quarta-feira, 21 de abril de 2010

Érico Veríssimo (1905 – 1975)


Erico Lopes Verissimo nasceu em Cruz Alta (RS) no dia 17 de dezembro de 1905, filho de Sebastião Verissimo da Fonseca e Abegahy Lopes Verissimo.

Em 1909, com menos de 4 anos, vítima de meningite, agravada por uma broncopneumonia, quase vem a falecer. Salva-se graças à interferência do Dr. Olinto de Oliveira, renomado pediatra, que veio de Porto Alegre especialmente para cuidar de seu problema.

Inicia seus estudos em 1912, freqüentando, simultaneamente, o Colégio Elementar Venâncio Aires, daquela cidade, e a Aula Mista Particular, da professora Margarida Pardelhas. Nas horas vagas vai o cinema Biógrafo Ideal ou vê passar o tempo na Farmácia Brasileira, de seu pai.

Aos 13 anos, lê autores nacionais — Coelho Neto, Aluísio Azevedo, Joaquim Manoel de Macedo, Afrânio Peixoto e Afonso Arinos. Com tempo livre, tendo em vista o recesso escolar devido à gripe espanhola, dedica-se, também, aos autores estrangeiros, lendo Walter Scott, Tolstoi, Eça de Queirós, Émile Zola e Dostoievski.

Em 1920, vai estudar, em regime de internato, no Colégio Cruzeiro do Sul, de orientação protestante, localizado no bairro de Teresópolis, em Porto Alegre. Tem bom desempenho nas aulas de literatura, inglês, francês e no estudo da Bíblia.

Seus pais separam-se em dezembro de 1922. Vão — sua mãe, o irmão e a filha adotiva do casal, Maria, morar na casa da avó materna. Para ajudar no orçamento doméstico, torna-se balconista no armazém do tio Americano Lopes. Os tempos difíceis não o separam dos livros: lê Euclides da Cunha, faz traduções de trechos de escritores ingleses e franceses e começa a escrever, escondido, seus primeiros textos. Vai trabalhar no Banco Nacional do Comércio.

Continua devorando livros. Em 1923. Lê Monteiro Lobato, Oswald e Mário de Andrade. Incentivado pelo tio materno João Raymundo, dedica-se à leitura das obras de Stuart Mill, Nietzsche, Omar Khayyam, Ibsen, Verhaeren e Rabindranath Tagore.

No ano seguinte, a família da mãe muda-se para Porto Alegre, a fim de que seu irmão, Ênio, faça o ginásio no Colégio Cruzeiro do Sul. Infelizmente a mudança não dá certo. O autor, que havia conseguido um lugar na matriz do Banco do Comércio, tem problemas de saúde e perde o emprego. Após tratar-se, emprega-se numa seguradora mas, por problemas de relacionamento com seus superiores, passa por maus momentos. Morando num pequeno quarto de uma casa de cômodos e diante de tantos insucessos, a família resolve voltar a Cruz Alta.

Erico volta a trabalhar no Banco do Comércio, como chefe da Carteira de Descontos, em 1925. Toma gosto pela música lírica, que passa a ouvir na casa de seus tios Catarino e Maria Augusta. Seus primos, Adriana e Rafael, filhos do casal, seriam os primeiros a ler seus escritos.

Logo percebe que a vida de bancário não o satisfaz. Mesmo sem muita certeza de sucesso, aceita a proposta de Lotário Muller, amigo de seu pai, de tornar-se sócio da Pharmacia Central, naquela cidade, em 1926.

Em 1927, além dos afazeres de dono de botica, dá aulas particulares de literatura e inglês. Lê Oscar Wilde e Bernard Shaw. Começa a sedimentar seus conhecimentos da literatura mundial lendo, também, Anatole France, Katherine Mansfield, Margareth Kennedy, Francis James, Norman Douglas e muitos outros mais. Começa a namorar sua vizinha, Mafalda Halfen Volpe, de 15 anos.

O mensário “Cruz Alta em Revista” publica, em 1929, “Chico: um conto de Natal” que, por insistência do jornalista Prado Júnior, Erico havia consentido. O colega de boticário e escritor Manoelito de Ornellas envia ao editor da “Revista do Globo”, em Porto Alegre, os contos “Ladrão de gado” e “A tragédia dum homem gordo”, onde, aprovadas, foram publicadas.

Erico remete a De Souza Júnior, diretor do suplemento literário “Correio do Povo”, o conto “A lâmpada mágica”. Esse, segundo testemunhas, o publica sem ler, o que dá ao autor notoriedade no meio literário local.

Com a falência da farmácia, em 1930, o autor muda-se para Porto Alegre disposto a viver de seus escritos. Passa a conviver com escritores já renomados, como Mario Quintana, Augusto Meyer, Guilhermino César e outros. No final do ano é contratado para ocupar o cargo de secretário de redação da “Revista do Globo”, cargo que ocupa no início do ano seguinte.

Em 1931 casa-se, em Cruz Alta, com Mafalda Halfen Volpe. Lança sua primeira tradução, “O sineiro”, de Edgar Wallace, pela Seção Editora da Livraria do Globo. No mesmo ano traduz desse escritor “O círculo vermelho” e “A porta das sete chaves”. Colabora na página dominical dos jornais “Diário de Notícias” e “Correio do Povo”.

Em 1932, é promovido a Diretor da “Revista do Globo”, ocasião em que é convidado por Henrique Bertaso, gerente do departamento editorial da “Livraria do Globo”, a atuar naquela seção, indicando livros para tradução e publicação. Sua obra de estréia, “Fantoches”, uma coletânea de histórias em sua maior parte na forma de peças de teatro. Foram vendidos 400 exemplares dos 1.500 publicados. A sobra, um incêndio queimou.

Traduz, em 1933, “Contraponto”, de Aldous Huxley, que só seria editado em 1935. Seu primeiro romance, “Clarissa”, é lançado com tiragem de 7.000 exemplares.

Seu romance “Música ao longe” o faz ser agraciado com o Prêmio Machado de Assis, da Cia. Editora Nacional, em 1934. No ano seguinte, nasce sua filha Clarissa. Outro romance, “Caminhos cruzados”, recebe o Prêmio Fundação Graça Aranha. O autor admite a associação desse romance a “Contraponto”, de Aldo Huxley, o que faz com que seja mal recebido pela direita e atice a curiosidade e a vigilância do Departamento de Ordem Política e Social do Rio Grande do Sul, que chegou a chamá-lo a depor, sob a acusação de comunismo. São publicados, ainda nesse ano, “Música ao longe” e “A vida de Joana d’Arc”. Realiza sua primeira viagem ao Rio de Janeiro (RJ), onde faz contato com Jorge Amado, Murilo Mendes, Augusto Frederico Schmidt, Carlos Drummond de Andrade, José Lins do Rego e outros mais. Seu pai falece.

Em 1936, publica seu primeiro livro infantil, “As aventuras do avião vermelho”. Lança, também, “Um lugar ao sol”. Cria o programa de auditório para crianças, “Clube dos três porquinhos”, na Rádio Farroupilha, a pedido de Arnaldo Balvé. Dessa idéia surge a “Coleção Nanquinote”, com os livros “Os três porquinhos pobres”, “Rosa Maria no castelo encantado” e “Meu ABC”. Lança a revista “A novela”, que oferecia textos canônicos ao lado de outros, de puro entretenimento. Nasce seu filho Luis Fernando. É eleito presidente da Associação Rio-Grandense de Imprensa.

O DIP - Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo, exige que o autor submeta previamente àquele órgão as histórias apresentadas no programa de rádio por ele criado, em 1937. Resistindo à censura prévia, encerra o programa. Outra reação ao nacionalismo ufanista da ditadura Vargas se faz sentir na versão para didática da história do Brasil em “As aventuras de Tibicuera”.

Um de seus maiores sucessos, “Olhai os lírios do campo”, é lançado em 1938. Publica, nesse mesmo ano, “O urso com música na barriga”, da “Coleção Nanquinote”.

Erico passa a dedicar a maior parte de seu tempo ao departamento editorial da Globo, em 1939. Em companhia de seus companheiros Henrique Bertaso e Maurício Rosenblatt, é responsável pelo sucesso estrondoso de coleções como a Nobel” e da “Biblioteca dos Séculos”, nas quais eram encontrados traduções de textos de Virginia Wolf, Thomas Mann, Balzac e Proust. Mesmo assim, com todo esse trabalho, arranja tempo para lançar, ainda da série infantil, “A vida do elefante Basílio” e “Outra vez os três porquinhos”, e o livro de ficção científica “Viagem à aurora do mundo”.

Em 1940, lança “Saga”. Pronuncia conferências em São Paulo (SP). Traduz “Ratos e homens”, de John Steinbeck; “Adeus Mr. Chips” e “Não estamos sós”, de James Hilton; “Felicidade” e “O meu primeiro baile”, de Katherine Mansfield. Faz sua primeira noite de autógrafos na Livraria Saraiva.

Passa três meses nos Estados Unidos, a convite do Departamento de Estado americano, em 1941, proferindo conferências. As impressões dessa temporada estão em seu livro “Gato preto em campo de neve”. Ele e seu irmão Enio são testemunhas de um suicídio: uma mulher se atira do alto de um edifício quando conversavam na praça da Alfândega, em Porto Alegre. Esse acontecimento é aproveitado em seu livro “O resto é silêncio”.

A censura no estado novo continuava atenta. A Globo cria a Editora Meridiano, uma subsidiária secreta para lançar obras que pudessem desagradar ao governo. Essa editora publica “As mãos de meu filho”, reunião de contos e outros textos, em 1942.

No ano seguinte, publica “O resto é silêncio”, livro que merece críticas pesadas do clero local. Temendo que a ditadura Vargas viesse a causar-lhe danos e á sua família, aceita o convite para lecionar Literatura Brasileira na Universidade da Califórnia feito pelo Departamento de Estado americano. Muda-se para Berkley com toda a família.

O Mills College, de Oakland, Califórnia, onde dava aulas de Literatura e História do Brasil, confere-lhe o título de doutor Honoris Causa, em 1944. É publicado o compêndio “Brazilian Literature: An Outline”, baseado em palestras e cursos ministrados durante sua estada na Califórnia. Esse livro foi publicado no Brasil, em 1955, com o título “Breve história da literatura brasileira”.

Passa o ano de 1945 fazendo conferências em diversos estados americanos. Retorna ao Brasil.

Em 1946, publica “A volta do gato preto”, sobre sua vida nos Estados Unidos.

Inicia, em 1947, a escrever “O tempo e o vento”. Previsto para ter um só volume, com aproximadamente 800 páginas, e ser escrito em três anos, acabou ultrapassando as 2.200 páginas, sob a forma de trilogia, consumindo quinze anos de trabalho. Traduz “Mas não se mata cavalo”, de Horace McCoy. Faz a primeira adaptação para o cinema de uma obra de sua autoria: “Mirad los lírios Del campo”, produção argentina dirigida por Ernesto Arancibia que tinha em seu elenco Mauricio Jouvet e Jose Olarra.

No ano seguinte, dedica-se a ordenar as anotações que vinha guardando há tempos e dar forma ao romance “O continente”. Traduz “Maquiavel e a dama”, de Somerset Maugham.

”O continente”, primeiro volume de “O tempo e o vento”, é finalmente publicado, em 1949, recebendo muitos elogios da crítica. Recebe o escritor franco-argelino Albert Camus, autor de “A peste”, em sua passagem por Porto Alegre.

No ano de 1951, é lançado o segundo livro da trilogia “O tempo e o vento”: “O retrato”. O trabalho não tão bem recebido pela crítica como o primeiro livro.

Assume, em 1953, a convite do governo brasileiro, em Washington, E.U.A., a direção do Departamento de Assuntos Culturais da União Pan-Americana, na Secretaria da Organização dos Estados Americanos, substituindo a Alceu Amoroso Lima.

No ano seguinte, é agraciado com o prêmio Machado de Assis, concedido pela Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto de sua obra. Lança “Noite”, novela que é traduzida na Noruega, França, Estados Unidos e Inglaterra. Visita, face às funções assumidas junto à OEA, diversos países da América Latina, proferindo palestras e conferências.

De volta ao Brasil, em 1956, lança “Gente e bichos”, coleção de livros para crianças. Sua filha casa-se com David Jaffe e vai morar nos Estados Unidos. Dessa união nasceriam seus netos Michael, Paul e Eddie.

Em 1957, publica “México”, onde conta as impressões da viagem que fizera àquele país.

”O arquipélago”, terceiro livro da trilogia “O tempo e o vento”, começa a ser escrito em 1958. Tem um mal-estar ao discursar na abertura de um congresso em Porto Alegre. Consegue se refazer e disfarçar o ocorrido.

Acompanhado de sua mulher e do filho Luis Fernando, faz sua primeira viagem à Europa, em 1959. Expõe sua defesa à democracia em palestras proferidas em Portugal e entra em choque com a ditadura salazarista. Lança “O ataque”, que reunia três contos: “Sonata”, “Esquilos de outono” e “A ponte”, além de um capítulo inédito de “O arquipélago”. Passa uma temporada na casa de sua filha, em Washington.

Dedica-se, em 1960, a escrever “O arquipélago”.

Em 1961, sofre o primeiro infarto do miocárdio. Após dois meses de repouso absoluto, volta aos Estados Unidos com sua mulher. Saem os primeiros tomos de “O arquipélago”.

O terceiro tomo de “O Arquipélago” é publicado em 1962, concluindo o projeto de “O tempo e o vento”. O volume é considerado uma obra-prima. Visita a França, Itália e a Grécia.

A mãe do biografado falece em 1963.

Em 1964, seu filho Luis Fernando casa-se com Lúcia Helena Massa, no Rio de Janeiro, cidade para a qual ele se mudara em 1962. Dessa união nasceriam Fernanda, Mariana e Pedro. Insurge-se contra o golpe militar e dirige manifesto a seus leitores em defesa das instituições democráticas. Recebe o título de “Cidadão de Porto Alegre”, conferido pela Câmara de Vereadores daquela cidade.

Ganha o Prêmio Jabuti – Categoria “Romance”, da Câmara Brasileira de Livros, em 1965, com o livro “O senhor embaixador”. Volta aos Estados Unidos.

A convite do governo de Israel, visita aquele país em 1966. Vai aos Estados Unidos, mais uma vez, visitar seus familiares. Escreve “O prisioneiro”, que seria lançado em 1967. A Editora José Aguilar, do Rio de Janeiro, publica, em cinco volumes, o conjunto de sua ficção completa. Desse conjunto faz parte uma pequena autobiografia do autor, sob o título “O escritor diante do espelho”.

”O tempo e o vento”, sob a direção de Dionísio Azevedo, com adaptação de Teixeira Filho, estréia na TV Excelsior, em 1967. No elenco, Carlos Zara, Geórgia Gomide e Walter Avancini.

É agraciado com o prêmio “Intelectual do ano” (Troféu Juca Pato”), em 1968, em concurso promovido pela “Folha de São Paulo” e pela “União Brasileira de Escritores”.

No ano seguinte, a casa onde Erico nascera, em Cruz Alta, é transformada em Museu Casa de Erico Verissimo. Lança “Israel em abril”.

Em 1971, é editado o livro “Incidente em Antares”.

Em 1972, comemorando os 40 anos de lançamento de seu primeiro livro, relança “Fantoches”, onde o autor acrescentou notas e desenhos de sua autoria.

Amplia sua autobiografia, publicada em 1966, fazendo surgir suas memórias — sob o título de “Solo de clarineta” — cujo primeiro volume é publicado em 1973.

O escritor falece subitamente no dia 28 de novembro de 1975, deixando inacabada a segunda parte do segundo volume de suas memórias, além de esboços de um romance que se chamaria “A hora do sétimo anjo”.

Carlos Drummond de Andrade faz homenagem ao amigo fazendo publicar o seguinte poema:

A falta de Erico Verissimo

Falta alguma coisa no Brasil
depois da noite de sexta-feira.
Falta aquele homem no escritório
a tirar da máquina elétrica
o destino dos seres,
a explicação antiga da terra.

Falta uma tristeza de menino bom
caminhando entre adultos
na esperança da justiça
que tarda - como tarda!
a clarear o mundo.

Falta um boné, aquele jeito manso,
aquela ternura contida, óleo
a derramar-se lentamente.
Falta o casal passeando no trigal.

Falta um solo de clarineta.
Postumamente, é lançado, em 1976, “Solo de clarineta – Memória 2”, organizada por Flávio Loureiro Chaves.

”Olhai os lírios do campo”, com adaptação de Geraldo Vietri e Wilson Aguiar Filho, é a novela apresentada pela TV Globo, em 1980, sob a direção de Herval Rossano. No elenco, Cláudio Marzo e Nívea Maria.

É instalado, no programa de Pós-Graduação em Letras da PUC-RS — como projeto de pesquisa do CNpQ, o Acervo Literário de Erico Verissimo, em 1984. A coordenação fica a cargo da professora Maria da Glória Bordini.

No ano seguinte, a Rede Globo leva ao ar a série “O tempo e o vento”, adaptação de Doc Comparato e Regina Braga, direção de Paulo José, com Glória Pires, Armando Bogus, Tarcísio Meira e Lima Duarte, entre outros.

Em 1986, o Museu de Cruz Alta torna-se Fundação Erico Verissimo.

“Incidente em Antares”, adaptado por Charles Peixoto e Nelson Nadotti, com direção de Paulo José e constando de seu elenco Fernanda Montenegro,e Paulo Betti, é apresentada pela Rede Globo.

A UFRS homenageia o autor, pela passagem dos 90 anos de seu nascimento, com uma mostra documental no salão de sua Reitoria. A PUC-RS realiza seminário internacional, coordenado por seu Programa de Pós-Graduação em Letras, em 1995.

Organizada por Maria da Glória Bordini, publica-se, em 1997, “A liberdade de escrever”, coletânea de entrevistas do autor sobre política e literatura.

Em 2002, a Globo inicia a edição definitiva da obra completa do autor. É inaugurado o Centro Cultural Erico Verissimo, destinado à preservação do Acervo Literário e da memória literária do Rio Grande do Sul.

OBRAS DO AUTOR

Contos:

Fantoche -1932
As mãos de meu filho – 1942
O ataque – 1958

Romances:

Clarissa – 1933
Caminhos cruzados – 1935
Música ao longe – 1936
Um lugar ao sol – 1936
Olhai os lírios do campo – 1938
Saga – 1940
O resto é silêncio – 1943
O tempo e o vento (1ª parte) — O continente – 1949
O tempo e o vento (2ª parte) — O retrato – 1951
O tempo e o vento (3ª parte) — O arquipélago – 1961
O senhor embaixador – 1965
O prisioneiro – 1967
Incidente em Antares – 1971

Novela:

Noite – 1954

Literatura Infanto-Juvenil:

A vida de Joana d’Arc – 1935
As aventuras do avião vermelho – 1936
Os três porquinhos pobres – 1936
Rosa Maria no castelo encantado – 1936
Meu ABC – 1936
As aventuras de Tibicuera – 1937
O urso com música na barriga – 1938
A vida do elefante Basílio – 1939
Outra vez os três porquinhos – 1939
Viagem à aurora do mundo – 1939
Aventuras no mundo da higiene – 1939
Gente e bichos – 1956

Narrativas de viagens:

Gato preto em campo de neve – 1941
A volta do gato preto – 1946
México – 1957
Israel em abril – 1969

Autobiografias:

O escritor diante do espelho – 1966 (em “Ficção Completa”)
Solo de clarineta – Memórias (1º volume) – 1973
Solo de clarineta – Memórias 2 – 1976 (ed. póstuma, organizada por Flávio L. Chaves)

Ensaios:

Brazilian Literature – an Outline – 1945
Rio Grande do Sul – 1973
Breve história da literatura brasileira – 1995 (tradução de Maria da Glória Bordini)

Biografias:

Um certo Henrique Bertaso – 1972

Adaptações para o cinema:

Mirad los Lirios Del Campo, Argentina – 1947
Baseado em Olhai os lírios do campo

O sobrado, Brasil – 1956
Baseado em O tempo e o vento

Um certo capitão Rodrigo, Brasil – 1970
Baseado em O tempo e o vento

Ana Terra, Brasil – 1971
Baseado em O tempo e o vento

Noite, Brasil – 1985
Baseado em Noite

Adaptações para a televisão:

O tempo e o vento, Brasil – 1967
Baseada em O tempo e o vento
Novela de Teixeira Filho
TV Excelsior.

Olhai os lírios do campo, Brasil – 1980
Baseada em Olhai os lírios do campo
Novela de Geraldo Vietri e Wilson Aguiar Filho
TV Globo.

O resto é silêncio, Brasil – 1981
Baseado em O resto é silêncio
Telerromance de Mario Prata
TV Cultura.

Música ao longe, Brasil – 1982
Baseado em Música ao longe
Telerromance de Mario Prata
TV Cultura.

O tempo e o vento, Brasil – 1985
Baseada em O tempo e o vento
Minissérie de Doc Comparato
TV Globo.

Incidente em Antares, Brasil – 1994
Baseada em Incidente em Antares
Minissérie de Charles Peixoto e Nelson Nadotti
TV Globo.

Fontes:
Cadernos de Literatura Brasileira. n.16. novembro de 2003. Instituto Moreira Salles.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Érico_Veríssimo
http://www.estado.rs.gov.br/erico/

Lenda Guarani (A Origem do Mate)


Os cânticos de guerra reboaram na floresta, e Itabaetê marchou com seus homens à procura do grande acampamento. Toda a tribo partira, levando nos olhos o brilho da vitória. Só um homem, enfraquecido pelo peso dos anos, não pudera seguir nesta nova arrancada guerreira. E ficara chorando no oito de uma coxilha, olhar estendido à linha de combatentes que serpenteava pelos caminhos. Mesmo depois da tribo ter desaparecido no véu da grande mata, ainda o velho índio permanecera numa atitude de estátua, mudo, enovelado em mil recordações das pelejas passadas. Voltava, em pensamento. àqueles tempos em que seu braço era o mais temido da tribo, a sua flecha a mais certeira, os seus olhos os mais seguros a perscrutar a imensidão das noites, Agora, fraco, envelhecido, estava condenado a atirar-se inativo ao fundo das matarias. Para seu consolo, restavam-lhe apenas as recordações, e a beleza de Yarí, a mais jovem e a mais formosa de suas filhas - a qual, surda ao convite de muitos guerreiros enamorados, preferira permanecer junto ao velho pai, adoçando-lhe as últimas horas de vida com o mel de seus sorrisos.

Um dia, chegou ao rancho do velho guarani um viageiro estranho - roupagem colorida, olhos lembrando o azul de céus longínquos. O guarani logo percebeu que o homem vinha de terras distantes, muito além das matas do Maracaju, matas que ele cortara, vibrando de entusiasmo, nas caminhadas de outrora. A porta de couro de seu rancho abriu-se inteiramente, recebendo o estrangeiro. Yarí foi buscar os frutos mais lindos da floresta, e o mel mais doce das mirins. E o seu velho pai, cerrando um pouco os olhos para melhor buscar as riquezas de um mundo afastado no tempo, recordava episódios de sua mocidade, entusiasmava-se no relato das caçadas perigosas e dos entreveros ruidosos. Tudo foi feito para que as horas que o estrangeiro passasse naquele rancho fossem cheias de contentamento.

Desceu a noite sobre a terra e a rede foi estendida para o sono do visitante. Seus sonhos foram povoados pela voz suave da virgem, entoando as cantigas guaranis. E no outro dia, quando o sol espiou por entre os ramos mais baixos do arvoredo, foi encontrar o estrangeiro já pronto para seguir viagem.

- Em tuas mãos repousa a generosidade das fontes cristalinas... - disse ele ao velho índio. - Em teu coração se abriga a hospitalidade das planuras infindas dos charruas, onde os campos se abrem em mil caminhos sem estender nada que impeça o andar do viageiro; no corpo de tua filha se esconde a pureza dos o1hos-d’água e a alegria das madrugadas de minha terra. Tanta virtude merece ser recompensada. Venho dos domínios de Tupá, o Deus do Bem. Pede o que quiseres!

- Nada mereço pelo que fiz, senhor! -, respondeu o guarani. - Mas como a bondade imensa de Tupá quer pousar suas mãos sabre este rancho pobre, eu pediria mais um pouco de alento para os últimos passos do meu viajar. Outrora, eu guiava pelos caminhos da guerra um sem-fim de guerreiros; hoje, somente minha filha enche de vida as minhas horas derradeiras. Eu quisera um outro companheiro, que atirasse doçura aos meus lábios e descanso ao meu coração. Alguém que fosse meu último amigo, um amigo fiel. Assim, Yarí poderia seguir o rastro da nossa tribo, onde os jovens anseiam por seu amor para continuarem mais confiantes no caminho da vitória. É o que peço, senhor: um amigo fiel, um companheiro que encha de doçura a horas amargas da saudade...

O emissário de Tupá sorriu. Em suas mãos brilhava - recoberta de uma luz estranha - uma planta repleta de folhagens verdes, donde se desprendia um perfume de bondade, talvez o mesmo perfume de Tupá.

- Deixa crescer esta planta, e bebe de suas folhas! - disse o enviado de Deus. - Bebe de suas folhas, e terás o companheiro que pedes! Esta erva, que traz em si a graça do Tupá, se estenderá pelas matas, trazendo o conforto não só a ti mas a todos os homens de tua tribo. E tu, Yarí, serás a protetora das florestas que haverão de surgir. Os guerreiros provarão a mesma delícia de teu carinho ao sorver esta bebida; as caminhadas de guerra serão menos fatigantes, e os dias de descanso mais felizes...

E já se afastando do rancho, o enviado de Tupá repetiu:

- Terás um companheiro fiel, velho chefe guarani... E será a protetora de tua raça, Caá-Yarí...

E desde então Caá-Yarí é a senhora dos ervais e a deusa dos ervateiros. Todos merecem dela o máximo de auxilia, se lhe são fiéis. E se algum ervateiro, ainda não satisfeito com aquela proteção, quiser ver a fartura escorrendo de seus dedos, poderá fazer com ela um pacto sagrado. Bastará entrar numa igreja, durante a Semana Santa, e pedir Caá-Yarí em casamento, jurando viver para sempre nos ervais, voltado somente para o culto de sua deusa, sem nunca mais amar outra mulher... Deixará, depois, num ramo de erva-mate, um bilhete no qual marca um encontro com a bela protetora das florestas No dia marcado, deverá penetrar no fundo da mataria, onde Caá-Yarí lhe provará a bravura, interrompendo-lhe o caminho com serpentes e feras. E se o ervateiro for corajoso e forte, vencendo a todos os perigos, receberá a recompensa de Yarí.

Sua vida será toda tomada pelo amor da jovem deusa. Suas noites serão cheias de prazer, e seus dias cheios de fartura. Os ervais se despirão por encanto, enchendo os surrões de couro sem que ele tenha gasto o mínimo de esforço. Na hora da pesagem, Caá-Yarí - que é invisível para todos menos para o seu amante - pousará sobre os feixes de erva, aumentando o peso da colheita. A felicidade será eterna para o ervateiro!

Eterna... se ele não quebrar seu juramento... Pois se alguma mulher consegue desnorteá-lo, haverá de lhe entregar, junto às carícias, a sentença da desgraça. Um dia, o ervateiro será encontrado estirado no meio dos ervais, inexplicavelmente morto, ou então correndo pelas florestas, ensangüentado, delirando, louco!

É a vingança de CaáYarí! Ela jamais perdoa!

Fontes:
http://www.lendas-gauchas.radar-rs.com.br/a_origem_do_mate_guaranis.htm

A Origem do Mate, segundo os jesuítas


Um dia Cristo desceu à terra, acompanhado por São João e São Pedro, e veio ter às selvas americanas. Depois de um penoso viajar pelas florestas sem fim, encontrou - perdido no fundo dos bamburrais - o rancho de um velho índio que ali morava em companhia de sua filha, jovem de deslumbrante formosura. Os três viajantes foram muito bem recebidos, e Jesus resolveu premiar aquela franca hospitalidade que encontrara no rancho do silvícola. Indagando-lhe o que mais desejava em sua vida, recebeu esta resposta:

- Senhor! Anhangá tomou conta dos corações humanos: as guerras incendeiam os campos de minha terra, e não há mais tranqüilidade nas tabas de meu povo. Vencedores, os guerreiros não poupam os vencidos: os homens são trucidados e as mulheres jovens são arrastadas a satisfazer os mais baixos instintos. Por isso, fugi de minha tribo e vim enterrar-me no escuro das florestas. Não por salvar-me, que pouco me resta viver. Mas para afastar minha filha das garras do pecado. Sei que em breve morrerei, e o que mais me acabrunha é pensar que a deixarei desprotegida, novamente exposta à fúria das paixões. Assim, Senhor, se alguma cousa me fosse dado pedir, eu pediria uma eterna proteção à alma de minha filha. Que ela fosse eternamente bondosa, eternamente pura, eternamente linda:

Respondeu Jesus:

- Se Anhangá hoje impera em tuas selvas, podes crer que o Deus-do-bem voltará a estender seu manto de paz sobre a taba de teus irmãos. As selvas se encherão de cânticos e as almas se encherão de luz. É o Deus-do-Bem que me envia para proteger teu povo... Tu, que foste bom, generoso e hospitaleiro, mereces ser recompensado. Farei de tua filha aquilo que me pedes. Símbolo da bondade, ela retribuirá o mal com o bem: aos que quiserem roubar as delícias do seu corpo, premiará com a fartura nos ranchos. E nenhuma força será capaz de abatê-la, pois por mais que a queiram aniquilar, sempre haverá de renascer, triunfante, trazendo força e inteligência aos homens de tua raça. Tua filha será eternamente linda e eternamente pura, pois. transformá-la-ei na mais linda e mais pura das árvores; linda no contorno das folhagens e pura no manto verdejante que lhe descerá até os pés. Tua filha será eternamente linda, eternamente pura e bondosa...

E Deus a transformou na erva-mate...

SÂO TOMÉ NA AMÉRICA

Quando, em 1624, os padres Montoga e Mendonza fundaram a vila de Encarnación, importante missão jesuítica posteriomente destruída, tiveram curiosidade em saber o que pensavam os silvícolas a respeito do mate, bebida que já constituía um hábito característico do Paraguai. Tiveram por resposta que a erva-mate lhes servia de alimento e remédio desde o dia em que Pai-Zumé, um estranho personagem que há muito tempo estivera naquelas tabas, lhes ensinara como aproveitar as folhas da caá (que até então julgavam venenosas), e como lhes usufruir os efeitos medicinais. Contavam também os indígenas que Zumé era um homem poderoso: as selvas brutas conservavam intacto o caminho por onde ele passara, desde o Tibagi até o Piquiri; e às margens deste rio, Zumé havia deixado, numa pedra, o sinal de seus pés - testemunho eterno de sua passagem por aquelas terras.

Os dois jesuítas logo aliaram a figura de Zumé à pessoa de São Tomé, o apóstolo que provavelmente teria visitado o continente americano pregando a doutrina de Cristo. A versão cristianizada da lenda logo se espalhou entre as populações brancas, e em breve era voz corrente que a erva-mate havia sido descoberta e bendita pelas mãos de São Tomé. Isto é o que vamos encontrar em muitos livros da época, a iniciar-se pelo “Tratado sobre o uso do mate no Paraguai”, escrito pelo licenciado Diego Zevallos em meados do século XVII e publicado em Lima no ano de 1667.

Lozano, no capítulo VIII de sua “História de la Conquista del Paraguay”, também se refere a São Tomé, narrando que durante uma terrível peste que assolara as tribos guaranis, foi aquele santo o salvador do gentio, ensinando-lhes como preparar a erva-mate, eficaz remédio contra aquela epidemia e muitas outras doenças.

A peste foi vencida, e a milagrosa bebida, cujo uso se generalizara por todas as tabas guaranis, continuou a prestar inúmeros benefícios. E por muito tempo os selvícolas guardaram na memória a figura daquele bom Zumé, que um dia, apesar das súplicas e protestos gerais, teve de deixar as terras do Paraguai.

Santo Tomé lhes responde:

“Os tengo que abandonar
Porque Cristo me ha mandado
Otras tierras visitar.
En recuerdo de mi estada
Una merced os he de dar,
Que es la yerba paraguaya
Que por mi bendicta está”.
Santo Tomé entró en el rio
Y en peana de cri tal
La aguas se lo llevaron
A las l anuras del mar.
Los indios, de zu partida
No se pueden consolar,
y a Diós sempre están pidiendo
Que vuelva Santo Tomás.

(Trecho extraído do livro "História do Chimarrão", de Barbosa Lessa, publicado em 1a. edição pelo Departamento de Cultura da Prefeitura do Município de São Paulo e editado posteriormente em 2a. edição pela Livraria Sulina.

Fontes:
http://www.lendas-gauchas.radar-rs.com.br/a_origem_do_mate_jesuitas.htm

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Ivy Menon (Livro de Poesias)


AUSÊNCIA

Não. Não penso em homens.
Meu corpo esvaziou-se de sonhos.
As madrugadas insones lembram-me nomes.
Como quando se caminha de noite
e se distancia das luzes até que, antes da curva da estrada,
elas se tornem apenas vaga-lumes tontos no horizonte.

Não. Não há o que me console, lá atrás.
Não é possível, gritando nomes,
resgatar a alma que se desgarrou de mim.
E vaga-lumes fogem da alva.

INVERNO

as Sibipirunas choram
escorrem
folhas secas
nas calçadas

não compreendem suas dores
a nudez dos galhos
a mudez
da sombra rala

os meninos riem
sujos de barro
abrem caminho para as flores

A BOCA NUA

Tua boca lua cheia de polpa
Doce, gosto de cidreira melódica
escorrida de acordes Sabiá-laranjeira
Acorda, noite sempre é dia ávido de rir
lábios dançam sorrisos, vestem linho carmesim
e pérolas, estrelas, colares em mim.
Saliva, sal, cortinas de seda que se me abrem,
derramam-se meus seios nus em ti.

O POEMA

O Poema jorra pétalas brancas
Rosas brancas, pálidas de espanto
ao vento, asas arremessadas, livres
pelo ar.

O Poema surpreendente doçura
mistura mel e terra, fruta-do-conde
Laranja craveira, sorva gomo a gomo

O Poema brota morno, doido
aos borbotões as lágrimas de gozo
inundam as mãos, ávidas mãos.

SUPRA-SUMO

vejo-me pequena menina favelada
em eternas cavalgadas pelo mamonais
verdes madrigais, eu e eles, nativos

acho que brotei da terra...terra vermelha
tão vermelha quanto o nariz dos italianos
que também brotaram dali.

e meus ramos, ervas daninhas
subindo livres,alegremente livres
no rumo da galharia
em direção ao céu, tão meu
tão brejeiro, próximo
sobrenatural

lembro-me crescendo meio
meio empertigada
com raízes incrustadas nas montanhas de pós-de-serra
creio que vim da terra com seus trigais amarelos
tão amarelos quanto os dentes dos italianos
com seus fumos-de-corda que também se fixaram ali.
e os meus cachos lisos e frescos
ganharam espaço, alçaram vôo
soltos no céu tão italiano, surreal.
enxergo-me mulher
meio arteira, meio inteira
nas incansáveis caminhadas
pelo teu corpo nu – e marrom –
tão marrom – e nu – quanto os italianos
que mudaram de cor quando perderam o tempo
e misturaram-se à terra dali
e meus rumos, incertos, sem prumos
cavalgam trigais verde-amarelos
e intimido-os se fixo em mim o infinito

de resto:
para o teu grito
o meu urro
para o teu resumo
o meu supra-sumo!

SILÊNCIO

o poema do descanso
faz cafuné
e dá colo
e nina
e põe na cama
é leve e cândido
e breve
e nem tem rima
o poema do descanso
só abraça
e silencia

BORBOLETA

rasga a casca,
crisálida, abre-se
e, só asas,
abraça o céu...

DISTRAÇÃO

bem-te-vi
pensa que não te vi?
descuide-me
eu me distraí
e seduziste-me a bermuda amarela...

URBANA

a borboleta passeia
plana
planeja
pousa
e rouba a cena

FELICIDADE

Foco
Foca
Bola no nariz
Que felicidade
É coisa de criança
E palhaços

MARIA

– maria, desce daí
maria pequena
maria menina
você vai cair!

uma voz que grita
eita voz que clama!
uma voz que zanga
voz que quer ser gente
menina que não quer crescer!

e a primavera não chega
e o inverno não passa
e esta vida rápida
me arrasta
e balança minha maria

sou eu mesma, a maria
e morro a cada dia

essa vida
sacode minhas tranças
balança minhas redes
quebra-me os galhos
despedaça-me em retalhos
corta-me os atalhos

– suba não, maria.
que subida é risco
– também é riso –
é perigo
rio em topo de montanha

sou maria
sou estranha
perco os sentidos
não temo quedas
foram tantas
foram tamanhas

dói muito ser maria
quero ser promovida
a Clarice.

MENINO

- vive menino!
e o menino ri
samba no sapato
grandemaior que o pé...

- anda menino!
e o menino corre
voa vira bala
ladeira abaixo...

- ri menino!
e o menino deita-e-rola
e amolece
e gargalha
e o nariz escorre...

- fala menino!
e o menino cala
emudece
empaca
faz pirraça...

- come menino!
e o menino cospe
faz pouco
vomita no prato
raso de refeição...

- cresce menino!
e o menino chora
esbraveja
sapateia
esperneia...
mas obedece...
cresce
e... morre o menino!

Ivy Menon (1958)



Ivy Menon nasceu em Cornélio Procópio – Paraná, no dia 31 de outubro de 1958.

Poetisa, bóia-fria até os 20 anos, Ivy, desde pequena, amava os livros e os bancos da biblioteca. Depois de sair da roça, foi jornalista, durante dez anos, tendo iniciado as atividades, nesta área, em O Diário do Norte do Paraná, em Maringá. Formada em Direito, com especialização em Direito do Trabalho, hoje atua na Justiça do Trabalho de Maringá.

Em dezembro de 2006, ganhou o primeiro lugar no I Concurso Carioca de Poesia promovido pela Associação Brasileira Cultural de Apoio à Cidadania (Abraci) em parceria com a Academia Brasileira de Letras (ABL) e com a Federação Nacional de Cultura (Fenac).

Seu primeiro livro de poesia, “Flores Amarelas”, prêmio recebido pelo primeiro lugar no referido concurso, foi lançado, no Rio de Janeiro, em abril de 2007.

Seus autores preferidos, pelos quais se sente influenciada, são: Mário Quintana, Fernando Pessoa , Paulo Leminski e Cora Coralina.

Ocupa a Cadeira nº. 31, da Academia de Letras de Maringá, cujo patrono é Olavo Bilac.

Fonte:
Academia de Letras de Maringá

Secretaria da Cultura de Maringá (Programação de Abril)



De 01 a 30/04 – Painel sobre “Monteiro Lobato”, elaborado por Sueli Gonçalves, na Biblioteca Centro.

Dia 29/04, às 15 horas – Promoção “Doce leitura” – Sorteio de ovos de páscoa entre os usuários da Biblioteca Operária que emprestaram materiais de leitura durante os meses de março e abril. Cada empréstimo dá direito a um cupom para concorrer ao sorteio. Patrocínio: Escritório Gomes de Contabilidade.
CLUBETEEN / HORA DA HISTÓRIA (entrada franca)

Livro: “Eclipse”, de Stephenie Meyer.
Dia 28/04, às 14 horas, na Biblioteca Palmeiras.

Livro: “Marcelo, Marmelo, Martelo”, de Ruth Rocha.
Dia 28/04, às 10 horas, na Biblioteca Mandacaru. Coordenadora: Eliana Penido.

Livro: “O ladrão de raios”, de Rick Riordan. Contadora: Marcia Santa Maria.
Dia 22/04, às 15 horas, na Biblioteca Mandacaru.

Filme e bate papo: “Lua Nova”
Dia 27/04, às 14 horas, na Biblioteca Mandacaru.
Dia 29/04, às 14 horas, na Biblioteca Centro.
Filme e bate papo: “Entrevista com o vampiro”
Dia 30/04, às 14 horas, na Biblioteca Alvorada.

CLUBINHO DE LEITURA (entrada franca)

Livro: “Festa no céu”, de Ana Maria Machado. Coordenação: Márcia Santa Maria. Painel: Sueli Gonçalves. Contadora: Luana Moscatto Orsini.
Dia 30/04, às 15 horas, na Biblioteca Operária.
CONVITE AO TEATRO (sempre no Teatro Barracão, às 20h30min, entrada franca).

Dias 23 e 30/04 – “O menino que ganhou uma boneca”, direção de Majô Baptistoni, com a Cia Tipos e Caras.

Fonte:
Colaboração da Academia de Letras de Maringá

Lançamento do Livro de Trovas de Manuel Maria (Meu Pequeno Mundo)

Clique sobre a umagem para ampliar

domingo, 18 de abril de 2010

Carlos Felipe Moisés (Livro de Poesias)


GRAMÁTICA

1. Fonética

Datilo
grafo
meu espasmo rude
em teu peito
e os dedos cravam
entre a bilabial
e a sibilante
o Ó
inaudível.

2. Vogais

Adiar
odiar
ode e ar.
As vogais se espalham
no céu da boca
e o sopro adiado
imobiliza
a língua
em forma de U.

3. Morfologia

Mastigo
um naco de sombra
e um assombro
de sílabas mudas
escorre dos dentes
entre os escombros
da memória calcinada.

4. Etimologia

Saber de cor
a água
a cor da pele
cada anseio
que a língua
recolhe.
Saber de cor
o coração.

5. Pontuação

Fotograma
atrás de fotograma
teu rosto
é a prolongada pausa
impressa na retina
entre parênteses
do travesseiro.

6. Linguagem figurada

Tropel de trapos
lençol amarfanhado
a convulsão
de umas sílabas rebeldes
desarrumando a cama
& a folha em branco:
o peito de quem ama.

7. Conjugação

Eu me arquipélago
tu te maravilhas
ele se istma
nós nos montanhamos
vós vos espraiais
eles se eclipsam.

DEVOLUÇÃO

A noite veio, dispersou meu corpo,
e os ventos me passearam pelo campo.
Ah minha carne misturada à terra,
meus ossos desmanchando-se no frio
secular dos rios que me despejam
envolto em musgo e lama contra as pedras.
Meus olhos desmoronam-se no verde
e a paisagem traspassa-me as retinas.
Meus dedos carcomidos se desfazem
pelos vãos das folhas, de volta ao pó.
De minha boca inútil nascem rosas
brancas, Eu chovo, eu vicejo, eu me planto,
e um dia eu vou brotar por entre as pedras
frias, mais puro, transformado em verde.

RETRATO

Ah quem viu? Quem vê?
Onde se esconde a pátina invisível
que cobrindo está
eu sei
estas palavras
estas mãos
o sono
e quando olho é brisa?
O mundo exíguo aumenta
no soluço reticente.
Ponte rio estrada
o céu a casa
e o corpo descontente.
Mulher? Criança? Não foi.
É o sol
que lentamente se levanta
e grava a solitária imagem
em pálpebras reclusas.
Absurdo, o amor desliza.
Oferta sonho recusa
repto sudário:
o amor é vário
e as vozes obtusas.
Foi? Não foi?
Palácio ou cornamusa
o mundo nítido é fatal ausência.
O céu — destino
a intenção — certeza
e a incerteza se desnuda
na moldura breve do meu riso.

AS FORMAS DO BRANCO

Caminho pela neve
e o mundo principia neste branco.
Tenho a verdade, sonho breve,
branco retido no branco.

Girassol amanhecido longe,
a verdade apareceu-me nesse branco.
Tempo devorado como carne, corpo ferido,
vermelho sobre o branco.

Os pássaros nascem nas nuvens,
azul distante.
Tinha a verdade, perdi-a:
branco escondido no branco.

FOLHA SOBRE FOLHA

Folha sobre folha
verde sobre cinza sobre folha
vento sobre folha
lento pobre manto cobre tanta
folha sobre folha.

O tempo se acumula,
quando sobre nunca,
até que o passado ressurja inteiro,
coberto de folhas,
memória liberta de si mesma.

CARREGO AS ESTAÇÕES

Carrego as estações comigo
e tenho as mãos cansadas.
(No bolso esquerdo um riacho murmura.)
Ali, onde pequenas pedras se acumulam,
uma canção exala seu vapor,
depois se perde.

Jardins de primavera circulam no meu corpo,
um céu de ouro verte seu perfume
e um vento ignorado agita suas asas.
Pasto de segredos,
mescla de memória e desejo,
meu corpo caminha com a chuva
(carrego as estações comigo),
à procura do sonho de uma nuvem fria.

Tantas folhas trago nos braços
que um pássaro, solidário, se oferece
para carregar as estações comigo.
Do peito aberto os meus jardins se vão
e o pássaro me ajuda (memória
e desejo) a semear meu corpo.

Ali planto meus braços,
debaixo daquelas árvores meus olhos ficam,
os pés, roídos pela terra, penduro numa árvore
e o tronco multiplico em cem pedaços –
lá vai, junto com as pedras,
no bojo do riacho antigo.

E pois que carrego as estações comigo,
os lábios deixo além, no descampado,
e peço ao pássaro que pelos cabelos atire
o que sobrou de mim
àquele mar onde me espera a memória
(e o desejo) do tempo em que não soube
carregar as estações comigo.

CAVALO ALADO

Foi como ervas e arrancaram-no.
Hoje pasta absorto em campo sombrio
(perdido vôo, exílio nefasto) e
lambe cicatrizes de ferida nenhuma.

Às vezes relincha, reclina
o dorso à procura de um rasto,
resto de fome clandestina,
mas não rasteja: ergue a fronte
e sopra dardos de fogo no horizonte.

O pouco do nada que lhe coube
é muito. O peito chora sem lágrimas
enquanto a cauda e a mansa crina
ondulam (brisa leve, pranto
alheio), rolando nas dunas
e nas ervas que foi, entre urzes.

Arrancaram-no mal raiou a madrugada.
Hoje pasta absorto entre sombras,
se alimenta da noite e sabe
que eterno dura. Mais nada.

MINOTAURO

Abrasado em sonho, uma vez foi rei
de um reino sem refúgio nem fronteira.
Reinou além do seu país e sua grei,
enquanto ruminava a hora derradeira.

Seu coração de lava incendiou
a memória de dálias e jacintos
e o segredo que o vento lhe negou
se converteu em treva e labirinto.

Estrelas e nuvens teve a seus pés
(o sonho azul de toda criatura)
e tudo recusou. Um trono fez
do nada em que abrigou sua loucura.

Hoje devora gafanhotos e o mel
destila do seu flanco sem idade.
Reino em ruínas, seu manto é o céu,
onde pasta serena majestade.

A PAIXÃO SEGUNDO CAMÕES

Transforma-se o amador em coisa alguma,
sem dolo, sem virtude, sem razão.
Por muito amar, dispersa o coração
e rói daquilo que é a alma nenhuma.

As esperanças perde, uma a uma,
de decifrar o rosto da paixão.
Sem rumo, ilhado entre o sim e o não,
perde-se no amor de um mar sem espuma.

Transforma-se o amador em coisa errante,
atira ao vento um grito enrouquecido,
buscando encontrar-se na coisa amada.

A pele rota, o gesto vacilante,
transforma-se, de amar como um perdido,
em sombra de si mesmo, ausência, nada.

FAUSTO

O dedo em riste
aponta o horizonte
e o ódio persiste
no rosto bifronte.

Morde e remorde
a própria língua,
mal ouve o acorde
esvaído à míngua.

A sanha incontida
arde e devora,
em dura lida,
o peito que chora.

O próprio sangue
escorre, incapaz
de aplacar, exangue,
a sede voraz.

O acorde a cantar.
O corpo é uma chama
e espalha no ar
o ódio que ama.
------------------

Fonte:
Jornal de Poesia.

Carlos Felipe Moisés (1942)


1942 – Nasceu no dia 20 de maio, na cidade de São Paulo, filho de Iolanda Ruivo e Jorge Moisés. São seus avós maternos Izolina de Castro Ruivo e João Ruivo; paternos, Ana Cória e Felipe Moisés – imigrantes portugueses e libaneses, respectivamente.

1945 - Os pais fixam residência no bairro do Canindé. No dia 18 de agosto nasce a irmã, Maria. (Oito dias depois, nascia também, em São Paulo, no bairro de Moema, Margarida Maria, que viria a ser a companheira de toda a vida.)

1954 – Inicia estudos secundários no Ginásio do Estado “Presidente Roosevelt” mas continua preferindo a liberdade das ruas do bairro, onde joga futebol, no time comandado pelos amigos e vizinhos, os irmãos Cláudio e Roberto. Este último, para orgulho do pai, Oswaldo Dias Branco, perseverou.

1956 – Colabora com logogrifos e problemas de palavras cruzadas na seção “Heureka”, dirigida por Sylvio Alves, na revista O Cruzeiro, e em publicações especializadas em charadismo e cruzadismo.

1957 – Começa a se interessar pelo colégio quando passa a participar das atividades esportivas, sociais e culturais do Grêmio XVI de Setembro e sobretudo quando é nomeado redator-chefe do tablóide O Ginásio do Estado, onde, estimulado pela professora de Português, dona Laís, publica seus primeiros poemas e crônicas.

1958 – Com o divórcio dos pais, começa a cuidar do próprio sustento. Experimenta alguns empregos de meio período, até se acertar, aos 16 anos, como revisor e redator, em tempo integral, na Livraria Editora Francisco Alves, sob as ordens do escritor sergipano Paulo Dantas. Matricula-se no colegial noturno, no mesmo Roosevelt.

1959 – Conhece Roberto Piva, Cláudio Willer, Paulo Del Greco, Álvaro Alves de Faria, Eunice Arruda, Eduardo Alves da Costa, Neide Archanjo e outros jovens escritores, que se reúnem na oficina de Massao Ohno, na Rua Vergueiro 688.

1960 – Publica o primeiro livro, A poliflauta, na “Coleção dos Novíssimos”, lançada no mesmo ano pela Editora Massao Ohno.

1961 – Sai O signo e a aparição, poema-plaquete, mais tarde incorporado ao livro A tarde e o tempo. Colabora com um poema e um conto na Antologia dos novíssimos, da Editora Massao Ohno. No ano seguinte, ingressa no Curso de Letras Neolatinas da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo. Publica os primeiros artigos e resenhas no “Suplemento Literário” do jornal O Estado de São Paulo. Neste mesmo ano, deixa o emprego na editora e começa a lecionar literaturas de língua portuguesa no Cursinho do Grêmio da Faculdade e depois no Equipe Vestibulares.

1963 – A tarde e o tempo, ainda inédito, recebe o Prêmio-estímulo Governador do Estado de São Paulo e é publicado no ano seguinte, em Florianópolis, por iniciativa dos amigos e poetas catarinenses Péricles Prade, Lindolf Bell e Rodrigo de Haro. Em 1965, termina o curso de licenciatura e inicia o mestrado, na USP.

1966 – Começa a ensinar literatura brasileira na PUC de São Paulo (onde conhece Margarida Maria), teoria literária na Faculdade de Filosofia de São José do Rio Preto e literatura portuguesa na USP. Publica o terceiro livro, Carta de marear.

1968 – Conclui o mestrado, sobre o surrealismo em Portugal, e inicia o doutorado, ainda na USP. Entre 1968 e 1969, primeira viagem ao exterior: três meses em Bloomington, Indiana, EUA. Em 1970, publica o primeiro livro de ensaios, A multiplicação do real. Neste mesmo ano, no dia 26 de dezembro, nasce em São Paulo a primeira sobrinha, Paula.

1972 – Conclui o doutorado, com uma tese sobre o neo-realismo e a poesia política de José Gomes Ferreira.

1974 – Publica Poemas reunidos (Prêmio APCA, Associação Paulista dos Críticos de Arte), que inclui os anteriores mais o inédito Urna diurna. Em setembro, viaja para os Estados Unidos, como representante brasileiro no International Writing Program da Universidade de Iowa.

1975 – Em fevereiro, segue dos Estados Unidos para Portugal, onde permanece até junho, com uma bolsa concedida pela Fundação Gulbenkian. Antes de retornar a São Paulo, viaja durante 15 dias por Espanha e Marrocos. No dia 12 de junho nasce, em São Paulo, a sobrinha Bianca, irmã de Paula e André.

1977 – Passa o primeiro semestre em João Pessoa, trabalhando no mestrado em Lingüística e Literatura da Universidade Federal da Paraíba. Em julho, de volta a São Paulo, casa-se com Margarida Maria. Em dezembro, depois do concurso de livre-docência, na USP, com uma tese sobre Fernando Pessoa, viaja para o México, a caminho dos Estados Unidos.

1978 – Inicia atividades no Departamento de Espanhol e Português da Universidade da Califórnia, em Berkeley. O livro Círculo imperfeito recebe o Prêmio Gregório de Mattos e Guerra, em Salvador, e é publicado pela Fundação Cultural do Estado da Bahia. No dia 1º de setembro nasce, em Berkeley, sua filha Manuela. Em novembro, viaja para a cidade do Porto, Portugal, para participar do I Congresso Internacional de Estudos Pessoanos. Está de volta a São Paulo em junho de 1979.

1980 – Em setembro, retorna a Berkeley, para mais uma temporada de dois anos. Entre 1980 e 1983, participa de vários encontros e simpósios, promovidos pela MLA, Modern Language Association, pela AATSP, American Association of Teachers of Spanish and Portuguese, e outras instituições. Regressa definitivamente a São Paulo em 1983 e reassume seu cargo na USP.

1984 – Participa da diretoria da União Brasileira de Escritores, São Paulo, gestão Fábio Lucas. Viagem a Lisboa, para o X Encontro de Professores de Literatura Portuguesa. Retorna a Lisboa no ano seguinte, para o II Congresso Internacional de Estudos Pessoanos. Em 1986, passa o primeiro semestre na Universidade do Novo México, em Albuquerque, New Mexico, EUA, ensinando literatura brasileira. Palestras em universidades norte-americanas.

1988 – Viaja a Lisboa, para participar do Encontro Internacional do Centenário de Fernando Pessoa, e para colaborar, como representante da UBE, na organização do I Congresso de Escritores de Língua Portuguesa, sob os auspícios da APE, Associação Portuguesa de Escritores. No ano seguinte, retorna a Lisboa, para participar do mesmo congresso. Ainda em 1989 sai o livro Subsolo.

1992 – Logo depois de se aposentar, pela USP, viaja a Paris, para participar de um colóquio sobre Antero de Quental. Um mês em Lisboa. No retorno, trabalha em vários projetos que resultam, nos anos seguintes, em alguns volumes de crítica literária e literatura infanto-juvenil.

1995 – Viagem aos Estados Unidos, para participar de um simpósio sobre Machado de Assis, na Universidade do Texas, em Austin. Palestras em universidades norte-americanas.

1998 – No dia 11 de abril, morre em São Paulo seu filho Luís Felipe. Sai o livro Lição de casa. Em setembro de 2000, passa a integrar o corpo docente do Mestrado Interdisciplinar em Educação e Comunicação da Universidade São Marcos, em São Paulo, onde atua até hoje.

2001 – Viagem a Portugal, para participar de um colóquio sobre José Gomes Ferreira, na Universidade do Porto, e para uma leitura pública de seus poemas, na Universidade de Coimbra.

2002 – Em abril, uma semana em Belém, para dirigir um seminário sobre criação poética, no IAP, Instituto de Artes do Pará. Segue trabalhando em novos poemas, ensaios, traduções e outros projetos.

2010 – Participa da V Feira Nacional do Livro de Poços de Caldas, no Momento de Poesia.

Fontes:
Jornal de Poesia
Flipoços

Carlos Felipe Moisés (O Escritor em Xeque)



Carlos Felipe Moisés concede entrevista a Álvaro Alves de Faria

À clássica pergunta “a poesia morreu?”, Carlos Felipe Moisés costuma dizer que a poesia morreu muitas vezes e sempre renasceu. Não é à toa que já imaginou escrever um livro com o título Poesia: crônica de uma morte anunciada. Desistiu. Como diz, seria insistir no óbvio:

– A morte da poesia vem sendo periodicamente propalada, e desmentida (diz Carlos Felipe), pelo menos desde a segunda metade do século XIX. É que, desde então, a poesia tem estado permanentemente em crise de transformação e evolução, determinada pela falência dos padrões clássicos, ou de qualquer padrão fixo e definitivo. A poesia passou a ser, a partir de Baudelaire, digamos, o reduto privilegiado da mudança. Daí a “crise”, interpretada por muitos como indício de esgotamento ou morte. Nada disso. Com a poesia acontece um pouco do que Marshall Berman (Tudo o que é sólido desmancha no ar) detectou na sociedade burguesa: “Afirmar que está caindo aos pedaços é dizer que está viva e em boa forma”.

Mas, afinal, para que serve a poesia num mundo mutilado, sem valores definidos, e mergulhado numa violência incompatível com a vida? Carlos Felipe Moisés assegura que a poesia serve para que nos tornemos melhores do que somos, enquanto indivíduos, não enquanto poetas. Serve para nos ajudar a extrair, desta breve passagem pela superfície do planeta, o melhor proveito espiritual possível.

– É uma visão romântica? – pergunta o poeta Carlos Felipe Moisés. E ele mesmo responde: – Sem dúvida. Mas é preciso entender que o romantismo não é apenas uma “escola” literária ultrapassada, circunscrita a determinado momento histórico, mas um estado de espírito que continua em curso, incorporando em sucessivas metamorfoses o que veio depois, atualizando-se. Cabe dizer, também, que servir, propriamente, a poesia não serve para nada: é a mais perfeita das inutilidades em que o homo ludens que somos pode empenhar-se. Mas por isso mesmo a poesia tem sido, vem sendo uma forma de resistência ao utilitarismo mesquinho.

Carlos Felipe não acredita que a poesia deva ser levada a sério. Acha que a poesia deve ser encarada como divertissement, jogo lúdico, despremeditado, com as palavras e com a essência da vida. O poeta se aborrece com a possibilidade de a poesia ser levada a sério, como algo que exigisse uma atitude mais formal, diferente daquela assumida no trivial da existência:

– Acho que a poesia deve fazer parte do nosso dia-a-dia – afirma Carlos Felipe. – A sério ou não, isso vai depender do temperamento de cada um. Para o meu, não. Para mim, poesia é sinônimo de divertimento. A sério. Mas sei que quando alguém indaga se a poesia deve ser levada a sério, a pergunta tem outro endereço: aquela mentalidade rigidamente utilitarista, para a qual poesia é bobagem, ocupação de desocupados e inadaptados. Ainda assim, minaha resposta continua sendo a mesma: a poesia não deve ser levada a sério.

Em que o poeta difere de outros poetas?

– Sem pensar muito, eu diria que não difere. Pensando um pouco, acrescentaria o óbvio: ninguém confunde um livro de poemas com um romance. E isso tem a ver com a preocupação classificatória de críticos e professores. É a questão dos gêneros, que sem dúvida diferem entre si, mas, neste século, muitas vezes manifestam-se sob formas híbridas, indiferenciadas. Há muitos textos modernos, dentre os mais marcantes e significativos, diante dos quais hesitamos. Poesia? Prosa? Prosa poética? E por aí vai. Então, insisto na resposta irrefletida: o poeta não se distingue de outros escritores.

Carlos Felipe Moisés observa que a poesia brasileira, hoje, felizmente, está em crise: “a poesia está morta mas juro que não fui eu”, como declarou José Paulo Paes. O poeta esclarece que essa crise significa pujança, dinamismo e, sobretudo, diversidade:

– Nossos grandes poetas se foram: Bandeira, Cecília, Drummond, Vinícius, Murilo... João Cabral silenciou, há tempos. Mas suas vozes continuam vivas e atuantes, muito mais do que a de muitos jovens recém-guindados ao panteão lírico da Pátria. A poesia brasileira hoje (um “hoje” que se arrasta há três ou quatro décadas) se caracteriza pela variedade dos ingredientes e caminhos em que aposta – da prolixidade à concisão, da ousadia experimentalista ao tradicionalismo conservador. E todos esses caminhos são válidos e legítimos, para desespero desta ou daquela minoria que insiste em nos impingir seu sectarismo.

E a crítica literária?

– Os arautos da morte da poesia diriam que nossa crítica, há décadas, vai bem melhor. Nos últimos 30 anos, a imprensa perdeu o charme dos grandes suplementos literários (noto, nos anos recentes, um tímido esboço no sentido de ressuscitá-los), o charme dos rodapés semanais. Perdeu-se com isso o critério subentendido da “autoridade” tacitamente atribuída a uns e outros. No mesmo período, cresceu o prestígio da chamada crítica universitária, modalidade que levou a “autoridade” a migrar das mãos do amador para as do especialista e a se divorciar do grande público. A crítica literária carece hoje de autoridade referendada. Eu diria que, entre o referendum da mídia e o prestígio da academia, nossa crítica procura cumprir com sua finalidade primordial, qual seja assinalar a maturidade da literatura em que se insere. Uma literatura amadurecida não se limita a existir, nem se restringe a alguns autores “de nível internacional”, como se costuma dizer, mas deve mostrar-se também capaz de discorrer sobre a consciência de sua própria existência. Acredito que aí resida a função maior da crítica literária. E acredito que a nossa caminha nessa direção.

Carlos Felipe Moisés pertence à Geração 60 de poetas de São Paulo. Mas ele não acredita na existência da geração. Ele observa que, se afirmar que acredita, dirão que é suspeito, pois se trata da sua geração; se negá-la, dirão que é mais suspeito ainda:

– Em nome da geração à qual pertenço (pertencemos, não é mesmo, Álvaro?), peço permissão para afirmar que a Geração 60 não existe, nem deixa de existir. Em primeiro lugar, quem somos, meu caro e fraterno Álvaro Alves de Faria? Resposta: Roberto Piva, Cláudio Willer, Lindolf Bell, Eduardo Alves da Costa, Celso Luís Paulini, Eunice Arruda, Rubens Rodrigues Torres Filho, Sérgio Lima, Neide Archanjo, Carlos Soulié do Amaral, você, eu próprio, e vários outros poetas que se reuniram, adolescentes, no início dos anos 60, em torno da editora Massao Ohno, em São Paulo. Nós erguemos nosso ideário ou nossa plataforma de combate? Produzimos nosso ismo? Transmitimos a alguém, como diria Brás Cubas, o legado da nossa miséria? Fomos e continuamos até hoje a geração da dispersão. E é isso, exatamente, que afirma a nossa existência e a nossa inexistência. Por outro lado, estamos falando de alguma coisa muito local, muito regional, quando poderíamos (deveríamos?) buscar um âmbito mais abrangente. Pedro Lyra – que é da mesma geração, em termos cronológicos, mas só viemos a nos cruzar muitos anos depois – nos ajuda a ver a coisa de outro prisma, com sua recolha ecumênica Sincretismo: a poesia da Geração 60. Naqueles idos de 60, no mesmo instante em que nos agrupávamos, circunstancialmente, em São Paulo, dezenas de outros jovens poetas faziam mais ou menos o mesmo, em vários pontos do país. Somos todos da mesma Geração, com G maiúsculo? Sugiro confiar essa pergunta à argúcia dos historiadores, que um dia saberão colocar esses e outros nomes em seu devido lugar.

Fonte:
Opção Cultural, Goiânia, 28 de junho de 1997, ano III, no 144.

Cornélio Pena (A Menina Morta)


O Argumento desse romance se esboça através de situações e detalhes, que compõem o ambiente e com ele submergem numa atmosfera que delimita o seu próprio mundo.

De repente , todos os seus componentes materiais, humanos e temporais avultam nitidamente em torno de um símbolo de poder unificador e punitivo, a "menina morta".

Evocada em sua curta existência , ela deixa entrever a sua missão conciliadora, também inspiradora do perdão e da bondade. Morta, abandona os vivos que se aprisionam cada vez mais nas cadeias do orgulho, do grande latifúndio escravocrata e monocultor, todos surdos aos gemidos da humildade passiva do escravo seviciado e aterrorizado.

A paisagem é a de uma grande fazenda de café no Vale do Paraíba, com seu imenso solar, inúmeros agregados e trezentos escravos. Seus senhores sofrem um drama íntimo, contido pelo orgulho e pelo amor-próprio, que intimidam e impedem qualquer possibilidade de alusão , de quem quer que seja, ao que possa ter acontecido. Ao mesmo tempo pressente-se a iminência da revolução social e econômica, com a extinção do trabalho servil.

A criança , que seria a esperança de uma reconciliação humana geral naquela paisagem de riqueza e poderio às vésperas de se extinguir , se converte naquele símbolo da "menina morta". É a sombra punitiva que paira sobre os desumanizados. Tanto que , como num misterioso processo de metempsicose.

Tanto que, como num misterioso processo de metempsicose, ela é confundida com a irmã que sobrevive e é feita herdeira da fazenda. É quando esse vasto latinjúndio de repente se desola, quase se intemporaliza , para envolver a sobrevivente numa imensa sombra, justamente com sua mãe, física e mentalmente debilitada. O romance parece então dividir-se em duas partes: a primeira, em que perdura a lembrança da menina morta, coexistindo com o seu retrato a óleo na parede, enquanto ela se faz atuante como verdadeira força catalítica; a segunda preenchida pelo retorno da irmã, coincidindo com a ausência dos pais, até ao entorpecimento sombrio de todo aquele imenso e fervilhante domínio.

Fonte:
CD Rom Digerati CEC003

Guido Bilharinho (O Universo Fechado de Cornélio Pena)



introdução

A obra ficcional de Cornélio Pena (Petrópolis/RJ, 1896 - Rio de Janeiro/RJ, 1958), é singular dentro da literatura brasileira. Com apenas quatro romances e fragmentos de outro, constitui fato isolado e inédito até, pelo menos, seu aparecimento, em conseqüência de características e peculiaridades que a compõem e distinguem. Essas particularidades, por sua própria natureza, isolando-a de qualquer conotação, aproximação ou similitude com a ficção brasileira anterior, simultaneamente a tornam fechado microcosmo. Mundo que exige, para completo desvendamento e total revelação, atenta leitura. Enorme soma de significações subjaz irrevelada, refratária a qualquer abordagem ligeira, demandando estreita identificação do leitor com a obra.

O quadro significante subjacente, no entanto, não deriva de relacionamentos ou alusões culturais nem implica em qualquer simbolismo. Dentro dos próprios limites do levantamento temático reside sua significação.

É obra inteiriça, compacta, densa, superior a quase tudo feito antes e depois dela no Brasil. É a marca de um artista que não se julga escritor, mas que, assoberbado por fantasmas interiores e oprimido pelo drama de seus antepassados, escreve romances ímpares e, em muitos sentidos, pioneiros na literatura brasileira, como foi notado desde o aparecimento de Fronteira (1936).

Figura humana singular, carregada de dignidade, Cornélio Pena vive, em muitos pontos, algumas das comoções íntimas que povoam densamente as mil e tantas páginas de seus romances. As confissões que faz indicam que muitas dessas perturbações pessoais refletem - em quem as consegue, de um modo ou de outro, superar - as mesmas causas traumatizadoras de suas personagens, algumas das quais encarnam antepassados do próprio Autor. Daí a atormentada autenticidade de sua ficção.

universo fechado

Estruturada a partir de decadência da classe a que pertencem as personagens, a obra de Cornélio Pena retrata universo fechado, isolado da dinâmica da sociedade em desenvolvimento. A ascensão de novas forças sociais, implicando em automático declínio daquelas que estão na direção do processo econômico e social, produz a lenta e dolorosa agonia destas até seu completo aniquilamento. A substituição de umas pelas outras faz-se normalmente de maneira vagarosa e de certo modo é imperceptível, porém, inexorável. Esse procedimento penoso, principalmente para a classe em descenso, sendo lento e despercebidas e incompreendidas suas causas, efeitos e implicações, gera, no grupo que decai do governo do processo histórico, marginalização total (econômica, social, psicológica) do indivíduo que o compõe, que se encerra e se isola na atmosfera social e mental de cosmo outrora em atividade, agora, porém, morto, inexistente, petrificado em restos ainda palpáveis, física e memorialmente, mas carentes de vida, autonomia e sentido.

Assim, ainda em contato com as sobras materiais de status econômico e social anteriormente dinâmico e prevalecente, esse indivíduo, vivendo num presente superador daquela situação pretérita, ou seja, já vivendo num e de um mundo materialmente apartado, move-se e agita-se em esfera particular, eis que da categoria social declinante em que se insere, separada e à parte do normal desenvolvimento da sociedade. Vive num meio social e psicologicamente fechado, refratário a contatar com o ambiente externo, em movimento e em processo, justamente características que, por impulsionadoras, suplantam e, em conseqüência, segregam o universo das personagens.

a incompreensão do mundo

Insuladas, marginalizadas por incapacidade individual de superação da queda de seu grupo social e inadaptação aos tempos ocorrentes, tão diversos dos “tempos” passados, as personagens de Cornélio Pena não compreendem e não entendem o mundo presente, que não é mais o seu.

a incomunicabilidade

Enclausuradas em ambiente limitado, desentendendo a realidade, essas personagens perdem-se na impossibilidade de comunicação, não só com a época atual, como, mais grave, entre si mesmas. Carecendo de sentido seu próprio mundo morto, sem ter qualquer perspectiva social ou individual, nada há que as una entre si, seja na realização de projeto existencial, seja mesmo na preservação do próprio status. Não há futuro possível e nem meios e modos de impedir seu ocaso.

solidão e Angústia

Pouco ou nada resta. A conseqüência é a solidão completa, uma “vida interior sombria” (Repouso, 1948, cap. XIII). O ser humano perdido e só em sua condição particular, repleta de fantasmas e obsessões múltiplas, sobrevindo, como corolário, angústia e sofrimento.

paroxismos do sofrimento

Há personagens, no entanto, que ultrapassam, em seu isolamento, incomunicabilidade, solidão e angústia, os limites condicionadores de sua mutilação existencial. Excedem de muito a causalidade de seu sofrimento, principalmente nos três primeiros romances. O efeito é superior à causa. Não reagem mais dentro da “normalidade” da circunstância de marginalização e isolamento social e individual em que se encontram. Suas reações paroxísticas já informam e constituem quadro também patológico, explícito e patente, por exemplo, em Dois Romances de Nico Horta (1939).

a técnica do autor

A obra de Cornélio Pena reflete estados de espírito, reações mentais e comportamentais. Não há implicação fática, que se evidencia do quadro geral dos romances, composto paulatinamente de mosaicos da realidade circundante por meio das reações individuais. Sua ficção está ao nível das conseqüências das transmutações sociais, refletidas, porém, no e pelo indivíduo, sem referências expressas ao contexto social. Única exceção se abre em A Menina Morta (1954), onde o Autor mostra, concomitantemente, seu debilitamento material e moral.

Assim, é a obra de Cornélio Pena excepcional e talvez a única no Brasil a traçar o quadro terrível da ruína das famílias patriarcais em seus reflexos e implicações mais profundos, manifestados nas reações psicológicas e mentais, extraídas do âmago mais recôndito do ser humano.
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Guido Bilharinho é da cidade de Conquista na Região do Triângulo. É poeta, ensaísta, advogado e editor. Foi editor da revista internacional de poesia Dimensão e da revista Convergência da Academia de Letras do Triângulo Mineiro. É membro da Academia de Letras do Triângulo Mineiro, da qual foi presidente.

Fonte:
http://www.cronopios.com.br/

Cornélio Pena (1896 – 1958)


Escritor fluminense (20/2/1896-12/2/1958). Autor inserido na corrente do realismo psicológico, sua obra é marcada pela introspecção e pelo espírito atormentado dos personagens. Cornélio de Oliveira Pena nasce em Petrópolis e, em 1919, forma-se em direito em São Paulo.

No ano seguinte fixa residência na cidade do Rio de Janeiro, iniciando carreira de pintor, gravador e desenhista. Nessa mesma época realiza sua primeira exposição individual. Trabalha também como redator e ilustrador de vários jornais. Em meados da década de 30 abandona as artes plásticas e passa a dedicar-se exclusivamente à literatura.

Suas histórias são caracterizadas pelos capítulos curtos e pela criação de uma atmosfera de estranheza. Em Fronteira, um de seus livros mais importantes, publicado em 1935, escreve: A confusão e o mal estão em mim, mas possuem vida independente e voluntária, longe de meu raciocínio e de minha vontade, e é preciso que estranhos me auxiliem e libertem.

Mas quem me libertará? Entre seus principais livros estão Dois Romances de Nico Horta (1939), Repouso (1948) e A Menina Morta (1954). Morre no Rio de Janeiro, deixando inacabado o romance Alma Branca.

Fonte:
http://www.algosobre.com.br/

A Cultura Guarani e Nós


Jornal do Brasil - RJ, em 3/02/2010

Mais de 800 lideranças indígenas guarani de quatro países - Brasil, Argentina, Bolívia e Paraguai - se reuniram no Encontro dos Povos Guarani da América do Sul, organizado pelo Ministério da Cultura (MinC), na aldeia indígena Tekoha Añetete, município de Diamante D’Oeste, no Paraná. O evento é inédito e tem como principal objetivo criar uma nova perspectiva de intercâmbio cultural que reconheça e fortaleça a cultura guarani como contribuição fundamental da formação brasileira.

A cultura guarani tem uma participação decisiva na formação do Brasil. São contribuições na culinária, na língua, na topografia e compreensão do território, e uma série imensa de costumes dos brasileiros de modo geral. Eles são parte do Brasil mesmo que a maior parte de nossa sociedade ainda não tenha consciência disso. Atualmente, existem cerca de 65 mil guaranis no Brasil, em diversos estados (RS, SC, PR, SP, RJ, ES e MS).

Presentes também na Argentina, na Bolívia e no Paraguai, onde a língua guarani é majoritária e oficial. Os guaranis estão espalhados pela América do Sul, mas com valores e construções cosmológicas muito similares, o que aponta para uma reflexão conjunta com os países do Mercosul.

Até 2003, o MinC sequer se relacionava com os povos indígenas brasileiros. Hoje, o ministério reconhece as culturas indígenas como tecnologias altamente desenvolvidas, cuja preservação e reprodução é do interesse estratégico do país. Seja pelos legados gerais à cultura brasileira, seja pela articulação com o meio ambiente e com a tecnologia contemporânea, os conhecimentos dos povos da floresta são decisivos para o futuro da humanidade. O pressuposto de atuação é que a diversidade cultural constitui grande riqueza para os indivíduos e a sociedade, um ativo que nos enriquece a todos. Evidentemente, uma concepção positiva de diversidade qualifica nosso modelo desenvolvimento, pois deixa para trás uma visão anacrônica e autoritária de civilização, e inclui as visões econômica, social, cultural, política e ambiental. Nesse contexto, a Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural, criada em 2003, desenvolve uma política específica para a cultura dos povos indígenas, com programas de capacitação, editais de premiação, fóruns de discussões e outros.

A ONU publicou, recentemente, relatório sobre a situação dos povos indígenas no mundo.

O estudo revela que, apesar de representarem apenas 5% da população mundial, os povos indígenas são 15% dos mais pobres do mundo. A discriminação étnica e cultural é percebida como uma das causas de todos esses problemas. O relatório também alerta sobre a ameaça de extinção das culturas indígenas, afirmando que 90% de todos os idiomas indígenas vão desaparecer até o final deste século.

A exclusão cultural se dá de duas formas: por meio da rejeição do modo de vida de determinados grupos (resultado do pensamento de que todos devem viver conforme o estilo da maioria); e por meio da discriminação ou das desvantagens impostas às minorias nas disputas por oportunidades sociais, políticas e econômicas.

O futuro das tradicionais culturas indígenas diz respeito aos indígenas e a todos nós, brasileiros.
Acreditamos que ao valorizar, promover e fomentar as expressões culturais, os valores e os conhecimentos tradicionais indígenas, estamos ajudando a moldar o futuro do Brasil. Nesse contexto, ocorre o Encontro Guarani. Uma democracia vibrante deve prever e garantir a liberdade dos grupos que formam a nossa sociedade, liberdade de viver plenamente suas culturas e tradições, escolhendo as formas e ritmos de interação e integração. Desejamos diminuir o preconceito da sociedade, colocando no lugar admiração, conhecimento, interesse, e contribuindo para fortalecer a autoestima e as relações sociais desses povos, de modo que se sintam mais bem equipados para fortalecer suas práticas. São temas que este primeiro encontro poderá debater e fortalecer na agenda cultural e política do Brasil.

Alfredo Manevy - Secretário Executivo do Ministério da Cultura
Américo Córdula - Secretário da Identidade e da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura

Fonte:
Ministério da Cultura – MinC
Jornal do Brasil - RJ, em 3/02/2010

Guarani, os Filhos do Vento



"Singular e assombroso o destino de um povo como os Guarani!
Marginalizados e periféricos, nos obrigam a pensar sem fronteiras
Tidos como parcialidades, desafiam a totalidade do sistema.
Reduzidos, reclamam cada dia espaços de liberdade sem limites
Pequenos, exigem ser pensados com grandeza.
São aqueles primitivos cujo centro de gravitação já está no futuro.
Minorias, que estão presentes na maior parte do mundo."
(Bartomeu Meliá)

"Respeito às pessoas e à natureza", esse é o lema dos índios guaranis.
Eles, desde cedo, recebem os ensinamentos de sua cultura pelos pais e depois pelo cacique, que lhes explica que os guaranis foram eleitos pelo Deus Nhanderú para serem os guardiães das almas dos seres humanos.

Guarani quer dizer: guerreiro indomável, filho de "Curupi" com Céa-Yari, povo livre com tempestade, que se espalha irregularmente pela vasta planície das várzeas lamacentas dos três grandes rios do Prata (o Paraná, o Paraguai e o Uruguai), atingindo quase toda a Bolívia e grande parte da Argentina até as mesetas da Patagônia.

Com o objetivo de reivindicar o que se supõe deveria ser na história o verdadeiro sentido da civilização guarani, surgiu, entre alguns escritores, uma corrente que inaugurou uma série de discussões polêmicas.

Uma destas correntes, entende que pertence ao patrimônio histórico da raça guarani a invejável civilização dos astecas do México e dos Incas do Peru e que todo esse monumento de glórias, criminosa e miseravelmente destruído pelos espanhóis, foi roubado a essa família indígena.

Obedecendo esta ordem de idéias, concebe ela que os guaranis chegaram a fundar, nos demais recantos da América do Sul, uma considerável civilização pré-colombiana e que os europeus a destruíram com tal habilidade que até os vestígios desapareceram.

A Grande Confederação Guaranítica, compreendeu inúmeras nações esparramadas pelo Continente Sul Americano, sendo a capital dessa civilização uma grande cidade denominada "Mbaeveraguasú". Imaginam os defensores dessa corrente, que os guaranis eram comunistas puros, organizados em Estado, com feição altamente civilizada. Para eles a palavra "guarani", tinha um sentido amplo e compreendia todos os indígenas de mais da metade do continente americano, excluindo-se, algumas raças que reputavam inferiores, sem as qualidades que ornam o caráter e a inteligência das múltiplas nações guaranis.

Há entretanto, algumas tribos, que não sendo guaranis, acomodaram-se aos costumes destes, em uma fusão regular, sendo por isso mesmo seus parentes, ou vassalos, como aconteceu com os "Aruacás", que acompanharam os "Caraivés", desde as Antilhas, como seus escravos.

Percebe-se portanto, que os guaranis correspondem ao homem sul-americano por excelência.

COMO TUDO COMEÇOU...

Para nos assenhorarmos dos verdadeiros pendores que dominam a alma coletiva de tão curiosa civilização, teremos que buscar recursos na história.

A nação guarani à luz do "descobrimento" conglomerava diversos povos. Com a chegada dos espanhóis (1537 em Assunción), foram diferentes as formas de contato e distintas as adaptações históricas-culturais da nação guarani. Podemos dividi-los a partir deste momento, em três grupos, ou três trajetórias.

1. O indígena que sofreu o impacto imediato do colonialismo. Encontramos aqui o índio "civilizado" e o escravo encomendado. Os índios civilizados, foram aqueles que lhes foi roubada a felicidade e convencidos à força de que os donos da civilização era os europeus. Estes foram os que mais sofreram adaptações. Já o índio encomendado, era aquele entregue ao espanhol para a catequese e conversão. Doutrinavam os índios em troca da utilização de seu trabalho. Na verdade, tal troca, acobertava uma disfarçada escravidão. Desse grupo, sobraram muito poucos, pois conduzidos a um cativeiro deshumano, acabaram dizimados, pela intensidade do trabalho forçado ou pelas inúmeras doenças trazidas pelos conquistadores.

2. Os guaranis reduzidos ou missioneiros, que buscavam refúgio da sanha colonial nas reduções jesuíticas. As reduções se constituíam em um Estado dentro do Estado. Neste aldeamentos fechados, os índios aprenderam ofícios tornando-se artesãos, marceneiros, carpinteiros e músicos, o que lhes permitiu dirigirem-se para os centros urbanos, como Montevidéu, Buenos Aires e Santa Fé, após a expulsão dos jesuítas das colônias ibéricas.

No inicio da civilização, os colonos sentiram a necessidade imprescindível do auxílio do missionário para a pacificação indígena. Mas, aos poucos o homem branco, emancipou-se daquela dependência e aliando-se com o mameluco, organizaram-se em bandeiras e, armados em verdadeiros exércitos, passaram a caçar o índio, para explorar e corromper. Eram invencíveis, sobretudo em uma luta com missionários e índios inermes. Ao desejo de enriquecer aliava-se a sede de glória, iniciando-se deste modo, um genocídio. Poucos foram os que conseguiram bater em retirada, único meio de fugir aquela ameaça de destruição. Mas, mesmo experimentando grande regozijo de escapar à sanha de seus agressores, tiveram os heróicos retirantes de enfrentar muitos perigos e sofrimentos durante a sua longa cruzada de fuga.

Alguns dirigiram-se para o Paraguai, onde o Guarani Paraguaio é hoje falado por cerca de 3 milhões de pessoas; para a Bolívia, onde o Guarani Boliviano (ou Chiriguano) é falado por cerca de 50 mil pessoas e para o norte da Argentina. Dos índios capturados, alguns tornaram-se escravos dos bandeirandes (séc. XVIII) e outros tornaram-se empregados de fazendeiros brasileiros e paraguaios, que iniciaram a ocupação destas terras com a extração da erva-mate.

3. O terceiro grupo a salientar, é o guarani que permaneceu fora do alcance da fome colonial, mantendo-se escondido nas densas florestas paraguaias. Os Caaguá foi um grupo que logrou manter sua cultura quase que intacta. Dele descendem os Guarani Mbya, Chiripá ou Ñandeva e os Paitvyterã ou Kaiowá. Eles foram raramente visitados por algum viajante no século XIX e conseguiram passar para o século XX, sem interferências exteriores.

OS MESTRES DAS MISSÕES

Nas reduções, o índio guarani aprendeu a ser pintor, escultor, marceneiro, serralheiro e fundidor. Um padre suíço, Charles Franck, ensinou-lhes até mesmo a fabricar relógios primitivos, mas que funcionavam perfeitamente. E a primeira oficina de impressão que se tem notícia em toda a América Latina foi instalada na República Guarani: ali eram impressos catecismos, dicionários, livros de canto e até mesmo alguns trabalhos sobre os dialetos dos índios. Quase tudo isso foi queimado pelos "civilizadores", os mesmos que hoje puxam o revólver (ou o talão de cheques) quando ouvem falar na palavra cultura.

Os índios seguiam essa ou aquela profissão, de acordo com suas inclinações e tendências. A maioria dedicou-se à agricultura ou ao pastoreio, porém os que tinham a chamada veia artística podiam cultivar a música, através da harpa, instrumento ainda hoje em moda no Paraguai, ou de violões, violinos, guitarras, tambores, pandeiros espanhóis e até castanholas.

De certa forma, cada missão especializou-se num determinado ramo de produção artística. Em Loreto fizeram-se as melhores esculturas, mas foi em San Francisco Javier que se elaboraram os mais finos tapetes e as mais graciosas rendas. De San Juan vinham os mais perfeitos instrumentos musicais, mas foi em Apósteles que se fundiram os melhores sinos.

As primeiras reduções propriamente ditas são fundadas pelos padres Simón Maceta e José Cataldino. Um velho missionário, de nome Lorenzama, fundou a redução do Paraná.

Mas o grande idealizador do Estado Jesuíta, aquele que era conhecido como o "caminhoneiro de Chaco" e que no futuro seria nomeado o Superior Geral da República Guarani, foi Antonio Ruiz de Montóya.

Nos primeiros anos as coisas foram muito difíceis, pois a vida das reduções jesuítas não ataraia os índios Guarani. Muitas divergências surgiram e até mesmo alguns missioneiros, como o padre Rodriguez, foram executados. Este, depois de discutir com o cacique Niazú, teve sua cabeça espatifada com um golpe de manacá. Na verdade o que levou os índios a se dirigirem para o interior das missões, foi o fato de terem percebido que só elas constituíam um refúgio, um abrigo, uma defesa, uma segurança contra os ataques brutais e escravagistas dos espanhóis e portugueses.

E as reduções cresceram e se multiplicaram: Arcángel, San Tomé, Los Reyes, Tpaes, Yapeyú. Logo se tornou imprescindível que todas elas tivessem governos, tribunais de justiça e até mesmo sistemas rudimentares de contabilidade.

O SOCIALISMO MISSIONEIRO

Em uma espécie de congregação superior eram selecionados os futuros magistrados, sacerdotes e executivos. Existiam arquivos, atas e contabilidade, embora um dia tudo viesse a ser reduzido a cinzas pelos "civilizados".

Apesar das diferenças culturais que sempre existiram, e sempre existirão, em todas as sociedades, a igualdade material era quase completa. Todos se vestiam da mesma maneira.

O trabalho tinha uma jornada de seis a oito horas, com um período de descanso após ao almoço. Quase todos os índios eram lavradores e durante a época de colheita todas as demais atividades eram suspensas. Iniciava-se um "mutirão", mutirim, ou pichirum, tradição do trabalho coletivo, ou seja, um ajudando o outro numa alegre animação.

Não havia dinheiro, nem comércio e a profissão de mercador ou traficante era punida com uma surra de vara de marmelo. Praticavam a troca, mas não havia moeda nem usura. O ouro e a prata serviam apenas para enfeitar os altares sagrados.

O principal produto era a erva-mate, que servia de referência para trocas e bargalhas. Eram exportadores e muitos produtos demandavam o exterior, principalmente o Prata. Fumo, algodão, açúcar, rendas, artesanatos, esculturas, arreios, rosários, cruzes, vasilhames, ponchos, peles, chapéus, barbicachos, cerâmicas, tijolos, gamelas, tudo isso era conduzido em lombo de burro ou em canoas para as colônias dos europeus onde seria trocado pelos produtos importados de que mais necessitavam.

Mas tudo pertencia à comunidade. Os bens eram indivisíveis. Chamavam-se "tupam-baé (campo de Tupã): eram propriedade do Deus . Não existia o direito de herança e por isso a terra era indivisível. E os padres jesuítas eram os primeiros a dar o exemplo: a eles nada pertencia, tudo era dos índios (Abámba-é).

É claro que os invasores ibéricos, que haviam construído a riqueza de suas nações sobre montanhas de cadáveres indígenas, não poderiam aceitar, em suas "fronteiras ideológicas", a existência da república utópica dos índios Guarani e dos padres jesuítas.

De tanto lidarem com aquelas crianças índias, demasiada e ingenuamente acabou por povoar os sonhos dos filhos de Santo Ignácio de Loyola. Fizeram com que os índios Guarani ficassem brincando de "Cavalhada" entre mouros e cristãos, enquanto o inimigo afiava suas adagas em forma de meia lua levantina e encilhava seus cavalos árabes.

Ensinaram os pequenos selvagens a representar em palcos improvisados os dramas que o santo padre José de Anchieta desenhava à beira-mar, enquanto os propostos coloniais do Marquês de Pombal carregavam seus mosquetes nas barrancas do lado direito do Uruguai.

Trabalhavam, brincavam, amavam, jogavam bola, faziam acrobacias, cantavam e compunham guarânias, enquanto os descendentes de Borba Gato preparavam as longas cordas com as quais iriam manoteá-los.

Tudo desapareceu, até mesmo as igrejas monumentais de pedra talhada e madeira ricamente esculpida foram incendiadas, tendo seus ornamentos de ouro e pratarias roubados por bandidos que se diziam "soldados cristãos".

Porém, a memória dos homens, que sempre sobrevive à noite dos tempos e às madrugadas do demônio, pode dar fé. Mas, o veredicto foi implacável e o povo Guarani se tornou o mais miserável de toda a América do Sul. Mas, apesar de tudo, foi o único povo americano que conseguiu escapar à sanha do colonizador durante longo tempo.

Eles deixaram gravada, nas ruínas de suas Reduções, a maior ata de condenação que se possa fazer aos que enlouqueceram na miragem de riquezas alucinantes. Sua sociedade foi e será estudada por muitos séculos. É uma história dolorosa, que foi assinada com sangue antes que eles submergissem de novo, e para sempre, na floresta virgem das várzeas lamacentas dos rios que formam o Prata.

A ALMA GUARANI

O guarani é um indivíduo profundamente espiritual. Embora haja muitos sub-grupos, todos compartilham de uma religião que enfatiza a terra. O conceito de terra para eles está relacionada a idéia de Terra-Sem-Males, na concepção de "bem viver", um lugar onde se vive o "ñanderekó" (jeito de ser). Ou seja, não concebem a terra em sua materialidade, mas a consideram como necessária para ser construída e arada culturalmente.

Seguindo mensagens de Nhanderú, eles buscam o que acreditam ser a "Terra Sem Males", um lugar onde não falta caça, pesca e muita paz. A sua procura, localizada no imaginário dos Guarani, para além do Atlântico, por si só, não minimiza as responsabilidades dos brancos sobre os poucos espaços territoriais que sobraram para esses índios. A sua perambulação, organizados em pequenos grupos familiais, por estradas e rodovias do Sul e Sudeste do país, é uma face trágica dessa diáspora.

TRAJETÓRIA E OBJETIVO

DA MIGRAÇÃO

A causa do êxodo Guarani sempre foi a imperativa necessidade de encontrarem um lugar onde possam viver em segurança, segundo seu antigo modo de ser, ou seja, a busca da "Terra-Sem-Males".

"Os primeiros que abandonaram a sua pátria, migrando para o leste foram os vizinhos meridionais dos Apapocuva: a horda dos Tañyguá, sob a liderança do pajé chefe Ñanderyquyní, que era temido feiticeiro. Subiram lentamente pela margem direita do Paraná, atravessando a região dos Apapocúva, até chegar à dos Oguauíva, onde seu guia morreu. Seu sucessor, Ñanderuí, atravessou com a horda do Paraná - sem canoas, como conta a lenda - , pouco abaixo da foz do Ivahy, subindo então pela margem esquerda deste rio até a região de Villa Rica, onde cruzando o Ivahy, passou-se para o Tibagy, que atravessou na região de Morro Agudos.

Rumando sempre em direção ao leste, atravessou com seu grupo o rio das Cinzas e o Itararé até se deparar,finalmente com os povoados de Paranapitinga e Pescaria na cidade de Itapetinga, cujos primeiros colonos nada melhor souberam fazer que arrastar os recém-chegados a escravidão. Eles porém, conseguiram fugir, perseverando tenazmente em seu projeto original, não de volta para o oeste, mas para o sul, em direção ao mar. Escondidos nos ermos das montanhas da Serra dos Itatins fixaram-se então, a fim de se prepararem para a viagem milagrosa através do mar à terra onde não mais se morre." Os Guarani Mbya, começaram a chegar, ao que se sabe, a partir do início do século XX. Em 1921, Nimuendaju, na época funcionário da antigo SPI, teve a ventura de acompanhar de perto a migração de um pequeno grupo Mbya rumo ao mar.

Esta fantástica experiência não modificou apenas o modo desse antropólogo alemão encarar a sociedade Guarani, como a partir de então, iria influenciar de maneira decisiva, o modo como a maioria dos antropólogos passaria a ver os Guarani.

Dizimados por doenças e obcecados com a fuga da destruição do mundo, Nimuendaju alcançou-os perto de Itanhaém/SP. Quando chegaram ao litoral, termina sua viagem horizontal e histórica. Inicia-se então a caminhada que deveria, através da dança, tomar um rumo vertical. Dançaram três dias até a exaustão e então veio a terrível decepção: o fracasso. "Havia ocorrido algum erro, que anulara toda a magia e que, fechara para sempre o caminho para o Além aos peregrinos". A maioria dos Guarani convenceu-se que já não poderiam alcançar a "Terra-Sem-Mal", pela falta de um instrumento e pela interpretação incorreta do mito.

Depois partiram "na direção do noroeste, convencidos de que a Terra-Sem-Mal se localizava, não além do oceano e sim no centro da Terra". Segundo Egon Scahden, somente poderiam ir em sua busca, aqueles que guardavam intactas suas crenças originais.

Hoje existem "aqueles que acreditam que só sua alma retornará a Nhanderú retã." Mas há ainda aqueles, que acreditam conseguir atravessar o oceano com corpo e alma e superando a prova da morte, serem testemunho da tradição.

Uma alucinada tentativa de alcançar a qualquer custo a Terra-Sem-Mal, pode ser observada entre os Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul. Nos anos entre 1986 a 2000, 337 índios das áreas de Dourados, Amambaí, Caarapó, Porto Lindo e Takuapery, cometeram suicídio. A ampla espoliação de seu território físico e espiritual e a falta de perspectiva de encontrarem a sua prometida Terra-Sem-Mal, os levaram a depressão profunda, o que concorreu para a concretização de tão trágico fim.

Na utopia da Terra-Sem-Mal, o imediatismo histórico ficou frustrado. Em busca da "Terra-Sem-Mal", vivem hoje os Guarani, ameaçados do Mal sem Terra, em conseqüência do avanço das fazendas sobre os habitantes indígenas originários.

A religião é ensinada, pelo karaí, que é o líder espiritual. Ele cuida dos doentes, recomendando os remédios e curando através da fé, pois, para eles, a doença nada mais é do que uma conseqüência da falta desta.

O artesanato é o maior sustento dessa aldeia. A cestaria e as esculturas de animais são perfeitas e vendidos pelos indígenas no litoral, na temporada de verão. Os índios, além disso, plantam milho, feijão e ervas medicinais.

As crianças guaranis que fazem parte do coral "Nhanderú Jepoverá" (Raio Sagrado de Deus), gravaram um CD em 2005 , que reúne 15 cantos sagrados.

Os guaranis cantam quando rezam, quando brincam, quando acalentam os filhos, quando plantam, quando colhem, quando curam, quando falam com seus deuses. Ninguém canta como eles, e ninguém ouve como eles, porque certamente seus cânticos fazem muito mais sentido em sua cultura.

CONCLUSÕES FINAIS

A batalha dos Guarani pela sobrevivência física e cultural continua nos dias atuais, no Paraguai, Argentina e Brasil (Maranhão, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul). A luta pela demarcação ou reconquista de suas terras confundem-se com a recuperação de sua identidade étnica.

A história indígena não é de vencidos, mas uma história viva e presente de avanços e resistência, de fazer renascer um mundo mais humano para todos, irmanados com a nossa Mãe Terra.

Os Guarani somam hoje, aproximadamente, cem mil pessoas em todo o território brasileiro.

"America Ameríndia,
aínda na Paixão:
um dia tua Morte
terá Ressurreição!"

Fonte:
http://www.rosanevolpatto.trd.br/

Poesia no Ônibus, em Ponta Grossa (Cultura prorroga prazo para inscrições)


A Secretaria Municipal de Cultura e Turismo prorrogou a data de inscrições do Programa Poesia no Ônibus “Poetas da indústria” para 24 de maio. As inscrições devem ser enviadas exclusivamente via Correios para: Programa Poesia no Ônibus, Edital 2010/11, Secretaria Municipal de Cultura e Turismo endereço: Rua Julia Wanderley, 936 – CEP 84010-170, Ponta Grossa- PR.

Podem participar trabalhadores da indústria de todas as categorias, desde que as empresas estejam localizadas no município de Ponta Grossa. O tema será livre e deve ser produzido em língua portuguesa. Cada interessado poderá inscrever até três poemas inéditos.

Uma comissão julgadora vai selecionar 24 poemas que circularão pelos veículos do Sistema Integrado de Transporte Urbano entre julho de 2010 e junho de 2011, sendo dois poemas diferentes por mês.

Os vencedores serão conhecidos e certificados no dia 5 de junho e participarão de duas Oficinas de Criação e Fomento Literário orientadas por oficineiros especializados, no decurso do mês de junho de 2010. Os vencedores terão ainda seus poemas publicados na Antologia de Poesias editada pela Prefeitura Municipal de Ponta Grossa.

O Programa é desenvolvido pela Secretaria Municipal de Cultura e Turismo em parceria com o SESI CULTURAL e o SESI Ponta Grossa, com a finalidade de estimular a produção poética local.

Fonte:
Colaboração da Prefeitura Municipal de Ponta Grossa.

Lançamento do V Concurso Literário Cidade de Maringá

Clique sobre a imagem para ampliar

sábado, 17 de abril de 2010

Trova Triste - Fernando Vasconcelos (2/9/1937 - 17/04/2010)

Fernando Vasconcelos (1937 – 2010)


Homenagem a Fernando Vasconcelos
Extinguiu-se a flor do lume
Do poeta expira o canto.
Qual menino vagalume,
chega ao céu e vira encanto!
Dinair Leite [Paranavaí]
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2 de setembro de 1937 (Diamantina/MG) - 17 de abril de 2010 (Ponta Grossa/PR)

Fernando Vasconcelos (Fernando Silvio Roque de Vasconcelos), jornalista e publicitário,é mineiro de Diamantina e paranaense de Ponta Grossa.

Filho de Sandoval Roque dos Santos e Maria de Lurdes de Vasconcelos Roque (poética Tia Velha), casado com Jelena Ruta e sete filhos e três netos.

Recebeu várias honrarias do poder público e da iniciativa privada, entre os quais
Título Cultural
Placa do Mérito Regional
Prêmio Rotary 98/área de Artes
Placa Homenagem por Incansável Jornada Literária (Sesc)

Título de Cidadão Ponta-Grossense (Lei 3.207 de 11/12/1979),
Mérito Leonístico Putanqui - Cultural,
Honra ao Mérito do Rotary Club 2009.

Pertence a dezenas de entidades culturais, inclusive em Portugal, sendo o vice-presidente da Academia de Letras dos Campos Gerais.
Conta com 170 premiações literárias nacionais e internacionais.

São seus livros publicados:
– Pequena Consciência (1974)
- As Narrativas de Nhô Fela (1983)
- Nos Espaços D'Alma (1985)
- Êta Vida Besta, Sô! - (1990)
- Estou Nascendo Para a Trova (1994)
- Pô, Meu! (1995)
- A Danadinha da Crase ( 1997)
- Da Cacimba do Coração (1998)
- Fiapico (1998)
– Abaretama - a sedução do guerreiro (1999)
- Os Pombinhos do Deus Tupã (2003)
- Eu Conto (2004)
- Gotinhas de Orvalho (2005)
- Branduras (2007).

Fernando Vasconcelos (Paraná em Trovas)


Registrando alguma ausência,
contabilidade ingrata,
nosso amor pediu falência,
desistiu da concordata;

É cada estrela cadente,
tendo o seu curto escarcéu,
um traço fosforescente
com que Deus rabisca o céu!

De um sentimento profundo,
no silente ou no escarcéu,
prosa é linguagem do mundo,
o verso a prosa do céu.

Nosso grande encantamento,
quando a julgar eu me ponho,
é o encanto do momento
do nosso primeiro sonho.

Na roça não se complica
a higiene rotineira:
começa na velha bica
e um gamelão é banheira!

De minha alma, nas dobrinhas,
a sua alma se aninhou...
As duas parecem minhas,
no ambíguo que eu hoje sou!

Passadas pinga e arruaça,
disse ao ser interrogado:
foi depressão, não cachaça,
que me deixou transtornado!

Tua ausência faz aflita,
triste e desesperançada,
a caminhada infinita,
em teus lábios começada.

Se na aflição se padece,
busque em Deus a solução...
A calma do céu nos desce,
no intercâmbio da oração

Não há quem se esforce à toa,
é rotina o desafio,
sendo a vida uma canoa
que atravessa o grande rio.

Lindas estrelas acesas,
quadro que prende e seduz...
É Deus dizendo belezas
num alfabeto de luz!

Inocência é pranto e riso,
Que puro nossa alma alcança,
Vindo lindo e sem aviso
Do sentir de uma criança.

Vamos, sonhar e sorrir"
esse é o remédio ideal,
não nos preocupe o porvir,
pois só o presente é real.

Cada vez que tenho um sonho,
formas, luzes, cores, som,
é você que lá eu ponho,
para o sonho ficar bom!

Casa do Poeta de Canoas/ES (Inauguração da Biblioteca)

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