domingo, 1 de setembro de 2024

Vereda da Poesia = 100 =


Trova de São Paulo/SP

DOMITILLA BORGES BELTRAME

Numa página, a saudade;
no verso – não tem escolha –
quase sempre a mocidade
faz parte da mesma folha!...
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Poema da Bahia

CASTRO ALVES
Freguesia de Muritiba (hoje, Castro Alves)/BA, 1847 – 1871, Salvador/BA

O crepúsculo sertanejo

A tarde morria! Nas águas barrentas
As sombras das margens deitavam-se longas;
Na esguia atalaia das árvores secas
Ouvia-se um triste chorar de arapongas.

A tarde morria! Dos ramos, das lascas,
Das pedras, do líquen, das heras, dos cardos,
As trevas rasteiras com o ventre por terra
Saíam, quais negros, cruéis leopardos.

A tarde morria! Mais funda nas águas
Lavava-se a galha do escuro ingazeiro...
Ao fresco arrepio dos ventos cortantes
Em músico estalo rangia o coqueiro.

Sussurro profundo! Marulho gigante!
Talvez um — silêncio!... Talvez uma — orquestra...
Da folha, do cálix, das asas, do inseto...
Do átomo — à estrela... do verme — à floresta!...

As garças metiam o bico vermelho
Por baixo das asas, — da brisa ao açoite —;
E a terra na vaga de azul do infinito
Cobria a cabeça co'as penas da noite!

Somente por vezes, dos jungles* das bordas
Dos golfos enormes, daquela paragem,
Erguia a cabeça surpreso, inquieto,
Coberto de limos — um touro selvagem.

Então as marrecas, em torno boiando,
O voo encurvavam medrosas, à toa...
E o tímido bando pedindo outras praias
Passava gritando por sobre a canoa!…
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* jungles = selvas
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Trova de Miguel Couto/RJ

EDMAR JAPIASSÚ MAIA

A despedida foi breve
e o nosso adeus sem afrontas...
Mas a saudade se atreve
a vir cobrar velhas contas! 
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Soneto de Magé/RJ

BENEDITA AZEVEDO

Minha lira

Minha lira interior vibrando ao te encontrar,
Levando-me de volta a dias tão distantes,
Naquele nosso encontro, e a mim sempre garantes
Que foi somente o acaso ali sob o luar...

Que nos levou também ao céu naquele abraço,
ao contar as  estrelas em  todo  esplendor
de uma noite suave  e cheia de sabor...
Nós dois ali sentados perto do terraço.

Mamãe a nos olhar vai chegando à janela,
convida-me a  entrar, é hora de dormir
cordialmente  vais sem  nem se despedir.

Canta meu coração, tal qual naqueles dias,
Ao entrar em meu quarto, enquanto tu partias...
Mas, hoje, meu amor, só eu vou decidir.
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Trova Premiada em Brumadinho/MG, 2004

JOSAFÁ SOBREIRA DA SILVA 
Rio de Janeiro/RJ

Nas cordas do coração,
em sonhos, dedilho, triste,
estilhaços da canção
que rasguei, quando partiste...
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Poema de Itararé/SP

SILAS CORRÊA LEITE

Família

minha mãe fritava polenta
e convidava a aurora para o banquete

Clarice tinha tranças bonitas
e uma voz de santa

Sueli era uma janela fechada
esperando um príncipe encantado

Erzita era a "irmãe" mais velha
guardiã dos sonhos de nós todos

Paulo e eu brigávamos muito
e tínhamos o destino da luta

(Célio sequer existia ainda
para ser nosso referencial futuro)

Depois meu pai vendeu a casa
Morreu 

virou saudade e nos deixou Célio Ely
de herança

E minha mãe com sua voz de clarinete
ainda alonga orações por nossos sonhos.
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Trova Popular

Quando eu te vi, logo disse:
lindos olhos para amar,
linda boca para os beijos
se a menina os quiser dar.
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Soneto de de São Paulo/SP

JB XAVIER
José Xavier Borges Junior

O Livro que não leste

De quais ignotos mundos transcendeste,
Para perder-te assim em meu passado?
E ao te perder perdi meu sonho amado...
A quais ignaros mundos pertenceste?

Por que à ignávia* lassidão cedeste?
E por que teu amor tens abrandado
Se por ti eu teria abandonado
De novo toda a vida que me deste?

Em quais ignóbeis mundos te perdeste
Vagando assim ao léu desencantado,
Que ao ferir-me sequer te apercebeste?

Eu sou a sinfonia que fizeste,
E o amor que te dedico, abnegado
É o livro da tua vida, que não leste!
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* ignávia = covarde, indolente.
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Trova de Felgueiras/Portugal

ARLINDO BRITO

És rainha. És soberana.
Porque só, por teu anelo,
a nossa humilde choupana
tem nobreza dum castelo.
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Poema de Itajaí/SC

VIVALDO TERRES

Ao encontrar-te

Ao encontrar-te na rua.
Maltrapilha, quase nua,
Implorando pedaço de pão,
Quem te conheceu não sabe,
Que fostes qual majestade
Morando numa mansão.

Tratavas teus serviçais
Como se fossem animais,
Sem amor ou compostura.
Hoje estás abandonada,
Passas as noites na calçada,
Como mendiga de rua.

Quantas noites recebestes
Esmola e compreensão
Dos mesmos que maltratavas
E arrogante, gritavas:
Vão trabalhar malandrões!

Os mesmos, indignados,
Mas pobres e necessitados.
Fingiam não te escutar
Pois eram gente honesta
Precisavam do trabalho
Pra seus filhos sustentar.

E tu, com arrogância,
Não pensavas que ferias
a alma e o coração
Daqueles que trabalhavam,
Cujo suor derramavam
Para ganharem seu pão..

Hoje vives abandonada,..
Cansada, desmemoriada,
Talvez sintas dor profunda.
Tua casa é a marquise,
Tua cama é a calçada,
Pois és mendiga de rua. 
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Quando a vida se distrai
ou dá tudo ou tudo nega;
Rico, pega o carro e sai...
pobre sai – e o carro pega!
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Soneto de de Mogi-Guaçu/SP

OLIVALDO JÚNIOR

O segredo de um tesouro

“Um bom amigo, que nos aponta os erros e as imperfeições e reprova o mal, deve ser respeitado como se nos tivesse revelado o segredo de um oculto tesouro.” 
(Sidarta Gautama - BUDA) 

O segredo de um tesouro 
não está no que se tem, 
mas no que nos vale ouro: 
ser a luz irmã de alguém. 

Toda luz é mais que o louro 
das vitórias de um 'ninguém', 
um senhor que tira o couro 
dos irmãos e o seu também. 

Vem cansado e sem abrigo 
este irmão aqui presente, 
sem a luz que mais persigo... 

Um tesouro é um bom amigo, 
um irmão que o faz contente, 
bem cantante, vento ao trigo!…
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Trova de Ponta Grossa/PR

SÔNIA MARIA DITZEL MARTELO
1943 – 2016

Nos mistérios deste outono,
as folhas caindo ao chão,
tecem colchas de abandono
que envolvem minha ilusão! 
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Poema do Rio de Janeiro/RJ

VINÍCIUS DE MORAES
1913 – 1980

A carta que não foi mandada

Paris, outono de 73
Estou no nosso bar mais uma vez
E escrevo pra dizer
Que é a mesma taça e a mesma luz
Brilhando no champanhe em vários tons azuis
No espelho em frente eu sou mais um freguês
Um homem que já foi feliz, talvez
E vejo que em seu rosto correm lágrimas de dor
Saudades, certamente, de algum grande amor

Mas ao vê-lo assim tão triste e só
Sou eu que estou chorando
Lágrimas iguais
E, a vida é assim, o tempo passa
E fica relembrando
Canções do amor demais
Sim, será mais um, mais um qualquer
Que vem de vez em quando
E olha para trás
É, existe sempre uma mulher
Pra se ficar pensando
Nem sei... nem lembro mais
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Trova Humorística de Nova Friburgo/RJ

SÉRGIO BERNARDO

Celular eu não tolero
desde um pré-pago que eu tinha,
que tocou “Mamãe eu quero...”
no velório da vizinha!
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ 

HERMES FONTES
Buquim/SE, 1888 – 1930, Rio de Janeiro/RJ

Luar 
(em Gênese)

Noite ou dia?! Ilusão... É noite. A Natureza
tem um pudor de noiva, ao beijo do noivado:
sonha, velada por um véu diáfano, e presa
de um sonho branco, um sonho alegre, iluminado.

A Lua entra por toda a parte, clara, acesa...
Desabrocham jasmins de luz, de lado a lado...
E o luar – vê bem: dirás que é o óleo da Tristeza
diluído pelo céu... pela terra entornado...

E há nos raios da Lua – a um tempo, hastis e lanças,
corações a sangrar feridos do infortúnio,
flores sentimentais do jardim das lembranças...

A ave do Sentimento as asas bate e espalma...
e, enquanto se abre aos céus a flor do Plenilúnio,
abre-se, dentro em nós, o plenilúnio da Alma...
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Trova Premiada em Brumadinho/MG, 2004

ÉLBEA PRISCILA DE SOUZA E SILVA 
Piquete/SP, 1942 – 2023, Caçapava/SP

Fracasso não me intimida,
bom ator, sou pertinaz,
repiso o palco da vida
com novo sonho em cartaz...
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Poema do Maranhão

GONÇALVES DIAS
Caxias, 1823 – 1864, Guimarães

Canção do exílio

Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas tem mais flores,
Nossos bosques tem mais vida,
Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o sabiá.

Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

VASCO DE CASTRO LIMA 
(1905-2004)

Embora vivas cantando,
canário, tens vida triste:
- já vi lágrimas pingando
nessa vasilha de alpiste!
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Grinalda de Trovas de São Paulo/SP

FILEMON MARTINS

Mulher

Segue uma estrada florida
quem, na verdade, tiver
a glória de ter, na vida,
um coração de mulher!
Filemon Martins

Quero seguir meu destino
com minha cabeça erguida,
quem ama o bem, imagino,
segue uma estrada florida.

Segue uma estrada florida,
quem é da paz e requer
a esperança protegida,
quem, na verdade, tiver.

Quem, na verdade, tiver
uma paixão desmedida,
felicidade é mister
a glória de ter, na vida.

A glória de ter, na vida,
um amor minha alma quer,
numa paixão incontida
um coração de mulher!
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Trova da Princesa dos Trovadores

CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Quando a penumbra descia,
a nossa emoção vibrava,
sonhando o que não dizia,
dizendo o que nem sonhava!...
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Hino de Itaboraí/RJ

Pedra Bonita, 
foi assim que te chamaram
Certa vez em Guarani
Terra bendita, 
é assim que hoje 
te chamo minha Itaboraí

Tens uma porta aberta para o mar
És a janela do nosso país
Quem vem de longe aprende a te amar
Quem nasce aqui é a tua raíz

Com a argila do teu solo
O calor do teu colo
E o suor do teu povo

Vamos seguir com firmeza
E ajudar com certeza
A construir um mundo novo

És um eterno poema
Que tem como tema a felicidade
Escrito pelo criador, 
que te transformou nesta bela cidade (Bis)

Teus laranjais, 
teus imortais
A tua história é um hino de amor
És a própria paz, 
porque sempre estás 
nas mãos de nosso senhor (Bis)

Itaboraí, Itaboraí!
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Trova de São Mateus do Sul/PR

GERSON CESAR SOUZA

Num show que bem poucos olham,
no palco das noites calmas,
chuvas de estrelas não molham,
mas lavam as nossas almas...
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Soneto de Vitória/ES

BERNARDO TRANCOSO

Ser feliz

Vida é viver, é ser alguém, é ser ninguém,
Quando quiser; é não mentir, sempre sorrir,
Morrer de rir, quando puder; é querer bem,
Homem, mulher, um ser qualquer, sem resistir;

Não desistir, nunca chorar, só quando tem
Alguém pra ouvir; sonhar, lutar, prá descobrir
O que é amar, o que é sentir; saber também
Que é grande o amor, elevador, sempre a subir;

Crescer, ter fé, firmar o pé, pisar no chão
E caminhar; Andar e crer, buscar, querer,
Na imensidão, o teu lugar; ter mente exposta

E, a quem te gosta, essa canção, teu coração;
Responder "não", pra quem te diz: "Ser ou não ser:
Eis a questão"; pois SER FELIZ: eis a resposta.
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Trova de Bauru/SP

ANTONIO VALENTIM RUFATTO

Se há pedras na encruzilhada
do sucesso que procuras,
faze delas uma escada
para galgar as alturas.
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O passarinheiro, o açor* e a cotovia

A injustiça, o rigor desculpam-se em geral
Citando como exemplo a quantos fazem mal,
Ninguém deve esquecer a regra tão cediça:
«Respeite sempre os mais quem atenções cobiça».

Certo dia um campónio armava aos passarinhos —
Vem despontando abril, estão já sós os ninhos,
A grande natureza há muito que não dorme,
O campo todo em flor ostenta um luxo enorme,

Imprime vibrações no ambiente perfumado,
O constante esvoaçar do inquieto mundo alado —
E o homem de atalaia...
De repente sorri dizendo: — «Talvez caia!»

— Cair o quê? Não sei — objeta-me o leitor.
Era uma cotovia. A tola, a sensabor
Dispunha-se a trocar a boa liberdade
Pela rede traiçoeira, e até, que ingenuidade!

Vinha cantando alegre a procurar a morte:
Ou se é, ou não se é forte.
Neste ponto um açor, que andava pelos ares,
Faminto, peneirando em voltas circulares,

Avista a pobrezinha e rápido qual seta
Silvando fende o espaço em breve linha reta,
Cai sobre a cotovia, empolga-a rudemente,
Aperta-a, despedaça-a em fúria recrescente.

Que bárbaro glutão!
Viu tudo o caçador e resolveu-se então
A puxar o cordel da pérfida armadilha,
Que ao distraído açor enreda, envolve e pilha.

Colhido de improviso o bicho quer soltar-se,
Mas logo dissuadido, usando de disfarce,
Murmura em voz mui doce:
«Meu caro caçador, sem dúvida enganou-se,

Podia lá prender-me! Eu nunca lhe fiz mal!...»
Replica-lhe o campónio: «E o pobre do animal
Que aí tens, fez-te algum? Não me responderás?»
O açor quis responder, porém não foi capaz.
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* Açor = ave de rapina, semelhante ao falcão.

Concurso Nacional Literário Ottília Amatto Mendes Castro, de Contos (Prazo: 30 de setembro)

Realização: Academia Valeparaibana de Letras e Artes

REGULAMENTO

OTTÍLIA AMATTO MENDES CASTRO foi acadêmica titular da AVLA, delegada cultural representando Guaratinguetá-SP, autora de diversas obras literárias e peças teatrais, além de autora de composições musicais. Realizou diversos eventos culturais na cidade de Guaratinguetá-SP.

O gênero textual escolhido para o certame de 2024 é CONTO.

1 - DO OBJETO

1.1. O presente Concurso tem por finalidade o estímulo e a valorização da produção literária nacional, selecionando e premiando CONTOS, em temática livre.

1.2. Classifica-se como CONTO uma obra de ficção que cria um universo de seres, de fantasia ou acontecimentos. Como todos os textos de ficção, o conto apresenta um narrador, personagens, ponto de vista e enredo. Classicamente, diz-se que o conto se define pela sua pequena extensão, mais curto que a novela ou o romance. O Conto tem uma estrutura fechada, desenvolve uma história e tem apenas um clímax. O Conto é conciso.

2 - DAS CONDIÇÕES GERAIS DE PARTICIPAÇÃO

2.1. O Concurso destina-se a contistas, não sendo exigido ineditismo ou exclusividade.

2.2. Cada autor poderá concorrer com apenas um conto.

2.3. O texto deve ser escrito em português.

2.4. Os participantes do Concurso deverão ser maiores de 18 anos na data de encerramento das inscrições.

2.5 . Membros titulares ou correspondentes da Academia Valeparaibana de Letras e Artes-AVLA não poderão participar do presente Concurso.

3 - DA DIVULGAÇÃO

3.1. A divulgação e demais informações acerca deste concurso serão veiculadas por meio da página do Instagram da AVLA(@academiavaleparaibanaavla). Os interessados deverão acessar o regulamento no referido veículo bem como as demais publicações a fim de tomar ciência dos comunicados com referência ao presente certame.

4 - DAS INSCRIÇÕES

4.1. As inscrições serão realizadas exclusivamente pelo e-mail da Academia Valeparaibana de Letras e Artes - academiavaleparaibana@gmail.com - do dia 1. de agosto de 2024 a 30 de setembro de 2024.

4.2. As propostas recebidas após o prazo estabelecido no subitem 4.1 não serão consideradas para julgamento.

4.3. A revisão do texto é de responsabilidade de seu escritor.

4.4. A inscrição no concurso é gratuita.

4.5. A AVLA tem direito de expor os textos vencedores nas suas redes sociais e em variações impressas.

4.6. A AVLA tem o direito de modificar aspectos visuais da formatação do texto de forma que este se enquadre nos padrões editoriais da comunidade.

4.7. Excetuadas as disposições dos itens 4.5 e 4.6 desta seção, o autor permanece detentor de todos os direitos autorais sobre seus textos.

4.8. Os vencedores do Concurso serão anunciados nas páginas das redes sociais da AVLA e comunicados individualmente.

4.9. As obras enviadas pelos concorrentes obrigatoriamente deverão estar adequadas ao regulamento e não possuir conteúdos que:

I) Contenham dados ou informações que constituam ou possam constituir crime ou contravenção penal, ou possam ser entendidos como incitação à prática de crimes ou contravenções penais;

II) constituam ofensa à liberdade de crença e às religiões.

III) contenham dados ou informações racistas ou discriminatórias.

IV) contenham indícios claros de uso de inteligência artificial ou plágio.

4.10. O texto deverá ser enviado seguindo as seguintes orientações:

I) Cada conto deverá ter até 5 (cinco) páginas, em folhas tamanho A4, orientação vertical, Fonte Times New Roman ou Arial, Tamanho 12, espaçamento padrão;

II) O texto do conto deverá ser encabeçado pelo título;

III) Os textos não podem indicar o nome do autor, ou pseudônimo ou fazer qualquer menção ou conter qualquer sinal que permita identificar o seu autor.

IV) O conto deverá ser salvo em arquivo formato PDF, com o nome do arquivo sendo apenas o título do conto.

4.11. Para a inscrição devem ser enviados DOIS ARQUIVOS convertidos em PDF, a saber:

I- um arquivo contendo o nome, CPF, endereço completo, telefones e e-mail de contato e o título do CONTO inscrito. O nome do Arquivo deve ser o nome do autor.

II – um arquivo contendo apenas o título e o texto do conto (sem nome, pseudônimo ou quaisquer marcas que identifiquem o autor). |O nome do arquivo deve ser o título do Conto.

4.12. A inobservância de qualquer dos requisitos ou documentos exigidos por este regulamento implica a automática desclassificação do texto do candidato.

5 - DA COMISSÃO JULGADORA

5.1 Os Contos inscritos serão avaliados por uma comissão designada pela diretoria da AVLA, cujas decisões são irrecorríveis. Ao final do Concurso, serão divulgados os nomes dos julgadores.

6 - DO JULGAMENTO

6.1. Os contos serão selecionados e classificados pela comissão julgadora, que escolherá os 10 (dez) melhores contos, classificando-os como finalistas, segundo os critérios estabelecidos neste regulamento.

6.2. Receberão premiação em dinheiro os classificados em primeiro, segundo e terceiro lugares, conforme cláusula sétima do presente regulamento. Os trabalhos classificados em quatro a décimo lugares receberão Menção Honrosa.

6.3. Obedecendo aos critérios definidos neste regulamento, a comissão apreciará cada proposta de conto e avaliará, entre outros critérios, aqueles inerentes à:

I) Qualidade Literária: atributos estéticos que configurem a excelência dos elementos constitutivos da obra.

II) Criatividade e Originalidade: utilização singular na escolha da temática, concepção e organização literária.

III) Rigor Técnico: domínio das técnicas de escrita.

IV) Coerência de linguagem: escolha e adequação dos elementos constitutivos da obra em consonância com a categoria definida para este Concurso.

7 - DA PREMIAÇÃO

7.1. Será conferida aos primeiros colocados premiação conforme segue:

I) o primeiro colocado receberá premiação no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais);
II) o segundo colocado receberá premiação no valor de R$ 300,00 (trezentos reais);
III) o terceiro colocado receberá premiação no valor de R$ 200,00 (duzentos reais).

7.2. Os dez primeiros colocados receberão a premiação em cerimônia oficial, em data a ser oportunamente definida.

7.3. Na impossibilidade de um encontro presencial na data programada, por qualquer motivo, a AVLA informará a todos os vencedores como se dará a premiação.

7.4. No caso do não comparecimento de qualquer dos autores no evento de premiação, o respectivo prêmio poderá ser enviado via digital, se Menção Honrosa, e em depósito em conta corrente bancária (se aplicável).

8 - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

8.1. A participação no concurso importa total concordância com os termos deste regulamento, tanto por parte dos competidores, quanto da comissão julgadora, renunciando os participantes a quaisquer outros direitos eventualmente invocados.

8.2. Os casos omissos a esse regulamento serão analisados e solucionados pela diretoria da AVLA.

8.3. Informações adicionais podem ser obtidas pelo e-mail academiavaleparaibana@gmail.com ou pela página no Instagram @academiavaleparaibanaavla.

Fonte: 

Recordando Velhas Canções (Apanhei-te cavaquinho)


(Polca, 1915)

Compositores: Ernesto Nazareth e Ubaldo Mangione

Ainda me lembro,
Do meu tempo de criança,
Quando entrava numa dança,
Toda cheia de esperança,
De chinelinho e de trança,
Com Mané e o Zé da França,
Nunca tive na lembrança,
De rever esse chorinho.

E hoje ouvindo,
Neste choro a voz do pinho,
Relembrando o bom tempinho,
Da mamãe e do maninho,
Hoje sou ave sem ninho,
Sem família, sem carinho,
Mas sou bem feliz ouvindo,
O "Apanhei-te Cavaquinho"!

Hoje cantando o "Apanhei-te Cavaquinho",
Fico louca, fico quente,
Fico como um passarinho,
Sinto vontade de cantar a vida inteira,
Esta vida, eu levo de qualquer maneira,
Ouvindo a flauta, o cavaquinho e o violão,
Eu sinto que o meu coração,
Tem a cadência de um pandeiro,
Esqueço tudo e vou cantando com jeitinho,
Este chorinho,
Que é muito Brasileiro !

Hoje cantando o "Apanhei-te Cavaquinho",
Fico louca, fico quente,
Fico como um passarinho,
Sinto vontade de cantar a vida inteira,
Esta vida, eu levo de qualquer maneira,
Ouvindo a flauta, o cavaquinho e o violão,
Eu sinto que o meu coração,
Tem a cadência de um pandeiro,
Esqueço tudo e vou cantando com jeitinho,
Este chorinho,
Que é muito Brasileiro !...
(bis a 1ª e 2ª)
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

A Nostalgia e a Alegria do Chorinho em 'Apanhei-te Cavaquinho'
A música 'Apanhei-te Cavaquinho', é uma celebração nostálgica e alegre do chorinho, um gênero musical tipicamente brasileiro. A letra remete às memórias de infância da narradora, que se recorda com carinho dos tempos em que dançava cheia de esperança, com chinelinho e trança, ao som do chorinho. Essas lembranças são evocadas com uma mistura de saudade e alegria, destacando a simplicidade e a felicidade dos momentos passados com a família e amigos.

No presente, a narradora se encontra sem família e sem carinho, mas encontra consolo e felicidade ao ouvir e cantar o chorinho 'Apanhei-te Cavaquinho'. A música se torna um refúgio, uma forma de reviver os bons tempos e de sentir-se viva e feliz novamente. A letra expressa como a música tem o poder de transformar o estado emocional da narradora, fazendo-a sentir-se como um passarinho, livre e leve, com vontade de cantar a vida inteira.

A canção também exalta a brasilidade do chorinho, destacando instrumentos típicos como a flauta, o cavaquinho e o violão, e a cadência do pandeiro. Ademilde Fonseca, conhecida como a Rainha do Chorinho, traz uma interpretação vibrante e cheia de vida, que captura a essência do gênero musical. A música é uma ode à cultura brasileira e à capacidade da música de trazer alegria e conforto, mesmo nos momentos mais difíceis.

A polca "Apanhei-te Cavaquinho" é a segunda composição mais gravada de Ernesto Nazareth, perdendo apenas para "Odeon". De andamento rápido (o autor recomendava semínima = 100 para as polcas e semínima = 80 para os tangos) é muitas vezes executada em velocidade vertiginosa por músicos exibicionistas, que presumem assim mostrar habilidade virtuosística.

Composta em 1915 e gravada no mesmo ano pelo grupo O Passos no Choro, "Apanhei-Te Cavaquinho" foi dedicada a Mário Cavaquinho (Mário Álvares da Conceição), um exímio cavaquinista, amigo de Nazareth (segundo Ary Vasconcelos, ele inventou o cavaquinho de cinco cordas e a bandurra de 14 cordas).

Em 1930 o autor gravou esta composição em disco de grande valor documental, que passou a servir de referência para novas execuções. Já classificado como choro, ganhou letra de Darci de Oliveira, em 1943, para ser gravado por Ademilde Fonseca.
Fontes: Cifrantiga

sábado, 31 de agosto de 2024

Isabel Furini (Poema) 69: Flores aos vento

 

Trovador Homenageado do Dia: Jessé Nascimento (Trovas em preto e branco)


1
Ah, relógio, meu amigo,
teus ponteiros, como correm!
O tempo voa contigo
e com ele os sonhos morrem…
2
Após tantos desenganos
e conselhos não ouvidos,
chego ao final dos meus anos
sem ter meus dias vividos.
3
Com meus sonhos mais singelos,
embalados na esperança,
venho erguendo meus castelos
desde os tempos de criança.
4
Corres tanto, mocidade,
és pela vida levada:
– amanhã, serás saudade,
serás velhice, mais nada.
5
Dos outros não dependamos,
mas cada um erga a voz;
a paz que tanto almejamos
começa dentro de nós
6
Na dureza da porfia
para moldar minha história,
Deus me abençoa e me guia
para chegar à vitória.
7
Não adormeças teus sonhos,
não os esqueças, jamais;
os dias são mais risonhos
pra aqueles que sonham mais.
8
Não censuro o teu pecado,
não me censures também;
de vidro é o nosso telhado,
pecados... quem não os têm?
9
Navegando nas poesias,
nas ondas da inspiração,
iço as velas de alegrias
deixo o rumo ao coração.
10
Nesta vida, de passagem
sem morada permanente,
numa tão breve viagem,
sou um turista somente.
11
O genro sempre é quem dança,
a minha sogra é um porre;
o nome dela é "Esperança"
que é a última que morre.
12
Sempre fui um sonhador,
sonhos...por que não os ter?
Vivo meus sonhos de amor
porque sonhar é viver.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

AS TROVAS DE JESSÉ NASCIMENTO EM PRETO E BRANCO
por José Feldman

AS TROVAS UMA A UMA

1. Ah, relógio, meu amigo
A metáfora do relógio representa a inevitabilidade do tempo. Os "ponteiros" que correm simbolizam a urgência da vida e a perda de sonhos. A ideia de que "com ele os sonhos morrem" sugere uma reflexão sobre como o tempo pode levar embora as esperanças e aspirações.

2. Após tantos desenganos
Aqui, há um tom de melancolia e arrependimento. O eu lírico reflete sobre as oportunidades perdidas e conselhos não seguidos. A frase "sem ter meus dias vividos" implica uma vida de experiências não aproveitadas, levantando questões sobre a valorização do presente.

3. Com meus sonhos mais singelos
Esta trova fala sobre a simplicidade dos sonhos infantis e a construção de "castelos" na imaginação. A conexão entre a infância e a esperança sugere que manter a inocência e a capacidade de sonhar é essencial para a felicidade.

4. Corres tanto, mocidade
A juventude é apresentada como efêmera, um período que rapidamente se transforma em saudade. A ideia de que a mocidade "serás velhice, mais nada" ressalta a transitoriedade da vida e a necessidade de aproveitar cada momento.

5. Dos outros não dependamos
Esta enfatiza a importância da autonomia e da responsabilidade pessoal. A paz interna é vista como um pré-requisito para a paz coletiva, sugerindo que a mudança começa dentro de cada indivíduo.

6. Na dureza da porfia
O esforço e a luta para moldar a própria história são reconhecidos. A presença de Deus como guia indica uma busca por força espiritual e moral para superar desafios, culminando em um desejo de vitória.

7. Não adormeças teus sonhos
Um forte apelo à persistência e à valorização dos sonhos. A ideia de que "os dias são mais risonhos" para aqueles que sonham sugere que a esperança e a ambição trazem alegria à vida.

8. Não censuro o teu pecado
Esta estrofe reflete a aceitação da imperfeição humana. O "telhado de vidro" simboliza a fragilidade das relações e a vulnerabilidade de cada um, reconhecendo que todos têm suas falhas.

9. Navegando nas poesias
A poesia é vista como um meio de libertação e alegria. O ato de içar as velas representa a disposição de seguir o coração e aproveitar a inspiração, sugerindo que a arte é uma forma de navegar pela vida.

10. Nesta vida, de passagem
A metáfora do "turista" implica que a vida é temporária e que devemos valorizar cada experiência. A ideia de "morada permanente" reflete a incerteza e a natureza efêmera da existência humana.

11. O genro sempre é quem dança
Aqui, o humor é utilizado para abordar as dinâmicas familiares. A sogra como "Esperança" sugere que, mesmo em meio a desafios, a esperança permanece, destacando uma visão otimista.

12. Sempre fui um sonhador
Esta trova reafirma a identidade do eu lírico como sonhador. A afirmação de que "sonhar é viver" encapsula a mensagem central das trovas: a importância dos sonhos para uma vida plena e significativa.

TEMAS ABORDADOS E SUAS RELAÇÕES COM OUTROS POETAS

As "Trovas de Jessé Nascimento" capturam a essência do tempo, dos sonhos e da vida com profundidade e sensibilidade.

Transitoriedade do Tempo
Em "O Tempo", Fernando Pessoa reflete sobre a passagem do tempo e a inevitabilidade da morte, semelhante à preocupação de Jessé com a efemeridade dos sonhos e a juventude que rapidamente se transformam em memória, assim como Marcelino Freire que explora a passagem do tempo e a efemeridade das experiências, refletindo sobre a vida de maneira intensa.

Esperança e Sonhos
Em seus poemas, Cecília Meireles fala sobre a importância da esperança e dos sonhos, ecoando a mensagem positiva de Jessé sobre a a importância de manter a esperança e sonhar, enfatizando que a vida é mais rica para aqueles que sonham.

Reflexão e Autoconhecimento
Em obras como "Sentimento do Mundo", Carlos Drummond de Andrade explora a introspecção e o autoconhecimento, temas que também permeiam as trovas acima, uma busca por compreender as próprias experiências, arrependimentos e a necessidade de aproveitar o presente. A poesia de Alice Ruiz é marcada por uma busca íntima e reflexões sobre a vida e o amor, dialogando com a introspecção presente nas trovas.

Individualidade e Coletividade
Em suas poesias, Adélia Prado e Rafael Cortez discutem a relação entre o eu e o outro, similar à necessidade de Jessé de encontrar a própria voz e contribuir para a paz interna e externa destacando a relação entre o indivíduo e a sociedade.

Aceitação da Imperfeição Humana
Com um tom leve e humorístico, Mário Quintana aborda a fragilidade humana em muitos de seus poemas, semelhante às trovas de Jessé que enfatizam a aceitação dos erros e falhas pessoais, reconhecendo a fragilidade das relações e a universalidade do pecado, assim como Thiago de Mello, conhecido por sua visão humanista.

A Vida como Viagem
Vinicius de Moraes reflete sobre a vida como uma jornada, um tema que ressoa com a visão na trova de Jessé, por intermédio da metáfora da vida como uma passagem ou viagem que sugere a importância de valorizar cada experiência, assim como Bruna Beber, que frequentemente utiliza metáforas de viagem e passagem, refletindo sobre a jornada da vida de maneira lírica e introspectiva.

Relações e Dinâmicas Familiares
O humor e a complexidade nas relações familiares são explorados, especialmente em relação à figura da sogra, como Juliana Leite aborda estas relações e complexidades, trazendo um olhar contemporâneo que ressoa com o humor e a leveza de Jessé.

CONSIDERAÇÕES FINAIS 

A temática das trovas de Jessé Nascimento revela uma rica tapeçaria de reflexões sobre a condição humana, onde a transitoriedade da vida, a importância da esperança e a busca por autoconhecimento se entrelaçam de maneira profunda. Aborda a passagem do tempo com uma sensibilidade que ressoa em muitos leitores, convidando-os a contemplar a efemeridade dos sonhos e a inevitabilidade das mudanças.

A simplicidade de sua linguagem e a musicalidade de suas trovas tornam suas mensagens acessíveis, permitindo que temas universais, como amor, perda e as complexidades das relações humanas, sejam explorados de forma íntima e profunda. O uso de humor e ironia, especialmente em contextos familiares, oferece uma leveza que contrabalança a seriedade de suas reflexões, destacando a dualidade da experiência humana.

Além disso, o trovador enfatiza a importância da individualidade dentro de um contexto coletivo, sugerindo que a paz pessoal é fundamental para a harmonia social. Essa ideia ressoa fortemente em um mundo contemporâneo repleto de desafios, onde a busca por significado e conexão se torna cada vez mais urgente.

Enfim, as trovas de Jessé Nascimento não apenas capturam a essência da vida cotidiana, mas também oferecem um convite à introspecção e à valorização dos momentos simples. Sua obra se estabelece como um farol de esperança e reflexão, incentivando os leitores a sonhar, a viver plenamente e a encontrar beleza mesmo nas incertezas da vida.

Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. IA Open. vol.1. Maringá/PR: Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

Geraldo Pereira (O Mata-Borrão)

Nesses meus sábados ou nesses meus domingos, imperceptíveis, quase, tal a atribulação do meu cotidiano, faço questão de aproveitar a emergência da inspiração e vou transbordando o coração assim, escrevendo. Há tempo para tudo, está escrito, também, para que a alma seja tomada pelas saudades ou pelas lembranças nostálgicas e tempo para que o espírito se encha de satisfação e plenitude. Como há momentos de quedas do humor e outros, de elevação desses sentimentos! Agora, com um computador novo, ganho de presente, da consorte – Com sorte, sempre! Graças a Deus! –, tenho condições diferenciadas para o meu processo, mais do que simples, de criar o texto, pois que ouvindo Josefina Aguiar e Henrique Annes, antecipando os grandes da música universal, Mozart e Tchaikovsky ou Beethoven e Chopin, vou sendo invadido por essa sensação de paz interior, com a sonoridade dos meus conterrâneos ou com os acordes do inteiramente clássico.

Ora, quem como eu fez uso da velha pena, que molhada no tinteiro a intervalos regulares permitia transferir para o papel o pensamento, é muito diferente sentar diante do monitor e observar as letras se juntando em abraços fraternais, formando palavras, as quais se reúnem nas frases e vão dando gosto ao período. Dantes, quando era menino e usava calças curtas, saía de casa para a escola com a minha caneta Compactor e o meu frasco de tinta, da marca Parker e de qualidade Azul Real Lavável! Mas, fiquei maior e na idade de rapaz cheguei, como todos os meus companheiros e não esqueceram os meus pais da lembrança que fazia crescer, também, no reconhecimento dos colegas, por isso me deram uma Parker 51, de cor azul, com a tampa dourada. Usei por anos a fio e tinha a satisfação de dizer a toda a gente que nunca escarrapichou. Há quem saiba mais que verbo é esse? Nem o computador aceita de bom grado a grafia.

E se tudo está mudado, mesmo, na pós-modernidade do tempo, a máquina de escrever desapareceu do habitual das coisas e só as delegacias de polícia resistem à antiguidade do velho equipamento. Era um sacrifício datilografar, diretamente, as minhas crônicas, nem sempre agradáveis ao leitor, para quem transmito as minhas dores e os meus ardores, os meus amores, igualmente, muitas vezes de maneira tão enrustida, que só os de casa ou aqueles de meus convívios compreendem! 

Sempre usei os dedos todos das duas mãos em meus trabalhos, pois que na década de 1960, nos inícios desses doces anos, quase tirei o diploma de datilógrafo, para me garantir, dizia meu pai, e trabalhar no comércio, se preciso fosse! Se errasse, todavia, era um problema e a borracha de duas cores – azul e vermelha – entrava em cena, apagando o vocábulo e permitindo a nova escrita, mas ficava tudo borrado, sujo, verdadeiramente.

Um belo dia – já contei isso por aqui –, a minha mãe comunicou a todos, na hora do jantar, que tinha visto uma caneta nova, diferente, sobretudo, e trocando o nome, chamou de “Caneta Estereográfica”, cuja característica mais importante, explicou, em alto e bom som, era a de não exigir o tinteiro e a de não esvaziar nunca, senão de uma vez só. Uma beleza! E de pronto, todo mundo no Recife adotou a invenção, com o efeito colateral de ter o bolso, quase sempre, completamente molhado pela tinta da novidade emergente. Eram rodas azuis na camisa de muitos pelas ruas, apontando o defeito dos começos, o vazamento comum desses apetrechos que chegavam. As marcas populares ganharam fama e ainda hoje a Bic anda por aí, mostrando a cor azul-escuro da tampa e o transparente do corpo.

Rabisca o bom e o ruim, risca os discursos da elite e faz o jogo do bicho, aposta no carneiro e termina dando touro, converte gente e promove a descrença. É paradoxal, então! 

E o mata-borrão? Há quem se lembre disso? Só os mais velhos. É que depois da frase escrita, havia a necessidade de secar a tinta, de enxugar os excessos e para tanto funcionava o então conhecido papel de natureza porosa, com o poder de sugar os excedentes da mancha gráfica daqueles antanhos. Eram promocionais, inclusive, porque veiculavam propagandas, de remédios, por exemplo. Estas, distribuídas aos médicos, como ao meu tio Hênio, de Campina Grande, faziam a mídia da época. E ele trazia em boa quantidade para nós outros, para o meu pai e para mim, para os meus irmãos e para a minha tia velha, que fazia de suas cartas a forma de resgate dos pretéritos perdidos em terras potiguares. Em casa havia uma peça de madeira bem cuidada, na qual se colocava o mata-borrão, propriamente, fixando-se fortemente e assim era possível usar de maneira mais ampla, no texto por inteiro, quase!

Tudo isso passou! O tempo mudou ou mudaram os homens? E agora, a máquina substitui a criatura, despreza a pena e aposenta a caneta, vai dispensando o papel e diminuindo as distâncias, dando ao penitente do hoje condições de acessar o mundo inteirinho, da baixaria à nobreza, da pornografia descuidada aos textos da ciência. E viva a pátria, o computador e os avanços! Mas, viva, sobretudo, o mata-borrão!

Fonte: Geraldo Pereira. A medida das saudades. Recife/PE, 2006. Disponível no Portal de Domínio Público