quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Vereda da Poesia = 90 =


Trova de Caicó/RN

MARA MELINNI GARCIA

Nas noites de solidão...
— Lua, que embala os amores,
és, em tua mansidão,
a musa dos trovadores!
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Poema de Belo Horizonte/MG

ROGÉRIO SALGADO

Sobre todas as coisas

O meu amor tem dessas coisas
de cultivar estrelas
no céu da tua boca
ser criança, como quem ama
adolescentemente
pela primeira vez.

O meu amor tem dessas coisas
de dizer silêncios
quando te observa e se encanta
no encontro de fazer milagres
no coração.

Assim, o me amor adormece
e acorda no acorde de ser canção
sobre todas as coisas assim
o meu amor tem dessas coisas
de sobre todas as coisas amar.
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Trova de Natal/RN

HÉLIO PEDRO SOUZA

Um mistério me alucina
no medo que todos têm:
transpor a negra cortina
que dá acesso ao além.
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Soneto de Natal/RN

FRANCISCO NEVES DE MACEDO  
1948 – 2012

Iconoclastas do meio ambiente

As árvores são tanta e já floridas,
e são milhares, todas importantes,
mas sei também de muitas ressequidas,
que a moto serra, fez agonizantes.

Árvores tombam, tantas, tanta vidas,
por mãos e mentes, as mais ignorantes,
nas ambições nefastas desmedidas,
o que lhes tornam torpes ruminantes.

Do apocalipse, a “besta” da ambição,
com a maldita, moto serra à mão,
destruindo as irmãs da nossa gente.

Vem a mortal desertificação,
morte virá também ao falso irmão:
Iconoclasta do Meio Ambiente.
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Trova Premiada em Salinópolis/PA, 2005

ANTONIO JURACI SIQUEIRA 
Belém /PA

Quando minha alma vagueia
pelos mares da ilusão,
a saudade é uma sereia
que canta em meu coração.
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Soneto de Florianópolis/SC

CRUZ E SOUZA
Florianópolis/SC, 1861-1898, Antonio Carlos/MG

Cristais

Mais claro e fino do que as finas pratas
o som da tua voz deliciava...
Na dolência velada das sonatas
como um perfume a tudo perfumava.

Era um som feito luz, eram volatas
em lânguida espiral que iluminava,
brancas sonoridades de cascatas...
Tanta harmonia melancolizava.

Filtros sutis de melodias, de ondas
de cantos volutuosos como rondas
de silfos leves, sensuais, lascivos...

Como que anseios invisíveis, mudos,
da brancura das sedas e veludos,
das virgindades, dos pudores vivos.
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Trova Popular

Dizem que o pito alivia
as mágoas do coração;
eu pito, pito e repito
e as mágoas nunca se vão.
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

MARIA NASCIMENTO SANTOS CARVALHO

Além da vida

Muitos dizem que a vida é uma tortura,
e o mundo é um vil celeiro de ilusão;
que, para cada dia de ventura,
vivem meses de plena solidão...

Que vegetam... Respiram desventura,
que a incerteza é mais forte que a razão;
que a cada instante morrem de amargura,
mas não ouvem a voz do coração.

Malgrado seja a vida uma incerteza,
não vou mesclar meus dias de tristeza
enquanto espero o dia da partida,

pois, voando nas asas do seu verso
o poeta transpõe todo o universo
e vive muito além da própria Vida!...
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

LUIZ POETA
Luiz Gilberto de Barros

Com meu sorriso eu assino
a cláusula do contrato
de te amar como um menino
mesmo ao fim do último ato.
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Poema de Aracaju / SE

RAIMUNDO SAMPAIO COSTA

O enigma do Eu

Não é preciso dares nome
À tua enfermidade moral.
Este teu puritanismo nas entranhas embutido
É a doença que vos infecta.
E, para satisfazeres a saga de tua insana mente
Atacas-nos qual abutre faminto invejando-nos o ser.
Enfim! Libertas-te das algemas sujas
Do calabouço moralista que vos aflige.
Procuras na pureza pura dos prazeres te encontrar.
A causa de tua imensa dor
É a crise interna do desamor.
O Enígma de teu Eu, é apenas teu.
Não se reprima, não se reprima.
Pouco importa se és Dagmar, Itamar ou Valdemar...
Cruzes, cruzes,cruzes.
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Trova Humorística de Nova Friburgo/RJ

CLENIR NEVES RIBEIRO

Coincidência que me arrasa,
que me assusta e me espezinha...
- meu marido chega em casa
quando chega o da vizinha!
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Dobradinha Poética de Bandeirantes/PR

LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DE CARLI

A força do amor sofrido

Difícil de compreender
a força do amor sofrido,
mas bem fácil de entender
depois de tê-la sentido…

 A inquebrantável força de um amor
resiste ao tempo, à dor e à despedida;
ignora a culpa, esquece do amargor,
veemente, segue incólume na vida.

Atenta ao coração do sofredor,
leva a esperança e a calma comedida;
despreza a solidão e, sem pudor,
oferta-lhe a presença destemida.

Contudo, quando o amor, senil, cansar-se,
a força ativa, sem jamais quedar-se,
não deixará que prostre, entregue à sorte...

Honradamente irá retroagir,
o amor fará no sonho submergir...
Trará a ilusão, que pode adiar a morte!
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Trova de Nova Friburgo/RJ

RODOLPHO ABUDD
Nova Friburgo/RJ, 1926 – 2013

Sem você, sigo calado,
e o meu viver é sombrio,
qual velho ator fracassado
vendo o teatro vazio!...
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Poema de Rio Branco / AC

ALESSANDRO BORGES DE MOURA

Magia infinda

Olha lá! O vento assanhando os cabelos verdes das árvores!
O moleque escorregando a ladeira com luvas
A correnteza levando os barquinhos de papel...
São crianças brincando na chuva.

Olha lá! A euforia subindo as montanhas!
A água turva se embalando;
O trovão montando na nuvem...
São crianças brincando na chuva.

Olha lá! Dezenas de pezinhos
Dançando sobre o barro vermelho!
A bola na rua fazendo curva,
As risadas sagradas da felicidade...
São crianças brincando na chuva.

Olha lá! Esse rio alegre de gente!
Não importam as trovoadas;
Essa chuva ainda vai longe...
Espalhando por toda terra
A magia infinita de toda essa criançada!
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Trova de Ribeirão Preto/SP

NILTON MANOEL
1945 – 2024

Nada mais embriagador
no arrepio das ternuras
que escutar juras de amor
mesmo que sejam perjuras.
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Soneto Paranaense 

CECIM CALIXTO
Pinhalão/PR, 1926 – 2008, Tomazina/PR

Testamento

Labuto em vão a costurar futuro
e a delinear as coisas que preciso.
Mas se me ligo, permanece escuro,
certo porão que se me hospeda o juízo.

Colhendo pedras ao projeto, aturo,
toda vileza que não tem aviso.
E já percebo que a sangrar procuro
as frágeis notas do obscuro siso.

E inalcansável tudo que imagino,
por isto aceito o freio ao meu destino,
na busca atroz de uma ilusão que existe.

Poeta...! Vale o teu anseio justo...
pois sabes bem que saberão o custo
todos que lerem teu soneto triste.
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Trova Premiada em Salinópolis/PA, 2005

JAIR SALES DE ALMEIDA 
Tomé-Açu/PA

Um canto ao longe soava
e encontrei na voz perdida,
a sereia que eu buscava
para o mar da minha vida.
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Poema de Belo Horizonte / MG

ANA CAROLINA VIANA FARIA

Frágil

Um monstro essa tal solidão
Que mata e envenena
Te rouba a razão
Te faz ir na contramão.

Um horror essa tal ilusão
Que afasta e queima
Um ou outro coração...
Sem hesitar.

Uma frágil emoção
Esse amor guardado em meu peito
Tão frágil que dá medo
Tão seguro que é frágil.

Parece que somos tão iguais...
E tão diferentes
Parece que somos tão unidos...
E tão distantes.

Não me pergunte por quê
E nem para onde
Só posso lhe dizer
Que agora eu quero você.
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Trova Humorística de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Baita arruaça, bravatas, 
um tremendo sururu... 
Frangas, marrecas e patas 
brigando por um peru!
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Pantun de Caicó/RN

PROFESSOR GARCIA

Pantun dos desajustados

TROVA TEMA:
Quando a família é rompida
por atos cegos, tiranos,
deixa destroços de vida,
restos de seres humanos.
Manoel Cavalcante 
Pau dos Ferros/RN

PANTUN:
Por atos cegos, tiranos,
por ciúme ou por loucura,
restos de seres humanos
são sobras da desventura.

Por ciúme ou por loucura,
as decisões mal tomadas,
são sobras da desventura
de vidas abandonadas.

As decisões mal tomadas,
as vezes gera a desgraça
de vidas abandonadas
jogadas no chão da praça.

As vezes gera a desgraça
das almas cheias de vida,
jogadas no chão da praça
quando a família é rompida.
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Trova da Princesa dos Trovadores

CAROLINA RAMOS
Santos/SP (1924)

Para os que entregam ao nada
os sonhos que ontem sonharam,
o orgulho é terra pisada
moldando os pés que a pisaram…
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Hino de Guarapuava/PR

O Sol surgiu, um dia, mais brilhante
E foi, risonho as flores acordar
O riacho, sobre as pedras, a cantar
A cidade que surgia triunfante!

Com fervor, nós te saudamos, Guarapuava
Neste hino de Louvor!

Teu vulto sem igual
Pinheiro magistral
Eu sempre hei de cantar com ardor!
Vaqueiro colossal
Figura imortal
Guarapuava é meu grande amor!

O Sol doura o campo verdejante
A brisa, os trigais a balançar
Guarapuava é menina radiante
Com o ouro dos trigais a se enfeitar!

Com fervor, nós te saudamos, Guarapuava
Neste hino de Louvor!

Teu vulto sem igual
Pinheiro magistral
Eu sempre hei de cantar com ardor!
Vaqueiro colossal
Figura imortal
Guarapuava é meu grande amor!

O Sol doura o campo verdejante
A brisa, os trigais a balançar
Guarapuava é menina radiante
Com o ouro dos trigais a se enfeitar!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Florianópolis/SC

ABEL PEREIRA

Saudade é onda que vaga
na vaga do desconforto.
É mar que o barco naufraga
sem rumo, longe do porto.
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Poema de Funchal/Portugal

JOAQUIM EVÓNIO
(Joaquim Evónio Rodrigues de Vasconcelos)
1938 – 2012

Foi um Anjo

Foi um anjo, melodia
que voou para os meus braços
em amplexo tão ardente...
Curou todas as feridas
que me traziam doente...
 
Mas hoje, amanhã e sempre
trarei no peito em chamas
a triste recordação
do tempo que não vivi.
 
Foram dias, foram anos
vividos pelos pinhais,
sentindo como os navios
perdidos… órfãos de cais...
 
Com o sol nasceu encanto
abraçado aos braços dela...
Veio o Verão, Primavera,
guardando o meu Outono
numa caixa de Pandora...
 
Foi a aventura sincera
sem amargura nem dor,
foi tudo, foi quase nada,
apenas um grande amor.
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Trova de Ponta Grossa/PR

MANUEL MARIA RAMÍREZ Y ANGUITA

Entre nós não há mais nada,
só o fundo abismo sem fim,
densa linha demarcada
entre o meu não e o teu sim.
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

Os dois touros e a rã

Dois touros brigavam, por causa de amores,
Não longe de nédia vaquinha louçã;
Do charco onde habita, notando os furores,
Assim, assustada, lhes fala uma rã:

«Que é isso?... não vedes que ao fim dessa briga
Será desterrado do campo um de vós,
O qual, suportando vergonha e fadiga,
Virá sobre os charcos pisar-nos a nós?

É justo soframos, sem ter pretendido
A posse da vaca?» — E a triste acertou!...
Fugiu para os charcos o touro vencido,
E rãs, sob as patas, às mil esmagou!

Famosa verdade! Mas, caros leitores,
Por muito sabida, não deve espantar:
As grandes toleimas dos grandes senhores
São sempre os pequenos que as têm de pagar!

Recordando Velhas Canções (Velho realejo)


(Valsa, 1940)

Compositor: Custódio Mesquita/Sady Cabral

Naquele bairro afastado
Onde em criança vivias
A remoer melodias
De uma ternura sem par

Passava todas as tardes
Um realejo risonho
Passava como num sonho
Um realejo a cantar

Depois tu partiste
Ficou triste a rua deserta
Na tarde fria e calma
Ouço ainda o realejo tocar

Ficou a saudade
Comigo a morar
Tu cantas alegre e o realejo
Parece que chora com pena de ti

Ficou a saudade
Comigo a morar
Tu cantas alegre e o realejo
Parece que chora com pena de ti
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Saudade e Melancolia em 'Velho Realejo'
A música 'Velho Realejo', é uma obra que evoca sentimentos profundos de saudade e melancolia. A letra nos transporta para um bairro afastado, onde o eu lírico relembra sua infância e as melodias ternas que ouvia de um realejo. Esse instrumento musical, que passava todas as tardes, é descrito como risonho e capaz de transformar a realidade em um sonho, trazendo uma sensação de nostalgia e simplicidade.

A partida de uma pessoa querida é um ponto central na canção. A rua, que antes era animada pela presença dessa pessoa e pelo som do realejo, agora está deserta e triste. A ausência é sentida profundamente, e o realejo, que antes trazia alegria, agora parece chorar, refletindo a dor da perda. A música utiliza essa metáfora do realejo para expressar a dualidade entre a alegria do passado e a tristeza do presente, criando uma imagem poética e tocante.

Orlando Silva, conhecido como o 'Cantor das Multidões', era famoso por sua voz emotiva e interpretação apaixonada. 'Velho Realejo' é um exemplo perfeito de seu estilo, que combina lirismo e emoção para tocar o coração dos ouvintes. A canção fala sobre a permanência da saudade e como as memórias podem ser tanto uma fonte de consolo quanto de dor. A melodia do realejo, que antes era um símbolo de alegria, agora é um lembrete constante da ausência e da saudade que ficou. https://www.letras.mus.br/orlando-silva/125899/ 

terça-feira, 20 de agosto de 2024

Ademar Macedo (Ramalhete de Trovas) 22


 


Trovador Homenageado do dia: Arlindo Tadeu Hagen (Trovas em preto e branco)


1
A casa quase vazia
mostra ao ator, numa trama,
que outro drama se inicia
quando ele encerra o seu drama
2
A saudade em meu destino
é uma criança levada
que, brincando, bate o sino
de uma igreja abandonada.
3
Bate à porta... e a desconfiança
põe o Salim na agonia:
tem mais medo de cobrança
do que gato de água fria!
4
– Casamento é mesmo o fim!
diz ela, no seu enfado.
– Quem suspirava por mim
agora ronca ao meu lado!
5
Diz o burro: - Não dá pé
minha paquera travessa!
Não sei fazer cafuné
numa "mula sem cabeça"!!!
6
Ela vive namorando
no escurinho atrás do muro
e por isto andam chamando
seu namoro de ... "namuro"!
7
Faltaram surpresa e encanto
em nosso encontro no cais...
Eu te esperei tanto, tanto,
que eu nem esperava mais...
8
Infância é um brinquedo usado
que um dia a vida resolve
tomar um pouco emprestado
e nunca mais nos devolve.
9
Maria é um resto somente
no cais, largada ao desdém...
ontem - mar de tanta gente...
hoje - porto de ninguém!...
10
Não sei de temeridade
maior do que andar sozinho.
A presença da amizade
encurta qualquer caminho.
11
O toureiro Chico Louro
é chifrado onde estiver:
Na tourada... pelo touro,
No forró... pela mulher.
12
Saudade são velhos trapos,
pedaços do coração,
que fica feito farrapos
na cerca da solidão!

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SOBRE AS TROVAS DE ARLINDO
por José Feldman

As trovas de Arlindo Tadeu Hagen exploram temas como saudade, solidão e as nuances da vida cotidiana. Cada uma traz uma reflexão poética sobre relacionamentos, memórias e a passagem do tempo.

1 – A Casa Quase Vazia: Reflete sobre a transição e o ciclo da vida, onde o encerramento de uma fase dá início a outra.

2 – Saudade em Meu Destino: A saudade é personificada como uma criança travessa, simbolizando a inocência perdida e a nostalgia de tempos passados.

3 – Desconfiança e Medo: Retrata a tensão emocional que surge em situações de incerteza, usando uma metáfora leve e humorística.

4 – Casamento e Desilusão: Expressa a frustração que pode surgir após o casamento, contrastando expectativas românticas com a realidade do cotidiano.

5 – Paquera e Humor: Usa uma metáfora divertida para falar sobre as dificuldades na conquista, misturando elementos de folclore.

6 – Namoro nas Sombras: Sugere que o amor pode ser clandestino, refletindo sobre a natureza oculta das relações.

7 – Expectativas Frustradas: Captura a desilusão de um encontro que não corresponde às esperanças.

8 – Infância e Perda: Uma meditação sobre a fragilidade da infância, que é temporária e se perde com o tempo.

9 – Desamparo de Maria: Ilustra a solidão e o descaso que a vida pode trazer, usando a metáfora de um porto deserto.

10 – Amizade e Solidariedade: Valoriza a importância da amizade como um alicerce que torna a jornada da vida mais suportável.

11 – Toureiro e Identidade: Brinca com a ideia de que a identidade é moldada pelas experiências e interações sociais.

12 – Saudade e Solidão: Usa a imagem de trapos para simbolizar os sentimentos desgastados que ficam após a perda.

CONCLUSÃO
A saudade é uma presença constante nas trovas, destacando a nostalgia e a perda. A ideia de que a infância e momentos passados não podem ser recuperados ressoa fortemente. Muitas trovas abordam a solidão e o desamparo, especialmente em contextos de amor e amizade. A desilusão no casamento e a complexidade das relações são temas recorrentes.

Arlindo utiliza o humor para abordar situações sérias, como em "A desconfiança" e "O toureiro Chico Louro". Essas trovas trazem leveza, permitindo o leitor rir de situações cotidianas. Usa metáforas e imagens vívidas, como "mar de tanta gente" ou "trapos do coração", para transmitir emoções profundas e criar conexões visuais com o leitor.

A combinação de humor, nostalgia e reflexão oferece um espaço para que os leitores se identifiquem com as experiências descritas. A simplicidade das palavras contrasta com a profundidade dos sentimentos, tornando suas trovas acessíveis e ressonantes.

A ironia em algumas trovas não apenas diverte, mas também provoca reflexão. Ele usa o humor para expor verdades sobre a vida e as relações, permitindo que os leitores se identifiquem com as situações de forma leve, mas profunda. 

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. IA Open. vol.1. Maringá/PR: Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

Eduardo Martínez (Aurelino, o empertigado)

Era desagradável por natureza. Alguns não gostavam das gravatas que usava, outros implicavam com o sotaque carregado de erres. No entanto, todos não suportavam o seu modo de dizer as horas.

— 18 menos 5.

Empertigado que nem pavão, Aurelino desfilava soberba por onde passava. Ninguém se atrevia a dizer coisa que o desabonasse, mesmo que o vaidoso merecesse ser achincalhado. Era homem de posição, e prudência era necessária para não ser alvo de perseguição por tolice. Um biltre, é verdade. Todavia, biltre com o alforje repleto de poder. 

O traste empoderado, além da canalhice e da maneira de dizer as horas, era mais pontual que bexiga de velho durante as madrugadas frias. E ai de quem não estivesse pronto na hora marcada.

— Seu Jorge, amanhã passo aqui às 10 menos 15 para que você me apare o bigode.

— Não vai querer cortar o cabelo, doutor?

— Semana que vem.

O barbeiro, que era bom na tesoura, mas ruim em matemática, se desdobrava para descobrir a que horas o freguês iria aparecer. Por sorte, naquele dia, estava por ali o pequeno Juliano, menino afeito a contas. 

— 9h45!

— Tem certeza?

— Se duvida, por que o senhor não faz as contas?

Sem tutano para tanto, Jorge tratou logo de colocar a desconfiança de lado. Pegou o caderno de espiral debaixo do balcão e anotou o compromisso. 

No dia seguinte, na hora marcada, lá estava Aurelino para cortar as pontas do bigode. Cumprimentou o barbeiro, que ligeiro foi dar algumas espanadas na cadeira para o ilustre freguês se acomodar.

Corta daqui, corta dali, eis que, de repente, a cabeça do Aurelino tombou para o lado. O corpo seguiu caminho idêntico. 

Jorge, a princípio, imaginou que o mais ilustre cliente estaria lhe pregando uma peça. Que nada! O coração do homem havia cansado de bater exatamente às 10 menos 10.

Fonte: Blog do Menino Dudu. 18 agosto 2024.