quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Anatole France (Baltasar)


I
Nesse tempo, Baltasar, que os gregos chamaram Sarraceno, reinava na Etiópia. Negro, mas belo de rosto, era de espírito simples e de coração generoso. Durante o terceiro ano de seu reinado, que era o vigésimo segundo de sua idade, saiu para visitar Balkis, rainha de Sabç. Acompanhavam-no o mago Sembobitis e o eunuco Menkera. Seguiam-no setenta e cinco camelos, carregados de cinamomo, mirra, ouro em pó e dentes de elefante. No decorrer da caminhada, Sembobitis ensinava-lhe não só a influência dos planetas como também as virtudes das pedras e Menkera cantava-lhe canções litúrgicas; mas ele não os ouvia e distraía-se a olhar os pequenos chacais sentados, de orelhas em pé, contra o horizonte de areia.

Enfim, após doze dias de viagem, Baltasar e seus companheiros sentiram um perfume de rosas, e, dentro em pouco, avistaram os jardins que contornavam a cidade de Sabá.
Nesse lugar, iam encontrar moçoilas que dançavam debaixo de romeiras em flor.

- A dança é uma prece, disse o mago Sembobitis.

- Vender-se-iam por elevado preço essas mulheres, disse o eunuco Menkera.

Assim que entraram na cidade, maravilharam-se da grandeza das lojas, dos galpôes e depósitos que diante deles se estendiam e, ainda, da quantidade de mercadorias que neles se acumulavam. Caminharam muito tempo pelas ruas cheias de carretas e carregadores, de asnos e almocreves, e depararam, quando menos esperavam, com as muralhas de mármore, os pavilhôes de púrpura, as cúpulas de ouro do palácio de Balkis. Recebeu-os a rainha de Sabá num pátio refrescado por chafarizes de água perfumada que se desmanchava em pérolas com límpido murmúrio. De pé, vestindo uma túnica de pedrarias, ela sorria.

Assim que a viu, Baltasar foi tomado de grande perturbação. Parecia-lhe ela mais doce que o sonho e mais bela que o desejo.

- Senhor, disse-lhe baixinho Sembobitis, cuidai de ajustar com a rainha um bom tratado de comércio.

- Acautelai-vos, senhor, acrescentou Menkera. Dizem que ela emprega a magia para se fazer amada pelos homens.

Em seguida, depois de se prosternarem, o mago e o eunuco retiraram-se.

Ao ficar a sós com Balkis, Baltasar tentou falar, abriu a boca, mas não pode dizer uma única palavra. Pensou então consigo mesmo: A rainha irá aborrecer-se com o meu silêncio.

No entanto, ela estava a sorrir e não tinha ar de enfado. Foi a primeira a falar, e disse com voz mais suave que a mais suave música:

- Sede bem-vindo e assentai-vos junto de mim.

E com o dedo, que a um raio de luz clara se assemelhava, indicou-lhe os coxins de púrpura espalhados pelo chão.

Exalando profundo suspiro Baltasar acomodou-se e, agarrando uma almofada em cada mão, exclamou de repente:

- Senhora, quisera que estes dois coxins fossem dois gigantes, inimigos vossos, para que eu lhes torcesse o pescoço.

E, assim dizendo, cerrava tão fortemente as almofadas nas mãos, que o estofo se rompeu, deixando sair uma nuvem de pequeninas plumas brancas. Uma delas voltejou por momento no ar e depois foi pousar no colo da rainha.

- Senhor Baltasar, disse Balkis corando, por que desejais matar gigantes?

- Porque vos amo, respondeu Baltasar.

- Dizei-me, indagou Balkis, se em vossa capital é boa a água das cisternas?

- Sim, respondeu surpreso Baltasar.

- Também tenho curiosidade de saber, prosseguiu Balkis, como se fabricam os doces secos na Etiópia.

O rei não sabia o que responder. Ela insistiu:

- Dizei, dizei, que me agradareis.

Então, fazendo grande esforço de memória, ele descreveu os processos dos cozinheiros etiópicos, que confeiçoam marmelos com mel. Ela porém não o ouvia.

De repente interrompeu-o:

- Senhor, dizem que amais a rainha Candace, vossa vizinha. Não me enganeis: ela é mais bela do que eu?

- Mais bela, senhora, exclamou Baltasar caindo a seus pés, será possível?...

A rainha prosseguiu:

- Sim! seus olhos? sua boca? sua tez? seu colo? . .
.
Baltasar estendeu os braços para ela e suplicou:

- Deixai-me remover a plumazinha que em vosso colo pousou e dar-vos-ei a metade de meu reino mais o sábio Sembobitis e o eunuco Menkera.

Ela porém ergueu-se e afastou-se rindo sonoramente.

Quando o mago e o eunuco retornaram, encontraram o seu senhor em inusitada atitude pensativa.

- Senhor, não haveis concluído um bom tratado comercial? inquiriu Sembobitis.

Nesse dia, Baltasar ceou com a rainha de Sabá e bebeu vinho de palmeira. Enquanto ceiavam, Balkis tornou a perguntar-lhe:

- Então, é verdade? A rainha Candace não é tão bela quanto eu?

- A rainha Candace é negra, replicou Baltasar.

Balkis encarou vivamente Baltasar e comentou:

- Pode-se ser negro sem ser feio.

- Balkis! exclamou o rei.

Mais nada pode acrescentar. Tomando-a nos braços, inclinara sob os seus lábios a fronte .da rainha. Mas viu que ela chorava. Falou-lhe então em surdina, com voz carinhosa e um pouco cantante, tal como fazem as amas, e chamou-a sua pequena flor e sua pequena estrela.

- Por que chorais? perguntou ele. E que é preciso fazer para que não choreis mais? Se tendes algum desejo dizei-me, para que eu possa realizá-lo.

Já não chorava mais, porém ficou absorta. Durante muito tempo, Baltasar instou para que ela lhe confiasse o seu desejo.

Enfim ela acedeu:

- Eu quisera ter medo.

Como Baltasar parecesse não ter compreendido, explicou-lhe que há muito sentia necessidade de correr algum perigo desconhecido, coisa que não lhe era possível, pois os guardas e os deuses sabeus velavam por ela.

- Contudo, acrescentou suspirando, quisera sentir durante a noite o delicioso frio do pavor penetrar em minha carne. Quisera sentir arrepiarem-se-me os cabelos. Oh! seria tão bom ter medo!

E, enlaçando os braços ao pescoço do rei negro, disse-lhe com a voz de uma criança que suplica:

- Eis que já chegou a noite. Partamos disfarçados para a cidade. Quereis?

Ele assentiu. Correu Balkis então ‡ janela e pela rótula olhou a praça pública.

- Um mendigo, disse ela, está deitado junto ao muro do palácio. Dai-lhe as vossas roupas e pedi-lhe em troca o seu turbante de pêlo de camelo e o pano grosseiro que lhe cinge os rins. Apressai-vos, que me vou aprontar.

E saiu correndo da sala do banquete a bater palmas para melhor manifestar a sua alegria. Baltasar tirou sua túnica de linho, bordada de ouro, e cingiu-se com o saiote do mendigo. Tinha assim a aparência de um verdadeiro escravo. A rainha reapareceu dali a pouco, vestindo a saia azul sem costura das mulheres que trabalham nos campos.

- Vamos! disse ela.

E guiou Baltasar por estreitos corredores até uma pequena porta que se abria para a campina.

II

Escura era a noite e, dentro da noite, Balkis parecia mais pequena ainda. Conduziu ela Baltasar a uma tasca onde brutamontes e carregadores da cidade se reuniam com prostitutas. Nesse lugar, assentados a uma mesa, viam, a luz de infecta lâmpada, em atmosfera espessa, homenzarrôes mal cheirosos que trocavam murros e facadas por uma barregã ou por um caneco de bebida fermentada, enquanto outros roncavam, de punhos fechados, debaixo das mesas. O taverneiro, recostado sobre uns sacos, observava prudentemente, com o canto dos olhos, as rixas dos beberrôes. Avistando uns peixes salgados que pendiam das traves do teto, Balkis declarou ao companheiro:

- Bem que eu gostaria de comer um desses peixes com cebola esmagada.

Baltasar ordenou que a servissem. Quando ela acabou de comer, o rei percebeu que não havia trazido dinheiro. Mas isto não lhe causou nenhuma inquietação por supor que poderiam sair sem pagar a despesa. O taverneiro barrou-lhes porém o caminho, chamando-lhes vilão, escravo e sórdida vagabunda. Com um soco Baltasar estendeu-o por terra. Vários bebedores atiraram-se de faca em punho contra os dois desconhecidos. Mas o negro, munindo-se de um enorme pilão, que era usado para amassar cebolas do Egito, desancou dois dos agressores e obrigou os outros a recuarem. Ao mesmo tempo, sentia o calor do corpo de Balkis enroscado no dele, e por isso era invencível. Os amigos do bodegueiro, não mais ousando se aproximar, atiraram contra Baltasar, do fundo da espelunca, jarras de óleo, canecos de estanho, tochas acesas e até o enorme caldeirão de bronze onde se cozinhava um carneiro de uma só vez. O panelão atingiu com horrível estrondo a fronte de Baltasar e lhe fez um enorme corte na cabeça. Por momentos ele ficou aturdido, mas em seguida, recuperando as forças, arremessou de volta o marmitão, porém com tamanho vigor que o seu peso foi decuplicado. Ao choque do bronze misturaram-se uivos inauditos e estertores de morte. Aproveitando-se do pânico dos sobreviventes e temendo que Balkis pudesse ser ferida, tomou-a nos braços e com ela fugiu pelas ruelas sombrias e desertas. O silêncio da noite envolvia a terra, e os fugitivos ouviam decrescer atrás deles o clamor dos bebedores e do femeaço, que os perseguiam ao acaso na escuridão. Logo nada mais ouviam a não ser o fraco ruído das gotas de sangue que caíam, uma a uma, da testa de Baltasar sobre o colo de Balkis.

- Amo-te! murmurava a rainha.

E a lua, irrompendo de uma nuvem, permitiu ao rei ver um clarão úmido e nevoento nos olhos entre cerrados de Balkis. Desceram ambos ao leito ressequido de uma corrente. De repente, o pé de Baltasar escorregou nos musgos e os dois caíram abraçados. Pareceu-lhes que se haviam afundado num delicioso abismo sem fim e o mundo dos vivos deixou de existir para eles.

Gozavam ainda do fascinante esquecimento do tempo, do número e do espaço, quando, á aurora, as gazelas vieram beber no côncavo das pedras. Nesse momento, uns salteadores que passavam viram os dois amantes deitados no musgo.

- São pobres, disseram, mas nós os venderemos por bom preço, pois são jovens e belos.

Então se aproximaram do casal, amarraram os dois e, atando-os à cauda de um asno,
prosseguiram seu caminho. O negro, acorrentado, proferia contra os bandidos ameaças de morte. Mas Balkis, tiritando ao ar frio da manhã, parecia sorrir a algo de invisível.Caminharam por desolados desertos até que se acentuou o calor do dia. Já ia alto o sol quando os facínoras desamarraram os prisioneiros e, fazendo-os assentarem-se ao pé deles, à sombra de um rochedo, jogaram-lhes um pedaço de pão bolorento, que Baltasar desdenhou de apanhar, mas que Balkis comeu avidamente.

Ela ria. O chefe dos salteadores perguntou-lhe por que ria:

- Rio-me, respondeu-lhe ela, por pensar que vos mandarei enforcar a todos.

- De verdade! zombou o chefe dos assaltantes. Eis um estranho intento na boca de uma lavadeira de escudelas como tu, minha querida! Sem dúvida é com a ajuda de teu galante negro que nos farás enforcar?

Ouvindo tão ultrajantes palavras, Baltasar foi tomado de grande furor. Atirou-se sobre o bandido e apertou-lhe tão fortemente a garganta que quase o estrangulou. Mas este enterrou-lhe até o cabo uma faca no ventre. O pobre rei, rolando por terra, volveu a Balkis um olhar de moribundo, que se extinguiu quase no mesmo instante.

III
Nesse instante, ouviu-se grande estrépito de homens, cavalos e armas, e Balkis reconheceu o bravo Abner que, à frente de sua guarda, vinha livrar a rainha, de cuja misteriosa desaparição desde a véspera tivera conhecimento.

Depois de prosternar-se três vezes aos pés de Balkis, .mandou avançar uma liteira de antemão preparada para recebê-la. Enquanto isso, os guardas amarravam as mãos dos assaltantes. Voltando-se para o chefe deles, disse-lhe com suavidade a rainha:

- Não me censurarás, amigo, de te haver feito vã promessa quando garanti que serias enforcado.

O mago Sembobitis e o eunuco Menkera, que ladeavam Abner, puseram-se aos gritos mal viram o seu príncipe estendido no chão, imóvel, com uma faca enterrada no ventre. Soergueram-no com precaução. Sembobitis, que excercia na arte da medicina, viu que ele ainda respirava. Fez-lhe um rápido curativo, enquanto Menkera enxugava a baba que escorria da boca do rei. Amarraram-no, em seguida, sobre um cavalo e conduziram-no vagarosamente até o palácio da rainha.

Durante quinze dias Baltasar esteve subjugado por violento delírio. Falava sem cessar no panelão fumegante, no musgo do córrego e chamava aos gritos por Balkis. Finalmente, no décimo sexto dia, abrindo os olhos, viu à sua cabeceira Sembobitis e Menkera, mas não avistou a rainha.

- Onde está ela? Que faz ela?

- Senhor, respondeu-lhe Menkera, ela está encerrada com o rei de Comagena.

- Combinam, sem dúvida, trocas de mercadorias, ajuntou o sábio Sembobitis. Mas não vos perturbeis dessa forma, senhor, porque vossa febre recomeçará.

- Quero vê-la! exclamou Baltasar.

E atirou-se em direção do apartamento da rainha sem que o ancião ou o eunuco pudessem retê-lo. Ao chegar diante da alcova, dela viu sair o rei de Comagena todo coberto de ouro e brilhante como um sol.

Balkis, reclinada sobre leito de púrpura, sorria, de olhos fechados.

- Minha Balkis, minha Balkis! soluçou Baltasar.

Ela porém nem voltou a cabeça e parecia prolongar um sonho.

Baltasar, aproximando-se, tomou-lhe uma das mãos que ela retirou bruscamente.

- Que quereis de mim? perguntou a mulher.

- Sois vós que perguntais! respondeu o rei negro desfazendo-se em lágrimas.

Balkis volveu-lhe uns olhos tranqüilos e duros, e Baltasar compreendeu que ela de tudo esquecera. Recordou-lhe então, a noite da torrente.

- Na verdade, não sei que pretendeis dizer, senhor. Não vos fez bem o vinho de palmeira! Estivestes sonhando por certo.

- Como! exclamou o infeliz príncipe torcendo os braços, teus beijos e a facada de que guardo o sinal, são por acaso sonhos! . . .

Ela se levantou. As pedrarias de sua veste produziram ruído semelhante à saraiva e expediram cintilações.

- Senhor, disse ela, esta é a hora em que se reúne o meu conselho. Não disponho de tempo para esclarecer os sonhos de vosso cérebro enfermo. Ide repousar. Adeus!

Baltasar, sentindo-se desfalecer, esforçou-se por não mostrar sua fraqueza à perversa mulher, e correu para sua câmara, onde tombou desmaiado, com a ferida reaberta.

Três semanas permaneceu insensível e feito morto, mas, sentindo-se reanimado no vigésimo segundo dia, segurou a mão de Sembobitis, que o velava em companhia de Menkera, e protestou soluçando:

- Oh! meus amigos, quanto sois felizes, um por ser velho e outro por aos velhos assemelhar-se! . . . Mas não! Não há felicidade no mundo, nele tudo é mau, pois que o amor é um mal e Balkis é má.

- A sabedoria restitui a felicidade, respondeu Sembobitis.

- Gostaria de experimentar, disse Baltasar. Mas partamos imediatamente para a Etiópia.

Como perdera o que amava, resolveu consagrar-se à sabedoria e vir a ser um mago. Se esta resolução não lhe dava prazer, trar-lhe-ia, ao menos, um pouco de calma. Toda a noite, sentado no terraço de seu palácio, em companhia do mago Sembobitis e do eunuco Menkera, contemplava ele as palmeiras imóveis no horizonte, ou atentava, à luz da lua, para os crocodilos que, como troncos de árvores, flutuavam sobre o Nilo.

- Nunca se cansa de admirar a natureza, dizia Sembobitis.

- Sem dúvida, respondia Baltasar. Mas há na natureza coisas mais belas que as palmeiras e os crocodilos.

E assim falava porque se lembrava de Balkis.

Sembobitis, que era velho, retomava:

- Há o fenômeno das enchentes do Nilo que é admirável e que já expliquei. O homem é feito para compreender.

- Ele é feito para amar, retrucava Baltasar suspirando. Há coisas que não se explicam.

- Quais? perguntava Sembobitis.

- A traição de uma mulher, respondia o rei.

Contudo, estando Baltasar resolvido a ser um mago, mandou construir uma torre do alto da qual se descortinavam diversos reinos e toda a extensão do céu. Era de tijolos e elevava-se acima das demais torres. Levou dois anos a ser construída e nela despendeu Baltasar todo o tesouro do rei seu pai. Toda noite subia ele ao topo dessa torre, e, lá, observava o céu sob a direção de Sembobitis.

- As figuras do céu são os signos de nossos destinos, dizia-lhe Sembobitis.

Ao que o rei replicava:

- … preciso admitir que esses signos são obscuros. Mas, enquanto eu os estudo, não penso em Balkis, o que é um grande bem.

O mago ensinava-lhe, entre outras verdades de útil conhecimento, que as estrelas são fixas como pregos na abóbada celeste e que há cinco planetas, a saber: Bel, Merodach e Nebo, que são machos, e Sin e Mílita que são fêmeas.

- A prata, dizia-lhe ele ainda, corresponde a Sin, que é a lua, o ferro a Merodach, o estanho a Bel.

E o bom Baltasar dizia:

- Eis aí conhecimentos que desejo adquirir. Enquanto estudo a astronomia, não penso nem em Balkis nem no que quer que seja deste mundo. As ciências são benéficas: elas impedem os homens de pensar. Sembobitis, ensina-me os conhecimentos que destroem nos homens a paixão e eu te cumularei de honrarias entre o meu povo.

Eis por que Sembobitis ensinou a sabedoria ao rei. Com ele Baltasar aprendeu apotelesmática, segundo os princípios de Astrampsicos, de Gobrias e de Pazatas. Baltasar, à medida que observava as doze casas do sol, pensava menos em Balkis. Menkera, que disso se apercebeu, demonstrou grande alegria:

- Confessai, senhor, disse-lhe um dia, que a rainha Balkis ocultava debaixo das vestes de ouro pés fendidos como são os das cabras...

- Quem te contou semelhante tolice? perguntou o rei.

- … a crença pública, senhor, tanto em Sabá quanto na Etiópia, respondeu o eunuco. Todos por aí afirmam que a rainha Balkis tem a perna cabeluda e o pé feito de dois chifres pretos.

Baltasar deu de ombros. Sabia que as pernas e os pés de Balkis eram feitos como os pés e as pernas de outras mulheres e perfeitamente belos. No entanto, essa idéia prejudicou-lhe a lembrança daquela que tanto amara. Pareceu-lhe afrontoso que a beleza de Balkis não estivesse isenta de ofensas na imaginação dos que a ignoravam. A idéia de que possuíra uma mulher, na verdade bela, mas que passava por monstruosa, provocou verdadeiro mal-estar e não desejou mais rever Balkis. De alma simples era Baltasar, mas o amor é sempre um sentimento assaz complicado. A contar desse dia, o rei fez grandes progressos em magia e em astrologia. Era extremamente atento às conjunções dos astros e tirava os horóscopos com tanta exatidão quanto o próprio sábio Sembobitis.

- Sembobitis, dizia-lhe, tu respondes com a cabeça pelo acerto dos meus horóscopos?

E o sábio Sembobitis respondia-lhe:

- Senhor, a ciência é infalível, mas os sábios sempre se enganam.

Baltasar tinha um belo talento natural, e afirmava:

- Nada existe de mais verdadeiro do que o que é divino, mas o divino nos é oculto. Procuramos em vão a verdade. Contudo, eis que descobri uma estrela nova no céu. … bela, parece vivente e, quando cintila, dir-se-ia um olho celeste que pisca com doçura. Feliz, feliz, feliz, quem nascer sob essa estrela! Sembobitis, vê que olhar nos lança esse astro encantador e magnífico.

Mas Sembobitis não viu a estrela, porque não a queria ver. Sábio e velho, não gostava de novidades.

E Baltasar repetia sozinho no silêncio da noite:

- Feliz, feliz, feliz, quem nascer sob essa estrela!

V

Ora, por toda a Etiópia e pelos reinos vizinhos propagou-se o rumor de que o rei Baltasar não mais amava Balkis.

Quando a notícia atingiu o país dos sabeus, Balkis indignou-se como se tivesse sido traída. Correu para o rei de Comagena, que na cidade de Sabá esquecia o seu império, e exclamou:

- Sabeis, amigo, do que acabo de ter conhecimento?

Baltasar não mais me ama.

- Que importa! respondeu sorrindo o rei de Comagena, se nós nos amamos.

- Mas não sentis, então, a afronta que esse negro me faz?

- Não, respondeu o rei de Comagena, não a sinto.

Balkis despediu-o ignominiosamente e ordenou ao seu grão-vizir tudo preparar para uma viagem à Etiópia.

- Partiremos esta noite mesmo, disse ela. Se antes do pÙr-do-sol, não estiver tudo preparado, mando cortar-te a cabeça.

Depois, quando se viu sozinha, pôs-se a soluçar:

- Amo-o! Ele não mais me ama e eu o amo! suspirava com toda a sinceridade de seu coração.

Ora, certa noite em que estava no topo da torre, a observar a estrela miraculosa, Baltasar, descendo o olhar para a terra, viu uma longa fileira negra, que serpenteava ao longe, sobre a areia do deserto, como um exército de formigas. Pouco a pouco, o que lhe parecera formigas avultou e tornou-se assaz nítido para que o rei verificasse que eram cavalos, camelos e elefantes.

Aproximando-se da cidade a caravana, Baltasar distinguiu as cimitarras resplandecentes e os cavalos negros dos guardas da rainha de Sabá. E, reconhecendo a própria rainha, sentiu-se fortemente perturbado. Percebeu que ia amá-la outra vez. A
estrela brilhava no zênite com esplendor maravilhoso. Embaixo, Balkis, reclinada numa liteira de púrpura e ouro, era pequena e brilhante como a estrela.

Baltasar sentiu-se atraído para ela por uma força violenta. Todavia, num esforço desesperado, voltou a cabeça e, levantando os olhos, reviu a estrela. Então a estrela assim falou
– Glória a Deus nos céus e paz na terra aos homens de boa vontade. Apanha uma medida de mirra, bom rei Baltasar, e segue-me. Eu te conduzirei aos pés do menino que acaba de nascer num estábulo, entre o asno e o boi. Esse menino é o rei dos reis. Ele consolará os que querem ser consolados. Ele te chama, Baltasar, a ti cuja alma é tão sombria quanto o rosto, mas cujo coração é simples como o de uma criança. Ele te escolheu porque sofreste, e ele te dará a riqueza, a alegria e o amor. Ele te dirá: sê pobre com júbilo, essa é a verdadeira riqueza. Ele te dirá ainda: a verdadeira alegria está na renúncia à alegria. Ama-me e não ames as criaturas senão em mim, porque somente eu sou o amor.î

A estas palavras, uma paz divina difundiu-se como uma luz sobre o semblante sombrio do rei. Baltasar, arrebatado, escutava a estrela. E sentia que estava se tornando um novo homem. Sembobitis e Menkera, prosternados, as frontes tocando a pedra, também a adoravam. A rainha Balkis observava Baltasar e compreendeu que jamais haveria amor para ela naquele coração transbordante do amor divino. Empalideceu de
despeito e deu ordem à caravana de regressar imediatamente às terras de Sabá.

Quando a estrela cessou de falar, o rei e seus dois companheiros desceram da torre. Em seguida, preparada a medida de mirra, organizaram uma caravana e saíram para onde os conduzia a estrela. Viajaram longo tempo por desconhecidas terras, sendo que a estrela marchava adiante deles.

Um dia, achando-se num lugar onde três caminhos se encontravam, viram eles dois reis que avançavam com numeroso séquito. Um era jovem e branco de rosto. Saudou Baltasar e disse-lhe:

- Chamo-me Gaspar, sou rei e vou levar ouro como presente ao menino que acaba de nascer em Belém de Judá.

O segundo rei adiantou-se por sua vez. Era um velho cuja barba branca lhe cobria o peito.

- Chamo-me Melchior, disse ele, sou rei e vou levar incenso à divina criança que vem ensinar a verdade aos homens.

- Sigo o mesmo caminho de vós, respondeu Baltasar; venci minha luxúria, e por isso a estrela me falou.

- Eu venci meu orgulho, disse Melchior, e por isso fui chamado.

- Eu venci minha crueldade, disse Gaspar, e por isso vou convosco.

E os três reis magos prosseguiram juntos a viagem. A estrela, que eles tinham visto no
Oriente, precedeu-os sempre até que se deteve ao chegar sobre o lugar onde estava o menino.

Ora, vendo parar a estrela, eles se alegraram profundamente. E, entrando no estábulo, encontraram o menino com Maria, sua mãe, e, prosternando-se, adoraram-no. E, abrindo seus tesouros, ofertaram-lhe ouro, incenso e mirra, tal como está dito no Evangelho.

Fontes:
http://virtualbooks.terra.com.br

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Pôr-do-Sol Cultural (em Itu)



5 de novembro
a partir das 18h30
no Museu da Energia de Itu

Um grande sarau comemorando o Dia da Cultura!

As atrações serão:

* Dança-Teatro
* Street Dance e Rap com Nação Hip Hop de Itu
* Declamação de Poesias (autores ituanos)
* Curtas-metragens (CineClube Itu) com participação do diretor Marcelo Domingues
* Grupo Choro das Três!

Exposições:

* Paulo Lara e Karin Mangiavacchi;
* Varal de poesias do EJA (Escola de Jovens e Adultos)

Ingresso:
* 1 litro de leite

Pontos de Troca:
* Museu da Energia de Itu (Rua Paula Souza, 669)
* Loja Universo Hip Hop (Rua Floriano Peixoto, 799).

Contato: 4022-6832 / (11) 7599-7848

E-mail: bibliotecacomunitariaitu@gmail.com
Blog: http://bibliotecacomunitaria.wordpress.com/

Iniciativa:
* Museu da Energia de Itu
* Biblioteca Comunitária prof. Waldir de Souza Lima


Apoio:
* Secretaria Municipal de Cultura de Itu
* Secretaria Municipal de Turismo, Lazer e Eventos de Itu
* Nação Hip Hop Itu
* Cineclube Itu Osvaldo de Oliveira
* Restaurante Quinhão
* Grupo HPSete

Fontes:
E-mail enviado pela Biblioteca Comunitária Prof. Waldir de Souza Lima
Imagem =
http://olhares.aeiou.pt

Alcione Araújo (Lançamento de "Pássaros de Vôo Curto)


O livro Pássaros de vôo curto, de Alcione Araújo, será lançado durante a 22ª Feira do Livro, que vai do dia 5 ao dia 10 de novembro de 2008, e será realizada na praça Marechal Floriano.

Alcione Araújo nasceu em 1945, na cidade de Januária, Minas Gerais. É formado em engenharia e já foi professor na Universidade de Minas Gerais. Estreou no teatro com a peça Há vagas para moças de fino trato, em 1974. São de sua autoria também peças teatrais consagradas, como Doce deleite e A caravana da ilusão. Alcione também é cronista do jornal Estado de Minas e Pássaros de vôo curto é seu segundo romance. Ainda, o autor faz parte dos Três Tenores (coordenadores de debates) das Jornadas Nacionais de Literatura.

O lançamento do livro está marcado para três datas: 5 de novembro para a comunidade em geral e o público acadêmico, às 19h30min, no auditório do IFCH (Instituto de Filosofia e Ciências Humanas); 6 de novembro, às 18h30min na praça Marechal Floriano, para o público da feira; e 7 de novembro, em Carazinho, na UPF campus Carazinho, às 19h30min, para escolas públicas e particulares da cidade.

Resenha

Um grande quebra-cabeça, com peças extremamente coloridas por personagens humanos e muita história do Brasil, com encaixes criados pelo leitor na hora de sua leitura. Eis uma boa definição visual do novo livro do dramaturgo, diretor e professor Alcione Araújo, chamado Pássaros de vôo curto.

A obra pode parecer, no início da leitura, uma seqüência de enredos independentes, por se passarem em épocas distintas e terem personagens diversos. Apesar disso, à medida que o leitor vai conhecendo as personagens e ambientando-se com cada cenário, percebe que todos estão interligados, como diz a teoria dos seis graus de separação, recentemente transposta para a televisão na série Six degrees, de um dos criadores do famoso Lost, que também explora o tema. De acordo com a teoria do psicólogo americano Stanley Milgram, são necessários no máximo seis laços de amizade para que duas pessoas quaisquer estejam ligadas.

Tal teoria concretiza-se em Pássaros de vôo curto e é o que consegue unir os três eixos narrativos iniciais, que não estão dispostos em ordem cronológica e alternam-se a cada página, fazendo o leitor construir um verdadeiro mapa mental (ou físico, em uma folha de papel, no meu caso...) do enredo para melhor apreciá-lo. Um exemplo simples e rápido desse fato é que na obra de Alcione Araújo, a mundialmente famosa cantora lírica grega, Maria Callas, está a somente dois graus de separação do garimpeiro Orlando, morador da interiorana cidade mineira de Galiléia.

Assim, o livro consegue descrever um grande pedaço da história de Minas Gerais e do Brasil, desde a exploração do ouro mineiro no século XIX por companhias inglesas, passando pela participação brasileira na Segunda Guerra Mundial, culminando no fim da ditadura militar, configurando-se em uma verdadeira saga de mais de 100 anos.

Vários sub-temas são recorrentes na obra, como estribilhos que ecoam por toda a história, ora explícitos, ora ocultos em histórias secundárias. O principal deles é a música lírica e a ópera. A cantora Diva Bustamante é quem personifica tal aspecto, em seu sonho quixotesco de levar tal repertório pelo Brasil afora, dentro de um antigo carro blindado (veterano da Segunda Guerra mundial) transformado em ônibus, batizado 14 Bis. Nesse estranho veículo; pilotado pelo motorista, mecânico e assistente de palco, Zé Bolero; a cantora se apresenta com o pianista americano Ralph Conway, levando a ópera a uma, em suas palavras, “terra de botocudos.” Entre seu repertório, merece destaque a ópera de Giuseppe Verdi, La Traviata, muito significativa na trama: histórias paralelas de personagens como Ralph ou a camareira de Diva, Orlanda, são variações sobre o tema da prostituta que se apaixona e deve deixar o homem que ama, mesmo a contragosto, pensando no bem do amado.

Outro tema recorrente e que pode dar pistas sobre o título da obra é a aviação. Exemplo disso é a paixão que Zé Bolero e Vittorio Emanuelle Sbravatti Chalmers têm por voar. Mas, infelizmente, como retrata muito bem o romance, a satisfação pessoal depende de dinheiro. Assim, este foi piloto de avião da Força Expedicionária Brasileira, enquanto aquele, por ter nascido pobre e filho de mecânico, chegou mais perto do céu subindo em árvores e nomeando o veículo por ele reformado como 14 Bis.

Com personagens cativantes e muito humanos, que vivem situações ora cômicas, ora trágicas, e trazem reflexões profundas, mas simples, sobre arte, política, vida, morte, etc., Pássaros de vôo curto é uma obra que deve ser lida não só pelos interessados em história, que a verão de forma totalmente natural neste romance, mas por todos que apreciam uma grande obra de arte.

Fontes:
E-mail enviado pelo Boletim Jornada
Artigo por PHILIPPSEN, Bruno. Pássaros a seis graus de separação.
Boletim Eletronico Jornadas Literárias de Passo Fundo - n. 74

Balaios de Trovas III



O Amor para ser gostoso,
jamais deve ser pamonha.
Tem de ser escandaloso,
cego, surdo e sem-vergonha!
A.A. de Assis

Prece que veio agora,
por um milagre de Deus,
o suave encontro da aurora
no brilho dos olhos teus!
Admerval Silva de Souza

Felicidade constante
na vida, consiste bem
em a gente achar bastante
o pouquinho que se tem.
A. G. Ramos Jubé

Feliz quem vai pela vida
tão suave e docemente,
como a flor adormecida,
levada pela corrente...
Aires de Montalbo

Já repararam que o rio,
quando vai a caminhar,
é nas pedras do caminho
que mais parece cantar.
Albercyr Camargo

Velhice não é doença,
todos sabem muito bem.
Porém, quanto mais descrença,
mais depressa ela nos vem...
Alberto Lima

No mundo nada terás,
se não socorres alguém.
Ajuda, espera, e verás
como é bom fazer o bem!
Almeida Corrêa

Para matar as saudades
fui ver-te em ânsias, correndo.
E eu que fui matar saudades
Vim de saudades morrendo.
Adelmar Tavares

Minha sogra é mesmo o fim.
Eu digo e tenho vergonha:
duvida tanto de mim
que acredita na cegonha.
Antonio Carlos Pinto

O Homem sempre há de penar
nas mãos da mulher que amou:
antes por querer casar,
e, depois porque casou.
Antônio Zoppi

Se Deus atendesse, um dia,
minha prece ingênua e doce,
quem fosse mãe não morria,
por mais velhinha que fosse.
Arquimimo Japajesse

Debaixo da nossa cama
que tu deixaste vazia,
o meu chinelo reclama
o teu chinelo, Maria
Assis Murad

Mergulha o sol no poente
qual se fosse enorme flor
que, depois de dar semente,
perde o perfume e a cor...
Astolfo Rezende

O tempo ao Amor não mata.
É disto a prova fiel
as nossas Bodas de Prata
em plena Lua de Mel.
Carlos Guimarães

O tempo ao amor não mata.
É disto a prova fiel
as nossas Bodas de Prata
em plena Lua de Mel.
Carlos Guimarães.

Cultiva a amizade, insiste,
põe nela o fervor maior,
pois cada amigo que existe
faz nosso mundo melhor.
Cleonice Rainho

Enxuta! Que Maravilha!
Enxuta como ela só,
quando amamentava a filha
só saía leite em pó.
Colbert R. Coelho

Eu vou aqui na beirada,
Ela ao lado da janela.
Graças às curvas da estrada,
Vou sentindo as curvas dela.
Colbert R. Coelho

Quando a mulher do vizinho
cruza contigo na rua,
diz o diabo baixinho:
"esta é melhor do que a tua!"
Durval Mendonça

Entrei nas lojas da vida,
quis comprar felicidade.
- Fui roubado na medida,
no preço e na qualidade.
Durval Mendonça

Não cobices a mulher
do próximo, nunca mais!
Especialmente se o próximo
está próximo demais...
Eno Theodoro

A mulher no aniversário,
sempre deseja que a gente
se esqueça do seu passado,
mas nunca do seu presente.
Eno Theodoro

É um perigo essa gente
que vive sempre a dizer,
não o que viu, mas somente
aquilo que julgou ver.
Guimarães Barreto

Na vida há céus constelados
e cardos pelos caminhos.
E há poetas deslumbrados
pondo estrelas nos espinhos.
Iracy Nascimento

Felicidade consiste
num contraste extraordinário:
esperar tudo que é triste
e acontecer o contrário.
Lamartine Babo

Quer ser feliz? Então siga
a minha vida bizarra
que tem muito de formiga
e ainda mais de cigarra.
Luiz Otávio

Distraída, distraída,
é a mulher do Januário,
ouve à porta uma batida,
tranca o marido no armário.
Magdalena Léa

Toda Mulher que é gorducha,
tem um recurso só seu,
ao vestir-se grita: "puxa
como esse troço encolheu!!"
Magdalena Léa

Embora sem alegria
vou cantando nos caminhos
foi essa a filosofia
que aprendi com os passarinhos.
Magdalena Léa

Foi tão engraçada a piada
que a dentadura da Zinha
em tremenda gargalhada,
caiu no chão rindo sozinha.
Magdalena Léa

A rua mais esquisita,
a mais escura viela,
fica uma rua bonita
se as crianças brincam nela.
Mariano Vicente

Quem recusa um elogio,
dizendo não merecê-lo,
no fundo sente um desejo
de outra vez mais recebê-lo!
Marivaldo Facca

Coração não tem idade...
Tolice de quem o diz.
- O coração envelhece
quando se sente infeliz.
Mercês Maria Moreira Lopes

Naquele jardim da praça,
quando passas, tão formosa,
é tamanha a tua graça,
que tira a graça da rosa!
Moacyr Pereira

Ternura, meiguice, amor,
e tantas rosas na estrada,
livres de espinhos e dor...
- Sonhar não nos custa nada!
Monteiro Viana

A mulher, ou por vaidade,
ou por ser demais esperta,
depois de uma certa idade,
não tem mais idade certa.
Nero Sena

Amizade é um vaso de flor
que precisa de cuidado, carinho,
de terra, da água e do amor
e se guardar num lindo antinho.
Ondina de Aquino Carrilho Cruz

As suas cartas, senhora,
releio-as de quando em vez.
Mas nelas só vejo agora
os erros de português...
Paulo Emílio Pinto

No homem a malícia é tanta
que, bonita ou mesmo feia,
a mulher que mais o encanta
é sempre a mulher alheia.
Peri Ogilve Rocha

O eletricista Zé Roque,
que só na Light produz
levou um tremendo choque
quando a mulher deu à luz.
Rangel Coelho

Etérea, fluida, de gaze,
corpo volátil de essência,
sua presença era quase
como se fora uma ausência.
Rangel Coelho
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Fonte:
A Hora da Trova. http://www.velhosamigos.com.br/
1-6,39

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Isaque de Borba Corrêa (Diversões papa-siri)


(foto: Carrinho de Rolimã)
-
No seio de uma família de modestos pescadores ou agricultores, o divertimento provinha única e exclusivamente da capacidade de criatividade das crianças de cada família, pois não se tinha à disposição o consumismo de hoje em dia, nem a fartura comercial que encontramos hoje. Dificilmente um pai fabricava os brinquedos, geralmente eraAdicionar imagemm feitos pela própria criança. É bom lembrar que para este caso e para esta época a criança, ou pelo menos o espírito de criança, alcançava a adolescência e, dependendo da época, poderia atingir a juventude. Era comum ver jovens fazendo algumas das brincadeiras que vamos citar. Cada um se divertia como podia usando da criatividade para fazer brinquedos daquilo que a natureza oferecia.

O menino fazia carrinho de lata de azeite, que na época, era quadrada. Recortava a parte de cima no sentido longitudinal e dobrava para cima, a 90º, como se fosse a caçamba do caminhão. Com alguns pregos na ponta de um pedaço de pau ele fazia uma pequena picareta para brincar de barreirinho com este carrinho, junto a um barranco. Depois, com um toco de pau e meia fatia de um gomo de bambu à guisa de lâmina, se fazia um trator tipo “esteira”.

Existia ainda o pião, carrinho de carretel, arapuca, carrinho de aro de bicicleta, carrinho de rolimã, que se chamava zorra.

De bambu se podia fazer uma pistola e uma atiradeira de flechas. A pistola era um pequeno canudo de bambu, do diâmetro de um centímetro no máximo. Uma das extremidades eram afiadas para cortar a casca da laranja, como se fosse um perfurador. Depois com um outro bastão, se expulsava sob pressão a carga de casca acumulada dentro da taquara.

A atiradeira de flecha era também constituída de uma taquara de bambu, porém com um diâmetro maior, talvez de uns 2 centímetros. Colocava-se um pedaço de elástico na boca desta taquara. A taquara tinha que ter um furo atrás, para engatar a flecha. A flecha também feita de bambu era uma tira de bambu de mais ou menos um cm de largura, com uma extremidade afiada e outra, a parte de trás, com uma saliência pouco maior para engatar no furo atrás. A flecha era introduzida dentro do canudo sobre a pressão da borracha com a ponta afiada para frente e a trava para trás. Para acioná-la bastava empurrar a parte saliente da flecha para baixo, que seria expulsa de dentro do cano pela força da pressão da borracha.

Na falta de rolamentos para se fazer uma zorra, o menino se atracava a uma calha de coqueiro e escorregava da ladeira abaixo, de preferência nos morros engramados. Muito parecido com um surf que se faz nas dunas de areias no nordeste. Um pneu ou um aro de bicicleta para sair batendo, também já dava um brinquedo. Bricáva-se de pegar, de esconder, de polícia e ladrão; caçar de funda, armar uma arapuca, armar um lacinho, armar uma xócha para pegar tatu; jogar quilica na “boca”, no triângulo ou na ronda, eram as principais diversões dos meninos. As meninas não tinham um repertório tão farto, o negócio delas era brincar de boneca que faziam de palha de milho. Jogavam amarelinha, cantigas de rodas e às vezes brincavam com os meninos de pegar ou esconder e até casamento atrás da porta. Existe ainda até hoje a brincadeira de jogar taco.

O Carrinho de bambu era o preferido, por isso resolvi inclusive fazer a ilustração na página seguinte. Quanto aos meus, o máximo de sofisticação que tinha era um volante de tampa de lata de tinta. Mas o Nelinho do Olindino, aliás o doutor Manoel Olindino Domingos funcionário da prefeitura municipal há muitos anos. Nelinho inclusive ainda conserva seu ar de sofisticação, mas desde rapaz pequeno que o Nelinho já botava nós todos no bolso com sua educação refinada e sua inteligência muito mais evoluída que a nossa.

Apesar de toda a seriedade que lhe é peculiar, Nelinho confessou-me que roubava as bóias de cortiça da rede do meu avô para fazer as rodas de seus carrinhos. Cada um exibia a sua criatividade como podia. Nelinho pegava duas latas de “Leite Ninho”, fazia furos, colocava brasas dentro como se fossem dois faróis e à noite, andava ele com aquela coisa que parecia um fantasma "com dois bagos de zólho", esnobando a sua criatividade na frente dos demais rapazes que não tinham tal capacidade nem tamanha inventividade nos seus brinquedos. Nelinho dizia que seu carrinho além de tudo era utilitário, pois muitas vezes era incumbido de carregar balaios de peixes da praia até em casa. Como eram muito pesados, ele pendurava o balaio no seu carrinho estrambólico e os transportava com relativa facilidade. Era criatividade que não acabava mais.

Já que falamos em brasas, só para lembrar de mais um divertimento que a gente fazia para o Sábado de Aleluia: Pegava-se um mamão verde, fazia nele furos semelhantes os olhos, e principalmente as canjicas arreganhadas para parecer uma caveira e colocava brasas dentro, pra parecer um fantasma e assustar os outros. Alguns também sofisticavam com uma vela acesa dentro.

Fontes:
http://www.balneariovirtual.com.br/
Imagem =
http://rogeriogalanti.wordpress.com

Entrevista com Isaque de Borba Corrêa


Membro da Academia Desterrense de Letras (Florianópolis) e Academia de Letras de Balneário Camboriú. Escritor, natural de Balneário Camboriú (1960), autor de mais de uma dezena de livros em diversas ciências.

Camboriú Virtual – Como você começou a tomar gosto pela história?

Isaque de Borba Corrêa - Em 1974 o prefeito Gilberto Meirinho propôs aos alunos da rede escolar uma pesquisa sobre a História da cidade. O tema era “Balneário Camboriú – 10 anos de construção” Não consegui terminar em tempo hábil de tanta coisa que arrumei em termos de história oral. Depois descobri os arquivos públicos. Me encantei com a história e pra falar bem a verdade até hoje já vai para 35 anos e ainda não terminei aquela história. Também pela identificação. Sou descendente do primeiro morador da Praia de Camboriú, naquele tempo apenas Camboriú, e recebi de herança documentos, bens que me remetem a história o tempo todo.

Camboriú Virtual – Como está a relação das prefeituras da região com a história de suas cidades? Há uma preocupação no sentido de preservar esses documentos?

Isaque de Borba Corrêa - Muito pouco. Aqui em Balneário Camboriú em termos de arquivo estamos razoavelmente bem, falta inventariar a documentação lá existente. Faltam recursos humanos especializados e um pouco de vontade política de realizar isso. Ainda não existe uma política cultural voltada ao resgate da história como existe em cidades como Joinville, Blumenau, Florianópolis e até Itajaí. Nas demais cidades é uma pena, o que existe são apenas alguns abnegados como eu que solitariamente fazem alguma coisa. E é bom que se frise que a história é fundamental nas cidades turísticas.

Camboriú Virtual – A iniciativa privada tem apoiado projetos voltados para história de nossa cidade?

Isaque de Borba Corrêa - Quando você diz nossa cidade, não sei exatamente qual pois milito nas duas cidades Camboriú e Balneário, e vamos figurar em portais de três cidades, mas posso te garantir que pra história nenhuma empresa até hoje investiu qualquer coisa. Falta uma lei de incentivo, que Itajaí tem faz tempo.

Camboriú Virtual – Quais foram os livros escritos pelo senhor?

Isaque de Borba Corrêa - 1º: HISTÓRIA DE DUAS CIDADES BALNEÁRIO CAMBORIÚ E CAMBORIÚ.
Preparo a 2ª edição. Um best-seller. O livro mais vendido e mais lido em Balneário Camboriú.

2º- DICIONÁRIO PAPA-SIRI. – Acho que foi o primeiro dicionário sociolingüístico do país, não conheço outro mais antigo. Acho que foi eu quem inventou essa história de dicionário (aloletário) regional.

3º A ESCRAVATURA EM CAMBORIÚ. –. Nenhuma cidade do país, tem a sua história demográfica escravagística mais bem documentada que a nossa ( Camboriú e Balneário)

4º DICIONÁRIO CATARINENSE. Um tratado de lingüística, dialetologia, falares e sub-falares de SC.; Fiz em parceria com a RBS e o DC. Possivelmente o mais vendido de santa Catarina. Só num final de semana foram quase 5 mil, no lançamento.

5º JANGA- O PIONEIRO DA FÉ. Biografia encomendada de João Boaventura Caetano – Janga – o Primeiro crente em BC.

6º PORANDUBA PAPA-SIRI – Folclore inédito das duas cidades.
7º SOLILÓQUIO – Memória de um papa-siri com sardade da bera da Praia. Um romance histórico, escrito em linguagem vulgar, memórias póstumas de Manoel Germano Corrêa, o primeiro pesacdor de BC.

8º - COLÓQUIO – Um romance em linguagem vulgar, sugerindo a convivência de uma família dos anos 50 da Praia de Camboriú

9ª PIRÃO COM MILONGAS – Livro é que nem filho, não se sabe qual o melhor, mas acho que esse é o que eu mais gosto. Antropologia social e cultural – do centro do litoral catarinense.

10º-LELA – PRAIANO HERÓI. Biografia encomendada do Lela, o maior contador de histórias que conheço.

11º - UMA TRAMA NO ALTO VALE. Biografia encomendada por Ivo Vanderlind.

12º O ESPATÁRIO – Biografia de Dom Paio Peres Corrêa, herói europeu da Idade Média. Nasceu em 1210 e morreu em 1270. Foi grão-mestre da maior ordem militar da Idade Média, a Ordem de Santiago da Espada, por isso se chama “O Espatário”. Foi ele quem expulsou os mouros do Algarve e Andaluzia, fundou inúmeras cidades cristãs, comandou a 7ª cruzada para resgatar o rei santo Luis IX. Destituiu o rei Sancho II, empossou seu irmão, fez casar reis e rainhas, matou muita gente, nunca perdeu uma guerra, sua naturalidade é disputada por duas cidades e seus restos mortais pelo dois países. Portugal de nascimento e a Espanha onde fez fama. Mesmo sendo português, foi nomeado pelo rei espanhol para representar a Espanha no conflito pela disputa de território entre os dois países. É considerado o homem mais poderoso do mundo, não sendo rei nem papa. Mesmo sendo um dos homens mais conhecidos da Europa, foi biografado por reis e até Luis de Camões, mas eu aqui nesse fim de mundo sou seu maior biógrafo. Consegui isso comprando a história de todas as cidades por onde ele passou. É tido como o 1º Corrêa e o mais famoso deles. Está na iminência de virar filme.

13 º - SÃO TOMÉ - Provas da passagem desse apóstolo de Cristo no continente americano.

14 º - OS ZELOTES – História desse povo religioso muito antes de Cristo. Teve seu auge na era Macabeus e seu trágico fim no governo do General Romano Tito.

Camboriú Virtual – Dentre os livros escritos pelo senhor, qual te chamou mais atenção? E por quê?

Isaque de Borba Corrêa - Diria que o “SÃO TOMÉ – A SAGA DO APÓSTOLO DE CRISTO NA AMÉRICA” uma pesquisa extraordinária que mais de 20 jesuítas contaram durante 100 anos, até que o Papa Urbano VIII proibiu de se falar nessa heresia no continente. Com medo de um processo no Tribunal do Santo Ofício, eles pararam de escrever sobra a passagem do Santo em terras americanas. Em virtude da proibição o mais fanático defensor dessa história o jesuíta Antônio Ruiz de Montoya, encerra sua pesquisa rogando a Deus que um dia alguém encontrasse os seus rascunhos e desse continuidade à sua história com mais fundamente. Mais de 400 anos depois, Deus ouviu o pedido do jesuíta e colocou em minhas mãos o seus rascunhos e eu fiz a continuidade da pesquisa, conforme o desejo daquele jesuíta tão abnegado. É a maior pesquisa já feita na América Latina, uma coisa muito maior que eu. Gastei tudo que tive, entrei em depressão, mas valeu a pena. Hoje o país inteiro está falando nisso, conjuntamente com o elemento principal dessa história que o Caminho do Peabiru, que já foi até tema de carnaval, filmes, documentários etc.

Camboriú Virtual – O senhor está escrevendo um novo livro? Conte-nos sobre este projeto.

Isaque de Borba Corrêa - Estou sempre escrevendo. Agora estou dissertando sobre os zelotes. Lembra que Jesus tinha um discípulo chamado “Simão – o zelote”? Pois é o Zelotismo era um facção da religião dos essênios. Eles começaram lá no princípio com Moisés. Era levitas encarregados de zelar pelo tabernáculo. Com o desenvolvimento e a modernidade eles evoluíram e criaram outras religiões. O auge do sofrimento deles foi durante o domínio selêucida, durante o governo de Antíoco - seleuco, na época dos irmãos Macabeus. Eles se extinguiram no governo de Tito quando houve a grande diáspora no ano 70. Logo em seguida a Igreja Católica os incorporou a todos; e, fariseus, saduceus, essênios, zelotes, sicários, nazirenos, viraram cristãos. Os escribas viram os bispos da Igreja Católica e ali foi o fim desse sofrido povo.

Camboriú Virtual – Como a população poderá ter acesso aos livros do escritor Isaque Borba?

Isaque de Borba Corrêa - Não poderá. Não tenho nenhum livro disponível. Todos foram esgotados por força da miséria. Sempre fiz pequenas tiragens. O único que disponho é sobre a escravatura, daí tem que ligar pra mim, no meu trabalho – GRÁFICA DIGITAL COPYARTE – Rua 300 nº 179 – 33631394 ou no meu imeio – isaqueborba@gmail.com

Camboriú Virtual – O senhor é membro da Academia Desterrense de Letras em Florianópolis e de Balneário Camboriú. Como está sendo esta experiência?

Isaque de Borba Corrêa - É talvez o fato mais positivo na carreira de um escritor. É o sonho de todo escritor fazer parte de alguma academia de letras, receber o titulo de imortal. O fato de eu me eleger em Florianópolis é ainda mais significativo, uma vez que lá as disputas são sempre muito acirradas, sempre tem mais candidatos que vagas e dificilmente se elege alguém do interior. O que me levou à eleição lá, foi o fato de meu excelente relacionamento com os demais escritores da capital e o respeito que eles têm pelo meu trabalho.

Camboriú Virtual – Em seus textos sobre a cultura papa-siri observamos uma forma divertida e única de abordar os fatos. Isso é uma marca pessoal do escritor Isaque Borba?

Isaque de Borba Corrêa - Sim, eu tenho por missão propagar a nossa língua, da mesma forma que os portugueses lutam para ter o idioma português em evidência no mundo. Isso é uma coisa muito valiosa. É só comparar com o inglês, quem não fala essa língua não tem o valor que tem quem a fala. Falar ou escrever nessa linguagem é sempre meio engraçado. Colocamos uma pitada de humor para que seja mais atraente, senão você não atrai as pessoas para essa leitura. Muitos pensam que escrever numa linguagem regional é escrever errado.

Camboriú Virtual – Deixe um recado para os leitores que acompanham os portais virtuais e o trabalho do escritor Isaque de Borba Corrêa.

Isaque de Borba Corrêa - Curtam a cultura da terra que vivam. Eu sempre adotei a cultura dos povos por onde vivi. Isso é uma demonstração de inteligência. Não se repudia a cultura onde se vive. Por isso convoco a todos para colaborar com a nossa cultura, estimular, promover. Precisamos de uma casa de cultura boa, um museu principalmente, pois isso no mínimo aumenta a permanência do turista e eleva a auto-estima do seu povo.

Fonte:
http://www.balneariovirtual.com.br/portal/diaadia_entrevista.php

Isaque de Borba Corrêa (Sinopses das principais obras, Documentários, Peças Teatrais)

São Tomé

A maior pesquisa já feita nas Américas: 20 jesuítas pesquisaram por exatamente 100 anos: de 1530 a 1630. Com tão pouca comunicação naqueles tempos, é incrível a coincidência dos seus relatos.

Quando os jesuítas iniciavam uma catequese, os índios já sabiam dogmas, doutrinas cristãs, bem como passagens bíblicas, inclusive canto. Perguntado como eles sabiam, eram unânimes em responder que fora um tal de Tomé quem os houvera ensinado. Diziam se tratar de um homem branco, de barba, que veio da banda do mar. Pregava um Deus invisível e fazia muito milagres.

Ele aportou em Santa Catarina onde existe o famoso caminho do Peabiru, única entrada para o interior da América. Esse Caminho mais tarde os jesuítas chamaram de Caminho Sagrado de São Tomé. Esteve até na América do Norte, Alvar Nunes Cabeza de Vaca foi confundido com ele por lá.
O jesuíta Antônio Ruiz de Montoya, fez boa parte do seu roteiro até a Venezuela e disse: “Eu não me abalaria a vir até essas lonjuras se não tivesse certeza que o Santo esteve aqui.”

O Espatário

Trata da incrível biografia de Dom Paio Peres Corrêa, 36º Grão-Mestre da Ordem de Santiago de Compostela. Abaixo de reis, ninguém fez o que ele fez na Europa. O medo que os reis tinham de arder no fogo do inferno, faziam prestar uma submissão muito forte à igreja. Porém a igreja estava sendo ameaçada pelos muçulmanos e as ordens militares é que davam proteção à igreja. Assim, papas e reis acabavam prestando muito respeito às ordens, que eram militares, porém religiosas . As ordens mantinham as duas forças mais poderosas do mundo cristão. Assim sendo, um grão-mestre poderia ter poderes e influências capaz de mudar a história.

Ele conjurou contra reis e rainhas, ajudou a depor reis, empossou outros, foi empossado por reis; desmanchou casamento entre reis, casou outros reis; pacificou reinos, destruiu outros tantos.

Como português, sua naturalidade é disputada por duas cidades, porém foi chefe da mais poderosa ordem castelhana e assim ele fez de tudo para manter a paz entre os dois reinos. Conheça a incrível estratégia que ele usou para apaziguar a briga entre Afonso III Portugal e Afonso X, que acabou fazendo nascer Dom Diniz.

Fez muitas coisas, até milagre. Já viu falar no milagre de Tentudia? Pois foi com ele. Ele foi o Gran-comander da reconquista cristã do Algarve e Andaluzia. Lutou em diversas cidades do Algarve, venceu todas as lutas. Voltou para a Espanha, lutou na Andaluzia, venceu todas as guerras tomou novos reinos para o rei de Castela. Morreu na Espanha, em Uclés ainda no reino de Leão e Castela em 1275. Seus restos mortais são disputados nos dois países.

Com a morte do Rei Luis IX (São Luís) a Europa pediu que ele fizesse a cruzada. O Papa pediu que ele encabeçasse essa cruzada. Ele assinou um documento que ia. Será que e foi? O maior paladino cristão não iria lutar pelo maior objetivo do cristianismo que era a Terra Santa?

Conheça os mistérios que envolveram sua história. Aprenda com bom humor como foi um dos períodos mais intensos da história da humanidade.

Dicionário catarinense

Um tratado de dialetologia, falares e sub-falares do Estado de Santa Catarina. Contém um campo lexical com quase 3 mil palavras.

Os Zelotes

Os zelotes eram pessoas consagradas a zelar o templo. Não confundir isso com quem era zeloso pela doutrina, pelas leis ou pelas coisas de Deus. O zelotismo é uma das instituições religiosas mais antigas do mundo que só não é suplantada pelo judaísmo. Os zelotes iniciaram seu ministério no levirato quando foi dividido o reino em tribos. Deut 25:5

Os levitas não tinham possessões geográficas. Eram consagrados a zelar o templo. Dali também nasceu outra corrente religiosa muito parecida que era o nazireado. Os nazireus eram consagrados à vida religiosa desde o ventre da mãe. Os mais antigos nomes nessa instituição registrado na Bíblia é provavelmente Sansão e Samuel. Outros exemplos mais próximos de nós foram João Batista e Tiago irmão do senhor. Jesus Cristo também era um nazireu.

Era nazireu pela sua religião e não pelo adjetivo pátrio. Muitos sustentam que a Igreja criou a cidade de Nazaré na Idade Média, alegando que ela não é citada em nenhum mapa antigo.

Isso para justificar que o termo nazireu ou nazareno, refere-se ao adjetivo pátrio de Jesus, escondendo com isso a sua religião. De fato a Bíblia só cita as religiões dos saduceus e fariseus, sequer fala dos essênios.

Se Jesus criticava ferrenhamente essas duas instituições e com extraordinária competência (Mt 23:23) era óbvio que ele pertencia a uma terceira corrente. Apóstolo Paulo por ser zeloso pelas leis, pelas doutrinas é comumentemente confundido como zelote. Atos 26:5

Ele era fariseu, inimigo número um dos essênios, que os criticavam abertamente. Paulo converteu-se à religião dos nazirenos. Atos 24:5

Zelotes, nazirenos e sicários, são ramificações dos essênios, religião de Jesus, a qual Paulo se converteu. Muitos dizem inclusive que Flávio Josefo também era zelote, por causa do episódio de Jotapata. Ele era fariseu, grão-sacrificador e odiava os essênios, chamando-os freqüentemente de demônios. O próprio Jesus foi tido como chefe dos demônios pelos fariseus. Mt 12:24

Muitos afirmam também que o zelotismo nasceu com a família Macabeus. Não nasceu ali como já vimos, mas foi ali o auge do sofrimento do povo judeu, administrado pela tirania da dinastia selêucida, em especial Antíoco Epifanes. Foi também nessa época onde mais aflorou a motivação zelótica.

O culto judaico, seus rituais, seu folclore, era o único elo de ligação desse povo durante os anos de cativeiro. O folclore é a identidade cultural de seu povo. Quem perde a sua identidade cultural se fragiliza, perde a auto-estima e se deixa dominar. Essa é a arma principal que o colonizador, dominador, usa para subjugar um povo.

Os zelotes e demais religiões judaicas sofreram o golpe final na data aproximada do ano 70, sob as ordens de Tito. A ênfase maior deste livro é o sofrimento desse povo, baseado no texto bíblico, apócrifos, historiadores cristãos do início da era cristã, Josefo e Eusébio.

Documentários

A lenda de Pay Tomé

Um documentário da Saga do Apóstolo no continente americano Direção de Lalo e Beto Bocchino - premiado no Festival Catarina - 2002

A Saga de Aleixo Garcia

Como ele alcançou o Império Inca 10 anos antes de Francisco Pizarro

Tralhas

Como o homem primitivo extraía os fios das folhas do ticum, gravatá e as cordas das cascas de Embaúva e Grandiúva e demais instrumentos para feitura de redes

Pirão com peixe

Mostra as dificuldades do pescador em fazer as diversos tipos de pesca, e a feitura da farinha, desde a plantação da mandioca.

Poranduba Papa-siri

Explorando o folclore do centro do litoral catarinense.

A Freguesia de Nossa Senhora do Bom Sucesso

Longa-metragem que conta a história da fundação da cidade de Camboriú

Santo Amaro & N. S. Do Bom Sucesso

(TCC - dirigido pelo aluno de jornalismo Júlio Cesar Garcia) Conta a história da religiosidade do povo da Barra do Rio Camboriú.

Solilóquio

Ficção onde o mais antigo pescador da Praia de Camboriú, Manoel Germano Corrêa, morto em 1968, conta a sua história e a história de Balneário Camboriú, quando ela tinha apenas 4 moradores. Baseado na entrevista que ele deu para o jornalista, imortal catarinense Silveira Júnior em 1952 e memórias do autor

A sinfonia dos cinzéis

Explora a difícil e árdua profissão na arte da cantaria – Extração do paralelepípedo

Memórias de um menino pobre

Biografia do Jornalista Silveira Júnior, baseado no seu livro autobiográfico Memórias de um menino pobre.

A pescaria da morte

Relata a tragédia de 21 de outubro de 1921, quando um tufão arrasou a comunidade de Nossa Senhora do Bom Sucesso de Camboriú, matando quase todos os pescadores, numa vila eminentemente formada por modestos pescadores artesanais. Baseada na reportagem de Hermínio Irineo Vieira – Jornal O intransigente - 1921

Fala catarina

Documentário que explora os mais diversos falares e sub-falares do Estado de Santa Catarina o mais multiétnico de todos os estados da federação.

Peças teatrais

Rodamuinho

1999 (adaptação dos textos dos livros História de Duas Cidades e Poranduba Papa-siri) em cartaz pelo Estado há cinco anos Autoria de Dianna Sitônio Direção de Ricardo Gamba

Colóquio

2000 - Baseado no Livro Colóquio. Modus vivendi de uma família tradicional dos anos 50 do século passado no centro do litoral catarinenses.



2004 - Baseado no texto bíblico, retrata o sofrimento do patriarca.

Jesus

2005 - Musical, baseados em músicas tradicionais que traçam toda a biografia do filho de Deus, desde o seu nascimento até a morte.

Fonte:
http://pt.wikipedia.org/wiki/

domingo, 2 de novembro de 2008

Guilem Rodrigues da Silva (Lançamento do Livro: Saudade e Uma Canção Desesperada)

Sobre o Brasil Minha Pequena
(para minha filha Zoyra-Lyra, nascida no exílio)

Sobre o Brasil quero contar-te minha pequena
A terra bem amada
Cheia de paz de sol e de beleza
Onde uma generosa natureza
Desenhou rios vales e montanhas

No Brasil minha pequena
São todos felizes
Ali há justiça trabalho pão e escolas
A miséria e o analfabetismo
Já não existem pertencem ao passado
Nenhum estudante desaparece nas cidades
Não há mais presos políticos e reina a liberdade
As companhias estrangeiras não são mais
Proprietárias
Dos nossos enormes recursos naturais
Já não há mais golpes de estado e nem torturas
E em suas casernas e quartéis os nossos generais
Esqueceram há muito os atos institucionais

Para ti minha filhinha que nasceste no exílio
E brincaste na neve longe de nossa pátria
Eu escrevo estes versos cheios de esperança

Oxalá quando as leis no entardecer dos meus anos
Não mais sejam quimeras nem vã utopia
Mas se eu te minto perdoa
Quero apenas que durmas
Embalada em meus sonhos

(escrito no duro ano do exílio de 1968)
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Com Desesperada Raiva

Mudas minhas mãos
Meus pés dormem inquietos
Gélido fogo sobe em minhas pernas
Consumindo meus joelhos
Procuro pensar nos pássaros
Acuso-os de terem deixado de cantar
É o fim de agosto
O verão na Suécia foi miserável
O fogo continua sua escalada
É como se eu afundasse
Num desses lagos gélidos da Lapônia
Recordo Verissimo
Gato preto em campo de neve
Meus joelhos não existem mais
Joelhos surdos insensíveis
Golpeio meus reflexos
A culpa é minha
Ninguém espera quinze anos
Seria impossível parar
Esse passar de carros sobre mim?
Carros de combate
Carros de passeio
Barcos de guerra
Barcos a vela
Uma vela se acende
Para quem?
Para mim?
Quem morre em Rio Grande?
Quem morre em Lund?
E esse maldito gelo que sobe
Eu subi por muitas escadas da vida
Senti muitas mortes
Chorei muitas prisões

Aqui estou malditos!
Pretendo esculturar em imperecível granito
Minha raiva meu grito
Para que todo aquele que passar por estas
Ruas do exílio possa ler o crime cometido
Em nossas almas
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Sobre o Autor,
nasceu na cidade de Rio Grande, Rio Grande do Sul, numa primavera do século passado. É oficial reformado no posto de comandante (capitão-de-corveta) da Marinha do Brasil. Perseguido, foi obrigado a fugir do país, refugiando-se no Uruguai até novembro de 1966, quando transferiu-se para a Suécia, aonde chegou como o primeiro refugiado político da América Latina na Escandinávia. Em 1969, depois de estudos pré-universitários, matriculou-se na Universidade de Lund, Suécia, onde estudou línguas neo-latinas, completando seus estudos na Universidade de Estocolmo.

Em 1976, publicou seu primeiro livro na Suécia, escrito em espanhol e traduzido para o sueco por renomados poetas tais como Lasse Söderberg e Peter Ortman e tradutores como Jens Nordenhök e Estrid Tenggren. Atualmente escreve diretamente em sueco, sendo autor de vários livros de poesia e redator de antologias de poetas suecos e latinoamericanos. Seus poemas foram publicados em 32 antologias internacionais, entre essas a “Antologia Internacional Roda Mundo” de 2005, do Editor Douglas Lara. Publicou também um livro de ensino da língua portuguesa para suecos: “Portugisiska för Nybörjare” adotado pelas escolas de línguas na Suécia. Em 2002, publicou seu primeiro livro no Brasil “Saudade e uma canção desesperada”, prefaciado pelo poeta Reynaldo Valinho Álvarez, do Rio de Janeiro. Por ocasião do lançamento do livro no Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro, foi agraciado com o título e o diploma de Membro de Honra do mesmo sindicato. Traduziu inúmeras peças de teatro, entre as quais a “Marquesa de Sade”, de autoria do famoso escritor japonês Yukio Mishima, para o Real Teatro Dramático de Estocolmo e vários filmes suecos para o Brasil e Portugal e filmes brasileiros para os cimemas suecos.
Seus poemas foram traduzidos para o islandês, dinamarquês, persa, espanhol, macedônio e inglês, tendo sido publicados no México, Cuba, Estados Unidos da América do Norte, Noruega, Dinamarca, e Islândia.

Guilem Rodrigues da Silva é presidente da Associacão de Escritores do Sul da Suécia (Escânia), membro do Sindicato dos Escritores da Suécia, da Associacão sueco-dinamarquesa de escritores, da Société Européenne de Culture em Veneza. É professor de línguas e ocupa o cargo de juiz eleito do Tribunal de Segunda Instância no Hovrätten över Skåne och Blekinge, Suécia.
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Fontes:
- SILVA, Guilem Rodrigues, Saudade e uma canção desesperada. Salvador: CABINCLA – Casa Baiana Para Integração Cultural Latino Americana.
- Douglas Lara. http://www.sorocaba.com.br/acontece
- http://guilem.blogspot.com/2007_02_01_archive.html
- http://poetasdobrasil.blogspot.com/2007/06/guilem-rodrigues-da-silva-nasceu-na.html

Andrey do Amaral (Como enlouquecer sua sogra)


Desde os mais remotos tempos da história, a sogra é esse elemento que pode despertar amor e ódio (às vezes só amor, às vezes só ódio!). Para apimentar a relação em família, Andrey do Amaral traça o roteiro, com inúmeras dicas para enlouquecer as sogras e afastá-las do território do sagrado lar. Mas será que elas são imunes a essa saraivada de críticas?

O autor promete que esse manual de sobrevivência é um poderoso antídoto.
Entretanto, a artilharia de Andrey, antes de ser uma campanha contra as sogras, é uma homenagem carinhosa.

Com uma abordagem descontraída, tudo se resume no grande folclore a partir de uma rivalidade que habita o imaginário popular. O objetivo do livro é provocar risos.

Disponível em bancas de jornal e nas melhores livrarias (e nas piores também).

Sobre o livro:
Como enlouquecer sua sogra
Autor: Andrey do Amaral
Editora Autodidata (61) 3201-4760
editora@autodidata.com.br
16ª edição
102 pág.
14 X 21 cm
ISBN: 978-85-61922-00-9
Ilustrações: Alex Falcão
Capa: em anexo
Outras informações: diretamente com a editora

Sobre o autor:
Andrey do Amaral (1976) é escritor e professor de literatura. Atualmente, presta consultoria para autores como agente literário. É autor dos sucessos Cuidado eu te amo (Ao Livro Técnico/RJ), O máximo e as máximas de Machado de Assis (Ciência Moderna/RJ) e Mercado Editorial – guia para autores (Ciência Moderna/RJ). Maiores informações: www.andreydoamaral.com

Fonte:
E-mial enviado pelo autor

Lançamento do Livro "O LobVampiro"

O sorocabano José Estevão Pinto de Oliveira tem 13 anos e aos 11 escreveu o livro O LobVampiro. O livro conta a história dos amigos Kauê e Marcos que começam a investigar o mistério de uma casa assombrada no bairro onde moram. Segundo a lenda, na casa assombrada mora o Lobvampiro, um azarado, que além de ser mordido por um morcego-vampiro também foi mordido por um lobo. Em noites de lua cheia, o temível morador transforma-se em lobisomem e no terceiro dia, um vampiro.

A história ainda tem a lenda de que o avô de Kauê também tenha sido mordido por um monstro, um caçador de mitos com nome esquisito e outras coisas mais.

José Estevão, que participou da Coletânea Rodamundinho 2008, juntamente com outras 24 crianças e adolescentes, lança O LobVampiro no próximo dia 7 de novembro na Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba (Fundec). Ele contou que a as ilustrações foram todas feitas no computador e a inspiração para começar a escrever começou muito antes. Veio da leitura de muito livros, e o menino confessa que é fã de Marcos Rey, falecido em 1999, ator de consagrados livros infanto-juvenis como O rapto do garoto de ouro, Na rota do perigo, Enigma na televisão, Um cadáver ouve rádio, entre muitas outras obras.

As ilustrações e a capa do livro também foram feitas por ele para a Ottoni Editora.

Sonhos da Imaginação (José Estevão P. de Oliveira)

Não seria ótimo ter imaginação infinita?
Criatividade para todo lado
Isto que iria ser uma cidade bonita.

É ótimo ter sempre opção
É ótimo ter o que escolher:
Uma maneira de sair do chão
E os frutos da imaginação colher

No Outono caem as folhas da imaginação
Mas tenha sempre esperança
Na primavera haverá flores de montão
O que encanta a criança.

Para mim, tudo isto que eu falei é verdade, e não sonho.

Fontes:
- Douglas Lara.
http://www.sorocaba.com.br/acontece
- MORAES, Cintian; LARA, Douglas (orgs.). Rodamundinho 2008. Itu,SP: Ottoni Editora, 2008. p.52.
- Jornal Cruzeiro do Sul. Caderno Cruzeirinho. 02 nov 2008, p.4.

sábado, 1 de novembro de 2008

Lançamento do Livro Poesia do Brasil - vol.7 (em Curitiba)


Tarde de Música e Poesia da Academia Paranaense de Poesia
18 de Novembro de 2008
17hs
Centro de Letras do Paraná
Rua Fernando Moreira, 370
Curitiba - Paraná

Ana Paula Tavares (1952)



Ana Paula Ribeiro Tavares nasceu no Lubango, província da Huíla, a 30 de Outubro de 1952. Passou parte da sua infância naquela província, onde fez os seus estudos primários e secundários. Iniciou o seu curso de História da Faculdade de Letras do Lubango (hoje ISCED-Lubango), terminando-o em Lisboa. Em 1996 concluiu o Mestrado em Literaturas Africanas. Actualmente vive em Lisboa, onde lecciona na Universidade Católica de Lisboa, encontrando-se a fazer o seu doutoramento.

Sempre trabalhou ligada à área cultural, tendo actuado como profissional em diferentes áreas da cultura como a Museologia, Arqueologia e Etnologia, Património, Animação Cultural e Ensino. Participou em simpósios, congressos, comissões de estudo e elaboração de inúmeros projectos da área cultural. Foi Delegada da Cultura no Kwanza Norte, técnica do Centro Nacional de Documentação e Investigação Histórica (hoje Arquivo Histórico Nacional), do Instituto do Património Cultural.

«Huíla desempenhou um papel particular em «termos» de cheiros, sons, cores, canções que me marcaram muito do ponto de vista estético. Essa era procura. Por outro lado, eu vivi esse tempo no limite entre duas sociedades completamente distintas - e talvez não tenha conseguido compreender nenhuma das duas. Por isso tentei reflectir e escrever sobre partes de uma e partes de outra que me marcaram fundamentalmente. A Huíla, tal qual era na minha juventude, era o limite entre duas sociedades bem distintas: a sociedade europeia - é uma cidade com muitas características europeias: uma cidade de planalto, onde faz frio, e verde... E, por outro lado, uma sociedade africana que era ignorada pela cidade europeia.» In: Michel Laban. Angola. Encontro com Escritores. Porto, Fundação Eng. António de Almeida, 1991, II vol. p. 849.

É membro de diversas organizações culturais como o Comité Angolano do Conselho Internacional de Museus (ICOM), Comité Angolano do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS), da Comissão Angolana para a UNESCO. É também membro da UEA.

Tem poemas escritos em diversos jornais e revistas angolanos e internacionais como em Portugal, Brasil, Cabo Verde. As suas obras publicadas são: Ritos de Passagem (1985), O Sangue da Buganvília (1998), O Lago da Lua (1999).

Ao falar sobre a «Literatura angolana no feminino», Inocência Mata refere-se à «maturidade que a escrita etnograficamente ritualística de Paula Tavares expressa... desde o título, passando pela significação do texto pictórico da capa o macro-poema de cada obra anuncia um intenso lirismos - poesia lírica no sentido de conter uma experiência individual e uma subjectiva postura mental perante a realidade do mundo.» Mais adiante a crítica literária diz: «há um apelo à imaginação, pelo recurso a imagens sinestéticas (Mistura de imagens sensoriais, como na poesia de Paula Tavares, principalmente na citação de frutos para simbolizar as características femininas)...» In: Inocência Mata. Literatura Angolana: Silêncios a Falas de Uma Voz Inquieta. Lisboa, Mar Além, 2001, p. 113, 116.

Fontes:
http://www.uea-angola.org/bioquem.cfm?ID=116
http://pt.wikipedia.org

Ana Paula Tavares (Poesias Avulsas)

Mukai*

1

Corpo já lavrado
eqüidistante da semente
é trigo
é joio
milho híbrido
massambala

resiste ao tempo
dobrado
exausto
sob o sol
que lhe espiga
a cabeleira.

2

O ventre semeado
deságua cada ano
os frutos tenros
das mãos
(é feitiço)
nasce
a manteiga
a casa
o penteado
o gesto
acorda a alma
a voz
olha p'ra dentro do silêncio milenar.

3

(Mulher à noite)

Um soluço quieto
desce
a lentíssima garganta
(rói-lhe as entranhas
um novo pedaço de vida)
os cordões do tempo
atravessam-lhe as pernas
e fazem a ligação terra.

Estranha árvore de filhos
uns mortos e tantos por morrer
que de corpo ao alto
navega de tristeza
as horas.

4

O risco na pele
acende a noite
enquanto a lua
(por ironia)
ilumina o esgoto
anuncia o canto dos gatos
De quantos partos se vive
para quantos partos se morre.

Um grito espeta-se faca
na garganta da noite

recortada sobre o tempo
pintada de cicatrizes
olhos secos de lágrimas
Dominga, organiza a cerveja
de sobreviver os dias.
.
* Mukai: - mulher

(O lago da lua)

Canto de nascimento

Aceso está o fogo
prontas as mãos

o dia parou a sua lenta marcha
de mergulhar na noite.

As mãos criam na água
uma pele nova

panos brancos
uma panela a ferver
mais a faca de cortar

Uma dor fina
a marcar os intervalos de tempo
vinte cabaças deleite
que o vento trabalha manteiga

a lua pousada na pedra de afiar

Uma mulher oferece à noite
o silêncio aberto
de um grito
sem som nem gesto
apenas o silêncio aberto assim ao grito
solto ao intervalo das lágrimas

As velhas desfiam uma lenta memória
que acende a noite de palavras
depois aquecem as mãos de semear fogueiras

Uma mulher arde
no fogo de uma dor fria
igual a todas as dores
maior que todas as dores.
Esta mulher arde
no meio da noite perdida
colhendo o rio

enquanto as crianças dormem
seus pequenos sonhos de leite.

(O lago da lua)

"Não conheço nada do país do meu amado"

Não conheço nada do país do meu amado
Não sei se chove, nem sinto o cheiro das
laranjas.

Abri-lhe as portas do meu país sem perguntar nada
Não sei que tempo era
O meu coração é grande e tinha pressa
Não lhe falei do país, das colheitas, nem da seca
Deixei que ele bebesse do meu país o vinho o mel a carícia
Povoei-lhe os sonhos de asas, plantas e desejo
O meu amado não me disse nada do seu país

Deve ser um estranho país
o país do meu amado
pois não conheço ninguém que não saiba
a hora da colheita
o canto dos pássaros
o sabor da sua terra de manhã cedo

Nada me disse o meu amado
Chegou
Mora no meu país não sei por quanto tempo
É estranho que se sinta bem
e parta.
Volta com um cheiro de país diferente
Volta com os passos de quem não conhece a pressa.

(O lago da lua)

"Vieram muitos..."

"A massambala cresce a olhos nus"

Vieram muitos
à procura de pasto
traziam olhos rasos da poeira e da sede
e o gado perdido.

Vieram muitos
à promessa de pasto
de capim gordo
das tranqüilas águas do lago.
Vieram de mãos vazias
mas olhos de sede
e sandálias gastas
da procura de pasto.

Ficaram pouco tempo
mas todo o pasto se gastou na sede
enquanto a massambala crescia
a olhos nus.

Partiram com olhos rasos de pasto
limpos de poeira
levaram o gado gordo e as raparigas.

(O lago da lua)

"Tratem-me com a massa"

"Amparai-me com perfumes, confortai-me com maçãs
que estou ferida de amor..."

Cântico dos Cânticos

Tratem-me com a massa
de que são feitos os óleos
p'ra que descanse, oh mães

Tragam as vossas mãos, oh mães,
untadas de esquecimento

E deixem que elas deslizem
pelo corpo, devagar

Dói muito, oh mães

É de mim que vem o grito.

Aspirei o cheiro da canela
e não morri, oh mães.

Escorreu-me pelos lábios o sangue do mirangolo
e não morri, oh mães.
De lábios gretados não morri

Encostei à casca rugosa do baobabe
a fina pele do meu peito
dessas feridas fundas não morri, oh mães.

Venham, oh mães, amparar-me nesta hora
Morro porque estou ferida de amor.

(O lago da lua)

November without water

Olha-me p'ra estas crianças de vidro
cheias de água até às lágrimas
enchendo a cidade de estilhaços
procurando a vida
nos caixotes do lixo.

Olha-me estas crianças
transporte
animais de carga sobre os dias
percorrendo a cidade até aos bordos
carregam a morte sobre os ombros
despejam-se sobre o espaço
enchendo a cidade de estilhaços.

(O lago da lua)

Abóbora menina

Tão gentil de distante, tão macia aos olhos
vacuda, gordinha,
de segredos bem escondidos
estende-se à distância
procurando ser terra
quem sabe possa
acontecer o milagre:
folhinhas verdes
flor amarela
ventre redondo
depois é só esperar
nela deságuam todos os rapazes.

(Antologia da poesia feminina dos PALOP)

Rapariga

Cresce comigo o boi com que me vão trocar
Amarraram-me já às costas, a tábua Eylekessa

Filha de Tembo
organizo o milho

Trago nas pernas as pulseiras pesadas
Dos dias que passaram...

Sou do clã do boi -
Dos meus ancestrais ficou-me a paciência
O sono profundo de deserto.
A falta de limite...
Da mistura do boi e da árvore
a efervescência
o desejo
a intranqüilidade
a proximidade
do mar
Filha de Huco
Com a sua primeira esposa
Uma vaca sagrada,
concedeu-me
o favor das suas tetas úberes.

(Página na Internet)

Amargos como os frutos

"Dizes-me coisas tão amargas como os frutos..."
Kwanyama

Amado, porque voltas
com a morte nos olhos
e sem sandálias
como se um outro te habitasse
num tempo
para além
do tempo todo

Amado, onde perdeste tua língua de metal
a dos sinais e do provérbio
com o meu nome inscrito

onde deixaste a tua voz
macia de capim e veludo
semeada de estrelas

Amado, meu amado
o que regressou de ti
é tua sombra
dividida ao meio
é um antes de ti
as falas amargas
como os frutos

(Dizes-me coisas amargas como os frutos)

Entre os lagos

Esperei-te do nascer ao pôr do sol
e não vinhas, amado.
Mudaram de cor as tranças do meu cabelo
e não vinhas, amado.
limpei a casa, o cercado
fui enchendo de milho o silo maior do terreiro
balancei ao vento a cabaça da manteiga
e não vinhas, amado.
Chamei os bois pelo nome
todos me responderam, amado.
Só tua voz se perdeu, amado,
para lá da curva do rio
depois da montanha sagrada
entre os lagos.

(Dizes-me coisas amargas como os frutos)

História de amor da princesa Ozoro e do húngaro Ladislau Magyar

Primeiro momento

Meu pai chamou e disse:
mulher, chegou a hora, eis o senhor da tua vida
aquele que te fará árvore

Apressa-te Ozoro,
parte as pulseiras e acende o fogo.
Acende o fogo principal, o fogo do fogo, aquele que arde
noite e sal.
Prepara as panelas e a esteira
e o frasco dos perfumes mais secretos
Este homem pagou mais bois, tecidos e enxadas do que
aqueles que eu pedi
este homem atravessou o mar
não ouvi falar do clã a que pertence
o homem atravessou o mar e é da cor do espírito

Nossa vida é a chama do lugar
Que se consome enquanto ilumina a noite

Voz de Ozoro:

Tate tate
meus todos parentes de sangue
os do lado do arco
os do lado do cesto
tate tate
porque me acordas para um homem para a vida
se ainda estou possessa de um espírito único
aquele que não se deu a conhecer
meu bracelete entrançado
não se quebrou e é feito das fibras da minha própria essência
cordão umbilical
a parte da mãe
meu bracelete entrançado ainda não se quebrou
Tate tate
ouve a voz de meu pequeno arco esticado
as canções de rapariga
minha dança que curva a noite
ainda não chegou meu tempo de mulher
o tempo que chegou
é lento como um sangue
que regula agora as luas
para mim
de vinte oito em vinte e oito dias

Segundo momento

Voz de Magyar:

Senhor:
Atravessei o mar de dentro e numa pequena barcaça
desci de Vardar para Salônica, durante a batalha das
sombras. De todas as montanhas, a que conheço expõe um
ventre de neve permanente e uma pele gretada pelo frio.
Nasci perto do Tisza Negro, junto à nascente.
Naveguei um oceano inteiro no interior de um navio
habitado de fantasmas e outros seres de todas as cores com
as mesmas grilhetas. Como eles mastiguei devagarinho a
condição humana e provei o sangue o suor e as lágrimas do
desespero. São amargos, senhor, são amargos e nem sempre
servem a condição maior da nossa sede. Vivi durante
muitos meses o sono gelado da solidão.
Senhor
Eu trago um pouco de vinho sonolento do interior da
terra e a estratégia de uma partida húngara, levo o bispo por
um caminho direto até à casa do rei, senhor. Por isso aqui
estou e me apresento, meu nome igual ao nome de meu
povo, Magyar, os das viagens, Magyar, o dos ciganos.
Senhor
Eu trouxe meus cavalos e vos ofereço minha ciência de
trigo, em troca peço guias dos caminhos novos, alimento
para as caravanas, licença para o Ochilombo e a mão de
Ozoro a mais-que-perfeita.
Senhor, deixai que ela me cure da febre e da dor que trago
da montanha para lá dos Cárpatos.
Senhor, deixai que ela me ensine a ser da terra.

Terceiro momento

Coro das mais velhas:

Fomos nós que preparamos Ozoro, na casa redonda
muitos dias, muitas noites na casa redonda
Fomos nós que lhe untamos, de mel, os seios
na casa redonda
Com perfumes, tacula e fumo velho esculpimos um corpo
na casa redonda
Nosso foi o primeiro grito perante tanta beleza:
Oh, rapariga na palhoça, sentada, ergue-te para que
possamos contemplar-te!

Quarto momento

Vozes das meninas:

Meu nome é terra e por isso me movo lentamente meia
volta, uma volta, volta e meia, para que o tempo me
encontre e se componha.
Sou a companheira favorita de Ozoro do tempo da casa
redonda.

Meu nome é pássaro, como o nome do clã a que
pertenço. Com Ozoro descobri o lago e as quatro faces da
lua, e vi primeiro que todos a cintura de salalé que se
contrai à volta das nossas terras.

Meu nome é flor e sou especialmente preparada para
cuidar do lugar onde a alma repousa. Com Ozoro eu tenho
o cheiro, guardado no frasco de perfumes mais pequeno - o
do mistério.

Meu nome é princípio e eu tenho as mãos do lugar e a
ciência dos tecidos como as mais velhas. Para Ozoro, a princesa,
eu já teci o cinto de pedras apertadas, o mais belo cinto,
de contas vindas do outro lado do tempo da própria casa de
Suku. Para o tecer preparei todos os dias as mãos com preciosos
cremes da montanha. Apertei cada conta no nó fechado
igual ao que fecha a vida em cada recém-nascido. Para Ozoro
eu teci o cinto mais apertado das terras altas.

Meu nome é memória e com as velhas treinei cada fala
- a do caçador nas suas caçadas
- a dos homens no seu trabalho
- o canto das mulheres nas suas lavras
- a das raparigas no seu andar
- o canto da rainha na sua realeza
- o som das nuvens na sua chuva
Na lavra da fala faço meu trabalho, como a casa sem
porta e sem mobília, não tão perfeita como a casa onde o
rei medita, tão redonda como a casa onde Ozoro e as
meninas aprenderam a condição de mulheres.

Coro das meninas:

A casa das mulheres
A casa da meditação
A casa da chuva
A casa das colheitas
A casa das meninas: Terra, Flor, Pássaro, Princípio, Memória

Fala do fazedor de chuva:

Eu que amarrei as nuvens, deixei chover dentro de mim.
Deixei uma nuvem solta, grande e
gorda de chuva rebentar dentro de mim.
Sangro em utima meu pranto de nuvens, choro em
Osande a princesa perfeita, a minha favorita.

Coro dos rapazes:

Desde ontem ouvimos o rugir do leão atrás da paliçada
E as palavras mansas do velho sábio dentro da paliçada
Desde ontem que o leão não se afasta detrás da paliçada
E se ouve o velho que fala com o leão atrás da paliçada
Desde ontem o feiticeiro acende o fogo novo dentro da
paliçada
E se espalham as cinzas do fogo antigo atrás da paliçada
Diante de ti, Ozoro, depositamos a cesta dos frutos e
a nossa esperança

Fala da mãe de Ozoro:

Fui a favorita, antes do tempo me ter comido por
dentro. Semeei de filhos este chão do Bié.
Para ti, Ozoro, encomendei os panos e fiz, eu mesma,
os cestos, as esteiras. Percorri os caminhos da missão.
Encontrei as palavras para perceber a tua nova língua e os
costumes. Com as caravanas aprendi os segredos do mar e
as histórias. Deixo-te a mais antiga
História do pássaro Epanda e do ganso Ondjava

Há muito muito tempo estas duas aves decidiram juntar forças e fazer
o ninho em conjunto. Ondjava era um animal muito limpo e lavava e cuidava
dos seus ovos e da sua parte do ninho. Quando nasceram os filhos,
os pequenos de Epanda estavam sempre muito sujos e feios, enquanto
os de Ondjava deixavam que o sol multiplicasse de brilho as suas penas.
Um dia, Epanda raptou e escondeu os filhos de Ondjava quando esta
se afastara em busca de comida. Ondjava chorou muito e, enquanto recorria
ao juiz para resolver o caso, cuidou dos outros filhos, lavou o ninho todo
e armazenou comida para o cacimbo. Um dia os filhos limpos de Ondjava
voltaram e o juiz determinou pertencerem a esta ave, ninho, filhos e ovos,
porque só merece o lugar quem dele cuida, quem o sabe trabalhar.

Coro:

Só merece o lugar que o sabe trabalhar
Só é dono do lugar aquele que o pode limpar

Fala de Ladislau Magyar, o estrangeiro:

Amada, deixa que prepare o melhor vinho e os
tecidos
e que, por casamento, me inicie
nas falas de uma terra que não conheço
no gosto de um corpo
que principio
Amada, há em mim um fogo limpo
para ofertar
e o que espero é a partilha
para podermos limpar os dois o ninho
para podermos criar os dois o ninho.

Fala dos feiticeiros:

Podemos ver daqui a lua
e dentro da lua a tua sorte, Ozoro
aprenderás a caminhar de novo com as caravanas
e estás condenada às viagens, Ozoro
teus filhos nascerão nos caminhos
serão eles próprios caminhos
da Lunda
do Rio Grande
se o cágado não sobe às árvores, Ozoro
alguém o faz subir!

Última fala de Ozoro antes da viagem:

Amar é como a vida
Amar é como a chama do lugar

que se consome enquanto se ilumina
por dentro da noite.

(O lago da lua)

A manga

Fruta do paraíso
companheira dos deuses
as mãos
tiram-lhe a pele
dúctil
como, se de mantos
se tratasse
surge a carne chegadinha
fio a fio
ao coração
leve
morno
mastigável
o cheiro permanece
para que a encontrem
os meninos
pelo faro

(Raízes do porvir, de Domingos Florentino)

A mãe e a irmã

A mãe não trouxe a irmã pela mão
viajou toda a noite sobre os seus próprios passos
toda a noite, esta noite, muitas noites
A mãe vinha sozinha sem o cesto e o peixe fumado
a garrafa de óleo de palma e o vinho fresco das espigas
[vermelhas
A mãe viajou toda a noite esta noite muitas noites
[todas as noites
com os seus pés nus subiu a montanha pelo leste
e só trazia a lua em fase pequena por companhia
e as vozes altas dos mabecos.
A mãe viajou sem as pulseiras e os óleos de proteção
no pano mal amarrado
nas mãos abertas de dor
estava escrito:
meu filho, meu filho único
não toma banho no rio
meu filho único foi sem bois
para as pastagens do céu
que são vastas
mas onde não cresce o capim.
A mãe sentou-se
fez um fogo novo com os paus antigos
preparou uma nova boneca de casamento.
Nem era trabalho dela
mas a mãe não descurou o fogo
enrolou também um fumo comprido para o cachimbo.
As tias do lado do leão choraram duas vezes
e os homens do lado do boi
afiaram as lanças.
A mãe preparou as palavras devagarinho
mas o que saiu da sua boca
não tinha sentido.
A mãe olhou as entranhas com tristeza
espremeu os seios murchos
ficou calada
no meio do dia.

(Dizes-me coisas amargas como os frutos)

O cercado

De que cor era o meu cinto de missangas, mãe
feito pelas tuas mãos
e fios do teu cabelo
cortado na lua cheia
guardado do cacimbo
no cesto trançado das coisas da avó

Onde está a panela do provérbio, mãe
a das três pernas
e asa partida
que me deste antes das chuvas grandes
no dia do noivado

De que cor era a minha voz, mãe
quando anunciava a manhã junto à cascata
e descia devagarinho pelos dias

Onde está o tempo prometido p'ra viver, mãe
se tudo se guarda e recolhe no tempo da espera
p'ra lá do cercado

(Dizes-me coisas amargas como os frutos)

Fonte:
http://betogomes.sites.uol.com.br/AnaPaulaRibeiroTavares.htm

Caldeirão Literário do Pará (Antonio Juraci Siqueira)

Arte Poética

Hoje,
amanheci meio peixe,
meio pássaro.

Estou aprendendo a nadar,
tomando aulas de vôo
e aprimorando o canto.

Amanhã,
pássaro pleno,
insofismável peixe,
debulharei meu canto sobre a terra
em nados abissais

e vôos rasantes.
==================
Verde Canto

Verde é o meu canto

vivo muiraquitã de amor talhado
na pedra da existência e pendurado
no invisível pescoço do amanhã.

Verde é o meu pranto

musgo a crescer nas fendas seculares
abertas pelas mãos da malquerença
na história carcomida deste chão.

Verde é o veneno

que escondo na palavra – jararaca
furtivamente oculta entre a folhagem
no emaranhado chavascal de mim.
==============
Vôo Noturno

Na fogueira da aurora eu me consumo
e ressuscito entre os lençóis da noite
para tecer meu ninho de discórdias
no frágil ramo do teu coração.

A minha pena – faca de dois gumes –
ao mesmo tempo fere e acaricia;
as minhas asas - guarda-sóis se abertas,
quando fechadas, grades de prisão.

Trago nas veias sangue canibal:
bebo esperanças, mastigo ilusões
e, às vezes, sorvo sonhos matinais.

Portanto não se engane: sou poeta
em cujo peito dorme um troglodita
que traz no coração pluma e punhal.
===================
Hai-Cai

a borboleta
põe dobradiças de sonho
sobre o jasmim.
====================
O Verbo e o Tempo

O verbo é grão
que germinará
na seara do tempo

O tempo é mó
que em pó tornará
os grãos estéreis
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TROVAS

Lírica:

Sempre que na noite calma
ouvires passos na rua,
não tenhas medo, é minha alma
andando em busca da tua!

Filosófica:

Não deixa que as desventuras
sepultem teus ideais;
vê que nas noites escuras
as estrelas brilham mais!

Religiosa:

Prudente quem não descarta
apoio a crentes e ateus
pois o amanhã é uma carta
lacrada nas mãos de Deus.

Humorística:

Deus fez o mundo certinho
porém, por divina troça,
fez a mulher do vizinho
bem mais bonita que a nossa!

Poeminha Gelado

Quero só ver-te
lambuzada de sorvete
para sorver-te toda
da cabeça aos pés.

Amor de Rosa

Se as flores fazem amor
a minha amada
é uma rosa que em meus braços desabrocha
entre beijos e ais.
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Sobre o Autor
Antonio Juraci Siqueira nasceu em 28 de Outubro de 1948 em Cajary, município de Afuá no Pará, onde, ainda menino, descobriu a literatura através dos folhetos de cordel. Aos 16 anos mudou-se para Macapá (AP) onde casou-se, prestou serviço militar e concluiu os estudos de segundo grau. Em 1976 mudou-se para Belém graduando-se em Filosofia em 1983 pela UFPa. Pertence a várias entidades lítero-culturais, entre estas a União Brasileira de Trovadores, a Malta de Poetas Folhas & Ervas, a Academia Brasileira de Trova e o Centro Paraense de Estudos do Folclore. Atua como oficineiro, performista, contador de histórias e publicou mais de 60 títulos individuais entre folhetos de cordel, livros de poesias, contos, crônicas, histórias humorísticas e versos picantes. Colabora com jornais, revistas e boletins culturais de Belém e de outras localidades e conta com mais de 200 premiações em concursos literários em vários gêneros, em âmbito nacional e local.
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Fonte:
http://www.culturapara.art.br/

Alter Breitenbach (Duas Maneiras de Ver os Contos)



O conto é o gênero narrativo que tem sofrido ao longo do tempo inúmeras mudanças em sua estrutura e forma , em conseqüência o modo de pensar o conto também modifica-se. O que pretendo neste trabalho é apresentar um contraste entre o conto de Poe e Tchekov, relacionando-os com as com as teorias que buscam explicar o seu funcionamento como narrativas curtas.

O trabalho teórico sobre o conto inicia-se com Edgar Allan Poe quando expõe, no prefácio à reedição da obra de Howtorne, seu princípio de como o autor deve construir a narrativa curta. Sua teoria é complementada com o ensaio A filosofia da Composição, onde apresenta detalhadamente o processo de construção do poema The Raven, mas fazendo referências a questões ligadas ao conto.

O princípio do autor recai sobre o efeito que o conto deve causar no leitor. Inicialmente sugere a leitura única, isto é, realizada de uma única vez, já que, segundo ele, a atenção do leitor estaria voltada exclusivamente para a obra, provocando a exaltação da alma, o que produz e mantém a unidade de efeito. Considerando este aspecto se faz necessário observar a extensão do conto. Ora se o efeito é causado durante a hora de leitura, nada mais óbvio que a narrativa manter a atenção do leitor entre "meia a uma ou duas horas", conforme nos diz o próprio Poe.

Igualmente estabelece que a gênese do bom conto deve partir de um efeito único a ser atingido e assim ir acomodando os acontecimentos de forma a satisfazê-lo. Assim a regularidade e eficiência estão na manutenção da atenção do leitor e de um único eixo dramático, não permitindo intervenções, comentários e descrições quando desnecessários.

Tomando como exemplo o conto O Barril de Amontillado, percebemos como o autor segue seu modelo teórico. Nas primeiras linhas já nos dá a clara sensação do efeito a ser causado no leitor, cito: "Suportara eu, enquanto possível, as mil ofensas de Fortunato. (...) Afinal deveria vingar-me. Isto era ponto definitivamente assentado, mas essa resolução definitivamente excluía a idéia de risco. Eu devia não só punir, mas punir com impunidade."

A leitura atenta indica a clara intenção do narrador em se vingar. E é deste desejo de vingança que o autor parte para a criação dos incidentes, de modo a corroborar o que preestabeleceu. Com um pretexto convincente para a prática do crime, Montresor conduz Fortunato à adega de seu castelo, apresentando, durante a trajetória, indícios claros de suas intenções até o momento em que pratica o ato final contra Fortunato, o acorrentando e emparedando.

O que Poe efetivamente faz, é estabelecer uma situação inicial e a partir dela trabalhar de forma concentrada situações capazes de criar o suspense no leitor conduzindo-o até o clímax, conseguindo isto, o contista, segundo Poe, atinge seus objetivos.

Contrariando o modelo de Poe, surgem as narrativas de Tchekov, escritor russo que dá nova forma ao conto. Suas histórias motivadas por um cotidiano simples e banal não criam a mesma tensão que os contos de Poe, mas da mesma forma causa efeito.

No ensaio Alguns aspectos do conto, o escritor argentino Julio Cortázar nos diz que os contos de Tchekov visam apresentar algo que está além do conto em si, tanto antes como depois.

Pensemos por um momento no conto O bilhete de loteria, onde a tensão está concentrada em Ivan Dmitritchi e sua esposa que imaginam terem ganho o prêmio da loteria. Durante o conto a ação é praticamente nula, apenas com os dois se observando e imaginando o que fazer com o dinheiro, porém quando certificam-se de que não ganharam nada, voltam-se para a realidade. Não há nada além disso se pensarmos de acordo com a teoria de Poe, mas de acordo com o pensamento de Tchekov as coisas se passariam de modo diferente.

Observando um caderno de Tchekov, outro escritor argentino, Ricardo Piglia, desenvolve uma nova teoria do conto.

Para Piglia, o modelo de conto adotado por Tchekov implica a existência de duas histórias ocorrendo paralelamente, sendo uma apresentada explicitamente e outra implícita e fragmentariamente. Retomando O bilhete de loteria, temos no primeiro plano a expectativa quanto a ganhar o prêmio e implicitamente a idealização da vida, o direito de sonhar.

De modo geral, tanto para Poe como para Piglia, os contos mantém as unidades fundamentais para sua realização, diferenciando-se apenas na forma de narrar a história implícita, para Poe ela é o mistério, para Piglia a chave. De qualquer forma ambos atingem seus objetivos, ao causar um determinado efeito no leitor.

Estes modos diferentes de conceber o conto, fazem com seja um gênero sempre efervescente em busca de novas formas, pois haverá tantas formas quantos forem as escolhas por modos de contar por partes dos autores, remetendo com isso a conhecida concepção de Mario de Andrade de que será conto tudo aquilo que o seu autor chamar de conto. Será sempre, independente da forma, um gênero capaz de criar múltiplas interpretações no leitor, incentivando a sua imaginação e estimulando o seu prazer pela leitura.

Fonte:
Artigo publicado em 24/06/2003
http://www.speculum.art.br/module.php?a_id=517

Luis Fernando Verissimo (A aliança)



Esta é uma história exemplar, só não está muito claro qual é o exemplo. De qualquer jeito, mantenha-a longe das crianças. Também não tem nada a ver com a crise brasileira, o apartheid, a situação na América Central ou no Oriente Médio ou a grande aventura do homem sobre a Terra. Situa-se no terreno mais baixo das pequenas aflições da classe média. Enfim. Aconteceu com um amigo meu. Fictício, claro.

Ele estava voltando para casa como fazia, com fidelidade rotineira, todos os dias à mesma hora. Um homem dos seus 40 anos, naquela idade em que já sabe que nunca será o dono de um cassino em Samarkand, com diamantes nos dentes, mas ainda pode esperar algumas surpresas da vida, como ganhar na loto ou furar-lhe um pneu. Furou-lhe um pneu. Com dificuldade ele encostou o carro no meio-fio e preparou-se para a batalha contra o macaco, não um dos grandes macacos que o desafiavam no jângal dos seus sonhos de infância, mas o macaco do seu carro tamanho médio, que provavelmente não funcionaria, resignação e reticências... Conseguiu fazer o macaco funcionar, ergueu o carro, trocou o pneu e já estava fechando o porta-malas quando a sua aliança escorregou pelo dedo sujo de óleo e caiu no chão. Ele deu um passo para pegar a aliança do asfalto, mas sem querer a chutou. A aliança bateu na roda de um carro que passava e voou para um bueiro. Onde desapareceu diante dos seus olhos, nos quais ele custou a acreditar. Limpou as mãos o melhor que pôde, entrou no carro e seguiu para casa. Começou a pensar no que diria para a mulher. Imaginou a cena. Ele entrando em casa e respondendo às perguntas da mulher antes de ela fazê-las.

— Você não sabe o que me aconteceu!

— O quê?

— Uma coisa incrível.

— O quê?

— Contando ninguém acredita.

— Conta!

— Você não nota nada de diferente em mim? Não está faltando nada?

— Não.

— Olhe.

E ele mostraria o dedo da aliança, sem a aliança.

— O que aconteceu?

E ele contaria. Tudo, exatamente como acontecera. O macaco. O óleo. A aliança no asfalto. O chute involuntário. E a aliança voando para o bueiro e desaparecendo.

— Que coisa - diria a mulher, calmamente.

— Não é difícil de acreditar?

— Não. É perfeitamente possível.

— Pois é. Eu...

— SEU CRETINO!

— Meu bem...

— Está me achando com cara de boba? De palhaça? Eu sei o que aconteceu com essa aliança. Você tirou do dedo para namorar. É ou não é? Para fazer um programa. Chega em casa a esta hora e ainda tem a cara-de-pau de inventar uma história em que só um imbecil acreditaria.

— Mas, meu bem...

— Eu sei onde está essa aliança. Perdida no tapete felpudo de algum motel. Dentro do ralo de alguma banheira redonda. Seu sem-vergonha!

E ela sairia de casa, com as crianças, sem querer ouvir explicações. Ele chegou em casa sem dizer nada. Por que o atraso? Muito trânsito. Por que essa cara? Nada, nada. E, finalmente:

— Que fim levou a sua aliança? E ele disse:

— Tirei para namorar. Para fazer um programa. E perdi no motel. Pronto. Não tenho desculpas. Se você quiser encerrar nosso casamento agora, eu compreenderei.

Ela fez cara de choro. Depois correu para o quarto e bateu com a porta. Dez minutos depois reapareceu. Disse que aquilo significava uma crise no casamento deles, mas que eles, com bom-senso, a venceriam.

— O mais importante é que você não mentiu pra mim.

E foi tratar do jantar.

Fonte:
VERÍSSIMO, Luís Fernando. As mentiras que os homens contam. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2000, p.37.