Clair Fernandes Malty
Itapema/SC
Quando as ondas desta vida
ameaçam me tragar,
a minha carga sofrida
lanço nas águas do mar.
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Setilhas do de Natal/RN
Ademar Macedo
Santana do Matos/RN, 1951 – 2013, Natal/RN
O poeta já vem com a verve feita
por Deus Pai nosso mestre e criador;
alguns nascem com a mente de aprendiz
outros tantos já nascem professor,
e Deus vendo chegar a minha vez,
com a bênção sagrada Ele me fez:
Fuzileiro, Poeta e Trovador.
Escorado no topo da muleta,
eu me fiz um poeta e trovador;
meu passado de atleta e de boêmio
para mim, não foi nada alentador;
mas depois do meu trágico acidente,
encontrei na poesia e no repente
o remédio eficaz pra minha dor.
Como prova de amor, maior do mundo,
Cristo morre por nós, os pecadores.
Vejo ainda no manto de Maria
os vestígios de suas próprias dores;
e, dotado de toda perfeição,
pra falar deste amor e do perdão
Deus criou os poetas Trovadores.
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Aldravia de Pires do Rio/GO
Iranilda Divina Resende Paes
chuva
fina
no
milharal
saudade
desaguando!
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Soneto de Eldorado/SP
Francisca Júlia
(Francisca Júlia da Silva Munster)
Eldorado/SP (antiga Xiririca) 1874 – 1920, São Paulo/SP+
NOTURNO
Pesa o silêncio sobre a terra. Por extenso
Caminho, passo a passo, o cortejo funéreo
Se arrasta em direção ao negro cemitério...
À frente, um vulto agita a caçoula do incenso.
E o cortejo caminha. Os cantos do saltério
Ouvem-se. O morto vai numa rede suspenso;
Uma mulher enxuga as lágrimas ao lenço;
Chora no ar o rumor de um misticismo aéreo.
Uma ave canta; o vento acorda. A ampla mortalha
Da noite se ilumina ao resplendor da lua...
Uma estrige soluça; a folhagem farfalha.
E enquanto paira no ar esse rumor das calmas
Noites, acima dele, em silêncio, flutua
O lausperene mudo e súplice das almas.
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Trova de Paranavaí/PR
Dinair Leite
A trova quando é sentida
viaja em nossa emoção
Nos faz fiéis toda a vida,
une os povos, faz irmãos.
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Soneto de Portugal
Florbela Espanca
(Florbela d'Alma da Conceição Espanca)
Vila Viçosa/Portugal, 1894 — 1930, Matosinhos/Portugal
CARAVELAS
Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho país que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.
Tanto tenho aprendido e não sei nada.
E as torres de marfim que construí
Em trágica loucura as destruí
Por minhas próprias mãos de malfadada!
Se eu sempre fui assim este Mar-Morto,
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram.
Caravelas douradas a bailar…
Ai, quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei à vida, e não voltaram!…
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Quadra Popular
Quando vires a tarde triste
e a noite para chover,
são lágrimas de meus olhos
que correm por não te ver.
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Soneto de São Paulo/SP
Filemon Martins
(Filemon Francisco Martins)
REVISITANDO A INFÂNCIA
Refaço, de memória, a longa estrada,
caminhos que trilhei desde menino.
De manhã cedo, ainda na alvorada,
eu preparava a terra, meu destino.
Tempos depois, aposentei a enxada,
para estudar, no chão diamantino.
A vida era feliz lá na Chapada,
quando brilhava a luz do sol, a pino...
Tudo passou, bem sei, tão de repente,
meu coração, parece, anda descrente
e o sentimento, quantas vezes, trunca...
Hoje, guardo no peito, com cuidado,
lembranças que marcaram meu passado
e uma saudade que não passa nunca…
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Trova Humorística, de Maringá/PR
A. A. de Assis
(Antonio Augusto de Assis)
Esta é uma antiga lorota,
que jamais se esclareceu:
– Se Judas nem tinha bota,
como foi que ele a perdeu?...
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Glosa de Fortaleza/CE
Nemésio Prata
(Nemésio Prata Crisóstomo)
UMA GLOSA "TRAIÇOEIRA"!
Mote:
Minha vida vai sem rumo
buscando um sonho encantado,
em seus braços me consumo...
sou mais um pobre enganado!
(José Feldman – Campo Mourão/PR)
Glosa:
Minha vida vai sem rumo
pelo mar da solidão
depois que perdi o prumo
norte do seu coração!
Náufrago, na maresia,
buscando um sonho encantado,
sonhei que você, um dia,
voltaria pro meu lado!
E neste sonho sem prumo
dizia pra minha amada:
em seus braços me consumo...
foi só um sonho e mais nada!
Neste sonho eu percebi
outro "sujeito" ao seu lado,
finalmente eu entendi:
sou mais um pobre enganado!
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Triverso de São Paulo/SP
Alberto Marsicano
Cumes
de cumulus
se acumulam
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Martelo Agalopado de Caicó/RN
Professor Garcia
(Francisco Garcia de Araújo)
Nosso velho rojão é tão dolente
que as estrelas marejam no infinito,
chora a imagem pintada no granito
nos instantes finais do sol morrente;
as estrelas fulguram no nascente
e a montanha se cobre de beleza,
para ouvir a canção da singeleza
que o poeta verseja e não vacila,
cada verso é uma estrela que cintila
no universo da santa natureza!
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Trova do Rio de Janeiro/RJ
Bastos Tigre
(Manuel Bastos Tigre)
Recife/PE, 1882 – 1957, Rio de Janeiro/RJ
Como infeliz é esta gente
que pensa que ser feliz
é não dizer o que sente
e não sentir o que diz!
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Décima de Fortaleza/CE
Francisco José Pessoa
(Francisco José Pessoa de Andrade Reis)
Fortaleza/CE, 1949 - 2020
A mais cara e perfeita maquilagem
que lambuza e restaura certo rosto
por prazer ou se não a contra gosto
torna falso o semblante da imagem
é o outono tristonho sem plumagem
é o alto do céu sem um condor
é um jarro quebrado sem a flor
é a infância sem um conto de fada
eu não vejo beleza em quase nada
que não tenha beleza interior.
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Epigrama de Salvador/BA
Clóvis Amorim
(Clovis Gonçalves Amorim)
Amélia Rodrigues/BA, 1912 – 1970, Salvador/BA
Veio ao mundo esse Raimundo
Devido a um erro, talvez,
E só Deus que fez o mundo
Sabe ao certo quem o fez.
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Spina de São Paulo/SP
Solange Colombara
SER MÃE
Abraços em braços
que tocam, acolhem,
afastam as tristezas
em gestos mágicos, doces sutilezas.
De mãos dadas, imortalizam olhares
disfarçados em beijos, raras riquezas
que amenizam as aflições. Saudosos
risos, para sempre nossas fortalezas.
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Trova de Curitiba/PR
Victorina Sagboni
Joaquim Távora/PR, 1932 – 2009, Curitiba/PR
Quando chora um trovador
não é o seu pesar somente,
canta, sofre e chora a dor
colhida de toda gente.
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Elegia* de Lisboa/Portugal
David Mourão-Ferreira
(David de Jesus Mourão-Ferreira)
1927 – 1996
ELEGIA DO CIÚME
A tua morte, que me importa,
se o meu desejo não morreu?
Sonho contigo, virgem morta,
e assim consigo (mas que importa?)
possuir em sonho quem morreu.
Sonho contigo em sobressalto,
não vás fugir-me, como outrora.
E em cada encontro a que não falto
inda me turbo e sobressalto
à tua mínima demora.
Onde estiveste? Onde? Com quem?
— Acordo, lívido, em furor.
Súbito, sei: com mais ninguém,
ó meu amor!, com mais ninguém
repartirás o teu amor.
E se adormeço novamente
vou, tão feliz!, sem azedume
— agradecer-te, suavemente,
a tua morte que consente
tranquilidade ao meu ciúme.
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* Modernamente, elegia é uma poesia de tom terno e triste. Geralmente é uma lamentação pelo falecimento de um personagem público ou um ser querido. Vale ressaltar que na elegia também há digressões moralizantes destinadas a ajudar ouvintes ou leitores a suportar momentos difíceis. Por extensão, designa toda reflexão poética sobre a morte: a elegia, assim como a Ode, tem extensões variadas. O que as difere é que a elegia trata de acontecimentos infelizes.
Na antiguidade, a elegia era uma composição da poesia lírica monódica (ou seja, declamada pelo próprio poeta, geralmente, e acompanhada por um só instrumento musical - como a lira; ao contrário da lírica coral, apresentada por um coro, como ou sem acompanhamento musical), aparentada à épica pela sua forma. No entanto, o metro utilizado era o dístico elegíaco. Havia vários tipos de elegia, conforme seu conteúdo: elegia marcial ou guerreira, elegia amorosa e hedonista, elegia moral e filosófica, elegia gnômica...
Inicialmente definida pelo metro específico, chamado metro elegíaco, a elegia passou a designar um gênero poético que se caracterizou não pela forma, mas pelo assunto: a tristeza dos amores interrompidos pela infidelidade ou pela morte.
A elegia surgiu na Grécia antiga, com Calino de Éfeso (século VII a.C.), Tirteu e Mimnermo. Seus poemas eram cantos guerreiros que incitavam à luta. Calímaco, importante poeta alexandrino do século III a.C., foi um dos primeiros a escrever elegias no sentido do moderno termo, ou seja, como poemas líricos e tristes. Sua elegia “Os cabelos de Berenice”, da qual só restaram fragmentos, constituiu o primeiro modelo do gênero.
Entre os romanos, o primeiro grande poeta elegíaco foi Tibulo. Seus três livros sentimentais, muito lidos durante a Idade Média, influenciaram fortemente os poetas da Renascença. Foram preferidos às elegias de Propércio, que inauguraram um subgênero, com poemas ardentemente eróticos. O mais importante dos elegíacos romanos foi Ovídio: os Poemas tristes e as Cartas do Ponto, que lamentavam seu exílio, se aproximam bastante das elegias modernas.
No século XVI, a elegia transformou-se num dos gêneros poéticos mais cultivados, embora ainda pouco definido. Em Portugal, o primeiro escritor de elegias foi Sá de Miranda, mas Camões foi o principal: da edição de 1595 de suas obras completas, constam quatro elegias, tidas pelas melhores em língua portuguesa. Na França da Renascença, destacou-se no gênero Pierre de Rosnard.
Na poesia inglesa, a elegia apareceu com Astrophel, lamento fúnebre de Edmund Spenser. Durante quase três séculos produziram-se, dentro desse modelo, alguns dos maiores poemas da literatura inglesa, como Lycidas, de Milton (1638), Adonais, de Shelley (1821), sobre a morte de Keats, e muitas outras. Contudo a mais famosa elegia da língua inglesa foi Elegy Written in a Country Church Yard (1751; Elegia escrita num cemitério da aldeia), de Thomas Gray, meditação sobre a morte de gente humilde e anônima e uma das obras capitais do pré-romantismo europeu.
Em outras literaturas, a elegia assumiu características [[pagãs], como as belas e eróticas Römische Elegien (1797; Elegias romanas), de Goethe, obra prima da literatura alemã. No século XX, a obra mais importante do gênero foi sem dúvida Duineser Elegien (1923; Elegias de Duino), do poeta alemão Rainer Maria Rilke. No Brasil, o mais importante autor de elegias foi Fagundes Varela, no século XIX. Destacam-se ainda Cristiano Martins, Vinicius de Moraes, Cecília Meireles (em Solombra) e Dantas Mota, no século XX.
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