sábado, 17 de setembro de 2011

Machado de Assis (O Alienista) V – O terror ; VI – A rebelião


CAPÍTULO V - O TERROR

Quatro dias depois, a população de Itaguaí ouviu consternada a notícia de que um certo Costa fora recolhido à Casa Verde.

—Impossível!

—Qual impossível! foi recolhido hoje de manhã.

— Mas, na verdade, ele não merecia... Ainda em cima! depois de tanto que ele fez...

Costa era um dos cidadãos mais estimados de Itaguaí, Herdara quatrocentos mil cruzados em boa moeda de El-rei Dom João V, dinheiro cuja renda bastava, segundo lhe declarou 0 tio no testamento, para viver "até o fim do mundo". Tão depressa recolheu a herança, como entrou a dividi-la em empréstimos, sem usura, mil cruzados a um, dois mil a outro, trezentos a este, oitocentos àquele, a tal ponto que, no fim de cinco anos, estava sem nada. Se a miséria viesse de chofre, o pasmo de Itaguaí, seria enorme; mas veio devagar; ele foi passando da opulência à abastança, da abastança à mediania, da mediania à pobreza, da pobreza à miséria, gradualmente. Ao cabo daqueles cinco anos, pessoas que levavam o chapéu ao chão, logo que ele assomava no fim da rua, agora batiam-lhe no ombro, com intimidade, davam-lhe piparotes no nariz, diziam-lhe pulhas. E o Costa sempre lhano, risonho. Nem se lhe dava de ver que os menos corteses eram justamente os que tinham ainda a dívida em aberto; ao contrário, parece que os agasalhava com maior prazer, e mais sublime resignação. Um dia, como um desses incuráveis devedores lhe atirasse uma chalaça grossa, e ele se risse dela, observou um desafeiçoado, com certa perfídia: — "Você suporta esse sujeito para ver se ele lhe paga". Costa não se deteve um minuto, foi ao devedor e perdoou-lhe a divida.— "Não admira, retorquiu o outro; o Costa abriu mão de uma estrela, que está no céu". Costa era perspicaz, entendeu que ele negava todo o merecimento ao ato, atribuindo-lhe a intenção de rejeitar o que não vinham meter-lhe na algibeira. Era também pundonoroso e inventivo; duas horas depois achou um meio de provar que lhe não cabia um tal labéu: pegou de algumas dobras, e mandou-as de empréstimo ao devedor.

—Agora espero que...—pensou ele sem concluir a frase.

Esse último rasgo do Costa persuadiu a crédulos e incrédulos; ninguém mais pôs em dúvida os sentimentos cavalheirescos daquele digno cidadão. As necessidades mais acanhadas saíram à rua, vieram bater-lhe à porta, com os seus chinelos velhos, com as suas capas remendadas. Um verme, entretanto, rola a alma do Costa: era o conceito do desafeto. Mas isso mesmo acabou; três meses depois veio este pedir-lhe uns cento e vinte cruzados com promessa de restituir-lhos daí a dois dias; era 0 resíduo da grande herança, mas era também uma nobre desforra: Costa emprestou o dinheiro logo, logo, e sem juros. Infelizmente não teve tempo de ser pago; cinco meses depois era recolhido à Casa Verde.

Imagina-se a consternação de Itaguaí, quando soube do caso. Não se falou em outra coisa, dizia-se que o Costa ensandecera, ao almoço, outros que de madrugada; e contavam-se os acessos, que eram furiosos, sombrios, terríveis,—ou mansos, e até engraçados, conforme as versões. Muita gente correu à Casa Verde, e achou o pobre Costa, tranqüilo, um pouco espantado, falando com muita clareza, e perguntando por que motivo o tinham levado para ali. Alguns foram ter com o alienista. Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixão, mas acrescentava que a ciência era a ciência, e que ele não podia deixar na rua um mentecapto. A última pessoa que intercedeu por ele (porque depois do que vou contar ninguém mais se atreveu a procurar o terrível médico) foi uma pobre senhora, prima do Costa. O alienista disse-lhe confidencialmente que esse digno homem não estava no perfeito equilíbrio das faculdades mentais, à vista do modo como dissipara os cabedais que...

—Isso, não! isso, não! interrompeu a boa senhora com energia. Se ele gastou tão depressa o que recebeu, a culpa não é dele.

—Não?

—Não, senhor. Eu lhe digo como o negócio se passou. O defunto meu tio não era mau homem; mas quando estava furioso era capaz de nem tirar 0 chapéu ao Santíssimo. Ora, um dia, pouco tempo antes de morrer, descobriu que um escravo lhe roubara um boi; imagine como ficou.

A cara era um pimentão; todo ele tremia, a boca escumava; lembra-me como se fosse hoje. Então um homem feio, cabeludo, em mangas de camisa, chegou-se a ele e pediu água. Meu tio (Deus lhe fale n alma!) respondeu que fosse beber ao rio ou ao inferno. O homem olhou para ele, abriu a mão em ar de ameaça, e rogou esta praga:—"Todo o seu dinheiro não há de durar mais de sete anos e um dia, tão certo como isto ser o sino-salamão! E mostrou o sino-salamão impresso no braço. Foi isto, meu senhor; foi esta praga daquele maldito.

Bacamarte espetara na pobre senhora um par de olhos agudos como punhais. Quando ela acabou, estendeu-lhe a mão polidamente, como se o fizesse à própria esposa do vice-rei, e convidou-a a ir falar ao primo. A mísera acreditou; ele levou-a à Casa Verde e encerrou-a na galeria dos alucinados.

A notícia desta aleivosia do ilustre Bacamarte lançou o terror à alma da população. Ninguém queria acabar de crer, que, sem motivo, sem inimizade, o alienista trancasse na Casa Verde uma senhora perfeitamente ajuizada, que não tinha outro crime senão o de interceder por um infeliz. Comentava-se o caso nas esquinas, nos barbeiros; edificou-se um romance, umas finezas namoradas que o alienista outrora dirigira à prima do Costa, a indignação do Costa e o desprezo da prima. E daí a vingança. Era claro. Mas a austeridade do alienista, a vida de estudos que ele levava, pareciam desmentir uma tal hipótese. Histórias! Tudo isso era naturalmente a capa do velhaco. E um dos mais crédulos chegou a murmurar que sabia de outras coisas, não as dizia, por não ter certeza plena, mas sabia, quase que podia jurar.

—Você, que é íntimo dele, não nos podia dizer o que há, o que houve, que motivo...

Crispim Soares derretia-se todo. Esse interrogar da gente inquieta e curiosa, dos amigos atônitos, era para ele uma consagração pública. Não havia duvidar; toda a povoação sabia enfim que o privado do alienista era ele, Crispim, o boticário, o colaborador do grande homem e das grandes coisas; daí a corrida à botica. Tudo isso dizia o carão jucundo e o riso discreto do boticário, o riso e o silêncio, porque ele não respondia nada; um, dois, três monossílabos, quando muito, soltos, secos, encapados no fiel sorriso constante e miúdo, cheio de mistérios científicos, que ele não podia, sem desdouro nem perigo, desvendar a nenhuma pessoa humana.

—Há coisa, pensavam os mais desconfiados.

Um desses limitou-se a pensá-lo, deu de ombros e foi embora. Tinha negócios pessoais Acabava de construir uma casa suntuosa. Só a casa bastava para deter a chamar toda a gente; mas havia mais,—a mobília, que ele mandara vir da Hungria e da Holanda, segundo contava, e que se podia ver do lado de fora, porque as janelas viviam abertas,—e o jardim, que era uma obra-prima de arte e de gosto. Esse homem, que enriquecera no fabrico de albardas, tinha tido sempre o sonho de uma casa magnífica, jardim pomposo, mobília rara. Não deixou o negócio das albardas, mas repousava dele na contemplação da casa nova, a primeira de Itaguaí, mais grandiosa do que a Casa Verde, mais nobre do que a da Câmara, Entre a gente ilustre da povoação havia choro e ranger de dentes, quando se pensava, ou se falava, ou se louvava a casa do albardeiro,—um simples albardeiro, Deus do céu!

—Lá está ele embasbacado, diziam os transeuntes, de manhã.

De manhã, com efeito, era costume do Mateus estatelar-se, no meio do jardim, com os olhos na casa, namorado, durante uma longa hora, até que vinham chamá-lo para almoçar. Os vizinhos, embora o cumprimentassem com certo respeito, riam-se por trás dele, que era um gosto. Um desses chegou a dizer que o Mateus seria muito mais econômico, e estaria riquíssimo, se fabricasse as albardas para si mesmo; epigrama ininteligível, mas que fazia rir às bandeiras despregadas.

— Agora lá está o Mateus a ser contemplado, diziam à tarde.

A razão deste outro dito era que, de tarde, quando as famílias safam a passeio (jantavam cedo) usava o Mateus postar-se à janela, bem no centro, vistoso, sobre um fundo escuro, trajado de branco, atitude senhoril, e assim ficava duas e três horas até que anoitecia de todo. Pode crer-se que a intenção do Mateus era ser admirado e invejado, posto que ele não a confessasse a nenhuma pessoa, nem ao boticário, nem ao Padre Lopes seus grandes amigos. E entretanto não foi outra a alegação do boticário, quando o alienista lhe disse que o albardeiro talvez padecesse do amor das pedras, mania que ele Bacamarte descobrira e estudava desde algum tempo. Aquilo de contemplar a casa...

—Não, senhor, acudiu vivamente Crispim Soares.

—Não?

—Há de perdoar-me, mas talvez não saiba que ele de manhã examina a obra, não a admira; de tarde, são os outros que o admiram a ele e à obra.—E contou o uso do albardeiro, todas as tardes, desde cedo até o cair da noite.

Uma volúpia científica alumiou os olhos de Simão Bacamarte. Ou ele não conhecia todos os costumes do albardeiro, ou nada mais quis, interrogando o Crispim, do que confirmar alguma notícia incerta ou suspeita vaga. A explicação satisfê-lo; mas como tinha as alegrias próprias de um sábio, concentradas, nada viu o boticário que fizesse suspeitar uma intenção sinistra. Ao contrário, era de tarde, e o alienista pediu-lhe o braço para irem a passeio. Deus! era a primeira vez que Simão Bacamarte dava o seu privado tamanha honra; Crispim ficou trêmulo, atarantado, disse que sim, que estava pronto. Chegaram duas ou três pessoas de fora, Crispim mandou-as mentalmente a todos os diabos; não só atrasavam o passeio, como podia acontecer que Bacamarte elegesse alguma delas, para acompanhá-lo, e o dispensasse a ele. Que impaciência! que aflição! Enfim, saíram. O alienista guiou para os lados da casa do albardeiro, viu-o à janela, passou cinco, seis vezes por diante, devagar, parando, examinando as atitudes, a expressão do rosto. O pobre Mateus, apenas notou que era objeto da curiosidade ou admiração do primeiro volto de Itaguaí redobrou de expressão, deu outro relevo às atitudes... Triste! triste, não fez mais do que condenar-se; no dia seguinte, foi recolhido à Casa Verde.

—A Casa Verde é um cárcere privado, disse um médico sem clínica.

Nunca uma opinião pegou e grassou tão rapidamente. Cárcere privado: eis o que se repetia de norte a sul e de leste a oeste de Itaguaí,—a medo, é verdade, porque durante a semana que se seguiu à captura do pobre Mateus, vinte e tantas pessoas,—duas ou três de consideração,—foram recolhidas à Casa Verde. O alienista dizia que só eram admitidos os casos patológicos, mas pouca gente lhe dava crédito. Sucediam-se as versões populares. Vingança, cobiça de dinheiro, castigo de Deus, monomania do próprio médico, plano secreto do Rio de Janeiro com o fim de destruir em Itaguaí qualquer gérmen de prosperidade que viesse a brotar, arvorecer, florir, com desdouro e míngua daquela cidade, mil outras explicações, que não explicavam nada, tal era o produto diário da imaginação pública.

Nisto chegou do Rio de Janeiro a esposa do alienista, a tia, a mulher do Crispim Soares, e toda a mais comitiva, —ou quase toda—que algumas semanas antes partira de Itaguaí O alienista foi recebê-la, com o boticário, o Padre Lopes os vereadores e vários outros magistrados. O momento em que D. Evarista pôs os olhos na pessoa do marido é considerado pelos cronistas do tempo como um dos mais sublimes da história moral dos homens, e isto pelo contraste das duas naturezas, ambas extremas, ambas egrégias. D. Evarista soltou um grito, —balbuciou uma palavra e atirou-se ao consorte—de um gesto que não se pode melhor definir do que comparando-o a uma mistura de onça e rola. Não assim o ilustre Bacamarte; frio como diagnóstico, sem desengonçar por um instante a rigidez científica, estendeu os braços à dona que caiu neles e desmaiou. Curto incidente; ao cabo de dois minutos D. Evarista recebia os cumprimentos dos amigos e o préstito punha-se em marcha.

D. Evarista era a esperança de Itaguaí contava-se com ela para minorar o flagelo da Casa Verde. Daí as aclamações públicas, a imensa gente que atulhava as ruas, as flâmulas, as flores e damascos às janelas. Com o braço apoiado no do Padre Lopes —porque o eminente confiara a mulher ao vigário e acompanhava-os a passo meditativo—D. Evarista voltava a cabeça a um lado e outro, curiosa, inquieta, petulante. O vigário indagava do Rio de Janeiro, que ele não vira desde o vice-reinado anterior; e D. Evarista respondia entusiasmada que era a coisa mais bela que podia haver no mundo. O Passeio Público estava acabado, um paraíso onde ela fora muitas vezes, e a Rua das Belas Noites, o chafariz das Marrecas... Ah! o chafariz das Marrecas! Eram mesmo marrecas—feitas de metal e despejando água pela boca fora. Uma coisa galantíssima. O vigário dizia que sim, que o Rio de Janeiro devia estar agora muito mais bonito. Se já o era noutro tempo! Não admira, maior do que Itaguaí, e, demais, sede do governo... Mas não se pode dizer que Itaguaí fosse feio; tinha belas casas, a casa do Mateus, a Casa Verde...

—A propósito de Casa Verde, disse o Padre Lopes escorregando habilmente para o assunto da ocasião, a senhora vem achá-la muito cheia de gente.

—Sim?

—É verdade. Lá está o Mateus...

—O albardeiro?

—O albardeiro; está o Costa, a prima do Costa, e Fulano, e Sicrano, e...

—Tudo isso doido?

—Ou quase doido, obtemperou padre.

—Mas então?

O vigário derreou os cantos da boca, à maneira de quem não sabe nada ou não quer dizer tudo; resposta vaga, que se não pode repetir a outra pessoa por falta de texto. D. Evarista achou realmente extraordinário que toda aquela gente ensandecesse; um ou outro, vá; mas todos? Entretanto custava-lhe duvidar; o marido era um sábio, não recolheria ninguém à Casa Verde sem prova evidente de loucura.

—Sem dúvida... sem dúvida... ia pontuando o vigário.

Três horas depois cerca de cinqüenta convivas sentavam-se em volta da mesa de Simão Bacamarte; era o jantar das boas-vindas. D. Evarista foi o assunto obrigado dos brindes, discursos, versos de toda a casta, metáforas, amplificações, apólogos. Ela era a esposa do novo Hipócrates, a musa da ciência, anjo, divina, aurora, caridade, vida, consolação; trazia nos olhos duas estrelas segundo a versão modesta de Crispim Soares e dois sóis no conceito de um vereador. O alienista ouvia essas coisas um tanto enfastiado, mas sem visível impaciência. Quando muito, dizia ao ouvido da mulher que a retórica permitia tais arrojos sem significação. D. Evarista fazia esforços para aderir a esta opinião do marido; mas, ainda descontando três quartas partes das louvaminhas, ficava muito com que enfunar-lhe a alma. Um dos oradores, por exemplo, Martim Brito, rapaz de vinte e cinco anos, pintalegrete acabado, curtido de namoros e aventuras, declamou um discurso em que o nascimento de D. Evarista era explicado pelo mais singular dos reptos. Deus, disse ele, depois de dar o universo ao homem e à mulher, esse diamante e essa pérola da coroa divina (e o orador arrastava triunfalmente esta frase de uma ponta a outra da mesa), Deus quis vencer a Deus, e criou D. Evarista."

D. Evarista baixou os olhos com exemplar modéstia. Duas senhoras, achando a cortesanice excessiva e audaciosa, interrogaram os olhos do dono da casa; e, na verdade, 0 gesto do alienista pareceu-lhes nublado de suspeitas, de ameaças e provavelmente de sangue. O atrevimento foi grande, pensaram as duas damas. E uma e outra pediam a Deus que removesse qualquer episódio trágico—ou que o adiasse ao menos para o dia seguinte. Sim, que o adiasse. Uma delas, a mais piedosa, chegou a admitir consigo mesma que D. Evarista não merecia nenhuma desconfiança, tão longe estava de ser atraente ou bonita. Uma simples água-morna. Verdade é que, se todos os gostos fossem iguais, o que seria do amarelo? Esta idéia fê-la tremer outra vez, embora menos; menos, porque o alienista sorria agora para o Martim Brito e, levantados todos, foi ter com ele e falou-lhe do discurso. Não lhe negou que era um improviso brilhante, cheio de rasgos magníficos. Seria dele mesmo a idéia relativa ao nascimento de D. Evarista ou tê-la-ia encontrado em algum autor que?... Não senhor; era dele mesmo; achou-a naquela ocasião e pareceu-lhe adequada a um arroubo oratório. De resto, suas idéias eram antes arrojadas do que ternas ou jocosas. Dava para o épico. Uma vez, por exemplo, compôs uma ode à queda do Marquês de Pombal, em que dizia que esse ministro era o "dragão aspérrimo do Nada" esmagado pelas "garras vingadoras do Todo"; e assim outras mais ou menos fora do comum; gostava das idéias sublimes e raras, das imagens grandes e nobres...

— Pobre moço! pensou o alienista. E continuou consigo: —Trata-se de um caso de lesão cerebral: fenômeno sem gravidade, mas digno de estudo...

D. Evarista ficou estupefata quando soube, três dias depois, que o Martim Brito fora alojado na Casa Verde. Um moço que tinha idéias tão bonitas! As duas senhoras atribuíram o ato a ciúmes do alienista. Não podia ser outra coisa; realmente, a declaração do moço fora audaciosa demais.

Ciúmes? Mas como explicar que, logo em seguida, fossem recolhidos José Borges do Couto Leme, pessoa estimável, o Chico das cambraias, folgazão emérito, o escrivão Fabrício e ainda outros? O terror acentuou-se. Não se sabia já quem estava são, nem quem estava doido. As mulheres, quando os maridos safam, mandavam acender uma lamparina a Nossa Senhora; e nem todos os maridos eram valorosos, alguns não andavam fora sem um ou dois capangas. Positivamente o terror. Quem podia emigrava. Um desses fugitivos chegou a ser preso a duzentos passos da vila. Era um rapaz de trinta anos, amável, conversado, polido, tão polido que não cumprimentava alguém sem levar o chapéu ao chão; na rua, acontecia-lhe correr uma distancia de dez a vinte braças para ir apertar a mão a um homem grave, a uma senhora, às vezes a um menino, como acontecera ao filho do juiz de fora. Tinha a vocação das cortesias. De resto, devia as boas relações da sociedade, não só aos dotes pessoais, que eram raros, como à nobre tenacidade com que nunca desanimava diante de uma, duas, quatro, seis recusas, caras feias, etc. O que acontecia era que, uma vez entrado numa casa, não a deixava mais, nem os da casa o deixavam a ele, tão gracioso era o Gil Bernardes. Pois o Gil Bernardes, apesar de se saber estimado, teve medo quando lhe disseram um dia que o alienista o trazia de olho; na madrugada seguinte fugiu da vila, mas foi logo apanhado e conduzido à Casa Verde.

—Devemos acabar com isto!

—Não pode continuar!

—Abaixo a tirania!

—Déspota! violento! Golias!

Não eram gritos na rua, eram suspiros em casa, mas não tardava a hora dos gritos. O terror crescia; avizinhava-se a rebelião. A idéia de uma petição ao governo, para que Simão Bacamarte fosse capturado e deportado, andou por algumas cabeças, antes que o barbeiro Porfírio a expendesse na loja com grandes gestos de indignação. Note-se — e essa é uma das laudas mais puras desta sombrio história — note-se que o Porfírio, desde que a Casa Verde começara a povoar-se tão extraordinariamente, viu crescerem-lhe os lucros pela aplicação assídua de sanguessugas que dali lhe pediam; mas o interesse particular, dizia ele, deve ceder ao interesse público. E acrescentava:—é preciso derrubar o tirano! Note-se mais que ele soltou esse grito justamente no dia em que Simão Bacamarte fizera recolher à Casa Verde um homem que trazia com ele uma demanda, o Coelho.

—Não me dirão em que é que o Coelho é doido? bradou o Porfírio,

E ninguém lhe respondia; todos repetiam que era um homem perfeitamente ajuizado. A mesma demanda que ele trazia com o barbeiro, acerca de uns chãos da vila, era filha da obscuridade de um alvará e não da cobiça ou ódio. Um excelente caráter o Coelho. Os únicos desafeiçoados que tinha eram alguns sujeitos que dizendo-se taciturnos ou alegando andar com pressa mal o viam de longe dobravam as esquinas, entravam nas lojas, etc. Na verdade, ele amava a boa palestra, a palestra comprida, gostada a sorvos largos, e assim é que nunca estava só, preferindo os que sabiam dizer duas palavras, mas não desdenhando os outros. O Padre Lopes que cultivava o Dante, e era inimigo do Coelho, nunca o via desligar-se de uma pessoa que não declamasse e emendasse este trecho:

La bocca sollevò dal fiero pasto
Quel "seccatore"...

mas uns sabiam do ódio do padre, e outros pensavam que isto era uma oração em latim.

CAPÍTULO VI - A REBELIÃO

Cerca de trinta pessoas ligaram-se ao barbeiro, redigiram e `_ levaram uma representação à Câmara.

A Câmara recusou aceitá-la, declarando que a Casa Verde era uma instituição pública, e que a ciência não podia ser emendada por votação administrativa, menos ainda por movimentos de rua.

—Voltai ao trabalho, concluiu o presidente, é o conselho que vos damos.

A irritação dos agitadores foi enorme. O barbeiro declarou que iam dali levantar a bandeira da rebelião e destruir a Casa Verde; que Itaguaí não podia continuar a servir de cadáver aos estudos e experiências de um déspota; que muitas pessoas estimáveis e algumas distintas, outras humildes mas dignas de apreço, jaziam nos cubículos da Casa Verde; que o despotismo científico do alienista complicava-se do espírito de ganância, visto que os loucos ou supostos tais não eram tratados de graça: as famílias e em falta delas a Câmara pagavam ao alienista...

—É falso! interrompeu o presidente.

—Falso?

—Há cerca de duas semanas recebemos um ofício do ilustre médico em que nos declara que, tratando de fazer experiências de alto valor psicológico, desiste do estipêndio votado pela Câmara, bem como nada receberá das famílias dos enfermos.

A notícia deste ato tão nobre, tão puro, suspendeu um pouco a alma dos rebeldes. Seguramente o alienista podia estar em erro, mas nenhum interesse alheio à ciência o instigava; e para demonstrar o erro, era preciso alguma coisa mais do que arruaças e clamores. Isto disse o presidente, com aplauso de toda a Câmara. O barbeiro, depois de alguns instantes de concentração, declarou que estava investido de um mandato público e não restituiria a paz a Itaguaí antes de ver por terra a Casa

Verde—"essa Bastilha da razão humana"—expressão que ouvira a um poeta local e que ele repetiu com muita ênfase. Disse, e, a um sinal, todos saíram com ele.

Imagine-se a situação dos vereadores; urgia obstar ao ajuntamento, à rebelião, à luta, ao sangue. Para acrescentar ao mal um dos vereadores que apoiara o presidente ouvindo agora a denominação dada pelo barbeiro à Casa Verde—"Bastilha da razão humana"—achou-a tão elegante que mudou de parecer. Disse que entendia de bom aviso decretar alguma medida que reduzisse a Casa Verde; e porque o presidente, indignado, manifestasse em termos enérgicos o seu pasmo, o vereador fez esta reflexão:

—Nada tenho que ver com a ciência; mas, se tantos homens em quem supomos são reclusos por dementes, quem nos afirma que o alienado não é o alienista?

Sebastião Freitas, o vereador dissidente, tinha o dom da palavra e falou ainda por algum tempo, com prudência mas com firmeza. Os colegas estavam atônitos; o presidente pediu-lhe que, ao menos, desse o exemplo da ordem e do respeito à lei, não aventasse as suas idéias na rua para não dar corpo e alma à rebelião, que era por ora um turbilhão de átomos dispersos. Esta figura corrigiu um pouco o efeito da outra: Sebastião Freitas prometeu suspender qualquer ação, reservando-se o direito de pedir pelos meios legais a redução da Casa Verde. E repetia consigo namorado:—Bastilha da razão humana!

Entretanto a arruaça crescia. Já não eram trinta mas trezentas pessoas que acompanhavam o barbeiro, cuja alcunha familiar deve ser mencionada, porque ela deu o nome à revolta; chamavam-lhe o Canjica—e o movimento ficou célebre com o nome de revolta dos Canjicas. A ação podia ser restrita—visto que muita gente, ou por medo, ou por hábitos de educação, não descia à rua; mas o sentimento era unânime, ou quase unânime, e os trezentos que caminhavam para a Casa Verde,—dada a diferença de Paris a Itaguaí,—podiam ser comparados aos que tomaram a Bastilha.

D. Evarista teve noticia da rebelião antes que ela chegasse; veio dar-lha uma de suas crias. Ela provava nessa ocasião um vestido de seda,—um dos trinta e sete que trouxera do Rio de Janeiro,—e não quis crer.

—Há de ser alguma patuscada, dizia ela, mudando a posição de um alfinete. Benedita, vê se a barra está boa.

—Está, sinhá, respondia a mucama de cócoras no chão, está boa. Sinhá vira um bocadinho. Assim. Está muito boa.

—Não é patuscada, não, senhora; eles estão gritando: — Morra o Dr. Bacamarte!!! o tirano! dizia o moleque assustado.

—Cala a boca, tolo! Benedita, olha aí do lado esquerdo; não parece que a costura está um pouco enviesada? A risca azul não segue até abaixo; está muito feio assim; é preciso descoser para ficar igualzinho e...

— Morra o Dr. Bacamarte!!! morra o tirano! uivaram fora trezentas vozes. Era a rebelião que desembocava na Rua Nova.

D. Evarista ficou sem pinga de sangue. No primeiro instante não deu um passo, não fez um gesto; o terror petrificou-a. A mucama correu instintivamente para a porta do fundo. Quanto ao moleque, a quem D. Evarista não dera crédito, teve um instante de triunfo súbito, imperceptível, entranhado, de satisfação moral, ao ver que a realidade vinha jurar por ele.

—Morra o alienista! bradavam as vozes mais perto.

D. Evarista, se não resistia facilmente às comoções de prazer, sabia entestar com os momentos de perigo. Não desmaiou; correu à sala interior onde o marido estudava. Quando ela ali entrou, precipitada, o ilustre médico escrutava um texto de Averróis;; os olhos dele, empanados pela cogitação, subiam do livro ao reto e baixavam do reto ao livro, cegos para a realidade exterior, videntes para os profundos trabalhos mentais. D. Evarista chamou pelo marido duas vezes, sem que ele lhe desse atenção; à terceira, ouviu e perguntou-lhe o que tinha, se estava doente.

—Você não ouve estes gritos? perguntou a digna esposa em lágrimas.

O alienista atendeu então; os gritos aproximavam-se, terríveis, ameaçadores; ele compreendeu tudo. Levantou-se da cadeira de espaldar em que estava sentado, fechou o livro, e, a passo firme e tranqüilo, foi depositá-lo na estante. Como a introdução do volume desconsertasse um pouco a linha dos dois tomos contíguos, Simão Bacamarte cuidou de corrigir esse defeito mínimo, e, aliás, interessante. Depois disse à mulher que se recolhesse, que não fizesse nada.

—Não, não, implorava a digna senhora, quero morrer ao lado de você...

Simão Bacamarte teimou que não, que não era caso de morte; e ainda que o fosse, intimava-lhe, em nome da vida, que ficasse. A infeliz dama curvou a cabeça, obediente e chorosa.

—Abaixo a Casa Verde! bradavam os Canjicas.

O alienista caminhou para a varanda da frente e chegou ali no momento em que a rebelião também chegava e parava, defronte, com as suas trezentas cabeças rutilantes de civismo e sombrias de desespero.—Morra! morra! bradaram de todos os lados, apenas o vulto do alienista assomou na varanda. Simão Bacamarte fez um sinal pedindo para falar; os revoltosos cobriram-lhe a voz com brados de indignação. Então o barbeiro, agitando o chapéu, a fim de impor silêncio à turba, conseguiu aquietar os amigos, e declarou ao alienista que podia falar, mas acrescentou que não abusasse da paciência do povo como fizera até então.

—Direi pouco, ou até não direi nada, se for preciso. Desejo saber primeiro o que pedis.

—Não pedimos nada, replicou fremente o barbeiro; ordenamos que a Casa Verde seja demolida, ou pelo menos despojada dos infelizes que lá estão.

—Não entendo.

—Entendeis bem, tirano; queremos dar liberdade às vítimas do vosso ódio, capricho, ganância...

O alienista sorriu, mas o sorriso desse grande homem não era coisa visível aos olhos da multidão; era uma contração leve de dois ou três músculos, nada mais. Sorriu e respondeu:

—Meus senhores, a ciência é coisa séria, e merece ser tratada com seriedade. Não dou razão dos meus atos de alienista a ninguém, salvo aos mestres e a Deus. Se quereis emendar a administração da Casa Verde, estou pronto a ouvir-vos; mas, se exigis que me negue a mim mesmo, não ganhareis nada. Poderia convidar alguns de vós em comissão dos outros a vir ver comigo os loucos reclusos; mas não o faço, porque seria dar-vos razão do meu sistema, o que não farei a leigos nem a rebeldes.

Disse isto o alienista e a multidão ficou atônita; era claro que não esperava tanta energia e menos ainda tamanha serenidade. Mas o assombro cresceu de ponto quando o alienista, cortejando a multidão com muita gravidade, deu-lhe as costas e retirou-se lentamente para dentro. O barbeiro tornou logo a si e, agitando o chapéu, convidou os amigos à demolição da Casa Verde; poucas vozes e frouxas lhe responderam. Foi nesse momento decisivo que o barbeiro sentiu despontar em si a ambição do governo; pareceu-lhe então que, demolindo a Casa Verde e derrocando a influência do alienista, chegaria a apoderar-se da Câmara, dominar as demais autoridades e constituir-se senhor de Itaguaí. Desde alguns anos que ele forcejava por ver o seu nome incluído nos pelouros para o sorteio dos vereadores, mas era recusado por não ter uma posição compatível com tão grande cargo. A ocasião era agora ou nunca. Demais, fora tão longe na arruaça que a derrota seria a prisão ou talvez a forca ou o degredo. Infelizmente a resposta do alienista diminuíra o furor dos sequazes. O barbeiro, logo que o percebeu, sentiu um impulso de indignação e quis bradar-lhes:—Canalhas! covardes! —mas conteve-se e rompeu deste modo:

Meus amigos, lutemos até o fim! A salvação de Itaguaí está nas vossas mãos dignas e heróicas. Destruamos o cárcere de vossos filhos e pais, de vossas mães e irmãs, de vossos parentes e amigos, e de vós mesmos. Ou morrereis a pão e água, talvez a chicote, na masmorra daquele indigno.

E a multidão agitou-se, murmurou, bradou, ameaçou, congregou-se toda em derredor do barbeiro. Era a revolta que tornava a si da ligeira síncope e ameaçava arrasar a Casa Verde.

—Vamos! bradou Porfírio, agitando o chapéu.

—Vamos! repetiram todos.

Deteve-os um incidente: era um corpo de dragões que, a marche-marche, entrava na Rua Nova.
–––––––––––––
continua… Capitulo VII – O inesperado; Capítulo VIII – As angústias do Boticário
––––––––––––-
Fonte:
ASSIS, Machado de. O Alienista.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

A. A. de Assis (Trovas Ecológicas) - 17

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 335)


Uma Trova Nacional

Eu ouço na voz do vento,
quer na brisa ou tempestade,
que a vida é um fugaz momento
nas asas da eternidade.
–CIDINHA FRIGERI/PR–

Uma Trova Potiguar

É tanta a minha tristeza,
ao sentir que não me queres,
que por vingança e baixeza
me entrego a outras mulheres.
–ISRAEL SEGUNDO/RN–

Uma Trova Premiada

2004 - Nova Friburgo/RJ
Tema: REFÚGIO - 3º Lugar.

Não desgastes, noutros leitos,
o ardor dos abraços teus,
pois teus braços foram feitos
para refúgio dos meus!
–ALMIRA GUARACY REBELO/MG–

Uma Trova de Ademar

Ouvi de um velho tristonho
que quase nunca sonhou:
– sequer eu colhi um sonho
que a própria vida plantou!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Saudade é doce lembrança
se traz promessas consigo.
saudade sem esperança,
não é saudade... é castigo!
–ALCY RIBEIRO S. MAIOR/RJ–

Simplesmente Poesia

Empecilho
–MARINA BRUNA/SP–

Ramagem de um florir antigo
se contorce em minha janela.
Folhas ocultam o horizonte
e abafam meu viver incerto.
Inútil podá-las pois, súbito voltam
e, viçosas, separam meus anseios
do mundo vasto...
Onde se acorrentam as raízes
do mal que me atormenta?
Quero arrancá-las do meu solo,
abrir espaço aos devaneios,
gozar a alegria que passa,
voltar a ser livre... Como antes...

Estrofe do Dia

O meu sertão de hoje em dia
é um sertão diferente,
quase que não tem mais gente
usando uma montaria,
tem um velho Kar-manguia,
um Uno, um fusca, um Fiesta,
a serenata e a seresta
perderam-se na distância;
das coisas boas da infância
saudade é só o que resta!
–FRANCISCO MACEDO/RN–

Soneto do Dia

Súplica.
–MARIA NASCIMENTO/RJ–

Jurei não lhe falar mais de ternura,
nem dar sinais de angústia nem de dor,
mas sinto as cicatrizes da censura
bem menos doloridas que as do amor...

Assim, movida pela desventura,
vivendo um sentimento embriagador,
tento afogar meu sonho na amargura,
e volto a lhe falar do meu amor.

Deixe que eu ame intensa e livremente,
sem censurar o meu comportamento,
sem ter pena das penas que padeço,

que eu sofro, por você, conscientemente,
e, por maior que seja o meu tormento,
estou sofrendo menos que mereço...

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Gena Maria (Divagações Poéticas)


O POETA QUANDO CHORA

Suas palavras são coloridas
como as cores do arco-íris
O poeta quando chora
Deixa a emoção falar mais alto
e transporta para o papel
toda a sua dor contida

O poeta quando chora
escreve seus lindos versos
deixando o coração falar
sobre a dor que tem no peito
falando do amor, da saudade
da tristeza, sem maldade

O poeta quando chora
dizendo tudo que sente
leva consigo outros amores
outros corações também
machucados pela
mesma dor do amor

O poeta quando chora
leva a todos os cantos seus versos
emocionando sempre com suas
líricas palavras de amor e dor

O poeta quando chora
faz chorar também, quem ama
quem sente saudade de um amor,
que se foi deixando em seu lugar,
alegria, tristeza e a dor!
FALANDO DE AMOR...

Como é bom falar de amor!
Sentir o coração bater forte
Saltitante, como se fosse pular
Do nosso peito em chamas!

Como é bom amar e sentir-se amado
Saber que mesmo estando longe
Tem alguém pensando em você...
Com a mesma saudade e a mesma saudade...
É uma vontade de estar junto, de se abraçar
Como se aquele momento fosse o último!

Como é bom beijar e sentir que
O mesmo desejo está nos lábios
De quem nos beija, com o mesmo ímpeto
Da paixão adolescente, ofegante e desejoso
De que esta emoção nunca se acabe!

Como é bom amar e ouvir
A voz do seu amado dizendo...
Muitas vezes, bobagens... Outras vezes,
Palavras profundas e sinceras!

Como é bom amar e poder dizer:
"Eu amo você meu amor e,
vou amá-lo eternamente!"

PROCURO UM AMOR

Procuro um amor
Que me faça sonhar... realizar fantasias...
Esquecer o ontem... viver o hoje
sem pensar no amanhã...

Procuro um amor
Que me veja linda por dentro e bela por fora
Ouvindo-me com atenção e me fazendo carinhos

Procuro um amor
Que ao findar do dia chegue saudoso de meus beijos
Abraçando-me com saudade, dizendo palavras de amor

Procuro um amor
Que não me troque por amigos ao entardecer
E ao chegar me procure com muito ardor

Procuro um amor
Que me ame acima de tudo e de todos
Que me faça sentir o quão importante sou

Procuro um amor
Que ao anoitecer me beije com carinho
Que tire minha roupa, me ame inteira...
Que me faça ir aos céus pedindo mais e mais...
Que me faça sentir, que sou a mulher de sua vida

Procuro um amor
Maior que eu, maior que nós, único e grandioso
Para que eu esqueça que nesta vida conheci
Alguém como você…
DE TOMBOS EM TOMBOS

Tanto fiz, tanto fiz que acabei assim
Sem você e muito machucada!
Ontem, seu amor era só meu...
Hoje, ele é de quem estiver por perto...
Amanhã sei lá, de quem será!
Nesta vida, o amor é assim
sempre nos pregando peças!
Quando pensamos que amamos,
de repente, descobrimos que não!
Quando pensamos ser amados,
de repente, somos abandonados!
E assim vamos levando a vida
de tombos em tombos...
E cada vez que nos levantamos
duma queda, esquecemos
rapidinho da dor...
Levamos outra rasteira e para
o chão novamente somos lançados...
E, lá ficamos inconformados
prometendo não mais
cair em ciladas...
Até que nosso sensível coração
sobreponha a nossa razão...
E de novo somos lançados
a uma nova chama da paixão!
Será que não existe um amor
total, completo, eterno entre
um homem e uma mulher?
Será que temos sempre
que amar sem ser amado
E ser amado sem amar?
Isto me lembra aquela música antiga...
“Quem eu quero não me quer...
Quem me quer mandei embora...
E por isso já não sei o que
será de mim agora..."
Mas, desta vez eu juro, eu prometo não
mais cair e, também não mais derrubar...
Assim quem sabe, serei feliz...
Bem mais feliz!

CADERNINHO DE MUSICAS

Meu caderninho de músicas
Só letras de amor escrevi
Cantei a paixão e a dor
E de amor quase morri

Nas letras e nas canções
Muita tristeza e algumas alegrias
Um amor mal resolvido
Uma traição, um reencontro...
E muitos beijos!

Uma despedida sem volta
Um encontro, um recomeço.
Um amor á primeira vista
Beijos ardentes
Promessas não cumpridas
E abraços "calientes!”.

Um coração "espinhado"
E um adeus para finalizar!
Ás vezes uma vida é rompida
Mas há os reencontros
Para não mais separar!

Ficaria horas
Lendo as músicas e ouvindo
Os famosos a cantar
Como é bom a adolescência
E voltar a amar!

Fontes:
http://magiadaspalavras.vilabol.uol.com.br/
http://genapoeta.blogspot.com

Lima Barreto (O Cemitério)


Pelas ruas de túmulos, fomos calados. Eu olhava vagamente aquela multidão de sepulturas, que trepavam, tocavam-se, lutavam por espaço, na estreiteza da vaga e nas encostas das colinas aos lados. Algumas pareciam se olhar com afeto, roçando-se amigavelmente; em outras, transparecia a repugnância de estarem juntas. Havia solicitações incompreensíveis e também repulsões e antipatias; havia túmulos arrogantes, imponentes, vaidosos e pobres e humildes; e, em todos, ressumava o esforço extraordinário para escapar ao nivelamento da morte, ao apagamento que ela traz às condições e às fortunas.

Amontoavam-se esculturas de mármore, vasos, cruzes e inscrições; iam além; erguiam pirâmides de pedra tosca, faziam caramanchéis extravagantes, imaginavam complicações de matos e plantas—coisas brancas e delirantes, de um mau gosto que irritava. As inscrições exuberavam; longas, cheias de nomes, sobrenomes e datas, não nos traziam à lembrança nem um nome ilustre sequer; em vão procurei ler nelas celebridades, notabilidades mortas; não as encontrei. E de tal modo a nossa sociedade nos marca um tão profundo ponto, que até ali, naquele campo de mortos, mudo laboratório de decomposição, tive uma imagem dela, feita inconscientemente de um propósito, firmemente desenhada por aquele acesso de túmulos pobres e ricos, grotescos e nobres, de mármore e pedra, cobrindo vulgaridades iguais umas às outras por força estranha às suas vontades, a lutar...

Fomos indo. A carreta, empunhada pelas mãos profissionais dos empregados, ia dobrando as alamedas, tomando ruas, até que chegou à boca do soturno buraco, por onde se via fugir, para sempre do nosso olhar, a humildade e a tristeza do contínuo da Secretaria dos Cultos.

Antes que lá chegássemos, porém, detive-me um pouco num túmulo de límpidos mármores, ajeitados em capela gótica, com anjos e cruzes que a rematavam pretensiosamente.

Nos cantos da lápide, vasos com flores de biscuit e, debaixo de um vidro, à nívea altura da base da capelinha, em meio corpo, o retrato da morta que o túmulo engolira. Como se estivesse na Rua do Ouvidor, não pude suster um pensamento mau e quase exclamei:

— Bela mulher!

Estive a ver a fotografia e logo em seguida me veio à mente que aqueles olhos, que aquela boca provocadora de beijos, que aqueles seios túmidos, tentadores de longos contatos carnais, estariam àquela hora reduzidos a uma pasta fedorenta, debaixo de uma porção de terra embebida de gordura.

Que resultados teve a sua beleza na terra? Que coisas eternas criaram os homens que ela inspirou? Nada, ou talvez outros homens, para morrer e sofrer. Não passou disso, tudo mais se perdeu; tudo mais não teve existência, nem mesmo para ela e para os seus amados; foi breve, instantâneo, e fugaz.

Abalei-me! Eu que dizia a todo o mundo que amava a vida, eu que afirmava a minha admiração pelas coisas da sociedade—eu meditar como um cientista profeta hebraico! Era estranho! Remanescente de noções que se me infiltraram e cuja entrada em mim mesmo eu não percebera! Quem pode fugir a elas?

Continuando a andar, adivinhei as mãos da mulher, diáfanas e de dedos longos; compus o seu busto ereto e cheio, a cintura, os quadris, o pescoço, esguio e modelado, as aspáduas brancas, o rosto sereno e iluminado por um par de olhos indefinidos de tristeza e desejos...

Já não era mais o retrato da mulher do túmulo; era de uma, viva, que me falava.

Com que surpresa, verifiquei isso.

Pois eu, eu que vivia desde os dezesseis anos, despreocupadamente, passando pelos meus olhos, na Rua do Ouvidor, todos os figurinos dos jornais de modas, eu me impressionar por aquela menina do cemitério! Era curioso.

E, por mais que procurasse explicar, não pude.

Fonte:
BARRETO, Lima. A Nova Califórnia - Contos. São Paulo: Brasiliense, 1979. Texto proveniente de A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro

VII Concurso de Trovas da UBT-Maranguape (Resultado Final)


ÂMBITO: NACIONAL/INTERNACIONAL
TEMA: ECOLOGIA (L/F)

VENCEDORES (1º ao 5º lugares)

1º. Lugar:
Não é moda, nem magia,
ou prova de inteligência;
preservar a ecologia
é lei de sobrevivência.
Almerinda F. Liporage
Rio de Janeiro/RJ

2º. Lugar:
A queimada em tempo breve
apagando a luz do dia,
anula o que Deus escreve
no livro da ecologia!
Elen de Novais Felix
Niterói/RJ

3º. Lugar:
Defender a Ecologia
de forma séria e decente,
é preservar a harmonia
da própria casa da gente.
Wandira Fagundes Queiroz
Curitiba/PR

4º. Lugar:
Quem trabalha a ecologia
Com exemplo e amor profundo
Sente o prazer e a alegria
De estar melhorando o mundo.
Roberto Resende Vilela
Pouso Alegre/MG

5º. Lugar:
A Ecologia é tão vasta...
exige estudo profundo;
mas saber só isto basta:
- Vou fazer mais verde o Mundo!
Gisela Alves Sinfrónio
Olhão – Portugal

MENÇÕES HONROSAS (6º ao 10º lugares)

ÂMBITO: NACIONAL/INTERNACIONAL
TEMA: ECOLOGIA
(Trovas líricas ou filosóficas)

6º. Lugar:
Político demagogo
faz da ecologia guerra
e acende a língua do fogo
que lambe o verde da Terra!
Gabriel Bicalho
Mariana/MG

7º. Lugar:
A planta, o animal, o inseto,
Em equilíbrio e harmonia,
Ao homem – seu desafeto –
Dão aulas de Ecologia!
Therezinha Dieguez Brisolla
São Paulo/SP

8º. Lugar:
Defendendo a natureza,
por amor a ecologia,
resguardamos a beleza,
que o Pai do Céu nos confia!
Carlos Alberto de Carvalho
São Gonçalo/RJ

9º. Lugar:
Cada vez mais me convenço,
de que bem mais que ciência,
a ecologia é bom senso,
fator de sobrevivência.
Campos Sales
São Paulo/SP

10º. Lugar:
Muito mais que a competência,
em compêndios reunida,
ecologia é Ciência
que defende a própria vida.
Emilia Peñalba de Almeida Esteves
Porto – Portugal

MENÇÕES ESPECIAIS (11º ao 15º lugares)

ÂMBITO: NACIONAL/INTERNACIONAL
TEMA: ECOLOGIA (Trovas líricas ou filosóficas)

11º. Lugar:
Quem frustra as graves sequelas,
praticando ECOLOGIA,
exerce uma das mais belas
lições de Cidadania!!!
Maria Madalena Ferreira
Magé/RJ

12º. Lugar:
Indo assim, num triste dia,
uma criança, decerto,
vai pensar que ecologia
é o estudo do deserto...
Austregésilo de Miranda Alves
Senhor do Bonfim/BA

13º. Lugar:
À expansão da Ecologia,
agradecem, fauna e flora,
estimulando a alegria
do nosso mundo de agora!
Gislaine Canales
Balneário Camboriú/SC

14º. Lugar:
Ecologia é loucura
aos olhos de um pregador,
prosperidade e doçura
nas mãos do trabalhador.
Cecília de Amaral Cardoso
Sorocaba/SP

15º. Lugar:
Por gerar a diretriz
Que mantém sua medida,
A ecologia é raiz
Que sustenta nossa vida...
Giovanelli
Nova Friburgo/RJ

DESTAQUES (16º ao 20º lugares)

ÂMBITO: NACIONAL/INTERNACIONAL
TEMA: ECOLOGIA (Trovas líricas ou filosóficas)

16º. Lugar:
Ser humano, jamais lese
A Natureza, um legado
Que Ecologia foi tese
De Deus em seu doutorado.
Élbea Priscila de Sousa e Silva
Caçapava/SP

17º. Lugar:
A ecologia assegura
que a natureza é assim:
Se ofendida não tem cura,
bem amada, não tem fim!
Antônio Messias da Rocha Filho
Juiz de Fora/MG

18º. Lugar:
Quem defende a ecologia
Com ação firme, segura,
Não se agarra a uma utopia:
Defende a vida futura!
Thereza Costa Val
Belo Horizonte/MG

19º. Lugar:
A ecologia é ciência
hoje muito comentada.
Busca o fim da violência
Aos seres vivos, mais nada!
Gilson Faustino Maia
Petrópolis/RJ

20º. Lugar:
Vamos dar mais alegria
E prazer à natureza,
Cuidando da ecologia
Com requintes de nobreza.
Amael Tavares da Silva
Juiz de Fora/MG
*********************
ÂMBITO:
NACIONAL/INTERNACIONAL

TEMA: QUEIMADA(S)
(Trovas humorísticas)

VENCEDORES (1º ao 5º lugares):

1º. Lugar:
Pra combater a queimada,
o bombeiro luso, em choque,
deixou a loja encharcada
temendo a “queima”... de estoque.
Maurício Cavalheiro
Pindamonhangaba/SP

2º. Lugar:
É queimada a Dona Benta
no bairro de Botafogo,
por já passar dos oitenta
e não ter baixado o fogo...!
Manoel Cavalcante de Souza Castro
Pau dos Ferros/RN

3º. Lugar:
De tanto ser “amassada”
Pelo padeiro, a vizinha,
Acabou sendo “queimada”
Pela língua da Candinha!...
Marisa Rodrigues Fontalva
São Paulo/SP

4º. Lugar:
Foi beber uma “queimada”
com vinho, pinga e limão,
acordou numa calçada
sem cueca e sem calção!
Ademar Macedo
Natal/RN

5º. Lugar:
Vejo moita esfumaçada,
já vou mudando de rumo:
Ou é sinal de queimada,
ou gente "puxando fumo"!...
Roberto Tchepelentyky
São Paulo/SP

MENÇÕES HONROSAS
(6º ao 10º lugares)

ÂMBITO:
NACIONAL/INTERNACIONAL

TEMA: QUEIMADA(S)
(Trovas humorísticas)

6º. Lugar:
Maria pula a fogueira,
mas cai, nas brasas, sentada.
Eis o fim da brincadeira:
a parte de trás queimada.
Gilson Faustino Maia
Petrópolis/RJ

7º. Lugar:
Quis apagar a queimada,
mas caiu numa esparrela,
pois, estando “alambicada”,
a mais queimada foi ela!
Wanda de Paula Mourthé
Belo Horizonte/MG

8º. Lugar:
Ao ver a sogra chegar
Da praia, toda queimada,
Diz o genro pra zombar:
“É picanha mal passada?”
Licínio Antônio de Andrade
Juiz de Fora/MG

9º. Lugar:
Era um dia de queimada.
E o desavisado peão
ao “verter água”, na estrada,
queimou o que tinha em mão!...
Renato Alves
Rio de Janeiro/RJ

10º. Lugar:
Devota de Santo Antônio,
Numa fogueira, animada,
Procurando um matrimônio,
Caiu e ficou queimada.
Zeni de Barros Lana
Belo Horizonte/MG

MENÇÕES ESPECIAIS
(11º ao 15º lugares)

ÂMBITO:
NACIONAL/INTERNACIONAL

TEMA: QUEIMADA(S)
(Trovas humorísticas)

11º. Lugar:
Cumádi... quanta queimada!
Em qui lugá queimou mais?
Cumpádi... ti contu nada:
Queimou a parti di trás!
Luiz Gilberto de Barros
Rio de Janeiro/RJ

12º. Lugar:
Ante a floresta queimada
Quis prestar o seu tributo:
Saiu na rua pelada
Para exibir o seu luto!
Adilson Maia
Niterói/RJ

13º. Lugar:
Pôs fogo, achando bacana,
Mas viu-se numa enrascada:
Lá se foi sua cabana,
Em meio à mata queimada!
Éderson Cardoso de Lima
Niterói/RJ

14º. Lugar:
De queimada o odor sentido
Na padaria que é tosca,
Confirma que é o seu marido
Que vive queimando a rosca...
Edmar Japiassu Maia
Rio de Janeiro/RJ

15º. Lugar:
O fogaréu da queimada
Nem “despacho” ele respeita...
-Atravessa a encruzilhada –
“e já deixa a janta feita”.
Wandira Fagundes Queiroz
Curitiba/PR

DESTAQUES
(16º ao 20º lugares)

ÂMBITO:
NACIONAL/INTERNACIONAL

TEMA: QUEIMADA(S)
(Trovas humorísticas)

16º. Lugar:
No rango de sexta-feira,
Ficou queimada a patroa,
Quando viu que a cozinheira
Deixou queimar a leitoa!!!
Ailto Rodrigues
Nova Friburgo/RJ

17º. Lugar:
Quando nasceu a pretinha
Que era filha da empregada,
Disse o filho da vizinha:
- Ela já nasceu queimada!
Luiz Machado Stabile
Uruguaiana/RS

18º. Lugar:
Tantas queimadas aprontas,
e a tantas matas dás cabo,
que algum dia, em tais afrontas,
queimarás teu próprio rabo!...
Antonio Augusto de Assis
Maringá/PR

19º. Lugar:
A negra Gigi, vaidosa,
Quer ter pedigree de escol.
Diz, que a pele afro, sedosa,
É queimada, pelo sol.
Fabiano de C. M. Wanderley
Natal/RN

20º. Lugar:
Eu entrei numa gelada,
Na noite de São João,
Fiquei com a calça queimada,
Quando soltava balão.
Iracema C. Neves Bull
Jundiaí/SP

TROVAS CLASSIFICADAS

VENCEDORES (1º ao 5º lugares)

ÂMBITO: ESTADUAL

TEMA: FLORESTA (Trovas líricas ou filosóficas)

1º. Lugar:
Todo o viço, eu aprecio,
Da floresta, que beleza!
Parece fêmea no cio
Explicando a natureza.
Deusdedit Rocha
Fortaleza/CE

2º. Lugar:
A floresta tão gigante,
Já não respira por nós.
O predador, num rompante,
Faz calar a sua voz.
Hortêncio Pessoa
Fortaleza/CE

3º. Lugar:
Salvemos nossa floresta
Com um alerta geral,
Pois o caos se manifesta
O aquecimento global.
José Aureilson C. Abreu
Maranguape/CE

4º. Lugar:
É pena, mas é verdade
Floresta vai se acabar
Só vai ficar a saudade
E gente a se lamentar.
Luiz Carlos de Abreu Brandão.
Maranguape/CE

5º. Lugar:
Sou parte da sua vida
Se o machado me devora
Ninguém sara esta ferida
A floresta geme e chora.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/CE

MENÇÕES HONROSAS (6º ao 10º lugares)

ÂMBITO: ESTADUAL

TEMA: FLORESTA (Trovas líricas ou filosóficas)

6º. Lugar:
Deus queira que essa ganância,
Que o madeireiro contesta,
Fuja junto com a arrogância
Para longe da floresta.
Haroldo Lyra
Fortaleza/CE

7º. Lugar:
É irreparável o dano
Uma floresta queimada
Entretanto, o ser humano
Não a deixa preservada.
Ana Maria Nascimento
Aracoiaba/CE

8º. Lugar:
O pé de ponta virada
Enganando o caçador,
É Curupira que guarda
A floresta, por amor
Sonia Nogueira
Fortaleza/CE

9º. Lugar:
Escondi-me na floresta
para ocultar minha dor
era tão rala e modesta
que ela veio e me encontrou.
Sonia Nogueira
Fortaleza/CE

10º. Lugar:
Qual o valor da floresta
Para a vida florescer
É ela que nos empresta
O ar puro para viver.
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

MENÇÕES ESPECIAIS (11º ao 15º lugares)

ÂMBITO:ESTADUAL

TEMA: FLORESTA (Trovas líricas ou filosóficas)

11º. Lugar:
Se o homem branco quisesse
ver no índio um bom retrato,
bastaria que ele desse
à floresta o mesmo trato.
Haroldo Lyra
Fortaleza/CE

12º. Lugar:
Sua a floresta nativa
Sou vida na mesma terra
Não procede essa evasiva
Da foice, o machado a serra.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/CE

13º. Lugar:
Na floresta do sertão
No calar da madrugada
Ouço o vento qual canção
E canto da passarada.
Léa Campelo Rêgo
Pentecoste/CE

14º. Lugar:
No meu país há floresta
Rica de canto de amor
Com vida, bom humor e festa,
Cheia de glória e esplendor.
Antônio Andrade
Maranguape/CE

15º. Lugar:
O planeta bem contente
Também faz as suas festas
Filtra bem o ar ambiente
Bem replantando as florestas
Maria Florinda Dos Santos Moreira
Fortaleza/CE

DESTAQUES (16º ao 20º lugares)

ÂMBITO: ESTADUAL

TEMA: FLORESTA (Trovas líricas ou filosóficas)

16º. Lugar:
Colocar nossa floresta
Nas regras da "Integração"
Faz a nossa vida em festa:
Viva a civilização!
Maria Florinda dos Santos Moreira
Fortaleza/CE

17º. Lugar:
A floresta se ressente
Das atitudes do homem.
Nosso futuro e o presente
Na agonia se consomem.
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

18º. Lugar:
Nos disse assim a floresta:
– Um dia vais me perder,
Com tua meta funesta
Não pode retroceder?
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

19º. Lugar:
Crimes contra a natureza
As previsões são funestas
Pois acaba com a riqueza
De nossas lindas florestas.
Alzenira Rodrigues
Morada Nova/CE

20º. Lugar:
Encontrei uma floresta
Somente para nós dois.
Vai ser mês de muita festa
O resto? Conto depois!
Olga Rosália Silva Pedrosa
UBT-Maranguape/CE

Âmbito Estadual:

Tema Macaquice


VENCEDORES (1º ao 5º lugares):

1º. Lugar:
É mentira de quem disse,
que descendo do macaco!
eu não faço macaquice,
nem mijo fora do caco.
Hortêncio Pessoa
Fortaleza/CE

2º. Lugar:
Chegou depressa à velhice
E o velho que foi discreto
Se desmancha em macaquice
Só para agradar o neto.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/ CE

3º. Lugar:
Macaquice vira manha
Para quem colhe o cajú
Se não pega na castanha
Ele quebra o mucumbú
Maria Florinda Dos Santos Moreira
Fortaleza/CE

4º. Lugar:
Um palhaço a gargalhar
Fez macaquice a valer
Que a calça veio a rasgar
Viu-se o que não se quer ver.
Cléa Campêlo
Pentecoste/ CE

5º. Lugar:
Macaquice só tem graça
Em circo ou mesa de bar
Um ébrio na rua ou praça
Cantando: eu quero mamar.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/ CE

ÂMBITO: ESTADUAL

TEMA: MACAQUICE(S) (Trovas humorísticas)

MENÇÕES HONROSAS (6º ao 10º lugares):

6º. Lugar:
Era um garoto travesso,
Um mestre na peraltice:
virava tudo ao avesso,
era o rei da macaquice.
Haroldo Lyra
Fortaleza/CE

7º. Lugar:
Macaquice é um bom tema
Se o bicho sogra vem nela,
Que esconde qualquer problema
Se for da família dela.
Deusdedit Rocha
Fortaleza/ CE

8º. Lugar:
Trepando pra tirar coco
E fazendo macaquice,
O vô não caiu por pouco:
Esqueceu-se da velhice.
Maria Florinda Dos Santos Moreira
Fortaleza/CE

9º. Lugar:
A macaquice do Zé
Ninguém olhava, nem ria
Gritou na ponta do pé
Pulava igual uma gia.
Ana Luiza
Pentecoste/ CE

10º. Lugar:
A menina Doralice
É safada pra danar
Fazia só macaquice
E depois ia chorar.
Léa Campêlo Rêgo
Pentecoste/ CE

MENÇÕES ESPECIAIS
(11º ao 15º lugares)

ÂMBITO: ESTADUAL

TEMA: MACAQUICE(S)
(Trovas humorísticas)

11º. Lugar:
Olha aqui, gritava o velho,
O povo olhava a velhice,
Desdentado mais zarelho,
Sorrindo. Que macaquice!
Sonia Nogueira
Fortaleza/CE

12º. Lugar:
O ébrio ao padre disse:
sem saber o que dizia,
“já vi muita macaquice
na porta da sacristia”.
Haroldo Lyra
Fortaleza/CE

13º. Lugar:
Tem humor os animais
Vejam quantas peraltices
O homem também é sagaz
Quando faz as macaquices
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

14º. Lugar:
Já vi tanta macaquice
Feita pela a tua boca.
Me acostumei com a mesmice,
Desta aparência louca.
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

15º. Lugar:
Tua macaquice faz
Estátua gargalhar,
Olhar de lado, pra atrás
Correr, pular, se sentar.
Luiz Carlos de Abreu Brandão.
Maranguape/CE

DESTAQUES - (16º ao 20º lugares)

ÂMBITO: - ESTADUAL

TEMA: MACAQUICE(S)
(Trovas humorísticas)

16º. Lugar:
O homem disse: benzedeira,
Nasci com esta gaguice,
Estrabismo e bebedeira
Cura minha macaquice
Sonia Nogueira
Fortaleza/CE

17º. Lugar:
Olhando a minha vizinha
Eu relembrei a meninice
Dançava mesmo sozinha.
Era a pior macaquice.
Ana Luiza
Pentecoste/CE

18º. Lugar:
Meninos em peraltices
Verdadeiras palhaçadas
Um avô com macaquices
Crianças dando risadas.
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

19º. Lugar:
O carnaval de outrora
Era muita macaquice
Mas na folia de agora
Só há brigas que burrice
Antônio Andrade
Maranguape/CE

20º. Lugar:
Que infernal macaquice
Na Justiça Federal,
Pois já furtaram a Eunice:
seu piso salarial.
Olga Rosália Silva Pedrosa
UBT-Maranguape/CE

VENCEDORES (1º ao 5º lugares)

ÂMBITO: MUNICIPAL

TEMA: SOL (Trovas líricas ou filosóficas)

1º. Lugar:
Nasce o sol de um novo dia
Pondo em tudo muita cor;
Trazendo mais poesia
Ao poeta sonhador.
João Osvaldo Soares (Vaval)
Maranguape/CE

2º. Lugar:
Fecha a cortina do dia
A noite acalenta o sol
A lua invejando espia
E faz das nuvens lençol.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/CE

3º. Lugar:
És como sol a brilhar
Mistério de meu calor
Fez meu corpo transpirar
Qual sereno sobre flor.
Olga Rosália Silva Pedrosa
UBT-Maranguape/CE

4º. Lugar:
Sol é estrela cadente
Do universo sideral
Aquece a vida da gente
Sem ele seria o mal.
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

5. Lugar:
Já que o Sol é para todos,
Carece também dizer
Que ele aquece até os “lodos”
Que teimam sobreviver.
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

MENÇÕES HONROSAS (6º ao 10º lugares)

ÂMBITO: MUNICIPAL

TEMA: SOL (Trovas líricas ou filosóficas)

6º. Lugar:
“Ver o sol nascer quadrado”
É um dito popular
Se por ti sou apaixonado
É sina, praga, sei lá!
Luiz Carlos de Abreu Brandão.
Maranguape/CE

7º. Lugar:
Abre a porteira do dia
O sol faz sua carreira
Esmorece a tarde esfria
Vai dormir a noite inteira.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/CE

8º. Lugar:
Quando o sol enfim se deita
Para um pouco repousar
Busca então a sua eleita
Que feliz vai lhe ninar.
João Osvaldo Soares
Maranguape/CE

9º. Lugar:
O sol é nosso astro rei
E a nós todos ilumina
Dele muita coisa eu sei
Além de ser luz divina.
Luciano Pereira
Maranguape/CE

10º. Lugar:
Sendo você, o meu sol
Nada tenho a reclamar
Sou um lírio no arrebol
Que nasceu para te amar.
Luiz Carlos de Abreu Brandão.
Maranguape/CE

MENÇÕES ESPECIAIS (11º ao 15º lugares)

ÂMBITO: MUNICIPAL

TEMA: SOL (Trovas líricas ou filosóficas)

11º. Lugar:
O sol brilha alegremente
Nas manhãs de primavera
Brilha meu sol docemente
Rosa – estrela bem sincera.
Antônio Andrade
Maranguape/CE

12º. Lugar:
O sol com sua magia
É subIime portador
E nos traz muita alegria
Com seu belo resplendor
Luciano Pereira
Maranguape/CE

13º. Lugar:
Para o Sol fiz um pedido:
Aquece-me todo dia,
E para o meu amor querido
Deixe-lhe paz e alegria.
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

14º. Lugar:
Nossa terra sem o sol:
Que mundo mais boreal.
A vida sairia do rol
Para a zona glacial.
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

15º. Lugar:
O Sol aquece minha alma
No frio do meu verão
Vem dizer-me bem na calma:
Dias melhores virão.
Lucia de Fátima Mapurunga Batista
UBT-Maranguape/CE

VENCEDORES (1º ao 5º lugares)

ÂMBITO: MUNICIPAL

TEMA: LOCUTOR (a, as, es)
(Trovas humorísticas)

1º. Lugar:
Locutor preocupado
Com o pedido insistente
Meyre tinha debandado
Quem fugiu? Foi bicho ou gente.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/CE

2º. Lugar:
Locutor com muita graça
Com voz melosa anunciou
Eu falo para os gays da praça,
Pois da classe também sou.
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

3º. Lugar:
O locutor já sabia
Que o microfone falhava.
E a mensagem se perdia
Se danava quem pagava.
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

4º. Lugar:
Eu possuí grande amigo
Um exímio trovador
Em segredo eu ti digo
Ele adora um locutor.
João Osvaldo Soares (Vaval)
Maranguape/CE

5º. Lugar:
Um locutor empolgado
Disse ao vivo o que não devia
Por pouco não foi linchado
Se salvou, na sacristia.
Luiz Carlos de Abreu Brandão.
Maranguape/CE

MENÇÕES HONROSAS
(6º ao 10º lugares)

ÂMBITO: MUNICIPAL

TEMA: LOCUTOR (a, as, es)
(Trovas humorísticas)

6º. Lugar:
Locutora apaixonada
Por alguém que não lhe quer
A pessoa desejada
Detesta o nome “mulher”.
Raimundo Rodrigues de Araújo
Maranguape/CE

7º. Lugar:
O locutor eloquente
Que pregava o fim do mundo
Claro que estava demente
Com um braseiro no fundo.
José Aureilson Cordeiro de Abreu
Maranguape/CE

8º. Lugar:
O locutor, Seu Augusto
Num morcego colidiu,
Então sofreu um grande susto:
Seu microfone engoliu.
Maria Ruth Bastos de Abreu Brandão
Maranguape/CE

9º. Lugar:
Caros ouvintes, bom dia!
Assim falou a locutora
Bem fanhosa que fazia
Tremer qualquer emissora.
Antônio Andrade
Maranguape/CE

10º. Lugar:
Locutor ou locutora
Fazem a comunicação
Cuidado na emissora
Com aquele palavrão...
Luiz Carlos de Abreu Brandão.
Maranguape/CE
---------------------
Mensagem do Presidente da UBT Maranguape

Poetas,

Segue no arquivo anexo as trovas vencedoras no VII Concurso de Trovas da UBT-MARANGUAPE, âmbitos Nacional/Internacional, estadual e municipal.

Nosso agradecimento aos poetas participantes do Concurso.

A UBT-MARANGUAPE está preparando os diplomas e os livros com as trovas para envio aos interessados.

Cada livro está orçado em R$ 15,00 (já incluido os custos do correio). Em cada livro constam as trovas vencedoras outras trovas classificadas.

No caso do livro com as trovas de âmbito Nacional/Internacional constam 20 trovas premiadas, mais 109 trovas classificadas e as participações especiais de trovadores cearenses. Nos âmbitos estadual e municipal constam as trovas premiadas e as participações especiais selecionadas pelos julgadores.

O interessados em receber o livro devem efetuar depósito na conta corrente abaixo indicada, informando por e-mail o nome completo, data e valor do depósito, a fim de que a UBT-MARANGUAPE possa providenciar a remessa dos livros, que deve ocorrer no mês de outubro/2011.

As trovas vencedoras estão no Orkut, comunidade Maranguape, fórum Trovas - Maranguape, onde cada trovador poderá fazer comentários. Ainda postaremos as trovas classificadas e participação especial.

Abraços.

Moreira Lopes

Presidente da UBT-MARANGUAPE


Fonte:
Moreira Lopes. Presidente da UBT Maranguape

Machado de Assis (O Alienista) III – Deus sabe o que faz; IV – Uma teoria nova


CAPÍTULO III - DEUS SABE O QUE FAZ

Ilustre dama, no fim de dois meses, achou-se a mais desgraçada das mulheres: caiu em profunda melancolia, ficou amarela, magra, comia pouco e suspirava a cada canto. Não ousava fazer-lhe nenhuma queixa ou reproche, porque respeitava nele o seu marido e senhor, mas padecia calada, e definhava a olhos vistos. Um dia, ao jantar, como lhe perguntasse o marido o que é que tinha, respondeu tristemente que nada; depois atreveu-se um pouco, e foi ao ponto de dizer que se considerava tão viúva como dantes. E acrescentou:

—Quem diria nunca que meia dúzia de lunáticos...

Não acabou a frase; ou antes, acabou-a levantando os olhos ao teto,—os olhos, que eram a sua feição mais insinuante,— negros, grandes, lavados de uma luz úmida, como os da aurora. Quanto ao gesto, era o mesmo que empregara no dia em que Simão Bacamarte a pediu em casamento. Não dizem as crônicas se D. Evarista brandiu aquela arma com o perverso intuito de degolar de uma vez a ciência, ou, pelo menos, decepar-lhe as mãos; mas a conjetura é verossímil. Em todo caso, o alienista não lhe atribuiu intenção. E não se irritou o grande homem, não ficou sequer consternado. O metal de seus olhos não deixou de ser o mesmo metal, duro, liso, eterno, nem a menor prega veio quebrar a superfície da fronte quieta como a água de Botafogo. Talvez um sorriso lhe descerrou os lábios, por entre os quais filtrou esta palavra macia como o óleo do Cântico:

—Consinto que vás dar um passeio ao Rio de Janeiro.

D. Evarista sentiu faltar-lhe o chão debaixo dos pés. Nunca dos nuncas vira o Rio de Janeiro, que posto não fosse sequer uma pálida sombra do que hoje é, todavia era alguma coisa mais do que Itaguaí, Ver o Rio de Janeiro, para ela, equivalia ao sonho do hebreu cativo. Agora, principalmente, que o marido assentara de vez naquela povoação interior, agora é que ela perdera as últimas esperanças de respirar os ares da nossa boa cidade; e justamente agora é que ele a convidava a realizar os seus desejos de menina e moça. D. Evarista não pôde dissimular o gosto de semelhante proposta. Simão Bacamarte pagou-lhe na mão e sorriu,—um sorriso tanto ou quanto filosófico, além de conjugal, em que parecia traduzir-se este pensamento: — "Não há remédio certo para as dores da alma; esta senhora definha, porque lhe parece que a não amo; dou-lhe o Rio de Janeiro, e consola-se". E porque era homem estudioso tomou nota da observação.

Mas um dardo atravessou o coração de D. Evarista. Conteve-se, entretanto; limitou-se a dizer ao marido que, se ele não ia, ela não iria também, porque não havia de meter-se sozinha pelas estradas.

—Irá com sua tia, redargüiu o alienista.

Note-se que D. Evarista tinha pensado nisso mesmo; mas não quisera pedi-lo nem insinuá-lo, em primeiro lugar porque seria impor grandes despesas ao marido, em segundo lugar porque era melhor, mais metódico e racional que a proposta viesse dele.

—Oh! mas o dinheiro que será preciso gastar! suspirou D. Evarista sem convicção.

—Que importa? Temos ganho muito, disse o marido. Ainda ontem o escriturário prestou-me contas. Queres ver?

E levou-a aos livros. D. Evarista ficou deslumbrada. Era uma via-láctea de algarismos. E depois levou-a às arcas, onde estava o dinheiro.

Deus! eram montes de ouro, eram mil cruzados sobre mil cruzados, dobrões sobre dobrões; era a opulência.

Enquanto ela comia o ouro com os seus olhos negros, o alienista fitava-a, e dizia-lhe ao ouvido com a mais pérfida das alusões:

—Quem diria que meia dúzia de lunáticos...

D. Evarista compreendeu, sorriu e respondeu com muita resignação:

—Deus sabe o que faz!

Três meses depois efetuava-se a jornada. D. Evarista, a tia, a mulher do boticário, um sobrinho deste, um padre que o alienista conhecera em Lisboa, e que de aventura achava-se em Itaguaí cinco ou seis pajens, quatro mucamas, tal foi a comitiva que a população viu dali sair em certa manhã do mês de maio. As despedidas foram tristes para todos, menos para o alienista. Conquanto as lágrimas de D. Evarista fossem abundantes e sinceras, não chegaram a abalá-lo. Homem de ciência, e só de ciência, nada o consternava fora da ciência; e se alguma coisa o preocupava naquela ocasião, se ele deixava correr pela multidão um olhar inquieto e policial, não era outra coisa mais do que a idéia de que algum demente podia achar-se ali misturado com a gente de juízo.

—Adeus! soluçaram enfim as damas e o boticário.

E partiu a comitiva. Crispim Soares, ao tornar a casa, trazia os olhos entre as duas orelhas da besta ruana em que vinha montado; Simão Bacamarte alongava os seus pelo horizonte adiante, deixando ao cavalo a responsabilidade do regresso. Imagem vivaz do gênio e do vulgo! Um fita o presente, com todas as suas lágrimas e saudades, outro devassa o futuro com todas as suas auroras.

CAPÍTULO IV - UMA TEORIA NOVA

Ao passo que D. Evarista, em lágrimas, vinha buscando o 1 [Rio de Janeiro, Simão Bacamarte estudava por todos os lados uma certa idéia arrojada e nova, própria a alargar as bases da psicologia. Todo o tempo que lhe sobrava dos cuidados da Casa Verde, era pouco para andar na rua, ou de casa em casa, conversando as gentes, sobre trinta mil assuntos, e virgulando as falas de um olhar que metia medo aos mais heróicos.

Um dia de manhã,—eram passadas três semanas,—estando Crispim Soares ocupado em temperar um medicamento, vieram dizer-lhe que o alienista o mandava chamar.

—Trata-se de negócio importante, segundo ele me disse, acrescentou o portador.

Crispim empalideceu. Que negócio importante podia ser, se não alguma notícia da comitiva, e especialmente da mulher? Porque este tópico deve ficar claramente definido, visto insistirem nele os cronistas; Crispim amava a mulher, e, desde trinta anos, nunca estiveram separados um só dia. Assim se explicam os monólogos que ele fazia agora, e que os fâmulos lhe ouviam muita vez:—"Anda, bem feito, quem te mandou consentir na viagem de Cesária? Bajulador, torpe bajulador! Só para adular ao Dr. Bacamarte. Pois agora agüenta-te; anda, agüenta-te, alma de lacaio, fracalhão, vil, miserável. Dizes amem a tudo, não é? aí tens o lucro, biltre!"—E muitos outros nomes feios, que um homem não deve dizer aos outros, quanto mais a si mesmo. Daqui a imaginar o efeito do recado é um nada. Tão depressa ele o recebeu como abriu mão das drogas e voou à Casa Verde.

Simão Bacamarte recebeu-o com a alegria própria de um sábio, uma alegria abotoada de circunspeção até o pescoço.

—Estou muito contente, disse ele.

—Notícias do nosso povo? perguntou o boticário com a voz trêmula.

O alienista fez um gesto magnífico, e respondeu:

—Trata-se de coisa mais alta, trata-se de uma experiência científica. Digo experiência, porque não me atrevo a assegurar desde já a minha idéia; nem a ciência é outra coisa, Sr. Soares, senão uma investigação constante. Trata-se, pois, de uma experiência, mas uma experiência que vai mudar a face da Terra. A loucura, objeto dos meus estudos, era até agora uma ilha perdida no oceano da razão; começo a suspeitar que é um continente.

Disse isto, e calou-se, para ruminar o pasmo do boticário. Depois explicou compridamente a sua idéia. No conceito dele a insânia abrangia uma vasta superfície de cérebros; e desenvolveu isto com grande cópia de raciocínios, de textos, de exemplos. Os exemplos achou-os na história e em Itaguaí mas, como um raro espírito que era, reconheceu o perigo de citar todos os casos de Itaguaí e refugiou-se na história. Assim, apontou com especialidade alguns personagens célebres, Sócrates, que tinha um demônio familiar, Pascal, que via um abismo à esquerda, Maomé, Caracala, Domiciano, Calígula, etc., uma enfiada de casos e pessoas, em que de mistura vinham entidades odiosas, e entidades ridículas. E porque o boticário se admirasse de uma tal promiscuidade, o alienista disse-lhe que era tudo a mesma coisa, e até acrescentou sentenciosamente:

—A ferocidade, Sr. Soares, é o grotesco a sério.

—Gracioso, muito gracioso! exclamou Crispim Soares levantando as mãos ao céu.

Quanto à idéia de ampliar 0 território da loucura, achou-a 0 boticário extravagante; mas a modéstia, principal adorno de seu espírito, não lhe sofreu confessar outra coisa além de um nobre entusiasmo; declarou-a sublime e verdadeira, e acrescentou que era "caso de matraca". Esta expressão não tem equivalente no estilo moderno. Naquele tempo, Itaguaí que como as demais vilas, arraiais e povoações da colônia, não dispunha de imprensa, tinha dois modos de divulgar uma notícia; ou por meio de cartazes manuscritos e pregados na porta da Câmara, e da matriz;—ou por meio de matraca.

Eis em que consistia este segundo uso. Contratava-se um homem, por um ou mais dias, para andar as ruas do povoado, com uma matraca na mão.

De quando em quando tocava a matraca, reunia-se gente, e ele anunciava o que lhe incumbiam,—um remédio para sezões, umas terras lavradias, um soneto, um donativo eclesiástico, a melhor tesoura da vila, o mais belo discurso do ano, etc. O sistema tinha inconvenientes para a paz pública; mas era conservado pela grande energia de divulgação que possuía. Por exemplo, um dos vereadores,—aquele justamente que mais se opusera à criação da Casa Verde,—desfrutava a reputação de perfeito educador de cobras e macacos, e aliás nunca domesticara um só desses bichos; mas, tinha o cuidado de fazer trabalhar a matraca todos os meses. E dizem as crônicas que algumas pessoas afirmavam ter visto cascavéis dançando no peito do vereador; afirmação perfeitamente falsa, mas só devida à absoluta confiança no sistema. Verdade, verdade, nem todas as instituições do antigo regímen mereciam o desprezo do nosso século.

—Há melhor do que anunciar a minha idéia, é praticá-la, respondeu o alienista à insinuação do boticário.

E o boticário, não divergindo sensivelmente deste modo de ver, disse-lhe que sim, que era melhor começar pela execução.

—Sempre haverá tempo de a dar à matraca, concluiu ele.

Simão Bacamarte refletiu ainda um instante, e disse:

—Suponho o espírito humano uma vasta concha, o meu fim, Sr. Soares, é ver se posso extrair a pérola, que é a razão; por outros termos, demarquemos definitivamente os limites da razão e da loucura. A razão é o perfeito equilíbrio de todas as faculdades; fora daí insânia, insânia e só insânia.

O Vigário Lopes a quem ele confiou a nova teoria, declarou lisamente que não chegava a entendê-la, que era uma obra absurda, e, se não era absurda, era de tal modo colossal que não merecia princípio de execução.

—Com a definição atual, que é a de todos os tempos, acrescentou, a loucura e a razão estão perfeitamente delimitadas. Sabe-se onde uma acaba e onde a outra começa. Para que transpor a cerca?

Sobre o lábio fino e discreto do alienista rogou a vaga sombra de uma intenção de riso, em que o desdém vinha casado à comiseração; mas nenhuma palavra saiu de suas egrégias entranhas.

A ciência contentou-se em estender a mão à teologia, — com tal segurança, que a teologia não soube enfim se devia crer em si ou na outra. Itaguaí e o universo ficavam à beira de uma revolução.
–––––––––––––
continua… Capitulo V – O terror ; Capítulo VI – A rebelião
––––––––––––-
Fonte:
ASSIS, Machado de. O Alienista.