso associados, 
parceiros, amigos e simpatizantes para abrilhantar este evento que comemora os 
10 anos de existência de nossa entidade.. 

Maria Luci Cardoso Leite
Presidente da Casa do Poeta de Canoas

PROGRAMAÇÃO DAS ATIVIDADES ALUSIVAS AOS 10 ANOS DA CASA DO POETA DE CANOAS

Dia 26 de setembro (quarta-feira)

Participação no XX Congresso de Poesia na cidade de Bento Gonçalves , com apresentação do Grupo de Teatro da Casa do Poeta com a peça TRAVESSIA.

Dia 28 de setembro (Sexta-feira)

19h - Sarau de Aniversário no Conjunto Comercial de Canoas.

Dia 2 de outubro (Terça-feira)

18h30min - Abertura Oficial de Exposição de fotos dos 10 anos de atividades da Casa do Poeta na Biblioteca Publica João Palma da Silva.

19h - Projeto Confraria da Leitura - Auditório da Bibliotecas João Palma da Silva.

 Palestrante: Jornalista e escritor Canabarro Tróis Filho (Tonito), tendo também a presença do Irmão Henrique Justus.

Dia 5 de outubro (Sexta-feira)

19h - Tributo a Roberto Carlos, com Luis Lisboa e Norberto Prado.
 Antiga estação férrea - Av. Victor Barreto, 2301 - Centro - Canoas

Dia 6 de outubro (Sábado)

12h - Almoço Comemorativo aos 10 Anos de nossa entidade, com Sarau Poetico Musical e Lançamentos da Coletânea da UBE Nucleo Canoas , Coletânea Dasnieve Daspet e Amigos núcleo Canoas e o livro "Amor de Alma" da escritora Neida Rocha.

 Restaurante Italianíssimo - Coronel Vicente, 260 - Centro - Canoas.

Dia 9 de outubro (Terça-feira)

13h - Lançamento da 4ª Edição do Projeto Poesia no Ônibus.

Dia 9 a 11 de outubro

Participação com contação de história, oficinas literárias e Sarau na feira do livro da Escola Estadual Érico Veríssimo no bairro Igara

Dia 18 de outubro (Quinta-feira)

18h - Homenagem na Câmara de Vereadores pelos 10 anos de atividades da entidade.
 Câmara Municipal de Canoas - Rua Ipiranga, 123 3º andar - Centro

Dia 26 de outubro (Sexta-feira)

15h - Homenagem aos Ferroviários pela passagem do seu dia (31/10), com Exposição de objetos cedidos pelo Museu do Trem de São Leopoldo e exibição do curta metragem "Dormentes do Tempo", na versão original 30mm.
 Antiga estação férrea - Av. Victor Barreto, 2301 - Centro - Canoas

19h - Apresentação da peça A TRAVESSIA, pelo Grupo de Teatro da Casa do Poeta. Encerramento das atividades alusivas ao aniversário da Casa do Poeta de Canoas.
 Antiga estação férrea - Av. Victor Barreto, 2301 - Centro - Canoas

Fonte:
Casa do Poeta de Canoas

domingo, 23 de setembro de 2012

Mario Quintana I


Ialmar Pio Schneider (A Primavera...)


Primavera em Porto Alegre
Dentre as estações do ano, principalmente aqui no sul, onde são mais definidas, é a que traz amenidades, prenunciando o próximo verão de sol ou de chuva, mas também de águas salgadas e areia, aos que se dirigem às praias, tão convidativas nos meses de dezembro, janeiro, fevereiro e março. Nesse período, os que têm condições de fazê-lo, vão ao litoral, nem que seja por quinze dias, a fim de refazer-se um pouco da estafa adquirida no dia-a-dia. 

Outrossim, representa também a quadra da vida, quando se está na adolescência, tão decantada pelos poetas, tais como Casimiro de Abreu e Pe. Antônio Tomás que nos deixou o soneto inesquecível: 

“CONTRASTES”  

“Quando partimos, no verdor dos anos, 
da vida pela estrada florescente, 
as esperanças vão conosco à frente 
e vão ficando atrás os desenganos. 

Rindo e cantando, céleres e ufanos, 
vamos marchando descuidosamente... 
Eis que chega a velhice de repente, 
desfazendo ilusões, matando enganos. 

Então nós enxergamos claramente 
como a existência é rápida e falaz, 
e vemos que sucede exatamente 

o contrário dos tempos de rapaz: 
- os desenganos vão conosco à frente, 
e as esperanças vão ficando atrás.”

Isto me leva a meditar num passado recente, porque a vida é efêmera, e não faz muito navegava nessa fase, percorrida sem grandes lances aventureiros. 

Conservo ainda enraizados aqueles devaneios que me assaltavam o pensamento na juventude pacata e laboriosa. Sempre lutando por dias melhores, desde a infância, consegui algum progresso relativo, o que me leva a acreditar no estudo e no trabalho.

E muitas vezes me surpreendo ao deparar com acontecimentos já presenciados outrora, que pareciam sepultados na tumba do tempo, mas que surgem avivados qual uma brasa encoberta pelas cinzas. São as reminiscências que nos fazem, enfim, reviver alguns momentos mais representativos ao longo de nossa caminhada pelo mundo. Aos treze anos de idade, quando praticava datilografia, cujo ensino me era ministrado por uma freira, numa sala da escola em que concluía o curso primário, há mais de quarenta anos, havia um piano no qual algumas meninas aprendiam a tocar. De uma delas recordo bem; as outras me parecem névoas que se dissiparam. Embora minha paixão pela música, meu dever era a datilografia e não o piano. Hoje só me resta dizer: 

“Parece que foi ontem !” São os desígnios da existência...
____________________________
Poeta e cronista 
Publicado em 29 de setembro de 1999 - no Diário de Canoas.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Drummond, Vinicius, Bandeira, Quintana e Campos (Cinco em Um)

Da esquerda para a direita: Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, Manuel Bandeira,
Mário Quintana e Paulo Mendes Campos
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
PAPAI NOEL ÀS AVESSAS


Papai Noel entrou pela porta dos fundos
(no Brasil as chaminés não são praticáveis),
entrou cauteloso que nem marido depois da farra.
Tateando na escuridão torceu o comutador
e a eletricidade bateu nas coisas resignadas,
coisas que continuavam coisas no mistério do Natal.
Papai Noel explorou a cozinha com olhos espertos,
achou um queijo e comeu.

Depois tirou do bolso um cigarro que não quis acender.
Teve medo talvez de pegar fogo nas barbas postiças
(no Brasil os Papai-Noéis são todos de cara raspada)
e avançou pelo corredor branco de luar.
Aquele quarto é o das crianças
Papai entrou compenetrado.

Os meninos dormiam sonhando outros natais muito mais lindos
mas os sapatos deles estavam cheinhos de brinquedos
soldados mulheres elefantes navios
e um presidente de república de celulóide.

Papai Noel agachou-se e recolheu aquilo tudo
no interminável lenço vermelho de alcobaça.
Fez a trouxa e deu o nó, mas apertou tanto
que lá dentro mulheres elefantes soldados presidente brigavam por causa do aperto.

Os pequenos continuavam dormindo.
Longe um galo comunicou o nascimento de Cristo.
Papai Noel voltou de manso para a cozinha,
apagou a luz, saiu pela porta dos fundos.

Na horta, o luar de Natal abençoava os legumes.

-
VINICIUS DE MORAES
O HAVER


Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.

--MANUEL BANDEIRA
RONDÓ DOS CAVALINHOS


Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Tua beleza, Esmeralda,
Acabou me enlouquecendo.

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O sol tão claro lá fora
E em minhalma — anoitecendo!

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Alfonso Reys partindo,
E tanta gente ficando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
A Itália falando grosso,
A Europa se avacalhando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O Brasil politicando,
Nossa! A poesia morrendo...
O sol tão claro lá fora,
O sol tão claro, Esmeralda,
E em minhalma — anoitecendo!

Consta que o poema acima, feito durante a "II Grande Guerra", foi escrito enquanto o autor almoçava no Jóquei-Clube do Rio de Janeiro, assistindo às corridas.

--MÁRIO QUINTANA
O MAPA


Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...

(E nem que fosse o meu corpo!)

Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...

Ha tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Ha tanta moca bonita
Nas ruas que não andei
(E ha uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)

Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso

Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)

E talvez de meu repouso…

--PAULO MENDES CAMPOS
POEMA DIDÁTICO


Não vou sofrer mais sobre as armações metálicas do mundo
Como o fiz outrora, quando ainda me perturbava a rosa.
Minhas rugas são prantos da véspera, caminhos esquecidos,
Minha imaginação apodreceu sobre os lodos do Orco.
No alto, à vista de todos, onde sem equilíbrio precipitei-me,
Clown de meus próprios fantasmas, sonhei-me,
Morto do meu próprio pensamento, destruí-me,
Pausa repentina, vocação de mentira, dispersei-me,
Quem sofreria agora sobre as armações metálicas do mundo,
Como o fiz outrora, espreitando a grande cruz sombria
Que se deita sobre a cidade, olhando a ferrovia, a fábrica,
E do outro lado da tarde o mundo enigmático dos quintais.
Quem, como eu outrora, andaria cheio de uma vontade infeliz,
Vazio de naturalidade, entre as ruas poentas do subúrbio
E montes cujas vertentes descem infalíveis ao porto de mar ?

Meu instante agora é uma supressão de saudades. instante
Parado e opaco. Difícil se me vai tornando transpor este rio
Que me confundiu outrora. Já deixei de amar os desencontros.
Cansei-me de ser visão, agora sei que sou real em um mundo real.
Então, desprezando o outrora, impedi que a rosa me perturbasse.
E não olhei a ferrovia - mas o homem que sangrou na ferrovia -
E não olhei a fábrica - mas o homem que se consumiu na fábrica -
E não olhei mais a estrela - mas o rosto que refletiu o seu fulgor.
Quem agora estará absorto? Quem agora estará morto ?
O mundo, companheiro, decerto não é um desenho
De metafísicas magnificas (como imaginei outrora)
Mas um desencontro de frustrações em combate.
nele, como causa primeira, existe o corpo do homem
– cabeça, tronco, membros, as pirações e bem estar...

E só depois consolações, jogos e amarguras do espírito.
Não é um vago hálito de inefável ansiedade poética
Ou vaga adivinhação de poderes ocultos, rosa
Que se sustentasse sem haste, imaginada, como o fiz outrora.
O mundo nasceu das necessidades. O caos, ou o Senhor,
Não filtraria no escuro um homem inconsequente,
Que apenas palpitasse no sopro da imaginação. O homem
É um gesto que se faz ou não se faz. Seu absurdo -
Se podemos admiti-lo - não se redime em injustiça.
Doou-nos a terra um fruto. Força é reparti-lo
Entre os filhos da terra. Força - aos que o herdaram -
É fazer esse gesto, disputar esse fruto. Outrora,
Quando ainda sofria sobre as armações metálicas do mundo,
Acuado como um cão metafísico, eu gania para a eternidade,
sem compreender que, pelo simples teorema do egoísmo,
A vida enganou a vida, o homem enganou o homem.
Por isso, agora, organizei meu sofrimento ao sofrimento
De todos: se multipliquei a minha dor,
Também multipliquei a minha esperança.