segunda-feira, 27 de maio de 2024

Vereda da Poesia = 19 =


Trova Premiada  em Camboriú/SC, 2004

Clair Fernandes Malty 
Itapema/SC

Quando as ondas desta vida
ameaçam me tragar,
a minha carga sofrida
lanço nas águas do mar.

= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Setilhas do de Natal/RN

Ademar Macedo
Santana do Matos/RN, 1951 – 2013, Natal/RN

O poeta já vem com a verve feita
por Deus Pai nosso mestre e criador;
alguns nascem com a mente de aprendiz
outros tantos já nascem professor,
e Deus vendo chegar a minha vez,
com a bênção sagrada Ele me fez:
Fuzileiro, Poeta e Trovador.

Escorado no topo da muleta,
eu me fiz um poeta e trovador;
meu passado de atleta e de boêmio
para mim, não foi nada alentador;
mas depois do meu trágico acidente,
encontrei na poesia e no repente
o remédio eficaz pra minha dor.

Como prova de amor, maior do mundo,
Cristo morre por nós, os pecadores.
Vejo ainda no manto de Maria
os vestígios de suas próprias dores;
e, dotado de toda perfeição,
pra falar deste amor e do perdão
Deus criou os poetas Trovadores.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Aldravia de Pires do Rio/GO

Iranilda Divina Resende Paes

chuva
fina
no
milharal
saudade
desaguando!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Eldorado/SP

Francisca Júlia
(Francisca Júlia da Silva Munster)
Eldorado/SP (antiga Xiririca) 1874 –  1920, São Paulo/SP+

NOTURNO

Pesa o silêncio sobre a terra. Por extenso
Caminho, passo a passo, o cortejo funéreo
Se arrasta em direção ao negro cemitério...
À frente, um vulto agita a caçoula do incenso.

E o cortejo caminha. Os cantos do saltério
Ouvem-se. O morto vai numa rede suspenso;
Uma mulher enxuga as lágrimas ao lenço;
Chora no ar o rumor de um misticismo aéreo.

Uma ave canta; o vento acorda. A ampla mortalha
Da noite se ilumina ao resplendor da lua...
Uma estrige soluça; a folhagem farfalha.

E enquanto paira no ar esse rumor das calmas
Noites, acima dele, em silêncio, flutua
O lausperene mudo e súplice das almas.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Paranavaí/PR

Dinair Leite

A trova quando é sentida
viaja em nossa emoção
Nos faz fiéis toda a vida,
une os povos, faz irmãos.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Portugal

Florbela Espanca
(Florbela d'Alma da Conceição Espanca)
Vila Viçosa/Portugal, 1894 — 1930, Matosinhos/Portugal

CARAVELAS

Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.

Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!

Se eu sempre fui assim este Mar-Morto,
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram.

Caravelas douradas a bailar…
Ai, quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Quadra Popular

Quando vires a tarde triste
e a noite para chover,
são lágrimas de meus olhos
que correm por não te ver.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de São Paulo/SP

Filemon Martins
(Filemon Francisco Martins)

REVISITANDO A INFÂNCIA

Refaço, de memória, a longa estrada, 
caminhos que trilhei desde menino. 
De manhã cedo, ainda na alvorada, 
eu preparava a terra, meu destino. 

Tempos depois, aposentei a enxada, 
para estudar, no chão diamantino. 
A vida era feliz lá na Chapada, 
quando brilhava a luz do sol, a pino... 

Tudo passou, bem sei, tão de repente, 
meu coração, parece, anda descrente 
e o sentimento, quantas vezes, trunca... 

Hoje, guardo no peito, com cuidado, 
lembranças que marcaram meu passado 
e uma saudade que não passa nunca…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Humorística, de Maringá/PR

A. A. de Assis
(Antonio Augusto de Assis)

Esta é uma antiga lorota, 
que jamais se esclareceu: 
– Se Judas nem tinha bota, 
como foi que ele a perdeu?... 
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Glosa de Fortaleza/CE

Nemésio Prata
(Nemésio Prata Crisóstomo)

UMA GLOSA "TRAIÇOEIRA"! 

Mote:
Minha vida vai sem rumo 
buscando um sonho encantado, 
em seus braços me consumo... 
sou mais um pobre enganado!
(José Feldman – Campo Mourão/PR)

Glosa:
Minha vida vai sem rumo 
pelo mar da solidão 
depois que perdi o prumo 
norte do seu coração! 

Náufrago, na maresia, 
buscando um sonho encantado, 
sonhei que você, um dia, 
voltaria pro meu lado! 

E neste sonho sem prumo 
dizia pra minha amada: 
em seus braços me consumo... 
foi só um sonho e mais nada! 

Neste sonho eu percebi 
outro "sujeito" ao seu lado, 
finalmente eu entendi: 
sou mais um pobre enganado!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Triverso de São Paulo/SP

Alberto Marsicano

Cumes
de cumulus
se acumulam
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Martelo Agalopado de Caicó/RN

Professor Garcia
(Francisco Garcia de Araújo)

Nosso velho rojão é tão dolente
que as estrelas marejam no infinito,
chora a imagem pintada no granito
nos instantes finais do sol morrente;
as estrelas fulguram no nascente
e a montanha se cobre de beleza,
para ouvir a canção da singeleza
que o poeta verseja e não vacila,
cada verso é uma estrela que cintila
no universo da santa natureza!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova do Rio de Janeiro/RJ

Bastos Tigre
(Manuel Bastos Tigre)
Recife/PE, 1882 – 1957, Rio de Janeiro/RJ

Como infeliz é esta gente             
que pensa que ser feliz        
é não dizer o que sente      
e não sentir o que diz!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Décima de Fortaleza/CE

Francisco José Pessoa
(Francisco José Pessoa de Andrade Reis)
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

A mais cara e perfeita maquilagem
que lambuza e restaura certo rosto
por prazer ou se não a contra gosto
torna falso o semblante da imagem
é o outono tristonho sem plumagem
é o alto do céu sem um condor
é um jarro quebrado sem a flor
é a infância sem um conto de fada
eu não vejo beleza em quase nada
que não tenha beleza interior.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Epigrama de Salvador/BA

Clóvis Amorim
(Clovis Gonçalves Amorim)
Amélia Rodrigues/BA, 1912 – 1970, Salvador/BA

Veio ao mundo esse Raimundo 
Devido a um erro, talvez, 
E só Deus que fez o mundo 
Sabe ao certo quem o fez.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Spina de São Paulo/SP

Solange Colombara

SER MÃE 

Abraços em braços 
que tocam, acolhem,
afastam as tristezas 

em gestos mágicos, doces sutilezas.
De mãos dadas, imortalizam olhares
disfarçados em beijos, raras riquezas
que amenizam as aflições. Saudosos
risos, para sempre nossas fortalezas.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Curitiba/PR

Victorina Sagboni
Joaquim Távora/PR, 1932 – 2009, Curitiba/PR

Quando chora um trovador
 não é o seu pesar somente,
 canta, sofre e chora a dor
colhida de toda gente.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Elegia* de Lisboa/Portugal

David Mourão-Ferreira
(David de Jesus Mourão-Ferreira)
1927 – 1996

ELEGIA DO CIÚME 

A tua morte, que me importa,
se o meu desejo não morreu?
Sonho contigo, virgem morta,
e assim consigo (mas que importa?)
possuir em sonho quem morreu.

Sonho contigo em sobressalto,
não vás fugir-me, como outrora.
E em cada encontro a que não falto
inda me turbo e sobressalto
à tua mínima demora.

Onde estiveste? Onde? Com quem?
— Acordo, lívido, em furor.
Súbito, sei: com mais ninguém,
ó meu amor!, com mais ninguém
repartirás o teu amor.

E se adormeço novamente
vou, tão feliz!, sem azedume
— agradecer-te, suavemente,
a tua morte que consente
tranquilidade ao meu ciúme.
===============

* Modernamente, elegia é uma poesia de tom terno e triste. Geralmente é uma lamentação pelo falecimento de um personagem público ou um ser querido. Vale ressaltar que na elegia também há digressões moralizantes destinadas a ajudar ouvintes ou leitores a suportar momentos difíceis. Por extensão, designa toda reflexão poética sobre a morte: a elegia, assim como a Ode, tem extensões variadas. O que as difere é que a elegia trata de acontecimentos infelizes.

Na antiguidade, a elegia era uma composição da poesia lírica monódica (ou seja, declamada pelo próprio poeta, geralmente, e acompanhada por um só instrumento musical - como a lira; ao contrário da lírica coral, apresentada por um coro, como ou sem acompanhamento musical), aparentada à épica pela sua forma. No entanto, o metro utilizado era o dístico elegíaco. Havia vários tipos de elegia, conforme seu conteúdo: elegia marcial ou guerreira, elegia amorosa e hedonista, elegia moral e filosófica, elegia gnômica...

Inicialmente definida pelo metro específico, chamado metro elegíaco, a elegia passou a designar um gênero poético que se caracterizou não pela forma, mas pelo assunto: a tristeza dos amores interrompidos pela infidelidade ou pela morte.

A elegia surgiu na Grécia antiga, com Calino de Éfeso (século VII a.C.), Tirteu e Mimnermo. Seus poemas eram cantos guerreiros que incitavam à luta. Calímaco, importante poeta alexandrino do século III a.C., foi um dos primeiros a escrever elegias no sentido do moderno termo, ou seja, como poemas líricos e tristes. Sua elegia “Os cabelos de Berenice”, da qual só restaram fragmentos, constituiu o primeiro modelo do gênero.

Entre os romanos, o primeiro grande poeta elegíaco foi Tibulo. Seus três livros sentimentais, muito lidos durante a Idade Média, influenciaram fortemente os poetas da Renascença. Foram preferidos às elegias de Propércio, que inauguraram um subgênero, com poemas ardentemente eróticos. O mais importante dos elegíacos romanos foi Ovídio: os Poemas tristes e as Cartas do Ponto, que lamentavam seu exílio, se aproximam bastante das elegias modernas.

No século XVI, a elegia transformou-se num dos gêneros poéticos mais cultivados, embora ainda pouco definido. Em Portugal, o primeiro escritor de elegias foi Sá de Miranda, mas Camões foi o principal: da edição de 1595 de suas obras completas, constam quatro elegias, tidas pelas melhores em língua portuguesa. Na França da Renascença, destacou-se no gênero Pierre de Rosnard.

Na poesia inglesa, a elegia apareceu com Astrophel, lamento fúnebre de Edmund Spenser. Durante quase três séculos produziram-se, dentro desse modelo, alguns dos maiores poemas da literatura inglesa, como Lycidas, de Milton (1638), Adonais, de Shelley (1821), sobre a morte de Keats, e muitas outras. Contudo a mais famosa elegia da língua inglesa foi Elegy Written in a Country Church Yard (1751; Elegia escrita num cemitério da aldeia), de Thomas Gray, meditação sobre a morte de gente humilde e anônima e uma das obras capitais do pré-romantismo europeu.

Em outras literaturas, a elegia assumiu características [[pagãs], como as belas e eróticas Römische Elegien (1797; Elegias romanas), de Goethe, obra prima da literatura alemã. No século XX, a obra mais importante do gênero foi sem dúvida Duineser Elegien (1923; Elegias de Duino), do poeta alemão Rainer Maria Rilke. No Brasil, o mais importante autor de elegias foi Fagundes Varela, no século XIX. Destacam-se ainda Cristiano Martins, Vinicius de Moraes, Cecília Meireles (em Solombra) e Dantas Mota, no século XX. 

Leon Tolstói (A menina-camundongo)

Um homem andava perto do rio e viu um corvo levando um camundongo pelo bico. O homem jogou uma pedra e o corvo largou o camundongo; o camundongo caiu na água. O homem tirou o camundongo da água e levou para casa. 

Ele não tinha filhos e disse:

− Ah! Quem dera esse camundongo virasse uma menina!

E o camundongo virou uma menina. 

Quando a menina cresceu, o homem perguntou para ela:

− Com quem você quer casar?

A menina disse:

− Quero casar com o mais forte do mundo.

O homem foi falar com o sol e disse:

− Sol! Minha menina quer casar com o mais forte do mundo. Você é o mais forte de todos; case com minha menina.

O sol respondeu:

− Não sou o mais forte de todos: as nuvens me escurecem.

O homem foi falar com as nuvens e disse:

− Nuvens! Vocês são os mais fortes de todos; casem com minha menina.

As nuvens responderam:

− Não, nós não somos os mais fortes de todos, o vento nos espalha.

O homem foi falar com o vento e disse:

− Vento! Você é o mais forte de todos; case com minha menina.

O vento respondeu:

− Não sou o mais forte de todos: as montanhas bloqueiam minha passagem.

O homem foi falar com as montanhas e disse:

− Montanhas! Casem com minha menina; vocês são os mais fortes de todos.

As montanhas responderam:

− Mais forte que nós é o rato. Ele nos rói.

Então o homem foi falar com o rato e disse:

− Rato! Você é o mais forte de todos; case com minha menina.

O rato concordou. O homem voltou para casa e disse para a menina:

− O rato é o mais forte de todos: rói as montanhas, as montanhas bloqueiam a passagem do vento, o vento espalha as nuvens, as nuvens escurecem o sol e o rato quer casar com você.

Mas a menina disse:

− Ah! O que vou fazer agora? Como posso casar com o rato?

Então o homem disse:

− Ah! Quem dera minha menina virasse de novo um camundongo!

E a menina virou camundongo e casou com o rato.

Fonte: Liev Tolstói. Livros de leitura para crianças. Publicado originalmente em 1864.  Disponível em Domínio Público

Recordando Velhas Canções (Tiro ao Álvaro)


Compositores: Osvaldo Molles / Adoniran Barbosa

De tanto levar frechada do teu olhar
Meu peito até parece sabe o quê?
Táubua de tiro ao Álvaro
Não tem mais onde furar
(Não tem mais)

De tanto levar frechada do teu olhar
Meu peito até parece sabe o quê?
Táubua de tiro ao Álvaro
Não tem mais onde furar

Teu olhar mata mais do que bala de carabina
Que veneno estricnina
Que peixeira de baiano
Teu olhar mata mais que atropelamento de automóver
Mata mais que bala de revórver

De tanto levar frechada do teu olhar
Meu peito até parece sabe o quê?
Táubua de tiro ao Álvaro
Não tem mais onde furar
Não tem mais

De tanto levar frechada do teu olhar
Meu peito até parece sabe o quê?
Táubua de tiro ao Álvaro
Não tem mais onde furar

Teu olhar mata mais do que bala de carabina
Que veneno estricnina
Que peixeira de baiano
Teu olhar mata mais que atropelamento de automóver
Mata mais que bala de revórver
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = = = = = = = = = = 

O Amor e Suas Metáforas em 'Tiro Ao Álvaro'
A música 'Tiro Ao Álvaro', interpretada por Elis Regina em parceria com Adoniran Barbosa, é um clássico da música popular brasileira que utiliza metáforas bem-humoradas para descrever os efeitos do amor e da paixão. A letra compara o olhar da pessoa amada a uma série de elementos perigosos e letais, evidenciando o impacto profundo que esse olhar tem sobre quem o recebe. A expressão 'táubua de tiro ao Álvaro' faz referência a uma superfície repleta de furos, sugerindo que o coração do eu lírico já foi 'atingido' inúmeras vezes pelo olhar da pessoa amada, a ponto de não haver mais espaço para novos 'ferimentos'.

Elis Regina, conhecida por sua voz marcante e interpretação intensa, dá vida à canção de maneira única, transmitindo a mistura de dor e deleite que o amor pode causar. Adoniran Barbosa, por sua vez, é reconhecido por suas composições que retratam o cotidiano e a cultura paulistana com linguagem coloquial e humor. A música faz uso de comparações exageradas, como 'mata mais do que bala de carabina' ou 'que peixeira de baiano', para enfatizar a força do olhar da pessoa amada, que é descrito como mais letal do que armas ou venenos.

A escolha de elementos tão diversos e potencialmente mortais para descrever o olhar da pessoa amada serve para ilustrar a intensidade da paixão, que pode ser tanto avassaladora quanto perigosa. 'Tiro Ao Álvaro' é uma música que brinca com a ideia de que o amor pode ser tão impactante quanto um tiro, e que o coração apaixonado é um alvo constante, sempre vulnerável aos 'tiros' do ser amado. A canção permanece como um exemplo da habilidade de Elis Regina e Adoniran Barbosa em transformar sentimentos complexos em arte, utilizando a música como veículo para expressar as nuances do coração humano.

Rommel Werneck (Como declamar poesias?)

A POESIA
Imagem, criação por JFeldman com IA Bing

A poesia é o gênero literário em que a expressão do estado da voz lírica se encontra num tempo presente que não foi passado e nem será futuro, o Presente Eterno, ou seja, a vitória da atemporalidade sobre os ruídos destruidores do tempo. Para isto acontecer, é necessário que o escritor selecione bem as palavras e emita sua mensagem de modo indireto e subjetivo, ou seja, o texto precisa ser construído racionalmente e com a graciosidade estética que exige.

Sendo o texto literário de uma construção diferente dos nossos diálogos cotidianos e de textos como bula de remédio, reportagem jornalística etc, convém que a recitação literária também seja decorada esteticamente por entonações, gestos, fundo musical etc, afinal, a leitura de uma notícia de jornal em voz alta é muito diferente da leitura de um soneto de Camões no mesmo tom de voz.

TIPOS DE DECLAMAÇÃO

Estas são orientações simples e pessoais que decidi expor aqui, mas que desmitificam lendas literárias das teorias do achismo. A regra geral é ler com confiança seguindo a pontuação, dando um tom artístico conforme pede o poema e, para isto, temos que ter o domínio do conteúdo e da forma também, afinal, ler um rondel é diferente de um soneto já que o primeiro apresenta refrão etc.

DECLAMAÇÃO SIMPLES

Com a intensa propagação e oficialização da poesia marginal, surgiu o mito de que a declamação simples lida é errônea, ultrapassada e sem graça. Afirmar isto seria o mesmo que dizer que os versos regulares também são ultrapassados e todos sabem que nossa luta é contra isto!

Uma declamação simples não consiste em ler em voz alta um poema somente, a graciosidade está na adoção de uma voz dramática para o texto assim como expressões faciais e gestos coerentes que são muito bem-vindos. O declamador lê na frente de todos, mas entoa como se estivesse cantando para si mesmo publicamente. Em um segundo, é possível ler o verso e declamar parte dele olhando para a assistência já que parte dele foi decorada. Pode-se utilizar uma pasta ofício, um livro ou mesmo um pedaço de papel na mão ou mesmo posicionados num ambão (tribuna), a outra mão pode ficar com o microfone ou fazendo alguns gestos no caso de microfone no pedestal.

Para este tipo de leitura não são recomendados textos longos, pois seria muito cansativo para o espectador. O declamador não precisa utilizar uma vestimenta ou maquiagem toda especial, pode estar apenas um pouco estiloso por estar num sarau.  

DECLAMAÇÃO DECORADA

Consiste em declamar um texto sem ler o que permite mais gesticulação e expressão facial. Recitar um poema decorado sem expressão nenhuma é o mesmo que fazer uma leitura ruim, pois o que merece destaque não é o simples ato de ter decorado o texto e recitar sem ler, o que importa é que decorando pode-se utilizar uma postura mais expressiva. Textos longos são bem-vindos.

DECLAMAÇÃO CÊNICA

Trata-se do caso anterior em um degrau a mais. Tudo que for utilizado para solenizar sua performance deve ter uma razão, regra que, aliás, já serve lá para os outros tipos. A declamação pode ser lida (desde que o ato de ler seja proposital) ou decorada como ocorre com mais frequência. Pode-se utilizar uma música de fundo, um figurino especial, uma entrada silenciosa ou musical, mesclar-se dança, recitar em grupo etc

Esta forma de recitação é perfeita para textos longos, teatrais ou que contenham diálogo, alegorias etc, pois não cansará o público e será uma bela união entre poesia e o gênero dramático e também com as outras artes, como a dança e a moda, além do mais, poemas longos permitem uma entrada triunfal, música de fundo e vários recursos que um poema curto como haicai não permite, afinal, não é agradável ver uma pessoa encenar um poema curtíssimo, porque nem temos o tempo de sentir a intensidade do texto e a dramaticidade exposta.

Claro que é possível realizar algo cênico com haicais e afins, mas evita-se a maioria dos recursos como sonoplastia, figurino etc. Por texto longo, entende-se algo a partir do tamanho de um soneto (14 versos), uma vez que a declamação cênica pode ser mais lenta para dar espaço aos gestos, movimentações e profundidade do poema.

OBSERVAÇÕES

– Antes de declamar, convém identificar o texto com o autor e o título. A etapa citada pode ser em forma dialogada em casos de uma comunidade literária pequena, porque é uma forma de contar como se chegou ao texto, Uma auto-apresentação também pode acontecer, mas há a opção de realizá-la entre o primeiro e o segundo texto ou mesmo no fim. Termina-se a leitura fazendo um gesto, aceno de cabeça, transformação do tom da voz etc ou dizendo o nome do autor.

-  Alguns afirmam que deve haver uma compatibilidade do poema com o declamador, é a crença de que o declamador deve concordar em gênero, número e grau com o poema, portanto, uma mulher não poderia ler um texto de eu lírico masculino, nem uma pessoa jovem recitar um texto de um eu lírico aparentemente mais velho etc Realmente, soa estranho quando não há tal relação, entretanto, se um escritor homem pode escrever como se fosse eu lírico feminino assim como acontecia na Idade Média, por que não podemos hoje declamarmos um belo poema independente do eu-lírico ser isto ou aquilo? Nestes casos o declamador pode deixar a voz um pouco mais aguda e a declamadora pode deixar mais grave e séria, é uma forma de neutralizar quem declama.

-  Embora em desuso, mas nunca abolida, a prática de bater os pés nas sílabas fortes é muito criativa, didática e em excelente caimento para todos os tipos citados acima. Ela tem origem nos poetas antigos que seguiam o sistema greco-latino de metrificação denominado pé justamente por esta razão. Agora em que estão considerando ultrapassada a regularidade métrica, creio que não há nada mais pedagógico e cultural que bater os pés nas declamações de sonetos na 6ª e 10ª sílabas, por exemplo, caso dos heroicos, porque é uma forma de mostrar a autenticidade dos versos regulares.

- Talvez, o tipo de verso mais fácil de errar é aquele que contém o cavalgamento, recurso poético também denominado enjambement e encadeamento, que consiste em transferir a parte final da construção sintática para o verso posterior por razões métricas e rítmicas. Observe:

Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha. ”
Olavo Bilac

Neste caso, leríamos sem deixar pausa. A pausa, nós utilizamos entre as estrofes e os símbolos de pontuação.

- Além das observações expostas acima, vale lembrar que é interessante conhecer e compreender o texto antes de ler em público, eliminar as dúvidas etc.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Declamar em saraus é uma prática maravilhosa que merece criatividade, dedicação e lirismo. Seria muito interessante se, em eventos não-literários, existisse uma ou outra declamação como parte da abertura assim como já se faz com a dança, por exemplo, em bailes de formatura, debutante, casamentos, dever-se-ia pensar mais na possibilidade de executar performances literárias bem cuidadas em tais situações.

domingo, 26 de maio de 2024

Carolina Ramos (Trovando) “15”

 

Geraldo Pereira (Consertador de Panelas)

O último artigo que escrevi nesta página do Jornal do Commercio – “Macaxeira Rosa” –, fazendo um comentário a propósito de antigos vendedores de rua da cidade, desaparecidos, em maioria, nesses tempos de globalização e de mundialização do tudo e de todos, obteve junto ao leitor generosa repercussão. Recebi alguns telefonemas e outros tantos cumprimentos pessoais, pelo resgate, sobretudo, de figuras assim, típicas da cidade provinciana, ainda, como era o Recife em décadas passadas. Foram muitas as contribuições sobre personagens que terminei omitindo, por falha mesmo da memória, haja vista os 53 anos bem vividos, já. 

Outros, também, pediram que continuasse a crônica, seguindo o tema e a tônica anterior, para complementar a lista. Faço isso, pois, em atenção àqueles que se ocupam de meus escritos e com isso me dão satisfação especial. 

Como esquecer do consertador de panelas, que passava oferecendo os seus préstimos às custas do toque cadenciado e peculiar de um pequeno varão de ferro sobre uma frigideira usada? O simples escutar dessa musicalidade característica, produzia na cozinha um rebuliço e as peças de alumínio furadas eram, de logo, selecionadas e entregues ao especialista na arte do remendo. Voltavam novas, praticamente, trazendo no fundo, sempre, o acréscimo de que precisavam e tinham a destinação habitual, a do cozimento, a depender, apenas, da receita do dia. Quando a galinha ia para a mesa, por certo que fora comprada ao homem que a cavalo trazia dois caçuás de penosas, um de cada lado. Cabia ao comprador sustentar a ave pelas asas e optar pela de peso maior, pois que o preço era unitário somente, não interessando os quilogramas a mais, de um ou de outro exemplar.

Musicalidade mais apurada, entretanto, era a do amolador de tesouras, de facas, também, que usava um instrumento assemelhado a um realejo, do qual nasciam as notas da oferta. Um desses tinha parte do antebraço amputada, mas com um revestimento de couro, uma luva apropriada, manuseava a peça, cega por hora. Usava um carrinho que vinha empurrando e ao primeiro sinal de serviço a ser realizado, invertia a posição, alinhava a polia grande de borracha e com o pé num pedal artesanal girava o esmeril. Na realidade, terminava desgastando as lâminas a serem amoladas e em casa de toda a gente algumas das facas não serviam mais para atender às visitas ou aos mais cerimoniosos da família. Eram facas da cozinha. 

O vendedor de pirulitos, com uma tábua toda furada e os doces cônicos encaixados, usava um apito e ia passando adiante o seu produto de fabricação caseira, que pregava nos dentes.

Já o homem das vassouras e dos espanadores era diferente, trazia um material de cabos coloridos e de pilosidade formando desenhos, para o chão da casa e a poeira dos móveis, além de vender, também, o vasculhador, que passado no teto sacudia as aranhas, afugentando-as das teias. Tinha um grito característico, chamando a atenção para a sua variedade em material assim, destinado à coleta do lixo doméstico, o grosso e o fino. Mas a oferta da lã de barriguda para travesseiro era cantada em versos sem muita rima: “Eu tenho lã de barriguda/Para travesseiro.” E como não havia a espuma de hoje, sintética e mais prática, conseguia boa freguesia nas ruas por onde passava. Era preciso encher esses apetrechos, que nos servem à cabeça, para um bom e reparador sono, a intervalos de tempo certos.

O peixe, do mesmo jeito, chegava à porta de casa, vinha em dois balaios, os quais, sustentados por cordas à ponta de um suporte de madeira carregado às costas, pendiam livres, quase, balançando, pra lá e pra cá, à medida que o vendedor andava pelas ruas e oferecia o produto gritando. Alguns desses homens do peixe faziam verdadeiros malabarismos com os balaios. Paravam, então, e apresentavam as espécies e as espécimes de que dispunham, utilizando-se depois de uma tábua para preparar as postas, tudo segundo as preferências do freguês. Peixe fresco, ao tempo, sem a ação, às vezes deletéria, do gelo, que da carne branca rouba o sabor. Com os anos, apareceram os frigoríficos e a albacora popularizou-se na mesa do recifense. Mas, o nome desse bicho dos mares era muito aplicado como apelido para as mulheres gordas, ricas em adiposidades.

E foi de Leda Alves a lembrança do vendedor de cambará: “Olha a bolinha de cambará/Dois pacotes é um vintém...” E do poeta Paulo Montezuma a saudade do acendedor de lampiões nas ruas do Recife, iluminando os passeios da gente faceira. Não esqueço, todavia, do acendedor das lâmpadas, já, nos velhos postes de meu bairro, ligando as chaves e alumiando o tempo.

Fonte: Geraldo Pereira. A medida das saudades. Recife/PE, 2006. Disponível no Portal de Domínio Público

Vereda da Poesia = 18 =


Trova Humorística, de Porto Alegre/RS

Flávio Roberto Stefani

O motel está falido
porque o dono, sem malícia,
ao ouvir qualquer gemido,
telefona pra polícia...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Campos dos Goytacazes/ RJ

Diamantino Ferreira

INVEJA
 
- Como invejo as estrelas!… Como invejo
a placidez da lua, o brilho intenso
dos astros cintilantes… Quando penso
no que existe de belo e malfazejo!…
 
Ausente das disputas de um pretenso
mundo estéril, malévolo e sem pejo,
sua apatia é tudo quanto almejo
para esquivar-me aos que não têm bom senso…
 
Desejo vão!… Porém, fosse verdade…
Pudesse olhar, do céu, toda a maldade…
As coisas vis, de lá pudesse vê-las!…
 
Como seria bom!… Infelizmente,
Tais coisas acontecem tão somente
Quando a mente vagueia entre as estrelas…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Haicai de Campinas/SP

Guilherme De Almeida
(Guilherme de Andrade de Almeida)
Campinas/SP, 1890 – 1969, São Paulo/SP

O BOÊMIO

Cigarro apagado
no canto da boca, enquanto
passa o seu passado.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema do Rio de Janeiro/RJ

Carlos Drummond de Andrade
Itabira/MG (1902 - 1987) Rio de Janeiro/RJ

IMORTALIDADE 

Morre-se de mil motivos 
e sem motivo se morre
de saudade,
morreu o poeta
sem morrer à eternidade
ele que fez de uma pedra
louvor para sua cidade
gauche*, grande destro
sem querer celebridade
pelos mil que era
num só se fez único
ficando no seu primeiro
caráter de bom mineiro
jamais morrerá
e sempre será.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
* Gauche = tímido
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Balneário Camboriú/SC

Ari Santos de Campos

Neste mundo de conflitos
o Poder faz e desfaz...
E os povos seguem aflitos
com a esperança de paz!...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Sextilha de Maringá/PR

A. A. de Assis
(Antonio Augusto de Assis)

Enlaçado nos meus laços
de amizade e de afeição,
vou seguindo vida afora
numa alegre comunhão
em que a cada amigo trato
qual se fosse um meu irmão.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Limerique de São Paulo/SP

Tatiana Belinky
São Petersburgo/Rússia, 1919 – 2013, São Paulo

MINHOCAS

Ao ver uma velha coroca
fritando um filé de minhoca
o Zé Minhocão
falou pro irmão:
“Não achas melhor ir pra toca?”
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Curitiba/PR

Túlio Vargas
(Odilon Túlio Vargas)
Piraí do Sul/PR, 1929 -2008, Curitiba/PR

MACHADIANO

“Oh! Flor do céu! oh! flor cândida e pura!”
Que dos vergéis avulta doce e inquieta;
encanta e traz, das vestes da natura,
da luz o brilho e a cor da borboleta.

Para exaltar-te invoca-se um poeta,
a declamar sem laivos de amargura,
pois eu, que sou um infeliz esteta,
não intento alcançar tal formosura.

Quero dizer-te a frase romanesca,
mas na garganta cessa voz grotesca
e o pensamento todo se embaralha.

Um número qualquer na sorte crivo,
oh! dúvida cruel! Mas sobrevivo.
“Ganha-se a vida, perde-se a batalha!”
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Curitiba/PR

Mário Zamataro
(Mário Augusto Jaceguay Zamataro)

Nos versos que tenho feito,
lucidez, sonho ou loucura
dão temas para um sujeito
que faz da trova procura.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Décimas em Cordel de Ipueiras/CE

Dalinha Catunda

O SUMIÇO DO VAQUEIRO

Quando o vaqueiro partiu
Minha dor doeu no peito
Com saudades do sujeito
Que minha vida floriu
Minha alegria sumiu,
E nesta situação
Olhando pro seu gibão
Eu renego meu destino
Pois meu maior desatino
Foi perder minha paixão.

Tão garboso ele passava
Bem em frente ao meu portão
Com uma rosa na mão,
Que beijava e me jogava.
Eu toda prosa ficava
Com aquele moço Trigueiro
Que rondava meu terreiro
E me chamava de flor,
Por merecer meu amor
Entreguei-me ao tal vaqueiro.

Uma viagem esticada
Ele foi e não voltou.
Meu coração palpitou,
E chorei desesperada.
Olhos grudados na estrada,
E aperto no coração
Murchava a flor do sertão
Que hoje se chama saudade
Perdeu a felicidade
Ao perder sua paixão.

Nem vaqueiro nem boiada,
Só saudade e solidão
Passando pela estrada
Que corta o meu sertão.
Não tem aceno de mão,
Nem levantar de chapéu,
Pois hoje mora no céu
Aquele viril vaqueiro,
Que tacava o tempo inteiro
Boiadas de déu em déu.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Epigrama do Rio de Janeiro/RJ

Cecília Meireles
(Cecília Benevides de Carvalho Meireles)
Rio de Janeiro/RJ, 1901 – 1964 

EPIGRAMA N. 8

Encostei-me a ti, sabendo bem que eras somente onda.
Sabendo bem que eras nuvem, depus a minha vida em ti.

Como sabia bem tudo isso, e dei-me ao teu destino frágil,
fiquei sem poder chorar, quando caí.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Glosa de Fortaleza/CE

Francisco Pessoa
(Francisco José Pessoa de Andrade Reis)
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Cada passo é mais um sonho 
Ao longo do caminhar

Esteja alegre ou tristonho
O poeta enxerga a vida
Tal a terra prometida…
Cada passo é mais um sonho.
Chega ao destino risonho,
Pelo prazer de rimar
E antes mesmo de apear
Em pensamentos, imerso,
Olha pra trás, vê seu verso
Ao longo do caminhar.

Usei todos os atalhos
Que encontrei pelo caminho,
Fiz de quando em quando um ninho,
Fiz de estrelas agasalhos.
Os meus cabelos grisalhos
Tingidos pelo luar,
Retratam bem meu andar…
Embora um tanto tardonho,
Cada passo é mais um sonho
Ao longo do caminhar.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Porto/Portugal

Emilia Peñalba de Almeida Esteves 

Nos seus ardentes amores,
consegue sempre o que quer:
rosa - a rainha das flores...
Rosa - a rainha mulher!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Martelo Agalopado de Caicó/RN

Professor Garcia
(Francisco Garcia de Araújo)

No repente, ninguém traça uma meta,
mas é bom que um roteiro a gente trace,
pois do nada, um improviso sempre nasce
e a beleza da vida se completa.
Não precisa que seja em linha reta,
pode ser por caminho tortuoso,
pois o verso sofrendo é mais famoso
aos primeiros suspiros da manhã,
quando o sol salpicando o morro e a chã
torna o verso mais belo e mais formoso!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Quadra Popular

Se os meus suspiros pudessem
a teus ouvidos chegar,
verias que uma saudade
é bem capaz de matar.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Copla* de São Luiz Gonzaga/RS

Ângelo Franco

COPLAS DE UM GAÚCHO BRASILEIRO

Esta parada que eu carrego no meu jeito
Vem do meu peito embriagado de ideal
Eu sou de um povo que se fez a ferro e fogo
Guardando posto no Brasil meridional

Os olhos firmes não retratam amarguras,
Pois as agruras não são mais que provações
Se rio pouco quando rio, sou sincero
Sei o que quero não nasci pras ilusões

A cada dia que o Brasil fica mais velho
Eu me revelo mais gaúcho e brasileiro
Pena que os olhos do país às vezes turvam
E nos enxergam muito mais como estrangeiros

É bem verdade que não somos agregados
Aos que parados choram pranto de miséria
Sangue latino, coração de terra bruta
A nossa luta é por trabalho e gente séria

Nossas verdades têm razões nacionalistas
Como ativistas da cultura regional
Já não pregamos nenhuma separação
Revolução é dar a mão ao seu igual

Por isso eu digo pra cada brasileiro
Somos gaúchos com orgulho da nação
Apenas peço não esqueçam do Rio Grande
Que ainda temos o Brasil no coração
=======

* (tradução por José Feldman)
Copla, pequeno poema lírico de inspiração popular, constituído geralmente por estrofes de quatro versos octossílábicos, assonantados. Os versos podem também ser assonantes ou consoantes de oito, onze ou doze sílabas. Há ainda octossílábicos alternados com heptassílábicos.

A copla pode ser de mais de quatro versos: cinco, sete, nove... e de menos: três.

As coplas se denominam: de vilancetes, de seguidilhas, quintilhas, sextilhas, de sete, oito e nove versos; coplas reais, coplas de arte maior, coplas de pé quebrado. Cada uma destas têm sua própria estrutura: tipo de versos (octossilábico, quintilha, etc), quantidade de versos e estrofes, e rimas. 
Fonte: Federico Carlos Sáinz de Robles. Diccionário de La Literatura. Aguillar, 1982.