quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Celso Sisto (“Obax”, de André Neves)


Do artigo de Celso Sisto, “Imaginação de elefante”, do site www.artistasgauchos.com.br

 NEVES, André. Obax. Ilustrações do autor. São Paulo, Brinque-Book, 2010. 36p.

 Inventar histórias preenche o tempo e a vida. Traz brilho para os olhos, aumenta a nossa experiência com aventuras! Faz a gente treinar brincadeiras e conquistar amigos! E pronto, estamos prontos para sermos felizes!

 A pequena Obax, que vive nas savanas, é solitária e destemida: corre pela planície, vive aventuras e depois conta para todo mundo. Mas, ninguém lhe dá muito ouvidos! Suas histórias são mágicas e os outros às vezes caçoam dela. Um dia, ela tropeça numa pedra em forma de elefante e decide sair pelo mundo em busca de provar a verdade das histórias. Nas costas do elefante Nafisa, Obax dá a volta ao mundo e retorna ao ponto de partida. Cheia de novas histórias, que ninguém acredita. No dia seguinte, ali perto, nasce um baobá, para confirmar que as histórias são sempre possíveis de acontecer. E servem para, no mínimo, fazer sonhar, fazer crescer!

 O livro é lindo! Enxuto, ágil, sem, contudo, deixar escapar nada de essencial. O encantamento começa com a sonoridade do nome da personagem Obax e se derrama pelas paisagens, pelos elementos da savana, pela rica imaginação da menina, pelas pinturas das casas, pelas costas do elefante Nafisa, pelo forte baobá, pela chuva de flores, pelo poder que tudo tem de se transformar.

 Obax significa flor e Nafisa, pedra preciosa! O livro tem essa aura perfumada e preciosa, do início ao fim, e o leitor pode acompanhar o exercício imaginativo da menina, enquanto vai percebendo que nas entrelinhas, outras coisas se avolumam: a necessidade que todo mundo tem de ser aceito pelo seu grupo; a poesia singela que a natureza oferece, mesmo nos lugares mais áridos; o silêncio revelador; o convívio intenso com uma fauna que não é a mesma do lugar em que vivemos; até mesmo a ironia daqueles que não estão acostumados a imaginar.

 Os elementos das culturas africanas também vão se revelando em tudo isso, principalmente nas cores e grafismos que predominam nas ilustrações, na vegetação do lugar, e também nos birotes da menina. Os penteados africanos são verdadeiras obras de arte, e esse que reúne os cabelos no cocuruto da cabeça, leva o nome de birote ou pitote. Mas o autor avisa: esta não é uma história recontada da tradição oral, é uma história totalmente inventada, com liberdade e conhecimento!

 E então, o tempo dá um salto no final da história e remete o leitor para um futuro indefinido, no qual o sonho é o grande Senhor das histórias, oferecidas mesmo por um majestoso baobá.
 As ilustrações deste livro brincam como se fossem lentes, que aumentam ou focalizam detalhes, recortando partes e pedaços que são importantes de perceber. Os vermelhos e amarelos predominam nas páginas, e em contraste com o branco, produzem um impacto ainda maior. E as figuras de André Neves tão fiéis a seu estilo (afiladas, esculturadas, de olhos puxados) se fundem com perfeição às texturas e às aplicações de colagens.

 O livro acaba de ganhar o prêmio Jabuti, nesta 53ª edição, na categoria Infantil.

Fonte:
http://www.artistasgauchos.com.br/portal/?cid=615

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 767)



Uma Trova de Ademar  

Quando a inspiração me envia 
a um cenário de beleza, 
eu dou beijos de poesia 
na face da natureza! 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Quando pela vida passas,
displicente e linda assim,
o mundo, sem tuas graças,
perde a graça para mim.
–Gabriel Bicalho/MG– 

Uma Trova Potiguar  

Quando eu morrer, vou assim: 
sustendo meu coração... 
Saudade da Terra? Sim! 
Saudade da vida? Não! 
–Auta de Souza/RN– 

Uma Trova Premiada  

2008   -   Caicó/RN 
Tema   -   ESTRADA   -   10º Lugar. 

Caminho, mantendo acesa
a chama da sensatez,
na estrada em que, com certeza,
não passarei outra vez!
–Therezinha Brisolla/SP– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Bebo na fonte sagrada, 
de onde vêm os versos meus. 
Sem ela, eu não faço nada... 
-Esta fonte, amigo, é Deus! 
–Francisco Macedo/RN– 

U m a P o e s i a  

Nossas conquistas são feitas, 
o mundo é nosso cartório, 
a vida é um laboratório 
de diferentes receitas, 
as lágrimas não são aceitas 
como nossos risos são, 
serenidade é canção 
na voz que Deus abençoa; 
passa a vida o tempo voa 
nas asas da ilusão. 
–Geraldo Amâncio/CE– 

Soneto do Dia  

SER TÃO SERTÃO. 
–Rachel Rabelo/PE– 

No trajeto vislumbro tais belezas 
das paisagens de luz deste sertão, 
que são típicas desta região 
completando meu ser de sutilezas. 

O teu povo traduz as realezas 
conquistadas nas artes da paixão, 
na poesia que vem do coração 
retratando histórias e certezas. 

Lá teu sol nasce já metrificado 
vem na chuva um canto ritmado 
entoando os ensaios da natura; 

tua noite tem brilho diferente 
que envolve num manto transparente 
as sementes da arte e da cultura!

Isabel Fontoura (Penhascos)


 Sou um ancião e sempre vivi na Chapada Diamantina, alojado entre grutas milenares que tremeram com a passagem da Coluna Prestes e com os tiros de Lampião. Sei das riquezas que estas cavernas escondem e das lendas que criam vida no ouvido das crianças.

 Garimpeiro de muitas lavras, sonhava encontrar diamantes e uma gema tão sólida que eternizasse a minha história. Lendas de um homem que encontrou a prisão e a alforria junto às pedras preciosas.

 Trabalhava dia após dia no garimpo para um coronel da região. Era parte do ofício envenenar os rios e matar os peixes em uma guerra de peneiras e dragas no ventre da terra, contudo, entre mercúrio, marte e a morte encontrava apenas cascalhos. O patrão ficava furioso e me castigava por achar que estava sendo roubado, não queria acreditar que naquela fazenda nada havia de valioso.

 Uma noite, enquanto dormia, a Santa veio me visitar, desde que me tornei órfão, ainda pequeno, escolhi Nossa Senhora como minha madrinha, e ela me mostrava uma gruta iluminada à beira de um precipício, uma trajetória para os diamantes.

 Lavrei com vigor, o sonho não me deixava, larguei minha peneira e subi córrego acima, andei umas duas léguas beirando o rio, nenhum capataz reparou e deparei-me com um penhasco, desci escorregando entre pedras e lamas até chegar ao começo da lapa. A entrada era sombria, o cheiro entorpecia-me, um bando de aves das cavernas esvoaçou sem me tocar, o medo assolou-me, nunca ouvira falar naquela gruta, todavia eu precisava desvendar aquele recanto de sombra e rochedo.

 Um veio de água corria pelo lajedo; e, em meio à frieza do córrego, insetos cegos, embranquecidos pela noite incessante da caverna, fugiam dos meus passos. Nas paredes, desenhos de homens que viveram sob o manto de pedra e deixaram o registro no seio da gruta. A passagem era muito estreita, o ar parecia escapulir do meu corpo, apertava as mãos, os dentes travavam de frio, enquanto minhas pernas cambaleantes alcançaram uma senda que cintilava no subsolo, e; em meio à escuridão, uma claridade nunca vista ardeu-me os olhos.

 O sonho materializou-se, havia opalas, águas-marinhas, ametistas. Muitas pepitas de ouro. Apanhei o máximo que pude e, ao sair, ouvi tiros: Cães, cavalos e capangas do coronel estavam a minha caça. Voltei à gruta e permaneci lá por muitas luas, alimentando-me de traíra crua e preás, devorei uma serpente que guizou em meus pés. Bebi água do rio que envenenara e sonhei com muitas lapas iguais a esta. Não queria mais sair: recluso no meu castelo de pedras, marajá com temor dos homens e das suas armas, cercado dos tesouros da mina de Nossa Senhora. Só e sozinho no calabouço, estava feliz.

 A lapa, no entanto, enojou-se de mim, e a terra tremeu, fugi tropeçando nas estalagmites milenares construídas no gota a gota do suor do tempo. A gruta ficava cada vez mais escura e as pedras desabavam nas minhas costas, devo ter corrido muito, era zanga de Nossa Senhora, decepcionada com seu afilhado, e receio muito a fúria das mulheres. Na fuga, perdi as pedras que abraçava ao peito e, por mais medo da pobreza que da morte, engoli os diamantes que tinha no bolso. Avistei uma luz intensa ao final de um túnel comprido. Era a luminosidade do dia, o sol, a saída da cratera.

 Embrutecido pelas pedras, desvalido pelo homem. Despertei no corredor de um hospital: tísico, demitido, homem sem saúde não serve para lida. Disseram que eu estava ali há alguns dias, falando frases soltas delirando de febre e clamando por Maria.

 Convalescente, lavrei entre meus dejetos pedras brilhosas: eram diamantes, que se dissiparam aos ventos de aguardentes e bordéis, consegui apenas após duas décadas arrematar a fazenda do coronel, terras estas onde conheci a escassez e a fartura, o retiro e o encantamento. Subterrâneos. Alqueires onde selei minha sina de garimpeiro de lavras do desconhecido.

 Hoje solto ecos nos penhascos, procuro a gruta de tesouro e de água envenenada que entre a rocha, a escuridão e a vida conduzirá meu caminho por trilhas sinuosas para escavar, naquela mina, um diamante de muitos quilates, lapidado pela engenhosidade do tempo. Pedra cintilante que contará a história de um velho garimpeiro, cego e sedento pelo brilho dos minerais, então descansarei naquele jazigo de jazidas, refúgio final de um peregrino.
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Sobre a autora
Isabel Fontoura tem 37 anos, é médica e escritora, membro da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores, regional Bahia. Participou de antologia com outros médicos baianos e publicou sozinha um livro de contos, "Penhascos", que foi premiado no VII Concurso Literário do Banco Capital e do qual extraímos o texto ao lado, que foi publicado pela EPP Publicidade em 2008.

Fonte:
http://www.releituras.com/ne_ifontoura_penhascos.asp

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Manuel Bandeira (O Último Poema)

Fonte:
Imagem com poema obtida no blog de Sylvia Moreti http://sylviamoreti.blogspot.com

A. A. de Assis (Revista Virtual de Trovas n. 157 - janeiro de 2013)





Quanto mais por ti eu peno,
mais gosto eu tenho em penar.
– O mundo inteiro é pequeno
para a glória te amar!
Colombina

Entender não há quem possa
a mulher, sempre ladina:
menina – já quer ser moça;
já velha – quer ser menina,
Félix Aires

Com que ironia o destino
pode este quadro pintar:
de um lado, um lar sem menino;
de outro, um menino sem lar.
Hegel Pontes

A vida é dura batalha
que não aceita um “talvez”
e nem outorga medalha
aos filhos da timidez!
Hermoclydes Franco

Chora o vento lá por fora...
Chora a chuva e vão-se as águas.
O coração também chora,
mas nunca se vão as mágoas.
José Fernandes

Vivo tanto a tua vida
na vida do sonho meu,
que até me sinto esquecida
da vida que Deus me deu.
Lilinha Fernandes


Tão ciumenta é a mulherzinha
que ele só passa, coitado,
pela casa da vizinha,
correndo e de olho fechado!
Carolina Ramos – SP

Não zombe de minoria
ao fazer trovas de humor;
como sogra é maioria,
use e abuse, sem pudor!
Eliana Jimenez – SC

Na briga que o meu cabelo
e a careca estão travando,
lamento ter que dizê-lo:
a careca está ganhando...
Izo Goldman – SP

Chega da farra na boa,
como quem acha que pode.
No escuro, beija a “patroa”...
sente na boca um bigode...
Jaime Pina da Silveira – SP

Conduzindo arma sem porte,
foi detido o valentão,
que da praia, por esporte,
vinha abraçando um “canhão”...
Nilton Manoel – SP

Caloteiro e bem sacana,
não tem vergonha na cara,
e, até quando paga em grana,
cola um papel de "BOM PARA..."
Sérgio Ferreira da Silva – SP

“Pescar, pra mim, é mania
e é estranho que a esposa deixe!...”
Ele vai pra pescaria
e ela vai “vender seu peixe”.
Therezinha Brisolla – SP

− Suspende a cachaça ou morre!
– Com humor, Zé, no boteco,
agora só toma porre
suspendendo seu caneco!
Wanda Mourthé – MG


Vereis nos próximos anos
a decisiva corrida:
– Cuidam do mundo os humanos,
ou cessa no mundo a vida!
A. A. de Assis – PR

Eu sinto a brisa do vento
como se fosse magia,
soprando em meu pensamento
os versos que Deus me envia...
Ademar Macedo – RN

Cultiva o amor tal qual fosse
plantinha bem delicada,
e terás lembrança doce
do teu amado ou da amada.
Benedita Azevedo – RJ

Julguei-o frio, entretanto
um soluço o denunciou;
abracei aquele pranto
que o homem forte chorou.
Cida Vilhena – PB

Quem leva a vida no amor,
dos sonhos nunca se cansa,
que o mundo só perde a cor
quando se perde a esperança.
Dáguima Verônica – MG

Beijo nas faces, carícias,
como tantas, inocentes,
mas abraços são primícias
dos desejos mais ardentes
Diamantino Ferreira – RJ

Mais uma noite se passa
numa caçada de amor...
Nem foi o dia da caça,
nem do pobre caçador.
Djalma da Mota – RN

Perco todos os cansaços
e minha angústia tem fim,
ao doce som dos teus passos
no cascalho do jardim...
Domitilla B. Beltrame – SP

Deste contraste da vida
à evidência eu não me furto:
– é uma história tão comprida...
– é um epílogo tão curto...
Dorothy Jansson Moretti – SP

A paixão se descontrola
e a saudade em mim se inflama
quando encontro a camisola
sem ela... na minha cama!
Eduardo A. O. Toledo – MG

Arruaça sempre grande:
jogo, bebidas, e orgia...
Quanto mais o vício expande,
mais a alma se esvazia!
Eliana Palma – PR

Este amor, mal necessário,
que a insensatez fez surgir,
é o erro mais arbitrário
que eu não quero corrigir!
Elisabeth Souza Cruz – RJ

Este orgulho que carregas,
insano, dentro do peito,
foge, tão logo te entregas
de corpo e alma em meu leito.
Ester Figueiredo – RJ

Eu passo a vida embalando
lembranças da mocidade,
e tristonho vou cantando
pra não morrer de saudade.
Francisco Garcia – RN

A trova faz tanto bem,
dá-nos prazer tão profundo,
que quem a cultiva tem
amigos em todo o mundo!
Gisela Sinfónio – Portugal

Nunca mais fiquei sozinha, 
pois na Internet eu namoro, 
e hoje a solidão que eu tinha 
não mora mais onde eu moro! 
Gislaine Canales – SC

Eu não contei tuas idas
nem minhas voltas confesso...
O que marcou nossas vidas
foi nosso eterno regresso!
Héron Patrício – SP

Lembra a lágrima um gemido
de ternura e redenção,
que não chega ao nosso ouvido,
mas comove o coração.
Humberto Del Maestro – ES

O bilro, velho instrumento,
que entrelaçou tantas rendas,
tece, agora, num momento,
as rimas de minhas lendas.
Ieda Lima – RN

Velhos sonhos, na lembrança,
vou mantendo em meu viver,
e nunca perco a esperança
de que vão acontecer!
Istela Marina – PR

Acordei (tinhas partido)
e me deixaste na estrada:
um pobre arbusto perdido
sem luz, sem pranto, sem nada...
Janske Schlenker – PR

Povo sofre, fica inerte
– ah que triste decepção! –
quando um líder se perverte,
envergonhando a nação.
Jeanette de Cnop – PR

Galgo nuvens montanhosas,
sou na vida um alpinista;
mesmo em trilhas perigosas,
busco os sonhos da conquista.
Jessé Nascimento – RJ

Música na madrugada, 
chovia em meu coração, 
ao saber que minha amada 
perdeu-se numa canção…
José Feldman – PR

Nada de dor nem de tédio,
sinto quase a juventude:
Ontem, comprando remédio;
hoje, vendendo saúde!
José Lucas de Barros - RN

Quem nesta vida não ama
na outra não pode amar,
pois do amor não leva a chama
que aqui deixou apagar.
José Maria Mangia – RJ

A trova, quando termina
em perfeita construção,
é uma casa pequenina,
com requintes de mansão!
José Messias Braz – MG

A cada novo empecilho,
seja audaz, perseverante.
A cruz mais pesada, filho,
alguém já levou adiante.
José Ouverney - SP

Partiu, deixando o seu traço
no meu caminho dos sós…
– A saudade é esse espaço
que existe sempre entre nós.
José Valdez – SP

E no princípio era o verso...
mas Deus, que tudo renova,
iluminou o universo,
formando a estrofe da trova!
Luiz Antônio Cardoso – SP

Se navegar é preciso
e viver nem tanto assim,
vou partir com teu sorriso, 
em busca do mar sem fim!
Luiz Carlos Abritta – MG

Falhei nesta vida minha,
ao querer ser o teu rei
pois tu já eras rainha,
e escravo teu me tornei.
Luiz Hélio Friedrich – PR

Vem na natureza, em cota
o dom de ser escritor...
Muitas vezes ninguém nota,
e o texto está numa flor!
Maria da Graça Stinglin – PR 

Não encontro, amor, o jeito
de lhe dizer que me encanta...
porque a frase sai do peito,
mas não passa na garganta!
Maria Nascimento – RJ

As marcas do teu batom
deixadas no meu cristal,
têm sabor e tem o tom
de um grande amor, no final...
Maurício Friedrich – PR

É de candeia em candeia
que clareio meus caminhos;
tanta luz só me norteia
para encontrar teus carinhos.
Messody Benoliel – RJ

Apesar de tantas portas
se fecharem para ti,
Deus até por vias tortas,
te contempla e te sorri.
Mifori – SP

Como parte desta vida,
ante a angústia do momento,
nosso pranto é a dolorida
expressão do sofrimento
Nei Garcez – PR

Se o nosso amor é pecado,
escondo-o lá nos refolhos...
e só me mande recado
pelas meninas dos olhos!
Newton Vieira – MG

Na roça em trabalho duro
aos filhos sonhou bem mais…
- Pra colher melhor futuro
plantou livros e jornais!
Olga Agulhon – PR

Com olhares tu fizeste
do coração uma cela,
e com teus beijos puseste
meu coração dentro dela.
Olympio Coutinho – MG

Em meus refúgios tristonhos,
passo o tempo a prantear
pelos segredos e sonhos
que não tive a quem contar!...
Paulo Roberto da Silva – RN

Passo as noites sempre em claro
contra esta insônia a lutar,
mas meu maior desamparo
é não ter com quem sonhar.
Renato Alves – RJ

Sempre tenho um ar risonho,
é de alegria o meu manto!
só nas trovas que eu componho
tento traduzir meu pranto!
Roza de Oliveira – PR


Quem dera se a vida fosse
mais simples de ser vivida:
nem todo regresso é doce,
nem sempre é amarga a partida...
Selma Patti Spinelli – SP

Amigos são todos eles
como aves de arribação:
se faz bom tempo, eles vêm...
Se faz mau tempo, eles vão...
Soares da Cunha – MG

Um alguém na multidão
anda com ar de desgosto
ao perceber a ilusão
que reside em cada rosto!...
Sônia Ditzel Martelo – PR

A árvore cai vencida,
cai vencida sem um gesto,
sem um gesto perde a vida,
perde a vida sem protesto.
Sônia Sobreira – RJ

Faça da vida uma troça
enquanto os males espreitam.
É nos trancos da carroça
que as abóboras se ajeitam.
Thalma Tavares – SP

Mulher, em sua contenda,
sempre tem o desafio
de tecer a linda renda,
desatando os nós do fio...
Vanda Alves – PR

Ao voltar do burburinho
da rua – a humana agressão,
a meiguice de um cãozinho
vem receber-me ao portão.
Vanda Fagundes Queiroz – PR

Amor, um santo remédio,
que revitaliza e cura.
Nos livra de qualquer tédio,
também nos leva à loucura.
Vânia Ennes – PR

Manoel Fernandes Menendes (Sete Notas Tem a Trova)


Ouço, freqüentemente, as pessoas que assistem aos nossos Jogos Florais, e que gostariam de participar, uma pergunta: 

– Como se aprende a fazer trova? 

Queixam-se, essas pessoas, de que os manuais de versificação ou, mesmo, os decálogos divulgados pela UBT, apesar de considerados excelentes, não lhes fornecem uma informação clara e precisa sobre o tema, isto é, não indicam, desde logo, um meio prático e rápido de compor, com segurança e acerto, a quadra setessilábica consagrada entre nós com o nome de “trova”, objeto de nossos concursos. 

Procurarei, neste breve espaço, resumir, a pedido do Presidente Milton Nunes Loureiro, a palestra que, sobre essa questão e com o título “A Música e a Poesia”, tenho feito, em diversas oportunidades e lugares, para facilitar a tarefa dos trovadores aprendizes. 

Dizem alguns antropólogos que o ser humano, antes de falar, cantou. Que a palavra primitiva – imitação das vozes e dos sons da natureza – era cantada. Verdade ou não, certo é que, desde remotas eras, em cerimônias religiosas ou manifestações políticas ou festas propiciatórias, a música andou de mãos dadas com a poesia, não raro também acompanhada da dança. Recordem-se, aqui, as odes líricas gregas, os salmos de Davi, os cantos heróicos de Homero, para citar apenas esses. Com o tempo, a poesia passou a ser simplesmente recitada – lida ou falada. Mas guardou indeléveis sinais de sua origem, sendo exato que a medida do verso ritmado nasceu do compasso melódico (música e dança.). Por isso, para atender ao meu propósito, sugiro um reencontro da poesia com sua velha companheira das épocas primordiais. 

Recorro, para ensejar essa reaproximação, à música popular, dela retirando exemplos que tornam acessíveis aos leigos as normas próprias do gênero literário. 

Os tratados de versificação ensinam que o verso tradicional é composto de pés ou sílabas, e que a métrica portuguesa admite os versos de uma (1) até doze (12) sílabas, alguns deles (os de 8, 9, 10, 11 e 12) com pausas obrigatórias peculiares, remanescência das velhas pausas musicais, base do ritmo. A contagem dessas sílabas é algo complicado e obedece a regras específicas. Mas, se utilizarmos o processo (que adotei) de acomodar a letra (as palavras do verso) a um molde musical preestabelecido, escolhendo uma forma para enchê-la com palavras, todas as dificuldades ficam superadas. 

Vamos à prova. 

Para modelo do verso de 12 sílabas, (o alexandrino), escolhi uma belíssima valsa de Paulo Medeyros, cantada por Sílvio Caldas: 

“Sorris da minha dor, mas eu te quero ainda, 
sentindo-me feliz, sonhando-te mais linda...” 

Com essa melodia, pode-se cantar o célebre soneto de Alceu Wamosy, “Duas almas”, escrito em versos alexandrinos: 

“Ó tu, que vens de longe! ó tu, que vens cansada...” 

Ou o famoso soneto de Bilac, “Virgens Mortas”: 
“Quando uma virgem morre, uma estrela aparece...” 

Para os versos de 10 sílabas, encontramos vários moldes, que podem ser aproveitados de diversas maneiras. 

Temos o Hino Nacional Brasileiro (“Ouviram do Ipiranga as margens plácidas...”), “A voz do violão” de Francisco Alves (“Não queiras, meu amor, saber da mágoa...”), “Chão de estrelas” de Orestes Barbosa (“Minha vida era um palco iluminado...”), o bolero “La barca” (“Dicen que la distancia es el olvido...”), por exemplo. Com qualquer desses conhecidos moldes, poderemos cantar estes conhecidos decassílabos: 

1 – “As armas e os barões assinalados...” 
(Camões) 

2 – “Sete anos de pastor, Jacó servia...” 
(Camões) 

3 – “Só a leve esperança, em toda a vida, 
disfarça a pena de viver, mais nada...” 
(Vicente de Carvalho) 

4 – “Vai-se a primeira pomba despertada...” 
(Raimundo Corrêa) 

5 – “Se a cólera que espuma, a dor que mora...” 
(Raimundo Corrêa) 

No caso do verso de sete (7) sílabas, metro obrigatório da trova, a coisa ainda fica mais simples, porque esse é o verso mais comum da Música Popular Brasileira. Os cantores de seresta sabem-no por experiência própria. Se não, vejamos: 

1 – “Fugindo da nostalgia, 
fui procurar alegria 
na ilusão de um cabaré...” 
(A mulher que ficou na taça) 

2 – “Olho a rosa na janela, 
sonho um sonho pequenino...” 
(Modinha) 

3 – “Vestida de azul e branco, 
trazendo um sorriso franco...” 
(Normalista) 

4 – “Nosso amor que eu não esqueço, 
e que teve o seu começo 
numa festa de São João...” 
(Último desejo) 

5 – “Estava à toa na vida, 
o meu amor me chamou 
pra ver a banda passar 
cantando coisas de amor...” 
(A banda) 

Para aplicar essas noções ao exercício da trova, costumo indicar três moldes, tomados à MPB, ao folclore e, até, à música popular italiana: “Peguei um Ita no Norte”, de Dorival Caymmi; “Meu limão, meu limoeiro”, canto folclórico; e “Torna a Surriento”, do cancioneiro napolitano. Uma trova corretamente feita, sem a necessidade de contarmos as sílabas pelos dedos, mas apenas com apoio num bom ouvido, ligando-se as palavras naturalmente, como na linguagem falada, encaixa-se, como numa luva, em qualquer desses moldes musicais. Querem experimentar? Comecemos pela toada de Caymmi: 

“Peguei um Ita no Norte, 
pra vir no Rio morá, 
adeus, meu pai, minha mãe, 
adeus, Belém do Pará...” 

Com a melodia dessa toada, é possível cantar estas trovas: 

1 – “Eu quis, na cara ou coroa 
saber se és minha ou do Zé 
fiquei na mesma. Esta é boa! 
O níquel caiu de pé!” 
Colbert Rangel Coelho 

2 – “Maria da Graça é uma 
cachopa de olhos em brasa 
vive sozinha, não fuma, 
e tem cinzeiros em casa!” 
Augusto Gil 

Com a melodia de “Meu limão, meu limoeiro” e de “Torna a Surriento” obtém-se o mesmo efeito: 

1 – “Meu limão, meu limoeiro, 
meu pé de jacarandá: 
Uma vez, tindô-lelê, 
outra vez, tindô-lalá...” 

2 – “Vide ‘o mare quant’è bello, 
spira tantu sentimento, 
comme tu a chi tiene mente, 
ca scetato ‘o faie sunná...” 

Penso que bastam essas explicações para demonstrar que o processo é prático e rápido. 

No início, o aprendiz pode exercitar-se com frases e palavras sem sentido, ligadas arbitrariamente, desconexas, procurando adaptá-las ao molde musical. Depois, adquirindo o hábito, os versos irão formar-se naturalmente, até pelo cotejo com as trovas de autores mais experimentados. E no meio, como diria o poeta espanhol, no meio “hay que poner talento”. Quanto a isto, não tenho dúvida: existe, por aí, de sobra.

Fonte:
Seleções em Folha. Ano 4. N.1 – janeiro 2000. São Paulo/SP