sábado, 25 de maio de 2024

Luís da Câmara Cascudo (A Princesa Jia)

Um casal tinha três filhos já em idade de trabalhar, mas, sendo muito unidos, não se separavam. Um dia o velho chamou os três filhos e disse que eles precisavam procurar a vida pelo mundo de meu Deus. No fim de um ano todos deviam voltar para a casa dos velhos.

Partiram os rapazes e logo adiante viram que a estrada se abria em três veredas. Cada um tomou a sua. José pela esquerda, Pedro pela do meio e João pela direita.

José e Pedro chegaram a cidades muito grandes e bonitas e acharam trabalho em palácios onde duas moças viviam e se engraçaram deles.

João andou, andou, andou, dormindo no mato, e dias depois viu um palácio deteriorado, feio, sujo, no meio de umas pedras escuras. O lugar era esquisito que fazia medo. João estava tão cansado e faminto que parou na porta e bateu palmas sem que ninguém respondesse. Bateu, bateu, e uma voz grossa roncou lá de dentro:

– Vá entrando!

João encontrou uma sala enorme, onde estava uma rede armada e uma mesa comprida, coberta de teia de aranha, picumã e porcarias. A voz continuou:

– Descanse...

João tirou os sapatos, deitou-se e pegou numa madorna (sonolência) quando a voz acordou-o:

– Jante!...

Jantou muito bem, havendo do bom e do melhor. Depois a voz ensinou onde era o quarto, com todos os preparos. João dormiu como um anjo. De manhã chamaram para o café, o almoço, a janta e a ceia. Passava o dia andando os arredores e lendo uns livros, pretos de poeira, que encontrara.

Na hora da ceia, tempos passados, ouviu os baques pesados no corredor e apareceu uma Jia (rã) que não tinha fim, grandona, gorda, repelente. Veio pulando, toda mole, escorrendo baba, até perto de João e sentou-se juntinho. O moço ia se esgueirando.

– Está com nojo de mim, João?

– Não senhora, dona Jia!

Conversaram e a Jia disse:

– Amanhã é o dia que você deve comparecer na casa de seus pais. Encontrará um cavalo selado junto da porta.

Na manhã seguinte, João mudou a roupa, almoçou e viu um cavalo selado que não tinha lugar para mais enfeites ricos. Montou-se e ia dando de rédeas quando a Jia apareceu, capengando:

– Espere aí, João. Leve esta lembrança para sua mãe.

Deu um saquinho, muito sujo, encardido, amarrado por um cordão imundo. O rapaz guardou o troço no bolso e galopou para casa. Antes de o sol se pôr avistou a casa e apeou-se no alpendre, onde seus pais e irmãos conversavam.

Jantaram muito satisfeitos e depois José e Pedro entregaram os presentes que traziam, roupa, calçado, chapéus, dinheiro. Os velhos agradeceram.

– E você, João, que me trouxe da viagem?

João entregou o saquinho de nada. Os irmãos riram como uns perdidos, mangando do tamanho do presente. A velha, recebendo o saquinho, sacudiu-o para fazer cair o que estivesse dentro. Quase não acabava de sair moedas de ouro, brilhantes, pedras preciosas, tudo de muito. Os velhos ficaram assombrados. E disseram, dançando:

José vai casar bem,
E Pedro casa melhor,
Mas João...
Passa-lhe a mão!

Os irmãos ficaram zangados. Quando anoiteceu despediram-se e João montou o cavalão que corria como o vento. Num ruflo estava diante do palácio velho e escuro. João apeou-se e entrou. Encontrou o banho pronto e depois a janta. Jantou e dormiu e continuou a mesma vida, conversando com a Jia, cada vez mais nojenta e amorosa.

Um ano se passou e a Jia lembrou que no dia seguinte devia estar o moço na casa dos pais, levando uma lembrança feita pela noiva.

Sucedeu como no ano anterior. No momento em que João ia picando o cavalo nas esporas, apareceu a Jia e lhe deu um vidrinho, com a boca quebrada, cheio de uma água que parecia lodo. O rapaz recebeu para não fazer desfeita e voou para casa.

A festa foi a mesma. José e Pedro traziam finos presentes bordados pelas noivas, em seda e ouro, representando passarinhos e estrelas, tudo faiscando de beleza. Quando chegou a vez de João e este entregou o vidrinho, foi uma risadaria geral. A velha destapou o vidrinho e sacudiu a água em cima da cama porque se fosse cheiro havia de servir. Imediatamente a cama ficou lastrada das maiores belezas do mundo, camisas, toalhas, lençóis, fronhas, todos os arranjos de casa, nuns bordados tão delicados e de cores tão feiticeiras que mão de gente não podia ter feito aquele serviço. Os velhos, não se contendo, dançaram:

Pedro vai casar bem!
José vai casar melhor!
Mas João...
Passa-lhe a mão!

Os manos fizeram cara feia, não achando graça na cantiga dos pais. Assim que anoiteceu se despediram. Os velhos disseram que, na próxima vez, deviam trazer as esposas e ficar uma semana, porque já estavam ricos e queriam hospedar os três filhos e as três noras com gosto e agrado.

Foram todos embora e João seguiu na vida velha no palácio feio ao lado da Jia.

Um ano depois, a Jia avisou que na manhã seguinte seria o dia de João se apresentar com a noiva.

– Eu não tenho noiva!

– Tem, sim senhor! Sou eu!

João tinha vontade de fugir mas não teve coragem de pagar o bem com o mal e, com pena da Jia, ficou calado. Quem cala consente.

Mal amanheceu o dia, e, depois do café, João encontrou, em vez do cavalo bonito e bem arreado, uma égua lazarenta, coberta de perebas e de moscas varejeiras, com a sela, bridas, rédeas, rabicho, tudo consertado com pedaço de cordão, caída de sujeira. Mesmo assim montou e saiu. Mal a égua dera os primeiros passos, tropeçando com a própria sombra, João ouviu um barulho desesperado atrás de si e, voltando-se na sela, reparou que todos os animais e aves o acompanhavam como se fizessem uma procissão. Galinhas, galos, perus, patos, guinés, gansos, porcos, tudo vinha seguindo, misturado, numa algazarra de carnaval. E o pior é que a Jia apareceu montada na garupa da égua, muito de seu, como se estivesse num trono. O pobre João só imaginava a mangação dos irmãos e do povo da rua quando fosse atravessar a povoação em que residiam os pais. Mas ficou conformado com a vontade de Deus, que lhe dera um bicho tão feio para noiva.

Com o trote do cavalo, a Jia desequilibrava-se e vinha ao chão, num estalo. Tornava a subir para a garupa da égua e ficava, agarrada como um cipó, até que despencava e ia bater na areia. Na terceira queda, desistiu de viajar na égua e chamou o galo para servir-lhe de montada. O galo parou e a Jia começou a lutar para montar-se no pescoço dele. Luta que luta, sobe e desce e João, esperando, achou tanta graça naquela cena mas teve tanta piedade que saltou do animal e veio, rindo, ajudar a Jia a se acomodar em cima do galo. Assim que ele colocou a Jia onde ela queria ficar, ouviu-se um estrondo e passou um clarão azul, tão forte, que cegava. João fechou os olhos, deslumbrado, e quando os abriu, estava diante de uma princesa bonita como uma estrela, sentada numa carruagem dourada, com seis cavalos brancos e um mundo de gente vestida de seda, bordada de ouro e tremendo de brilhantes, esperando. Era um cortejo tão faiscante que João não podia acreditar que fosse verdadeiro.

A princesa sorrindo disse:

– Eu fui a Jia que não recusaste para noiva e nunca fizeste pouco de seus presentes e feiúra. Estou desencantada e serei uma esposa fiel e amante. Esses são meus criados e estavam todos encantados.

A égua perebenta virara um cavalo gordo e espelhante, coberto de arreios que valiam uma riqueza. João montou e veio com aquele povão, estrada a fora, até sua casa, onde seus pais e irmãos o receberam como um rei coroado.

Fez-se o casamento, com grandes festas, e João foi morar no palácio velho, agora novo e cheio de luzes e de criados, sendo muito feliz.

Fonte> Luís da Câmara Cascudo. Contos Tradicionais do Brasil. Publicado originalmente em 1946. Disponível em Domínio Público.

Recordando Velhas Canções (Romance de Uma Caveira)


Compositores: Alvarenga, Ranchinho e Chiquinho Sales
(Valsa Humorística – 1940)

Eram duas caveiras que se amavam 
e à meia-noite se encontravam 
pelo cemitério os dois passeavam 
e juras de amor então trocavam.

 Sentado os dois em riba da lousa fria 
a caveira apaixonada 
assim dizia que pelo caveiro de amor morria 
e ele de amores por ela vivia.

 Ao longe uma coruja cantava alegre 
de ver os dois caveiro assim feliz 
e quando se beijavam em tom fúnebre 
a coruja batendo as asa pedia bis.

 Mas um dia chegou de "pé junto" 
um cadáver, um defunto 
E a caveira por ele se apaixonou 
e o caveiro antigo abandonou.

 O caveiro tomou uma bebedeira 
e matou-se de modo romanesco 
por causa dessa ingrata caveira 
que trocou ele por um defunto fresco.
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Na versão de Alvarenga e Ranchinho alguns eixos norteadores da canção ficam bem claros. Primeiro, se trata de uma seresta em compasso ternário (o mesmo compasso utilizado em uma valsa) tocada em um ritmo lento que constitui um elemento estético muito forte estabelecendo uma primeira relação entre a melodia, harmonia e letra. Outra característica da música é por ser cantada em uníssono sendo que a segunda voz (Ranchinho) só entra em um segundo momento da letra, no entanto, sem harmonizar com o vocal principal apenas dobrando a mesma linha melódica. A harmonia da canção em tom menor é outro item indispensável para alcançar o tom “fúnebre” que é proposto pelos artistas. Aliás, quando essa se altera para um tom maior, ela se relaciona diretamente com a letra da canção tendo em vista que é nesse momento da narrativa em que acontece a novidade da chegada do terceiro personagem: o “defunto fresco”.

Nos primeiros segundos da gravação da dupla Alvarenga e Ranchinho, escutam-se gritos e uivos de certo modo fantasmagóricos acompanhados por sons dissonantes e intencionalmente sombrios vindos de um acordeon que além de preparar o ouvinte para o tema central da canção mostra um dos fatores fortes da dupla: a questão da performance. 

A letra da canção possui uma narrativa linear contando uma história simples com começo, meio e fim. Até a terceira estrofe a canção fala de um casal de caveiras que viviam apaixonados. O cenário sombrio pode ser observado na letra quando os autores, além de já indicar o romance entre dois seres humanos mortos, usam de elementos como o local do romance (cemitério), o horário em que os “dois se amavam” (meia noite) e ainda o bater das asas da coruja (ave que no imaginário popular ajuda a compor o tom fúnebre proposto). A história sofre uma brusca mudança na terceira estrofe quando um “cadáver novo” chega ao cemitério fazendo com que a caveira se apaixonasse por ele configurando assim um triângulo amoroso fúnebre. 

O interessante de observar nesse momento é que justamente na estrofe em que ocorre uma mudança brusca no enredo, o tom da música também muda. Antes, em tom menor a canção seguia linear contando o romance entre as duas caveiras. Todavia, com a chegada do defunto novo a canção alterna para um tom maior, chamando a atenção do ouvinte para a novidade que ocorre na letra e em sua narrativa, assim como na harmonia da música. De um modo geral a letra da canção apresenta um tom humorístico por se tratar de um romance existente entre dois indivíduos que normalmente não integrariam qualquer enredo amoroso.
(Fonte: Carlos Gregório dos Santos Gianelli, trecho do artigo A Resignificação da Canção “Romance de uma Caveira” de Alvarenga e Ranchinho, Universidade de São Paulo, 2012, no Encontro Internacional de Música e Mídia)

Como Escrever uma História Curta e Engraçada – 4, final


Revisando a história

1. Deixe o conto de lado por um tempo, antes de revisá-lo.

A pior coisa que um autor pode fazer é seguir imediatamente para a revisão após terminar de escrever um conto. Os escritores precisam de algum tempo longe do projeto para que a obra não esteja tão fresca em suas mentes e (idealmente) para que não estejam tão emocionalmente ligados a cada detalhe do enredo.

Após terminar de escrever, espere por pelo menos uma ou duas semanas antes de revisar a história. Se possível, tente esperar por um mês para poder criar uma distância significativa entre o enredo e você.

Considere pedir a um familiar ou amigo de confiança para ler o conto. Peça para que ele seja honesto e crítico, e enfatize que deseja saber tudo o que não está funcionando bem no enredo e por quê.

Ler a história com novos olhos vai ajudá-lo a encontrar erros que talvez tenha deixado passar.

Quando a trama está fresca na sua cabeça, é fácil preencher as lacunas com tudo o que você sabe sem perceber que certas informações foram omitidas no texto. Além disso, será mais fácil eliminar elementos da história se você esperar por algum tempo antes de revisar o conto. Talvez o autor esteja apaixonado por uma cena mas, depois de esperar por algumas semanas, perceba que ela não é tão relevante quanto ele acreditava.

2. Lembre-se do que desejava realizar no início do projeto.

Qual o ponto central do conto?
Você tentou destacar alguma situação social real? 
Tentou abordar algum aspecto da natureza humana? 
Tentou retirar humor de situações e experiências pessoais?

Independentemente das suas intenções, lembre-se delas antes de seguir com o processo de revisão.

Mantendo as intenções originais em mente, você saberá o que esperava fazer com a história e conseguirá avaliar se atingiu ou não esse objetivo.

Considere se o tom da trama corresponde às suas intenções e aos eventos gerais do conto.

3. Esclareça quaisquer elementos confusos.

Esse é um motivo importante para deixar a história de lado por um certo tempo antes de revisá-la. Quando acaba de escrever um conto, o autor tem uma probabilidade menor de encontrar qualquer elemento que possa confundir o leitor, no entanto, você poderá encontrar seus erros caso se dê tempo suficiente.

A confusão pode surgir do conteúdo da história (ou da falta dele), ou resultar de uma transição ausente ou mal executada. As transições devem conectar uma cena à cena seguinte, o capítulo anterior com o próximo e assim por diante.

Uma boa transição encerra a cena anterior e guia suavemente o leitor para a cena seguinte.

Um exemplo de uma transição entre duas cenas poderia ser algo nas linhas de: "Ele a observou em silêncio durante toda a noite, até que ela desapareceu na escuridão. Na manhã seguinte, ele continuou olhando para o horizonte, mas sabia que ela já estava a meio caminho de casa".

Peça para um amigo revisar o conto e tentar encontrar qualquer detalhe confuso ou que não faça sentido.

4. Edite a história para corrigir os erros.

A edição deve ser considerada um passo separado da revisão. Rever o conto envolve reescrever certas partes e eliminar elementos que não funcionem bem. A edição, por outro lado, envolve principalmente a correção dos erros de ortografia e gramática.

Tente encontrar erros de ortografia, gramática ou sintaxe, orações muito longas ou fragmentadas, erros de pontuação e linhas de diálogo muito fracas.

Use o corretor ortográfico do computador ou peça para um amigo com bastante talento para edição dar uma olhada no seu conto.

Tente ler a história em voz alta. Às vezes, pode ser mais fácil ouvir um erro quando o falamos em voz alta do que quando apenas o lemos em silêncio.

DICAS

Não desista! Caso esteja com dificuldade, faça uma pausa e comece novamente.

Não utilize palavras pouco comuns, para que não quebre a comicidade. Palavras difíceis ou não utilizadas cotidianamente podem fazer o leitor quebrar a cabeça para entende-las, tornando o conto cansativo, fazendo com que ele perca interesse no conto. Você tem que prender o leitor no conto para que ele leia até o fim. 

Lembre-se de que os contos nunca são perfeitos logo de cara. O trabalho de um escritor envolve a desconstrução e aperfeiçoamento de suas obras.

Peça para um amigo próximo, em quem você confie e cujas opiniões valorize, ler o conto. Pergunte quais partes ele acha que funcionam bem e quais partes precisam de revisão.

Nunca roube o trabalho de outra pessoa, incluindo piadas e trechos escritos.

Fonte> wikihow 

sexta-feira, 24 de maio de 2024

Vanice Zimerman (Tela de versos) 36

 

Newton Sampaio (Trem de subúrbio)

Calixto interrompe a discussão, enterra o chapéu na cabeça, cai no mundo. 

Esbarra nos homens que passam.

O bonde apinhado também esbarra nele. Por um triz teria os pés esmagados.

Procura um cigarro. No bolso não há cigarros.

Procura o relógio. O relógio mostra o ponteiro pequeno bem em cima do número 3. Chega à estaçãozinha. Só o tempo de entrar e o trem sair.

O maquinário rodando lhe dá o gosto longínquo de desaparecimento, de evasão.

Evasão... Longo tempo lhe dança no cérebro, o termo. Evasão... Fugir da vida...

Mas a vida florescia em tudo, feito milagre permanente. Florescia na paisagem se mexendo sem parar. E no cheiro da máquina vomitando fumaça. E na promiscuidade do vagão, — do vagão cheio de gente se abanando, de cores se exibindo, de perfumes baratos se misturando como os donos.

Ao lado, volumosa ruiva tem os quadris maltratados pela cinta apertadíssima. Perto da ruiva, um velhote percorre as letras de um vago pasquim suburbano. O velhote lê. Mas não fala.

Quem fala toda a vida é aquele rapaz de bigode lustroso. Transmite, ao companheiro, imaginárias peripécias do último jogo de futebol.

O companheiro guarda um interesse imenso na história. Não é como a moça de boina azul que não dispensa atenção a nada.

Ela é bonita, está no segundo banco, e olha, e olha.

No mundo existem milhares de moças — de boininha azul ou sem boina — que fazem a mesma coisa. Que têm esse jeito triste, distante. Que espiam silenciosamente. Com vontade de segurar nas mãos aquilo que corre do lado de lá das janelas. Mas as janelas têm vidraças que separam o corpo das moças dos apelos que correm e se sucedem.

É cheia de vidraças, a vida das moças. Por isso há moças de boina espiando, tristinhas. Espiando com olhos parecidos com os de Calixto. 

Os olhos de Calixto estão vermelhos e molhados. Por causa de uma faísca impertinente. A faísca obriga-o a esfregar as pálpebras, muitas vezes.

Esfrega, esfrega. A ruiva pensa que o rapaz havia chorado. Será que as matronas gordas pensam coisas exatas? Gravíssimo é o problema, cidadãos!

Apesar do problema, o garoto louro do primeiro banco continua chupando o seu caramelo. E se sujando também. Até o fim. Depois, a mãe limpa o rostinho dele. Como agradecimento, o garoto começa a fazer travessuras. Salta no corredor. O trem dá uma sacudidela violenta, e o teria fatalmente derrubado se a moça de boina não o tivesse amparado em tempo.

Cresce um rebuliço. A mãe fica muito pálida, o rapaz de bigode lustroso acha graça, o velhote interrompe a leitura. E a senhorita guarda o menino. Passa-lhe a mão na cabecinha.

— Como se chama?

— Roaldo.

— Quantos anos tem?

A mãe intervém.

— Já fez três. Foi no último agosto.

— Crescidinho, não?

— E ladino! — completa o orgulho materno.

O cabelo do menino tem a cor do sol. Desse sol que atravessa a vidraça e a deixa intacta. Mas a senhorita do segundo banco não tem mais esses pensamentos. Porque uma criança loura quase sempre resolve o silêncio das moças de boina...

Calixto, infelizmente, não se lembra disso. Continua a meditar em torno da discussão com a noiva. Enquanto o trenzinho corre, corre. 

Vomitando fumaça como um demônio.

Fonte> Newton Sampaio. Ficções. Secretaria de Estado da Cultura: Biblioteca Pública do Paraná, 2014.

Vereda da Poesia = 16 =

 


Trova do Rio de Janeiro

Luiz Poeta
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Que trovador desastrado!
… foi direto pro doutor:
Fiz trova de pé quebrado!
Bota um gesso, por favor!
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Soneto de Minas Gerais

Sílvia Araújo Motta
Belo Horizonte/MG

SOL COM CHUVA

No adágio popular ouvi dizer
que quando há sol com chuva...alguém sorriu!
Na despedida vi “viúva” a crer:
-“Marido vivo” em paz, feliz, fugiu...

Mulher tão forte, em tudo, quis vencer!
Enxugou o pranto, teve fé, agiu!
Criou seus filhos, graças viu chover!
Pingos lavaram “alma pura à mil...”

Com seu poder de sol viveu, brilhou...
Sempre enfrentou problemas, mas sorria!
Buscou o saber, destino então traçou.

Chove amizade... só por seu valor!
Ao ritmo dança, canta e faz poesia!
Molhada agora, beija o novo amor.
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Haicai de São Paulo

Analice Feitoza de Lima 
Bom Conselho/PE, 1938 – 2012, São Paulo/SP

Uma água barrenta,
pássaros sobre o barranco.
Um rio minguante.
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Poema de Portugal

Alice Gomes
Tabuaço, 1910 – 1983, Lisboa

NA IDADE DOS PORQUÊS 

Professor diz-me porquê?
Por que voa o papagaio
que solto no ar
que vejo voar
tão alto no vento
que o meu pensamento
não pode alcançar?

Professor diz-me porquê?
Por que roda o meu pião?
Ele não tem nenhuma roda
E roda, gira, rodopia
e cai morto no chão...

Tenho nove anos, professor
e há tanto  mistério à minha roda
que eu queria desvendar!
Por que é que o céu é azul?
Por que é que marulha o mar?
Porquê?
Tanto porquê que eu queria saber!
E tu que não me queres responder!

Tu falas, falas, professor
daquilo que te interessa
e que a mim não interessa.
Tu obrigas-me a ouvir
quando eu quero falar.
Obrigas-me a dizer
quando eu quero escutar.
Se eu vou a descobrir
Fazes-me decorar.

É a luta, professor
a luta em vez de amor.

Eu sou uma criança.
Tu és mais alto
mais forte
mais poderoso.
E a minha lança
quebra-se de encontro à tua muralha.

Mas
enquanto a tua voz zangada ralha
tu sabes, professor
eu fecho-me por dentro
faço uma cara resignada
e finjo
finjo que não penso em nada.

Mas penso.
Penso em como era engraçada
aquela rã
que esta manhã ouvi coaxar.
Que graça que tinha
aquela andorinha
que ontem à tarde vi passar!...

E quando tu depois vens definir
o que são conjunções
e preposições...
quando me fazes repetir
que os corações
têm duas aurículas e dois ventrículos
e tantas
tanta mais definições...
o meu coração
o meu coração que não sei como é feito
nem quero saber
cresce
cresce dentro do peito
a querer saltar cá para fora
professor
a ver se tu assim compreenderias
e me farias
mais belos os dias.
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Trova Premiada em Maringá

Lucília Trindade Decarli
Bandeirantes/PR

Aquela alegre canção,
que, outrora, era de nós dois,
traz, hoje, triste emoção
na solidão de um depois…
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Poema do Rio de Janeiro

J. G. de Araújo Jorge
(Jorge Guilherme de Araújo Jorge)
Tarauacá/AC 1914 – 1987 Rio de Janeiro/RJ

POEMA ÀS PALAVRAS 

 Tem uns homens por aí
com medo das palavras.

Tem uns poetas por aí
segregacionistas.

Tem preconceitos contra
as palavras:
esta não serve - é mestiça,
esta também não - é muito comum,
é do povo, não é importante,
e aquela também - não tem educação
fala muito alto, é palavrão.

Tem poeta por aí cochichando
como gente muito fina
de salão,
falando entre dentes
perpetrando futilidades
e maldades, como comadres.

Tem uns homens por ai
tratando as palavras pela cor
de sua pele:
não cruzam com as palavras, negras
amarelas, mulatas,
só fazem poemas brancos, poemas
puros, poemas arianos, poemas de raça.

Que se danem! Faço filhos
com todas as palavras
basta que elas se entreguem, e me amem
e saiam com o meu verso, à rua
para cantar.
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Quadra Popular

Coração entristecido,
por que tanto te magoas?
Se estás cercado de penas,
o que fazes que não voas?
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Décima do Rio Grande do Norte

Ademar Macedo
Santana do Matos/RN, 1951 – 2013, Natal/RN

O SERTÃO

No sertão tem poesia,
tem o preá no serrote
tem mocó dando pinote
e tem cabra dando cria;
tem coalhada na bacia
tem fogueira de São João,
tem festa de apartação
tem porteira e passadiço;
quem nunca viu tudo isso
não sabe o que é sertão!
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Trova Humorística do Rio Grande do Sul

Lacy José Raymundi
Sananduva/RS, ???? – 2014, Garibaldi/RS

É mentira ou é verdade?
É verdade ou é mentira?
Se a mulher disser a idade
não acredite: confira!…
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Martelo Agalopado do Rio Grande do Norte

Professor Garcia
(Francisco Garcia de Araújo)
Caicó/RN

Minha avó também teve competência,
com seu fuso na mão, foi de primeira,
também tinha uma roca de madeira
que lhe deu o sustento, e deu vivência.
Enedina, um sinal de resistência,
não sentia o torpor da nostalgia,
na pobreza do campo onde vivia
resistiu aos insultos da escassez,
mas viveu com ternura e sensatez
encantada com tudo que fazia!
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Aldravia do Rio de Janeiro

Juçara Regina Viegas Valverde
Rio de Janeiro/RJ

respingos
do
ontem
nublam
o
hoje
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Soneto Alexandrino de Portugal

Maria João Brito de Souza
Oeiras/Portugal

MEMÓRIAS DO MAR

Sei duma vozinha que contava estórias,
Dizia segredos que só eu escutava
E que, tantas vezes, me deliciava
Quando me falava de velhas memórias...

 Sempre que contava das antigas glórias
Nos tempos remotos em que navegava
Uma caravela que então procurava
As suas conquistas, as suas vitórias

 Nessa descoberta das terras douradas,
Da canela em pau, do café em grão,
Das madeiras nobres e do açafrão,

De mil coisas lindas para ser usadas,
Coisas requintadas, coisas que só são...
Porque o mar me disse que as teve na mão!
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Trova Humorística do Paraná

Maria da Conceição Fagundes 
Curitiba/PR

Tesoura a vida do alheio
E age de modo imparcial
E ela afirma, sem receio:
- É “terapia social”!!! 
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Poema do Amazonas

Silviah Carvalho
(Sílvia Helena de Carvalho)
Manaus/AM

A MENINA DO RIO AMAZONAS

Fiquei na margem do rio,
Desanuviando minha mente,
Meditando na constância das águas,
No desapego da alma, neste vazio...

Vi pessoas passarem às margens,
E notei, cada um faz seu próprio rio!
E navegam em suas esperanças,
Levando as lendas em suas lembranças.

Vi a menina sentada à beira do rio,
Sonhando com a felicidade,
Esperando o boto... Não sei!
Que a tire da beira e, se faça seu rei.

Na espera inútil à tristeza vem à tona,
Não há encantamento... Eu chorei!
Vendo a tristeza nos olhos da menina
Do rio amazonas...

Eu a vi partindo só e com frio,
Deixando nas margens o fim do seu rio,
Eu a vi sofrer por um conto infantil,
Eu soube que ela nunca mais sorriu.

E eu! Ainda espero só,
Na margem do rio,
Do meu rio...
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Epigrama de Minas Gerais

João Salomé Queiroga
Serro/MG, 1810 – 1878

Oh, deste patrono a musa,
Diz o povo, não se entende,
Pois quando defende, acusa,
E quando acusa, defende…

(a um advogado no júri)
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Écloga* de Portugal

Miguel Torga
(Adolfo Correia da Rocha)
São Martinho de Anta, 1907 – 1995, Coimbra

Na ribeira que secou
Bebia o gado que eu tinha;
Quando chegava à noitinha,
A voz das águas chamava,
E o rebanho que pastava
Deixava os tojos e vinha.

Eu próprio molhava as mágoas
Na pureza da nascente;
Metia as mãos docemente
Na limpidez da frescura,
E as caricias da corrente
Davam-me paz e ternura.

O gado, farto, bebia;
E eu deixava-me correr
Naquele suave prazer
Que me levava consigo...
Eu não tinha que fazer,
E o gado tinha pascigo (1).
´
A noite, então, vinha mansa
Cobrir a lã das ovelhas;
Era um telhado de telhas
Furadas ou embutidas
De luzes muito vermelhas
Por todo o céu repartidas.

E aquela viva irmandade
Do rebanho e do zagal (2)
Era ali tão natural
Que apagava dos sentidos
A saudade do curral
Feita de sono e balidos.
´
Mas a ribeira secou.
Não sei que praga lhe deu
Que no leito onde correu
Há pedras e maldição...
E o meu rebanho morreu
De sede e de mansidão.
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(1) Pascigo = lugar onde o gado pasta.
(2) Zagal = pastor

* Écloga, é uma composição em verso, geralmente escrita sob a forma de diálogo, de conversa aberta entre as entidades presentes no texto e, muitas vezes, entre o autor, as personagens e o próprio leitor, é um pequeno poema pastoral que apresenta, a forma de um diálogo entre pastores ou de um solilóquio. 

A sua origem ficou a dever-se ao poeta grego Teócrito e foi utilizada por Virgílio para a composição das suas famosas Bucólicas.

A temática versada nas éclogas relacionava-se, quase sempre, com a vida campestre, os amores pastoris, as impossibilidades e não correspondências dos amores vários.

Nas épocas mais remotas, na chamada Época Clássica, a écloga servia também como meio para profundas reflexões morais, estéticas e filosóficas.

O introdutor deste subgênero literário em Portugal foi Sá de Miranda, influenciado por escritores italianos como Dante e Boccaccio. (http://www.infopedia.pt/$ecloga)

A écloga clássica parte quase sempre de um quadro idílico, o locus amoenus ou lugar aprazível, e desenvolve com certa brevidade o louvor de uma pessoa, por razões sentimentais, reflete sobre a condição do poeta e/ou da própria poesia, ou entretém-se com sutilezas políticas ou religiosas. Outro tema clássico das éclogas é o da libertação espiritual, a renúncia aos bens terrenos e sociais para uma total entrega à natureza e aos mais puros ideais de vida perseguindo a chamada aurea mediocritas. (http://www.edtl.com.pt/)

Abbie Phillips Walker (Os animais falantes)

Hulda e Nathan tinham ouvido histórias sobre uma floresta maravilhosa onde os animais podiam falar, mas descartaram isso como mera fantasia. Isto é, até que um dia eles se viram vagando pela floresta. Nathan, cativado por um esquilo, o perseguiu, com Hulda logo atrás. Quase pegando o esquilo várias vezes, eles de repente perceberam que haviam se aventurado em uma parte desconhecida da floresta.

“Devemos voltar”, sugeriu Hulda, “pois a escuridão está se aproximando e podemos nos perder.” No entanto, em vez de refazer seus passos e encontrar o caminho que levava para fora da floresta, eles pareciam se aprofundar nela. Logo o anoitecer chegou e a ansiedade de Hulda se manifestou em lágrimas.

“Não tenha medo,” Nathan a confortou. “Esta noite, a lua vai brilhar intensamente e estou confiante de que encontraremos o caminho de volta.”

“Temo que estejamos perdidos,” Hulda lamentou enquanto Nathan a guiava para um assento debaixo de uma grande árvore. De repente, um brilho chamou a atenção deles e, ao olharem para cima, notaram uma luz fraca filtrada por uma pequena janela na lateral da árvore. Uma voz acenou: “Vocês estão perdidos, crianças?”

Uma coruja emergiu da janela e Nathan perguntou: “Você pode nos guiar para fora da floresta?”

“É muito longe para viajar esta noite,” a coruja respondeu. “Venham para dentro, e eu lhes darei o jantar.”

“Eu sei onde estamos,” Nathan exclamou. “Estamos na floresta dos animais falantes.”

A porta se abriu e eles entraram em uma cozinha arrumada. Dona Coruja, enfeitada com um grande avental branco e gorro combinando, preparava o jantar.

“Por favor, sentem-se à mesa,” ela ofereceu. Tigelas e colheres já estavam colocadas, e Dona Coruja as encheu de mingau e leite. Sua gentileza logo deixou Hulda e Nathan à vontade. Assim que terminaram a refeição, a Sra. Coruja perguntou: “Vocês gostariam de ver meus bebês?”

“De fato,” Hulda respondeu ansiosamente. A Sra. Coruja os levou até o quarto, onde três corujinhas dormiam profundamente em uma cama aconchegante.

“Eles são os pássaros mais bonitos de toda a floresta”, proclamou a orgulhosa mãe.

“Não tenho dúvidas,” Hulda concordou, “especialmente quando seus olhos estão abertos.”

Na manhã seguinte, depois que a Sra. Coruja serviu o café da manhã, Hulda expressou a necessidade de partir. Eles se despediram da Sra. Coruja e de seus bebês, reconhecendo com gratidão sua hospitalidade.

“Lá vem o Sr. Bruin”, alertou a Sra. Coruja. “Ele vai guiá-los para fora da floresta. Não se preocupem,” ela assegurou às crianças ao notar suas expressões alarmadas. “Nenhum mal acontece a ninguém nesta floresta de animais falantes. Bom dia, Sr. Bruin,” ela cumprimentou o urso pardo. “Essas crianças estão perdidas. Você vai mostrar a saída a elas?”

“Certamente”, respondeu Bruin. “Elas podem me acompanhar. Vou fazer uma longa caminhada e gostaria da companhia.”

Hulda e Nathan caminharam ao lado de Bruin, que provou ser amável e envolvente, dissipando rapidamente seus medos.

“Bom dia, Sr. Bruin”, um gaio azul gritou de sua varanda. “Onde você está indo?”

Bruin explicou o destino deles e o gaio azul os convidou a entrar. “Talvez as crianças gostem de conhecer meus bebês”, ela sugeriu.

“Ficaríamos encantados”, respondeu Hulda.

A casa do gaio azul aninhada dentro de uma grande árvore, com varandas em todos os lados. Enquanto Bruin permaneceu no andar de baixo, Hulda e Nathan seguiram a Sra. Gaio Azul escada acima.

“Eles não são adoráveis?” ela exclamou, revelando três pequenos gaios azuis aninhados em um berço. “São os pássaros mais bonitos de toda a floresta.”

Hulda e Nathan concordaram de todo o coração, achando as garotas absolutamente encantadoras. Depois de se despedir da Sra. Gaio Azul, elas se juntaram a Bruin. “Eu moro ali”, indicou Bruin, apontando para uma rocha que se assemelhava peculiarmente a uma casa. “Minha esposa ficará descontente se eu não apresentar vocês a ela.”

“Teremos o maior prazer em visitá-la”, respondeu Hulda, e logo chegaram à porta da residência de Bruin. A Sra. Bruin, de boné e avental, deu-lhes as boas-vindas com um sorriso caloroso, exalando um ar carinhoso.

“Entrem,” ela convidou. “Vou preparar o almoço e apresentá-los às crianças. Vocês certamente vão se apaixonar por eles,” ela acrescentou enquanto ela e Bruin buscavam seus filhos. Em questão de minutos, eles voltaram, cada um carregando um ursinho pardo debaixo do braço. Colocados em cadeiras altas, os filhotes jogavam leite com as colheres de brincadeira, como crianças malcomportadas que Hulda e Nathan observaram.

Depois do almoço, eles se despediram da Sra. Bruin e de seus filhotes, assegurando-se de elogiar o charme inegável dos bebês. Continuando a viagem, caminharam uma distância considerável sem encontrar ninguém até que se cruzaram com um esquilo e um coelho.

“Por favor, juntem-se a nós para o chá,” o coelho gentilmente convidou. “E vocês precisam ver meus bebês.”

“E depois, vocês devem ver os meus”, acrescentou o esquilo.

Eles primeiro visitaram o coelho, cuja charmosa casa branca ostentava persianas verdes vibrantes, cercadas por vegetais florescentes. A sra. Coelho conduziu-os a uma aconchegante sala de estar. Enquanto saboreavam o chá, uma babá entrou com duas cestas, colocando-as no chão. A Sra. Coelho descobriu amorosamente as cestas, revelando seus preciosos coelhinhos.

“Garanto a vocês”, ela declarou com orgulho, “que essas são as criaturas mais encantadoras da floresta.” Hulda concordou sinceramente, admirando sua aparência delicada.

Em seguida, eles cruzaram a rua para a casa da Sra. Esquilo, onde seus bebês brincavam no quintal. A Sra. Esquilo explicou: “Deixei-os correr livremente para que vocês possam apreciar sua graciosidade. Eles são os bebês mais adoráveis da floresta.”

“Eu acredito que você esteja certa,” Hulda concordou. “Eles são incrivelmente astutos.”

Finalmente, quando se aproximaram do caminho que saía da floresta, Bruin informou-os de que não poderia ir mais longe. “Entrar nesse caminho faz com que qualquer animal falante perca a capacidade de falar”, revelou.

“Estamos profundamente gratos”, expressou Nathan. “Tivemos uma experiência verdadeiramente cativante.”

“Por favor, voltem”, Bruin estendeu seu convite. “Sempre recebemos visitantes.” Com essas palavras de despedida, Bruin desapareceu na floresta, logo desaparecendo de vista.

“Nunca mais quero comer mingau com leite”, exclamou Hulda. “Eles devem subsistir com isso. Você viu como aquelas mães eram vaidosas? É bastante estranho quando eles perguntam se seus bebês são atraentes.”

“Você concordou com cada mãe”, observou Nathan, “mesmo com a coruja, cujos filhotes eram os mais feios que já vi.”

“Você diz a uma mãe que seu bebê não é bonito?” questionou Hulda.

“Não,” Nathan admitiu, “acho que não.”

“Bem, é o mesmo com animais e pássaros”, concluiu Hulda.

Apesar de inúmeras tentativas no futuro, Hulda e Nathan não conseguiram encontrar o caminho que levava de volta à floresta de animais falantes. No entanto, eles mantêm a esperança, sabendo que ela existe, e sonham em redescobri-la algum dia.

Fonte> Abbie Phillips Walker (EUA, 1867 - 1951). Contos para crianças. 
Disponível em Domínio Público.