segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

José de Alencar (Ao Correr da Pena I)


A primavera – Eclipse de uma estrela – Espetáculo de graça – As três graças dos gregos e as des-graças de um diletante – Importe de um espetáculo gratuito – o baile do Cassino – A valsa – Nova pomba da arca.

17 de setembro

Estamos na primavera, dizem os folhetins dos jornais, e a folhinha de Laemmert, que é autoridade nesta matéria. Não se pode por conseguinte admitir a menor dúvida a respeito. A poeira, o calor, as trovoadas, os casamentos e as moléstias, tudo anuncia que entramos na quadra feiticeira dos brincos e dos amores.

Que importa que o sol esteja de icterícia, que a Charton enrouqueça, que as noites sejam frias e úmidas, que todo o mundo ande de pigarro? Isto não quer dizer nada. Estamos na primavera. Os deputados, aves de arribação do tempo do inverno, bateram a linda plumagem; a Sibéria fechou-se por este ano, os buquês de baile vão tomando proporções gigantescas, as grinaldas das moças do tom são perfeitas jardineiras, a Casaloni recebe uma dúzia de ramalhetes por noite, e finalmente os anúncios de salsaparrilha de Sands e de Bristol começam a reproduzir-se com um crescendo animador.

Come, gentil spring! Vem, gentil quadra dos prazeres! Vem encher-nos os olhos de pó! Vem amarrotar-nos os colarinhos da camisa, e reduzir-nos à agradável condição de um vaso de filtrar água. Tu és a estação das flores, o mimo da natureza! Vem perfumar-nos com as exalações tépidas e fragrantes da Rua do Rosário, da Praia de Santa Luzia, e de todas as praias em geral!

Doce alívio dos velhos reumáticos, esperança consoladora dos médicos e dos boticários, sonho dourado dos proprietários das casinhas dos arrabaldes! Os sorveteiros, os vendedores de limonadas e ventarolas, os donos dos hotéis de Petrópolis, os banhos, os ônibus, as gôndolas e as barracas, te esperam com a ansiedade, e de suspirar por ti quase estão ficando tísicos (da bolsa).

Esta semana já começamos a sentir os salutares efeitos de tua benéfica influência! Vimos uma estrela do belo céu da Itália eclipsada por uma moeda de dois vinténs, e tivemos a agradável surpresa de ouvir o 1º ato do Trovatore e um epeech da polícia, tudo de graça.

Alguns mal intencionados pretendem que a noite não foi tão gratuita como se diz; mas deixai-os falar; eu, que lá estive, posso afiançar-vos que o espetáculo foi todo de graça, como ides ver.

A autoridade policial depois de participar que ficava suspensa a representação e que os bilhetes estavam garantidos, sendo por conseguinte aquela noite de graça, como esta notícia excitasse algum rumor, declarou formalmente, e com toda a razão, que se acomodassem, porque a polícia, quando tratava de cumprir o seu dever, não era para graças.

Os namorados que tiveram duas noites de namoro pelo custo de uma, os donos de cocheira que ganharam o aluguel por metade do serviço, o boleeiro que empolgou a sua gorjeta sem contar as estrelas até a madrugada, aqueles que lá não foram, não só riram-se de graça, como acharam nisto uma graça extraordinária.


Muito olhar suplicante vi eu nos últimos momentos, humilhando-se diante de um rostozinho orgulhoso e ofendido, clamar com toda a eloqüência do silêncio: grazia! grazia! É preciso advertir que o olhar estava no Teatro Provisório, e por isso não se deve admirar que falasse italiano; além de que, o olhar é poliglota e sabe todas as línguas melhor do que qualquer diplomata.

Finalmente, para completar a graça deste divertimento, as graças com os seus alvos vestidinhos brancos se reclinavam sobre a balaustrada dos camarotes, cheias de curiosidade, para verem o desfecho da comédia. E a este respeito lembra-me uma reflexão que fiz a tempos, e da qual não vos quero privar, porque é curiosa.

Os gregos, como gente prudente e cautelosa, inventaram unicamente três graças, e consta que viveram sempre muito bem com elas. Nós, de mal avisados que somos, queremos ter em todos os divertimentos, nos bailes, nos teatros e nos passeios uma porção delas, sem refletir que, logo que se ajuntarem muitas, podem formar necessariamente um grupo de dez graças.

Maldito calembur! Não vão já pensar que pretendo que as graças tenham sido a causa de tudo isto, nem também que todo aquele desapontamento fosse produzido por alguma graça da Charton. A primadona estava realmente doente, e, aqui para nós, suspeito muito os meus colegas folhetinistas de serem a causa daquela súbita indisposição com o formidável terceto de elogios que entoaram domingo passado. Lembrem-se que os elogios e os aplausos comovem extraordinariamente um artista. Ainda ontem vi como ficaram fora de si as tímidas coristas, unicamente porque lhe deram duas ou três palmas!

Em toda esta noite, porém, o que houve de mais interessante foi o fato que vou contar-vos. Um velho dilettante do meu conhecimento, ainda do tempo do magister dixit, e para quem a palavra da autoridade é um evangelho, teve a infeliz lembrança de justamente nesta noite encomendar um magnífico buquê para oferecer à Charton no fim da representação. Apenas se declarou o relâche par indisposition, o homem perdeu a cabeça, e, o que foi pior, com os apertos da saída perdeu igualmente a bengala, que lá deixou ficar com os ares de novo um chapéu comprado pela Páscoa.

No outro dia, o homem, que tinha seus hábitos antigos de comércio, viu-se em sérias dificuldades. Não podia deixar de acreditar, à vista da declaração da polícia, que o espetáculo da noite antecedente fora de graça; mas, ao mesmo tempo, tinha de dar saída no livro de despesas ao dinheiro que gastara com o aluguel do carro, com a gorjeta do boleeiro, com o par de luvas, com o buquê da Charton, o custo da bengala e o estrago do chapéu. Coçou a cabeça, tomou a sua pitada, e afinal escreveu o seguinte assento: Importe de um espetáculo gratuito no Teatro Provisório – 26$000!

O meu dilettanti ainda não sabia que a palavra grátis é um anacronismo no século XIX, e, quando se fala em qualquer coisa de graça, é apenas uma graça, que muitas vezes torna-se bem pesada, como lhe sucedeu. Provavelmente, depois deste dia, o velho lhe aditou ao seu testamento um codicilo proibindo terminantemente ao seu herdeiro os espetáculos gratuitos.

Assim a crônica futura desta heróica cidade consignará nas suas páginas que, pelo começo da primavera do ano de 1854, tivemos um divertimento de graça. Os nossos bisnetos, não falo dos militares de boca aberta , hão de pasmar quando lerem um acontecimento tão extraordinário, e, se nesse tempo ainda estiver em uso o latim, clamarão com toda a força dos pulmões: Miserabile dictu!

Depois de uma semelhante noite, era natural que os dias da semana corressem, como correram, monótonos e insípidos, e que o baile do Cassino estivesse tão frio e pouco animado. Entretanto aproveitei muito em ir, pois consegui perder as minhas antipatias pela valsa, a dança da moda. É
verdade que não era uma mulher que valsava, mas um anjo. Um pezinho de Cendrillon, um corpinho de fada, uma boquinha de rosa, é sempre coisa de ver-se, ainda mesmo em corrupios.

Fiz a amende honorable de minhas opiniões antigas, e, vendo nos rápidos volteios da dança voluptuosa passar-me por momentos diante dos olhos aquele rostinho iluminado por um sorriso tão ingênuo, não pude deixar de fazer uma comparação meio sentimental e meio cosmogônica, que talvez classifiqueis de original, mas que em todo o caso é verdadeira. Quando o mar, que Shakespeare disse ser a imagem da inconstância, revolveu o globo num cataclisma e cobriu a terra com as águas do dilúvio, foi uma pomba o emblema da inocência, que anunciou aos homens a bonança, trazendo no bico um raminho de oliveira. Se algum dia uma paixão de loureira vos revolver a alma, e deixar-vos o desgosto e a desilusão, há de ser um anjinho inocente como aquele quem vos anunciará a paz do coração, trazendo nos lábios o sorriso do amor o mais casto e mais puro.

Fonte:
ALENCAR, José de. Ao correr da pena. SP: Martins Fontes, 2004.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Hermes Fontes (Caderno de Poesias)


ROSA

Rosa do meu Jardim, que ardes na minha Jarra,
filha do meu afã, mártir do meu amor!
Minha grande paixão egoísta te desgarra
as pétalas, te aspira o segredo interior.

Pois que estamos a sós — eu volúvel cigarra,
tu, borboleta rubra estacionada em flor —
deveras ter comigo uma folha de parra,
a fim de preservar-te a beleza e o pudor...

Pois que! tão nua assim, tão fresca e tão punícea,
rosa da Tentação, rosa da Impudicícia,
és o próprio Pecado: e há virtude em pecar...

— Pecar morrendo em ti, sangrando em teus espinhos,
remindo num Desejo os desejos mesquinhos,
gozando pelo Olfato e amando pelo Olhar...

JOGOS DE SOMBRAS

Sempre que me procuro e não me encontro em mim,
pois há pedaços do meu ser que andam dispersos
nas sombras do jardim,
nos silêncios da noite,
nas músicas do mar,
e sinto os olhos, sob as pálpebras, imersos
nesta serena unção crepuscular
que lhes prolonga o trágico tresnoite
da vigília sem fim,
abro meu coração, como um jardim,
e desfolho a corola dos meus versos,
faz-me lembrar a alma que esteve em mim,
e que, um dia, perdi e vivo a procurar
nos silêncios da noite,
nas sombras do jardim,
na música do mar…

MESSIANEIDA

São Francisco de Assis pregou aos pássaros,
e Santo Antônio aos peixes.
Mais corajoso do que São Francisco
e do que Santo Antônio,
Jesus pregou aos homens e às mulheres...

Perderam, todos eles, o seu tempo
e o seu sermão:
O mais sábio por certo,
o mais sábio de todos foi São João,
que pregou no deserto...

POUCO ACIMA DAQUELA ALVÍSSIMA COLUNA

Pouco acima daquela alvíssima coluna
que é o seu pescoço, a boca é-lhe uma taça tal
que, vendo-a, ou, vendo-a, sem, na realidade, a ver,
de espaço a espaço, o céu da boca se me enfuna
de beijos — uns, sutis, em diáfano cristal
lapidados na oficina do meu Ser;
outros — hóstias ideais dos meus anseios,
e t o d o s cheios, t o d o s cheios
do meu infinito amor . . .
Taça
que encerra
por
suma graça
tudo que a terra
de bom
produz!
Boca!
o dom
possuis
de pores
louca
a minha boca
Taça
de astros e flores,
na qual
esvoaça
meu ideal!
Taça cuja embriaguez
na via-láctea do Sonho ao céu conduz!
Que me enlouqueças mais... e, a mais e mais, me dês
o teu delírio... a tua chama... a tua luz...

A CIGARRA

Não, orgulhosa! não, alma nobre e vadia,
nunca foste pedir migalha ao formigueiro!
Dessedenta-te o sol e te nutre a alegria
De viver e morrer cantando, o dia inteiro...

Que infâmia ires ao vizinho celeiro
tu, que tens o celeiro universal do Dia,
e preferes morrer queimada em teu braseiro
íntimo a renunciar a tua fantasia!

Não! tu és superior ao código e ao compêndio,
à Economia, ou à Moral. — Aristocrata,
crês que prever miséria é já um vilipêndio.

Primadona pagã do Jardim e da Mata,
trazes dentro em ti mesma, em teu constante incêndio,
a luz, que te alimenta e o fogo, que te mata…

TODOS TÊM SUA GLÓRIA...

Ó glória, glória triste, excelsa glória,
irmã do amor e da felicidade!
Visão miraginal da trajectória
curta de nossa curta Mocidade!

Só se logra alcançar-te, à merencória
luz, quando a alma de ti se dissuade
e não és mais o que és, pois a memória
do que foste, é que é gloria, de verdade.

O glória que eu julgava inatingível,
se és apenas a fama, e o amor é apenas
a posse corporal de urna mulher...

Que vos valeu penar as grandes penas
de sonhar que eras quase um impossível,
se és um sonho ao alcance de qualquer?!

PERFEIÇÃO

Tanto esforço perdido em ser perfeito!
Em ser superno, tanto esforço vão!
Sonho efêmero; acordo e, junto ao leito,
a mesma inércia, a mesma escuridão.

Vejo, através das sombras, um defeito
em cada cousa, e as cousas todas são,
para os meus olhos rútilos de eleito,
prodígios de impureza e imperfeição!

Fico-me, noite a dentro, insone e mudo,
pensando em ti, que dormes, esquecida
do teu amargurado sonhador...

Ali, Mas, se ao menos, imperfeito é tudo
salve-se, as mil imperfeições da vida,
a humilde perfeição do meu amor!

SUAVE AMARGOR

Sofrer é o menos, minha suave Amiga;
todos têm sua cruz ou seu cajado
— cruz de dor, ou cajado de dever...

Este é sereno; aquele se afadiga:
um, só pelo desejo contrariado,
outro, por esperar, sem nunca obter.

Tudo muda, dirás... Mas, certamente,
não muda a luz: — vem sempre do Nascente
para o mesmo calvário de Sol-Pôr!

Sofrer é o menos... A dificuldade
é sofrer sem protesto e sem rancor;
é morrer sem tristeza e sem saudade:

Morrer, de olhos em Deus, devagarzinho,
ciciando uma palavra de carinho
aos que vivem sem fé e sem amor...

––––––––––––––––––-

Fontes:
LEMOS. Wagner (seleção). Antologia Poética da Literatura Brasileira.
MIRANDA, Antonio. Poesia dos Brasis: Sergipe.

Hermes Fontes (1888 – 1930)



Hermes Floro Bartolomeu Martins de Araújo Fontes (Buquim, Sergipe, 28 de agosto de 1888 – Rio de Janeiro, a 25 de dezembro de 1930) foi um compositor e poeta brasileiro.

Filho de Francisco Martins Fontes e de Maria José de Araújo Fontes, foi para o Rio de Janeiro em 1898 e bacharelou-se em Direito, em 1911, pela então Faculdade de Direito do Rio de Janeiro.
Fundou o jornal Estréia, com Júlio Surkhow e Armando Mota, em 1904, no Rio de Janeiro. Formou-se bacharel em direito, mas não exerceu a profissão. De 1903 ao final da década de 1930 colaborou em periódicos como os jornais Fluminense, Rua do Ouvidor, Imparcial, Folha do Dia, Correio Paulistano, Diário de Notícias e as revistas Careta, Fon-Fon!, Tribuna, Tagarela, Atlântida, entre outras. Foi também caricaturista do jornal O Bibliógrafo. No período, trabalhou como funcionário dos Correios e oficial de gabinete do ministro da Viação. Em 1913 publicou seu primeiro livro de poesia, Gênese. Seguiram-se Ciclo da Perfeição (1914), Miragem do Deserto (1917), Microcosmo (1919), A Lâmpada Velada (1922) e A Fonte da Mata... (1930), entre outros. A poesia de Hermes Fontes é de estética simbolista.

O êxito como escritor, alcançado muito cedo, não trouxe benefício pessoal ao poeta. "Cantou, constantemente em suas obras, o sentimento idealizado do amor, mas suas relações amorosas eram inconstantes e traziam-lhe sempre, como saldo, uma amarga sensação de enjeitado", escreve Costa Almeida. Hermes Fontes tampouco conseguiu realizar o sonho de entrar para a Academia Brasileira de Letras. Ele tentou cinco vezes. "De acordo com alguns imortais, seu físico era impróprio para um acadêmico: pequeno, 1,54m, cabeça grande demais, meio surdo e gago, além de extremamente feio". O poeta conseguiu, contudo, entrar para a Academia Sergipana de Letras.

Poética

Hermes Fontes estreou com o livro Apoteoses. Tinha 19 anos e obteve amplo reconhecimento do seu talento. Dele disse o poeta Olavo Bilac: "É Hermes Fontes um moço, quase um menino cujo livro Apoteoses é uma revelação de força lírica". O livro influenciará a poesia brasileira no começo do século 20.

O poeta teve sua obra marcada por uma temática obsessiva, a equivalência entre a vida e a morte. "E o voluntário exílio me afigurara/Que ando seguindo o próprio enterramento/E abrindo, em vida, a própria sepultura...", escreveu de forma premonitória.

"A vida definida por Hermes Fontes", escreve Almeida Costa, "é o espaço de desagregação do ser; tem o sabor da existência em que os pesares apenas se alteram".

Ao longo da sua obra, o poeta se dedicou a temas universais, inclusive política, revelando-se, em algum momento, seguidor de idéias anarquistas. "Mas Hermes Fontes se mostra melhor poeta quando trata de assuntos interiores, quando fala de amor e de desilusões pessoais".

Suicidou-se no Rio de Janeiro, em 1930, aos 42 anos.

Fontes:
Wikipedia
http://www.webartigos.com/articles
http://www.sergipe.com.br/

Lygia Fagundes Telles (A Caçada)

Tapeçaria (Companheiros de Caçada)
A Loja de antigüidades tinha o cheiro de uma arca de sacristia com seus panos embolorados e livros comidos de traça. Com as pontas dos dedos, o homem tocou numa pilha de quadros. Uma mariposa levantou vôo e foi chocar-se contra uma imagem de mãos decepadas.

- Bonita imagem- disse ele.

A velha tirou um grampo do coque e limpou a unha do polegar.

- É um São Francisco.

Ele então voltou-se lentamente para a tapeçaria que tomava toda a parede no fundo da loja. Aproximou-se mais. A velha aproximou-se também.

- Já vi que o senhor se interessa mesmo é por isso...Pena que esteja nesse estado.

O homem estendeu a mão até a tapeçaria, mas não chegou a tocá-la.

- Parece que hoje está mais nítida...

- Nítida?- Repetiu a velha, pondo os óculos. Deslizou a mão pela superfície puída- Nítida, como?

- As cores estão mais vivas. A senhora passou alguma coisa nela?

A velha encarou-o. E baixou o olhar para a imagem de mãos decepadas.O homem estava tão pálido e perplexo quanto a imagem.

- Não passei nada, imagine...Por que o senhor pergunta?

- Notei uma diferença.

- Não, não passei nada, essa tapeçaria não aguenta a mais leve escova, o senhor não vê? Acho que é a poeira que está sustentando o tecido - acrescentou, tirando novamente o grampo da cabeça. Rodou-se entre os dedos com ar pensativo. Teve um muxoxo: - Foi um desconhecido que trouxe, precisava muito de dinheiro. Eu disse que o pano estava por demais estragado, que era difícil encontrar um comprador, mas ele insistiu tanto...Preguei aí na parede e aí ficou. Mas já faz anos isso. E o tal moço nunca mais me apareceu.

- Extraordinário...

A velha não sabia agora se o homem se referia à tapeçaria ou ao caso que acabara de lhe contar. Encolheu os ombros. Voltou a limpar as unhas com o grampo.

- Eu poderia vendê-la, mas quero ser franca, acho que não vale à pena. Na hora que se despregar, é capaz de cair em pedaços.

O homem acendeu um cigarro. Sua mão tremia. Em que tempo, meu Deus! Em que tempo teria assistido a essa mesma cena. E onde?...

Era uma caçada. No primeiro plano, estava o caçador de arco retesado, apontado para uma touceira espessa. Num plano mais profundo, o segundo caçador espreitava por entre as árvores do bosque, mas esta era apenas uma vaga silhueta, cujo rosto se reduzira a um esmaecido contorno. Poderoso, absoluto era o primeiro caçador, a barba violenta como um bolo de serpentes, os músculos tensos, à espera de que a caça levantasse para desferir-lhe a seta.

O homem respirava com esforço. Vagou o olhar pela tapeçaria que tinha a cor esverdeada de um céu de tempestade. Envenenando o tom verde-musgo do tecido, destacavam-se manchas de um negro-violáceo e que pareciam escorrer da folhagem, deslizar pelas botas do caçador e espalhar-se pelo chão como um líquido maligno. A touceira na qual a caça estava escondida também tinha as mesmas manchas e que tanto podiam fazer parte do desenho como ser simples efeito do tempo devorando o pano.

- Parece que hoje tudo está mais próximo- disse o homem em voz baixa.- É como se... Mas não está diferente? A velha firmou mais o olhar. Tirou os óculos e voltou a pô-los.

- Não vejo diferença nenhuma. - Ontem não se podia ver se ele tinha ou não disparado a seta...

- Que seta? O senhor está vendo alguma seta?

- Aquele pontinho ali no arco...

A velha suspirou.

- Mas esse não é um buraco de traça? Olha aí, a parede já está aparecendo, essas traças dão cabo de tudo- lamentou disfarçando um bocejo. Afastou-se sem ruído, com suas chinelas de lã. Esboçou um gesto distraído: - Fique aí à vontade, vou fazer o meu chá.

O homem deixou cair o cigarro. Amassou-o devagarinho na sola do sapato. Apertou os maxilares numa contração dolorosa. Conhecia esse bosque, esse caçador, esse céu- conhecia tudo tão bem, mas tão bem! Quase sentia nas narinas o perfume dos eucaliptos, quase sentia morder-lhe a pele o frio úmido da madrugada, ah, essa madrugada! Quando? Percorrera aquela mesma vereda, aspirara aquele mesmo vapor que baixava denso do céu verde...Ou subia do chão? O caçador de barba encaracolada parecia sorrir perversamente embuçado. Teria sido esse caçador? Ou o companheiro lá adiante, o homem sem cara espiando entre as árvores? Uma personagem de tapeçaria. Mas qual? Fixou a touceira onde a caça estava escondida. Só folhas, só silêncio e folhas empastadas na sombra. Mas, detrás das folhas, através das manchas pressentia o vulto arquejante da caça. Compadeceu-se daquele ser em pânico, à espera de uma oportunidade para prosseguir fugindo. Tão próxima a morte! O mais leve movimento que fizesse, e a seta... A velha não a distinguira, ninguém poderia percebê-la, reduzida como estava a um pontinho carcomido, mais pálido do que um grão de pó em suspensão no arco.

Enxugando o suor das mãos, o homem recuou alguns passos. Vinha-lhe agora uma certa paz, agora que sabia Ter feito parte da caçada. Mas essa era uma paz sem vida, impregnada dos mesmos coágulos traoçoeiros da folhagem. Cerrou os olhos. E se tivesse sido o pintor que fez o quadro? Quase todas as antigas tapeçarias eram reproduções de quadros, pois não eram? Pintara o quadro original e por isso podia reproduzir, de olhos fechados, toda a cena nas suas minúcias: o contorno das árvores, o céu sombrio, o caçador de barba esgrouvinhada, só músculos e nervos apontando para a touceira..."Mas se detesto caçadas! Por que tenho que estar aí dentro?"

Apertou o lenço contra a boca. A náusea. Ah, se pudesse explicar toda essa familiaridade medonha, se pudesse ao menos...E se fosse um simples espectador casual, desses que olham e passam? Não era uma hipótese? Podia ainda Ter visto o quadro no original, a caçada não passava de uma ficção. "Antes do aproveitamento da tapeçaria..."- murmurou, enxugando os vãos dos dedos no lenço.

Atirou a cabeça para trás como se o puxassem pelos cabelos, não, não ficara do lado de fora, mas lá dentro, encravado no cenário! E por que tudo parecia mais nítido do que na véspera, por que as cores estavam mais fortes apesar da penumbra? Por que o fascínio que se desprendia da paisagem vinha agora assim vigoroso, rejuvenescido?...

Saiu de cabeça baixa, as mãos cerradas no fundo dos bolsos. Parou meio ofegante na esquina. Sentiu o corpo moído, as pálpebras pesadas. E se fosse dormir? Mas sabia que não poderia dormir, desde já sentia a insônia a segui-lo na mesma marcação da sua sombra. Levantou a gola do paletó. Era real esse frio? Ou a lembrança do frio da tapeçaria? "Que loucura!... E não estou louco", concluiu num sorriso desamparado. Seria uma solução fácil. "Mas não estou louco."

Vagou pelas ruas, entrou num cinema, saiu em seguida e, quando deu acordo de si, estava diante da loja de antigüidades, o nariz achatado na vitrina, tentando vislumbrar a tapeçaria lá no fundo. Quando chegou em casa, atirou-se de bruços na cama e ficou de olhos escancarados, fundidos na escuridão. A voz tremida da velha parecia vir de dentro do travesseiro, uma voz sem corpo, metida em chinelas de lã: "Que seta? Não estou vendo nenhuma seta..."Misturando-se à voz, veio vindo o murmurejo das traças em meio das risadinhas. O algodão abafava as risadas que se entrelaçavam numa rede esverdinhada, compacta, apertando-se num tecido com manchas que escorreram até o limite da tarja. Viu-se enredado nos fios e quis fugir, mas a tarja o aprisionou nos seus braços. No fundo, lá no fundo do fosso podia distinguir as serpentes enleadas num nó verde-negro. Apalpou o queixo. "Sou o caçador?" Mas ao invés da barba encontrou a viscossidade do sangue.

Acordou com o próprio grito que se estendeu dentro da madrugada. Enxugou o rosto molhado de suor. Ah, aquele calor e aquele frio! Enrolou-se nos lençóis. E se fosse o artesão que trabalhou na tapeçaria? Podia revê-la, tão nítida, Tão próxima que, se estendesse a mão, despertaria a folhagem. Fechou os punhos. Haveria de destruí-la, não era verdade que além daquele trapo detestável havia alguma coisa mais, tudo não passava de um retângulo de pano sustentado pela poeira. Bastava soprá-la, soprá-la!

Encontrou a velha na porta da loja. Sorriu irônica:

- Hoje o senhor madrugou.

- A senhora deve estar estranhando, mas...

- Já não estranho mais nada, moço. Pode entrar, o senhor conhece o caminho...

"Conheço o caminho"- murmurou, seguindo lívido por entre os móveis. Parou. Dilatou as narinas. E aquele cheiro de folhagem e terra, de onde vinha aquele cheiro? E porque a loja foi ficando embaraçada, lá longe? Imensa, real só a tapeçaria a se alastrar sorrateiramente pelo chão, pelo teto, engolindo tudo com suas manchas esverdinhadas. Quis retroceder, agarrou-se a um armário, cambaleou resistindo ainda e estendeu os braços até a coluna. Seus dedos afundaram por entre galhos e resvalaram pelo tronco de uma árvore, não era uma coluna, era uma árvore! Lançou em volta um olhar esgazeado: penetrara na tapeçaria, estava dentro do bosque, os pés pesados de lama, os cabelos empastados de carvalho. Em redor, tudo parado.Estático. No silêncio da madrugada, nem o piar de um pássaro, nem o farfalhar de uma folha. Inclinou-se arquejante. Era o caçador? Ou a caça? Não importava, não importava, sabia apenas que tinha que prosseguir correndo sem parar por entre as árvores, caçando ou sendo caçado. Ou sendo caçado?...Comprimiu as palmas das mãos contra cara esbraseada, enxugou no punho da camisa o suor que lhe escorria pelo pescoço. Vertia sangue o lábio gretado.

Abriu a boca. E lembrou-se. Gritou e mergulhou numa touceira. Ouviu o assobio da seta varando a folhagem, a dor!

"Não..."- gemeu, de joelhos. Tentou ainda agarrar-se à tapeçaria. E rolou encolhido, as mãos apertando o coração.

Fontes:
TELLES, Lygia Fagundes. Antes do Baile Verde.
Imagem = http:// www.dogtimes.com.br/idademedia.htm

Antonio Brás Constante (Meu Vizinho Extraterrestre)



...A probabilidade de não estarmos sozinhos ganha força a cada dia, tanto que até o vaticano já anda admitindo esta possibilidade. Caso isto realmente venha a se comprovar, muitas coisas vão acabar mudando por aqui. A começar pela tecnologia, pois finalmente poderemos viajar pelo universo graças aos avanços tecnológicos recebidos de seres extraterrestres, ou pelo menos porque eles vão acabar concordando em colocar um ponto de ônibus ou de táxi espacial aqui no nosso orbe azul.

Nessas viagens interestelares, é sempre bom conferir se você terá como pagar pela corrida, pois em caso de calote o taxista poderá acabar comendo você (literalmente). Poderemos pressupor que o turismo será bem diversificado. Para os naturalistas, ao invés de se ir a uma praia de nudismo, haverá planetas de nudismo, com preços que deixarão qualquer vivente peladinho. Os aventureiros poderão ir fazer um safári em um sistema solar selvagem, onde primeiro se disputa no cara-e-coroa quem vai ser a caça e o caçador.

Vivemos em um cantinho isolado e pacato da galáxia, quase como se estivessemos em um ranchinho bem afastado das grandes metrópoles, e como possivelmente ainda não dispomos de algo que realmente desperte o interesse de qualquer civilização estelar a ponto de eles quererem puxar conversa conosco, o jeito é esperar. Ao menos até avançarmos o suficiente no ramo da genética para conseguir clonar a Gisele Bündchen, dispondo assim de uma inigualável moeda de troca com outros seres inteligentes (que mesmo se não for à moeda de maior valor no universo, ainda assim tenderá a ser a mais bonita).

Para as religiões, de um modo geral, um contato com novas civilizações será uma ótima chance de aumentar o número de fiéis. Por outro lado às inúmeras crenças que já não se entendem aqui terão de aprender a conviver com infinitas outras crenças de origem interplanetária. Em todo caso, é sempre bom e saudável pregar que é extremamente pecaminoso a qualquer raça alienígena o consumo de carne humana.

O sistema político também mudará, pois necessitaremos de um governante mundial para tratar dos assuntos em terras além-vácuo. Se os alienígenas forem realmente inteligentes, vão influenciar neste tipo de decisão, evitando que o eleito seja aquele que possuir a maior coleção de bombas, optando por alguém que se mostre disposto a pensar no bem-estar de todos.

Enfim, a confirmação de vida alienígena inteligente e avançada, com certeza trará muitas mudanças em nosso modo de agir, pensar e viver. Porém, na eventualidade de se ocorrer este contato, o mais importante agora é ficarmos na torcida para que ele aconteça de um jeito totalmente diferente daquele que ocorreu na própria história da humanidade, quando o homem então no papel de desbravador, trouxe junto com o descobrimento de novas terras, as doenças, a miséria, as guerras, e tantas outras desgraças para os povos nativos que tiveram a infelicidade de se deparar com eles. Pois tudo isto, infelizmente, nós já temos.

Fonte:
http://recantodasletras.uol.com.br/autores/abrasc

Antonio Brás Constante (O Homem atrás do escritor. O escritor atrás do homem)

Em sua terceira entrevista da série O homem atrás do escritor, o escritor atrás do homem. A mulher atrás da escritora, a escritora atrás da mulher, o Singrando Horizontes entrevistou o escritor Antonio Brás Constante, natural de Porto Alegre. Residente em Canoas/RS. Bacharel em computação, bancário e cronista de coração, escreve com naturalidade, descontraída e espontaneamente, sobre suas idéias, seus pontos-de-vista, sobre o panorama que se descortina diferente a cada instante, a nossa frente: a vida. Membro da ACE (Associação Canoense de Escritores).

A.B. Constante: Antes de iniciar, gostaria de frisar aos que forem continuar lendo esta singela entrevista, que sou um escritor meio fora dos padrões convencionais ao termo (por isso mesmo definido como eterno aprendiz de escritor), por isso lhes peço, não me desejem mal...

INFANCIA E PRIMEIROS LIVROS

Conte um pouco de sua trajetória de vida, onde nasceu, onde cresceu, o que estudou.

Parafraseando o Analista de Bagé, posso dizer que minha infância foi normal, o que não aprendi no galpão, aprendi atrás do galpão. Nasci em Porto Alegre e me perdi por Canoas, onde cresci. Me formei em Ciência da Computação, mas daí me apaixonei perdidamente pela escrita, e passei a ser seu escravo, transcrevendo os delirios que esta Diva sussura em minha mente.

Como era a formação de um jovem naquele tempo? E a disciplina, como era?

Não existiam computadores, algo que pode parecer meio pré-histórico para essa gurizada hi-tech, mas não vejo tanta diferença para os dias de hoje (também não sou tão velho assim), no fim tudo se resume a querer aprender, pois no nosso mundo ou você aprende enquanto é novo ou alguém te prende depois.

Recebeu estímulo na casa da sua infância?

Sim, meu maior estímulo foi ser péssimo em futebol, algo que me deu bastante tempo livre para me dedicar aos livros.

Quais livros foram marcantes antes de começar a escrever.

Foram muitos, mas a série “para gostar de ler” foi bem importante para mim nessa época.

Antonio Bras Constante, Escritor

Fale um pouco sobre sua trajetória literária. Como começou a vida de escritor?

Minha vida literária se dividiu em duas partes. Na primeira etapa (fase adolescente) escrevi alguns textos na época do segundo grau (era assim chamado naqueles tempos), buscando melhorar minhas notas nas aulas de português, acabei gostando muito de escrever, mas tão logo concluí os estudos parei, adormecendo o escritor que dentro de mim existia. Somente ao final da faculdade voltei a escrever (quase quinze anos depois), graças ao empurrão de um grande amigo chamado Zé Gadis, que era chargista. A coisa começou como uma brincadeira, ele desenhava caricaturas dos colegas de empresa e eu fazia as mensagens para os cartões de aniversário. Aos poucos fui me viciando no ato de escrever, e não parei mais.

Como foi dar esse salto de leitor pra escritor?

Foi estranho, tanto que até hoje me defino como um eterno aprendiz de escritor. Não me intitulo como escritor profissional, porque acho que isso acarreta uma responsabilidade muito grande, e não gosto de sentir este tipo de obrigação nas costas, como um fardo. Por isso prefiro ser um aprendiz, poder ousar, errar, viajar, tratando a arte de escrever como uma deliciosa brincadeira.

Teve a influência de alguém para começar a escrever?

Além do meu amigo Gadis, do qual já citei antes, também tive as influências literárias de escritores como: L. V. Verissímo, Barão de Itararé e Douglas Adams.

Tem Home Page própria (não são consideradas outras que simplesmente tenham trabalhos seus)?

Sim, todos os meus textos publicados estão disponíveis no site: http://recantodasletras.uol.com.br/autores/abrasc

Você encontra muitas dificuldades em viver de literatura em um país que está bem longe de ser um apreciador de livros?

Viver de literatura?? Rsrsrs... isso existe?? Rsrss. Falando sério, na verdade eu tento dar vida a literatura, mas não sobrevivo dela. Algo que me chama a atenção neste País é que muitos leitores tem preconceito com a literatura nacional. São pessoas que consomem tudo que vem de fora, mas torcem o nariz para o que é produzido aqui.

Como foi que você chegou à poesia?

Para mim a poesia é como um arrepio de frio, um bocejo, um tropeção em uma pedra, chega sem aviso e se vai sem explicação. Para não perder a viagem acabo escrevendo o que senti naquele momento, mas não sou exatamente um poeta.

SEUS LIVROS E PREMIOS

Como começou a tomar gosto pela escrita?

Quando comecei a rir do que escrevia, acho que o primeiro ponto para alguém se tornar escritor é gostar daquilo que escreve.

Em que você se inspirou em seus livros?

No cotidiano, temperando situações do dia-a-dia com pitadas de humor.

Como definiria seu estilo literário?

Posso dizer que meu estilo literário ainda encontra-se em construção...

Dentre os livros escritos por você, qual te chamou mais atenção? E por quê?

Foi o livro “Hoje é seu aniversário – PREPARE-SE” que por ter sido o único até o momento, me chamou a atenção por total falta de opções.

Que acha de sua obra?

Fiz um livro que eu gostaria de ler se fosse outra pessoa, e olhando a obra desta forma posso dizer que considero este livro, como um filho textual. É um livro que apesar de não seguir o mesmo estilo literário dos livros da Bruna Surfistinha, também é cheio de gozação.

Qual a sua opinião a respeito da Internet? A seu ver, ela tem contribuído para a difusão do seu trabalho?

Posso dizer sem sombra de dúvidas, que se não fosse a internet, meu trabalho como escritor praticamente não existiria.

Tem prêmios literários?

Sim, fui vencedor do oitavo concurso de poesias, contos e crônicas, na categoria crônicas. Prêmio oferecido pela fundação cultural de Canoas. Também ganhei uma mochila cheia de chocolates BIS em uma promoção de frases da Nestlé.

CRIAÇÃO LITERÁRIA

Você precisa ter uma situação psicologicamente muito definida ou já chegou num ponto em que é só fazer um "clic" e a musa pinta de lá de dentro? Para se inspirar literariamente, precisa de algum ambiente especial ?

Na realidade, para me inspirar a situação ideal seria poder relaxar em uma sauna com aproximadamente umas cinco beldades seminuas ao meu redor, mas como minha esposa desencoraja este tipo de “ambiente” para mim, argumentando silenciosamente com seu rolo de macarrão em punho, venho me contentando com um tempinho livre em qualquer lugar mesmo, onde possa rabiscar ideias para depois colocá-las no micro.

Você projeta os seus livros? Ou seja, você projeta a ação, você projeta o esquema narrativo antes? Como é que você concebe os livros?

Não escrevo romances, mas as ideias sobre novos textos vem em golfadas dentro da minha cabeça, depois coloco tudo no papel (entenda-se “papel” o editor de texto) e vou aprimorando o texto até ficar de um jeito que acho interessante.

Você acredita que para ser escritor basta somente exercitar a escrita ou vocação é essencial?

Acho que sem vocação, não haveria prazer em escrever e consequentemente a pessoa não seguiria por este caminho, ou se seguisse, não seria por muito tempo.

Como surge o momento de escrever um livro?

O momento certo para se escrever um livro é quando uma editora cai do céu e se propõe a publica-lo. Se isto não acontecer, tente conseguir alguma verba para pagar a editora, e o resultado será o mesmo.

Quanto tempo você leva escrevendo um livro?

Deixe-me ver... Escrevo um novo texto a cada semana, meus livros tem em média 28 textos, ou seja, levo em torno de sete meses para ter material suficiente para um novo livro.

Como foi o processo de pesquisa para a escrita de seus livros?

Alguns textos realmente precisam de pesquisa, algo que poderia ser feito em várias bibliotecas ou utilizando o Google. Considero a pesquisa essencial para dar profundidade ao texto e para não escrever minhas “pérolas textuais” de forma equivocada.

No processo de formação do escritor é preciso que ele leia porcaria?

Tudo depende do que a pessoa vai querer escrever. Eu, por exemplo, adoro ler gibis (considerados por muitos como porcarias), sou fã de tirinhas de jornal, e sempre que tenho tempo dou uma olhadinha no Big Brother Brasil.

O ESCRITOR E A LITERATURA

Mas existe uma constelação de escritores que nos é desconhecida. Para nós, a quem chega apenas o que a mídia divulga, que autores são importantes descobrir?

Sou um curioso nato, gosto de sempre que possível experimentar coisas novas, comidas diferentes, autores diferentes, lugares diferentes. Vou aproveitar este espaço para divulgar o trabalho de um mestre-poeta que conheci ao acaso no mundo virtual, o Dário Banas (http://estranhamobilia.blogspot.com/ ). Suas poesias são fantásticas.

Na sua opinião, o livro ou livros da literatura da língua portuguesa deveriam ser leitura obrigatória?

É dificil opinar sobre o que seriam livros “obrigatórios”, já que sou adepto da leitura espontanea. Acho que se um autor consegue cativar um leitor, sua leitura já deveria ser desejada e incentivada, pois teria o seu mérito.

Qual o papel do escritor na sociedade?

Com certeza seria um papel escrito. Rsrsrs. O escritor é aquele sujeito que cutuca o outro, chamando sua atenção para uma outra realidade. É função do escritor abrir as janelas da imaginação para que as pessoas possam olhar o mundo e viajar por ele.

Há lugar para a poesia em nossos tempos?

Claro que há, sempre tem alguma gaveta vazia em algum lugar. Mas o melhor lugar para se guardar a boa poesia é dentro dos compartimentos de nossas mentes. A poesia não é um almoço que se come religiosamente todo santo dia, mas uma fruta suculenta que é sorvida, e escorre seu néctar pela boca, deliciosamente, saciando nossa fome poética.

A PESSOA POR TRÁS DO ESCRITOR

O que o choca hoje em dia?

Quando percebo que a insensibilidade anda tomando conta do mundo, de tal forma que nada mais parece chocar, confesso que fico chocado.

O que lê hoje?

Além das tradicionais bulas de remédio, cuja leitura é indispensável para uma vida saudável, leio o que me cai nas mãos, terminei há pouco de ler o livro “Ensaio sobre a cegueira” do Saramago. Por enquanto estou apenas na companhia das revistas e suas reportagens criativas.

Você possui algum projeto que pretende ainda desenvolver?

Atualmente ando respondendo um questionário sobre literatura da melhor forma possível, e confesso que estou adorando. Fico na torcida para que meu amigo virtual, José Feldman, publique estas minhas respostas espontâneas em seu portal. Não possuo outros projetos.

De que forma você vê a cultura popular nos tempos atuais de globalização?

Toda raiz cultural começou através de uma veia popular, a cultura nasce no seio da população, enriquece e muitas vezes acaba elitista. Acho que a globalização é um bom instrumento de fomentar e divulgar a cultura, de termos contato com outras culturas.

CONSELHOS PARA OS ESCRITORES

Que conselho daria a uma pessoa que começasse agora a escrever ?

Querer se consagrar como escritor é o mesmo que se lançar ao oceano buscando chegar a uma ilha repleta de tesouros, voce nada, nada e muitas vezes não acontece nada. Se desistir, ou se afoga, ou a maré te leva de volta para o anonimato de onde saiu. Por isso quero dizer para quem quiser começar a escrever, que escreva por prazer, sem querer visualizar um horizonte. Escreva pelo mesmo motivo que respira, para viver. A melhor recompensa para quem escreve é gravar para eternidade seus pensamentos, suas ideias, suas loucuras. O resto é pura consequencia.

O que é preciso para ser um bom poeta?

Entendo que a poesia é uma forma de dança onde as frases ocupam o lugar dos movimentos. Não se escreve uma poesia para que ela seja “bonitinha”, a poesia é a essência dos sentimentos, derramados no papel de um jeito ritmado.

Gostaria de acrescentar mais alguma coisa? Outros trabalhos culturais, opiniões, crítica, etc.

Estou distribuindo meu livro em PDF gratuitamente para quem quiser conhecer a obra, basta me enviar um e-mail para : abrasc@terra.com.br e pedir uma cópia.

E para encerrar a entrevista

Quero agradecer a iniciativa do Feldman em ceder este espaço para que os escritores possam falar um pouco sobre suas obras e divulgá-las. Deixo aqui registrado meu muito obrigado.

Se Deus parasse na tua frente e lhe concedesse três desejos, quais seriam?

PRIMEIRO pediria que ele aumentasse a dose de humanidade nos seres que se definem como humanos.

SEGUNDO Pediria a ele que largasse este bico de gênio realizador de desejos e voltasse a trabalhar em prol do mundo, já que depois do sexto dia (ele parou para descansar no sétimo) as coisas andaram piorando bastante por aqui.

TERCEIRO pediria para ele sair um pouco para o lado (já que ele estaria parado na minha frente) para que eu pudesse terminar de ver na televisão a sua maior obra, o seriado de “Os Simpsons”.

Fonte:
Entrevista Virtual realizada por José Feldman para o Singrando Horizontes.

Universidade de Passo Fundo/RS (Projeto Livro do Mês - 2010)


Realizado desde 2006, o Projeto Livro do Mês, em parceria com a Prefeitura Municipal de Passo Fundo, Editoras dos autores presentes, SESC Passo Fundo e escolas públicas e particulares de Passo Fundo e região

Agendamento da participação de alunos e professores nos seminários, favor entrar em contato pelo telefone (54) 3316-8148 (Mundo da Leitura).

SEMINÁRIOS

Março
24, 25 e 26/03

O barbeiro e o judeu da prestação contra o sargento da motocicleta
Joel Rufino dos Santos
Editora Moderna

24/03 – Letras
25/03 – SME – SESC
26/03 – SESC (escolas públicas e particulares)

Abril
27, 28 e 29/04

Um livro de horas
Emily Dickinson (Ângela Lago)
Editora Scipione

27/04 – Letras
28/04 – SME - SESC
29/04 – SESC (escolas públicas e particulares)

Maio
26, 27 e 28/05
Kina, a surfista
Toni Brandão
Editora Melhoramentos

26/05 – Letras
27/05 – SME – SESC
28/05 – SESC (escolas públicas e particulares)

Junho
21, 22 e 23/06

De carona, com Nitro
Luis Dill
Editora Artes e Ofícios

21/06- Letras
22/06 - SME – SESC
23/06 - SESC (escolas públicas e particulares)

Agosto
30, 31 e 01/09

Cidades dos deitados
Heloísa Prieto
Edições Sesc SP / Editora Cosac Naify

30/08 – Letras
31/08 - SME – SESC
01/09 - SESC (escolas públicas e particulares)

Setembro
22, 23 e 24/09

Enigmas de Huasao: uma história peruana
Luciana Savaget
Editora Global

22/09 – Letras
23/09 - SME – SESC
24/09 - (escolas públicas e particulares)

Outubro
27, 28 e 29/10

Alma de fogo: um epsódio imaginado de Álvares de Azevedo
Mario Teixeira
Editora Ática

27/10 – Letras
28/10 - SME – SESC
29/10 - (escolas públicas e particulares)

Novembro
18 e 19/11

Dá pra acreditar?
Luís Pescetti SM

18/11 – Letras
19/11 - SME – SESC

Fonte:
Colaboração da Universidade de Passo Fundo

Associação Canoense de Escritores (Atividades)

OFICINA DE CRÔNICAS

Dia: 26 de janeiro de 2010
Hora: 14 horas
Local: Parque Eduardo Gomes (galpão 5)
Proponente: Associação Canoense de Escritores
Oficineiros: ETEVALDO SILVEIRA e NEIDA ROCHA
capacidade: 30 lugares

OFICINA DE POEMAS

Dia: 26 de janeiro de 2010
Hora: 17 horas
Local: Parque Eduardo Gomes (galpão 5)
Proponente: Casa do Poeta de Canoas
Oficineiros: ANCILA DANI MARTINS e MARI REGINA RIGO
capacidade: 30 lugares
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Fontes:
Colaboração de Neida Rocha
Fotomontagem = José Feldman

sábado, 23 de janeiro de 2010

Walcyr Carrasco (Pinga-pinga de pinguço)


Um passeio nas vans que circulam de bar em bar

Bares do Itaim, Jardins e Pinheiros andam oferecendo um serviço exclusivo para bebuns. É uma van que os leva até em casa. Trata-se, com o perdão de um trocadilho, de um pinga-pinga de pinguços. As vans circulam de bar em bar. arrebanhando os etílicos, durante a madrugada.

Desde que o novo Código de Trânsito entrou em vigor, a polícia anda rondando perto dos bares, bafômetro a postos, em busca de motoristas infratores. Com as vans, os bares garantem faturamento. Os clientes podem mergulhar nos copos, sem depois arriscar a pele no asfalto. Serviços semelhantes já existem na Europa, nos Estados Unidos e no Japão. Raramente tomo umas e outras. Soube, entretanto. que o clima nas vans é animadérrimo. Imaginem seis bêbados indo para casa. A van estaciona para pegar o sétimo, em novo bar. Descem os seis primeiros.

E aí, que tal a saideira?

Dá-lhe! O inocente que saiu para tomar um ou dois uísques entra na animação. Acorda embaixo do balcão de uma padaria. Também são freqüentes os tipos belicosos e as discussões capazes de resolver o problema do futebol brasileiro.

Eu já disse que o Ronaldinho...

Ah, nego vem falar do Ronaldinho! Não vem! Nãããão veeeeem!

O Ronaldinho? O Ronaldínho?

Sóbrio por necessidade profissional. o motorista tenta aplacar os animos.

-Ô, pessoal, o Ronaldinho joga um bolão.

Os seis se unem.

- Cala a boca!

O coitado silencia. Abre a janela. É obrigado a dirigir a madrugada toda de vidro abaixado. Até o ar está impregnado. Se respirar mais fundo, fica de fogo.

Mais uma parada, entra um rapaz. Tomou só um ou dois goles.

- Eu sozinho. Lembrei da van. Que negócio é esse de ir para casa tão cedo?

Novo tropel. No veículo. fica só um, desmaiado, lá no fundo. Os outros descem, atrás de nova rodada. A van é ideal para fazer amizades. Há quem chegue até mais longe.

A senhora não está bêbada! - desconfia o motorista.

Ela afina a voz, bambeia as pernas.

- Estou bebinha, sim!

Consegue entrar. Aperta-se entre todos. Examina um por um, com o olhar esperto. Um está bêbado demais. Outro, passado da idade. O terceiro, sim, serve! Tem perfil de executivo. Ela afia as garras. Ele nem desconfia., quando descem no mesmo prédio. Sobem juntos no elevador, aterrissam no mesmo andar. Começa a ficar cabreiro quando, após várias tentativas, consegue botar a chave na porta e percebe que ela o espera. Não há tempo para perguntas. Ela entra depressa, vai até o bar e prepara dois uísques. Ele cai duro no sofá. Consegue erguer uma das pestanas meia hora depois.

Quem é você? - pergunta, trêmulo.

Você me convidou para um uísque! - ela retruca, revoltada.

O executivo vasculha o cérebro. Não consegue lembrar. Mas deve ter convidado. Senão, por que ela estaria em sua sala? Bebe mais uma dose para acordar e desmaia. Na semana seguinte, ela já está falando em casamento. Ele continua não se lembrando de nada.

Também existem alpinistas sociais. Como o sujeito que mora na periferia. Quer chegar em casa de carro. A maior parte dos bares adota limites mínimos de consumo, para dar direito a carona. Ele bebe o mínimo. Depois, exige que o levem para a casa. O motorista quase cai nas barrancas do Tietê para chegar até lá. O falso bebum desce alegremente. Os amigos, admirados.

-Tu tá por cima. hein, malandro? Chegando em casa de chofer!

Sorri, vitorioso. Sai mais barato do que táxi. O bêbado desmemoriado é uma tragédia.

O senhor não se lembra do endereço?

Eu aaaaaaaaaacho que é virando aquela rua...

Toca a vasculhar quarteirões.

Certo tipo de bebum não vai de van. É o imprevidente, que saiu de casa em seu próprio carro. O bar oferece o motorista. que dirige para o cliente. Mas bêbado detesta terminar a noite sozinho.
Soooobe aí. Veeeem tomar uma comigo.

Sinto muito. A van do bar vem me pegar em meia hora, esquiva-se o motorista.

Soooobe só meia hooora.

O chofer acaba mais bêbado do que o cliente. Quando a van chega, está cantando na sarjeta. Há quem possa se espantar com a idéia. É uma medida civilizada. Com este calor, poucos resistem a um chope, ou a dois, a três, quatro... Ficam a salvo pedestres e postes!


Fonte:
Revista VEJA. São Paulo. 11 de março 1998.

Izabel Leão (O Galo Chico)



Recolhendo fragmentos no baú de minhas memórias fui trazendo lembranças a tanto esquecidas que foram narradas por meu pai, ainda vivo, e que tem muita coisa pra contar.

Sempre que o visito em Bauru, cidade onde nasci e por lá fiquei até meus trinta e pouco anos, ele passa a rememorar seus arquivos antigos e me brindar com histórias que só quem viveu é capaz de contar.

A que mais me recordo é sobre um tal galo de estimação, que tanto ele gostava e que para sua tristeza era manco com defeito em uma das pernas.

Foi em São Manoel, cidade próxima a Bauru, que papai nasceu e lá viveu sua infância simples e humilde. Ele conta que sempre que voltava da escola correndo e esbaforido gritava já da calçada: Chico, cadê você? Vem cá Chico!!!!! Chico! Chico! E lá vinha o Chico correndo e mancando pelo quintal atrás daquele que o chamava e ele nem sabia o porquê.

Papai tinha certeza que ele era o único na família que prezava tanto o Chico. “Eu tinha dó do pobre galo. Peguei carinho por ele”, diz condoído.

Como nada na vida que a gente ama dura pra sempre, assim também foi com o querido galo Chico.

Um dia papai chega da escola e grita: Chico! Vem cá. Grita mais uma vez: Chico! vem cá. Cadê você!!! E grita mais uma centena de vezes e nada do Chico aparecer. Ele achou estranho, e preferiu pensar que o galo estivesse em algum momento melancólico e não quisesse brincar. Exclamou: “Deixa pra lá!”

Na hora do jantar, o cheiro apetitoso da comida da vovó Izabel, do qual o meu nome originou-se, faz meu pai sair correndo para a mesa garantir um naco daquilo que parecia estar muito gostoso. Eis que para a sua surpresa era um ensopado de frango.

Desconfiado lhe vem a mente, mais que de repente, a lembrança do galo Chico, correndo pelo quintal e atendendo ao seu chamado.

Naquela noite papai não quis comer o ensopado. Perdeu a fome. Nem quis perguntar pra vovó de onde vinha aquele frango. Ele conta que ela era brava demais e com certeza ia lhe dar uma bronca. Só sabe que o galo Chico nunca mais apareceu. E ele não quis nem ouvir o lhe era difícil e dolorido de aceitar.
––––––––––––––––-
(*) Izabel Leão é jornalista em São Paulo, SP.

Fontes:
Jornal Guata. Foz do Iguaçu.
Imagem =
http://sotaodaines.chrome.pt

Palavras e Expressões mais Usuais do Latim e de de outras linguas) Letra U-V


ubi bene, ibi patria
Latim = Onde se (vive) bem, aí (está) a pátria. Conceito materialista dos cosmopolitas.

ubi eadem ratio ibi eadem legis dispositio
Latim Direito = Onde existe a mesma razão, aí se aplica o mesmo dispositivo legal.

ubicumque sit res, pro domino suo clamat
Latim = Onde quer que esteja a coisa clama pelo seu dono. Princípio jurídico que resume o direito de propriedade, também citado assim em moral: res clamat domino, a coisa clama por seu dono.

ubi non est justitia, ibi non potest esse jus
Latim = Onde não existe justiça não pode haver direito. A justiça é que sustenta as diversas formas de direito.

ubi Petrus, ibi Ecclesia
Latim = Onde (está) Pedro aí (está) a Igreja. Provérbio muito citado pelos apologistas católicos que só consideravam verdadeira a igreja que estivesse em comunhão com o pontífice romano.

ubi societas, ibi jus
Latim Direito = Onde (está) a sociedade aí (está) o direito. De modo geral, as causas correm no foro da comarca onde a sociedade foi estabelecida.

ubi solitudinem faciunt, pacem appelant
Latim = Onde estabelecem a solidão, atraem a paz. Frase que Tácito atribui a um herói, vítima da rapinagem dos soldados romanos.

ultima ratio
Latim = Última razão. Argumento decisivo e terminante.

ultima ratio regum
Latim = Último argumento dos reis. Legenda gravada nos canhões de Luís XIV.

ultra petita
Latim Direito = Além do pedido. Diz-se da demanda julgada além do que pediu o autor.

una salus victis, nullam sperare salutem
Latim = A única salvação para os vencidos é não esperar salvação. Frase com que Enéias procura arrancar do desânimo os companheiros vencidos em Tróia.

una voce
Latim = De comum acordo; em coro; unanimemente.

unguibus et rostro
Latim = Com as garras e com o bico; com unhas e dentes.

urbi et orbi
Latim = Para a cidade (de Roma) e para o universo. Diz-se das bênçãos dadas pelo papa, em circunstâncias especiais, quando as estende ao mundo inteiro.

uti, non abuti
Latim = Usar, não abusar.

uti possidetis
Latim Direito = Como possuís. 1 Fórmula diplomática que estabelece o direito de um país a um território, baseada na ocupação pacifica dele. 2 Princípio que faz prevalecer a melhor posse provada da coisa imóvel, no caso de confusão de limites com outra contígua.

utile dulci
Latim = O útil ao agradável.

vade in pace
Latim = Vai em paz. Palavras com que o confessor despede o penitente, depois de absolvê-lo.

vade mecum
Latim = Vai comigo. Diz-se dos livros de conteúdo prático e útil, e formato pequeno.

vade retro, Satana!
Latim = Vai para trás, Satanás! Expressão usada duas vezes por Jesus: (Mt. IV, 10) a fim de repelir o demônio que o tentava de idolatria e (Marcos, VIII, 33) para repreender o apóstolo Pedro, que desejava dissuadi-lo de aceitar a morte e a paixão.

vae soli!
Latim = Ai do solitário! Expressão com que o Eclesiastes (IV, 10) lamenta a fraqueza do homem abandonado à própria sorte.

vae victis!
Latim = Ai dos vencidos! Exclamação atribuída a Breno, célebre caudilho gaulês que derrotou e saqueou Roma no ano de 390 a. C.

vanitas vanitatum et omnia vanitas
Latim = Vaidade das vaidades, e tudo é vaidade. Conclusão melancólica do Eclesiastes (XII, 8), sobre a pequenez das coisas deste mundo.

varietas delectat
Latim = A variedade agrada.

varium et mutabile semper femina
Latim = A mulher é algo mutável e inconstante. Expressão de Virgílio (Eneida, IV, 569-570).

velut aegri somnia
Latim = Como os sonhos de doente. É como Horácio (Arte Poética, 7) compara as obras literárias, sem entrosamento nas idéias; são sonhos disparatados de um enfermo.

veniam petimus damusque vicissim
Latim = Pedimos licença e a damos também. Horácio (Arte Poética, 2) aconselha a tolerância nas relações.

Veni Creator Spiritus
Latim = Vinde Espírito Criador. Primeiro verso do hino litúrgico da festa do Espírito Santo.

venite, exultemus Domino
Latim = Vinde, exultemos no Senhor. Palavras do breviário no invitatório de matinas, recitado diariamente pelos ministros sagrados.

veni, vidi, vici
Latim =Vim, vi, venci. Palavras com que César anunciou, ao Senado Romano, sua vitória sobre Farnaces, rei do Ponto, no ano 47 a. C. São citadas como alusão a um êxito seguro e rápido em qualquer empreendimento.

ventus popularis
Latim = Aura popular; popularidade.

vera incessu patuit dea
Latim = Manifestou-se verdadeira deusa pelo andar. Modo como Virgílio se refere a Vênus (Eneida, 1, 405).

verba et voces, praetereaque nihil
Latim = Palavras e vozes e nada mais. Verso de Ovídio em que o poeta verbera alguns discursos do seu tempo.

verba volant, scripta manent
Latim = As palavras voam, os escritos permanecem. Provérbio de grande atualidade que aconselha prudência em pronunciamentos comprometedores e na assinatura de contratos bilaterais.

verbum pro verbo
Latim = Palavra por palavra; ao pé da letra. Diz-se das traduções e interpretações fiéis.

vergiss mein nicht
Alemão = Não me olvides; miosótis.

veritas odium parit
Latim = A verdade gera o ódio. Conceito emitido por Terêncio, cujo pensamento é o seguinte: a complacência produz amigos e a franqueza, o ódio.

vesica piscis
Latim = Bexiga de peixe. Grande nimbo em forma de amêndoa.

victis honos
Latim = Honra aos vencidos. Empregada nas competições esportivas como sinal de confraternização.

victrix causa diis placuit, sed victa Catoni
Latim = A causa vencedora agradou aos deuses, mas a vencida a Catão. Lucano, em Farsália, I, 128, alude à fidelidade de Catão a Pompeu, quando este foi derrotado por César. Emprega-se para expressar apoio a uma causa, embora vencida.

video meliora, proboque, deteriora sequor
Latim = Vejo as coisas melhores e as aprovo, mas sigo as piores. Imagem do homem fraco, traçada por Ovídio (Metamorfoses, VII, 20). Vê o bem e o aprova, mas é arrastado pelas paixões.

vient de paraître
Francês = Acaba de surgir. Usada no mercado de livros para anunciar as novidades literárias.

vincit omnia veritas
Latim =A verdade vence todas as coisas.

vir bonus dicendi peritus
Latim = Homem de bem, perito em falar. O perfeito orador, segundo Quintiliano, deve aliar a honestidade de vida à perfeição oratória.

vis-à-vis
Frances = Frente a frente. Empregada quando alguém se encontra em frente a outra pessoa numa mesa, bailado etc.

vitam impendere vero
Latim = Consagrar a vida à verdade.

vivas in Deo
Latim = Que tu vivas em Deus. Frase com que os primeiros cristãos se despediam daqueles que morriam, desejando-lhes a felicidade eterna.

vivere parco
Latim = Viver com pouco.

vivit sub pectore vulnus
Latim = A ferida ainda vive no coração. O poeta Virgílio refere-se à paixão nascente de Dido.

volenti nihil difficile
Latim = Nada é difícil a quem quer; querer é poder.

volenti non fit injuria
Latim = Não se faz injúria àquele que consente. Axioma jurídico segundo o qual a vítima não se deve queixar em juízo de uma ofensa por ela consentida.

volti subito

Italiano = Volte rapidamente. Música = Expressão empregada nas partituras.

vox clamantis in deserto
Latim = A voz do que clama no deserto. Palavras de São João Batista, referindo-se a si próprio (Mt. II, 3), quando pregava às multidões no deserto. A expressão passou a ser empregada para designar aquele cujas admoestações não são atendidas.

vox faucibus haesit
Latim = A voz ficou presa na garganta. Expressão virgiliana para indicar uma forte emoção.

vox populi, vox Dei
Latim = Voz do povo, voz de Deus. O assentimento de um povo pode ser o critério de verdade.

vulnerant omnes, ultima necat
Latim = Todas ferem, a última mata. Inscrição filosófica em mostradores de relógios. Cada hora fere a nossa vida até que a derradeira a roube.
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LETRA A http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/10/palavras-e-expresses-mais-usuais-do.html
LETRA B http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/10/palavras-e-expresses-mais-usuais-do_07.html
LETRA C http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/10/palavras-e-expresses-mais-usuais-do_21.html
LETRA D http://singrandohorizontes.blogspot.com/2008/11/palavras-e-expresses-mais-usuais-do.html
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LETRA R http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/11/palavras-e-expressoes-mais-usuais-do.html
LETRA S http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/11/palavras-e-expressoes-mais-usuais-do_21.html
LETRA T http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/12/02/palavras-e-expressoes-mais-usuais-do-latim-e-de-outras-linguas-letra-t/

Fonte:
Helio Consolaro. In Por Tras das Letras

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Trova 111 - Pedro Ornellas (São Paulo/SP)

Alex Giostri (O Homem Atrás do Escritor. O Escritor Atrás do Homem)



Dando prosseguimento à série de entrevistas O homem atrás do escritor, o escritor atrás do homem. A mulher atrás da escritora, a escritora atrás da mulher, nesta segunda entrevista o Singrando Horizontes conversou com o escritor, editor, roteirista, dramaturgo Alex Giostri

Alex é paranaense, mudou-se muito cedo para São Paulo, viveu por doze anos no Rio de Janeiro (1996-2008) e voltou à São Paulo, onde vive até hoje. Formou-se em Cinema, algumas pós-graduações, inúmeros cursos profissionalizantes e ingressou profissionalmente na literatura. Colaborador de jornais como Jornal do Brasil e Tribuna da Imprensa, trabalhou como diretor de filmes publicitários. Idealizou e coordenou o Projeto Novo Autor (2004). Criou seu próprio selo editorial Giostri Editor. Com o início do marca, logo ampliou os trabalhos e apresentou ao mercado o RAG Editor e o selo infantil Giostrinho, os três selos da Giostri Editora Ltda. Tem 5 livros publicados, obras teatrais, roteirista de cinema. Mais detalhes de sua biografia podem ser encontrados em http://singrandohorizontes.blogspot.com/2009/12/alex-giostri.html

INFANCIA E PRIMEIROS LIVROS

Conte um pouco de sua trajetória de vida, onde nasceu, onde cresceu, o que estudou.

Nasci em Umuarama, Paraná. Cresci em São Paulo e fui ao Rio de Janeiro aos 22 anos. Estudei Cinema na graduação e fiz algumas pós-graduações, uma de roteiro de cinema e dramaturgia. Também pesquisei sobre psicanálise e até hoje fuço sobre os mais inusitados assuntos. Minha trajetória foi um tanto confusa. Tive muitos problemas de ordem pessoal, passei pela coisa da droga, da criminalidade, da prisão. Isso no final da adolescência, começo da vida adulta.

Como era a formação de um jovem naquele tempo? E a disciplina, como era?

Peguei os anos 90, final dos anos 80. Uma geração rock/punk. Vim de família tradicional, com os problemas também tradicionais. Pai alcoólatra, mãe ressentida. Fui criado nas regras e nos limites. O prato cheio para quem quer ousar. Quebrei todos os limites e infringi todas as regras. Mas olhando hoje, noto que nada é à toa nessa vida. Tanto, que eu ter passado por tudo que passei foi imprescindível. Mexendo no baú da memória percebo que se eu não tivesse sido o que fui não seria quem sou hoje e não teria essa bagagem humana que carrego por conta das tantas pauladas que levei dessa vida.

Recebeu estímulo na casa da sua infância?

Sim. Tive uma mãe que desde pequeno me deu livros. Na época lia por ler. Não sabia que preferia o universo da ficção à realidade. Lia porque lia. Só descobri a importância dos livros da infância aos 22 anos. Entre 14 anos e 21 anos e não li quase nada. Vivi a vida da melhor e da pior maneira. Depois voltei à leitura e ao silêncio.
E não foi apenas esse estímulo. Foram muitos outros. Fui muito amado. Ainda sou. Só não sei afirmar se o amor ofertado a mim foi o que deveria ser - da maneira que deveria ser - como deve ser, mas foi amor.

Quais livros foram marcantes antes de começar a escrever.

Li muito. Comecei a escrever por necessidade. Por desilusão. Descobri um mundo mais sadio nos livros, um mundo mais interessante. Dos que me lembro, os romances de Dostoievski me fizeram muito bem. Os clássicos em geral me deram muito de beber. Sou um escritor que é fruto do que leu. Não escrevo porque escrevo. Escrevo porque li, porque leio, porque adoro criar universos a partir do que vejo ou sinto.

ALEX GIOSTRI, O ESCRITOR

Fale um pouco sobre sua trajetória literária. Como começou a vida de escritor?

Vim da leitura. Depois vim da desilusão. Passei a escrever versos para me salvar da dor, da angústia do dia a dia. Escrevia porque amava e não sabia amar. Dos versos passei à prosa, da prosa passei às crônicas e das crônicas passei às críticas em jornal, depois aos roteiros de cinema, de TV, depois passei aos textos de teatro e no meio disso tudo, passei a escrever livros. Sou um autor que acredita na palavra, no universo da ficção. Estudei e estudo as linguagens, as maneiras de dizer o que quero dizer e também as possibilidades de dizer o que quero dizer nesse ou naquele veículo. Mudam-se as formas, mas o conteúdo é o mesmo. O que importa é aquilo que eu quero dizer e a maneira que eu quero dizer. Se for para o teatro, eu adapto no cenário, na boca do ator, no gestual, na luz. Se for cinema, eu passo às imagens e aos jogos de cena. Se for TV, eu priorizo os núcleos, novamente os atores, mas desta vez a fala por si só. E se for livro, que é a que eu mais gosto, eu buscarei a voz do narrador. Hoje tenho 36 anos. Portanto, um autor jovem. Tenho muito a aprender da vida e de mim. Tenho muito a ler. Ainda não escrevi um livro que eu possa dizer: maravilha!

Como foi dar esse salto de leitor pra escritor?

Um acaso que estava escrito e eu não sabia. Olho para trás e analiso quem sou eu e não me vejo fazendo outra coisa, sendo um outro tipo de homem. Sou do universo da ficção, tenho uma pré-disposição a essa “vida dupla”, ser eu e não ser eu. Quando vi, eu estava escrevendo, quando notei um pouco mais, eu estava debruçado na teoria, quando me olhei mais a fundo haviam passado doze anos e eu estava vivendo do meu trabalho e fazendo a mesma coisa, com a mesma rotina, sem mudar nada. E, para minha surpresa, gostando e feliz.

Teve a influência de alguém para começar a escrever?

Que eu me lembre não. Tive dos autores que li. Talvez da vida e do meu inconformismo em relação a ela. Talvez da minha inabilidade em viver em sociedade e fazer parte de coisas que eu não acredito e não acreditarei nunca, pelo visto. Escrever para mim é como me salvar de algo que não me interessa. Não gosto mesmo da vida do dia a dia. Gosto da rotina, da minha rotina. E não é um paradoxo ou uma contradição, é o que é. O dia a dia inclui gente, gente e gente. A minha rotina inclui eu, o silêncio, o computador e a música. Muito mais divertido.

Tem Home Page própria (não são consideradas outras que simplesmente tenham trabalhos seus)?

Tenho. Optei por ter após ter a minha vida fuçada por leitores e jornalistas. Tudo sobre minha vida está no site. Não tenho nada escondido por aí. www.alexgiostri.com.br

Você encontra muitas dificuldades em viver de literatura em um país que está bem longe de ser um apreciador de livros?

Não encontro, mas não posso esbanjar. Vendo os meus textos, os meus roteiros, as minhas críticas. Dou aula, sou sócio de uma editora de livros. Editora que só existe porque eu quis publicar as minhas obras por mim mesmo. Sou o tipo de homem que arregaça a manga e vai trabalhar. Faço livros e vendo custe o que custar. Não tem jogo ruim comigo. Distribuo em todas as livrarias do país, cobro, vendo pra vizinha da esquina, troco nisso, naquilo, faço o que aparecer. Livro e texto são a minha maneira de ganhar a vida.

Como foi que você chegou à poesia?

Não sou um poeta. Embora eu tenha poemas escritos. Acredito no poeta de alma. Aí talvez até possa me colocar lá no final da fila, sem demagogia. Mas o poema pra mim é o desabafo. Não escrevo profissionalmente poesia. É a hora do lanche, digamos assim. E muito lento. Em 2009 eu fiz uma apenas. Sou um homem da prosa, eu acho. Risos.

SEUS LIVROS E PREMIOS

Como começou a tomar gosto pela escrita?

Escrevo para me salvar do mundo e das pessoas. Escrever livros me toma tempo, estudo, pesquisa. E isso me tira da circulação. E eu adoro e sou um adepto da reclusão, ainda que ultimamente esteja vivendo em São Paulo e adoecido de corpo e alma pelo tumulto dia e noite.

Em que se inspirou em seus livros?

Tenho cinco livros publicados. Dois voltados para autores, sob a ótica da filosofia e da psicanálise, um voltado para atores, sob a ótica da identidade e da sua construção, um de contos, que é gênero fantástico, surreal, onde trato muito do universo da perversão e um sobre relação, sob a ótica da psicanálise também, esse com uma estrutura dramatúrgica entrelaçando a obra em prosa.

Como definiria seu estilo literário?

Ainda o procuro. Mas espero que eu vá para o campo da ficção, da novela, da estrutura formal clássica e talvez com um pouco dessa modernidade dita contemporânea. Acredito nos diálogos, creio que facilita a vida do leitor. Mas não acredito no leitor burro, acredito no leitor despreparado. Mas quem é despreparado pode se preparar, se quiser, ou for bem orientado.

Quais foram os livros que escreveu?

Componentes fundamentais para um texto ficcional.
Do pensamento para o papel
A/C do Ator – tratado sobre a profissão
Meninos
Afeto Amor e Fantasia

Dentre os seus livros escritos, qual te chamou mais atenção? E por quê?

Cada livro tem a sua história. O meu gozo é momentâneo. Gosto do livro que escrevo no ato da escrita e no processo de revisão. Ao publicá-lo, ele se transforma num produto de compra e venda e passa a ser de interesse público, ou não. O que eu não gosto mais é o do Ator. Preciso revê-lo urgentemente. Mas dos outros, gosto de todos.

Que acha de sua obra?

Acho-a respeitável. Aceitável.

Qual a sua opinião a respeito da Internet? A seu ver, ela tem contribuído para a difusão do seu trabalho?

Creio que sim. A internet facilita tudo.
Tem prêmios literários?

Tenho um de dramaturgia no ano de 2005. Um texto teatral chamado QUASE. Num concurso nacional.

CRIAÇÃO LITERÁRIA

Você precisa ter uma situação psicologicamente muito definida ou já chegou num ponto em que é só fazer um "clic" e a musa pinta de lá de dentro? Para se inspirar literariamente, precisa de algum ambiente especial ?

Preciso da melancolia para criar. Preciso do silêncio, da solidão. Tenho uma necessidade de me sentir esquecido, abandonado. Talvez algum conflito mal resolvido. Mas essa solidão, esse esquecimento me fazem muito bem, me deixam à mercê da vida e assim eu parto pra um novo universo no papel. Escrevo por encomenda também. E não sinto a menor dificuldade. O que digo é o ideal, mas nem sempre podemos ter o ideal.

Você projeta os seus livros? Ou seja, você projeta a ação, você projeta o esquema narrativo antes? Como é que você concebe os livros?

Nunca escrevi um romance, nem mesmo uma novela literária. Do livro de contos, todos partiram de uma situação, de um telefonema, de alguém que eu vi na rua. Eu pego a situação e imediatamente a transformo e a escrevo dentro de mim, depois vomito no papel e passo à construção. Os textos teatrais são mais pensados. Penso o que eu quero falar e como quero apresentar isso ao espectador. Feito isso, defino o tempo que quero contar a trama, tempo cronológico e desenho a estrutura no papel e na cabeça.

Você acredita que para ser escritor basta somente exercitar a escrita ou vocação é essencial?

Há de se ter uma pré-disposição à coisa. O exercício é fundamental. Mas penso que não é tão simples assim. Penso que se tudo vai bem, que se a vida é linda e maravilhosa, se tudo que eu quero está ali, aos meus pés, se o meu mundo é idêntico ao mundo da novela das 21h, não há porque eu escrever nada. O autor, geralmente, tem essa inconformidade em alguma parte. E é dela que partem as ideias e as histórias. O autor nasce do leitor, do bom leitor, do leitor esfomeado não pela história, mas pelas palavras da história, pelas frases da história, pelos parágrafos da história, pelos capítulos.

Como surge o momento de escrever um livro?

Eu venho desenhando sempre novas ideias, mas não tenho conseguido levá-las adiante por conta da editora. Mas o momento ideal é aquele que você para tudo e se dedica à obra. Meu desejo é escrever uma obra anualmente. Em 2009 eu não consegui. Vamos ver esse ano.

Quanto tempo você leva escrevendo um livro?

Em 2008 eu escrevi AFETO AMOR E FANTASIA. Desenhei os capítulos e os tópicos de cada capítulo em março e passei às pesquisas. Em setembro, com tudo pronto, iniciei a obra com cronograma. Só trabalho com cronograma. Tantas páginas por dia. Nem mais nem menos. Em 28 dias o livro estava pronto para revisão. Depois mais vinte dias ele estava revisado e aprovado. Depois mais 20 dias ele estava diagramado e em seguida publicado.

Como foi o processo de pesquisa para a escrita de seus livros?

A cada tema eu tenho um processo de pesquisa. Mas sou um autor que acredita na pesquisa. Não acredito no genial. Creio no trabalho de pesquisa de campo mesmo. Existe o tempo da definição do tema, o tempo da pesquisa e o tempo da escrita.

No processo de formação do escritor é preciso que ele leia porcaria?

Fundamental que leiam textos ruins. Para minha formação de dramaturgo, eu idealizei um projeto no Rio de Janeiro em 2003 onde recebia textos teatrais de autores para leituras públicas. Recebi pra lá de 300 textos. E resenhei todos. Muitos bons, mas muita porcaria. O meu tradicional é ler duas ou três bombas e uma obra genuína. Com isso vou aprimorando o olho para as ciladas. Na editora leio muita bomba, mas recebo muitas obras interessantes. E, quando quero lavar a alma e os olhos, vou à livraria e compro uma obra genuína, um clássico, um autor brasileiro que admiro, alguma obra que eu possa ler e dizer: nossa, mas que maravilha!

ESCRITORES E LITERATURA

Mas existe uma constelação de escritores que nos é desconhecida. Para nós, a quem chega apenas o que a mídia divulga, que autores são importantes descobrir?

Por trabalhar diretamente com autores há muitos anos, conheço os nomes que nunca foram publicados. É uma resposta dolorosa, mas falta que esses autores acreditem em si e ponham a mão na massa. Ora, se é uma necessidade, um sonho, se é muito importante para o autor e ele acredita em si próprio é fundamental que ele não espere de ninguém, que ele encare isso como um desafio mesmo. E dizer que é difícil. Pergunto: o que é fácil? Nada. E fracassar é melhor do que não tentar. Digo por mim. Ninguém me deu nada. Não sou tão bom assim. Sou apenas um cara que correu e corre atrás do que quer. Não meço esforços. E, ainda não estou lá onde quero estar: num sítio sossegado escrevendo um livro por ano. Trabalho e luto hoje para isso. Apenas para isso. Preciso se segurança e tranquilidade financeira. Por este motivo estou na luta do pão nosso de cada dia.

Na sua opinião, livro ou livros da literatura da língua portuguesa deveriam ser leitura obrigatória?

Ler não deve ser obrigatório. Ler é prazer. E o grande mal da educação é acreditar que obrigar a ler fará do pequeno cidadão um leitor. Pergunta a todos: por que um jovem deve ler em casa se ao chegar lá a mãe não lê e o pai também não? Por que ele deve ler se o professor que o obriga a ler o livro também não leu?

Qual o papel do escritor na sociedade?

O papel utópico do escritor na sociedade é tentar melhorá-la, transformá-la. Mas o papel real do escritor na vida de hoje é tentar com as suas crenças e com a sua literatura apresentar uma nova maneira de viver ou vir a vida. Está na hora de alguns escritores descerem do salto alto e compreenderem quem são os leitores, quem deve ler e para quem de fato se deve escrever. O que adianta frufruzar nas palavras, nas organizações das frases, na sintaxe do todo? As pessoas não leem, não podem comprar livros, não são educadas a lerem; ao pegarem uma obra de um autor desses, não entenderá nada e dirá: não gostei. Ninguém diz: não entendi. Vai logo para o não gostei.
O papel do escritor, portanto, é resgatar o leitor a qualquer custo. É deixar de fazer caras e bocas. O escritor é um homem como outro qualquer. É um funcionário da sociedade e de si mesmo.

Há lugar para a poesia em nossos tempos?

Há lugar para tudo e todos. Mas quero saber onde estão os verdadeiros poetas. Os poetas de alma, aqueles que se importam com as palavras e nada mais.

O ESCRITOR, PESSOA HUMANA

O que te choca hoje em dia?

O mundo me choca. As pessoas me chocam.

O que você lê hoje?

Leio textos de autores a serem publicados diariamente. Leio obras que me interessam na medida em que consigo um tempo. Ouço notícias. E não leio mais jornal impresso. Não me interesso mais pelas notícias ruins.

Você possui algum projeto que pretende ainda desenvolver?

Sim, muitos.

De que forma você vê a cultura popular nos tempos atuais de globalização?

Somos ferramentas da sociedade. Cada um na sua, fazendo a sua parte. Atingimos a minoria, mas estamos aqui e não iremos parar de fazer o que gostamos - pelo menos eu.

CONSELHOS AO NOVO ESCRITOR

Que conselho daria a uma pessoa que começasse agora a escrever ?

Leia. Mas leia mesmo. Esqueça o computador. Vá ler livro. Não tem dinheiro para comprar livros? Vá às bibliotecas. Assista aos filmes clássicos, veja peças de teatro. Estude a sua língua, a língua portuguesa. Compreenda o significado das palavras. E, sobretudo, se interesse mais pelo outro, pelo seu vizinho, pelo seu amigo, saiba mais um pouco da visão de mundo das pessoas que te rodeiam.

E para encerrar a entrevista

Se Deus parasse na tua frente e lhe concedesse três desejos, quais seriam?

Se parasse aqui, agora, nesse instante, terça-feira, dia 19 de janeiro de 2010, eu pediria que me desse uma paz interior eterna, que retirasse definitivamente alguns defeitos de estimação que me incomodam e que não consigo me livrar e por fim que me deixasse ganhar numa dessas mega-sena acumuladas para eu ir para o fim do mundo me dedicar apenas ao silêncio e às palavras novamente.

Fonte:
Entrevista virtual realizada por José Feldman para o Singrando Horizontes.

Delasnieve Daspet (Caderno de Poesias I)


Frente a Frente

Eis-nos. Frente a frente.
O mundo é redondo.
Um dia poderia acontecer.

Te fitei de longe.
Ao teu lado, em teus braços,
outros braços, não os meus;
Outro corpo, não eu!

Até este momento não tinha me dado conta
de como é desconcertante olhar alguém
que já havia sido paixão.

Estavas bem à minha frente
- alheio a minha pessoa -
sem perceber minha emoção.

E eu te adivinhava.
Teus pensamentos. Teus gostos.
Teu cheiro. Teu hálito.
Tiques.... sabia tudo de ti!

Eis-nos!
Tu, eu e ela.
A uma curta distância,
tão longe e tão perto.
Tudo em ti ocupado:
o coração e o lugar ao lado!

Sempre pressenti que nada havia
mas pensei que poderia mudar
o curso da história.

Continuei fitando sem ver...
Buscava respostas que não existiam:
Porque não tinha dado certo?
Porque - nuvens negras?
Porque - o impedimento?
Porque - a indiferença?

Te encontrar fez-me recordar
das saudades e do querer - outra vez....
Vi que os fantasmas ainda estão insepultos!
...Talvez não tenha havido um grande amor....

28-07-03 - Campo Grande MS

Ondas no Tempo.

Como uma pedra
Que se joga no rio
Venho formando ondas no tempo.

Nada importa.
Onde eu vá
Sempre estarei sozinha.

Já não pertenço a lugar algum.
Tudo que me resta são sonhos.
Agora é tarde para mudar,
- Está tudo feito! -
A chuva continua caindo.

Chuva fina e constante.
Olho a chuva,
Não suporto mais vê-la cair...

Findou o inverno
E a primavera com seus brotos e flores
Já surge nas árvores,
Na curva dos dias de sol.

Repouso minha poesia e meu canto
Numa quimera!
Caminho ao teu encontro,
Beijarei tua boca cheia de palavras,
E a saudade líquida fluirá rolando face afora.

05-10-2002 - Campo Grande MS
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Fonte:
Colaboração da Poetisa.