sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Ialmar Pio Schneider (Mensagem aos Jovens)


“Apresentaram-lhe umas crianças para que as tocasse, porém os discípulos os repreendiam. Vendo-o Jesus, indignou-se e lhes disse: Deixai vir a mim as criancinhas, e não as estorveis, porque delas é o reino de Deus. Em verdade vos digo, quem não receber o reino de Deus como uma criança, não entrará nele. E abraçando-as, abençoou-as, impondo-lhes as mãos”. Marcos 10-13 a 16

De minhas leituras da adolescência, uma me ficou ao longo do tempo na memória. Trata-se da história de um menino, que após haver sido enjeitado pelos pais, foi entregue a um apresentador de espetáculos públicos e passou a viver as mais difíceis situações para sobrevivência. Levavam com eles três cachorros e um macaquinho com que divertiam os assistentes. O titulo do livro é Sem Família, cujo autor Heitor Henrique Malot, foi premiado pela Academia Francesa, 1878. Estou agora relendo-o e descobrindo passagens que já permaneciam esquecidas, mas não de todo, pois relatos deste jaez sempre ficam.

Quantas crianças andam por aí abandonadas pelas ruas, se perdendo no consumo das drogas, sem perspectivas favoráveis de uma vida digna, em total abandono ! Todavia, temos visto algumas pessoas altruístas que também surgindo da pobreza, como é o caso daquela gari da Restinga, que está abrigando inúmeras crianças e ainda continua a construir mais acomodações para proporcionar estudo aos carentes necessitados.

Nesta data desejo transcrever meus versos Mensagem ao poeta, que escrevi no ano de 1981 e publiquei no livro Poesias Esparsas Reunidas, antes, porém, no O Timoneiro de 20.11.81, que assim dizem:

Vai em frente, segue a estrada
sem muito esperar da glória,
vida simples, devotada…
Se alguém ouvir tua estória
nostálgica e merencória,
canta sempre, até por nada !…

Faze como o passarinho
que saúda a natureza,
enquanto busca um raminho,
com afã e singeleza,
pra construir o seu ninho:
- maior prova de beleza !

Sejam teus versos cantigas
que a gente escuta na rua,
pobres canções, mas amigas
como as estrelas e a lua;
pois a terra será tua
longe de dor e fadigas…

Não temas crítica austera
e nem te afastes do tema,
sempre alcança quem espera;
prosseguir seja teu lema
e verás a primavera
coroar-te com seu diadema !

Esta é uma simples homenagem que dedico às crianças com o poema e à primavera que estamos vivendo.

Outrossim, desejo registrar que li com muito proveito o livro cheio de dinamismo, altruísmo e humanismo, da consagrada preletora da Seicho-No-Ie, Norma Maria Varani, cujo título Uma Vida Dedicada a Servir, já por si diz tudo o que contém de trabalho à uma causa nobre, quais sejam à APAE, ao Asilo Padre Cacique, e outras atividades filantrópicas ao bem-estar da coletividade.

Por fim, com nostalgia dos meus jovens tempos, quero transcrever este soneto antológico de Júlio Salusse, poeta romântico do Rio: “VISÃO

– Vi passar num corcel a toda brida,
Nuvens de poeira erguendo pela estrada,
Um gigante, impassível como o nada,
Indiferente a tudo – à morte e à vida !

Tinha nos braços, como adormecida,
Deusa de olhos azuis, Quimera ou Fada:
Seria, acaso, uma ilusão dourada,
Ou, porventura, uma ilusão perdida?

Assombrado, gritei para o Gigante:
- Quem és tu? Essa deusa é tua amante?
E o cavaleiro – o Tempo – respondeu:

- Eu sou tudo e sou nada nos espaços
E a Quimera, que levo nos meus braços,
É a tua mocidade, que morreu...” –
Rio 27-9-926 ( De “O Cruzeiro”) – Revista.

Lendo-o, atualmente, deixo um recado à juventude, que aproveitem esta quadra da vida para sua formação intelectual e ética a fim de realizarem as obras necessárias ao desenvolvimento deste imenso País, com mais paz e justiça social. Até mais e obrigado pela atenção...

Fonte:
Texto enviado pelo autor
Imagem = por Carla Neli Neto

Dari Pereira (Sopa Poética)


TROVAS

Ouvi conselho de um monge
achei-o mais do que certo:
Quem quiser chegar ao longe
tenha sempre Deus por perto!

Poeta não faz escolha,
desafia qualquer tema,
desdobra folha por folha
e compõe o seu poema.

Recordando a mocidade
e o meu tempo de criança,
faço trova da saudade
e poema da lembrança.

Longe, longe, na campina,
na hora em que a noite desce,
o céu, fechando a cortina,
reza conosco uma prece...

Contendo idéia completa
e pregando o bem geral,
um só verso de um poeta
pode torná-lo imortal.

Quem quiser boa acolhida
pela graça do perdão,
não pode negar, na vida,
um abraço para o irmão.

Descortinar horizontes,
buscar a estrada florida,
cruzar os vales e os montes,
eis a viagem da vida…

Quem é de Deus não padece
no caminho dos ateus…
e a cada dia, na prece,
tem novo encontro com Deus.

DISTANTE

Distante da minha terra,
longe de tudo o que amo,
eu sou um vate que erra,
sinto saudade e reclamo…

Aqui, tão triste e sozinho,
distante do berço amado,
sinto a falta de carinho
e meu viver é magoado.

Distante dos meus amigos,
da festiva serenata,
já não encontro os abrigos
que a noite na alma desata.

Lá na terra pura e santa,
é tão lindo o fim do dia,
na hora em que o sino canta
as preces da Ave-Maria…

A serra, os rios e o vale,
o verde lá da campanha,
temem que um dia se cale
o canto na terra estranha.

Toda carta que eu recebo
só me fala do regresso
e em cada linha, percebo
que nada vale o sucesso.

Se aqui distante, reclamo,
eu deixo tudo, por fim:
- Longe das coisas que amo,
estou distante de mim.

Fontes:
Academia de Letras de Maringá
UBT Nacional

Dari Pereira (1940)


Nasceu na cidade de São Simão, no Estado de São Paulo, dia 22 de Janeiro de 1940. Filho de João Pereira e Nica Gasparini Pereira.

Graduou-se pela Universidade Estadual de Maringá e especializou-se no Magistério tendo sido professor, por vinte e oito anos consecutivos, da rede oficial de ensino do Estado do Paraná.

É poeta e já escreveu quinze livros.

Pertence à Academia de Letras de Maringá e à União Brasileira de Trovadores-UBT desde 1966, sendo presidente da seção de Maringá

Foi presidente da União dos Escritores de Maringá e vice-presidente da Sociedade Cultura Latina do Paraná.

Além de trovador é compositor de músicas, autor do maior sucesso "Jardim Florido" uma valsa que marcou época na cenário da música sertanejo de toda a região.

Primeiro escritor rnaringaense a gravar um CD com poemas teológicos, bíblicos. O lançamento foi feito pela UBT e a TV "Terceiro Milênio "da Arquidiocese de Maringá.

Fonte:
UBT Nacional

Antonio Candido, Anatol Rosenfeld, Decio de Almeida Prado e Paulo Emílio Sales Gomes (A Personagem de Ficção) Parte II - O Problema Lógico


2) O problema lógico. Os enunciados de uma obra científica e, na maioria dos casos, de notícias, reportagens, cartas, diários etc., constituem juízos, isto é, as objectualidades puramente intencionais pretendem corresponder, adequar-se exatamente aos seres reais (ou ideais, quando se trata de objetos matemáticos, valores, essências, leis etc.) referidos. Fala-se então de adequatio orationis ad rem. Há nestes enunciados a intenção séria de verdade. Precisamente por isso pode-se falar, nestes casos, de enunciados errados ou falsos e mesmo de mentira e fraude, quando se trata de uma notícia ou reportagem em que se pressupõe intenção séria.

O termo “verdade”, quando usado com referência a obras de arte ou de ficção, tem significado diverso. Designa com freqüência qualquer coisa como a genuinidade, sinceridade ou autenticidade (termos que em geral visam à atitude subjetiva do autor); ou a verossimilhança, isto é, na expressão de Aristóteles, não a adequação àquilo que aconteceu, mas àquilo que poderia ter acontecido; ou a coerência interna no que tange ao mundo imaginário das personagens e situações miméticas; ou mesmo a visão profunda — de ordem filosófica, psicológica ou sociológica — da realidade.

Até neste último caso, porém, não se pode falar de juízos no sentido preciso. Seria incorreto aplicar aos enunciados fictícios critérios de veracidade cognoscitiva. Sentimos que a obra de Kafka nos apresenta certa visão profunda da realidade humana, sem que, contudo, seja possível “verificar” a maioria dos enunciados individuais ou todos eles em conjunto, quer em termos empíricos, quer puramente lógicos. Na obra de Knut Hamsun há uma visão profunda inteiramente diversa da realidade, mas seria impossível chamar a maioria dos enunciados ou o conjunto deles de “falsos”. Quando chamamos “falsos” um romance trivial ou uma fita medíocre, fazemo-lo, por exemplo, porque percebemos que neles se aplicam padrões do conto de carochinha a situações que pretendem representar a realidade cotidiana. Os mesmos padrões que funcionam muito bem no mundo mágico-demoníaco do conto de fadas revelam-se falsos e caricatos quando aplicados à representação do universo profano da nossa sociedade atual (a não ser que esta própria aplicação se torne temática). “Falso” seria também um prédio com portal e átrio de mármore que encobrissem apartamentos miseráveis. É esta incoerência que é “falsa”. Mas ninguém pensaria em chamar de falso um autêntico conto de fadas, apesar de o seu mundo imaginário corresponder muito menos à realidade empírica do que o de qualquer romance de entretenimento.
Ainda assim a estrutura das orações ficcionais parece ser em geral a mesma daquela de outros textos. Parece tratar-se de juízos. O que os diferencia dos verdadeiros é a intenção diversa — isto é, a intenção que se detém nas objectualidades puramente intencionais (e nos significados mais profundos por elas sugeridos), sem atravessá-las, diretamente, em direção a quaisquer objetos autônomos, como ocorre, no nosso exemplo, na visão do moço real. É essa intenção diversa — não necessariamente visível na estrutura dos enunciados— que transforma as orações de uma obra ficcional em “quase-juízos”(1). A sua intenção não é “séria”(2).

O autor convida o leitor a deter o raio de intenção na imagem de Mário, sem buscar correspondências exatas com qualquer pessoa real deste mesmo nome(3).

Todavia, os textos ficcionais, apesar de seus enunciados costumarem ostentar o hábito exterior de juízos, revelam nitidamente a intenção ficcional, mesmo quando esta intenção não é objetivada na capa do livro, através da indicação “romance”, “novela” etc. Ainda que a obra não se distinga pela energia expressiva da linguagem ou por qualquer valor específico, notar-se-á o esfôrço de particularizar, concretizar e individualizar os contextos objectuais, mediante a preparação de aspectos esquematizados e uma multiplicidade de pormenores circunstanciais, que visam a dar aparência real à situação imaginária. É paradoxalmente esta intensa “aparência” de realidade que revela a intenção ficcional ou mimética. Graças ao vigor dos detalhes, à “veracidade” de dados insignificantes, à coerência interna, à lógica das motivações, à causalidade dos eventos etc., tende a constituir-se a verossimilhança do mundo imaginário. Mesmo sem alguns destes elementos o texto pode alcançar tamanha fôrça de convicção que até estórias fantásticas se impõem como quase-reais. Todavia, a aparência da realidade não renega o seu caráter de aparência. Não se produzirá, na “verdadeira ficção”, a decepção da mentira ou da fraude. Trata-se de um “verdadeiro ser aparencial” (Julian Matias), baseado na conivência entre autor e leitor. O leitor, parceiro da empresa lúdica, entra no jogo e participa da “não -seriedade dos quase-juízos e do “fazer de conta”.

Uma oração como esta: “Enquanto falava, a mulherzinha deitava sobre o marechal os grande olhos que despediam chispas. Floriano parecia incomodado com aquele chamejar; era como se temesse derreter-se ao calor daquele olhar. . .“ (Lima Barreto, Triste Fim de Policarpo Quaresma) revela de imediato, apesar do contexto histórico, a intenção ficcional. O autor parece convidar o leitor a permanecer na camada imaginária que se sobrepõe e encobre a realidade histórica.
______________________
NOTAS
(1) A expressão é usada por Roman Ingarden em Das literarische Kunstwerk. J.-P. Sartre, em L’Imagination, formula: “Il y a lá un type d’affirmation, un type d’existence intermédiaire entre les assertions fausses du rêve et les certitudes de la veille: et ce type d’existence est évidemment celui des créations imaginaires. Faire de celles-ci des actes judicatifs, c’est leur donner trop” (p.137).

(2) Quando da publicação de seus Buddenbrooks, Th. Mann foi violentamente atacado devido ao retratamenso de pessoas e aspectos da cidade de Lübeck. Tais incidentes são freqüentes na história da literatura. Num ensaio sobre o caso (“Bilse und ich”), Th. Mann declarou: “Quando faço de uma coisa uma oração — que tem que ver esta coisa com a oração?” O fato é que mesmo uma cidade realmente existente torna-se ficção no contexto fictício, já que representa determinado papel no mundo imaginário. Isso se refere também às imagens de filmes tomadas no ambiente real correspondente ao enredo: o ambiente, embora em si real, situa-se agora num espaço fictício e torna-se igualmente fictício. Um enunciado como “dois e dois são quatro” é sempre verídico; mas quando preferido por uma personagem, com intenção séria, esta intenção séria é, por sua vez, fictícia; e quando ocorre na própria narração, a intenção fictícia transforma o enunciado em quase-juízo, embora em si certo. Quando, em Á Lição, de Ionesco, o professor e a aluna se debatem com multiplicações astronômicas, ninguém pensaria em verificar os resultados. A função dos juízos aritméticos, no contexto fictício, não é esta.

(3) A consciência do caráter ficcional não tem sido sempre nítida. Wolfgang Kayser (em: Die Wahrheit der Dlchter — A verdade dos Poetas) demonstra que no século XVI os leitores de romance não tinham a noção nítida de que os enunciados respectivos eram fictícios.

-----------------------
continua… O problema epistemológico (a personagem)
_____________________________
Fonte:
Antonio Candido, Anatol Rosenfeld, Decio de Almeida Prado e Paulo Emílio Sales Gomes. A Personagem de Ficção. 2. ed. SP: Perspectiva.
Este livro é digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source com a intenção de facilitar o acesso ao conhecimento a quem não pode pagar e também proporcionar aos Deficientes Visuais a oportunidade de conhecerem novas obras.

Monteiro Lobato (Viagem ao Céu) XX – A aflição dos astrônomos


Certa vez, lá no sítio, Dona Benta explicou aos meninos o que era “sistema planetário”. Parecia um bicho-de-sete-cabeças, mas a boa velha costumava explicar as coisas mais difíceis de um modo que até um gato entendia.

— Sistema — disse ela — é um conjunto de coisas ligadas entre si. E sistema planetário é um conjunto de planetas ligados entre si e o Sol, em torno do qual giram. Este sítio, por exemplo, é um pequeno sistema...

— Sistema de quê? — perguntou Pedrinho. — Planetário não é, porque nós não somos planetas.

— Não somos aqui no sítio um sistema planetário, mas somos um sistema de gentes e coisas. Eu sou o centro, a dona das terras e da casa e das coisas que há por aqui. Vocês são meus netos. Tia Nastácia é minha cozinheira. O Tio Barnabé é meu agregado, isto é, mora em minhas terras com meu consentimento. Há aqui estes objetos caseiros — a mesa, as cadeiras, as camas, o relógio da parede...

— O guarda-chuva grande, os travesseiros de paina, o pote d’água — ajudou Emília.

— Sim, há todos os objetos que nos rodeiam. E lá fora há os animais, a Vaca Mocha, o Burro Falante, o Senhor Marquês de Rabicó, o pangaré de Pedrinho. São entes vivos e coisas inanimadas que giram em redor de mim. São os meus planetas. Eu sou o Sol de tudo isso. Se eu morrer, tudo isso se dispersa. Um vai para cá e outro para lá. Os objetos mudam de dono. Alguém é até capaz de comer o Rabicó assado e de botar o Burro Falante numa carroça. Mas enquanto eu estiver viva e aqui no meu posto de dona, tudo permanece como está e me obedece. Isto quer dizer que formamos aqui um “sistema familial”, em que todas as pessoas e coisas se relacionam à minha pessoa.

— Compreendo, vovó — disse Pedrinho. — As cadeiras e o pote do seu compadre Teodorico, a negra velha que cozinha para ele, as vacas e cavalos da fazenda dele, tudo que há lá não pertence ao nosso sistema aqui — pertence ao outro sistema — ao sistema familial do Coronel Teodorico — não é isso?

Dona Benta sorriu de gosto diante da esperteza do neto.

— Exatamente, meu filho. Gosto de ver como você compreende depressa.

— E eu também não compreendo depressa? — reclamou a menina em tom queixoso.

Dona Benta abraçou-a e botou-a no colo.

— Sim, Narizinho. Em matéria de inteligência você é em tudo igual a Pedrinho. Eu tenho a honra de ser avó de dois netos que são dois amores.

Foi a vez de Emília enciumar-se.

— E eu? E eu? — gritou ela.

— Você também, está claro, porque nunca houve no mundo uma boneca mais viva, mais esperta e inteligente.

Emília derreteu-se toda.

— Pois é isso — volveu a boa senhora retornando ao assunto. — Formamos aqui no sítio o nosso “sistema de pessoas, animais e coisas”. Ali adiante o Coronel Teodorico é o centro de outro sistema do mesmo gênero. O Elias Turco é centro dum terceiro sistema. O próprio Tio Barnabé, que faz parte do nosso sistema, também é centro dum sistemazinho lá dele, composto da mulher, dos filhos e dos cacarecos que possui no casebre — aquele pote d’água, aquelas esteiras, aquelas panelas de barro tão velhas...

— E aquele cachorro sarnento também, o Merimbico — lembrou Emília.

— Sim, tudo isso forma um sistemazinho ligado ao nosso sistema familial. Pois com os astros do céu se dá a mesma coisa. Há pelo éter infinito milhões de sistemas planetários em que certo número de astros giram em redor dum sol, como vocês giram em redor de mim. Vem daí o nome de “sistema planetário”, porque os astros que giram em redor de um sol são os planetas desse sol.

— Já sei — gritou Pedrinho. — E dentro desse sistema planetário do sol, há outros sistemazinhos menores, como aqui o do Tio Barnabé. Os satélites.

— Exatamente — concordou a velha. — Temos o nosso Sol como a Dona Benta celeste. Em redor do Sol giram os planetas Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Saturno, Netuno e também grande número de planetóides.

— Se a senhora é o Sol — lembrou a menina — Emília é Mercúrio — o planeta menor. E eu sou Vênus, o mais bonito.

— Olha a gabola!

— E você, Pedrinho, é Marte, o mais valente. E Tia Nastácia é Júpiter — o mais gordo de todos. E Saturno é a Vaca Mocha — sempre lá fora, já mais longe aqui do centro...

— E Urano, que é longíssimo? — perguntou Pedrinho.

— Urano é aquele cedrão do pasto. E Netuno é o Tio Barnabé que mora nas divisas do sítio.

— Muito bem — aprovou Dona Benta. — Nós moramos no sistema planetário do Sol. Mas cada estrelinha do céu visível a olho nu ou graças ao telescópio, é também um sol com, talvez, o seu sistema planetário.

Emília interrompeu-a com uma das suas.

— Dona Benta, olho nu não é indecente? — perguntou ela com a maior simplicidade, fazendo que todos rissem.

A boa velha achou que não valia a pena responder e prosseguiu:

— Deve haver milhões de sistemas planetários por esse universo infinito. Nós vivemos num deles. O Sol é o pai de todos nós aqui — nós planetas; nós plantas; nós bichões ou bichinhos. Se o Sol desaparecer, todos nós levaremos a breca. Os planetas rolarão pelo espaço, desgovernados e tontos, até se escangalharem, e nós aqui, bichinhos da Terra, morreremos de frio e horror...

Essa conversa fora dias antes do passeio dos meninos pelo céu e muito contribuíra para que eles se animassem a tentar a grande aventura, com o fim de ver com os próprios olhos como eram as coisas por lá.

Mas o sistema planetário do Sol é uma coisa muito bem arranjadinha, tal qual o.maquinismo dum relógio. Um relógio só funciona bem quando tudo está em seu lugar — todas as rodinhas e pecinhas. Se alguma delas se desarranja, ou se cai entre elas um grão de poeira, o relógio pára, ou começa a “reinar” — a atrasar-se ou adiantar-se.

Foi o que se deu com o sistema planetário do Sol durante a reinação celeste dos meninos. Esse sistema sempre vivera quieto, bem arrumadinho, sem perturbações, até o dia em que eles começaram a atrapalhar tudo. E tais coisas fizeram lá por cima, que até produziram um satélite novo: lá estava o Doutor Livingstone girando em redor da Lua como um satelitezinho pernudo!...

Ora, os astrônomos são uns sábios admiráveis aos quais não escapa coisa nenhuma do céu. Sempre a espiarem pelos seus telescópios, vão vendo tudo, tomando nota de tudo e fazendo cálculos. Logo que os meninos chegaram à Lua, começaram os astrônomos a observar “perturbações inexplicáveis”, e de repente perceberam um satélite da Lua, coisa que nunca tinham visto antes — e um satélite diferente de todos os satélites conhecidos — em vez de redondo, tinha perninhas, braços e chapéu de explorador africano, com fitinha atrás! Em seguida observaram uma grande perturbação na cauda do cometa de Halley, como se um burro andasse pastando por lá. E depois deram com manchas nos anéis de Saturno, como se alguém andasse patinando por lá.

Essas perturbações, jamais observadas, causaram a maior sensação no mundo da ciência. Numerosos artigos foram publicados na imprensa, e o povo ignorante tremeu de medo, julgando que fossem sinais de “fim do mundo”.

Infelizmente os telescópios ainda não eram bastante poderosos para que os sábios pudessem ver os meninos reinando no espaço; eles verificavam as perturbações, mas não descobriam a causa — e começaram a formular hipóteses. E ainda estavam nisso, quando foi inaugurado o gigantesco telescópio de Palomar, na Califórnia, que custou 6 milhões de dólares e tinha uma lente de 5 metros e meio de diâmetro. Por meio desse potentíssimo óculo de alcance puderam eles descobrir o mistério das perturbações celestes: os famosos netos de Dona Benta andavam reinando por lá!

E enquanto isso, a pobre vovó suspirava sentidamente lá em sua redinha da sala de jantar. Seus amados netos haviam desaparecido misteriosamente, e Tia Nastácia também, e o Burro Falante e o Doutor Livingstone. Por onde andariam? Dona Benta mandou procurá-los por toda parte, pelos vizinhos e pela vida — chegou até a dar parte à polícia e pôr aviso nos jornais. Tudo inútil. Ninguém dava a menor notícia das crianças — e ela suspirava tristemente em sua redinha da sala de jantar.

Mas assim que os astrônomos descobriram a causa das perturbações celestes, trataram imediatamente de pedir providências à avó dos “perturbadores” e vieram em comissão ao sítio de Dona Benta.

Isso foi por uma linda tarde de abril. Dona Benta havia acabado de dar um profundo suspiro quando ouviu barulho na porteira. Estavam batendo palmas e gritando, “ó de casa!” Ela ergueu-se da redinha e foi espiar.

— Que será, meu Deus do céu! — murmurou, vendo parados na porteira uma porção de homens esquisitíssimos, de cartola, grandes barbas e óculos.

— Dá licença? — gritou o maioral do grupo assim que a avistou.

— Entrem! — respondeu a boa velha. — A casa é de Vossas Excelências.

Mas notou que os tais homens vacilavam, como se estivessem com medo de entrar e gritou de novo: “Entrem. Não façam cerimônias”.

Os homens barbudos e cartoludos pareciam sem ânimo de abrir a porteira — e Dona Benta percebeu a razão: a Vaca Mocha estava deitada no caminho, mascando umas palhas de milho. Tamanhos homens com medo de vaca, imaginem!

— Entrem sem susto! — gritou ela de novo. — A Mocha é mansíssima. Nunca chifrou ninguém.

Criando coragem, os sábios abriram a porteira e, arrepanhando as sobrecasacas como se fossem saias, deram uma cautelosa volta por trás da Mocha, a qual nem se mexeu. O pacífico bovino não ligava a menor importância a astrônomos.

Aproximaram-se todos da varanda e pararam, com o maioral à frente. Era o mais barbudo e de óculos mais fortes que os outros.

— Minha senhora — disse ele tirando o chapéu — viemos aqui em comissão pedir o apoio de Vossa Excelência num caso que muito nos está preocupando. Somos astrônomos.

Dona Benta estremeceu. Astrônomos? Que queriam com ela aqueles astrônomos tão importantes? E convidou-os a subir. Os astrônomos subiram os sete degraus da varanda e apertaram a mão da boa velha, um depois do outro. O maioral tossiu o pigarro e disse:

— Minha senhora, as perturbações que temos observado em nosso sistema planetário nos induziram a vir aqui em comissão pedir enérgicas providências...

Dona Benta estranhou aquelas palavras. Se havia perturbações no sistema planetário, que tinha ela com isso? E como também fosse uma excelente astrônoma, interrompeu o discurso do maioral para dizer:

— Se tem havido perturbações em nosso sistema planetário, com certeza será devido a alguma nova mancha do Sol recentemente aparecida. Tenho aqui a obra do Padre Secchi sobre o Sol, e sei das terríveis influências que tais manchas exercem sobre o nosso planeta.

Os sábios entreolharam-se. Ouvir aquela velhinha, ali naquele sítio, falar em manchas do Sol e no Padre Secchi, era um estranho fenômeno. Mas aceitaram o estranho fenômeno e o chefe prosseguiu:

— Não, minha senhora. Desta vez a causa das perturbações não decorre das manchas do Sol e sim de dois meninos, uma boneca, um burro e um sabugo de cartola que andam a fazer estrepolias no éter. Foi o que o telescópio de Palomar nos fez ver — e aqui estamos para pedir a preciosa intervenção de Vossa Excelência.

— Será possível? — exclamou Dona Benta tirando os óculos. — Será possível que meus netos andem pelo éter?... Há já vários dias que desapareceram daqui, e também a minha cozinheira, o Burro Falante e o Doutor Livingstone — mas nem por sombras me passou pela cabeça que tivessem ido para o céu. Parece incrível!...

— A nós também, minha senhora. Muita dor de cabeça tivemos para decifrar o enigma, mas hoje estamos seguros do que afirmamos. A causa de vários transtornos observados na “harmonia universal” são as reinações de seus netos lá em cima.

— Meus senhores — respondeu Dona Benta botando de novo os óculos — muito sinto o que está acontecendo, e quando eles aparecerem hei de passar-lhes um bom pito. Podem ficar sossegados que outra não acontecerá. Vou chamá-los.

Os astrônomos abriram a boca diante daquele “Vou chamá-los”.

— Mas... mas como vai Vossa Excelência comunicar-se com eles? — perguntou o maioral.

— Nada mais simples. Desde que sei onde estão, é só chamá-los com um bom berro.

Disse e, chegando ao gradil da varanda, levou à boca as mãos em forma de concha e com toda a força dos pulmões gritou:

— Pedrinho! Narizinho! Emília! Desçam já daí, cambada!

E voltando-se para os astrônomos:

— Pronto, meus senhores. Posso garantir a Vossas Excelências que daqui a pouco estão de volta — e mortinhos de fome, como sempre acontece no fim de cada aventura.

Em seguida ofereceu-lhes café.

— Estou sem cozinheira. Sentem-se por aqui enquanto vou eu mesma preparar um café com bolinhos. Não façam cerimônias.

Os astrônomos sentaram-se por ali e a boa senhora foi para a cozinha preparar o café. O maioral, que era um sueco de mais de dois metros de altura, ocupou justamente a banquetinha de pernas serradas de Dona Benta — e ficou um perfeito N invertido — assim: И — com os joelhos à altura do queixo...
____________
Continua … XXI – O Grito de Dona Benta
–––––––––––-
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Viagem ao Céu & O Saci. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. II. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 296)


Uma Trova Nacional

Uma Trova Potiguar

Todo ele, já se consagra,
um baita, bicho-papão,
mas, às vezes, só viagra,
reanima, o cinquentão...
–FABIANO WANDERLEY/RN–

Uma Trova Premiada

2000 - Nova Friburgo/RJ
Tema: CALOR - 2º Lugar

Se queixando do calor,
no consultório a gatinha,
- Ponho onde a roupa doutor?
- Deixa ali perto da minha...
–CAMPOS SALLES/SP–

Uma Trova de Ademar


Minha dívida eu não nego,
mas eu não posso pagar;
e vou deixá-la no prego
até você perdoar.
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Há três coisas que a mulher
consegue fazer de um nada:
uma intriguinha qualquer,
um chapéu e uma salada!...
–CAROLINA A. DE CASTRO/PE–

Simplesmente Poesia

Resolvi cantar de galo
na porta de um galinheiro;
subi no ponto mais alto,
vi o território inteiro;
findei levando uma "manga",
pois não encontrei a franga
para brincar no terreiro.
–DJALMA MOTA/RN–

Estrofe do Dia

São Pedro foi bailarino,
Homero, caminhoneiro,
Sansão guardava dinheiro
no banco de Virgulino.
Pilatos tinha um cassino
na cidade de Teixeira,
num circo de catingueira
Garrincha foi o palhaço;
eu querendo também faço
igualzinho a Zé Limeira.
–JOMACÍ DANTAS/PB–

Soneto do Dia

Meu Orgulho
–PEDRO TORQUATO MACIELSP–

Muito cedo morreu, infelizmente,
o grande Rui, o mestre consagrado,
a quem prestei auxílio eficiente
na sua profissão de advogado.

No escritório, à Rua do Senado,
nós dois a trabalhar conjuntamente,
íamos dando conta do recado,
a contento, aliás, de toda gente.

Obedecendo às normas do Direito,
o meu trabalho, rápido, perfeito,
em pouco tempo lá ficou notório.

Tanto assim que, no meio de doutores,
não poucas vezes mereci louvores
por ter varrido bem o escritório!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Celito Medeiros (Estou partindo...)


Fonte:
Poema e pinturas de autoria de Celito Medeiros, enviadas pelo autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 295)


Uma Trova Nacional


Uma Trova Potiguar

Porque é que todo mundo
acha-se mais sofredor,
se o sofrimento é profundo
e ninguém afere a dor?
–MARCOS MEDEIROS/RN–

Uma Trova Premiada

2010 - Curitiba/PR
Tema: IMAGEM - Venc.

Não julgue alguém pela imagem,
pois muitos fazem de tudo
para esconder na “embalagem”
a falta de conteúdo.
GERSON CÉSAR SOUZA/PR–

Uma Trova de Ademar

A foto da escravidão
revelou-se no Brasil,
nos filmes de exploração
deste trabalho infantil!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Poeta mau não conheço,
mau poeta ah, isto sim!
Conheço e digo onde mora:
bem aqui... dentro de mim.
–OCTÁVIO BABO FILHO/RJ–

Simplesmente Poesia

–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–
Morte Prévia

Muita gente
sai do mundo
antes de morrer,
porque não luta,
não sonha,
não ama.

Estrofe do Dia

Esta mulher que foi minha,
zomba de mim quando passa;
construiu minha desgraça,
destruiu tudo que eu tinha;
dá-lhe um título de rainha
era o que eu mais pretendia,
mas ela não merecia
viver ao lado de um rei;
a boca que eu mais beijei
hoje me nega um bom dia.
–SEBASTIÃO DA SILVA/PB–

Soneto do Dia

Soneto
–MARIA NASCIMENTO/RJ–

Em minha vida simples, malograda,
de filha de modesto agricultor,
faltava tudo e não faltava nada,
porque nasci num lar cheio de amor !

E, cedo, minha luta foi travada,
pois calcada em meu pai, um lutador,
não quis ser ave presa, engaiolada,
e sonhei altos vôos de condor.

Não pude ter infância e juventude,
nem mesmo DEUS nos dando amor, saúde
e a régia proteção da Deusa CERES ...

Mas, para compensar a imensa lida,
Deus, pondo poesia em minha vida,
me fez a mais ditosa das mulheres ! ...

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Viviane Colin (O Dia da Fuga na Chuva)


O dia amanheceu chuvoso. Jandira espiou pela janela e sentiu um arrepio forte na sua nuca:

- Será que terei coragem? - questionou-se.

Mal tinha dormido naquela noite. Acordou de hora em hora, ansiosa pelo início da manhã. Pensava no que lhe esperava ao longo do dia:

- Se conseguir, será o dia mais importante da minha vida - pensava.

Estava assim, dispersa, vendo a chuva cair na rua, quando escutou os sons comuns das suas manhãs: a descarga e o marido limpando a garganta, a filha ligando o chuveiro, o despertador seguido de rock vindo do quarto do caçula.

Assustou-se e correu para a cozinha:

- Vou fazer logo esse café! - decidiu.

Sentiu um certo alívio quando se viu sozinha em casa. Podia se trocar com calma e seguir com o seu plano.

Colocou algumas roupas dentro de uma pequena bolsa de viagem, vestiu uma saia cinza, uma cacharrel vermelha, uma bota de couro preta e um lenço amarelo na cabeça. Por cima, uma grossa capa azul-marinho. Odiava os guarda-chuvas.

Também tirou da gaveta o velho óculos escuro, que não usava havia pelo menos cinco anos:

- Nunca mais Ernesto nos levou à praia no verão - lembrou, com certa amargura.

Saiu de casa, trancou a porta e não olhou para trás.

A chuva havia dado uma trégua e ela caminhou tranquila até o ponto, onde pegou o ônibus para o Centro.

Andou pelos calçadões cheios de poças, olhou as vitrines com um prazer de mulher livre e, na hora do almoço, comeu um lanche barato num fast-food comum.

Depois, tomou outro ônibus para a Zona Norte. Ainda não eram duas da tarde quando chegou. Haviam marcado às cinco na frente do portão principal do Horto.

A chuva voltava a ficar forte e o céu, agora, transformava-se: estava assustador.

Jandira não se intimidou. Olhou em volta, as pessoas correndo para se proteger da tempestade. Mas ela iria esperar até a hora que fosse. Não compreendia como tinha tido coragem de chegar até ali, mas, já que havia ido tão longe, atravessou a rua e se postou sob o orelhão, bem em frente ao portão do parque.

A gotas caiam com cada vez mais força e ela, sozinha, começou a ter dúvidas.

Quis ir embora, mas acreditava que precisava ficar.

Estava paralisada e confusa. Sua cabeça girava, o coração batia apressado e os olhos, marejados de lágrimas que não caiam, não viam mais nada. Nem sabe ao certo quanto tempo ficou lá.

A tempestade foi se dissipando, o ar ficou fresco e, de repente, percebeu que a noite se aproximava. Sentiu medo e, só então, conseguiu se mexer, sair da imobilidade que tomou conta dela e correr para pegar um ônibus de volta para casa, para a sua vida.

Cinco minutos depois, chegaria um carro e pararia bem em frente ao portão do parque. Cleber desceria e veria o orelhão vazio. Onde ela estaria?

O homem ficou lá alguns minutos, a chuva voltou a cair e ele logo percebeu: nunca mais saberia dela.

Fonte:
Diário Dez. Jornal O Diario de São Paulo de 24 a 30 de julho de 2011. ano 4. n. 197.

Celso Corrêa de Freitas (Retirantes)


Retirantes é dedicada a Antonio Corrêa Branco – Meu avô


Quando lhes tiraram a lavoura,
e o sistema se voltou para os pastos,
eles partiram deixando para traz,
naquelas terras tão somente os rastros.
que apontavam para as cidades grandes,
gado humano em procissão,
brancos escravos e negros servis
tangidos para longe do seu chão.

E se a juriti abandonou o campo,
com medo do gavião,
quem ficou o fez por não ver,
vida longe da plantação.
Nas cidades cresceram as favelas,
e os bois engordaram nas invernadas,
as riquezas do País foram ficando,
nas mãos de poucos... Concentradas.

Depois vieram as indústrias,
como vaga-lumes iluminando o apogeu,
mas o País continuou injusto,
com a sorte dos filhos seu.
que em desatino elegem a esperança,
como forma de punir maus governantes,
afinal ela trazia na sua pele,
as chagas dos retirantes.

E o destino que teceu a trama,
daquele que assumiu o seu papel,
se pos como um enorme vazio,
tal como uma nuvem no céu.
E esperando pelo incerto
num tempo que está a passar,
quando a Asa-Pau se faz ouvir,
esse povo se põe a rezar.

E olha que nem seria preciso
essas preces levadas a Deus,
se no planalto se ouvisse
a voz rouca dos votantes ateus.
gente de todos os matizes
que não encontram a saída,
que os faça retornar pela estrada
que lhes pareceu ser um caminho de vida.

E se o gado agora geme no curral
alguém está sofrendo no cativeiro,
o mau feitor no conforto da sua cela
com segurança aplica nosso dinheiro.
O que pode esperar esse povo?
Feito galinha solta no terreiro,
cada um com um galo de plantão
a lhe fustigar o traseiro.

Como bicho solto na seca
busca salvar-se procurando emprego,
vive com um pé no ócio
e o outro no desapego.
Andam cobras pelas esquinas
a encantar passarinhos
suas bocas quando agarram não soltam
e os meninos deixam de ser anjinhos.

Ninguém mais é o mesmo
e hoje já não é como antes,
somos todos nesse caminho do medo
apenas e tão somente...Retirantes!
Em busca do melhor da vida
quando essa é feita de instantes,
falta-nos aquele rancor cívico
que sufoca os governantes.

Ainda tem gente minha por lá,
E para lá estou querendo voltar
Já não me vejo mais aqui
Pois lá sempre foi o meu lugar.

Será um reencontro com tudo
Que passou a florescer,
Tão somente nos sonhos
De quem cresceu sem esquecer,
Quem eu sou,
De onde vim,
Para onde vou,
Esperar o fim.

As margens do grande rio
que sempre correu em mim,
A sombra das mangueiras
que adocicaram o meu jardim.
Tem gente minha por cá
também querendo voltar.
tem gente minha morrendo
sem esse sonho realizar.

Preciso me apressar
Para que eu não morra também assim,
Preciso voltar para a minha terra
O melhor lugar de mim.

Fonte:
Texto e imagem do autor

Celso Corrêa de Freitas (1954)


Poeta e Articulista, nascido em Itaperuna-RJ, aos 26 de Agosto de 1954.

Presidente (O sexto) da Casa do Poeta Brasileiro de Praia Grande-SP até 2010. Membro dessa Associação desde 26/08/2004 (...Entrei no dia do meu aniversário, foi um presente que me dei...).

Reside em Praia Grande, onde ampliou sua família desde Fevereiro de 1996.

Colaborador ativo nos jornais e demais meios de comunicação (Blogs e Sites), através dos seus artigos e inserções.

Sua classificação honrosa no primeiro concurso de Poesias Fernando Pessoa lhe permitiu participar da Antologia “Poesia e Liberdade” que lhe abriu as portas para sua segunda antologia “Poesia e Amor” e sedimentou a sua posição no cenário poético Nacional com o livro “Poeta-Profissão Homem!”, “Destino em Transição(Livro solo)”, e a antologia “São Paulo-450 anos em Prosa e Verso”.

É autor também dos livretos “Sitio do Campo em Cordel”, “Os Portais de Mim”, e colaborou ativamente no projeto educacional da Escola Carlos Roberto Dias que gerou o livreto “OS POETAS DA EJA”.

Sites:
www.portalpoeticoccf.blogspot.com-
www.casadopoetapg.com.br-
www.cappaz.com.br

Fonte:
Slideshare

Joseph E. de Souza (Trovas de Amor)


Esta menina querida
é meu pé, é minha mão
minha alegria na vida
meu arroz e meu feijão

ela é meu rio, meu lago
meu riacho, meu açude
ela é meu beijo e afago
não quero que ela mude

ela é meu dedo e anel
minha camisa de linho
minha garrafa de mel
meu consolo, meu carinho

se a carne mata a fome
o beijo mata a saudade
a tristeza me consome
eu quero é felicidade

me abraça bem abraçado
quero todo o teu carinho
sem teu abraço apertado
vou me perder no caminho

és água que mata a sede
és chuva no meu roçado
és punho na minha rede
és rima neste recado

essa menina adorada
essa menina querida
que alegria danada
ter ela na minha vida.

Fontes:
Trovas obtidas no SlideshareLink
Imagem = Scrapsfacil

Lucita Briza (Ada: mulher, pioneira, aviadora)


Mulher pilotando avião e saltando de paraquedas em plena década de 30? Pois foi isso que fez Ada Rogato naqueles tempos em que a aviação engatinhava, ainda mais no Brasil… Essa moça destemida, nascida em São Paulo, no dia 22 de dezembro de 1910, tornou-se 24 anos depois, a primeira mulher brasileira a obter brevê de piloto de planador e de paraquedista e a terceira a obter o brevê de aviador no país.

A mulher é a rainha, mas o homem, profissionalmente, é mais capaz. Era o que Lucita Briza ouvia seu pai dizer em jantares em casa, quando se discutia o papel da mulher na sociedade. "E minha mãe respondia: mas a Ada é melhor que a maioria dos pilotos."

Lucita se fez jornalista, construindo sua carreira em suplementos femininos e em política internacional, em veículos como Jornal da Tarde, O Estado de S.Paulo, Agência Estado e em produtos da Editora Abril. Mas não poderia imaginar que, tantos anos após ouvir a defesa de sua mãe - que também se chamava Ada - às mulheres, investigaria a fundo a vida da aviadora Ada Rogato, que morreu em 1986, aos 76 anos.

"Ada - Mulher, Pioneira, Aviadora" lançado no dia 30 de abril, na Livraria Cultura do Shopping Villa-Lobos, pela C&R Editorial. Ada não foi a primeira a obter um brevê, que conquistou em 1936, mas foi a primeira a pilotar um planador na América Latina. Na década de 50, foi o primeiro piloto (homem ou mulher) brasileiro a sobrevoar os Andes com um avião de baixa potência (65 cavalos), fez a primeira experiência de pulverização de lavoura de café usando um avião, foi a primeira paraquedista mulher e a pioneira ao voar, sozinha, mais de 51 mil km pelas três Américas, até o Alasca. Detalhe: sem rádio, com um avião de 90 cavalos, seu segundo aparelho, hoje doado à Aeronáutica. Em abril, a viagem pelas três Américas comemora seu cinquentenário.

Quando Lucita fortaleceu a ideia de escrever um livro, começou a pensar num tema e se lembrou de ambas as Adas, a mãe e a aviadora. Começou a pesquisar na web e se assustou ao perceber que as informações sobre essa extraordinária figura eram desencontradas. "Como que uma mulher, que morre assim, na ativa - na época ela era presidente da Fundação Santos Dumont, responsável por orientar e encaminhar aviação civil, não administrativamente, mas como entidade - e ninguém mais fala nada? Não havia informações consistentes sobre essa história."

O trabalho de reportagem começou em 2005, com grande esforço para encontrar pessoas ligadas à aviadora, que nunca se casou, não teve filhos e rompera os laços familiares quando jovem. Seu pai, Guglielmo Rogato, imigrante italiano que se fez homem importante em Alagoas e tem até duas ruas com seu nome, quis impedir a carreira da moça. Fora as fontes oficiais de informação, a jornalista só conseguiu se aproximar mais da vida da aviadora ao encontrar Neide Bibiano, em São Paulo. Amiga de Ada, amparando-a até a morte, foi ela que saiu em busca dos parentes da aviadora antes que ela morresse, de câncer no útero. "O contato com a Neide fez com que as coisas começassem a tomar vulto na minha cabeça. Essa mulher foi meu guia para conseguir mais informações."

Lucita também viajou para o Uruguai, Argentina e Chile para entrevistar pessoas que tiveram contato com a aviadora em suas viagens. "Depois da morte dela, esse esquecimento brutal. E eu não me conformava. Ela tinha muitas boas relações, com homens e mulheres, menos com a Anésia", lembra, citando Anésia Pinheiro Machado, a segunda mulher que conseguira um brevê. A primeira foi Thereza de Marzo, em 1922. "Eu sempre quis escrever um livro sobre uma mulher a frente do seu tempo." Lucita corrigiu essa lacuna, num livro de 300 páginas.

Fontes:
Roger Marzochi 18 de março de 2011. Disponível em http://noticias.limao.com.br/entretenimento/ent214849.shtm
CÁPUA, Cláudio de (editor). Revista Santos: arte e cultura. ano V, vol. 27 – maio de 2011.

Edna Gallo (O Recado)


O expediente terminara. Os funcionários já haviam ido embora e João estava sozinho na sua empresa. Dirigiu-se à escrivaninha, apanhou uma pasta e começou a examinar alguns papéis importantes, referentes à parte que teria de pagar à esposa de seu sócio Felipe, falecido recentemente.

Maquinava uma maneira de trapacear com o dinheiro da viúva. Ela era completamente alheia aos negócios do marido. Sempre vivera para o lar, atenta as tarefas de dona de casa. Mulher simples, confiava totalmente na honestidade desse homem que fora companheiro de trabalho de seu esposo e, posteriormente, sócio nesse bem sucedido empreendimento.

Com a morte de Felipe, João ficara só na administração da firma e, sentindo-se senhor da situação pensou logo em ficar com tudo, propondo então à viúva a compra da parte dela. Sem ter condições ou prática para gerir os negócios e ainda com filhos adolescentes para educar, ela concordou com a venda. Empregaria o dinheiro na compra de imóveis e viveria da renda dos mesmos.

Já era tarde e ele permanecia ainda no escritório. Formado em contabilidade, ele estudava uma forma de pagar um valor bem menor que o real. Tinha que fazer tudo direito, usar a cabeça, de modo que ela jamais desconfiasse que a importância a receber era maior que aquela que ele ia lhe pagar. A viúva confiava nele a ponto de dispensar a assessoria de um bom advogado.

Começou a subtrair dados, escondeu documentos, e quando estava adulterando algumas somas ouviu um barulho no trinco da porta, como se alguém a estivesse abrindo...

De repente, sentiu um cheiro de perfume ao seu redor. Arrepiou-se todo. Aquela era a fragância que Felipe usava.

Largou tudo o que estava fazendo e saiu correndo com o coração descompassado.

Esperou passar alguns dias e voltou a fazer a contabilidade. Desta vez, porém, não ficou só. Aproveitou o horário de expediente e, cercado de pessoas à sua volta, na certa aquele fato estranho, talvez até fruto de sua imaginação, não aconteceria outra vez.

Sentou-se e começou a rever a papelada. A idéia de trapaça não fora afastada. As intenções eram as mesmas. De repente o barulho na porta e o perfume exala no ar.

Não era possível! Chamou a secretária. Ela entrou e foi logo dizendo: “Nossa, que sala perfumada.”João ficou ainda mais nervoso com o comentário. Então, não era impressão sua. Ela também sentira o perfume. Resolveu, então, ficar algum tempo sem tocar naquela documentação.

Um dia, resolveu levar os tais papéis para casa.

Quem sabe longe do ambiente de trabalho aquilo não voltasse a se manifestar, porém, mais uma vez escutou ruídos na porta, e sentiu aquele aroma tão seu conhecido. Chamou a esposa e contou-lhe o que estava acontecendo. Decidiu rasgar todas as anotações que fizera e jogou-as no lixo. Fez a contabilidade novamente. Não omitiu um centavo. As contas foram feitas com a maior honestidade.

A viúva recebeu a parte dela. Tudo o que lhe pertencia estava ali, tostão por tostão. João compreendera o recado.
---------------------
Sobre a autora
Edna Gallo é poetisa, trovadora, cronista e contista. Nasceu em Santos/SP - pertence ao grupo Encontro de Poetas e a União Brasileira de Trovadores (U.B.T) Seção Santos. Alguns de seus poemas foram musicados pela musicista Glorinha Veloso regente do coral " Vozes da Esperança
"Livros publicados: “Alvoradas e Crepúsculos” e “Brisa de Outono”

Fonte:
CÁPUA, Cláudio de (editor). Revista Santos – Arte e Cultura. ano IV. vol.21 - maio de 2010.

Antonio Candido, Anatol Rosenfeld, Decio de Almeida Prado e Paulo Emílio Sales Gomes (A Personagem de Ficção) Parte I


Literatura e Personagem Conceito de Literatura

Geralmente, quando nos referimos à literatura, pensamos no que tradicionalmente se costuma chamar “belas letras” ou “beletrística”. Trata-se, evidentemente, só de uma parcela da literatura. Na acepção lata, literatura é tudo o que aparece fixado por meio de letras — obras científicas, reportagens, notícias, textos de ‘propaganda, livros didáticos, receitas de cozinha etc. Dentro deste vasto campo das letras, as belas letras representam um setor restrito. Seu traço distintivo parece ser menos a beleza das letras do que seu caráter fictício ou imaginário. A delimitação do campo da beletrística pelo caráter ficcional ou imaginário tem a vantagem de basear-se em momentos de “lógica literária” que, na maioria dos casos, podem ser verificados com certo rigor, sem que seja necessário recorrer a valorizações estéticas. Contudo o critério do caráter ficcional ou imaginário não satifaz inteiramenente o propósito de delimitar o campo da literatura no sentido restrito. A literatura de cordel tem caráter ficcional, mas não se pode dizer o mesmo dos Sermões do Padre Vieira, nem dos escritos de Pascal, nem provavelmente dos diários de Gide ou Kafka. Será ficção o poema didático De rerum natura, de Lucrécio? No entanto, nenhum historiador da literatura hesitará em eliminar das suas obras os romances triviais de baixo entretenimento e em nelas acolher os escritos mencionados. Parece portanto impossível renunciar por inteiro a critérios de valorização, principalmente estética, que como tais não atingem objetividade científica embora se possa ao menos postular certo consenso universal.

A Estrutura da Obra Literária

A estrutura de um texto qualquer, ficcional ou não, de valor estético ou não, compõe-se de uma série de planos, dos quais o único real, sensivelmente dado, é o dos sinais tipográficos impressos no papel. Mas este plano, embora essencial à fixação da obra literária, não tem função específica na sua constituição, a não ser que se trate de um texto concretista. No nexo deste trabalho, este plano deve ser posto de lado, assim como todas as considerações sobre tendências literárias recentíssimas, cuja conceituação ainda se encontra em plena elaboração.

Como camadas já irreais por não terem autonomia ôntica, necessitando da atividade concretizadora e atualizadora do apreciador adequado — encontramos as seguintes: a dos fonemas e das configurações sonoras (orações), “percebidas” apenas pelo ouvinte interior, quando se lê o texto, mas diretamente dadas quando o texto é recitado; a das unidades significativas de vários graus, constituídas pelas orações; graças a estas unidades, são (projetadas através de determinadas operações lógicas, “contextos objectuais” (Sachverhalte), isto é, certas relações atribuídas aos objetos e suas qualidades (“a rosa é vermelha”; “da flor emana um perfume”; “a roda gira”). Estes contextos objectuais determinam as “objectualidades”, por exemplo, as teses de uma obra científica ou o mundo imaginário de um poema ou romance.

Mercê dos contextos objectuais, constitui-se um plano intermediário de certos “aspectos esquematizados” que, quando especialmente preparados, determinam concretizações especificas do leitor. Quando vemos uma bola de bilhar deslizando sobre o pano verde, “vivenciamos” um fluxo continuo de aspectos variáveis de um disco eliptóide, de uma cor clara extremamente matizada; através desses aspectos variáveis é-nos dada e se mantém inalterada a “percepção” da esfera branca da bola. Em geral, os textos apresentam-nos tais aspectos mediante os quais se constitui o objeto. Contudo, a preparação especial de selecionados aspectos esquemáticos é de importância fundamental na obra ficcional — particularmente quando de certo nível estético — já que desta forma é solicitada a imaginação concretizadora do apreciador. Tais aspectos esquemáticos, ligados à seleção cuidadosa e precisa da palavra certa com suas conotações peculiares, podem referir-se à aparência física ou aos processos psíquicos de um objeto ou personagem (ou de ambientes ou pessoas históricas etc.), podem salientar momentos visuais, táteis, auditivos etc.

Em poemas ou romances tradicionais, a preparação especial dos aspectos é bem mais discursiva do que, por exemplo, em certos poemas elípticos de Ezra Pound ou do último Brecht, em que a justaposição ou montagem de palavras ou orações, sem nexo lógico, deve, como num ideograma, resultar na síntese intuitiva de uma imagem, graças à participação intensa do leitor no próprio processo da criação (a teoria da montagem fílmica de Eisenstein baseia-se nos mesmos princípios).
Num quadro figurativo há só um aspecto para mediar os objetos, mas este é de uma concreção sensível nunca alcançada numa obra literária. Esta, em compensação, apresenta grande número de aspectos, embora extremamente esquemáticos. O cinema e o teatro apresentam muitos aspectos concretos, mas não podem, como a obra literária, apresentar diretamente aspectos psíquicos, sem recurso à mediação física do corpo, da fisionomia ou da voz.

Às camadas mencionadas devem ser acrescentadas, numa obra ficcional de elevado valor, várias outras — as dos significados espirituais mais profundos que transparecem através dos planos anteriores, principalmente o das objectualidades imaginárias, constituídas, em última análise, pelas orações. Este mundo fictício ou mimético que freqüentemente reflete momentos selecionados e transfigurados da realidade empírica exterior à obra, torna-se, portanto, representativo para algo além dele, principalmente além da realidade empírica, mas imanente à obra.

A Obra Literária Ficcional
1) O problema ontológico: A verificação do caráter ficcional de um escrito independe de critérios de valor. Trata-se de problemas ontológicos, lógicos e epistemológicos.

Como foi exposto antes uma das funções essenciais da oração é a de projetar, como correlato, um contexto objectual que é transcendente ao mero conteúdo significativo, embora tenha nele seu fundamento ôntico. Assim, a oração “Mário estava de pijama” projeta um correlato objectual que constitui certo ser fora da oração. Mas o Mário assim projetado deve ser rigorosamente distinguido de certo Mário real, possivelmente visado pela oração. Como tal, o correlato da oração pode referir-se tanto a um rapaz que existe independentemente da oração, numa esfera ôntica autônoma (no caso, a da realidade), como permanecer sem referência a nenhum moço real. Todo texto, artístico ou não, ficcional ou não, projeta tais contextos objectuais “puramente intencionais” que podem referir-se ou não a objetos onticamente autônomos.

Imaginemos que eu esteja vendo diante de mim o Mário real; é evidente que na minha consciência há só uma imagem dele, aliás não notada por mim, já que me refiro diretamente ao Mário real. Posso chamar este objeto — o Mário real — de “também intencional”, visto o mesmo existir não por graça do meu ato, mas ter plena autonomia, mesmo quando visado por mim num ato intencional, como agora. Todavia, a imagem dele, a qual o representa na minha consciência (embora não a note), é “puramente intencional”, visto não possuir autonomia ôntica e existir por graça do meu ato. Posso reproduzi-la até certo ponto na minha mente, mesmo sem ver o rapaz autônomo; posso também transformá-la mercê de certas operações espontâneas. É óbvio que as orações só podem projetar tais correlatos puramente intencionais, já que não lhes é dado — tampouco como à minha consciência — encerrar os objetos “também intencionais”.

Ainda assim, as objectualidades puramente intencionais projetadas por intermédio de orações têm certa tendência a se constituírem como “realidade”. Se a oração “Mário estava de pijama” apresenta o moço pela primeira vez, este torna-se portador do traje a ele atribuído; portador graças à função específica de sujeito da oração; e portador de algo, em virtude da função significativa da cópula. O pretérito, apesar de em certos casos ter o cunho fictício do “era uma vez”, tem em geral mais fôrça “realizadora” e “individualizadora” do que a voz do presente (“O elefante pesa no mínimo uma tonelada” pode ser o enunciado de um zoólogo sobre os elefantes em geral; mas “o elefante pesava no mínimo uma tonelada” refere-se a um elefante individual, existente em determinado momento). De qualquer modo, a oração projeta o objeto — Mário — como um “ser independente”. Com efeito, ela sugere que Mário já existia e já estava de pijama antes de a oração assinalar este “fato”. Ao seguir a próxima oração: “Ele batia uma carta na máquina de escrever”, Mário já se emancipou de tal modo das orações,. que os contextos objectuais, embora estejam pouco a pouco constituindo e produzindo o moço, parecem ao contrário apenas revelar pormenores de um ser autônomo. E isso ao ponto de o mundo objectual assim constituído pelas orações (mas que se insinua como independente, apenas descrito pelas orações) se apresentar como um contínuo, apesar de as orações serem naturalmente descontínuas como os fotogramas de uma fita de cinema. À base das orações, o leitor atribui a Mário uma vida anterior à sua “criação” pelas orações; coloca a máquina sobre uma mesa (não mencionada) e o rapaz sobre uma cadeira; o conjunto num quarto, este numa casa, esta numa cidade — embora nada disso tenha sido mencionado.

Uma das diferenças entre o texto ficcional e outros textos reside no fato de, no primeiro, as orações projetarem contextos objectuais e, através destes, seres e mundos puramente intencionais, que não se referem, a não ser de modo indireto, a seres também intencionais (ônticamente autônonios), ou seja, a objetos determinados que independem do texto. Na obra de ficção, o raio da intenção detém-se nestes seres puramente intencionais, somente se referindo de um modo indireto — e isso nem em todos os casos — a qualquer tipo de realidade extraliterária. Já nas orações de outros escritos, por exemplo, de um historiador, químico, repórter etc., as objectualidades puramente intencionais não costumam ter por si só nenhum (ou pouco) “peso” ou “densidade”, uma vez que, na sua abstração ou esquematização maior ou menor, não tendem a conter em geral esquemas especialmente preparados de aspectos que solicitam o preenchimento concretizador. O raio de intenção passa através delas diretamente aos objetos também intencionais, à semelhança do que se verifica no caso de eu ver diante de mim o moço acima citado, quando nem sequer noto a presença de uma “imagem” interposta.

Há um processo semelhante no caso de um jornal cinematográfico ou de uma foto de identificação. Trata-se de “imagens puramente intencionais” que, no entanto, procuram omitir-se para franquear a visão da própria realidade. Já num retrato artístico a imagem puramente intencional adquire valor próprio, certa densidade que facilmente “ofusca” a pessoa retratada. Aliás, mesmo diante de um fotógrafo despretensioso a pessoa tende a compor-se, tomar uma pose, tornar-se “personagem”; de certa forma passa a ser cópia antecipada da sua própria cópia. Chega a fingir a alegria que deveras sente.
––––––––––––-
continua… 2) O problema lógico
_____________________________
Fonte:
Antonio Candido, Anatol Rosenfeld, Decio de Almeida Prado e Paulo Emílio Sales Gomes. A Personagem de Ficção. 2. ed. SP: Perspectiva.
Este livro é digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source com a intenção de facilitar o acesso ao conhecimento a quem não pode pagar e também proporcionar aos Deficientes Visuais a oportunidade de conhecerem novas obras.

Cincinato Palmas Azevedo (A Morte Anunciada do Livro)


No ano em que boa parte dos atuais brasileiros nascia um homem andava na Lua... se podemos chamar aqueles pulos de passos. Enquanto isso, centenas de quilômetros abaixo, em trechos da África, da Oceania ou Ásia, nas imensidões geladas da Rússia, Groenlândia ou Chile, outro homem produzia fogo esfregando pauzinhos ou batendo pedras.

Quase meio século depois -- em passos gigantescos para a Humanidade -- a ELETRÔNICA atinge (e predomina em) quase todos os setores e atividades das grandes metrópoles. Mas, mesmo assim, continuamos tendo (e mantendo) técnicas e comportamento do início das eras porque, afinal, computadores não plantam batatas e vitamina de abacate ainda precisa de liquidificador para existir.

Por enquanto não se pode andar com um monitor normal de 15 polegadas sob o braço, para ler seu conteúdo fora do local original. Embora existam notebooks, palmtops e handhelds com memória para duas dúzias de robustos livros -- aparelhos cada vez menores, mais cômodos para se transportar -- as obras após lidas teriam que ser DELETADAS para darem lugar a novos títulos.

Fortuitamente, poderíamos localizar a brochura de um autor desconhecido, poeta de aldeia, escritor-de-um-livro-só, num trabalho de "formiguinha" em qualquer biblioteca comunitária de nosso bairro.

Quem sobrevive de reciclagem há de encontrá-la no saco de lixo da casa da esquina pois o brasileiro não aprendeu a DOAR o livro que não quer mais. Simplesmente joga-o fora, entre restos de comida e pó. Contudo, na superlotada e inviável Internet --- a não ser que se conheça algo do Autor ou do contexto da obra -- jamais será esta detectada, ficando "sepultada" irônicamente entre bilhões de outros textos também com poucas chances de serem lidos. A biblioteca "do futuro" transformou-se numa armadilha para o Autor que, pretendendo atingir milhares (ou milhões) de leitores, acaba sem nenhum. Um pesadelo cibernético nunca sequer imaginado por seus inventores.

Ainda podemos ler, hoje, a Bíblia Sagrada que Gutemberg imprimiu há 500 anos atrás... com rasuras, rabiscos, páginas rasgadas ou deterioradas pelo Tempo, algoz e senhor da Eternidade. Um simples risco INUTILIZA um CD-ROM inteiro com milhares de informações e, descobriu-se agora, os disquettes "apagam-se" sozinhos antes de completarem dois míseros anos de "vida".

Computadores precisam de energia elétrica, baterias, noção prévia dos comandos (e de se manter os "hackers' à distância) para que possam existir. Um livro não-virtual qualquer criança "abre", embora de "cabeça" para baixo, às vezes. Estes os lemos deitados na rede, confortáveis em nossa cama ou -- para que o tempo passe mais rápido -- num ônibus ou trem.

A televisão veio com o intuito de substituir o Rádio, mídia "obsoleta"... já o computador ACABARIA com os livros. Por mais paradoxal que pareça, os PCs transformaram-se no maior aliado do escritor, ocupando o lugar que era da onipresente cópia xerox, "alma" do livro antigo, da "Edição do Autor" de tiragem minúscula.

Fazeres & serviços à cargo de tipografias e microeditoras são agora realizados pelo computador, em nossa sala. Programas sofisticados executam todas as etapas da edição.

Mas não se iluda o escriba que ainda rabisca seus textos e os "imprime" "catando milho" na sua vetusta Olivetti Lettera ou Remington... o Mundo será um dia tomado por essas máquinas de inteligência artificial e seremos todos meras "extensões" de seus domínios.

Todavia, entre iglus ou camelos, entre vulcões ou cangurus, haverá mais de um jovem registrando sonhos & fatos em pedaços de papel amarfanhado e que -- juntados, costurados e "colados" com maizena e arroz -- farão surgir de novo o LIVRO.

Fontes:
Texto enviado pelo autor
LinkImagem = Klaxonsbc

Cincinato Palmas Azevedo (1952)


Nascido no Rio de Janeiro em outubro de 1952, letrista e compositor, faz poesias desde os 15 anos e contos & cronicas a partir de l988, tendo publicado mais de 50 textos nos jornais de Belém e Ananindeua, cidade vizinha. Membro da UBT-Belém [União Bras. de Trovadores] e da ALA-A [Assoc. de Letras e Artes de Ananindeua]

Foi vencedor em 9 concursos nacionais de poesia/contos, tendo 51 Menções Honrosas em eventos literários de vinte cidades em 11 Estados e 290 textos em jornais culturais e revistas de 52 cidades em 9 Estados.

Está em 14 coletâneas literárias de 4 Estados, principalmente em obras da IGARABA Prod. Culturais, da cidade de Roque Gonzales/RS.

Compositor de MPB, sambas e rocks sem maiores méritos, fazendo também versões de hits de grandes bandas roqueiras.

Lançou artesanalmente [Edição do Autor, em xerox] PALAVRAS AO VENTO, livreto de poemas & canções com mais de 80 cópias, em 4/1986;
Coordenou a coletânea com 16 poetas de Vigia/PA, 'Livrencontro', em fev./1987, com mais de 200 cópias.

Editou 'QUASE NADA...''miscelânea' com 60 exemplares, em 9/1988.

A partir de dez.1999 produziu o folheto 'Jardim de Trovas' n. 0 e 1 [este em nov./2000] e o n. 2, hoje com mais de 500 cópias já enviadas para todo o país, desde junho/2002.

Entre 1990/92 organizou shows anuais em teatros de Belém com artistas de Ananindeua, além de fundar [em 1988, com meu irmão gêmeo Renato] e presidir o CCCP - Centro Cultural de Capoeira do Pará, controverso marco extinto em 6/1992, no qual expediu mais de 300 ofícios diversos defendendo uma visão artítisca dessa luta.

Aguarda a futura [?!] publicação de 'QUASE NADA...', estreando como contista e registro de suas memórias em 'AQUELAS TARDES TRISTES...', com cenas da infância no Sul [PR/SC] e 'momentos' amazônicos.

Fonte:
Poetas del Mundo

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 294)


Uma Trova Nacional


Uma Trova Potiguar

Quando revi, monte a monte,
os campos de minha terra,
parece que a alma da fonte
cantava no altar da serra.
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–

Uma Trova Premiada

2007 - Ribeirão Preto/SP
Tema: ÁRVORE - 2º Lugar.

Devastando as matas vai
a espécie humana e, nem sente
que, em cada árvore que cai,
morre uma amiga da gente!...
–JOSÉ TAVARES DE LIMA/MG–

Uma Trova de Ademar


Se ter ciúmes, é amar,
triste de quem ama assim;
forma cruel de gostar,
pois traz queixumes sem fim...
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Seria ideal a vida,
maravilhosa e tão doce,
se você fosse, querida,
como eu queria que fosse!...
–ELTON CARVALHO/RJ–

Simplesmente Poesia

Meia-Idade
–CARLOS LÚCIO GONTIJO/MG–

O tempo envelhece no meu rosto
Vai na eterna juventude do vento
Por gosto, passa e não me esquece
Mas bem lá no fundo de mim
O mundo das luzes se enriqueceram
Ainda trago manhãs que não amanheceram
Afago do destino no meu caminhar
Dando-me o direito divino de tropeçar.

Estrofe do Dia

Amizade é joia rara
confesso que me seduz.
Ela no final do túnel
aparece feito luz.
Sendo braços que se abraçam,
com carinhos se enlaçam,
e ao sentimento conduz.
–DALINHA CATUNDA/CE–

Soneto do Dia

Saudade
FRANCISCO MACEDO/RN

Tentei definir uma grande saudade...
Querendo encontrar fui ao meu coração,
de tanto tentar e buscar solução,
eu creio, encontrei uma quase verdade!

Maior sentimento na separação,
terei descoberto, na terceira idade,
Irei certamente para a eternidade
de lá sondarei os sinais da emoção.

Quem sabe terei por ser um aprendiz,
resposta à pergunta que a mim mesmo fiz,
de tanto pensar, acredito encontrei.

Defino sorrindo com grande leveza:
direi que a saudade é com toda certeza,
a soma do amor que ao partir deixarei...

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Monteiro Lobato (Viagem ao Céu) XIX – De novo na Lua


Terminado o fiunnn que os levou de Saturno à Lua, viram-se bem em cima duma cratera.

— Onde será que mora São Jorge? — disse Pedrinho sondando os horizontes. -— Só vejo crateras e mais crateras. Casa nenhuma. Nenhum castelo...

— O meio de descobrir onde ele mora é um só — sugeriu a menina. — Como é hora do lanche, Tia Nastácia deve estar no fogão. Procure uma fumaça. Onde houver fumaça, lá mora São Jorge.

Pedrinho achou boa a idéia e pôs-se a procurar a fumacinha. Todos fizeram o mesmo. Quem primeiro a descobriu foi o Conselheiro.

— Ou muito me engano — disse ele — ou aquele fio de “fumo” que aparece a sudoeste indica a residência do Senhor São Jorge.

Todos correram naquela direção. De longe já avistaram o santo sentadinho num rochedo, com a lança ao colo.

— Viva! Viva! — gritou-lhe a boneca, que seguia adiante dos outros puxando o anjinho pela mão. — Aqui estamos, São Jorge, com o nosso Conselheiro encontrado na cauda dum cometa e este anjinho que descobri na Via-láctea — e foi contando atropeladamente as principais peripécias da grande aventura.

São Jorge não se espantou de coisa nenhuma, porque já não se espantava de nada, tantas e tantas coisas maravilhosas havia visto. Só estranhou o passeio pela Via-láctea. Sua idéia sobre as nebulosas era a mesma dos astrônomos — que aquilo era um imenso aglomerado de estrelas em certas direções do céu. Mas deixou passar. Estava com preguiça de discutir.

— E Tia Nastácia? — perguntou Narizinho. — Como vai ela?

— Mal, coitada! — respondeu o santo. — Não se acostuma aqui. Continua tão boba como no primeiro dia. E não consegue dominar o medo que tem do dragão. Já lhe expliquei que o meu dragão é o que há de inofensivo, mas de nada adiantou. Cada vez que ele urra ela fica de pernas moles no fundo daquele buraco.

Narizinho foi correndo à cratera que o santo indicava. Encontrou a pobre negra fritando bolinhos, mas com o ar mais desconsolado desta vida. De seu peito brotavam suspiros de cortar o coração.

Ao ver a menina, o rosto de Tia Nastácia iluminou-se como um sol de alegria.

— Meu Deus do céu! Será verdade o que estou vendo? Não será sonho?

— Não é sonho, não, boba! Sou eu mesma que voltei dos espaços infinitos com Pedrinho, Emília, o Conselheiro e o anjo — e agora vamos seguir para a Terra.

— Conselheiro? Anjo? — repetiu a negra, tonta. — Que história é essa, menina? Não estou entendendo nada...

— Conselheiro é o nome que Emília pôs no Burro Falante. E o anjo... ah, o anjo é uma coisa que só vendo. Um anjinho de verdade que Emília achou na Via-láctea. De asa quebrada, o coitadinho. A esquerda... o ente mais galante do mundo, Nastácia! Vovó vai abrir a boca. Nunca houve anjo de verdade na Terra, como você não ignora. O nosso vai ser o primeiro. E gulosinho, sabe? Chupou uma bala puxa-puxa que Emília lhe deu e gostou, apesar de nunca haver chupado bala em toda a sua vida.

— Credo! — exclamou a preta.

— E o dragão? Como se tem arrumado com ele?

— Nem fale, Narizinho! — exclamou a negra fazendo o pelo-sinal. — Não sei por que São Jorge não mata duma vez esse horrendo bicho. Dá cada urro que meu coração pula dentro do peito que nem cabritinho novo...

— Dragão que urra não morde, bobona! — disse a menina. — São Jorge afirma que é mais manso que um cordeiro.

— Essa não engulo! — rosnou a preta. — Cada vez que o estupor me vê lambe os beiços e põe de fora uma língua vermelha deste tamanho! Não come gente? É boa!... Pois não ia comendo o burro?

— Mas burro não é gente, Nastácia. Há uma diferença.

— Diferença? Qual é a diferença que há entre gente e aquele burro que fala e diz cada coisa tão certa que até eu me benzo com as duas mãos?

Conversaram sobre mil coisas, inclusive as comidinhas que ela havia feito para São Jorge.

— Coitado! — suspirou a negra. — Santo bom está ali. E é um bom garfo, sabe? Comeu uma panqueca que eu fiz e lambeu os beiços que nem o dragão. E para comer bolinhos não há outro. É dos tais como o Coronel Teodorico: não deixa nem um no prato para remédio.

— Que pena! — exclamou a menina. — Se ele houvesse deixado algum, seria para mim um regalo. Estou com uma fome danada...

Saindo dali a menina foi ter com os outros. Encontrou Emília contando com todo o espevitamento mil coisas a São Jorge, algumas já bastante aumentadas.

— E o meu presente? — perguntou o santo. —, Esqueceu-se?

Eles não haviam passado perto da Cabeleira de Berenice e, portanto Emília não pudera arrancar o fio de cabelo que havia prometido ao santo. Mas não se deu por achada. Respondeu com o maior cinismo:

— Não me esqueci, não. Vou buscá-lo.

E saindo dali sabem onde foi? Foi conferenciar com o Burro Falante. Ninguém ouviu o que disseram, mas o caso é que Emília voltou com um embrulhinho muito malfeito.

— Aqui está! — disse ela com todo o desplante, entregando a São Jorge o embrulhinho. — Em vez dum fio só, como prometi, eu trouxe três...

Se alguém fosse contar os cabelos da cauda do Burro Falante, era muito possível que encontrasse a falta de três fios...
____________
Continua … XX – A Aflição dos Astrônomos
–––––––––––-
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Viagem ao Céu & O Saci. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. II. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

Cursos de Literatura na Fundação Ema Klabin (SP)



Professor | Antonio Brancaglion Jr.
Duração | 04 encontros
Dias | segundas-feiras das 18h00 às 20h00
Datas | 15, 22, 29 de agosto e 05 de setembro
Local | Fundação Ema Klabin - Rua Portugal 43, Jardim Europa
Valor | R$ 140 na inscrição + uma parcela de R$ 140,00

Se formos buscar a 1ª civilização que utilizou a escrita além do emprego funcional - científica ou técnica - isto é, não-utilitária, podemos afirmar que foi no Egito onde surgiu a literatura mais antiga conhecida. Embora a mais antiga, a literatura egípcia, é também uma das menos conhecidas. Somente no final do século XIX, com o completo domínio sobre a tradução dos hieróglifos, os egiptólogos voltaram-se para a tradução, estudo e publicação dos textos literários.

A vida literária dependia diretamente das escolas, que funcionavam como arquivos, bibliotecas e onde as cópias eram a base do aprendizado dos escribas. A literatura não era uma fonte de diversão, mas um exercício de leitura e caligrafia. Fonte de ensinamentos éticos, morais, históricos e religiosos.

Este curso pretende expor de maneira objetiva as principais formas literárias surgidas no segundo milênio antes de Cristo e que lançam uma nova luz e uma maneira diferenciada sobre a vida dos antigos egípcios.

1. Os Hieróglifos e os Escribas
2. Ensinamentos, Instruções e Máximas: A Literatura Didática
3. Romances e Contos: A Literatura Fantástica
4. A Poesia Lírica e Dramática

Antonio Brancaglion Jr. professor e egiptólogo - Museu Nacional do Rio de Janeiro – UFRJ

Professor | Rodrigo Petronio
Duração | 04 encontros
Dias | sábados das 14h00 às 17h00
Datas | 13, 20, 27 de agosto e 03 de setembro
Local | MuBE - Av. Europa , 218 - Sala de Aula
Valor | R$ 210,00 na inscrição + uma parcela de R$ 210,00

A Oficina de Escrita Criativa tem como objetivo fornecer técnicas para o desenvolvimento de textos nos gêneros ensaio, poesia, conto, crônica ou romance. Tal abertura é possível porque a Oficina não foi concebida tendo em vista um gênero isolado, mas sim a própria categoria Texto, em suas estruturas elementares.

Assim, os exercícios se alternam entre a proposta de temas, que induzem os alunos a refletir sobre certas matrizes da literatura e do imaginário, e a análise formal, que esmiúça as particularidades da linguagem, tendo em vista a eficácia ou a ineficácia dos recursos empregados.

Ao contrário do que se imagina, tais recursos podem ser aferidos objetivamente, e, por meio de cotejo com obras semelhantes, é possível também averiguar quais os pontos positivos ou negativos na linguagem utilizada. Alguns aspectos importantes serão desenvolvidos, tais como musicalidade, ritmo, imagem, enredo, estrutura, personagem, narrador e a parte conceitual subjacente.

Tais pontos podem parecer muito vastos para serem dominados em um curso. Entretanto, a proposta é trabalhá-los de modo intensivo e não extensivo. Ou seja: verticalizar cada um deles por meio de exercícios criados especialmente com esse objetivo. Assim, mesmo a escrita dissertativa, teórica ou ensaística vem contemplada nesse escopo. Pois o intuito não é tratar do conteúdo dos argumentos expostos, mas sim do modo pelos quais eles estão estruturados.

A Oficina consiste, portanto, em mostrar como funciona a carpintaria dos textos literários, quais os meios utilizados pelos autores para atingir determinados fins e causar efeitos específicos nos leitores, sejam eles no campo da ficção ou da não-ficção. Também pretende apontar os principais vícios, cacoetes, redundâncias, erros, deslizes e equívocos de linguagem.

Em termos práticos, a Oficina de Escrita Criativa também se apoia em obras e autores selecionados como referência. Porém, uma bibliografia mais minuciosa pode ser fornecida ao longo dos encontros, de acordo com os interesses do grupo. Todo conteúdo teórico da Oficina de Escrita Criativa visa à produção de textos próprios, que serão comentados e avaliados. Na medida do possível, haverá o desenvolvimento de um projeto individual ao longo dos encontros, como se fosse o esboço de um futuro livro.

A Oficina se destina não só àqueles que queiram desenvolver uma carreira de escritor profissionalmente, mas a todos os interessados em apurar as técnicas da escrita.

Rodrigo Petronio nasceu em 1975, em São Paulo. É editor, escritor e professor. Formado em Letras Clássicas e Vernáculas pela USP. É membro do Nemes (Núcleo de Estudos de Mística e Santidade) da PUC-SP. Foi professor de Literaturas Espanhola e Hispano-Americana na Universidade Santo André (2003-2006). Professor do Projeto Cultura na Fundação Ema Klabin, professor e cofundador do curso de Criação Literária da Academia Internacional de Cinema (AIC), professor-coordenador do grupo de Estudos Cavalo Azul, fundado pela poeta Dora Ferreira da Silva, e coordenador de grupos de leitura do Instituto Fernand Braudel. Trabalha no mercado editorial há quinze anos. Recebeu prêmios nacionais e internacionais nas categorias poesia, prosa de ficção e ensaio. Tem poemas, contos e ensaios publicados em revistas nacionais e estrangeiras. Participou de encontros de escritores em instituições brasileiras, em Portugal e no México. Coorganizou com Rosa Alice Branco a primeira antologia do poeta António Ramos.

Fonte:
Projeto Cultura – Cursos e Viagens Culturais