domingo, 29 de setembro de 2024

Jaqueline Machado (“Nascimento e morte da dona de casa”, de Paola Masino)

 
“Nascimento e morte da dona de casa” é um livro do século XX, escrito pela escritora italiana Paola Masino. 

Conta a história de uma menina que não se encaixava em seu ambiente familiar. A menina estava sempre empoeirada. E a mãe fazia chantagem emocional dizendo-lhe que ia morrer de desgosto. E a criança, sentindo-se culpada, procurava encontrar nos jornais, casos de gente, que por ventura, teria morrido de desgosto. Não queria ser a causadora da morte da própria mãe, mas não encontrou nenhum caso parecido.

Deitada num armário que tinha função de cristaleira, cama, mesa e quarto cheio de retalhos, farelos de pão, livros e detritos de funerais, como flores, pregos, véus de viúvas, pó que caía do teto...  Cobria-se com um cobertor mofado, ligava a lâmpada, lia, ou ficava a refletir sobre assuntos de morte.

Ela era diferente, tinha um estilo meio gótico e filosófico de ser. E por este motivo, era negligenciada pela mãe, que não lhe dava carinho. 

Tinha um sonho recorrente, em que teias de aranha ao redor e sobre ela a enredavam como se ela fosse a presa de uma aranha. Depois dormia encolhida e trêmula. Mas gostava de ficar dentro do baú. Ali, a menina podia ser ela mesma.

Com a cozinheira, ia ao supermercado, mas não prestava atenção nas prateleiras. Olhava para o chão, para os saltos das mulheres pisando nas frutas estragadas. E pensava nas antigas dinastias que ainda viviam ali embaixo.             

Observava os ventres dos bois pendurados em ganchos de ferro nas vigas dos açougues, com seus órgãos esvaziados, cravados nos metais que foram arrancados do ventre da terra. Ela via a violência do ser humano até no modo de alimentação.

A garota era uma filósofa nata, e devaneava sobre a natureza e a morte. - O céu e a terra também vivem e morrem. - Pensou na primeira vez que viu o próprio sangue (menstruação). Era um momento vermelho e dolorido. E o comparou ao pôr do sol, que também era vermelho e devia ser sofrido a cada encerramento de dia.

O tempo passou. E ela vendo o incessante desgosto da mãe, resolveu mudar, tomar banho, se vestir melhor, se comportar igual as outras jovens de sua idade, arranjar um noivo e casar. A mãe, feliz, foi em busca de pretendentes. Mas, por ser muito exótica, ninguém queria casar com ela. Até que alguém aceitou. E ela se tornou uma dona de casa. E em seu lar, seguindo todas as normas exigidas pela sociedade, viveu e morreu sem poder ser quem ela de fato era. 
Fonte: Texto enviado pela autora

Recordando Velhas Canções (Asa branca)


(toada, 1947) 

Compositor: Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga

Quando olhei a terra ardendo
Qual fogueira de São João
Eu perguntei a Deus do céu: Ai
Por que tamanha judiação?

Que braseiro, que fornalha
Nem um pé de plantação
Por falta d'água, perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão
Por falta d'água, perdi meu gado
Morreu de sede meu alazão

Inté mesmo a asa branca
Bateu asas do sertão
Entonce eu disse: Adeus, Rosinha
Guarda contigo meu coração
Entonce eu disse: Adeus, Rosinha
Guarda contigo meu coração

Hoje longe, muitas légua
Numa triste solidão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim voltar pro meu sertão
Espero a chuva cair de novo
Pra mim voltar pro meu sertão

Quando o verde dos teus óios
Se espalhá na prantação
Eu te asseguro, não chore não, viu?
Que eu voltarei, viu, meu coração?
Eu te asseguro, não chore não, viu?
Que eu voltarei, viu, meu coração?
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 
Asa Branca: Um Hino de Esperança e Saudade do Sertão
A música 'Asa Branca', composta por Luiz Gonzaga, o 'Rei do Baião', e seu parceiro Humberto Teixeira, é uma das mais emblemáticas canções da música brasileira, retratando a dura realidade do sertanejo diante da seca no Nordeste. A letra descreve a terra ardente, comparada a uma fogueira de São João, uma festa tradicional nordestina, e questiona a razão de tanto sofrimento. A imagem da terra queimada e a perda do gado e do alazão, por falta de água, são representações poderosas da devastação causada pela seca.

A 'asa branca' mencionada no título é uma referência à ave que migra quando o sertão se torna inóspito, simbolizando o próprio sertanejo que se vê forçado a deixar sua terra natal em busca de melhores condições de vida. A despedida de Rosinha, que pode ser interpretada como uma pessoa amada ou a própria terra, carrega um tom de promessa e esperança de retorno. A solidão do migrante é palpável, e a espera pela chuva é a espera pelo momento de voltar ao lar.

A canção transcende a narrativa de uma pessoa específica e se torna um símbolo da resiliência do povo nordestino. A esperança de dias melhores, quando o verde voltará a cobrir o sertão e os olhos de quem espera não precisarão mais chorar, é um tema universal de perseverança e fé no futuro. 'Asa Branca' é mais do que uma música, é um hino que expressa a saudade de casa e a força de um povo que não desiste diante das adversidades.

Um tema folclórico muito antigo é a origem da toada "Asa Branca" (espécie de pomba brava que foge do sertão ao pressentir sinais de seca). Luiz Gonzaga o conhecia desde a infância, através da sanfona do pai, mas achava-o simples demais para transformá-lo numa canção.

Assim, foi só para atender ao pedido de uma comadre que se dispôs a gravá-lo, levando-o antes para Humberto Teixeira dar-lhe uma "ajeitada" na letra. Então, Teixeira ajeitou-lhe também a melodia, acrescentou-lhe versos inspirados ("Quando o verde dos teus óios se espaiá na prantação") e tornou "Asa Branca" uma obra-prima.

Reconhecida e gravada internacionalmente, a canção inspirou nos anos setenta a retomada da música nordestina, em geral, e o culto a Luiz Gonzaga, em particular, por iniciativa dos baianos Caetano e Gil. Sua construção, possibilitando boas oportunidades de explorações harmônicas, tem-lhe proporcionado o aproveitamento como peça de concerto.

Fontes: 
https://www.letras.mus.br/luiz-gonzaga/47081/
– Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello. A Canção no Tempo. Vol. 1. Editora 34, 1997.

sábado, 28 de setembro de 2024

Ademar Macedo (Ramalhete de Trovas) 26

 

Julimar Andrade Vieira (Trovas em Preto &Branco)


1
A inteligência encerra
tudo quanto a força faz…
Da força resulta a guerra;
da inteligência, a paz.
2
À sombra do anonimato
somente os covardes agem.
Nunca, um cidadão sensato.
Nunca, um homem de coragem.
3
Cumpre bem a sua norma
em prol da sociedade
o jornalista que informa
sem distorcer a verdade.
4
De grandeza, desconfio
ser este o sonho da fonte:
ser, um dia, um grande rio,
todo coberto de ponte.
5
Dura, suada e sofrida
quase sempre é a trajetória
de quem consegue, na vida,
a tão sonhada vitória.
6
É na surdina, eu suponho,
juntinho à mulher querida,
que a vida se torna sonho
e o sonho se torna vida.
7
Há muito cego sabido
que nada de cego tem.
Se o vento sobe um vestido,
como o ceguinho vê bem!
8
Minha mãe, analfabeta,
sozinha aprendeu a ler,
mas fez seu filho, poeta,
muitas lições aprender.
9
Nada expressa mais tristeza,
nem há vida mais tristonha,
que a de quem sofre a pobreza,
sem realizar o que sonha…
10
Nem sempre faço o que penso,
para evitar embaraço,
mas, por questão de bom senso,
penso sempre no que faço.
11
O rancor não engrandece
o passado de ninguém.
A gente prospera e cresce
amando e fazendo o bem.
12
Quem muito a si mesmo cobra
ou de si mesmo é juiz,
no pouco tempo que sobra
não dá para ser feliz.

AS TROVAS UMA A UMA

As trovas de Julimar apresentam uma ampla variedade de temáticas, reflexões e conceitos, que envolvem desde questões sociais e comportamentais até aspectos da vida cotidiana. A seguir, uma análise aprofundada de cada uma das doze trovas apresentadas.

Trova 1. A inteligência encerra
Aqui, Julimar opõe a força à inteligência, destacando que a guerra (que resulta da força) é intrinsecamente negativa, enquanto a paz, oriunda da inteligência, é desejável. Essa dualidade sugere uma crítica à luta pela dominação e promove a valorização do raciocínio e do diálogo como meios de resolução de conflitos. A mensagem é clara: a sabedoria deve prevalecer sobre a brutalidade.

Trova 2. À sombra do anonimato
Esta trova explora a coragem e a covardia. Julimar sugere que a verdadeira coragem é visível e não se esconde no anonimato; covardes agem nas sombras, como forma de evitar a responsabilização. Ele preconiza que cidadãos sensatos e corajosos não têm medo da exposição e da luta por suas convicções, promovendo a ideia de integridade e a necessidade de assumir posições.

Trova 3. Cumpre bem a sua norma
Aqui, o trovador enaltece a função do jornalista, enfatizando a importância da verdade na informação. Isso pode ser visto como uma crítica à manipulação e à desinformação, que muitas vezes dominam a mídia. Valoriza a ética no jornalismo, reconhecendo que a veracidade é um pilar fundamental para a construção de uma sociedade justa.

Trova 4. De grandeza, desconfio
Nesta trova, há uma reflexão sobre ambição e as suas consequências. Julimar sugere que a busca por grandeza muitas vezes é superficial e está ligada a uma necessidade de validação externa. O uso da metáfora do "grande rio" coberto de pontes pode ser interpretado como uma crítica à busca por reconhecimento material em detrimento de valores que realmente importam.

Trova 5. Dura, suada e sofrida
Julimar aborda a luta pela conquista das vitórias na vida, reconhecendo que o sucesso muitas vezes vem acompanhado de sacrifícios e dificuldades. A ideia de que a trajetória é "quase sempre" desafiadora reforça a realidade de que o caminho para a realização é repleto de obstáculos, mas também é uma mensagem motivadora sobre a resiliência e a recompensa do esforço.

Trova 6. É na surdina, eu suponho
Com esta trova, o autor explora a conexão íntima entre amor e felicidade. A ideia de que a vida se torna um sonho na companhia da pessoa amada sugere que os relacionamentos significativos são essenciais para uma vida plena. Essa visão transcende a materialidade e sugere que a verdadeira realização se encontra nas pequenas coisas e na simplicidade.

Trova 7. Há muito cego sabido
O poeta utiliza um jogo de palavras para questionar a percepção do conhecimento e da sabedoria. A figura do "cego sabido" reflete a hipocrisia de quem se julga informado, mas na realidade não possui uma visão completa da vida. A observação do vento levantando um vestido sugere que, mesmo aqueles que se fazem de cegos, observam o que ocorre ao redor conforme o seu interesse.

Trova 8. Minha mãe, analfabeta
Nesta trova, há uma homenagem à figura materna, ressaltando a importância da aprendizagem e do exemplo. O fato de a mãe ter aprendido a ler por si mesma, embora analfabeta, ilustra o poder da auto-didática e a força da educação, que transcende a mera habilidade de ler e escrever, influenciando a formação do filho em um poeta.

Trova 9. Nada expressa mais tristeza
Julimar reflete sobre a pobreza e a frustração dos sonhos não realizados. O tom melancólico ressalta como a falta de recursos pode limitar a realização pessoal e causar sofrimento. A lamentação pela pobreza é um chamado à empatia, confrontando uma realidade social dura e muitas vezes invisível.

Trova 10. Nem sempre faço o que penso
Esse verso remete à consciência moral e ao pragmatismo que muitas vezes se fazem necessários nas interações sociais. A busca por evitar embaraços sugere uma pessoa que pondera suas ações, reconhecendo que o pensamento deve ser balanceado com as consequências das ações. O trovador defende a importância do equilíbrio entre reflexão e ação.

Trova 11. O rancor não engrandece
Enfatiza a ideia de que o ressentimento não traz benefícios. O crescimento pessoal é associado ao amor e às boas ações, chamando atenção para a necessidade de se libertar de emoções negativas para prosperar. É um convite à generosidade e à compreensão como formas de se transcender a dor do passado.

Trova 12. Quem muito a si mesmo cobra
A última trova toca na questão da auto-cobrança e da busca incessante por padrões pessoais. Julimar sugere que a autocrítica exacerbada pode gerar infelicidade, fazendo um apelo ao equilíbrio e à aceitação. A felicidade, nesta perspectiva, não está nas expectativas, mas na capacidade de aproveitar o momento presente.

TEMÁTICA DAS TROVAS DE JULIMAR E SUA RELAÇÃO COM POETAS BRASILEIROS E ESTRANGEIROS

As trovas de Julimar, abordam temas como amor, saudade, natureza e a efemeridade da vida. Comparemos a temática de suas trovas com poetas brasileiros e estrangeiros que também exploram esses temas.

1. Amor
Muitas dessas trovas falam sobre o amor de forma suave e nostálgica, ressaltando a beleza e a dor que ele pode causar. O amor, para Julimar, não é apenas um ideal romântico; é uma experiência humana repleta de desafios e superações. Além disso, ele também aborda o amor sob a perspectiva da tradição e da cultura popular. Suas trovas muitas vezes dialogam com elementos do folclore, mostrando como as manifestações históricas e culturais influenciam a percepção do amor. Ele pode fazer referências a amores impossíveis, a rivalidades e ao papel do amor na vida comunitária, revelando a interconexão entre o amor individual e a coletividade. 

Outro ponto importante nas trovas de Julimar é a maneira como ele traz à tona a vulnerabilidade humana. O amor, em suas palavras, é um território onde a fragilidade está sempre presente, e a saudade e a tristeza são parte do processo de amar e ser amado. Essa visão mais realista e menos idealizada do amor permite que suas trovas se tornem um espaço de identificação e empatia para aqueles que passam por experiências semelhantes.

As imagens poéticas que Julimar utiliza são ricas e evocativas, capazes de despertar sentimentos profundos no leitor. Ele frequentemente evoca a natureza, as estações do ano e elementos do cotidiano para simbolizar diferentes aspectos do amor, criando uma atmosfera que é ao mesmo tempo nostálgica e esperançosa.

Em suma, o amor abordado nas trovas de Julimar é multifacetado, explorando tanto a sua beleza quanto a sua dor. Ao fazê-lo, ele capta a essência da experiência humana, tornando suas obras atemporais e universalmente ressonantes. As trovas servem não apenas como uma celebração do amor, mas também como um convite à reflexão sobre as muitas formas que esse sentimento pode assumir ao longo da vida.

Vinícius de Moraes: Em poemas como "Soneto de Separação", Vinícius aborda a intensidade do amor e a tristeza da perda. Assim como nas trovas acima, há uma melancolia que permeia a lembrança de momentos felizes, criando um diálogo entre o amor vivido e o amor perdido.

Pablo Neruda: Em "Soneto XVII", expressa uma paixão ardente e visceral, que se entrelaça com o amor idealizado. Ambas as vozes poéticas, a de Neruda e a de Julimar, transmitem a dualidade do amor - sua beleza e suas dores.

2. Saudade
A saudade é um tema constante, refletindo o apego a momentos e pessoas que passaram. Julimar fala sobre sentimentos profundos e cheios de nuances, especialmente a saudade, que é uma emoção muito presente na cultura brasileira. A saudade é frequentemente descrita como uma mistura de sentimentos de perda, nostalgia e amor. Em suas trovas, provavelmente explora esses temas de uma maneira que ressoa com a experiência humana, fazendo uma conexão com o passado e as memórias associadas a pessoas, lugares ou momentos.

A saudade nas trovas de Julimar pode ser abordada em diferentes dimensões. Primeiramente, pode refletir a dor da ausência de alguém querido, onde as lembranças ganham vida em cada verso, evocados por sensações olfativas, sonoras ou visuais que trazem à tona momentos significativos. Além disso, as trovas podem capturar a beleza da saudade, mostrando como esse sentimento, embora muitas vezes doloroso, também pode ser uma homenagem àquilo que foi especial.

Outro aspecto importante da saudade nas trovas de Julimar pode ser a forma como ele a relaciona com o cotidiano, utilizando elementos da cultura popular, tradições e vivências que conectam ouvintes de diferentes regiões do Brasil. Essa habilidade de tecer a saudade com o tecido cultural local pode provocar uma identificação nas pessoas que ouvem suas músicas, tornando a experiência ainda mais universal e visceral.

Por fim, as trovas dele podem ter um tom esperançoso ou de aceitação, onde a saudade não é apenas um lamento, mas uma celebração das memórias vividas. Em vez de se concentrar apenas na perda, ele pode enfatizar a importância de valorizar os momentos que foram importantes, transformando a saudade em algo que, embora melancólico, também é reconfortante.

A saudade nas trovas é uma expressão multifacetada que aborda a complexidade das emoções humanas, interligando memória, amor e a vivência cultural de forma profunda e tocante.

Cazuza: Em suas canções fala sobre a intensidade da saudade e a dificuldade de lidar com a perda. A relação entre suas letras e as trovas é clara: ambos expressam sentimentos profundos de saudade que ressoam na memória.

Emily Dickinson: Em muitos de seus poemas, Dickinson explora a ideia da saudade e da perda. A maneira como ela captura a essência da ausência e a busca pela conexão é similar à profundidade emocional que encontramos nas trovas de Julimar.

3. Natureza
Frequentemente incorpora a natureza em seus versos, refletindo a rica biodiversidade e a cultura do Brasil. As trovas de Julimar costumam capturar a beleza do meio ambiente, ressaltando elementos como flora, fauna, paisagens e fenômenos naturais.

Elementos da Natureza nas Trovas de Julimar

1. Representação da Flora: As plantas, árvores e flores são frequentemente mencionadas nas trovas, simbolizando não apenas a beleza estética, mas também atitudes de cuidado e reverência. O uso de imagens como “as flores do campo” ou “as folhas a dançar ao vento” pode evocar sentimentos de alegria e plenitude.

2. Inspiração na Fauna: Os animais também têm grande presença nas trovas. Ao descrever pássaros, mamíferos ou até insetos, muitas vezes traz lições de vida ou reflexões sobre a liberdade e a interação entre os seres vivos. As metáforas que utilizam animais muitas vezes destacam características subtis, refletindo sobre a condição humana.

3. Ciclos Naturais: As menções a estações do ano, o ciclo da chuva, e a passagem do tempo são comuns. Esses elementos enfatizam a impermanência e a continuidade da vida, servindo como uma alegoria para as experiências humanas. A observação da natureza pode induzir a pensamentos mais profundos sobre o lugar do ser humano no mundo.

4. Cenário Local: Muitas trovas refletem o cenário regional, enfatizando características geográficas que falam à identidade cultural. Seja uma praia, um vale ou uma montanha, as descrições muitas vezes conectam o leitor ao seu próprio espaço, criando um vínculo emocional com a terra.

5. Simbolismo e Metáforas: A natureza em Julimar não é apenas uma descrição, mas um veículo de simbolismo. Elementos naturais são usados como metáforas para sentimentos humanos — a tempestade pode representar conflitos internos, enquanto um rio calmo pode estar associado à paz e serenidade.

6. Conexão com a Espiritualidade: Muitas vezes, a natureza é abordada como um reflexo da espiritualidade. A relação do homem com a terra, os elementos e as forças da natureza pode significar um diálogo com o divino, um reconhecimento da interdependência entre todos os seres.

As trovas de Julimar, ao explorar a natureza, se tornam mais do que simples observações; elas são uma reflexão da experiência humana e uma celebração da vida em todas as suas formas. Ao entrelaçar temas de natureza com emoção e experiência vivida, suas trovas continuam a ressoar com os leitores, convidando-os a apreciar e refletir sobre o mundo natural ao seu redor. Assim, a natureza nas trovas se torna um espaço de inspiração, introspecção e uma ponte para a compreensão mais profunda da vida e do lugar do ser humano nela.

Manuel Bandeira: é conhecido por sua relação íntima com a natureza, especialmente em poemas que falam dos ciclos da vida e da morte, como em "Vou-me embora pra Pasárgada". A conexão com a natureza nas trovas de Julimar ressoa com a busca pela beleza e pelo significado na obra de Bandeira.

William Wordsworth: é um dos principais poetas do romantismo, que exalta a natureza como uma fonte de inspiração e contemplação. Assim como Julimar, ele encontra na natureza um reflexo das emoções humanas e uma forma de conexão com o transcendente.

4. Efemeridade da Vida
As trovas de Julimar, reconhecido por sua habilidade em explorar a natureza efêmera da vida, abordam a transitoriedade das experiências humanas com uma profundidade poética. Essa temática é frequentemente refletida em sua escrita através da utilização de metáforas, simbolismos e um tom melancólico que captura a fragilidade da existência.

Um dos aspectos centrais dessa efemeridade é a inevitabilidade da passagem do tempo. Julimar frequentemente utiliza imagens da natureza, como flores que murcham ou a luz do sol que se põe, para ilustrar a beleza passageira da vida. Essas imagens evocam um sentimento de nostalgia, convidando o leitor a refletir sobre momentos que foram preciosos, mas que já não existem mais. Ele nos lembra que, assim como as flores, as experiências e os momentos significativos também têm seu tempo limitado.

Além disso, a efemeridade em suas trovas pode ser vista como um convite à apreciação do presente. Em meio à angústia da transitoriedade, há um apelo para que se valorize cada instante vivido. Isso cria um paradoxo: a consciência da brevidade da vida pode levar a uma maior valorização das emoções e das relações humanas. As trovas frequentemente enfatizam a importância de amar e estar presente, mesmo diante da certeza da separação e da perda.

Outro ponto importante é como essa temática está ligada à reflexão sobre a morte. O poeta não a aborda de maneira macabra, mas sim como uma parte natural do ciclo da vida. Essa aceitação pode proporcionar um conforto ao leitor, sugerindo que a efemeridade não deve ser vista apenas com tristeza, mas como uma oportunidade para celebrar a vida enquanto temos a chance.

Enfim, as trovas de Julimar também podem ser interpretadas como um retrato da condição humana. A busca por significado em meio à transitoriedade é uma luta comum a todos nós. A fragilidade da vida, destacada em suas palavras, pode levar à introspecção e à busca por um propósito que transcenda a efemeridade.

As trovas mergulham na temática da efemeridade da vida, evocando reflexão sobre o tempo, a beleza passageira, a importância das relações e a inevitabilidade da morte. Sua poesia não apenas capta a tristeza inerente à transitoriedade, mas também a celebração da vida, convidando os leitores a viver de forma mais consciente e plena, mesmo que por um breve momento.

Adélia Prado: Em seus poemas, Adélia reflete sobre o cotidiano e a passagem do tempo, enfatizando a beleza nas pequenas coisas, semelhante à abordagem de Julimar sobre a efemeridade.

John Keats: em seus "Odes", aborda a beleza e a transitoriedade da vida. A maneira como ele celebra cada momento enquanto também reconhece sua fragilidade se alinha bem com os sentimentos expressos nas trovas.

Conclusão
As trovas de Julimar, capturam emoções universais que são ecos de obras de poetas tanto brasileiros quanto estrangeiros. A intersecção entre suas temáticas e as de poetas como Vinícius de Moraes, Pablo Neruda, Cazuza, Emily Dickinson, Manuel Bandeira e John Keats revela a riqueza da experiência humana por meio da poesia, ampliando o entendimento sobre amor, saudade, natureza e a efemeridade da vida.

As trovas são densas em significado e oferecem reflexões sobre ética, moral, sociedade e emoções humanas. Cada uma delas traz uma lição, um chamado à reflexão ou uma crítica social, recorrendo a metáforas simples, porém poderosas que convidam o leitor a ponderar sobre a vida e seus desafios. A capacidade do autor de sintetizar tais complexidades em rimas curtas é o que torna suas obras notáveis e instigantes.

Representam uma confluência rica de tradição poética e inovação contemporânea, destacando-se não apenas por sua habilidade técnica, mas também por sua capacidade de ressoar com temas universais e atemporais. Influenciado por uma variedade de tradições literárias, Julimar utiliza a leveza da trovada para abordar questões profundas da experiência humana, como amor, natureza, sociedade e identidade.

A importância delas reside na forma como ele consegue unir a simplicidade da linguagem com a profundidade do conteúdo, tornando suas trovas acessíveis a um público vasto, mas também instigantes para críticos e estudiosos da literatura. Sua escrita reflete uma sensibilidade aguda para as nuances da vida contemporânea, explorando as complexidades das relações humanas e os desafios do mundo moderno.

Em um cenário global onde a literatura muitas vezes se distancia das experiências cotidianas, Julimar resgata a poesia como uma forma de conexão e introspecção, reafirmando seu poder de provocar reflexão e diálogo. Desse modo, suas trovas não apenas contribuem para o enriquecimento da literatura brasileira, mas também estabelecem um elo importante com a cultura contemporânea, reafirmando a relevância da poesia em tempos de transformação social e econômica.

Finalmente, as trovas de Julimar transcendem as fronteiras do mero entretenimento literário; ela se firma como um legado significativo, inspirando novas gerações de escritores e leitores a se engajarem com a arte da palavra, cultivando a reflexão crítica e a valorização das pequenas belezas que permeiam a vida.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. IA Open. vol.1. Maringá/PR: Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

José Feldman (A Luz)

para Maya
[São Paulo/SP 1997 – Maringá/PR 2013]

Foste uma amiga, uma irmã,
foste uma luz, o calor.
No despertar da manhã,
foste… simplesmente amor.

Em uma pequena cidade, havia um homem chamado Giuseppe, que viveu a maior parte de sua vida imerso na solidão. Mas, tudo mudou quando ele encontrou uma cadela abandonada na rua. Ela era uma mistura de raças, com olhos brilhantes e um jeito brincalhão que derreteu seu coração. Giuseppe a chamou de Maya, e desde aquele dia, eles se tornaram inseparáveis.

Maya trouxe alegria para a vida dele. Juntos, exploravam parques, faziam longas caminhadas e compartilhavam momentos simples, como assistir ao pôr do sol no quintal. Com o passar dos anos, Maya se tornou mais do que uma companheira; ela era sua melhor amiga, sua luz em dias sombrios.

Os anos passaram rapidamente e, ao completar 16 anos, Maya começou a apresentar sinais de fraqueza. A energia que antes brilhava em seus olhos agora era apenas um lampejo. Giuseppe, preocupado, levou-a ao veterinário, onde recebeu a notícia que temia: Ela estava envelhecendo e seu tempo estava se esgotando.

Nos dias que se seguiram, Giuseppe fez tudo o que pôde para tornar os últimos momentos de Maya especiais. Ele a levou a todos os lugares que ela amava, preparou suas comidas favoritas e passou horas acariciando seu pelo macio. Mas, apesar de seus esforços, o estado dela continuava a piorar.

Uma noite, enquanto a lua iluminava o céu, Maya deitou-se ao lado de Giuseppe. Ele a abraçou, sentindo seu coração bater lentamente. Com lágrimas nos olhos, ele sussurrou palavras de amor e gratidão, lembrando-se de todos os momentos que viveram juntos. Maya olhou para ele, como se entendesse cada palavra, e então fechou os olhos pela última vez.

A dor da perda foi avassaladora. A casa, que antes era preenchida com os risos e as brincadeiras de Maya, agora parecia vazia e silenciosa. Giuseppe caminhava pelos lugares onde costumavam brincar, sentindo a falta da alegria que a cadela trouxera para sua vida. Cada canto lembrava-o dela: o sofá onde ela costumava se aninhar, o parque onde corriam juntos, e até mesmo o quintal onde tantas vezes observaram o sol se pôr.

Os dias se tornaram semanas, e a tristeza de Giuseppe parecia não ter fim. Ele se perguntava como poderia viver sem sua fiel amiga. A vida, que antes parecia cheia de significado, agora era uma sombra do que era.

Mas, em meio à dor, Giuseppe começou a lembrar das lições que Maya lhe ensinou sobre amor e amizade. Ele decidiu que, embora ela não estivesse mais fisicamente ao seu lado, seu espírito e as memórias que compartilharam sempre viveriam em seu coração. Com isso, ele se dedicou a ajudar animais abandonados, fazendo o que pôde para dar a outros cães a mesma felicidade que Maya trouxe para sua vida.

A tristeza nunca desapareceu completamente, mas Giuseppe encontrou consolo na ideia de que Maya havia deixado um legado de amor. E, assim, em meio à dor, ele começou a reencontrar sua luz.

Fonte: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: Ia Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Vereda da Poesia = 121 =


Trova de
ELSON SOUTO
Bandeirantes/PR

Meu medo não é morrer
por quem amo tanto assim.
Meu dilema é não saber
se esse alguém morre por mim.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de
XÊNIA ANTUNES
Rio de Janeiro/RJ

Que tenhas meu corpo
(Quando as mulherezinhas crescem...)

Se amanheço
Me prometo sobriedade
Um trabalho bem feito no corpo
Um jeito tal nos cabelos
Algum sabor de morango
E pouca velocidade

Se entardeço
Esqueço do antigo enredo
Me sonho em tramas febris
Reformulo o perfeito jeito
Acrescento um tal sabor
E muito mais velocidade

Se anoiteço
Me ofereço toda com jeito
Pro jeito ser desarrumado
O amor bem feito no corpo
O coração rebatendo
Com muito mais velocidade

Se madrugo
Me acordo toda sem jeito
Feliz por um amor no meio
Enredada no gozo da alma
Um sorriso pra quem me vê
Por um instante mais calma.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Humorística de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

É "Carcará" o apelido
do Zé, porque... come... e cisca...
Mas a mulher diz: "Duvido!
Aqui em casa nem... belisca..."
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de
ALMA WELT
Novo Hamburgo/RS, 1972 – 2007, Rosário do Sul/RS

O Fantasma dos Sonetos

Permanecer viva em meu escrito...
Eis a esperança que ainda guardo,
E sendo isso o derradeiro Mito
Que me mantém acesa, com que ardo.

Um soneto mais, que insensatez!
Não posso parar, devo ir em frente.
Acabar é dar o sim ao pretendente
Que hospedado espera a sua vez.

Toda a minha vida entretecida,
Concentrada afinal em tipos pretos
A me fazer mais íntegra e assumida!

Já mal existo fora de um poema,
E sou mais e mais nestes tercetos,
Eu, fantasma vivo, que ainda teima...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova  Premiada em Irati/PR, 2023
SÉRGIO FERREIRA DA SILVA 
São Paulo / SP

Chão de pedras, sem guarida,
na agreste visão do estio,
na invernada espalha a vida
no leito firme do rio...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de 
CLÁUDIO SCHUSTER
Pelotas/RS

Cena

cheguei ao bar
sentei ao balcão
e pedi uma dose de batom vermelho
puro
sem gelo

nacional ou estrangeiro?

dei de ombros
já havia bebido tantos vestidos pretos
naquela madrugada
por outros bares
que nem sentiria mais
o gosto de um bom batom vermelho

era o que eu achava
até perceber que a temperatura
subiu logo aos 40 graus
assim que o garçom colocou
o termômetro no copo

meus caninos cresceram
pela primeira vez
em séculos
e eu bebi aquela página
vermelha
num gole só
com todos me olhando
num inglês com rotação alterada
pelo tempo

de repente
tudo ficou em silêncio
e todos tiveram que ouvir
aqueles beijos
descendo
rubros
pelo meu pescoço
pelo meu peito

ninguém respirava
qualquer outra cor
e o batom
vermelho
desceu ainda mais
me lambendo
e sugando
por dentro
enquanto eu cravava os dentes
no copo
sem notar
que todos saíam
em câmera lenta
deixando seus vestidos de noiva
seus pijamas
e dentaduras
nos copos
sobre as mesas
trêmulas
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Popular

Quem disser que a vida acaba,
digo-lhe eu que nunca amou;
quem deixou ficar saudades
nunca a vida abandonou.
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Soneto de
IALMAR PIO SCHNEIDER
Porto Alegre/RS

Soneto a Fernando Pessoa - In Memoriam 

Pra Fernando Pessoa este soneto,
em que pretendo ter a liberdade,
de ofertar-lhe com toda lealdade,
no que me empenho e então me comprometo,

os versos que nasceram da ansiedade,
como quem pinta um quadro em branco e preto,
finalizando o último quarteto
com o pincel da dor e da saudade...

´´Cartas de amor ridículas´´, talvez...
mas eu as escrevi sem o saber,
outrora quando tinha solidão...

Hoje as relembro e tenho a sensatez,
de havê-las enviado por prazer,
nos momentos de sonho e sensação…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de
JOSÉ MARCOS ALBERGATE
Bandeirantes/PR

Na leveza dos acenos,
sorrisos... mãos estendidas,
moram os gestos pequenos
que mudam as nossas vidas.
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Poema de
ANA WILINSKI
Santo André/SP

A janela

Hoje a minha janela
Já não é mais aquela,
Minha fonte de contato
É o cheiro do mato.
O luar, refletido nos teus olhos azuis,
Foi substituído pelo verde das folhas de bananeira
Ao invés do brilho dos teus olhos,
Vejo folhas molhadas.
No lugar da tua voz,
Ouço o cair da chuva
Todo o embalo, neste momento,
São as folhas ao vento.
Folhas de mamona
E todo o carinho, o tato,
Vieram... do próprio vento.
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Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

O bombeiro subalterno
morreu... e o céu foi seu rogo...
Mas, foi mandado pro inferno
porque no céu... não tem fogo!!!
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Soneto de 
ALPHONSUS DE GUIMARAENS FILHO
Ouro Preto/MG, 1870 – 1921, Mariana/MG

Soneto dos quarent'anos

Não me ficou da vida mágoa alguma
de que possa lembrar aos quarent'anos
senão esses cansados desenganos
que o mar que trouxe leva como espuma.

Foram-se os anos, mas que são os anos?
Chama que em sombra esfaz-se, apenas bruma.
As horas que eu vivi, de uma em uma,
deixaram sonhos e deixaram danos.

Muita morte passou n'alma ferida:
meu pai e meus irmãos, mortos amados.
Mas pela minha vida passou vida,

passou amor também, passou carinho.
E pelos dias claros ou magoados
não fui feliz e nem sofri sozinho.
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Trova do Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
Rio de Janeiro/RJ (1916 -1977) Santos/SP

Não digo não: “minha” Trova
quando faço um verso novo:
– não é minha e nem é nova
quando cai na alma do povo…
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Poema de
CHRIS HERRMANN
Rio de Janeiro/RJ

Corrimão

Ouço passos
subindo degraus.
Aproximam-se.
Cerro os olhos
e tu vens sorrindo.
Fala comigo!
Tomo distância
e não entendo.
Continuas vindo.
Vejo apenas
um corrimão
de sons e cheiros
a entorpecerem
tuas mãos,
como taças de vinho
sobre a mesa,
à espera do pão.
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Trova Funerária Cigana

De tanta terra enfeitada,
a terra que menos brilha
é a porção que hoje cobre
os restos de minha filha!
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Soneto de 
EMILIANO PERNETA 
Pinhais/PR, 1866 — 1921, Curitiba/PR

Vencidos

Nós ficaremos, como os menestréis da rua,
Uns infames reais, mendigos por incúria,
Agoureiros da Treva, adivinhos da Lua,
Desferindo ao luar cantigas de penúria?

Nossa cantiga irá conduzir-nos à tua
Maldição, ó Roland?... E, mortos pela injúria,
Mortos, bem mortos, e, mudos, a fronte nua,
Dormiremos ouvindo uma estranha lamúria?

Seja. Os grandes um dia hão de cair de bruço...
Hão de os grandes rolar dos palácios infetos!
E glória à fome dos vermes concupiscentes!

Embora, nós também, nós, num rouco soluço,
Corda a corda, o violão dos nervos inquietos
Partamos! inquietando as estrelas dormentes!
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Trova hispânica de
KATHIA SARINA MIRANDA
Pedregal/Panamá

Vehemente y soñador
expreso con gallardía,
aquellos versos de amor
que escribo en la poesía.
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Poema de 
SILVIAH CARVALHO
Manaus/AM

O Poeta

É aquele que ama um pouco mais,
E nunca ama por amar
E sonha um pouco mais, voa um pouco mais alto
E um pouco mais longe...
Chega onde poucos conseguem chegar

Entra nos labirintos da mente
Conhece o passado e presente
Deduz o futuro com tanta exatidão
Que parece viver um passo a frente

Nele existe um pouco mais de emoção
Um pouco mais de atenção
Um pouco mais de alegria
E um pouco mais de solidão

Um pouco mais de sinceridade
Coisa pouca dentro de muita gente
Um pouco mais da louca igualdade
Que o faz assim, tão diferente

Ele tem um pouco mais de quase tudo
Guardado dentro da mente
De tudo faz um poema, revela tudo que sente

Assim é o poeta
Ama sem ser amado; espera sem ser esperado
E muitas vezes, morre abandonado

Por vezes, só depois da morte
Tem seus poemas lembrados...
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Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Astronauta, não destrua 
meu direito de sonhar... 
Deite e role sobre a Lua, 
porém me deixe o luar! 
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Soneto de
RITA MOUTINHO
Rio de Janeiro/RJ

Soneto do superar e do optar

Passados muitos anos fundeada
nesse charco funesto, a solidão,
fui beijada por príncipe e elevada
do raso ao riso de uma afloração.

Vida nova e uma filha em mim gestada,
reedifiquei tão logo um coração
de uma cor rubra, mas aquarelada,
que convive com os tons pastéis da opção.

Pincelo de zarcão estas correntes
que me ata, mas não fere a liberdade,
grilhão/guarita da destemperança.

Para fechar comportas das torrentes
que te amedrontam a emotividade,
como eu, também te atrelas na aliança.
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Trova da
Princesa dos Trovadores
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

O mar, raivoso, se alteia,
como todos, quer a altura,
mas, é nos braços da areia
que encontra a paz que procura.
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Hino de 
Campo Grande/MS

I
Campo Grande que outrora um deserto,
Transformou-se em cidade primor,
É de joias escrínio aberto,
É uma gema de fino lavor!

II
(Estribilho)
A cidade onde todos vivemos,
Aprendamos fiéis defender!
Nosso afeto a ela sagremos
E felizes assim iremos ser.
Nosso afeto a ela sagremos
E felizes assim iremos ser.

III
Quanta luz, quanto gozo sem par!
Nos legou nosso amado País!
Oh! que terra ditosa é meu lar!
Campo Grande é feliz, é feliz!

IV
(Estribilho)
A cidade onde todos vivemos,
Aprendamos fiéis defender!
Nosso afeto a ela sagremos
E felizes assim iremos ser.
Nosso afeto a ela sagremos
E felizes assim iremos ser.

V
Mato Grosso do Sul, Campo Grande,
E Brasil, eis a tríade sagrada,
Em louvá-los minh'alma se expande
Morrerei pela Pátria adorada.

VI
(Estribilho)
A cidade onde todos vivemos,
Aprendamos fiéis defender!
Nosso afeto a ela sagremos
E felizes assim iremos ser.
Nosso afeto a ela sagremos
E felizes assim iremos ser.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Humorística de 
GLICE SALES ALCÂNTARA
Maranguape/CE

Quando o noivo ao pai pediu
a mão da filha Mazé
o papagaio sorriu
- “A mim só pedem o pé!”
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Poema de 
CONDORCET ARANHA
São Gonçalo/RJ

A ponta do telhado

Sentado no sofá, ao canto do escritório,
Vejo:
Olhando na janela, a ponta do telhado,
O céu escurecido e um poste iluminado.
Momentos são de angústia, tal qual rezas de velório,
Ideias que divagam, nas vagas da incerteza,
Enquanto, o coração, mergulha na tristeza.

Lembranças que se achegam, ferem e abomináveis,
Sem serem convidadas, invadem e se acomodam,
Persistem, noite à dentro, parecem intermináveis,
Com fatos já passados, que nada representam.
Recordações da infância, também da juventude,
Sangram-me, são punhais, me talham, a alma rasgam.

Sentado no sofá, ao canto do escritório,
Vejo:
A ponta do telhado, que abrupto termina,
O céu escurecido, convite a ver mais nada,
Um poste iluminado, às custas de energia,
A mesma que me falta, pra luz de um novo dia.
Assim, recordações, agora, valem nada,
Não posso ser mais jovem, tão pouco ser criança,
Serei, talvez, quem sabe, um dia, outra lembrança.
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Trova premiada em Irati/PR – 2023
MÔNICA MONNERAT 
Santos / SP

Sempre que se faz preciso,
sou firme como uma rocha,
mas não seguro o sorriso
ante a flor que desabrocha.
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

O gato e a raposa

Uma vez a raposa conversando
Com o gato, se esteve ali gabando
De ter artes e gírias bom recheio;
Enfim que delas tinha um saco cheio.

O gato lhe dizia: «Para tudo
Vós tendes cachimônia*: eu sou mui rudo:
Tendes um saco cheio; eu por desgraça
Nunca pude aprender mais que uma traça.

Nesta prática estavam divertidos;
E quando muitos cães foram sentidos,
Já os tinham no meio: em tal trabalho
O gato saltou logo em um carvalho,
E pôs-se lá de cima a ver a festa,
Que foi para a raposa bem funesta.
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* cachimônia = juízo