terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Vereda da Poesia = 201


Trova de
ALCIDES CARNEIRO
Princesa Isabel/PB (1906 – 1976)

Mulher feia dá sossego,
mulher bonita aflição;
descobri que andar aflito
me faz bem ao coração...
= = = = = = = = =  

Poema de
MACHADO DE ASSIS 
Rio de Janeiro/RJ, 1839 – 1908

Mundo interior

Ouço que a natureza é uma lauda eterna
De pompa, de fulgor, de movimento e lida,
Uma escala de luz, uma escala de vida
De sol à ínfima luzerna.

Ouço que a natureza, — a natureza externa, —
Tem o olhar que namora, e o gesto que intimida
Feiticeira que ceva uma hidra de Lerna
Entre as flores da bela Armida.

E contudo, se fecho os olhos, e mergulho
Dentro em mim, vejo à luz de outro sol, outro abismo
Em que um mundo mais vasto, armado de outro orgulho,

Rola a vida imortal e o eterno cataclismo,
E, como o outro, guarda em seu âmbito enorme,
Um segredo que atrai, que desafia — e dorme. 
= = = = = = = = =  

Trova de
FÉLIX AIRES
Buriti Bravo/MA (1904 – 1979)

 Por esses campos azuis,
 Ó lua do meu sertão,
 tu és um pente de luz
 nas tranças da escuridão!
= = = = = = 

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Casulo de vidro

Ofusca-me a visão
Esses encontros com o espelho
A dualidade entre o passado
E o  presente, repleto de ausências,
Dos traços envoltos em brumas
O doloroso mergulho:
Quebrar o espelho
Sem fragmentar a essência
Sentir na pele, a lâmina que corta
E recorta - cura -
Desfalecer de dor
No silenciar da alma,
Na solidão do "casulo de vidro"
Buscando respostas
Na sequência de pétalas eternas-
“Flor da Vida”-
Aroma de bálsamo –
Aquietando meu coração.
= = = = = = 

Poetrix de
PEDRO CARDOSO
Brasília/DF

Outono 

as folhas amareladas
dizem que o meu coração
mudou de estação
= = = = = = 

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

Sou um cansaço que findou no sono
(Narciso Alves Pires, in “Para além do adeus”)

Sou um cansaço que findou no sono
Da tarde triste em que morreu o dia
E quando a noite o meu corpo acolhia
O sol desceu do seu dourado trono.

A doce paz nasceu desse abandono
Mistura de mistério e nostalgia
E, aos poucos, o meu ser desfalecia
Como folha que tomba pelo Outono.

A mansidão abraça-se ao sossego
E eu fico numa luz, num aconchego
Como nunca, em meus dias, eu vivi.

O tempo foi passando devagar
E não sendo eu capaz de me acordar
Só então é que eu soube que morri.
= = = = = = = = = 

Trova de
JOSÉ OUVERNEY
Pindamonhangaba/SP

Há mentiras proferidas,
bem piores que punhais,
porque provocam feridas
que não se fecham jamais...
= = = = = = 

Soneto de
OLAVO BILAC
Rio de Janeiro/RJ, 1865 – 1918

Ida

Para a porta do céu, pálida e bela,
Ida as asas levanta e as nuvens corta.
Correm os anjos: e a criança morta
Foge dos anjos namorados dela.

Longe do amor materno o céu que importa?
O pranto os olhos límpidos lhe estrela...
Sob as rosas de neve da capela,
Ida soluça, vendo abrir-se a porta.

Quem lhe dera outra vez o escuro canto
Da escura terra, onde, a sangrar, sozinho,
Um coração de mão desfaz-se em pranto!

Cerra-se a porta: os anjos todos voam...
Como fica distante aquele ninho,
Que as mães adoram... mas amaldiçoam!
= = = = = = 

Trova de 
ADEMAR MACEDO
Santana do Matos/ RN, 1951 – 2013, Natal/ RN

A distância nos redime 
se a saudade nos escolta; 
ir pra longe é tão sublime 
como sublime é a volta!
= = = = = = 

Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

Teu nome

Fecho os olhos pela luz dos teus
A escuridão tem o teu nome
Quando chegas sem pedir licença.

Trazes nos gestos a graciosidade da açucena
Um brilho distinto de beleza sem mácula
Vontade projetada pelo fulgor dos sentidos.

Tudo o que vejo, tudo o que sinto
É um sorriso, um ansiado aroma teu
Um olhar suspenso no tempo
Naquele dia onde esmoreceu.

Abro os olhos de ofuscada saudade.
O que me falta em palavras
Sobra-me de teus gestos ausentes!
= = = = = = 

Haicai de
GUILHERME DE ALMEIDA
Campinas/SP 1890 – 1969 São Paulo/SP

O Pensamento

O ar. A folha. A fuga.
No lago, um círculo vago.
No rosto, uma ruga.
= = = = = = 

Poema de
MÁRIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 – 1994) Porto Alegre/RS

Saudade

Que me dizias, Augusto Meyer,
naquele tempo que não passa,
na mesa, junto à vidraça,
naquele bar que era um barco?

Por ela passavam mares,
passavam portos e portos,
ali que os ventos ventavam,
dos quatro cantos do mundo!

O que dizíamos? Sei lá!
não falemos em nossas vidas...
nem, por nós, se salvou o mundo...

Mas, Amigo, eu sei que tenho
— naquelas horas perdidas —
o meu ganho mais profundo!
= = = = = = 

Trova de
ADAUTO GONDIM
Pedra Branca/CE (1915 – 1980) Fortaleza/CE

No teu jardim, entre flores,
feliz estou ao teu lado
meu calendário de dores
hoje marcou feriado.
= = = = = = 

Hino de
ANAHY/ PR

Neste solo gentil dadivoso
Onde outrora o café imperou
O pioneiro com seu braço valoroso
O agreste sertão desbravou
Na clareira do mais puro encanto
A capela de Sant'Ana se ergueu
e anunciando o progresso ao recanto
Anahy majestosa nasceu

Na lavoura a magia singela
O algodão canta um hino de amor
Com o milho e a soja tão bela
Revezando com o trigo em flor
Qual presentes da mãe natureza
A irrigar as riquezas daqui
Correm rios da mais alva beleza
Irmanados ao rio Piquiri

Tuas portas estão sempre abertas
Acolhendo com carinho e afeição
Todo aquele que procura rotas certas
Aqui encontra abrigo e união
Anahy és um exemplo seguro
A inspirar este povo gentil
No labor construindo o futuro
E a grandeza do nosso Brasil
= = = = = = = = =  

Soneto de
BENEDITA AZEVEDO
Magé/ RJ

Meu primeiro amor

Lembras nosso primeiro carnaval?
Eu dançava no corso na avenida...
Ao me vês acenaste da calçada
A música era bela e original.

Ao ver-te disparou meu coração,
O amor que despertava no momento
Sob o som da marchinha, e o sentimento,
Trouxe à minha alma muita inquietação.

Cheguei naquele dia no trabalho,
Mas teu olhar em fuga deixou o meu
Percebi que sentias tal qual eu.

Meu amor que nasceu sob o orvalho,
Deu frutos, em dois filhos que gerou,
E em cinco netos o amor eternizou
= = = = = = = = =  = = = = 

Trova de
CLÁUDIO DE CÁPUA
São Paulo/ SP, 1945 – 2021, Santos/ SP

Imensidões veneráveis, 
que me fazem navegar, 
céu e mar, inseparáveis, 
na linha do meu olhar.
= = = = = = = = = 

Uma Lengalenga de Portugal
O QUE ESTÁ NA GAVETA?
 
 O que está na gaveta?
Uma fita preta.
O que está na varanda?
Uma fita de ganga
O que está na panela?
Uma fita amarela
O que está no poço?
Uma casca de tremoço
O que está no telhado?
Um gato malhado
O que está na chaminé?
Uma caixa de rapé
O que está na rua?
Uma espada nua
O que está atrás da porta?
 Uma vara torta
 
O que está no ninho?
Um passarinho
Deixa-o no morno
 Dá-lhe pãozinho.
Vamos ver se ele pia?
Piuuuuuuuuuuuuuu!
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
FERNANDO MÁXIMO
Avis/ Portugal

Cria um filho para ser
paladino das verdades,
não o cries para ter
vícios… defeitos… maldades…
= = = = = = = = =  

Soneto de
MÁRIO A. J. ZAMATARO
Curitiba/PR

Ingenuidade

Quero ter a minha voz
pra dizer abertamente
que uma farsa aperta os nós
e disfarça impunemente!

E direi como é feroz,
como faz tranquilamente
o papel doce de algoz
e se crê ser inocente.

Usa a lei como sofisma,
tem acordo com a ilusão
pra fazer cavilação.

Quer impor sempre o seu prisma
e não vê nisso maldade,
deve ser ingenuidade!

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