quarta-feira, 10 de junho de 2009

Humberto de Campos (A Rosa Azul)



O comendador Luiz de Faria acabava de fechar os olhos à velha marquesa de São Justino, adoçando-lhe o momento da morte com a noticia alvissareira e mentirosa da completa regeneração do seu neto, o estudante Guilherme de Araújo, quando o encontrei à porta da casa funerária, à espera do seu automóvel. Abalado, ainda, pela emoção daquele instante, em que tivera de lançar mão de uma falsidade para perfumar o último sopro de uma vida de virtudes e sofrimentos, o antigo par do reino português aceitou um lugar no meu "taxi", e confessou-me, em viagem:

- A mentira, meu amigo, é, às vezes, uma necessidade. Aquela de que me socorri há meia hora, para suavizar a morte de uma santa, de uma senhora cuja maior esperança consistia no futuro de um neto que se desgarrara do lar, era tão necessária como a do prior da Cartuxa para alegrar a agonia daquele célebre monge do Bussaco.

Eu olhei, interrogativamente, o meu companheiro de viagem, e ele, percebendo a ignorância, indagou, com admiração:

- Não conhece, então, a lenda da rosa azul?

À minha afirmativa, que lhe pareceu estranha, o comendador apoiou as mãos robustas no castão de ouro da bengala, e contou:

- No Mosteiro da Cartuxa, no Bussaco, em Portugal, vivia, em séculos que já se foram, um piedoso e santo monge, cuja vida se consumia, inteira, entre a oração e as rosas. Jardineiro da alma e das flores, passava ele as manhãs de joelhos, no silencio da nave, aos pés de um Cristo crucificado, e as tardes, no pequeno jardim da ordem, curvado diante das roseiras, que ele próprio plantava e regava.

O comendador interrompeu um momento a narrativa, recostou-se na almofada, e continuou:

A sua paciência de jardineiro era absorvida, entretanto, por uma idéia, que era um sonho: encontrar a rosa azul das legendas do Oriente, de que tivera noticia, uma noite, ao ler os poemas latinos dos velhos monges medievais. Para isso, casava ele as sementes, os brotos, fundia os enxertos, combinando as terras, com que as cobria, e as águas, com que as regava, esperando, ansioso, o aparecimento, no topo da haste, do sonhado botão azul! Ao fim de setenta anos de experiências e sonhos, em que se lhe misturavam na imaginação as chagas vermelhas de Cristo e as manchas celestes da sua rosa encantada, surgiu, afinal, no coroamento de um galho de roseira, um botão azul, como o céu. Centenário e curvado, o velhinho não resistiu à emoção; adoeceu, e, conduzido à cela, ajoelhou-se diante do Crucificado, pedindo-lhe, entre soluços pungentes, que, como prêmio à santidade da sua vida, não lhe cerrasse os olhos sem que eles vissem, contentes, o desabrochar da sua rosa azul.

Uma nova pausa, e o meu companheiro tornou:

- Em volta do santo velhinho, no catre do mosteiro, todos choravam, compungidos. E foi, então, que, divulgada de boca em boca, foi a noticia ter a um convento das proximidades, onde jazia, orando e sonhando, uma linda infanta de Portugal. Moça e formosa, e, além de formosa e moça, - fidalga e portuguesa, compreendeu a pequenina freira, no jardim do seu sonho, o valor daquela ilusão, e correu à sua cela, consumindo toda uma noite a fazer, com os seus dedos de neve, uma viçosa flor de seda azul, que perfumou, ela própria, com essência de gerânio. E no dia seguinte, pela manhã, morria no seu catre, sorrindo entre lágrimas de alegria, por ter nas mãos tremulas, por um milagre do céu, a sua rosa azul!

O "taxi" parava no meio-fio da calçada, o comendador acrescentou, estendendo-me a mão agradecida:

- Feliz, meu amigo, aquele que morre, como esse monge e a marquesa, apertando nas mãos a rosa, mesmo mentirosa, de uma roseira de que cuidou toda a vida.

Fonte:
Domínio Público

domingo, 7 de junho de 2009

Trova XVIII

Nilton Manoel (Constelação de Trovas)



1
Quem tem vida vive atento
pêlos caminhos que enfrenta;
brinda as farpas do momento
com chocolate e pimenta.

2
O chifre em terra rachada
em bucolismo infernal,
é o adorno que traça a estrada
da carência de água e sal.

3
Florestas? - Quero espigões!
e a fauna toda enjaulada!
... e a moda de altos portões,
esconde a noite estrelada.

4
Depois dos cinqüenta, creio,
tudo é lucro e coerência;
homem que não faz rodeio,
sabe o que vale a existência.

5
Homem é o que sabe ser
companheiro, amigo e irmão;
Quem preza o Bem, sabe ter
da vida toda a emoção.

6
Meu pai, exemplo perfeito
de luta e vitalidade;
ao partir, por ser direito,
deixou sincera saudade.

7
Quando o homem é Homem não chora,
enfrenta as farpas da vida,
vence a fauna hostil com a flora
tornando a estrada florida.

8
O amante da Filomena,
se encontra o ex-marido dela,
treme tanto de dar pena...
e geme sem dor com ela!

9
Solteiro? - Querida! Ó vida
de prazeres... sonhos tantos!
Casados? ? Os nós da lida,
cegam os reais encantos!?

10
No lirismo de meu povo
sonho e tenho sempre fé
que num dia de sol novo
será plena a paz.. de pé!

11
Enfim dono dos saberes
da vida, em música e dança,
concluo que, o fim dos seres
é o limite da esperança.

12
Corre-se tanto, mas tanto,
pelo pódio e sua glória
que, o enfim é o fúnebre pranto,
de um troféu ao fim da história!

13
Quando há morte programada
pelos quadrantes da terra,
homens que não valem nada
sentem paz plantando guerra.

14
Cavalgando sem rodeios
por galáxias estreladas,
o poeta, em seus anseios
tece trovas requintadas.
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Artur de Azevedo (A Ama-Seca)



O Romualdo, marido de D. Eufêmia, era um rapaz sério, lá isso era, e tão incapaz de cometer a mais leve infidelidade conjugal como de roubar o sino de São Francisco de Paula; mas - vejam como o diabo as arma! Um dia D. Eufêmia foi chamada, a toda a pressa, a Juiz de Fora, para ver o pai que estava gravemente enfermo, e como o Romualdo não podia naquela ocasião deixar a casa comercial de que era guarda-livros (estavam a dar balanço), resignou-se a ver partir a senhora acompanhada pelos três meninos, o Zeca, o Cazuza, o Bibi, e a ama-seca deste último, que era ainda de colo.

Foi a primeira vez que o Romualdo se separou da família. Custou-lhe muito, coitado, e mais lhe custou quando, ao cabo de uma semana, D. Eufêmia lhe escreveu, dizendo que o velho estava livre de perigo, mas a convalescença seria longa, e o seu dever de filha era ficar junto dele um mês pelo menos.

O Romualdo resignou-se. Que remédio!...

Durante os primeiros tempos saía do escritório e metia-se em casa, mas no fim de alguns dias entendeu que devia dar alguns passeios pelos arrabaldes, hoje este, amanhã aquele. Era um meio, como outro qualquer, de iludir a saudade.

Uma noite coube a vez ao Andaraí Grande. O Romualdo tomou o bonde do Leopoldo, e teve a fortuna ou a desgraça de se sentar ao lado da mulatinha mais dengosa e bonita que ainda tentou um marido, cuja mulher estivesse em Juiz de Fora.

Nessa noite fatal a virtude do Romualdo deu em pantanas: tencionando ele ir até o fim da linha, como fazia todas as noites, apeou-se na Rua Mariz e Barros, ali pelas alturas da Travessa de São Salvador. A mulata havia se apeado algumas braças antes.

E ele viu, à luz de um lampião, o vulto dela saltitante e esquivo, e apressou o passo para apanhá-la, o que conseguiu facilmente, porque, pelos modos, ela já contava com isso.

- Boa noite!

- Boa noite.

- Como se chama?

- Antonieta.

- Pode dar-me uma palavra?

- Por que não falou no bonde?

- Era impossível... estava tanta gente... e estes elétricos são tão iluminados.

- Mas o sinhô bolinou que não foi graça! vamos, diga: que deseja?

- Desejo saber onde mora.

- Não tenho casa minha; tou empregada numa famia ali mais adiente, por siná que não stou satisfeita, e ando procurando outra arrumação.

- Onde poderemos falar em particular?

- Não sei.

- Você sai amanhã à noite?

- Amanhã não, porque saí hoje, e não quero abusá.

- Então, depois de amanhã?

- Pois sim.

- Onde a espero?

- Onde o sinhô quisé.

- Na Praça Tiradentes, no ponto dos bondes. As oito horas.

- Na porta do armazém do Derby?

- Isso!

- Tá dito! Inté depois d'amanhã às oito hora.

- Não falte!

- Não farto não!

No dia seguinte, o Romualdo contou a sua aventura a um companheiro de escritório que era useiro e vezeiro nessas cavalarias... baixas, e o camarada levou a condescendência ao ponto de confiar-lhe a chave de um ninho que tinha preparado adrede para os contrabandos do amor.

Antonieta foi pontual; à hora marcada lá estava à porta do Derby, com ares de quem esperava o bonde.

O Romualdo aproximou-se, fez um sinal, afastou-se e ela seguiu-o...

Dez dias depois, estava ele arrependidíssimo da sua conquista fácil, e com remorsos de haver enganado D. Eufêmia, aquela santa! Procurava agora meios e modos de se ver livre da mulata, cuja prosódia era capaz de lançar água na fervura da mais violenta paixão.

Vendo que não podia evitá-la, tomou o Romualdo a deliberação de fugir-lhe, e uma noite deixou-a à porta do ninho, esperando debalde por ele. Lembrou-se, mas era tarde, que havia prometido dar-lhe uni anel, justamente nessa noite.

- Diabo! pensou ele, Antonieta vai supor que lhe fugi por causa do anel!

Voltou, afinal, D. Eufêmia de Juiz de Fora. Veio no trem da manhã, inesperadamente, e já não encontrou o marido em casa.

Estava furiosa, porque a ama-seca de Bibi deixara-se ficar na estação da Barra. Podia ser que não fosse de propósito. O mais certo, porém, era o ter sido desencaminhada por um sujeito que vinha no trem a namorá-la desde Paraíbuna.

Quando D. Eufêmia contou isso ao marido, acrescentou indignada:

- Que homens sem-vergonha!... Não podem ver uma mulata!...

O Romualdo perturbou-se, mas disfarçou, perguntando:

- E agora? E preciso anunciar! Não podemos ficar sem ama-seca!

- Já mandei o Zeca pôr um anúncio no Jornal do Brasil.

No dia seguinte, o Romualdo saiu muito cedo; ao voltar para casa, a primeira coisa que perguntou à senhora foi:

- Então? Já temos ama-seca?. .

- Já; é uma mulatinha bem jeitosa, mas tem cara de sapeca. Chama-se Antonieta.

- Hem? Antonieta?

- Que tens, homem?

- Nada; não tenho nada... E jeitosa?... Tem cara de sapeca?... Manda-a embora! Não serve! Nem quero vê-la!...

- Ora essa! Por quê? Olha, ela aí vem.

Antonieta chegou, efetivamente, com o Bibi ao colo; mas o Romualdo tinha fechado os olhos, dizendo consigo:

- Que escândalo!... rebenta a bomba!... este diabo vai reclamar o anel!.

Mas como nada ouvisse, o mísero abriu os olhos e - oh! milagre! - era outra Antonieta!.

Ele pensou, os leitores também pensaram que fosse a mesma; não era.

Decididamente, há um Deus para os maridos que enganam as suas mulheres.

Fontes:
Domínio Público
Imagem = Fundação Casa de Rui Barbosa

Projeto de Trovas Para Uma Vida Melhor (Resultados da 2a. Etapa)



Grupo 1 Nacional
Tema: Paciência
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VENCEDORES
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1º Lugar
Ante as agruras da vida,
que nos chegam com freqüência,
a conduta mais contida
é seguir com paciência.
Hélio Pedro Souza
Natal/RN


2º LUGAR
A Paciência é uma virtude
que, junto à perseverança,
de nós, afasta a inquietude,
e traz de volta a esperança!
Delcy Rodrigues Canalles
Porto Alegre/ RS

3º LUGAR
Só com paciência se alcança
o que se espera da vida.
Siga com mais esperança
a cada meta vencida!
Leonilda Yvonneti Spina
Londrina/PR
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MENÇÃO HONROSA
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1.
Dá-me, Deus, com certa urgência,
a graça que aqui rabisco:
dez por cento da paciência
que puseste em São Francisco!
Humberto Rodrigues Neto
Pirituba/SP

2.
Motorista, paciência...
Calma lá, meu companheiro!
Não se esqueça: competência
nem sempre é chegar primeiro!
Antonio Augusto de Assis
Maringá/PR

3.
Não há nada que se negue
ao homem manso e cortês:
a paciência consegue
muito mais do que a altivez!
Renata Paccola Frischkorn
São Paulo/SP


4.
É na sua deficiência,
que o cego, na escuridão,
acende a luz da paciência
no altar do seu coração...
Ercy Maria Marques de Faria
Bauru/SP

5.
"Quando a dor chega a seu lar
paciência é uma virtude
que se deve cultivar
com amor em plenitude!"
Sônia Ditzel Martelo
Ponta Grossa/PR
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MENÇÃO ESPECIAL
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1.
Quem pratica a paciência,
como virtude na vida
supera toda ciência
vence a mais perversa lida.
Wilton Di Cali
Guarulhos/SP

2.
Paciência tem limite,
eu sempre pensei assim;
embora não acredite,
nosso amor chegou ao fim.
Neiva Fernandes
Campos dos Goytacazes/RJ

3.
A virtude da paciência
nos traz equilíbrio e paz
ao evitar a imprudência
de uma atitude fugaz.
Alfredo Barbieri
Taubaté/SP

4.
Um desafio na vida
é vencer tribulações
e a paciência nos convida
a refrear emoções.
Marina Gomes de Souza Valente
Bragança Paulista/SP

5.
Quando a dor desta existência
torna-se um fardo pesado,
a Deus peço a Paciência
e na fé sigo amparado!
Maria Emília Leitão Medeiros Redi
Piracicaba/SP
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GRUPO 2 NACIONAL
Tema: Paciência
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VENCEDORES
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1º Lugar
Contra a grande violência
e a total insegurança,
é melhor ter paciência
e uma dose de esperança,
Ilze Soares
São Paulo/SP


2º Lugar
Paciência teve Jó
que tantas dores sofreu,
perdeu tudo, ficou só
mas, sua fé não morreu.
Mifori
Mogi das Cruzes/SP

3º Lugar
Tenha a calma de um regato,
da criança a inocência;
você verá que, de fato,
a tudo vence a paciência.
Adamo Pasquarelli
São José dos Campos/SP
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MENÇÃO HONROSA
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1.
Neste mundo em que vivemos,
de tanta pressa e aflição
que paciência nós temos
para ajudar um irmão?!
Diamantino Ferreira
Campos dos Goytacazes/RJ

2.
Loja de conveniência,
farmácia e lanchonete
ofereçam “Paciência”
em comprimido ou tablete.
Gisleno Feitosa
Teresina/PI

3.
Todas as dores do mundo,
tem uma causa, uma essência.
Mas, com fé e amor profundo,
Deus nos provê Paciência!
Dilma Ribeiro Suero
Estácio/RJ

4.
Paciência é um preceito
de quem tem fé, confiança,
e acredita no conceito:
"Quem espera sempre alcança"
Decio Rodrigues Lopes
Mogi das Cruzes/SP

5.
Tenha paciência, senhora,
na vida tem recomeço;
quando um amor vai embora,
outro amor manda endereço.
Clênio Borges
Porto Alegre/RS
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MENÇÃO ESPECIAL
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1.
Diante de tanta violência,
serena, medita e ora;
espera com paciência
e vive no aqui e agora.
Elisa Santos
Ponta Grossa/PR

2.
Se teu viver é exemplar,
com paciência e união,
tua vida há de brilhar,
como uma bela lição!
Arlene Lima
Maringá/PR

3.
A paciência na dor
é virtude de alma forte.
Vislumbra tão grande Amor,
vai vencer até a morte.
Elisa Alderani
Ribeirão Preto/SP

4.
Paciência!... Paciência!...
Oh meu Deus, me dá um pouco...
Pois se dela, há carência,
fico agindo como um louco.
Raquel Delvaje
Piracicaba/SP

5.
Houve pedras no caminho...
Em que eu tanto tropecei,
com paciência e carinho,
na esperança confiei!
Célia Apparecida Silli Barbosa
Ribeirão Preto/SP
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GRUPO INTERNACIONAL
Tema: Paciência
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VENCEDORES
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1º Lugar
Paciência é uma virtude
que se tem, mas que se gasta
quando se toma a atitude
de, para alguém, dizer: - Basta!
António José Barradas Barroso
Portugal

2º Lugar
Tanta era a sua pobreza
com humildade e decência,
que, faltando o pão na mesa,
lhe sobrava a paciência.
Olívia Alvarez Miguez Barroso
Portugal

3º Lugar
Que Deus me dê paciência
para sofrer esta dor
de ver que a inconsciência
mata e diz que é por amor!
Gisela Alves Sinfrónio
Olhão/Portugal
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MENÇÃO HONROSA
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1.
Em teus braços meu amor
me sinto plena e feliz,
tua paciência é calor,
dá a minha vida matiz.
Nora Lanzieri
Buenos Aires/Argentina

2.
Os avanços da ciência,
por vezes vão devagar,
preciso ter paciência
para uma cura aguardar...
Aciolinda Spranger
Lagos/Portugal

3.
Se diz não ter paciência
pra ler, da Bíblia, conselhos;
use da sua valência:
Fale com Deus, de joelhos...
Maria da Conceiçãoo Custódio Sanches
Gois/Portugal

4.
Com positiva paciência
obra boa descortina,
te diz a minha consciência
que sempre Deus ilumina.
Jamil William Piscoya Ayala
Ferreñafe/Peru

5.
Para todo o sofrimento
É preciso Paciência
Um olhar com sentimento
A quem vive na indigência.
Maria José Fraqueza
Fuzeta/Olhão/Portugal
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MENÇÃO ESPECIAL
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1.
Se a paciência faltar
nas penas, que hão-de ser luz...
Lembra Deus a carregar
por nós, o peso da Cruz!
Clarisse Barata Sanches
Góis/Portugal


2.
Se na dor, por excelência,
O amor é primordial...
Há o sofrer, com paciência,
De quem sofre d'algum mal!
Fernando Reis Costa
Coimbra/Portugal

3.
Um homem sem paciência,
nem na dor tira vantagem;
e vê na sua existência
uma vida sem coragem!
Jorge A. G. Vicente
Suiça

4.
No sofrimento e na dor
rogo a Deus Sua clemência,
resarei com mais fervor,
para me dar paciência...
António Boavida Pinheiro
Lisboa/Portugal

5.
Paciência é virtude
que no mundo pouco abunda;
hoje em qualquer latitude
está quase moribunda.
Euclides Cavaco
Canadá
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Colaboração
Antonio Augusto de Assis, por e-mail.

sábado, 6 de junho de 2009

Trova XVII

Benjamin Sanches (Solidão)



O pássaro de barro da saudade
Revoando no aro dos meus olhos
Repousou nos meus dedos de silêncio
Partindo para as terras ignotas.

Divaguei nos roteiros do amanhã
(Quilhas cortando o ventre do espaço
Rasparam os recifes das quimeras
Encalhando nas rochas das lembranças).

E aquela argila diluída em sombras
Incensando o meu templo de memórias
Nas alvoradas dos meus sofrimentos.

Na grande solidão do inatingível
Ancorei o coração num mar de lágrimas
E adormeci num inferno entre dois céus.
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Benjamin Sanches (o tartaruga)


É de se registrar que, nessa obra, o autor escreveu exclusivamente com minúsculas (inclusive o título) e alinhou os parágrafos pela direita.

depois de entregar-se por muito tempo à água, voltou a terra onde com a matemática dos olhos procurava descobrir os lugares onde os tracajás haviam enterrado os seus ovos e, isto, os homens da ciência sabiam menos que ele. a prática fizera-o mestre no buscar os ninhos camuflados no igual do branco da areia.

a praia, descendo da densa mata devoluta, serpenteava no rumo do rio onde um enorme jacaré, num peso de montanha, dilatou o vazio para dar duas rabanadas, e, em vôo submerso atingiu o mo-lhado da margem e ficou olhando-o com um olhar famélico. era um inimigo que não ficara de vir, embora ter, ele, admitido, sempre, a possibilidade daquela indesejável presença. via o espírito da fome rondando as suas carnes. sentiu-se quase prisioneiro. na posição em que ficara, a fera, dominava, realmente, a única saída. o seu casco, que havia deixado na beira, estava a dois passos do anfíbio, cujas patas velozes arranhavam o chão num chi-chi manhoso, preparando-se para a furiosa investida.

as suas pernas que nunca dançaram de alegria, bailavam, agora, dentro da calça no assombro de ser estraçalhado pelo chocalhar daquelas mandíbulas maiores que o seu corpo descascado pelo quente da tarde. ele já havia vivido toda a idade do crescimento e não conseguira ir além dos cinco palmos. parecia que os ventos sopraram, sempre, a sua vida de cima para baixo. tinha isto, como uma pobreza envergonhada, da sua condição de homem. a natureza
havia-o prejudicado na distribuição dos tamanhos.

quando conseguiu sair daquelas circunvoluções do susto e voltar ao estado de medo consciente, não quis dar tudo como perdido, embora tivesse que passar por um fininho tubo da vida. segurou-se a ele como quem agarrasse um objeto que ia perder para sempre, e, no esforço de renascer daquela quase morte intempestiva, enfiou a cabeça em desabalada carreira, internando-se no grosso da mata. uma chuva, cujo turbilhão de água mais parecia ser de cimento e ferro, desabava retorcida com a noite, tornando-a intensamente escura. os filtros da sua carne começaram, lentamente, a dar passagem ao frio a caminho dos seus ossos. numa noite clara, poderia varar o longe e alcançar a vila em três horas de regular caminhada, mas, o escuro tomara altura e não deixava à amostra, nem um astro que o orientasse. para caminhar seria imprescindível algum rastro de luz
desembocando das trevas.

astro
rastro
vasto

o pio dos pássaros e o barulhar da chuva fundiam-se com os esturros das feras e num só grito, cortava o vasto verde, que não
se apagava da sua memória.

verde vasto verde
dia verde
noite verde
grito verde
pio verde
verdeverdeverde

sentiu necessidade de resguardar-se e tateando com os pés na terra encharcada caminhou alguns passos entre a tiririca que lhe cortava a pele, até conseguir abraçar-se à perna de uma árvore e subiu até a primeira forquilha. ali, poderia passar a noite, incomodamente, é verdade, mas suspenso do perigo que rastejava no escuro. as suas carnes mergulhadas no grosso da chuva viviam minutos de horror, em meio àquela combinação de sons perversos e imprevistos, que iam despojando-o, aos poucos, de sua coragem. de quando em quando abandonava a cabeça num cochilo e acordava descendo no espanto. precavendo-se de uma queda desastrada, desafivelou o cinturão e com ele, procurou envolver barriga e forquilha. não conseguiu
nesta, subiu para outra mais fina e amarrou-se.

aforquilhado dentro do molhado da noite, ouvindo, medrosamente, os berros dos afiados dentes e o cochichar das raízes, não obstante, acontecia de longe em longe, lembrar-se do seu casco, na preocupação que a água da chuva empurrasse praia afora, levando a farinha e a rapadura que na manhã próxima, roeriam a fome
que já roía o seu estômago.

o tempo espichando-se demorava a soltar a sua condição de noite e, ele, esperando resignadamente que a manhã viesse libertá-lo, rosnou um sono de chumbo e sonhou que passeava elegantemente pela praça da igreja, onde aos domingos à tarde, as mocinhas mais gostosas da vila desfilavam exibindo apuro e beleza. embalando-se na miragem, via que todas o olhavam com olhos gulosos, e uma delas, não suportando refrear a gulodice, aproximou-se e beija-lhe os lábios com seriedade e paixão. ele não sabia o porquê e preferiu não fazer perguntas. era um novo amanhecer no seu mundo. a sua alegria refletia-se nas paredes e até no chão enxuto. de mãos dadas, saíram caminhando sob as vistas de centenas de pupilas espantadas. espantadas porque todos sabiam que jurara nunca amar, quando na seresta para a primeira conquista,
deram-lhe um banho de bacio.

agora, estava suadinho de fé, e procurava com os dedos arrumar os cabelos, quando de súbito, num estrondo metálico que varreu o ar, o apelido, impiedosamente abalroou o seu ouvido: – tartarUUUUga! – todo o ódio do mundo apareceu na sua cara. naquele momento odiou até as rosas. sentiu vontade de fazer mil coisas de uma vez. queria morder. queria rasgar. queria matar. sim. sentiu desejo quase irresistível de matar. a sua alma ficou, por muito tempo, galopando na mais brutal raiva do mundo. pensou que seria melhor desmanchar com a vida, o único meio para se livrar daquela alcunha. não mais poderia engolir aquele epíteto humorístico que o havia enchido até por fora da roupa. todos, desapiedadamente, o chamavam de tartaruga. nunca presumira que o seu nome de cartório desaparecesse tão completamente. nunca mais ouvira pronunciá-lo. todos o chamavam de tartaruga.
diziam-lhe até com os olhos: tartaruga, somente tartaruga.

era o ridículo do apelido, que o obrigava a embarcar naquele pequeno casco de itaúba preta e isolar-se o dia todo, depois de remar para as praias distantes e desertas, cuja beleza mansa e
perigosa ainda não aprendera a dominar.

agora, mais enfurecido que nunca, tomou posição para desaparecer de uma vez por todas, quando sentiu o braço da moça doce e gentil cingir-lhe a barriga, não o deixando se afastar e sussurrando o seu nome, com os lábios quentes roçando a sua orelha – jorgitinho. foi assim que a ouviu chamar, amorosamente, o diminutivo do seu nome. estremeceu dentro da cadeia do abraço e tudo se fez claro quando acordou preso à forquilha. mas, mesmo assim, sentiu-se feliz por se encontrar entre feras e bem longe dos
humanos. humanos? não! jorgito nunca os considerou como tais.
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Sobre o autor
Nasceu em Manaus, no dia 21 de abril de 1915, o poeta e contista Benjamin Sanches de Oliveira. Faleceu na mesma cidade no ano de 1978. Obra de ficção: o outro e outros contos, 1963.
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Fonte:
SANCHES, Benjamin. O outro e outros contos. Manaus: Ed. S. Cardoso, 1963.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Trova XVI

Montagem sobre Tela de René Magritte

Adalcinda Camarão (Caldeirão Literário do Pará)


BOM DIA, BELÉM

Há muito que aqui no meu peito
Murmuram saudades azuis do teu céu
Respingos de ausência me acordam
Luando telhados que a chuva cantou
O que é que tens feito
Que estás tão faceira
Mais jovem que os jovens irmãos que deixei
Mais sábia que toda a ciência da terra
Mais terra, mais dona do amor que te dei

Onde anda meu povo, meu rio, meu peixe
Meu sol, minha rêde, meu tamba-tajá
A sesta o sossego da tarde descalça
O sono suado do amor que se dá
E o orvalho invisível na flôr se embrulhando
Com medo das asas do galo cantando
Um novo dia vai anunciando
Cantando e varando silêncios de lar

Me abraça apertado, que eu venho chegando
Sem sol e sem lua, sem rima e sem mar
Coberta de neve, lavada no pranto
Dos ventos que engolem cidades no ar
Procuro o meu barco de vela azulada
Que foi de panada sumindo sem dó
Procuro a lembrança da infância na grama
Dos campos tranquilos do meu Marajó

Belém minha terra, minha casa, meu chão
Meu sol de janeiro a janeiro a suar
Me beija, me abraça que quero matar
A doída saudade que quer me acabar
Sem círio da virgem, sem cheiro cheiroso
Sem a "chuva das duas " que não pode faltar
Cochilo saudades na noite abanando
Teu leque de estrelas, Belém do Pará!
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ESPAÇO-TEMPO

Quero-te mesmo, amor, na ausência ou na presença,
com rumores de sombra, alarde ou desafios.
―Dormir num chão de luar à sombra de roseiras
ou sob os pirisais na baixada dos rios...

Assim te amo e te sei amando dia-a-dia,
acordada ou dormindo o germinal segredo.
E te abraço sem ter teu corpo ao meu, beijando
a saudade sem ser de quem se tem sem medo.

Amo-te mesmo, amor, no madrigal do tempo,
derrubando androceus e gineceus se amando
nas pálpebras do estio que o sono não acorda.

No teu dorso eu descanso a caminhada enorme
que fiz pra te encontrar ― lábios ardendo em busca
da tua noite azul onde minh'alma dorme.

Amo-te mesmo, amor. Se me vens ou te vais.
Sinto-te à flor da pele e à superfície da água
que dessedenta o bem que nos lava o mal.

Amo-te e não sei quem és ― teu nome nem origem.
Só sei que és homem são e me sabes mulher.
Que beleza este amor sem pranto nem vertigem,
sem princípio nem fim, nem dimensão sequer!
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