sábado, 16 de maio de 2009

Ralf Gunter Rotstein (Poeta da Chuva)

SÉCULO XXI

Tantas correntes! Tantos desvarios!
Tão poucas consciências descontentes
E, em tão imensa multidão, as gentes
Riem de dias cada vez mais frios!

Riem felizes, tiritando os dentes,
Riem felizes, não ouvindo os chios
Que aguardam essas águas concorrentes
Que passam por lugares tão sombrios!

E todos, deslizando, vão em paz,
Cada vez com mais frio e cada vez,
Para aquecer-se, se abraçando mais.

Vão todos: e se sai alguém da terna
Turba, dando braçadas para trás,
Levam-no, sorridentes, pela perna.
G G G G G G G G G G

SINFONIA

Em meio à tempestade, o som de algum trovão
Meus ouvidos alcança e, como a voz de um santo,
O corpo me arrepia e me inunda de encanto
E sublime prazer o pasmo coração.

Faz crescer minha mágoa e, enquanto as gotas vão
Por meus poros entrando, encontra em mim um canto
Que jamais recebeu e nem sonhou ter tanto
Sincero acolhimento ou tal consolação.

A chuva, ao meu redor, é intensa sinfonia
E vejo que não mais do que um novo instrumento
Ao vir-me abençoar ela de mim queria.

Tristezas que somar às que já tenho invento.
Já não sou nada mais: sou nota e melodia;
Sou os santos trovões e os sussurros do vento.
G G G G G G G G G G
Ralf Gunter Rotstein, o Poeta da Chuva, nasceu na cidade do Rio de Janeiro – RJ e mora em Curitiba–PR desde pequeno. Também desde cedo teve interesse crescente pela poesia e passou logo a exercitá-la. Publicou seu primeiro livro, Um Dia de Chuva, em 2008, pelo Instituto Memória. Seu segundo livro, Sonhos Pluviais será publicado em 2009 pelo Projeto Cultural Abrali. Em 2008 tornou-se membro do Centro de Letras do Paraná e associado da Academia Paranaense de Poesia e freqüenta as reuniões de ambos, sendo também membro do Projeto Cultural Abrali.
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Fonte:
Andréa Motta. http://simultaneidades.blogspot.com

Ronald De Carvalho (Caravelas da Poesia)


O MERCADOR DE PRATA, DE OURO E ESMERALDA

Cheira a mar! cheira a mar!
As redes pesadas batem como asas,
As redes úmidas palpitam no crepúsculo.
A praia lisa é uma cintilação de escamas.
Pulam raias negras no ouro da areia molhada,]
O aço das tainhas faísca em mãos de ébano e bronze.]
Músculos, barbatanas, vozes e estrondos, tudo se mistura,
Tudo se mistura no criar da espuma que ferve nas pedras.
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

EPIGRAMA

Enche o teu copo, bebe o teu vinho,
enquanto a taça não cai das tuas mãos...
Há salteadores amáveis pelo teu caminho.
Repara como é doce o teu vizinho,
repara como é suave o olhar do teu vizinho,
e como são longas, discretas, as suas mãos...
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

UMA NOITE EM LOS ANDES

"Naquela noite de Los
Andes eu amei como nunca o Brasil.

De repente,
Um cheiro de Bogari, um cheiro de varanda
carioca balançou no ar...

Vinha não sei de onde o murmúrio de um
córrego tranqüilo,
escorregando como um lagarto pela terra
molhada.

A sombra vestia uma frescura de folhas
úmidas.

Um vagalume grosso correu no mato.
Queimou-se no sereno.

Eu fiquei olhando uma porção de cousas
doces maternais...

Eu fiquei olhando, longo tempo o céu da
noite chilena as quatro estrelas de um
cruzeiro pendurado fora do lugar..."
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

SABEDORIA

Enquanto disputam os doutores gravemente
sobre a natureza
do bem e do mal, do erro e da verdade,
do consciente e do inconsciente;
enquanto disputam os doutores sutilíssimos,
aproveita o momento!

Faze da tua realidade
uma obra de beleza

Só uma vez amadurece,
efêmero imprudente,
o cacho de uvas que o acaso te oferece...
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨


BRASIL
A Fernando Haroldo

Nesta hora de sol puro
palmas paradas
pedras polidas
claridades
faíscas
cintilações

Eu ouço o canto enorme do Brasil!
(...)

Eu ouço todo o Brasil cantando, zumbindo, gritando,
[vociferando!
Redes que se balançam,
sereias que apitam,
usinas que rangem, martelam, arfam, estridulam, ululam e
[roncam,
tubos que explodem,
guindastes que giram,
rodas que batem,
trilhos que trepidam,
rumor de coxilhas e planaltos, campainhas, relinchos, aboiados
[e mugidos,
repiques de sinos, estouros de foguetes, Ouro-Preto, Bahia,
[Congonhas, Sabará,
vaias de Bolsas empinando números como papagaios,
tumulto de ruas que saracoteiam sob arranha-céus,
vozes de todas as raças que a maresia dos portos joga no sertão!

Nesta hora de sol puro eu ouço o Brasil.
Todas as tuas conversas, pátria morena, correm pelo ar...
a conversa dos fazendeiros nos cafezais,
a conversa dos mineiros nas galerias de ouro,
a conversa dos operários nos fornos de aço,
a conversa dos garimpeiros, peneirando as bateias
a conversa dos coronéis nas varandas das roças...

Mas o que eu ouço, antes de tudo, nesta hora de sol puro
palmas paradas
pedras polidas
claridades
brilhos
faíscas
cintilações

é o canto dos teus berços, Brasil, de todos esses teus berços,
[onde dorme, com a boca escorrendo leite,
[moreno, confiante,
o homem de amanhã!
¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨¨

Ronald de Carvalho (16 Maio 1893 – 15 Fevereiro 1935)

Ronald de Carvalho (Rio de Janeiro, 16 de maio de 1893 — Rio de Janeiro, 15 de fevereiro de 1935), foi um poeta e político brasileiro.

Filho do engenheiro naval Artur Augusto de Carvalho e de Alice Paula e Silva Figueiredo de Carvalho, Ronald de Carvalho nasce na cidade do Rio de Janeiro - RJ no dia 16 de maio de 1893.

No ano de 1899 inicia o curso secundário no Colégio Abílio (Rio de Janeiro), formando-se em 1907. No ano seguinte, ingressa no curso de Direito da Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais, formando-se bacharel no ano de 1912. Nessa época já colaborava com a revista A Época e com o jornal "Diário de Notícias", de Rui Barbosa.

Em 1913 vai para Paris estudar Filosofia e Sociologia. Nessa cidade faz sua estréia literária com a publicação da obra "Luz gloriosa", que mostra uma a forte influência de Charles Baudelaire e Paul Verlaine.

No ano de 1914 começa a exercer atividades diplomáticas e estabelece-se em Lisboa - Portugal. Conhece então os membros do grupo modernista desse país e, em 1915, já integrado a esse grupo, participa do lançamento da revista "Orpheu", marco inicial do modernismo português.

De volta ao Brasil, publica, em 1919, a obra "Poemas e Sonetos" que revela um certo contato com a estética parnasiana.

A experiência de fincar o marco inicial modernismo em Portugal parece ter agradado a Ronald de Carvalho, pois em 1922 participa ativamente da SAM (Semana de Arte Moderna), marco inicial do Modernismo no Brasil.

Na noite de 15 de fevereiro, segundo dia da SAM, Ronald de Carvalho causa o maior escândalo ao declamar o poema "Os Sapos", de autoria de Manuel Bandeira. Isso ocorre porque o poema satiriza violentamente a poesia e, sobretudo os poetas parnasianos, que são comparados a sapos coachando.

Depois da sua participação explosiva na SAM, Ronald dá novos rumos sua poesia: ainda em 1922 publica "Epigramas irônicos e sentimentais"; dois anos depois, é vez de "Toda a América". Nesta última obra percebe-se que o poeta está sob forte influência de Walt Whitman, pois seus versos agora são amplos e com ritmo livre.

Em 1924, dirigiu a Seção dos Negócios Políticos e Diplomáticos na Europa. Durante a gestão de Félix Pacheco, esteve no México, como hóspede de honra daquele governo.

Em 1926, foi oficial de gabinete do ministro Otávio Mangabeira. Exerceu cargos diplomáticos de relevância, servindo na Embaixada de Paris, com o embaixador Sousa Dantas, por dois anos, e depois em Haia (Países Baixos).

Foi secretário da Presidência da República, cargo que ocupava quando morreu. Em concurso realizado pelo Diário de Notícias, em 1935, foi eleito Príncipe dos Prosadores Brasileiros, em substituição a Coelho Neto. Colaborou, com destaque, em O Jornal. Casou com Leilah Accioly de Carvalho, com quem teve quatro filhos.

Ronaldo de Carvalho falece a 15 de fevereiro de 1935, no Rio de Janeiro, vítima de um acidente de automóvel, ocorrido em 19 de janeiro

No campo da literatura, além de poesia, Ronald de Carvalho dedicou-se aos ensaios, à crítica literária, e aos estudos de história da literatura.

Obras
Luz Gloriosa (1913)
Pequena História da Literatura Brasileira (1919)
Poemas e Sonetos (1919)
Epigramas Irônicos e Sentimentais (1922... )
Espelho de Ariel (1923), crítica literária
Toda a América (1926)

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/
http://www.mundocultural.com.br/

Mehmet Murat İldan (16 Maio 1965)

(tradução José Feldman)

Dramaturgo e novelista contemporâneo turco, Mehmet Murat Ildan nasceu no dia 16 de maio, em Elazig, na parte Oriental da Turquia. Devido a ocupação do pai dele, continuou os estudos em Ankara. Em 1982, o diploma de escola secundária, obtendo o primeiro lugar no Ankara Private Yenisehir College . Ele passou um ano na Escola Preparatória Inglesa em Ankara (na Universidade Técnica do Oriente Médio - METU). Então em 1983, fez cursos do Departamento de Eletrônica como um estudante de tempo integral em Gaziantep METU Campus.

Em 1988, obteve grau de bacharelado em Economia com "Certificado de Honra" (na METU). No mesmo ano, obteve também uma Bolsa de estudos do Ministério de Educação do Governo turco para mestre e doutores em Economia da União Européia. Em 1989, ele passou 8 meses em um Curso de francês Intensivo, em Vichy, na França. Em 1990, fez cursos na área de finanças como um estudante de tempo integral na Universidade Louis-Pasteur (ULP) na Estrasburgo-França. No mesmo ano, ocupou cursos avançados em inglês durante 6 meses, ao Centro de Cambridge para Idiomas em Cambridge - a Inglaterra.

Ele obteve o grau de Mestre de Artes em Economias da Universidade de Essex, na Inglaterra em 1991. Em 1994, enquanto fazia o doutorado, fez o serviço militar na Turquia. Em 1997, foi premiado como Doutor de grau de Filosofia em Economias pela Universidade de Essex..

CARREIRA LITERÁRIA

A carreira literária dele começara em 1993 com um livro de poesia chamada Bright Candles (Velas Luminosas); foi escrito em inglês na Inglaterra e publicou na Turquia em 1995. Em 1997, um poema deste livro foi publicado na antologia de poesias Georgian Blue Poetry Anthology . Entre os anos 1993 - 1998, não escreveu nada; escreveu apenas alguns artigos políticos num jornal turco. Em 1998, escreveu histórias durante 6 meses. Em 1999, ele abandonou a ocupação de economia. Ele trabalhou como um tradutor no Turkish Daily News somente durante um dia. Do ano 2000 em diante, se dedicou a literatura, tornando-se um escritor profissional.

Publicou 7 peças teatrais e 25 histórias. Os romances " Diário do Antiquário Arago", " Rosas debaixo de Paris " e “As Primeiras Tristezas do Jovem Werther ” e seu livro "Amantes da Ilha de Samos", também foram publicados. Duas de suas peças teatrais , Galileo Galilei & o Diário de Emmanuel Arago, foram aceitos para o repertório do Turkish State National Theatre. Também, a peça "Olhos Mágicos", a "Profecia do Mendigo" e o "Diário de Emmanuel Arago" foram incluídos no repertório no repertório do Istanbul City Theatre. Seis de suas peças foram traduzidas para o inglês por Yurdanur Salman, lingüista famoso em Istanbul. Sua peça "Os Olhos Mágicos" foi publicada na revista literária Absinthe - New European Writing, nos Estados UNidos. O escritor é sócio da "Associação de Dramaturgos" em Istanbul; "Associação de Autores Turcos (AA)" em Ankara; Associação Profissional de Trabalhos Científicos e Literários", em Istanbul; e " International P.E.N, Turkish P.E.N Association" em Istanbul.

PRÊMIOS

Sua peça "Olhos Mágicos" adquiririu o "Melhor Prêmio de Peça Teatral" em Istanbul Kadiköy Municipality National Playwriting Competition, em 2000. A mesma peça ganhou o " Melhor Prêmio de Enredo" em Istanbul Maltepe University 2004 Interuniversity Theatre Competition. Outra peça, "a Profecia do Mendigo", se tornou um finalista em " AQT 2005 Vancouver Canada International Playwriting Competition. Sua história "A Mosca Doméstica" obteve o segundo melhor lugar em Samim Kocagöz National Story Competition. Suas histórias: a Arca de Noé, Ponte Férroviária, Perseguição e Raça Infinita foram consideradas dignas de louvor e publicadas em " ZOKEV Ahmet Naim Çiladir National Story Competition

Trabalhos Publicados

Peças de Teatro
– Ghosts of Forest, 2000
– Sakyamuni, 2000
– Eyes of Magic, 2000
– Galileo Galilei, 2001
– Beggar's Prophecy, 2001.
– Mohandas Karamchand Gandhi, 2002.
– William Shakespeare, 2002.

Outros:
– Antiquary Arago's Diary, 2005 (novela).
– Roses underneath Paris, 2006 (novela).
– Lovers of Samos Island, 2006 (romance)
– The First Sorrows of Young Werther, 2007 (novela).

Fonte:
http://muratildan.webs.com/cv.htm

Julián Gustems (Era uma vez)


Era uma vez uma princesa muito feia.

Era uma vez um príncipe muito formoso.

A princesa era esperta como a fome.

O príncipe era grosseiro como um urso.

Vocês pensaram que o príncipe e a princesa se conheceram e se amaram. Pensaram que uma princesa tão esperta pudesse conquistar um príncipe tão grosseiro. Vocês pensaram, também, que uma bela e difícil história de amor impediu a bela união. Poderão pensar também que os dois estavam feitos um para o outro. Que a beleza do príncipe compensaria a feiúra da princesa. Ou que a feiúra da princesa se refletiria na beleza do príncipe. Também pensaram que o casamento de semelhantes príncipes ia ser o acontecimento do século, e que a imprensa, o rádio, a televisão iriam brigar pela notícia. Porque se comentava que assim seria. Pois não se deu assim. O formoso príncipe, ao que parece, não é tão idiota para unir seu destino a uma princesa tão pouca favorecida. Não que ela, tão esperta, não houvesse pressentido que um marido tão formoso fosse permanecer casado por mais de dois dias.

Que triste destino se a princesa e o príncipe se enamorassem!

Não seria mais normal que a princesa fosse bela e o príncipe feio?

Por que sou um escritor tão afastado da normalidade? Que me custaria fazer feliz um casal de príncipes tão notáveis? Uns dizem que sou vingativo e que não tenho coração. Porém não creio que assim seja. Na verdade, me sobra sinceridade. E sou realis¬ta. E é por isso que tenho deixado que os príncipes andem aos trancos, sem se encontrarem.

Fonte:
Conto extraído do livro Un poco de locura y otros temas, Barcelona, Espanha, 1997, em tradução de Nilto Maciel.
http://www.jornaldepoesia.jor.br/juliangustems1.html

Nilto Maciel (Pode me chamar de anjo mau)



– Vamos, Gabriel, que a assembléia já deve ter começado.

– Sim, vamos logo, Rafael.

E saíram, quase a correr.

No salão, todos se voltaram para a porta principal, ao perceberem a chegada dos retardatários. Os da mesa também reprovaram, com olhos duros, o atraso dos dois congressistas, que sentaram-se nas últimas cadeiras e se puseram a ouvir o orador.

– Estranho! – murmurou Rafael.

– O orador ou o ambiente?

– Tudo. Você não percebeu nada, Gabriel? Para mim entramos pela porta errada, ou estou ficando louco.

O orador se inflamava, a platéia aplaudia, ficava de pé, enquanto Gabriel e Rafael cochichavam, sentados.

– Se isto não for a assembléia dos anjos maus, dou minha cara a bofete – dizia Rafael.

– Que anjos maus, que nada! Vamos ouvir a fala do orador.

Rafael irritava-se cada vez mais e só faltava gritar. Haviam sido enganados, sim senhor, ludibriados.

– Cala a boca – aconselhava Gabriel.

– Como calar a boca, seu idiota? Não vê a cara de todos, os gestos, as feições dessa gente? Ou está cego? Repare bem: são anjos maus. Sim, são diabos. Não tenho a menor dúvida.

– Que importam as feições, os gestos, as aparências, meu caro Rafael?

– Você se esquece de que o Belo independe dos nossos sentidos. Se analisarmos a fundo uma forma que à primeira vista nos parece bela ou feia, veremos quão débeis somos, quão pobre é nossa percepção. Seremos capazes então de encontrar a Verdade e descobrir o Belo naquilo que nos pareceu Feio, e vice-versa.

– Então está a concordar comigo: esses anjos são maus para você, que os vê apenas pelos sentidos, superficialmente...

Rafael sorriu, deu uma palmadinha na coxa do companheiro.

– Eu já esperava por essa conclusão sua. Porém cabe a mim mesmo concluir meu pensamento. Antes, quero dar meus parabéns a você. Muito inteligente! Seu raciocínio está corretíssimo.

Gabriel franziu a testa e olhou espantado para seu interlocutor.

– Dá-se que você inverteu tudo. Quem está se deixando levar pelas aparências não sou eu. Você ainda os vê como anjos bons porque não tem senso crítico ou se contaminou da primeira impressão ou da “certeza” trazida de casa de que estávamos entre anjos bons.

Entusiasmado com as próprias palavras, Rafael gesticulava, elevava o tom da voz, como se fosse ele quem devesse ser ouvido pela platéia. E já quase todos os congressistas se mostravam irritados, a reclamar, pedir silêncio. O próprio presidente da mesa interrompeu o orador e quis saber o que ocorria.

Rafael levantou-se e, cheio de gestos, pôs-se a bradar:

– Fomos enganados, vocês nos ludibriaram.

– Queira explicar-se, companheiro – pediu o presidente.

– Pois digo que caímos na arapuca e estamos entre os malditos anjos maus.

A platéia toda se agitou, aos gritos, apupos, vaias.

O presidente pediu calma. Desejava explicar aos presentes e especialmente aos retardatários um mal-entendido.

– Todos sabem, exceção talvez desses dois jovens, da realização deste congresso de anjos maus, como diz a propaganda oficial. Mas quem somos e o que fazemos? Somos aqueles que durante séculos e séculos vimos combatendo os tais anjos bons, os chamados anjos da guarda ou anjos custódios. Combatemos esses lobos vestidos de cordeiros e, até a sua total destruição, nossa luta permanecerá. Sim, temos garras em vez de mãos e braços fortes em vez de asinhas. Inventamos e usamos armas as mais terríveis. Porque a necessidade da guerra impôs-nos essa fisionomia e esse modo de agir. Somos os derrubadores de impérios e, por isso, anjos maus. E eles, os anjos bons, os de asinhas e rostos infantis, o que são? Andorinhas a voar no espaço da metafísica e aves de rapina que bicam e matam às escondidas seus semelhantes.

Rafael, caído na cadeira, espumava de ódio e viam-se as garras por detrás de suas asas apontadas para o pescoço de Gabriel, que aplaudia o presidente, cheio de sorrisos.

– Na essência, Rafael, não nos enganamos. Pode me chamar de anjo mau.

Fontes
http://www.jornaldepoesia.jor.br/nilto6.html
Imagem = http://acertodecontas.blog.br/

Eunice Arruda (Divagações ao Sabor das Ondas)


PROPÓSITO

Viver pouco mas
viver muito
Ser todo o pensamento
Toda a esperança
Toda a alegria
ou angústia — mas ser

Nunca morrer
enquanto viver
G G G G G G G G G G

OUTRA DÚVIDA

Não sei se é
amor

ou

minha vida que pede
socorro

De Invenções do Desespero (1973)
G G G G G G G G G G

ERRO

Edifiquei minha
casa sobre a
areia

Todo dia recomeço

De As Pessoas, As Palavras (1976)
G G G G G G G G G G

OBSERVANDO

sim

as horas de trégua

Quando se afiam
as facas
G G G G G G G G G G

UM DIA

um dia eu
morrerei
de sol, de
vida acumulada
na convulsão
das ruas

um dia eu
morrerei e
não
podia:

há poemas
escorregando de meus dedos
e um vinho não
provado

De Os Momentos (1981)
G G G G G G G G G G

DEUS E O DOMINGO

Eu ia ser feliz
domingo
naquele tempo bastava pouco
Não sabia que no
domingo
é fácil chover
e muito difícil viver
Ah, eu ia ser feliz
Mas
domingo Deus descansa
e a gente sofre mais

De O Chão Batido (1963)
G G G G G G G G G G

ENGANO

afinal
construímos prédios
casas jardins rosas
desabrocharam
trêmulas, afinal fomos
submissos às ocupações do dia
às estações do ano
à rotação da terra

Pensávamos ser esta a nossa pátria
G G G G G G G G G G

RISCO

Um poema livre
da gramática, do som
das palavras
livre
de traços

Um poema irmão
de outros poemas
que bebem a correnteza
e brilham
pedras ao sol

Um poema
sem o gosto
de minha boca
livre da marca
de dentes em seu dorso
Um poema nascido
nas esquinas nos muros
com palavras pobres
com palavras podres
e
que de tão livre

traga em si a decisão
de ser escrito ou não

De Risco (1998)
G G G G G G G G G G

GEOGRAFIA

estar em
algum lugar

sempre

deixar o
corpo
posto
em algum lugar

porto
onde voltar

(do livro “OS MOMENTOS” – l981)
G G G G G G G G G G

TRANSFORMAÇÃO

Anjo
dá guarda

Eu estou atravessando

Também me empresta
de tuas asas
o vôo

Que eu chegue a nenhum lugar
G G G G G G G G G G

TAREFA

cabe agora
morrer o corpo

dia a
dia ir

me desacostumando
do rosto
que eu chamava
meu

(do livro “RISCO” – 1988)
G G G G G G G G G G

SACIEDADE BIOGRÁFICA

Tenho andado sem pés
voado sem asas
Sou um sonho espalhado

Os rios recebem minhas cartas
com freqüência
facas me apontam o coração

O que poderia dizer
(os pássaros já cantaram)
o que poderia amar
(os amantes se suicidaram)

Os assassinos conhecem o meu nome

(do livro “RISCO” – l988)
G G G G G G G G G G

NOTÍCIAS

As crianças morrem

Em piscinas
lagoas
no centro da cidade
O corte na testa
barrigas inchadas
costas afundadas

As crianças
elas também nos abandonam

(do livro “MUDANÇA DE LUA” – l986)
G G G G G G G G G G

UM VISITANTE

Quem escreve
é
um visitante

Chega nas horas da noite
e toma o lugar do
sono
Chega à mesa do almoço
come a minha fome

Escreve
o que eu nem supunha
Assina o meu nome

(Mudança de lua, 1986)
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Fontes
– Carlos Machado. Poesia.net – numero 172 ano 4 – São Paulo, 19 julho 2006. Disponível em http://www.algumapoesia.com.br/poesia2/poesianet172.htm
– Jornal de Poesia. http://www.jornaldepoesia.jor.br/ea.html
– Blog da Eunice Arruda. http://poetaeunicearruda.blogspot.com/

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Trova I

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Fontes:
XAVIER, Francisco Cândido. Humorismo no Além.
Montagem em cima da imagem da http://picasaweb.google.com/

August Strindberg (O Sonho)



Drama

Em abril de 1907, O Sonho foi encenado pela primeira vez.

A peça começou a ser escrita no outono de 1901, quando Strindberg casou-se com Harried Bosse. Pouco tempo depois Harried o abandonou, levando consigo o sonho da felicidade matrimonial. Sofrendo sozinho por quarenta dias, Strindberg concluiu que a vida é uma ilusão na qual se é incapaz de realizar os sonhos. A peça foi concluída no final desse mesmo ano.

O título, A Dream Play, traduzido como O Sonho também pode ser entendido como “Uma Peça de Sonho” ou “Uma peça que sonhei”, isto é, o drama que o autor idealizou. Strindberg, inclusive, refere-se à obra como “minha peça mais querida, filha de minha melhor dor”.

O tema inicial da peça girava em torno da história de um homem que esperava por sua noiva num teatro. A espera era em vão, pois ela nunca chegaria. O foco, porém, passou para o que antes era apenas um “sub-enredo”: a personagem principal agora era a filha de Indra, que veio à terra para compartilhar as agonias da existência humana.

O Sonho é talvez o primeiro drama a conter o universo onírico como realidade, como gênero em si. Peças tradicionais já haviam incorporado cenas ilustrando sonhos ou pesadelos, mas nenhuma se baseou inteiramente nisso. Deste modo, Strindberg abandonou a percepção convencional de tempo e espaço. Segundo suas próprias palavras, “o autor atentou para a figura inconseqüente do sonho. Tudo pode acontecer, tudo é possível e provável. Tempo e lugar não existem; numa base insignificante de realidade, a imaginação gira, modelando novos padrões; há a mistura de memórias, experiências, livres fantasias, incongrutitudes e improvisações. As personagens se duplicam, se multiplicam, se separam, evaporam, condensam, dispersam, reúnem. Mas uma percepção governa sobre todas elas : para o sonhador não há segredos, escrúpulos, leis. O sonho não absolve ou justifica condenações, somente as relata. Tal como no sonho é mais freqüente o sofrimento que a felicidade, esse conto bruxuleante é acompanhado de uma dose de melancolia e compaixão por todos os seres humanos.” À frente de seu tempo, Strindberg baseava-se em filosofias orientais para justificar sua crença de que o mundo é apenas ilusão.

Estreando “O sonho” no teatro, o autor fez algumas anotações em seu diário. De acordo com elas, “o amor é um pecado e sua dor é o melhor inferno que existe. Se o mundo existe, existe através do pecado (do amor, das relações carnais, de Maya), e por isso é apenas um sonho, uma ilusão. Assim se justifica a minha peça do sonho (“my dream play”) ser uma fotografia da vida. Esse mundo, o sonho, é um fantasma cuja destruição é a missão dos ascetas (aqueles que negaram a carne e vivem do espírito). Mas tal missão entra em conflito com o instinto do amor, que oscila entre a sensualidade e o sofrimento trazido pelo remorso (a culpa cristã que também se instalou nos ascetas). Isso me parece a resposta para o enigma da vida... Todo dia eu leio o Budismo.”.

Fonte:
http://www.opalco.com.br

August Strindberg (22 Janeiro 1849 – 14 Maio 1912)


Johan August Strindberg (22 de janeiro de 1849 - 14 de maio de 1912), pintor, escritor e dramaturgo sueco, é autor, entre outros, de O Pelicano. Figura ao lado de Henrik Ibsen, Søren Kierkegaard e Hans Christian Andersen como o maior escritor escandinavo. É um dos pais do teatro moderno. Seus trabalhos são classificados como pertencentes os movimentos literários Naturalismo e Expressionismo.

August Strindberg nasceu em Estocolmo, em 22 de janeiro de 1849, terceiro filho do mercador Carl Strindberg e sua ex-empregada doméstica, Ulrika Norling. Sua infância foi pobre e sua mãe morreu quando ele tinha treze anos. Era um garoto sensível e, ao mesmo tempo rebelde, nunca tendo se ajustado nas escolas que frequentou.

Frequentou a Universidade de Uppsala. Estudou na Universidade de Uppsala, de onde saiu após um semestre. Nessa época, acometido de uma forte depressão, decidiu matar-se em seu pequeno apartamento ingerindo uma pílula de ópio. Não morreu e acordou numa profusão de memórias infantis, de onde obteve em apenas algumas horas sua primeira peça. Foi nomeado em 1874 bibliotecário da Real Biblioteca de Estocolmo o que lhe permitiu assegurar o seu futuro econômico e tentou a vida também como jornalista.

As suas primeiras peças teatrais denotam influências de Ibsen e Kierkegaard e aí transparece uma personalidade amarga e torturada: O Livre Pensador (1869), Hermion (1869), O Mestre Olof (1872), A Viagem de Pedro Afortunado (1882) e A Mulher do Cavaleiro Bent (1882). Sua primeira peça importante, Mestre Olof, de 1872, é um drama sobre a revolta contra as convenções sociais e todos os tipos de poder.

O Quarto Vermelho (1879), uma novela, foi sua estréia no mundo literário, como o primeiro romance naturalista da literatura sueca, com a ajuda de sua primeira esposa, com quem se casou em 1877, a Baronesa Siri von Essen, que estava grávida de sete meses. Este filho, porém, não vingou, mas o casal teve mais três filhos: Karin, Greta e o menino Hans.

As alucinações, visões e neuroses que tem no decorrer da vida não prejudicam sua criatividade, mas dificultam seus relacionamentos.

Casa-se e divorcia-se três vezes. O fracasso do seu primeiro matrimônio com Siri von Essen (1877-1891) deu à sua obra um tom misógino, que está patente, em especial nos contos de Esposos (1884). Revela rancor contra as mulheres em várias peças, especialmente em O Pai (1887), Camaradas (1897) e Senhorita Júlia (1899).

Em 1886, Strindberg termina sua novela biográfica, O Filho de um Empregado (The Son of a Servant). Nessa época, Strindberg escreveu "Miss Julie", enquanto vivia na Dinamarca. Essa peça foi encenada em 1889, com sua esposa no papel principal, o que "coincidentemente" acabou com o casamento dos dois após 12 anos de convivência. Escreveu também "Em Defesa de um Louco", em que descreve seu primeiro casamento.

Strindberg muda-se para a Europa Central, vivendo em diversas cidades, convivendo com seus amigos Edvard Munch e Gaughin e acabando por conhecer Frieda Uhl, uma jovem austríaca com quem veio a se casar e divorciar em apenas um ano.

Começa, então, seu período chamado Inferno, em que se interessa por ocultismo e alquimia e lê o filósofo Swedenborg. Nesse período escreve as novelas "Inferno" e "Lendas". O Inferno não dura muito e Strindberg volta para a Suécia em 1897 onde termina, em 1898, a peça "Para Damasco", precursora do teatro expressionista, que influencia inúmeros dramaturgos alemães. Nessa época, iniciou um diário, o "Diário Oculto", que manteve até 1908 e é uma das melhores fontes para se entender o autor e seu trabalho.

No Diário, ele descreve sua relação com sua terceira esposa, Harried Bosse, com quem teve um filho, descasou-se e tornou-se seu amante. Desse divórcio resultou, em parte, sua obra prima expressionista: a peça "O Sonho" (A Dream Play), escrita em 1901.

Finalmente, livrou-se de Bosse e de seu diário oculto e mudou-se para um apartamento onde teve um período muito produtivo, do ponto de vista artístico, tendo escrito as peças "Páscoa" e "A Dança da Morte", esta última uma obra primas do simbolismo.

Morreu de câncer em Maio de 1912 e em seu túmulo há a singela expressão latina O CRUX AVE SPES UNICA (Salve Ó Cruz, Nossa única Esperança)

Fontes
http://www.algosobre.com.br/
http://pt.wikipedia.org/
http://www.opalco.com.br/