quinta-feira, 12 de março de 2020

Paulo Mendes Campos (Automóvel: Sociedade Anônima)


Se você quiser, compre um carro; é um conforto admirável. Mas não o faça sem  conhecimento  de  causa,  a  fim  de  evitar  desilusões futuras. Saiba que está praticando um  gesto  essencialmente  econômico; não para a sua economia, mas para a economia coletiva. Isso quer dizer que, do ponto de vista comunitário, o automóvel que você adquire não é um ponto de  chegada, uma conquista final em sua vida, mas, pelo contrário, um ponto de partida para os outros.

Desde que o compre, o carro passa a interessar aos outros, muito mais que a você mesmo.

Com o carro, você está ampliando seriamente a economia de milhares de pessoas. É uma espécie de indústria às avessas, na qual você monta um engenho não para obter lucros,  mas para distribuir seu dinheiro para toda a classe de pessoas:  industriais europeus, biliardários do Texas, empresários  brasileiros, comerciantes, operários especializados, proletários, vagabundos, etc.

Já na compra do carro, você contribui para uma infinidade de setores produtivos, que podemos encolher ao máximo nos seguintes itens: a indústria automobilística propriamente dita, localizada no Brasil, mas sem qualquer inibição no que toca à remessa  de  lucros  para  o exterior; os vendedores de automóveis; a siderurgia; a petroquímica;  as fábricas de pneus e as de artefatos de borracha; as fábricas de plásticos, couros, tintas, etc.; as fábricas de rolamentos e outras autopeças; as fábricas de relógios, rádios, etc.; as  indústrias de petróleo e muitos de seus derivados; as refinarias; os distribuidores de  gasolina, as oficinas mecânicas; as lojas distribuidoras de autopeças; o Estado (através do tributo).

Você já pode ir vendo a gravidade do seu gesto: ao comprar um carro, você entrou na órbita de toda essa gente; até ontem, você estava fora do alcance deles; hoje, seu transporte passou a ser, do ponto de vista econômico, simplesmente transcendental. Você é um  homem economicamente importante para  os  outros. Seu automóvel é de fato  uma sociedade anônima, da qual todos lucram, menos você.

Mas não fica nisso; você estará ainda girando numa constelação menor, miúda mas nada desprezível: a dos recauchutadores, eletricistas, garagistas, lavadores, olheiros, guardas de trânsito, mecânicos de esquina. Você pode ainda querer um  motorista ou participar de  alguma das várias modalidades de seguros para automóveis. Em outros termos, você continua entrando pelo cano. No fim deste, há ainda uma outra classe: a dos ladrões, seja  organizada em sindicatos, seja a espécie de franco-puxadores.

As perspectivas de suas relações com os diversos setores supracitados são as seguintes:  você pode ter sorte com o carro adquirido, mas pode também ter azar; as oficinas mecânicas boas ou más, sempre lhe arrancarão um máximo de tutu com um mínimo de  esforço; as fábricas de autopeças exploram os vendedores, os vendedores apelam para você; nos postos de gasolina, a lubrificação de seu carro pode ser malfeita, o óleo pode não ser trocado, e na própria gasolina você pode ser lesado; uma oficina pode também  causar a seu motor um dano irremediável ou trocar uma peça boa por uma peça ruim;  o  recauchutador pode dizer-lhe que seus pneus não prestam mais, a fim de vender-lhe pneus novos, e recauchutar os velhos para vendê-los a terceiros; o garagista e o mecânico poderão de vez em quando dar uma voltinha no seu carro, estando você de sorte se a batida que ele der for de pouca monta; o mecânico de esquina, muitas vezes indispensável, é prejuízo  certo; o lavador jamais cumpre o trato de fazer o trabalho todos os dias; o guardador, se não for muito bem gorjeteado, reserva para você as  piores vagas e manobra com o seu carro como se fosse um tanque de  guerra;  se você tem motorista, considere-se não o proprietário, mas o sócio dum automóvel: são os motoristas os melhores filhos, sobrinhos, netos, pais, tios e primos do Brasil, estando a todo momento  precisando de visitar esses parentes enfermos; o guarda de trânsito, se é honesto  capricha na multa; caso contrário, capricha na facada; as companhias de seguros são ficções: no momento em que você bateu, ou foi batido por um motorista que tenha seguro  contra  terceiros,  há  de aprender dolorosamente que o valor dos contratos dessa natureza é  muito relativo. Uma choldra, para dizer tudo.

Restam ainda os ladrões ou os outros ladrões: arrombam-lhe o carro, carregam pneus sobressalentes, espelhos, ferramentas, calotas, aros, rádio, antena, objetos deixados no porta-luvas e, pior que tudo, os documentos. Às vezes levam o carro todo; a polícia lhe dirá  que não dispõe de meios para prender o ladrão.

Como proprietário de automóvel, você ainda terá relações  com outras pessoas; com o Serviço de Trânsito, que poderá, entre outras picardias, esvaziar seus pneus; com os colegas motoristas, que  preferem bater no seu para-lama a  dar  uma  marcha  à  ré  de  meio  metro;  com pedestres e ciclistas imprudentes; com as crianças diabólicas que riscam a sua pintura, sobretudo quando o carro está novinho em folha; com os sujeitos que só dirigem de farol alto; com os barbeiros de qualidades diversas, alguns mortais; com a juventude transviada; com parentes e amigos, que o consideram um sujeito excelente ou ordinário, conforme sua subserviência à necessidade deles.

Poderia escrever páginas e páginas sobre o  automóvel  que  você comprou ou vai comprar, mas fico por aqui: tenho de tomar um táxi e ir à oficina para ouvir do mecânico que o meu carro ainda não está pronto. De qualquer forma, não desanime com minha crônica: paga a pena ter carro, pois ser pedestre, embora mais tranquilo e mais  barato,  é  ainda  mais chato. A não ser que você tenha chegado, com Pascal, à suprema descoberta: a de que todos os males do homem se devem ao fato de ele não ficar quietinho no quarto.

Fonte:
Paulo Mendes Campos. Supermercado. RJ: Tecnoprint, 1976.

quarta-feira, 11 de março de 2020

Varal de Trovas n. 205


Rachel de Queiroz (O Rádio)


Sei que o homem desembarcar na Lua foi o fato mais importante do século — e quem sabe até da história do mundo. Mas a divulgação do rádio transistor teve um  alcance muito maior, em sentido imediato.

Não conheço outra criação do progresso que possuísse tal capacidade de penetração nem fosse tão rapidamente aceita pelas populações mais atrasadas. Máquina  de costura, luz elétrica, agulha de injeção, tudo isso espalhou-se depressa e profundamente — mas não chega aos pés do rádio de pilha. Até do motor a explosão o rádio ganha, por causa da sua acessibilidade. Todo o mundo pode sonhar com um carro, até índio, — mas adquiri-lo já é outra coisa. Enquanto o rádio está praticamente ao alcance de todos até do índio, também.

No sertão mais escondido, em barrancas secretas de rio por Amazonas e Goiás, em serranias perdidas, em campinas longe do mundo, se a gente avista uma casa de  caboclo, de colono, de pioneiro emigrante, nove casos em cada dez, verá, por cima do telhado rústico, de cumeeira a cumeeira, o fio de cobre da antena do rádio.

Dentro da casa haverá um tamborete, um pote, um fogão de barro, nada mais. Porém em cima de um caixote improvisado em mesa, trepado num caritó na parede da sala, quase infalivelmente você verá um rádio. Tocando o dia inteiro as suas musiquinhas de dois vinténs (e por isso matando a velha e preciosa música folclórica), espalhando notícias e — essa, sim, é a sua contribuição mais importante — servindo de elo de ligação entre  populações distantes que não têm entre si outro veículo de comunicação, dando recados, pedindo notícias, acusando cartas, servindo de correio gracioso aos que não  têm outro correio ou, tendo-o, não sabem como usá-lo.

Rara é a estação de interior — rara não, acho que não há mesmo nenhuma que deixe de ter a sua “hora sertaneja” ou ‘‘alô, sertão”, ou ‘‘mande o seu recado’’  ou outro programa equivalente. E comove a gente ouvir o trançado das informações e avisos — “Dona Maria de Tal, fazenda Carnaúba, sua filha manda dizer que o menino operou-se e vai se salvar”. “Seu Raimundinho Nonato, do sítio Pacavira, avisa à família que perdeu o trem ontem e agora só pode ir na semana que vem.” “Rosélia do Putiú, Baturité, avisa aos irmãos Ribamar e Vicente, na Barra do Ceará, que a mãe faleceu repentinamente, o enterro é hoje mesmo.”

A princípio se estranha como é que chegam a destino aquelas comunicações perdidas, sem horário certo. Depois se entende — os rádios estão sempre ligados, sempre  tem em casa uma pessoa que escuta as mensagens. Ao ouvir um nome conhecido, arrebita a orelha, presta atenção e passa adiante o recado a quem interessa. É raríssimo perder-se um comunicado ou chegar ele com atraso. Sempre alguém por perto escutou.

E pode faltar na casa o dinheiro para o fumo ou o café, para a rede nova, para o corte de pano da mulher, mas não faltará para o carrego do rádio — ou seja,  carga de pilhas do aparelho. E também, sendo o rádio objeto de tão indispensável presença em todos os lares, e sendo quase sempre escasso o dinheiro em moeda corrente, os rádios são negociados nas barganhas mais singulares: um rádio novo por dois bacorinhos, um saco de milho e meia arroba de algodão; um rádio velho, já passado por muitas mãos, por um amarrado de frangos e um relógio de pulso com corda quebrada; um rádio ainda mais ou menos por tantos dias de serviço, uma lanterna de pilha sem carrego e uma ninhada de ovos de galinha indiana... Qualquer negócio vale, contanto que o rádio venha; pois é da nossa natureza, mesmo entre os mais esquecidos e abandonados dos seres, esse desejo e esse orgulho de pertencer — (nem que seja através de uma voz distante dentro de uma caixa de plástico) —, de fazer parte, de se integrar na comunhão dos homens.

Fonte:
Rachel de Queiroz. As Menininhas e outras crônicas. RJ: J. Olympio, 1976.

Calazans Alves D’Araújo (Baú de Trovas)


Ao ver-te colhendo flores,
tive esse desejo vão:
transformar-me numa flor,
para estar em tua mão.
- - - - - –

É meu peito uma gaiola
vazia, sem passarinho.
Ah! Se eu pudesse, menina,
guardar nele o teu carinho!
- - - - - –

Este nosso velho mundo
já não está prestando mais:
rapaz querendo ser moça…
moça a querer ser rapaz...
- - - - - –

Eu sou como aquele ramo
da roseira, que ficou
muito triste, sem a rosa
que mão perversa arrancou.
- - - - - –

Eu sou seu, você é minha,
somos os dois – galho e flor
juntinhos, amando e rindo,
felizes no nosso amor.
- - - - - –

Invejei aquele feio
e miserável mendigo
que te pediu uma esmola…
(e eu nunca falei contigo!)
- - - - - –

Nasci no Brasil: me orgulho
de ser daqui do Nordeste,
onde as mulheres são lindas
e os homens cabras-da-peste.
- - - - - –

O beijo da nossa linda
morena pernambucana,
é gostoso como o mel
feito da cana-caiana.
- - - - - –

O vento desfolha as flores,
jogando-as no pó do chão.
Fez assim com os meus amores
a cruel ingratidão.
- - - - - –

Quando Ziza por mim passa,
eu me ponho a suplicar:
- Nossa Senhora da Graça
não deixe Ziza casar…
- - - - - –

Quanto mais galopa o tempo,
corre veloz, vai-se embora,
mais meu coração te ama,
busca e quer, muito te adora.
- - - - - –

Que desejo extravagante
este do meu coração:
querer ser o travesseiro
onde dorme Conceição!
- - - - - –

Quem fez o céu tão bonito,
a floresta, o campo, o mar,
não devia ter-me feito
para sofrer e chorar.
- - - - - –

Que tenho sido na vida?
No mundo, que tenho sido?
— Um velho barco perdido
numa enseada esquecida...
- - - - - –

São meus olhos dois mendigos,
dois miseráveis plebeus,
pedindo, ao bater-te à porta,
uma esmola aos olhos teus.
- - - - - –

— Tão longe! — disseste olhando
o céu. Eu disse: Tão perto!...
Falei do céu de teus olhos,
alegrando meu deserto...
- - - - - -

Tu gostas de minhas trovas,
eu gosto do teu olhar.
Foi por causa dos teu olhos
que eu aprendi a trovar.
 - - - - - –

Vendo da mulher o riso
Diz a feroz onça preta:
- Não torço esse meu sorriso
por essa horrível careta.
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Calazans Alves D'Araújo nasceu em 1902 e faleceu em 1976. Residia em Catende/PE. Poeta e trovador. Professor em diversas cidades do Pernambuco. Publicou em 1961 um livro intitulado "Ao Doce Embalo da Rede", trovas e em 1973, “Flauteio do Sabiá”.

Fontes:
– Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Ed. Minerva.
– Calazans Alves D’Araújo. Ao doce embalo da rede.

Monteiro Lobato (Anta que berra)


História propriamente não é o que vou contar, mas simples episódio — coisa de um aparte inocente que atrapalhou a façanha narrada pelo meu saudoso amigo major Pedro Falaverdade, de Itaquaquecetuba.

Apesar de grande caçador o meu amigo não mentia: atrapalhava-se às vezes, confundia uma caçada com outra: mas mentir deliberadamente, como a maioria dos devotos de são Huberto, isso nunca! Para narrar feitos venatórios não havia outro; imitava ao vivo os cães na acuação, os anseios da espera, a corrida, o tiro, levando o naturalismo a ponto de reproduzir até o estrebuchamento final da caça ferida, para o que se atirava ao chão e tremelicava de pernas entre roncos e arquejos de animal agonizante.

É impossível reproduzir as suas histórias com o encanto que lhes emprestava a mímica pitoresca e o seu maravilhoso estilo técnico de caçador encanecido nas lides cinegéticas. Além disso, confesso aqui à puridade, não sou literato; não fiz versos aos vinte anos e nem sequer coloco decentemente os pronomes. Mas vamos ao caso.

Por uma tarde modorrenta de agosto o major narrava-me em sua fazenda a mais bela proeza da sua vida:

— Caçada de que me orgulho — dizia ele —, como Napoleão se orgulhava de Marengo. Passou-se o feito nos sertões do Peripipeva, Serra do Mar, às margens do Itaguaçu. Para encurtar caminho e não amolar os leitores, começo do meio.

Fale o major:

— ... E aí soltei a cachorrada. O Vinagre, como sempre, rompeu na dianteira. Cachorro fantasista, amigo de contemplações, pegou logo de namoro com os tangarás, e moita — não correu. Olho Verde, Molho Pardo e Tatuíra, esses afundaram firmes por uns carreiros velhos.

“Mozart partiu por último, depois de um consciencioso farejo pela beira do rio.

“Mozart! Que cachorrão! Era o mestre da matilha e único que fazia fé. Os outros às vezes negavam fogo, mentiam, perdiam a caça ou mudavam de rastro. Mozart, nunca!

“Sóbrio, comedido, de poucas vozes, mas certo como um relógio. Quando ele acuava, eu me punha a postos, que era caça, na certeza matemática; e conforme o número de acuos, já de antemão eu sabia que animal levantara. Um sinal, paca; dois, veado; três, porco; quatro, anta.

“Aos bichos vagabundos, irara, cutia, coati, ouriço, ele magoava com o silêncio de um desprezo olímpico.

“Nesse dia, a primeira voz que me chegou aos ouvidos foi a acuação do Olho Verde. Não fiz caso. Olho mentia como um cachorro.

“Depois latiu a Tatuíra. Era mais sério. Tatuíra, por Mozart e Minerva, herdara do pai as sólidas qualidades de mestre, prejudicadas, porém, por umas excentricidades histéricas da mãe, que, coitada, morreu hidrófoba. E assim, como chienne souvent varie, eu que estava deitado de papo acima sob a copa de um ingazeiro marginal ergui-me, mas só nos cotovelos.

“Nisto acuou Mozart — au, au, au, au: — anta! De um pulo pus-me na espera, atento. Logo depois os latidos amiudaram e percebi que todos os cães, exceto aquele tranca do Vinagre, corriam no calcanhar da anta.

“Como você sabe, corrida de anta no mato é um castigo. Não há barulho igual. Anta acuada mete-se num trote rompente por meio dos tramados, e vara caminho em linha reta, amassando o reino vegetal como um tanque de carne.

“E por isso enche a floresta de uma barulhada infernal, de fazer pequeno o coração do caçador novato.

“Vinha para meu lado a bicha, margeando o rio. O estrépito das taquaras rachadas, e da galhaça feita em lascas, crescia de vulto rapidamente. Eu postei-me em posição de fogo, no eixo de um valado, onde forçosamente ela havia de entreparar, e engatilhei a Lafourché, bem encaroçada de paula-sousa.

“Au! au! au! Estava a bicha a coisa de cem metros; mais minuto e rompia na clareira onde a esperava o meu tiro. O barulho fez-se atroador! Parecia um furacão do inferno em trabalhos de arrasar a floresta! Os taquaruçus rebentavam com estampidos de bomba; e embaúvas de foice gemiam estaladas nas sapopembas. Vinte metros! O fragor já ensurdecia os meus ouvidos. Dez passos! Só tinha o monstro de vencer um moitão de taquaruçus para cair no limpo da espera. Bá, bá, tá, tá — a moita estremeceu, rasgou-se, estrondeante, e uma anta cascuda, que mais parecia um rinoceronte, rompeu da tranqueira verde e estacou apalermada à beira do valo. — Eu — pum! pum! — tiro de barragem no pé do ouvido. Ela moleou o corpo e sumiu o corpanzil para dentro do buraco, estrebuchando, e lá desferiu um berro que parecia fim do mundo!”

Neste ponto eu interrompi o major com um aparte inocente:

— Será que anta berra, major?

O homem vacilou um segundo, mas tomando pé incontinenti disse:

— Ora, que diabo! Estou confundido. Não era “propriamente” anta o que eu caçava nesse dia, era um veado! É isso mesmo, um lindo veado-catingueiro…

Mas, como ia dizendo, o veado berrou e eu…

O veado berrou e o major continuou a história da maior façanha da sua vida com uma impavidez que é privilégio dos heróis. E eu tive lado de verificar quanta razão assistia ao povo em tê-lo na conta do caçador mais verídico da zona. O major positivamente não mentia, confundia apenas uma caçada com outra, por defeito de memória, coisa aliás desculpável em quem já trazia sobre si o peso de sessenta janeiros. Agora que o meu pobre amigo jaz a dormir o derradeiro sono, presto aqui a homenagem desta confissão às altas qualidades do seu espírito superiormente fidedigno.

Fonte:
Monteiro Lobato. Cidades Mortas.

Silmar Böhrer (Gamela de Versos n. 8)


Agatha Christie (Resenha de Livros) 2


O Segredo de Chimneys
The Secret of Chimneys


No magnífico palácio de Chimneys morre assassinado o monarca de um país dos Bálcãs. Somam-se ao crime o desaparecimento de um manuscrito revelador de importantes segredos de Estado, o roubo de uma coleção de cartas comprometedoras e a existência de um valioso diamante escondido no palácio. Ao redor destes fatos misteriosos movimentam-se os principais personagens do romance: o simpático e corajoso aventureiro, cuja identidade é enigmática, Anthony Cade, que traz o manuscrito da África; a atraente Lady Virginia Revel, que, com a ajuda de Anthony oculta o cadáver de um chantagista; um célebre ladrão, o “Rei Vítor”, que procura apoderar-se do valiosíssimo diamante; o alto e pomposo funcionário do Foreign Office, George Lomax; o colecionador de livros raros H. Fish, que de livros sabe muito pouco; o magnata Isaac Stein, que quer explorar o petróleo balcânico; o inteligente e imperturbável superintendente Battle, da Scotland Yard, que sempre sabe mais do que aparenta; e por fim, o velho proprietário de Chimneys, Lord Caterham, que só pretende, inutilmente, que o deixem em paz, e no qual a romancista concentrou seu característico sentido de humor.

O valente Anthony Cade voltou à Inglaterra depois de mais de 20 anos com a missão de entregar as memórias do Conde Stylpitch à uma determinada editora e cartas de um falecido chantagista a Virginia Revel. Todos querem se apoderar do manuscrito que revela segredos que o governo inglês por anos abafou além do esconderijo de um valioso diamante roubado pelo Rei Victor. Logo o manuscrito e as cartas são roubadas e Anthony ajuda Virginia a esconder da polícia o cadáver encontrado na casa dela. Na mesma noite, o príncipe da Herzoslováquia é assassinado em Chimneys. Nesse ambiente de mistério, o Coronel Battle contará com a ajuda de Cade para desvendar esses assassinatos, recuperar o manuscrito, encontrar os Camaradas da Mão Vermelha que queriam a morte do príncipe e descobrir qual hóspede do palácio de Chimneys é o famoso Rei Victor.

O Assassinato de Roger Ackroyd
The Murder of Roger Ackroyd


O assassinato do rico Roger Ackroyd, morto a punhaladas com uma adaga tunisiana, é a terceira de uma série de estranhas mortes, que despertam a atenção da solteirona e sagaz Caroline Sheppard, irmã do médico da cidade e narrador deste romance. Intrigada, Caroline resolve investigar o caso e descobrir se as três mortes têm alguma ligação. Para isso, ela conta com a ajuda de seu novo e excêntrico vizinho: o detetive belga Hercule Poirot. Escrita em 1926, O Assassinato de Roger Ackroyd é uma das mais famosas histórias da rainha do mistério.

Provavelmente o melhor de todos os livros da célebre escritora, onde Hercule Poirot elucida inacreditavelmente o assassinato de Mr. Ackroid, que estava prestes a descobrir a identidade do chantagista de sua falecida amante, achando onde menos se podia esperar o autor desta morte terrível.

Os Quatro Grandes
The Big Four


O número 1 é Li Chang Yen, o cérebro, a força controladora. O número 2 é o dinheiro, o poder da riqueza. O número 3, uma mulher francesa, é o conhecimento. O número 4, “O Destruidor”. Unidos para dominar o mundo, eles fundam uma organização secreta - os Quatro Grandes - que passa a cometer vários assassinatos e violentos atentados terroristas. A audácia ilimitada do grupo assusta até mesmo Hercule Poirot. O detetive belga, ajudado pelo fiel amigo Capitão Hastings, vai ter que usar todas as suas pequenas células cinzentas para desvendar um dos mais misteriosos casos criados pela dama do suspense.

O Mistério do Trem Azul
The Mystery of the Blue Train


Uma jovem encantadora, filha de um milionário, é estrangulada com um pedaço de cordão preto em sua cabina no luxuoso trem azul. A princípio o assassinato parece ter sido obra de um ladrão comum. Mas o detetive belga Hercule Poirot não acredita nesta hipótese e descobre que, entre os amigos da vítima, está um criminoso conhecido como “O marquês”. Seguindo esta única pista, Poirot tem que desvendar a identidade do assassino antes que o trem chegue na última estação.

O Mistério dos Sete Relógios
The Seven Dials Mystery


Sete esferas referentes a sete relógios constituem o cerne desta misteriosa aventura, que envolve uma extravagante organização secreta e põe em cena três deliciosos personagens de Agatha Christie: o esperto superintendente Battle da Scotland Yard, o simpático Lorde Caterham, dono do célebre palácio de Chimneys, e sua encantadora e corajosa filha Eileen. Juntos, eles vão ter que enfrentar um dos mais hábeis e cruéis assassinos de que já se teve notícia, criado pela imaginação inesgotável da “velha dama” britânica.

Sócios no Crime
Partners in Crime


Em Sócios no Crime, Tommy e Tuppence, dois jovens aventureiros, donos da Agência Internacional de Detetives, veem-se envolvidos na mais fantástica série de aventuras. Para cada caso a ser solucionado, usam o estilo de um famoso e grande detetive: as artimanhas do padre Brown, a irônica e bem-humorada inteligência de Sherlock Holmes, a inigualável sutileza do genial Hercule Poirot. São 23 histórias de tirar o fôlego de qualquer leitor, conduzidas pela inconfundível habilidade de Agatha Christie em criar, a partir do banal e corriqueiro, as situações mais extraordinárias.

Assassinato na Casa do Pastor
Murder at the Vicarage


“Qualquer pessoa que matasse o coronel Protheroe estaria prestando um grande serviço ao mundo”. Pronunciadas incidentalmente pelo pastor Clement, estas palavras, para surpresa de todos, logo viriam a se tornar realidade: o coronel é encontrado assassinado… na casa do próprio pastor. Mas para a sorte de Clement e azar do verdadeiro culpado, entra em cena a simpática velhinha Miss Jane Marple. Com apenas duas armas - um conhecimento profundo da natureza humana e um formidável poder de observação - ela descobre a verdadeira identidade do assassino, surpreendendo os moradores da pequena St. Mary Mead.

Fonte:
http://users.hotlink.com.br/pmgi/agatha/index.html

terça-feira, 10 de março de 2020

Varal de Trovas n. 204


Manuel Antonio de Almeida (As Flores e os Perfumes)


Lenda Oriental

Numa hora de ciúme o sultão Abdul foi encontrar-se no quiosque do lago com a sultana Djali, causa de seus tormentos.

Achou-a brincando tristemente com um pendão de flores. Sentou-se junto dela, tomou a guzla que ela há pouco tinha deixado, e ao som de sua toada melancólica cantou-lhe o seguinte:

“A princípio as flores eram todas brancas e não tinham perfume.

“O sol enamorou-se delas, e, nos raios com que as beijava, mandou-lhes as cores de que cada uma se vestiu.

 “As que se abriam ao amanhecer para receber do horizonte seu primeiro olhar ficaram com as cores da aurora;

 “As que lhe mostravam os seios quando ele estava no ponto mais elevado do céu ficaram rubras pelo fogo de seus beijos nesses momentos de triunfo;

“As que lhe esperavam na hora do ocaso para sorrir-lhe um adeus de saudade ficaram com as cores desmaiadas e melancólicas do crepúsculo.

 “Os perfumes eram silfos que vagavam no espaço, transparentes e invisíveis; brincavam com as brisas, adormeciam no seio das nuvens brancas, corriam pela superfície dos lagos, dos mares e dos rios.

 “Ora, os perfumes, depois que viram as flores tão garridas com as novas cores, enamoraram-se também delas, e, ocultos nas gotas do orvalho da noite, vinham beijá-las ao desdobrar dos botões, antes que o sol aparecesse no horizonte, e apenas ele se escondia no ocaso.

 “As flores não desprezaram a luz pelos perfumes, nem também os perfumes pela luz; aceitaram tudo, as cores e o aroma.

 “Eram flores! Daí veio que as mulheres gostam tanto delas, e que todas as chamam irmãs.

 “Os últimos amantes são sempre os mais felizes, porque para eles se guarda o requinte das carícias.

“Assim sucedeu com os silfos.

“O sol nunca passara de beijos na corola; os perfumes penetraram o seio de suas amadas, encarnaram-se nelas, nenhum mistério lhes foi vedado.

“Mas Deus permitiu que a luz castigasse as flores, e é por isso que, dardejando os raios sobre elas, o sol faz acordar no seu seio os rivais felizes que as abandonam medrosos: ao seu calor evapora-se o perfume.

“É por isso que algumas flores, bem raras, que se conservaram fiéis a seus primeiros amores, que não receberam perfumes em seu seio, têm mais longa vida: as flores sem perfume são de ordinário as que mais duram.

“Ao contrário, quanto mais perfumada é a flor, mais é tênue e menos vive.

“É por isso que as flores ficaram sendo o símbolo das glórias neste mundo, que são vãs, das esperanças que são fugazes, dos sonhos que se não realizam.

“É por isso que, como emblema da duplicidade, elas servem para coroar a fronte dos heróis e enfeitam as vítimas do sacrifício, adornam os altares e as sepulturas, o tálamo e o ataúde.

“Deus podia castigá-las ainda mais, tirando-lhes as cores que lhes dera o sol. Mas, como o seu crime era um crime de amor, quis que elas ficassem sempre belas, e que fosse mais uma prova de que a beleza é vária e ingrata”.

Quando ele acabou de cantar, a sultana passou-lhe os braços em roda do pescoço, e entreabriu nos lábios um sorriso de amorosa censura.

O amante olhou-a um instante, e disse:

— Sabes o que me lembra esse teu sorriso? Lembra-me as flores da cantiga que acabaste de ouvir...

A sultana aproximou mais seu rosto do dele, e entreabrindo novo sorriso, deixou ao mesmo tempo escapar um vagaroso suspiro.

O amante, vencido, foi colhê-lo com um beijo na passagem, dizendo, à meia voz:

—... Mas ah! o perfume de algumas flores dá a felicidade na embriaguez que produz…

Fonte:
Correio Mercantil, Rio de Janeiro, 27.08.1854.

Cândido Canela (Jardim de Versos)


TROVAS

Dizem que a pinga nos mata
pouco a pouco, lentamente.
Por isso não largo dela
pra não morrer de repente...
- - - - - -

Duas caveiras na mesa,
A de um mendigo e a de um nobre.
Dize agora: tens certeza
qual a do rico e a do pobre?
- - - - - –

Esquecer-te, meu amor?...
Impossível! Não consigo.
– Durante o dia te vejo,
a noite sonho contigo...
- - - - - –

Eu não sou tão pobre assim
como pensa todo mundo.
Tenho um pedaço de terra
de sete palmos de fundo.

Matar é crime na terra,
tu sabes, bem como sei.
Por isto inventou-se a guerra,
que mata dentro da lei...
- - - - - –

Não lamentes tua origem,
teu leito humilde, pequeno,
lembra que o Filho da Virgem
nasceu num berço de feno.
- - - - - –

Não tenho medo da fera
que vive na mata imensa.   
Temo, entretanto, a pantera
que fala, tem alma e pensa.
- - - - - –

Nasci chorando num rancho,
na mata escura e bravia.
Mas hei de morrer cantando
entre os braços de Maria.
- - - - - -

Quantos heróis esquecidos
deste mundo, sem medalhas,
E quantos brasões no peito
de refinados canalhas!…
- - - - - –

Quantos lábios sorridentes
a nos traírem de perto.
E quanto rosto fechado
de coração sempre aberto!
- - - - - -

LÍRICA E HUMOR DO SERTÃO (1952)

Morena, bela, iscuta estes meus versos,
ouve, Cabocla, esta triste canção,
qu'eu iscrivi com a pena da sodade
e com a tinta roxa da paixão.

Inda se alembro da premera vez
qu'eu te incontrei na Igreja da Maiada,
inté pensei qui fosse a Virge Santa
quitava cá imbaxo ajueiada.

E foi ali, Caboca feiticera,
eu ti oiei, vancê tomém me oiou.
E nest'ora ganhei seu coração,
meu coração vancê tomem ganhou.

Nós dois se amemo quatro ano afio,
nesta fazenda, aqui neste Sertão,
inté que um dia de infilicidade
trouxe pra nós triste disilusão.

E como a Pomba Juriti sodosa,
qui o caçadô matou s cumpanhera
varei o mundo a fora sem distino,
quage trint'ano quage a vida intera.

Sufri na Terra grandes disventura,
ai sempre percurando sempre tiisquecê,
mais cada dia e noite qui passava
mais eu quiria vortá pra vancê.

Aqui cheguei, Morena, nesta Terra,
Já tô de vorta, aqui neste Sertão,
véio acabado, fraco e sem dinhêro,
mais tenho novo ainda o coração.

Mais se vancê, Morena, inda quisé,
este caboco véio e sem valia,
abre esta porta e vem me abraçá,
pois eu ti quero mais do quiria.

E ela uviu estes meus versos triste
Esta viola, esta triste canção.
Abriu a porta e veio me abraçá,
e junto ao meu botou seu coração.

Fontes:
– Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Minerva.
Memórias da Poesia Popular

Cândido Canela (1910 - 1993)

Cândido Simões Canela nasceu na cidade de Montes Claros/MG, no dia 22 de agosto de 1910 e faleceu em 07 de março de 1993. Filho de Antônio Canela e de D. Luiza Canela. Ele concluiu o curso primário na Escola Normal no ano de 1929. Atuante na vida política da cidade, foi vereador em diversos mandatos. Cândido tinha uma veia artística forte e era considerado pelo compositor e produtor Téo Azevedo como um dos maiores poetas brasileiros. 

Casado com Laurinda Prates de Souza Canela, com quem teve o filho, também poeta, Reivaldo Simões Canela. Na década de 40, editou o jornal humorístico O Gangorra. Nos anos 50, dirigia e apresentava o programa Alma Cabocla, na ZYD-7, onde também se apresentou com Antônio Rodrigues, com quem formou a dupla caipira Chico Pitomba e Mané Juca. Foi jornalista colaborando por muitos anos na Gazeta do Norte e no Jornal Montes Claros.
 
Em 1978 foi vencedor do 1º Festival Brasileiro da Música Caipira, promovido pela Rádio Record São Paulo, com a música “Temos pinga da saudade”, parceria com Téo Azevedo. Sua música “Saracurinha Três Pontes” foi gravada por Tonico e Tinoco e Pena Branca e Xavantinho. Cândido Canela também foi membro da Academia Montes-clarense de Letras. Ocasionalmente usou também o pseudônimo Chico Pitomba. 

Poeta, jornalista, compositor, radialista e trovador, tabelião em sua cidade natal do do Cartório do 1º Ofício por quase 50 anos. Integrou o teatro amador e era um apaixonado pelo palco. Teve suas obras “Lírica e humor no sertão” e “Rebenta boi” consagradas pelo público.

Fontes:
– Aparício Fernandes (org.). Trovadores do Brasil. 2. Volume. RJ: Minerva.
Prefeitura de Montes Claros. 

Nilto Maciel (Santo Yan)


Zadik Perez odiava Sancho Peretz, desde muitos anos. Ódio mudo, fermentado entre quatro paredes, espumoso, envelhecido à rolha.

Num dia de sol quente, ouviram-se os primeiros resmungos, rangeres de dentes, curtos insultos. E as faíscas dos quatro olhos queimaram alguns curiosos. Nem anoiteceu e toda redondeza dos odientos sabia do pretérito e do presente deles, e até o futuro contava.

Daí por diante, a lenda virou odisseia e mil e uma histórias se enlearam. Os pais de Perez e Peretz se haviam estraçalhado em briga de foice, seus avós comandaram exércitos que se destruíram, seus bisavós arregimentaram bandos, seus mais antigos ancestrais se envolveram em saques, tocaias, covardias, brutos moradores de cavernas, mandíbulas de ferro, garras de gavião, patas cabeludas, grunhidos ferozes, parentes de macacos.

A fama de Zadik e Sancho alcançou longínquas regiões, terras de pastores de feras, caçadores de ovelhas, nunca sequer faladas naquele tão perdido mundo.

Até um tal Yan, de distantes plagas, ouviu a qual novela. Dono de uma cadeia internacional de campos-santos e, nas horas de filantropia, mediador de guerras e intrigas, desceu dos céus, com seu pássaro de prata, na fronteira dos países de Perez e Peretz.

Cuidou antes de instituir no novo mundo o hábito de se enterrarem os mortos em cemitério, em vez de no próprio lugar on­de as almas largavam os corpos. Fez a todos renegarem a antiga lei, chamando-os de bárbaros, em sua língua. Os mortos não podiam viver com os vivos; as águas se contaminavam; a vida cheirava a podre. Predicou e insultou, feito um missionário em danação. E o aplaudiram, reverenciaram, idolatraram. Chamaram-no de Santo Yan, beijaram-lhe os pés, sacrificaram-lhe animais.

A discórdia entre Zadik Perez e Sancho Peretz não devia prosperar. Chamou à sua tenda primeiro Perez e se nomeou juiz de um duelo. Aqui, seu visitante, ali, o rival dele. Discursou sobre a arte de duelar, historiou o duelo, exaltou o romantismo da disputa.

Apesar disso, Zadik não se fez áspero, nem inchou o pei­to nem fechou a mão. E pela primeira vez disse não ao reformador. Preferia não arriscar. Muito mais seguro seria dar morte certa a Sancho. Por trinta sacos de ouro.

Santo Yan negou-se assassino e não recusou nem aceitou a proposta de seu discípulo. Na saída, benzeu-o ternamente. E mandou chamar Sancho.

Renomeou-se juiz de um duelo, fez discurso, contou história, entusiasmou-se. E nem assim o outro largou a brandura e a covardia. Em troca da morte segura de Zadik, ofereceu trinta hectares de terra fértil.

De pronto, o reformador disse sim. Não pelas terras, que terras não lhe faltavam, mas por ver em Peretz o justo, o bom, o pacato, e em Perez o brigão, o mau, o injusto.

Abraçaram-se, e Yan saiu em busca de Zadik Perez.

Os trinta sacos de ouro reluziram aos pés do Santo, que sorriu e deu por cumprida sua parte no pacto firmado com Sancho Peretz.

Fonte:
Nilto Maciel. Punhalzinho Cravado de Ódio, contos. Secretaria da Cultura do Ceará, 1986.

Fernando Pessoa (Poemas de Amor) 1


O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala; parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...
(1928)
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A tua voz fala amorosa.
Tão meiga fala que me esquece
Que é falsa a sua branda prosa.
Meu coração desentristece.

Sim, como a música sugere
O que na música não 'stá?
Meu coração nada mais quer
Que a melodia que em ti há...

Amar-me? Quem o crera? Fala
Na mesma voz que nada diz
Se és uma música que embala.
Eu ouço, ignoro, e sou feliz.

Nem há felicidade falsa,
Enquanto dura é verdadeira.
Que importa o que a verdade exalça
Se sou feliz desta maneira?
(22.1.1929)
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Deixa-me ouvir o que não ouço...
Não é a brisa ou o arvoredo;
É outra coisa intercalada...
É qualquer coisa que não posso
Ouvir senão em segredo,
E que talvez não seja nada...

Deixa-me ouvir... Não fales alto!
Um momento!... Depois o amor,
Se quiseres... Agora cala!
Tênue longínquo sobressalto
Que substitui a dor,
Que inquieta e embala...

O quê? Só a brisa entre a folhagem?
Talvez… Só um canto pressentido?
Não sei, mas custa amar depois...
Sim, toma a mim, e a paisagem
E a verdadeira brisa, ruído...
Vejo-te, somos dois...

Por quem foi que me trocaram
Quando estava a olhar pra ti?
Pousa a tua mão na minha
E, sem me olhares? sorri.

Sorri do teu pensamento
Porque eu só quero pensar
Que é de mim que ele está feito
É que o tens para mo dar.

Depois aperta-me a mão
E vira os olhos a mim...
Por quem foi que me trocaram
Quando estás a olhar-me assim?
(12.08.1930)
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INCIDENTE

Dói-me no coração
Uma dor que me envergonha...
Quê! Esta alma que sonha
O âmbito todo do mundo
Sofre de amor e tortura
Por tão pequena cousa...
Uma mulher curiosa
E o meu tédio profundo?
(1931)

Fonte:
Fernando Pessoa. Poemas de amor. RJ: Agir Editora, 2009.

segunda-feira, 9 de março de 2020

Varal de Trovas n. 203


Humberto de Campos (O Gramático)


Alto, magro, com os bigodes grisalhos a desabar, como ervas selvagens pela face de um abismo, sobre os cantos da funda boca munida de maus dentes, o professor Arduíno Gonçalves era um desses homens absorvidos completamente pela gramática. Almoçando gramática, jantando gramática, ceando gramática, o mundo não passava, aos seus olhos, de um enorme compêndio gramatical, absurdo que ele justificava repetindo a famosa frase do Evangelho de João:

— No princípio era o VERBO!

Encapado pela gramática, e às voltas, de manhã à noite, com os pronomes, com os adjetivos, com as raízes, com o complicado arsenal que transforma em um mistério a simplicíssima arte de escrever, o ilustre educador não consagrava uma hora sequer às coisas do seu lar. Moça e linda, a esposa pedia-lhe, às vezes, sacudindo-lhe a caspa do paletó esverdeado pelo tempo:

— Arduíno, põe essa gramatiquice de lado. Presta atenção aos teus filhos, à tua casa, à tua mulher! Isso não te põe para diante!

Curvado sobre a grande mesa carregada de livros, o cabelo sem trato a cair, como falripas de aniagem, sobre as orelhas e a cobrir o colarinho da camisa, o notável professor retirava dos ombros a mão cariciosa da mulher, e pedia-lhe, indicando a estante:

— Dá-me dali o Adolfo Coelho.

Ou:

— Apanha, aí, nessa prateleira, o Gonçalves Viana.

Desprezada por esse modo, Dona Ninita não suportou mais o seu destino: deixou o marido com as suas gramáticas, com os seus dicionários, com os seus volumes ponteados de traça, e começou a gozar a vida passeando, dançando e, sobretudo, palestrando com o seu primo Gaudêncio de Miranda, rapaz que não conhecia O padre Antônio Vieira, o João de Barros, o frei Luís de Sousa, o Camões, o padre Manuel Bernardes, mas que sabia, como ninguém, fazer sorrir as mulheres.

— Ele não prefere, a mim, aquela porção de alfarrábios que o rodeiam?   Então, que se fique com eles!

E passou a adorar o Gaudêncio, que a encantava com a sua palestra, com o seu bom-humor, com as suas gaiatices, nas quais não figuravam, jamais, nem Garcia de Rezende, nem Gomes Eanes de Azurara, nem Rui de Pina, nem Gil Vicente, nem, mesmo, apesar do seu mundanismo, D. Francisco Manuel de Melo.

Assim viviam, o professor, com seus puristas e Dona Ninita com o seu primo, quando, de regresso, um dia, ao lar, o desventurado gramático surpreendeu a mulher nos braços musculosos, mas sem estilo, de Gaudência de Mianda. Ao abrir0se a porta, os dois culpados empalideceram, horrorizados. E foi com o pavor no coração que o rapaz se atirou aos pés do esposo traído, pedindo súplice, de joelho:

— Me perdoe, professor!

Grave, austero, sereno, duas rugas profundas sulcando a testa ampla, o ilustre educador encarou o patife, trovejando, indignado:

— Corrija o pronome, miserável! Corrija o pronome!

E, entrando no gabinete, começou, cantarolando, a manusear os seus clássicos...

Fonte:
R. Magalhães Júnior (org.). Antologia de Humorismo e Sátira. RJ: Bloch, 1998.

Doce Aconchego das Trovas n. 9


Da mãe à filha querida:
- Obrigada, meu bebê...
Fui eu quem lhe dei a vida,
mas minha vida é você!
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

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Que saudade dos brinquedos
do meu tempo de criança,
tendo os risos e folguedos
como arautos da esperança.
ALICE BRANDÃO
Caxias do Sul/RS

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O tempo voa, bem sei,
nos dias da mocidade;
mostra onde errei e acertei,
tem remorso e tem saudade …
ALMIR PINTO DE AZEVEDO
Cambuci/RJ

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Neste encontro inesperado,
vamos brindar a nós dois.
Primeiro, o beijo guardado…
o vinho eu peço depois!
ALMIRA GUARACY REBELO
MG

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Velho trem me faz lembrar
os meus tempos de menino,
em que eu me punha a cismar
qual seria o meu destino…
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

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Felicidade é encanto
que se vive por um triz,
mas celebro, por enquanto,
apenas o que Deus quis.
ANTONIO CABRAL FILHO
Jacarepaguá/RJ

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Racistas, intransigentes,
olhai o exemplo da mão:
cinco dedos diferentes
na mais perfeita união!
ANTONIO JURACY SIQUEIRA
Belém/PA

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Ah! Se eu morresse, querida,
sentindo os carinhos teus...
Teria, na morte, a Vida
que em vida pedi a Deus!
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ

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Na bagagem que hoje trago
quase tudo joguei fora;
só guardei o bom afago
e as alegrias de agora.
BENEDITA AZEVEDO
Magé/RJ

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Um fato triste, por certo,
não convém ser relembrado…
Jamais conserve por perto
as tristezas do passado!
BENEDITO MADEIRA
Porto Alegre/RS

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Navegando pela vida,
em águas nem sempre mansas,
junto à bagagem sofrida
carrego mil esperanças!
CONCEIÇÃO ABRITTA
Crucilândia/MG, 1934 - 2015, Belo Horizonte/MG

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Teu grande amor, que ironia,
é hoje coisa esquecida:
foi luz que por um só dia
iluminou minha vida.
CONCEIÇÃO DE ASSIS
Pouso Alegre/MG

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El primer Nobel del mundo
jamás ha sido entregado,
fue El de Paz y amor profundo;
ganador? Jesus amado!
CRISTINA OLIVERA CHÁVEZ
EUA

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Os meus garbosos oitenta
jamais pensei alcançar:
– será que a carcaça agüenta
uns outros mais a chegar?
DIAMANTINO FERREIRA
São Fidélis/RJ

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Revejo o passado e penso,
sem surpresa e sem espanto,
que o tempo, às vezes, é o lenço
com que Deus me enxuga o pranto…
DOMITILLA BORGES BELTRAME
São Paulo/SP

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Ora eloquente, ora mudo,
teu olhar é uma charada:
promessa sutil de tudo,
no fútil revés… do nada!
DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC (1926 – 2017) Sorocaba/SP
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Num desabafo insincero,
chorando em teu ombro amigo,
digo coisas que não quero,
quero coisas que não digo…
ÉLBEA PRISCILA
Caçapava/SP

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Correndo entre paralelas
de aço, o trem foi a glória
para quem hoje vê nelas
apenas traços da história.
ERCY M. MARQUES DE FARIA
Bauru/SP

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 Vivo em constante conflito
entre o delírio e a razão:
– meu sonho alcança o infinito,
meus pés tropeçam no chão!
ELISABETH SOUZA CRUZ
Nova Friburgo/RJ

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Só se salva de verdade,
nesta enchente de amargor.
quem faz da fraternidade
o seu barco salvador.
FLÁVIO ROBERTO STEFANI
Porto Alegre/RS

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Todo indivíduo que é tolo,
mas que de sábio se arvora,
é tal um pão sem miolo…
só tem a casca por fora!
FRANCISCO PESSOA
Fortaleza/CE
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Aquela ponte que unia
nossas vilas ribeirinhas
une, ainda, por magia,
tuas saudades e as minhas.
GISLAINE CANALES
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS

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Teu retrato desbotado,
num canto velho e sozinho,
são resquícios do passado
das pedras do meu caminho.
GUTEMBERG LIBERATO
Fortaleza/CE

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Hoje trago na lembrança
uma dor que sobrevive
num fiapo de esperança,
pelo amor que nunca tive.
J.B. XAVIER
São Paulo/SP

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Me esculpindo a cada dia,
vendo no Mestre o padrão,
tento chegar – que utopia! –
mais perto da perfeição.
JESSÉ NASCIMENTO
Angra dos Reis/RJ

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Na aliança nunca desfeita,
alma e corpo te entreguei:
juntei a ideia perfeita
ao passo maior que eu dei.
JOSAFÁ SOBREIRA DA SILVA
Rio de Janeiro/RJ

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Não penses que estás distante
de uma estrada mais florida,
há sempre um mágico instante
que muda os rumos da vida!
JOSÉ LUCAS DE BARROS
Serra Negra do Norte/RN (1934 – 2015) Natal/RN
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Tento fugir da rotina,
conquistar um novo espaço-
mas minha tristeza assina
seu nome por onde passo...
JOSÉ VALDEZ DE CASTRO MOURA
Pindamonhangaba/SP

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Meu sonho bom, tu me bastas,
mas, perto do amargo fim,
se por acaso te afastas,
morre um pedaço de mim!
LAVÍNIO GOMES DE ALMEIDA +
Barra do Piraí/RJ

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Este manto que carregas,
como bandeira estendida,
è vitória das refregas
que enfrentaste nesta vida!
LORIS TURRINI
Tremembé/SP
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Em cada nota eu receio,
na pauta que a vida escreve,
que transformem nosso enleio
numa simples semibreve...
LUIZ CARLOS ABRITTA
Belo Horizonte/MG

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Sempre sozinha, aos farrapos,
mas de rosário na mão…
A fé tecida entre os trapos
remendava a solidão!
PROFESSOR FRANCISCO GARCIA
Caicó/RN

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Não vivas com tanto orgulho
em razão do teu talento.
O tambor, que faz barulho,
tem por dentro apenas vento.
SANTIAGO VASQUES FILHO
Teresina/PI, 1921 – 1992, Fortaleza/CE

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No refúgio desmanchamos.
quando ficamos a sós,
esses nós que carregamos
no fundo de todos nós!
SELMA PATTI SPINELLI
São Paulo/SP

Carlos Heitor Cony (Moto próprio)


Tinha 27 anos e uma motocicleta. Não tinha mais nada nem precisava. Possuía o mundo e todas as pompas do universo porque sentia a moto entre as pernas. Amava a moto e, de moto próprio, só amou a própria moto.

Vivia trepado na moto, correndo pelas estradas, sentindo o trepidar dos 57 cavalos do motor. Era um deus, dono do mundo, dono do próprio destino. Não saía da moto nem para comer nem para beber. Tampouco dormia.

A moto o possuía e ele possuía a moto.

Andava sem itinerário, nunca ia a parte alguma porque se considerava em todas as partes. Adquiriu a onipresença - própria dos deuses - de ser e estar em todos os lugares e modos.

O rapaz virou Deus.

Não se preocupava com o Bem e o Mal. O único mal seria a moto enguiçar ou a gasolina acabar. Mas a moto era eterna, a gasolina jamais acabava. A força das coxas que espremiam a moto entre as pernas era tanta e tamanha que os 57 cavalos não precisavam de outra energia.

O rapaz era a moto e a moto era o rapaz.

O sol ou a chuva em nada afetavam o rapaz ou a moto. De dia ou de noite, a marcha era a mesma, e mesmo o trepidar. As pessoas que, ao longe, viam passar a moto e o rapaz pensavam que era um anjo, ou o próprio Deus descido à Terra.

O rapaz não ligava para a admiração que causava, admiração que se transformou em adoração. Os camponeses, quando viam ou ouviam a moto, ajoelhavam-se à beira das estradas e rezavam, pedindo proteção para as colheitas. Uma lenda logo se formou: por onde o rapaz e a moto passassem, o chão se abriria, fecundo, em frutos e flores.

À noite, as jovens sonhavam que o rapaz e a máquina chegavam. Elas acordavam em orgasmo, o rapaz e a máquina entravam pela carne das virgens.

Foram criados exorcismos específicos, a fim de impedir que as púberes caíssem em sonhos tais. Numa certa região dos Lagos Gelados, após um sonho com o rapaz e a moto, uma virgem pariu uma pequenina motocicleta, de 15 cavalos apenas.

Depois de algum tempo, o rapaz e a moto começaram a preocupar as autoridades. Também os deuses se ocuparam do rapaz e da moto, sentiam que alguma coisa de anormal ocorria no mundo.

Os deuses se reuniram com as autoridades e deliberaram dar um fim ao rapaz e à moto. Era impossível acabar com os dois, ao mesmo tempo. A moto era indestrutível. Nem o fogo nem a água podiam contra ela. E o rapaz, enquanto estivesse em cima da moto, seria indestrutível. Nem o fogo nem a água podiam contra ele.

Então, o mais velho dos deuses sugeriu um acidente que poderia acabar com o rapaz e a própria moto, mas de moto próprio.

Num cair de tarde, o rapaz vacilou diante do sol que se punha no horizonte, à sua frente. Não viu a árvore que tinha galhos para dentro da estrada. A velocidade era grande e o seu corpo foi projetado para a frente e para o alto. Ficou preso nos galhos da árvore. Pelo muitos anos em que vivera trepado na moto, o rapaz continuou de pernas abertas, como se entre elas tivesse, ainda, a sua moto.

Após ter expelido o dono, a moto prosseguiu a marcha desgovernada, para cima e para a frente, de tal modo que, de moto próprio, encravou-se entre as pernas do rapaz. Tamanho o desejo de voltar a ser possuída pelo dono, que penetrou-o sem dor.

De longe, os deuses viram que a moto fora tragada pelo rapaz. E muito se rejubilaram: o rapaz desintegrou-se, desintegrando a moto.

Os deuses providenciaram para que o corpo desaparecesse - única forma de fazer desaparecer, também, a indestrutível moto, que nem o fogo e a água podiam contra ela. Aproveitaram o cair da noite e sepultaram os escombros do rapaz e da moto no túmulo do vento.

As autoridades bateram palmas.

Quando o dia raiou, nada mais havia do rapaz e da moto. O mundo continuou com suas estradas assassinas e suas árvores criminosas.

Os deuses se sentiram recompensados. E as autoridades, depois de muito bater palmas, foram bater as populações vizinhas, cobrando impostos, taxas e demais posturas a que tinham direito pela lei.

Fonte:
Suplemento "Primeiras histórias do ano 2000", jornal Folha de São Paulo, 01 janeiro 2000.

Silmar Böhrer (Gamela de Versos n. 7)


Agatha Christie (Resenha de Livros) 1


O Misterioso Caso de Styles
The Mysterious Affair at Styles


No meio da noite, a rica proprietária da mansão Styles é encontrada morta em sua cama, aparentemente vítima de um ataque cardíaco. As portas do quarto estavam trancadas por dentro e tudo indicava morte natural. Mas o médico da família levanta uma suspeita: assassinato por envenenamento. Todos os hóspedes da velha mansão tinham motivos para matar a Sra. Inglethorp e nenhum deles possui um álibi convincente. Para solucionar o crime entra em ação o detetive Hercule Poirot, irresistível personagem criado por Agatha Christie, que faz a sua estreia neste intrigante caso.
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O Inimigo Secreto
The Secret Adversary


Cansados da rotina, dois jovens decidem fundar uma empresa nada convencional, especializada em investigações, a Jovens Aventureiros Ltda. O primeiro caso era um desafio que intrigava a Scotland Yard: uma jovem americana desaparecera, levando com ela documentos secretos que poderiam comprometer o governo inglês. Mas Thomas Beresford e Prudence Cowley - ou simplesmente Tommy e Tuppence - não são os únicos interessados em descobrir o paradeiro desses papéis. A mesma busca é empreendida por um homem misterioso e perigoso, conhecido como Sr. Brown, um mestre na arte do disfarce, que pode aparecer do nada e desaparecer em seguida sem deixar qualquer rastro.
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Assassinato no Campo de Golfe
Murder on the Links


Uma carta de um desconhecido, com um pedido de socorro, leva o detetive belga Hercule Poirot e seu ajudante Hastings à França, em busca de respostas para uma série de perguntas. Qual seria a relação entre os dois assassinatos cometidos com um intervalo de mais de 20 anos? Qual a ligação entre a mulher de um misterioso milionário e sua amante? Qual a relação entre um fio de cabelo, uma espátula ensanguentada, um cano de chumbo e um campo de golfe? Numa aventura repleta de mistérios, lindas jovens e amores frustrados, Hercule Poirot ainda precisa enfrentar seu melhor amigo, apaixonado pela mulher que pode ser uma perigosa assassina.
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O Homem do Terno Marrom
The Man in the Brown Suit


Este livro é uma engenhosa mistura de romance policial e aventura. Trata de aventuras românticas e perigosas, vividas por sua protagonista, uma orfã atraente e corajosa chamada Anne Beddingfeld, que, quando menos espera, está no meio de uma enrascada, cheia de acontecimentos terríveis e misteriosos, que superam seus estranhos sonhos de levar uma vida semelhante à das mais destemidas heroínas de ficção. Escrita sempre na primeira pessoa, a narração divide-se habilidosamente entre o que Anne conta e o que no seu diário escreve Sir Eustace Pedler. O hilariante humor de Pedler, serve de contrapeso ao aceso romanticismo da jovem, que lutará contra uma quadrilha de criminosos cruéis dirigidos por um temível e enigmático personagem chamado “O Coronel”. Atrás das marcas deixadas por este enganoso coronel - fascinado, além disso, pela beleza e pelo caráter de Anne - também participa um coronel de verdade, Race, alto funcionário do Serviço Secreto, que intervém em outros romances de Agatha Christie como grande amigo de Hercule Poirot.
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Poirot Investiga
Poirot Investigates


Baixinho, sempre impecavelmente vestido, metódico e organizado, capaz de encontrar uma solução para os casos mais difíceis usando apenas as suas “pequenas células cinzentas”. Assim é o detetive belga Hercule Poirot, uma das mais fascinantes criações de Agatha Christie. Nesta seleção de alguns dos melhores contos da autora, Poirot investiga o sequestro de um primeiro-ministro, soluciona um roubo de um milhão de dólares, encontra um testamento desaparecido e vive uma emocionante aventura numa tumba egípcia. Ao seu lado, ajudando-o em suas deduções, seu fiel amigo e auxiliar, o valente e ingênuo Capitão Hastings.

A Aventura do “Estrela do Ocidente”
Atriz do cinema americano recebe cartas que ameaçam roubar seu diamante e Poirot entra em ação e consegue evitar o roubo.

A Tragédia de Marsdon Manor
Poirot investiga a morte de um senhor que cometeu suicídio mas tinha também uma apólice de seguros muito alta.

A Aventura do Apartamento Barato
Depois de um casal ter dito que alugou um apartamento por um preço muito abaixo do mercado, Poirot decide investigar o motivo e encontra uma resposta surpreendente.

O Mistério de Hunter’s Lodge
Depois do assassinato de um milionário, Poirot é chamado para resolver a questão mas doente manda Hastings ir em seu lugar. Apenas com os telegramas mandados por Hastings, Poirot descobre a identidade do assassino.

O Roubo de Um Milhão de Dólares em Obrigações do Tesouro
Poirot e Hastings são chamados para investigar o roubo de um milhão de dólares. O roubo aconteceu no navio que levava os títulos para a América. Mas depois de uma revista em todos os passageiros, nada foi descoberto. Só Poirot consegue descobrir a maneira que os ladrões usaram para roubar os títulos.

A Aventura da Tumba Egípcia
Algumas mortes numa expedição ao Egito atribuídas a uma maldição levam Poirot a uma investigação minuciosa que acabam em um assassino frio e calculista.

O Roubo das Joias no Grand Metropolitan
Numa estadia em um hotel, Poirot e Hastings acabam tendo que resolver o mistério do desaparecimento das joias de uma senhora muito rica, encontrando novamente os culpados.

O Primeiro-Ministro Sequestrado

Após o desaparecimento do primeiro-ministro da inglaterra que iria para uma convenção internacional, Poirot é chamado para encontrá-lo antes que a convenção se inicie.

O Desaparecimento do Sr. Davenheim
O inspetor Japp duvida que Poirot encontre o Sr. Davenheim sem sair de casa. Mesmo com um plano muito astuto, Poirot descobre onde o Sr. Davenheim está e o que ele fez com o dinheiro roubado.

A Aventura do Pobre Italiano
Poirot investiga o caso da morte de um conde italiano que morreu de uma forma brutal. Depois de algumas investigações ele descobre a identidade do assassino.

O Caso do Testamento Desaparecido

Poirot tenta descobrir onde está o testamento que um rico fazendeiro deixou para sua sobrinha. Apenas Poirot descobre a maneira engenhosa que o fazendeiro utilizou para esconder o testamento.

A Dama de Véu
Lady Millicent vai a Poirot para que ele consiga reaver uma carta escrita por ela há muito tempo, que está em poder de um chantageador que pode acabar com seu noivado. Na carta existem declarações comprometedoras.

A Mina Perdida
Chinês é encontrado morto e os papéis sobre as condições de uma mina que está a muito tempo abandonada desapareceram. Poirot é chamado e, como sempre, descobre os papéis e desvenda a identidade do assassino.

A Caixa de Chocolates
Poirot conta a Hastings um caso em que chegou a uma conclusão errada ao final das investigações. Depois da morte de um famoso deputado, Poirot é chamado para descobrir a verdadeira causa de seu falecimento. Ao esquecer de levar em conta um pequeno detalhe, Poirot falha. Apenas com a confissão do assassino é que ele descobre os erros que cometeu.

Fonte:
http://users.hotlink.com.br/pmgi/agatha/index.html

domingo, 8 de março de 2020

Varal de Trovas n. 202


Douglas Lara (Um Bando de Girassóis)


Depois de passar frio adentramos ao clube União Recreativo central no baile mensal do CAS, Clube da Amizade de Sorocaba. Por que passar frio ... vocês ai em Sorocaba não tem agasalho?

Temos sim, só que os homens nesta noite não podiam usar paletó nem agasalho ... tinham que mostrar suas camisas amarelas ... cor de girassol.

O clube como sempre caprichosamente ornamentado. Em cada mesa um vaso de girassol. Em cada vaso ao lado do girassol uma borboleta. O que? como? Borboleta vai mentir pra lá.

Calma pessoal a borboleta era de papel e estou certo que os distraídos não perceberam até agora que tinha uma borboleta em cada vaso. Não tem portança ...

Agora o impacto para quem como nós que chegamos quando grande parte dos 300 dançoólicos já estavam devidamente a postos esperando o conjunto 'the best band' começar a tocar foi impressionante parecia estarmos entrando num jardim repleto de girassóis ...

Se não tinha ninguém com juízo? Que não estivesse vestido de girassol? Tinha sim alguns e algumas que parecem eram de outro planeta e estavam vestidos normalmente, digo não estavam a fantasia e nem passando frio. Até agora domingo na hora do almoço com a garganta áspera e tossindo um pouco.

Para quem não sabe as mesas estão automaticamente reservadas ... Mudar de mesa, nem pensar. São 75 mesas devidamente com dono. Nas mesas tem aquele marcador de mesa já gravado o nome das duas 'donas' da mesa.

Sabemos quem senta ao lado direito, esquerdo atrás e assim por diante

Ao chegar o Machadão já estava se queixando do preço das mesas e comentando quanto, os outros clubes, estão cobrando para entrar e o preço das mesas.

Comentando que 'em compensação' os conjuntos e bandas que tocam no clube da amizade tocam sempre ao vivo, não é tape.

Depois do beija mão, digo cumprimentar todos vizinhos de mesa pudemos com frio sentar e começar a olhar.

Fico sempre vendo quem veio e quem não veio.

Alguém novo? De idade? Não, novo no convívio.

Fico tentando observar a fisionomia de cada um ...

Os maridos cara de 'saco cheio', que estão cumprindo sua obrigação mensal. Depois do baile devem continuar cumprindo suas obrigações com suas companheiras.

Olho para o clube suas pilastras de mármore que viram e ouviram tantas juras, estórias ... promessas. Fico um bom tempo olhando para a sacada na frente do clube - a mesma de mais de 70 anos - que conheci em 1954. Como era gostoso ficar na sacada olhando as pessoas circular na praça coronel Fernando Prestes. Ver e ser visto. Conversar alegremente com amigos e conhecidos que víamos e conversávamos diariamente. E como tínhamos assunto.

Comparo como as conversas hoje são distantes apesar de ver uma pessoa depois de meses em nem ao menos um contato telefônico ou por internet durante meses. E ainda tem gente reclamando que conversa mais com estranhos no exterior do que com o vizinho.

Sinto o mesmo só que não me queixo. Aceito.

A 'the best band' começa a tocar e os viciados em dançar começam a acompanhar as músicas. Conjunto conhecido pela qualidade da música produzida e repertório sei que mais uma vez o baile será um sucesso. O presidente do clube vem até nossa mesa, como faz com todas, e cumprimenta a todos. Aproveita para passar um recado dizendo, temos que fazer uma reunião do conselho administrativo e aprovar as contas até dezembro do ano passado. Penso, ano de eleição de nova diretoria, ele quer deixar tudo em ordem. Redondo como dizem atualmente.

Fico olhando os casais dançando, alguns parecem tanques de guerra na guerra. Outros dançando de forma suave e bonita como num balé. Alegra os olhos ver casais que não estão 'brigando' e sim deixando a musica levá-los pelos pequenos espaços que existem entre um casal e outro.

Alguns casais parando no meio do salão para cumprimentarem amigos de muitos anos.

Os girassóis já não estão com tanto frio... estamos todos alegres pois a alegria que provem da música e da dança é contagiante.

Num certo momento percebo que estou cantando junto a um grupo que cercou nossa mesa e isto é o sinal de que o baile acabou.

'deixa a vida me levar, vida leva eu
deixa a vida me levar, vida leva eu...'

Agora é voltar para casa e esperar o baile do próximo mês.

Fonte:
Recanto das Letras.

Luiz Poeta (Poemas Escolhidos) 5


CERTAS CANÇÕES, HOMENS CERTOS

Certas Canções são tão certas,
Incerta é a solidão
Que acerta  as dores incertas
Que ferem um coração.

A Banda "Certas Canções "
Resgata o que Deus  recria,
Quando a voz  das emoções
Se transforma  em poesia.

É  o Clube da Esquina
Ressurgindo do passado,
Pois quando a canção  se ilumina,
O amor é abençoado.

É a arte afinando os sons
São tons em plena harmonia,
Porque, se Deus dá  os dons,
Talento é só cortesia.

Quando os sentimentos  voam
sobre os sonhos mais desertos,
Os  acordes abençoam
Certas Canções e homens certos.

Portanto, que se acenda
A luz da fraternidade
E o amor retire a venda
Da palavra liberdade.

Que cada nota perdida
Encontre os diapasões
E  que o amor ganhe  vida...
Com vocês: Certas Canções .

HUMANA RESSURREIÇÃO

Não chores, meu amigo...eu só morri.
Não fiques te culpando assim à toa,
Não viste o que minha alma tem de boa
E nem as dores tantas que sofri.

Olhaste meus defeitos... e daí?
O ser humano é frágil... eu te perdoo,
Sei que sou egoísta nesse voo...
Não chores só porque, hoje, eu parti.

Perdoa, quando não te percebi
Ou quando não notei que me sorrias,
Existem avenidas tão vazias,
Mostraste o que sentias e eu... nem vi.

Nós somos tão iguais... tão ocupados
Com sonhos e emoções particulares,
E se ninguém vê nossos vãos altares,
Sentimo-nos mais tolos e afetados.

Desculpa, se agora ressurgi
Numa lembrança vaga, que atrapalha.
A nossa emoção já é tão falha,
E, afinal, fui eu que te perdi.

RAZÕES ENTORPECIDAS

Se o sonho pensa, a verdade raciocina...
...o que alucina não é sonho, é pesadelo.
Enxerga mais quem vê por dentro da retina.
Nunca se ensina o que se sabe... sem sabê-lo

Os erros moram dentro do pior conselho;
há  fedelho no ancião que vive em nós;
o porta-voz da fé é a dobra do joelho;
a dor do artelho é uma linha do retrós.

A cada voz, outra se soma e logo ecoa,
levando pétalas... ou pregos na ogiva...
cada palavra é mais que um pássaro que voa,
quando o silêncio jaz na própria iniciativa.

Se a razão sonha, embebeda-se de enleios;
os devaneios são razões entorpecidas
e enquanto há vida na essência dos anseios,
todo receio se retrai... ganhamos vida !!!

REFÉM FELIZ

A cada vez que  minha dor me diz bom dia,
A poesia brinca com meu pensamento...
Meu coração convida minha fantasia
E anestesia o meu próprio sofrimento.

Meu riso fácil mansamente se projeta,
Poeta ri, quando a poesia é seu espelho,
Mas também chora, quando lhe foge o poeta
E ele se curva à própria dobra de um joelho.

A cada vez que a dor se torna mais severa,
Amanso a fera, afinal, sou domador
Da própria dor que não resiste a essa quimera
Que faz de mim,  refém feliz de um  sonhador.

Estou aqui e sou feliz... esse é  meu jeito
De abençoar meu coração com a alegria
E se o amor mais fraternal  bate em meu  peito
Ele transforma minha dor em poesia.

Tenho uma história e toda vez que a reconto,
Não ponho ponto, quando finda a narrativa,
É só alguém me ouvir, que encontro o contraponto
Da minha vida e pronto: encontro outra saída.

Deixo um legado para a dor que me provoquem:
A piedade... mas não sei silenciar,
E se eu chorar, quando eu sorrir, não me retoquem,
Preciso rir, sentindo a dor se dispersar.

A cada vez que o desamor me deixa triste,
A dor insiste... mas se ela não me doer,
Sinto-me morto  e esse amor que ainda resiste,
É que me faz, sentindo dor, sobreviver.

As dores físicas não pedem permissão...
São atrevidas... sempre vêm sem avisar,
Mas se um rancor atinge em cheio um coração,
A solidão faz razão se emocionar.

E eu não nasci para sofrer, pois Deus me fez
Para sonhar... viver...  amar... e ser feliz
E sempre busco me curar a cada vez
Que alguém me fere com palavras pueris.

A minha  dor é espontânea e atrevida,
Ela revida toda vez que a desacato,
Mas eu a mato, porque se ela ganha vida,
Brinca com a vida que ainda há no meu retrato.

Faço uma selfie, meu sorriso é imortal
E debochado, quando a dor é insistente,
Pois cada vez que ela vem e me faz mal,
Deus ri comigo e volto logo a ser contente.

RUMO

Meu melhor riso é aquele que te encanta.
A pressa é tanta e o tempo, um passarinho
que faz seu ninho, põe seus ovos e que canta...
...quem não se encanta, ouvindo cantos no caminho?

No meu olhar, o teu olhar mais luminoso
paira, teimoso, espreitando o meu afeto,
não há projeto num amor afetuoso,
quando dois olhos têm o mesmo dialeto.

Sou inquieto em fazer alguém feliz
quem não me quis, seguiu o rumo que escolheu,
mas quem me quer, sabe que eu sou um aprendiz
do próprio sonho, que sequer nunca foi meu.

Não pinto risos, nunca soube ser palhaço,
no meu abraço cabe o mundo e o vazio,
não dou nós cegos, simplesmente faço um laço
que só desfaço, quando há fogo no pavio.

Se a explosão do coração é iminente,
que não se tente antecipar a emoção,
por isso deixo o meu sonhar mais inocente
fazer da mente o que sente meu coração.

Fonte:
Recanto das Letras

Jessé Nascimento (O Herói)


Gritos angustiados e o socar de portas ecoaram em meio a fria madrugada.

" - Fogo! Fogo!"

Levantei-me sobressaltado, olhos ainda preguiçosos e semicerrados, teimosos bocejos e pernas cambaleantes. Dirigi-me à janela ao mesmo tempo em que outros amarrotados rostos procuravam ver o que ocorria por entre cortinas e venezianas.

" - Fogo! Fogo!"

Um motorista de táxi, solitário naquela rua sombria e longa, resolvera ali parar ao perceber débeis, porém insistentes, sinais de fumaça. E passara a esmurrar as velhas portas de aço daquele bar, há muitos anos fechado.

A assistência agora era bem maior, denunciada, já então, por algumas dezenas de lâmpadas acesas e janelas entreabertas. Olhares parados, respiração quase suspensa, para não atrapalhar o desenrolar de uma possível tragédia.

Embora ninguém se atrevesse a ganhar a rua - covardia ou medo? - aquele homem já não estava só. O fundo do bar, há algum tempo transformado em morada de rapazes solteiros - mas não alheios às companhias femininas - até então o interrogativo palco de apreensões, começa a movimentar-se febrilmente com um vai e vem incessante.

" - Chama os bombeiros!"

" - Pega o balde d'água!"

" - Vê se todo mundo já acordou!"

A fumaça estava bem mais espessa. E em poucos minutos já se ouvia a sirene dos bombeiros de um quartel não muito distante.

E só então o herói saiu de cena. Humildemente entrou em seu carro, sem fazer alarde, sem olhar para trás. E sem ouvir um muito obrigado.

Minhas mãos ameaçaram um aplauso que não aconteceu. Meus lábios tentaram uma prece que não foi concretizada. Mas meus olhos e pensamentos acompanharam o herói, o solitário herói daquela fria madrugada. Até perder-se por entre a escuridão de muitos postes adiante.

Era um desses raros heróis do mundo em que vivemos, mas que ainda nos fazem crer no espírito humanitário e solidário dos muitos anônimos que povoam as madrugadas da vida.

Fonte:
Recanto das Letras.

Antônio Assumpção (Pétalas de Versos)


FOLHAS DO OUTONO — I

Fui jogado neste mundo
como uma nave no espaço…
De trevas é o meu destino!
Apenas às vezes um raio de luz
de fugidia estrela
deixa-me entrever o que me espera..,

FOLHAS DO OUTONO — II

Mar verde
que se perde
alucinado,
encapelado,
em ondas
transformando
as ilusões
do meu sentir...

FOLHAS DO OUTONO — III

Eu sinto o marulhar das ondas
em teus cabelos loiros...
Teu rosto escultural de jambo
e lábios sensuais!
Tens o segredo de deusas
no cimo de pedestais...

FOLHAS DO OUTONO — IV

Arfa o meu coração...
Meu corpo, em êxtase, se agita,
quando sobre ti eu vibro com a vida
e a perpetuo!

FOLHAS DO OUTONO — V

Ao som do fox dolente,
à meia luz...
Eu ouço e bebo todas as frustrações

FOLHAS DO OUTONO — VI

Eras uma estrela...
E eu, outra,
erradia,
no Universo,
buscando em ti a chama do amor...
E um dia,
fugazmente,
nos unimos,
para depois errarmos...
Errarmos sós.
E infinitamente...

FOLHAS DO OUTONO — VII

Que me importa? Que me importa
se já agora não me amas,
se apagadas estão as flamas
do amor que me juraste?
Que me importa? Se me vou
para a poeira dos espaços,
mergulhando os longos braços
no éter das solidões.
E, ascendendo, vá encontrando
outros mundos, outras luas...
ou, nos sonhos, antegozando
as carícias das virgens nuas,
que habitam mil galáxias,
em paraísos sem ruas.

FOLHAS DO OUTONO — VIII

Tu, quando estás triste, choras,
mas eu, poeta, chorar não posso,
Só se me consente derramar
em versos
as lágrimas da tristeza,
para transforma-las
em pérolas de beleza!

FOLHAS DO OUTONO — IX

Sobre este tão brumoso
e largo mar de sono,
chuvas de rosas
e coruscantes auroras
loucamente se desmancham
em folhas do outono...

FOLHAS DO OUTONO — X
Todos são livres.
Todos patrícios.
De três raças herdeiros,
são todos brasileiros.
Brasileiros ricos,
brasileiros de pés descalços...

FOLHAS DO OUTONO — XI

Qual a forma que ousa ouvir meu grito?
Qual a noite que se converterá em um clarão
para ouvir meu grito?
Quem ouvirá minha mensagem de amor
e de desespero?
Quem nascerá dos lírios
para ouvir meu grito?

FOLHAS DO OUTONO — XII
Uma rosa
Um perfume
O meu ciúme
Uma cruz
Um queixume
O teu perfume.

SOL NOTURNO — II

Quando o sol imaginou
que uma canção
fosse cantada,
uma brisa o apagou,
E na noite dourada
tudo ao silêncio voltou,

SOL NOTURNO — III

Por uns momentos
tu de novo me quiseste
e o mundo
retornou ao Paraíso.
Um raio fugaz
do teu sorriso
era todo o sol da terra,
antes da sombra
que vestiu minha alma.

SOL NOTURNO — V

Negro Sol.
Que paixão!
Pudesse eu
ser livre
e sempre Sol
na Solidão!

SOL NOTURNO — VI

Se me perco nesta estrada,
ela assim já tão cavada
de vida que andei perdendo,
vou sorrindo no amanhã,
que o Sol está acendendo
na noite do grande nada.

SOL NOTURNO — IX

Eu sou o Sol da noite abissal.
Eu vim trazer
no ouro do meu ser
o sangue e o sal da luz.
Clarão da madrugada,
eu sou o Profeta
que canta a Amada.

SOL NOTURNO — X

Eu sou a chama,
eu sou a luz
e sou a flor.
Uma fagulha de amor
incendiando as trevas.
E, na tristeza do mundo,
a vermelha rosa,
que no peito levas.

SOL NOTURNO — XI

Chorei a rosa da vida,
que tão cedo murchou...
E como um anel de ouro
o Sol me foi servido
na taça da Noite!
E um lírio então brotou
na canção da Eternidade...

SOL NOTURNO — XII
Que importa a dor
no signo da manhã morta?
Repousa silente à sombra do cipreste
e não esqueças o sonho
de um imenso Sol agreste.

SOL NOTURNO - XIV

Quando as sagas da noite surgirem
e eu já não puder fugir,
empunharei uma Espada
para o teu caminho abrir.
E um Sol então despertará
entre os lírios
na manhã dourada e eterna.

SOL NOTURNO — XVI

Onde estão os poetas?
Que flores estarão plantando
na manhã
em verdes campos?

NOVlLÚNIO — I

Em sono e vento
acordei para o amanhã.
E então brisas
em ouro
sopraram na floresta
que encobria o Sol,
No reino se fecundaram astros
que atropelaram os róseos sonhos.
E as águas mornas do lago
me cobriram de poemas.
A Poesia, a deusa que me embalava.
E a noite, o ósculo em que apaguei todos os sonhos!

NOVILÚNIO — II

O som de negro explodiu
nas róseas sombras
e a paina se ergueu
símbolo das noites.
Trombas de luz faiscaram então
na rósea luz de tua mão.
E, perdida,
eu te busquei,
chorando ventos
e cantando areia.
E na dor dos meus passos lentos,
eu era inseto grudado à teia.

NOVILÚNIO — III

Novilúnio.
Da noite brotou o Futuro,
muro sem vida,
escondendo o Sol.
Suaves acordes
deleitaram o triunfo.
A aguerrida Lua
beijando o Sol.

NOVILÚNIO — IV

Lá está a minha grei.
Lá está a minha gente.
Lá de alguma forma
eu sou rei.
Lá está minha vertente,
lá nos meus pagos distantes
dos legendários heróis.
Lá onde ao cair da tarde
é de ver-se o Sol que arde
nos corações minuanos...
E do vento frio,
na planície,
ergue-se a Cidade-sereia,
a Noiva do Mar!

Fonte:
Aparício Fernandes (org.). Anuário de Poetas do Brasil – 3. Volume. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1980.

Antônio Assumpção (1922 – 1998)

Antônio Assumpção (Antônio de Castro Assumpção), filho de Arlindo Campos Assumpção e de D. Alda de Castro Assumpção, nasceu no Rio Grande (RS) em 28 de março de 1922 e faleceu no Rio de Janeiro, em 11 de novembro de 1998. Formou-se em Direito na tradicional Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (1946) e em Ciências Econômicas na Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas do Rio de Janeiro (1973). Doutor em Direito e Livre-Docente de Teoria Geral, na Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense (1962). Exerceu os cargos de Inspetor Federal do Ensino Secundário, Promotor Público e Juiz de Direito no Estado de São Paulo e, a partir de 1951, o de Juiz de Direito na cidade do Rio de Janeiro, sendo Desembargador do Tribunal de Justiça, depois de ter sido Juiz e Presidente do I Tribunal de Alçada do Estado do Rio de Janeiro. Após a aposentadoria, em 1992, voltou a exercer a advocacia. Dedicou-se, também, ao estudo da astrologia e da história de Portugal.

Portador do Colar do Mérito Judiciário, do Colar do Mérito Judiciário Militar, da Medalha do Mérito da Magistratura, da Medalha Estado da Guanabara, da Medalha Benjamin Constant, da Medalha da Ordem dos Velhos Jornalistas e da Medalha Cultural Pereira Coruja.

Em 1989 foi agraciado, pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, com o título de Cidadão do Estado do Rio de Janeiro.

Publicou "Estado Federal", "O Sentido do Direito" e "O Poder do Estado Contemporâneo", obra e escritos de doutrina jurídica, e *'Folhas do Outono", "Sol Noturno", "Novilúnio", “Seival”, “Perpétua Rosa”, “As Cinco Pontas da Estrela”, “A canção do africano”, obras poéticas.

Membro titular da Academia Brasileira de Ciências Morais e Políticas (Cadeira n.º 11); Academia Carioca de Letras (Cadeira n.º 6); Academia Rio-Grandense de Letras (Cadeira n.º 10).

Deixou para seus descendentes uma das maiores bibliotecas particulares do Brasil, com cerca de 25 mil volumes, repleta de relíquias como uma edição em latim do Corpus Juris Civilis (datada de 1825) e coleções completas de famosos juristas, economistas e poetas nacionais e estrangeiros.

Fontes:
Aparício Fernandes (org.). Anuário de Poetas do Brasil – 3. Volume. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1980.
Wikipedia.