segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Simone Athayde (A Ilha Triste)


Emanuel andava apressado, esperando que aquela última oportunidade que lhe tinham acenado fosse real. Por tantos dias vagara, sem rumo e comida, que o espírito já lhe fraquejava e ele não sabia mais quanto tempo ia suportar viver daquele modo ingrato.

Não tinha nada naquela vida: nem estudo, nem dinheiro, nem tampouco lugar pro pouso noturno. Virara pouco mais que um vagabundo, e se ainda não roubara é que sua mãe, quando viva, soubera lhe ensinar o que era certo. Preguiça não tinha, era capaz de fazer qualquer serviço, mas havia tanta gente mais necessitada que ele, tanto desemprego, que só podia pôr a culpa naqueles tempos difíceis.

Enfim, com a cabeça estourando com o calor daquela terra, com o estômago nas costas de não comer nenhuma refeição decente em muitos dias, chegou ao tal porto, que apesar de ter muitos barcos velhos, muito peixe sendo limpo ali mesmo na praia, dava até gosto de ver: um mar azul que era uma lindeza só.

Parou perto do primeiro barco que viu e perguntou ao homem, que de tão ocupado com o que fazia, nem se preocupou em fitá-lo:

“Bom dia. Fiquei sabendo de um serviço lá na ilha Triste. Queria saber se o senhor pode me levar até lá.”

O homem levantou os olhos, perscrutando o jovem.

“Só quem faz essa viagem é o Preto Genésio, mas o senhor deve estar com muita precisão pra querer trabalho naquele lugar.”

“Ah, isso tô mesmo! Mas onde encontro o tal homem?”

“O barco dele sempre fica de frente pro bar. É pertinho, não tem como errar.”

Então Emanuel agradeceu, e estava tão satisfeito que não percebeu que o homem lhe queria falar mais alguma coisa, que parecia preocupado. Foi andando mais rápido até avistar o tal bar e um homem negro enrolando um cigarro de palha, sentado no barco sem se preocupar com o balanço excessivo produzido pelas embarcações que chegavam ou partiam. Alheio ao balanço das águas e ao movimento do mundo.

“O senhor é Seu Genésio?”

“Pode falar “Preto”. Preto Genésio é como todo mundo me chama”, disse o homem sem levantar a cabeça.

“Tarde. É que quero ver o serviço lá na ilha Triste. Um moço me falou que só o senhor é que faz essa viagem.”

“Verdade. Vai ter que conversar com o dono. Se ele gostar de você, te dá o trabalho.”

“Ele vai gostar. Mas o senhor pode me levar lá agora? E quanto custa? Não posso pagar muito.”

“Você me paga quando receber. Eu estou sempre indo praquelas bandas mesmo, não vai me faltar oportunidade de cobrar.”

Emanuel riu e pulou pro barco. A viagem começou e o preto ia lento, lentamente. O jovem tinha ficado atrás dele, de modo que não podia ver o rosto escuro enquanto conversavam. Não que falassem muito, na verdade, demorou bem uns dois minutos até que o barqueiro começasse uma cantiga triste, e mais uns três até que resolvesse falar.

“Tá vendo a ilha?”

“Tô. É uma lindura! Por que um lugar tão bonito pode ter um nome tão triste?”

Mas o homem não respondeu, e continuou com a cantiga.

“Há de ser um serviço duro. Veio uma chuva brava, uma ventania louca, e derrubou o barracão do homem trabalhar.”

“Não tenho medo da lida. É bom que tenha muito trabalho mesmo, porque assim fico uns dias de barriga cheia.”

“Também não há de lhe pagar muito, mas não é tratante. Se acertar, paga.”

“Antes pingar que faltar.”

Por fim chegaram. A beleza daquele lugar e o vento bom que soprava ali caíram nele como feitiço. Abriu os pulmões pra respirar fundo aquele ar, e quando olhou de novo pra ilha, viu sobre um pequeno monte, uma mulher que parecia um anjo. Tinha os cabelos da cor do ouro, tão longos e lisos que, com o vento, voavam. O rosto era tão perfeito que não parecia real. No instante em que ele se virou para perguntar ao preto quem era aquela maravilha, eis que ela desapareceu.

“Você viu, Preto? Quem é aquela?”

O barqueiro ficou muito sério. Só então Emanuel reparou nos olhos dele, que eram opacos, quase brancos.

“Quer um conselho, amigo? Não vá atrás de aparição. Faça seu trabalho, que o mais pode ser muito perigoso. Venho aqui toda semana trazer mantimentos e pegar as peças que o homem faz. Ele é artista. Na minha próxima viagem posso levar você de volta, se tiver terminado o serviço. E não enrole, quanto menos conversar e mais rápido andar, melhor pra você. Até logo.”

“Não vai me esperar?”

“Não vai ser preciso. Ninguém mais ia querer esse serviço. O homem sabe disso.”

Então Emanuel agradeceu, um pouco encabulado com tantos conselhos. Ao estender a mão pra cumprimentar o homem, sentiu um calafrio: o preto era mesmo cego.

Emanuel atravessou a areia e a parte pedregosa que vinha depois até avistar a casa. Era uma construção muito simples, não parecia ter sido feita com capricho. Havia um cômodo na parte superior e, da janelinha aberta, Emanuel pôde ver que alguém o observava. Bateu palmas e chamou. Como demorassem pra atender, andou por trás da casa, até chegar ao barracão que havia sido destruído pela chuva.

“Um estrago e tanto, né?”

Emanuel levou um susto, mas logo se recompôs. Com o chapéu nas mãos, abaixou a cabeça num cumprimento. O homem olhava-o severo, não lhe deu nenhum sorriso.

“Foi uma chuva como nunca se viu, pensei que não ficava vivo. Mas a minha casa é mais bem construída. Esse barracão foi eu que fiz e por isso não resistiu. Agora preciso de alguém que saiba trabalhar, porque não posso levar prejuízo de novo.”

“ Metade do cômodo se foi”, disse Emanuel observando atentamente. “Mas posso fazer isso ficar uma belezura.”

“E quanto tempo demora?”

“Pra um homem sozinho é serviço pra duas semanas, no mínimo.”

“Tá brincando”, disse o homem, muito irritado. “Te dou uma semana, e te ajudo se for preciso. Se não der conta pode ir dando o fora.”

Emanuel pediu calma. Sabendo que não haveria como ir embora, disse que poderia dar conta do serviço no prazo estabelecido. Então o homem, que apesar de ser forte, já tinha muitas rugas, cabelos brancos e uma barriga proeminente, começou a lhe explicar melhor o serviço, as regras que deveria cumprir, e o quanto pagaria. Disse que não gostava de conversa, nem que ficassem de andanças na sua ilha, nem que fossem na sua horta e comessem seus frutos, que já eram poucos, e que dormisse ali mesmo no barracão porque não gostava de se misturar com ninguém. Vivia sozinho que era como gostava.

Emanuel sentiu vontade de perguntar da moça, mas achou melhor não, e depois de ouvir tamanha ladainha, pensou que poderia se dar a um pequeno atrevimento.

“Posso começar agora mesmo, moço, mas é que estou com muita fome. Será que o senhor pode me arrumar nem que seja um pedaço de pão?”

O homem mandou que ele começasse a trabalhar, que logo lhe traria o que comer. E assim foi feito. Emanuel começou com a lida e algum tempo depois lhe veio uma refeição completa e farta, tão gostosa que não parecia ter sido feita por um homem que dizia viver sozinho. Depois que comeu, descansou alguns minutos e trabalhou sob a vista do patrão o resto do dia. Só parou com o escuro, porque o outro não tinha lampiões de sobra. Quando perguntou onde podia tomar um banho, teve que ouvir mais desaforos.

“Você gosta de mordomias, heim, moço? Do lado esquerdo da praia aonde vocês chegaram, tem um riachinho, que é de onde tiro minha água. Não é fria nessa época do ano, é até muito aprazível.”

Emanuel resignou-se, mas estava tão cansado que acabou por dormir depois da refeição noturna, tão boa e farta quanto a anterior. No outro dia, acordou com a aurora, e foi logo procurar o riachinho. Era um lugar bonito, agradável, e a água realmente não era fria. Ficou nu e se demorou por lá, até que viu, já com a luz plena da manhã, a mesma moça do dia anterior. Tratou de vestir-se, mas ela não estava envergonhada de vê-lo nu. Porém, quando foi conversar, ela fugiu.

Não contou nada pro patrão, mas passou o dia inteiro pensando naquela jovem. Quando foi jantar, descobriu, debaixo do arroz, um bilhete escrito com letras tortas e feias:

“Vá se banhar a meia-noite”.

E assim Emanuel fez. Mas não se banhou nu, por pudor ou medo, e acabou rápido pra esperar uma nova aparição. Ela demorou, mas veio. Desta vez chegou perto, e tinha olhos tristes.

“Quase não pude vir. Ele não dormia.”

“O que ele é seu?”

“Meu pai. Mas parece um monstro, porque me tranca nesse lugar maldito e nunca, nunca deixa que ninguém me veja. Sou tão infeliz...”

“Por que ele faz isso?”

“Diz que é pra me proteger. Diz que nunca vai me entregar para homem algum.”

“Quer que eu te ajude?”

Então ela sorriu, e Emanuel soube que poderia ser tragado por aqueles olhos verdes profundos.

“Quero que me conte coisas. Me fale sobre o que acontece do outro lado do mar.”

Emanuel começou a falar da sua vida, do que as pessoas faziam no continente. Lara, como ela se chamava, encantava-se com tudo, empolgada como criança.

“Tenho que ir”, disse, ao se assustar por ver que o dia amanhecia.

“ Não vá ainda.”

“Volto amanhã, na mesma hora.”

E ficou tão perto do rosto de Emanuel que ele pôde sentir o hálito de alecrim que exalava do sorriso dela.

“Me beija”, ela pediu.

O jovem obedeceu, mas ao invés de sentir-se feliz, teve um estranho pressentimento. Lembrou-se das palavras do preto, e soube que ali começava sua perdição.

A outra noite chegou e novamente conversaram muito, mas Lara não deixou que Emanuel a beijasse, para que ele não pensasse mal dela. E foi no quarto dia que aconteceu o acidente, que mudaria o rumo da vida de Emanuel (ou talvez o rumo de sua vida já estivesse traçado antes que ele colocasse os pés no barco do Preto).

Enquanto o patrão ajudava a carregar umas vigas pesadas para reconstruir a última parte do telhado, eis que não suportou o peso da madeira. Ao tombar, a viga caiu sobre seu tórax, num impacto que o fez urrar como um animal. O homem empalideceu e continuou gritando, sentindo muita dor. Seu sofrimento foi tanto que chamou atenção de Lara, que da casa, ouviu os gritos e achou melhor acudir. Chegou desesperada, mas quando o homem a viu, deu-lhe grande bronca.

“O que está fazendo aqui? Já para dentro.”

“Fiquei com medo que morresse.”

Enquanto isso Emanuel não sabia se tirava a viga de cima do homem, ou se admirava a beleza de Lara, mas por fim pediu:

“Moça, me ajude aqui. Esta viga é pesada, tem que ser tirada com jeito, pra não machucar mais ele.”

Sem que pudesse protestar, o homem viu os dois se ajudarem até conseguir livrá-lo. Depois, não se importou mais de ser amparado por eles até a parte interna da casa.

No quarto, que ficava no andar superior, havia uma cama de casal enfeitada com uma colcha muito bonita. Lara ajeitou o homem com tanto carinho que ele relaxou e não se preocupou mais com o intruso.

O rapaz foi ficando por ali, ajudando a jovem a colocar emplastos de ervas. Ela disse que uma costela fora quebrada, pelo menos. Por fim, vencido pela dor e pelo cansaço, o homem dormiu, e Lara e Emanuel foram para a parte de baixo, onde num cômodo único, ficava uma mistura de cozinha e sala. Numa mesa mais afastada, estavam esculturas muito estranhas e belas.

“É ele quem faz. As pessoas do outro lado gostam, é assim que vivemos.”

“São bonitas.”

“Ele tira o barro aqui da ilha mesmo. É o segredo dele: um tipo de barro especial que dá esse tom, esse brilho.”

Depois ela lhe serviu comida, e aproveitaram para se beijar, embora timidamente. Depois de algum tempo o homem chamou-os.

“Rapaz, obrigada por me socorrer. Eu devia ter deixado você me ajudar com o peso, mas fui teimoso. Agora você já conhece meu tesouro: essa é minha mulher, Lara. Pode comer aqui conosco até terminar seu serviço, e pode se banhar aqui em casa se quiser. Mas sou um homem ciumento. Não admito falta de respeito.”

“De maneira nenhuma, senhor, não sou homem de cuspir no prato que come”, disse isso enquanto ainda se embasbacava com o que o homem dissera, de ser Lara mulher dele, e não filha.

Despediu-se e reparou que Lara movia os lábios, sem emitir som, pedindo que fosse ao riacho.

Na hora costumeira ela chegou. Emanuel ficou lívido ao vê-la nua. Ela o abraçou e disse, desconsolada:

“Ele mentiu sobre eu ser mulher dele, mas é um monstro, dorme comigo. E agora que já você já sabe, quero que fique comigo.”

Emanuel quis negar, quis sair correndo, mas afundou-se naquele corpo macio, que amava, e sentiu tanto contentamento quanto angústia.

O patrão continuava de repouso, mas permanecia na parte térrea da casa, de olho em Lara. Por causa do acidente, o trabalho de Emanuel atrasou, e findada a semana, ele teve que ir com a mulher até o barco do Preto. Este levou tanto susto quando percebeu que eles estavam juntos, que perdeu o costume de ficar mais calado, e falou aflito.

“O que você faz com essa perdição, filho?”

Emanuel contou só do acidente, mas o preto, com seu instinto de cego, sentiu neles o cheiro do amor, e soube de tudo o mais.

“Ele vai descobrir. Você tá perdido.”

“Ora, descobrir o quê?”, perguntou a bela.

“Você sabe. Quer desgraçar a vida dele igual desgraçou a minha?”

“Do que você tá falando, Preto?”

¬“Da minha cegueira. Foi o homem dela quem fez isso comigo, só porque um dia, depois de muito tempo que vinha aqui, vi ela e disse que era a coisa mais linda do mundo. Ele me enfiou o canivete nos olhos, me colocou no barco, e o empurrou pro mar, e disse que aquilo era pra eu aprender a não desejar o que era dele.

Emanuel ficou pálido feito cera, aterrorizado com a história, mas Lara ficou desmentindo, nervosa.

“Por que não ficou quieta no seu canto? Você gosta é de desgraçar os outros.”

“Não vê que é mentira, Emanuel? Se fosse verdade, por que ele voltaria aqui depois de tudo?”

“Porque é o único caminho que sei fazer sem meus olhos. O caminho que já sei de cor dentro da minha alma; e porque seu homem nunca mais me amolou, e me paga direito.”

Lara não deixou o preto falar mais. Puxou Emanuel, carregando os mantimentos na outra mão. Mais na frente pararam. Emanuel estava dos mais acabrunhados.

“Vai deixar de me amar por causa disso?”

Emanuel a abraçou, sem ter coragem de perguntar de novo se aquela história era verdadeira, mas sabendo que mesmo se fosse, Lara não tinha culpa.

“Foge comigo, Lara, na próxima viagem.”

“A gente não precisa esperar até lá. Ele tem um barco escondido lá nas bandas do riachinho.”

“Então a gente pode ir agora mesmo, se você quiser. Ele nunca vai descobrir nosso rumo.”

Lara abaixou a cabeça, e Emanuel viu que ela não tinha muita certeza se queria fugir.

“Eu vou, mas não hoje, com ele tão doente. Quero que melhore mais.”

“Se melhorar muito, pode descobrir nosso plano.”

“Não. Daqui a dois dias. E vamos pra casa, que já demoramos muito.”

Viveram normalmente até o dia combinado, encontrando-se enquanto o homem dormia. Quando chegou a tal noite da fuga, caiu uma chuva violenta e Emanuel ficou chateado, achando que não poderiam ir. Foi jantar na cozinha, como o patrão permitira.

“O serviço tá indo bem.”

“É, mais dois dias e tá pronto.”

“Não vai ter jeito de você dormir lá essa noite. Pode ficar aqui na cozinha. Eu e Lara vamos nos deitar.”

Emanuel concordou, abaixando a cabeça, ressabiado em pensar que sua bela ia dormir com aquele. Aninhou-se num canto perto do fogão, que era onde estava mais quente, e só acordou com Lara chamando. A ilha parecia tremer com tanto trovão e relâmpago que caia do céu.

“Que pena. Acha mesmo que não dá?”

“Era procurar a morte nesse mar.”

“Então me beija.”

“Aqui não, Lara, é perigoso ele acordar.”

“Ele dorme feito pedra.”

E Lara começou a beijá-lo, apesar da resistência dele. E tanta era a disposição dela, que Emanuel até se esqueceu do perigo e deixou-se levar. Mas não durou muito tempo. Da rústica escada o homem gritou, com feição assustadora.

Desceu com tanta destreza como se não estivesse machucado, e investiu contra Emanuel com um soco violentíssimo.

Lara gritava, tentando defender o jovem, mas o homem a empurrou e continuou batendo em Emanuel. Este conseguiu desvencilhar-se e aplicou-lhe um golpe nas costelas, que o fez cair no chão com um gemido. Lara e Emanuel ficaram parados, olhando para ele, até que o jovem achou que tinham que ir mesmo embora e puxou a bela pelas mãos. Mas o homem levantou-se e sem que Emanuel percebesse, pegou uma faca sobre a mesa e avançou contra ele. Lara gritou, avisando-o, e Emanuel teve tempo de se defender, esmurrando o homem e jogando a faca longe. Porém, o outro era muito forte. Prensou o jovem contra a parede, enquanto tirava da cintura uma arma antes escondida, o canivete.

Emanuel segurava o braço dele, mas não tinha forças para resistir muito mais. Pediu desesperado:

“A faca, Lara! A faca!”

Mas Lara não se mexeu. Permaneceu grudada à parede, e seus lindos olhos nem piscavam.

Então Emanuel perdeu as forças, e o homem cravou-lhe o canivete muitas vezes, até perceber que se esvaia. E Lara permaneceu encostada à parede, silenciosa.

Então o homem descansou poucos minutos. Depois, sem dizer uma só palavra, carregou o corpo até a horta, que Emanuel em vida nunca pudera visitar. Com uma pá cavou um buraco, ao lado de quatro canteiros altos, onde estavam plantados pés de alecrim, e onde havia quatro cruzes.

O homem, molhado pela chuva e pelo suor, parou um pouco seu trabalho para olhar em direção à janela, e sorriu. E Lara lhe sorriu também.

Fonte:
http://www.simoneathayde.com.br/contemas.asp

57a. Feira de Livros de Porto Alegre (Programação de 8 de novembro, terça-feira)


5ª Expo AEILIJ - Cores e Formas que Contam Histórias
08/11/2011 - 00:00
A mostra estará exposta do dia 8 ao dia 13 de novembro, no Hall da Casa do Pensamento

O Autor no Palco
08/11/2011 - 09:00
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

Mostra do Programa de Leitura Adote um Escritor
08/11/2011 - 09:00

Encontro com autor
08/11/2011 - 10:30
Bate-papo sobre História

Sessão de autógrafos da EMEF Granja Esperança - Cachoeirinha
08/11/2011 - 10:30

Dom Quixote e Dulcinéia contando Histórias
08/11/2011 - 10:30
João Sortudo, dos Irmãos Grimm e O Macaco e a Velha, de Ivo Bender

O Autor no Palco
08/11/2011 - 10:30
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

A Arte Levada a Sério
08/11/2011 - 10:30
Projeto Música Ação Inclusão da SMED Cachoeirinha - Encontro com autor

Oficina: Libertando a escrita criativa
08/11/2011 - 13:30
Através de jogos e exercícios, a oficina busca remover bloqueios e levar à produção de textos que evidenciem o potencial criativo de cada participante. Módulo 1/3

4ª Oficina de fotografia Click da Leitura
08/11/2011 - 13:30

Encontro com autor
08/11/2011 - 14:00

O Autor no Palco
08/11/2011 - 14:00
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

A Arte Levada a Sério
08/11/2011 - 14:00
Projeto Música Ação Inclusão da SMED Cachoeirinha - apresentação de coros do município

Objetos & Memórias
08/11/2011 - 14:00

Urtiga no rabo do cavalo
08/11/2011 - 14:30

Menina Bonita do Laço de Fita, de Sílvia Ortofy
08/11/2011 - 15:30

Encontro com autor
08/11/2011 - 15:30
Bate-papo sobre história

Lançamento do livro Virando a Página, escrito por estagiários da FASE no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com sede em Porto Alegre
08/11/2011 - 15:30

Cine SESC
Exibição do filme O pequeno Nicolau
15:30

O Autor no Palco
08/11/2011 - 15:30
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

Jornalismo Digital: audiovisual, convergência e colaboração
08/11/2011 - 15:30

Somente Números
08/11/2011 - 15:30

Fragmentos do Passado
08/11/2011 - 15:30

Doktors, contos de memória
08/11/2011 - 16:00
A história de médicos europeus que chegaram ao Rio Grande do Sul no período entre-guerras e deixaram importante legado cultural e material, auxiliando no desenvolvimento da medicina no estado

Oficina: Introdução à arte de escrever
08/11/2011 - 16:00
Iniciação à arte da escrita, visando despertar o processo criativo e transmitir técnicas de aperfeiçoamento. Módulo 2/3

A Arte Levada a Sério
08/11/2011 - 16:00
Projeto Música Ação Inclusão da SMED Cachoeirinha - Encontro com autor

A garça em branco e preto
08/11/2011 - 16:00
Antologia de Prosa e Verso da Segurança Pública
08/11/2011 - 16:00

Bens Culturais - Temas contemporâneos
08/11/2011 - 16:30
Gestão e políticas culturais, direitos de autor e bens culturais

Oficina: Haikais - imagens poéticas de Porto Alegre
08/11/2011 - 16:30
A produção de haikais a partir de imagens de Porto Alegre. Módulo 2/2

Por que não agora?//Fica ficando
08/11/2011 - 16:30

Educação dos Sentimentos - O caminho das virtudes
08/11/2011 - 16:30

Oficina: Higienização de acervo bibliográfico
08/11/2011 - 17:00
Higienização básica de acervo bibliográfico, dicas de conservação e cuidados básicos com os livros e acervos em papel

Doktors, Contos de Memória
08/11/2011 - 17:30

Teatros da história
08/11/2011 - 18:00
Análise do teatro como elemento historiográfico e artístico

Heine, Hein?
08/11/2011 - 18:00
Aula-recital sobre a vida e obra de Heinrich Heine

Cultura, Escolas e Fases Metodológicas do Processo
08/11/2011 - 18:00

360 graus - Inventário astrológico de Caio Fernando Abreu
08/11/2011 - 18:30
Presença da astrologia na obra do escritor, seu mapa astral e leituras de textos e cartas de Caio F.

Oficina: Tradução Literária, um mal necessário
08/11/2011 - 18:30
Como dizia Borges, os livros intraduzíveis não tem importância. Módulo 2/3

Bens Culturais: Temas Contemporâneos
08/11/2011 - 18:30

Presença de Henri Loevenbruck
08/11/2011 - 19:00
Traduzido para mais de 15 idiomas, autor francês fala sobre thrillers, romances de aventura e fantasia e música

Oficina do livro - O livro passo a passo
08/11/2011 - 19:00
Dicas e orientações para produção de um livro. Módulo 2/3

Cine Santander Cultural
08/11/2011 - 19:00
Sessão Comentada

3º Seminário AEILIJ - Por um espaço especial para a literatura na escola
08/11/2011 - 19:00
Bibliotecas escolares, teoria e prática irradiando leitores e leituras - A leitura dentro e fora da escola

Sessão de Autógrafos da Escola Leonardo da Vinci Beta - Porto Alegre
08/11/2011 - 19:00

Conversas Ilustradas
08/11/2011 - 19:00

Encontro com o Professor Vol.6
08/11/2011 - 19:30

Memórias do Anonymus Gourmet
08/11/2011 - 19:30

Chegaram os Americanos
08/11/2011 - 19:30

Um pequeno rio não corre para o mar
08/11/2011 - 19:30

J.Guinsburg, A Cena em aula - Itinerário de um Professor em Devir
08/11/2011 - 19:30

Retalhos da Vida
08/11/2011 - 19:30

Cordão da Saideira: Exorcismos urbanos - Histórias da cidade oculta
08/11/2011 - 20:00
Descubra antilugares, conheça histórias e participe de um novo mapeamento das cidades.
Canja-trilha da banda Dingo Bells

Sarau literário musical com Marlon de Almeida e Cláudio Levitan
08/11/2011 - 20:00

Fonte:
http://www.feiradolivro-poa.com.br/

domingo, 6 de novembro de 2011

Nemésio Prata Crisóstomo (Trova Ecológica 41)

Carlos Drummond de Andrade (Conselhos de um Velho Apaixonado)


Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida.

Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles, fique alerta: pode ser a pessoa que você está esperando desde o dia em que nasceu.

Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem d’água neste momento, perceba: existe algo mágico entre vocês.

Se o 1º e o último pensamento do seu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Algo do céu te mandou um presente divino : O AMOR.

Se um dia tiverem que pedir perdão um ao outro por algum motivo e,em troca, receber um abraço, um sorriso, um afago nos cabelos e os gestos valerem mais que mil palavras, entregue-se: vocês foram feitos um pro outro.

Se por algum motivo você estiver triste, se a vida te deu uma rasteira e a outra pessoa sofrer o seu sofrimento, chorar as suas Lágrimas e enxugá-las com ternura, que coisa maravilhosa: você poderá contar com ela em qualquer momento de sua vida.

Se você conseguir, em pensamento, sentir o cheiro da pessoa como se ela estivesse ali do seu lado... Se você achar a pessoa maravilhosamente linda, mesmo ela estando de pijamas velhos, chinelos de dedo e cabelos emaranhados...

Se você não consegue trabalhar direito o dia todo, ansioso pelo encontro que está marcado para a noite...

Se você não consegue imaginar, de maneira nenhuma, um futuro sem a pessoa ao seu lado... Se você tiver a certeza que vai ver a outra envelhecendo e, mesmo assim, tiver a convicção que vai continuar sendo louco por ela...

Se você preferir fechar os olhos, antes de ver a outra partindo: é o amor que chegou na sua vida. Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes na vida, mas poucas amam ou encontram um amor verdadeiro. Às vezes encontram e, por não prestarem atenção nesses sinais, deixam amor passar, sem deixá-lo acontecer verdadeiramente. É o livre-arbítrio. Por isso, preste atenção nos sinais.

Não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem cego para a melhor coisa da vida: O AMOR !!! ame muito..... muitíssimo....... Beija alguém de quem gostas quando receberes esta mensagem, mesmo que seja em pensamento.

(Assim seja !!!)

Carlos Drummond de Andrade (O Poeta Singrando Horizontes VI)


BELA

esta manhã sem carência de mito,
e mel sorvido sem blasfêmia.

Bela
esta manhã ou outra possível,
esta vida ou outra invenção,
sem, na sombra, fantasmas.

Umidade de areia adere ao pé,
engulo o mar, que me engole.
Valvas, curvos pensamentos, matizes da luz
azul
completa
sobre formas constituídas.

Bela
a passagem do corpo, sua fusão
no corpo geral do mundo.
Vontade de cantar. Mas tão absoluta
que me calo, repleto.

BOCA

Boca: nunca te beijarei.
Boca de outro que ris de mim,
no milímetro que nos separa,
cabem todos os abismos.

Boca: se meu desejo
é impotente para fechar-te,
bem sabes disto, zombas
de minha raiva inútil.

Boca amarga pois impossível,
doce boca (não provarei),
ris sem beijo para mim,
beijas outro com seriedade.

BOITEMPO

Entardece na roça
de modo diferente.
A sombra vem nos cascos,
no mugido da vaca
separada da cria.
O gado é que anoitece
e na luz que a vidraça
da casa fazendeira
derrama no curral
surge multiplicada
sua estátua de sal,
escultura da noite.
Os chifres delimitam
o sono privativo
de cada rês e tecem
de curva em curva a ilha
do sono universal.
No gado é que dormimos
e nele que acordamos.
Amanhece na roça
de modo diferente.
A luz chega no leite,
morno esguicho das tetas
e o dia é um pasto azul
que o gado reconquista.

BOLERO


Segure minha mão
com firmeza,
mas com carinho.

Olhe nos meus olhos
bem fundo
enquanto eu te olho
no fundo dos seus olhos.

Enxergue minha alma
enquanto traduzo seus sonhos
e deixe que a gente flutue
bem juntos
em uma só energia.

Vamos dançar juntos
como se voássemos
em uma nuvem exclusiva
toda nossa.

E enquanto dançamos,
eu te beijo
e você me beija
e a essa altura
já não sou eu, nem você.
Somos nós dois, em um apenas.
Dois seres, dois corpos,
um sentimento,
uma dança,
uma alma única.

BRINQUEDOS PARA HOMENS


Embora eu seja adulto,
não me seduzem os brinquedos eletrônicos
que a moda, irônica, me oferece.
E excogito:
Que brinquedo inventar para o adulto,
privativo dele, sangue e riso dele,
brinquedo desenganado mas eficiente?
Tenho de inventar o meu brinquedo,
mola saltando no meu íntimo,
alegria gerada por mim mesmo,
e fácil, fluida, pluma,
pétala.

Sem o pedir às máquinas e aos deuses,
que cada um invente o seu brinquedo.

CASO DO VESTIDO


Nossa mãe, o que é aquele
vestido, naquele prego?
Minhas filhas, é o vestido
de uma dona que passou.
Passou quando, nossa mãe?
Era nossa conhecida?
Minhas filhas, boca presa.
Vosso pai evém chegando.
Nossa mãe, dizei depressa
que vestido é esse vestido.
Minhas filhas, mas o corpo
ficou frio e não o veste.
O vestido, nesse prego,
está morto, sossegado.
Nossa mãe, esse vestido
tanta renda, esse segredo!
Minhas filhas, escutai
palavras de minha boca.
Era uma dona de longe,
vosso pai enamorou-se.
E ficou tão transtornado,
se perdeu tanto de nós,
se afastou de toda vida,
se fechou, se devorou,
chorou no prato de carne,
bebeu, brigou, me bateu,
me deixou com vosso berço,
foi para a dona de longe,
mas a dona não ligou.
Em vão o pai implorou.
Dava apólice, fazenda,
dava carro, dava ouro,
beberia seu sobejo,
lamberia seu sapato.
Mas a dona nem ligou.
Então vosso pai, irado,
me pediu que lhe pedisse,
a essa dona tão perversa,
que tivesse paciência
e fosse dormir com ele...
Nossa mãe, po que chorais?
Nosso lenço vos cedemos.
Minhas filhas, vosso pai
chega ao pátio. Disfarcemos.
Nossa mãe, não escutamos
pisar de pé no degrau.
Minhas filhas, procurei
aquela mulher do demo.
E lhe roguei que aplacasse
de meu marido a vontade.
Eu não amo teu marido,
me falou ela se rindo.
Mas posso ficar com ele
se a senhora fizer gosto,
só pra lhe satisfazer,
não por mim, não quero homem.
Olhei para vosso pai,
os olhos dele pediam.
Olhei para a dona ruim,
os olhos dela gozavam.
O seu vestido de renda,
de colo mui devassado,
mais mostrava que escondia
as partes da pecadora.
Eu fiz meu pelo-sinal,
me curvei... disse que sim.
Saí pensando na morte,
mas a morte não chegava.
Andei pelas cinco ruas,
passei ponte, passei rio,
visitei vossos parentes,
não comia, não falava,
tive uma febre terçã,
mas a morte não chegava.
Fiquei fora de perigo,
fiquei de cabeça branca.
perdi meus dentes, meus olhos,
costurei, lavei, fiz doce.
minhas mãos se escalavraram,
meus anéis se dispersaram.
minha corrente de ouro
pagou conta de farmácia.
Vosso pai sumiu no mundo.
O mundo é grande e pequeno.
Um dia a dona soberba
me apareceu já sem nada,
pobre, desfeita, mofina,
com sua trouxa na mão.
Dona, me disse baixinho,
não te dou vosso marido,
que não sei onde ele anda.
Mas te dou este vestido,
última peça de luxo
que guardei como lembrança
daquele dia de cobra,
da maior humilhação.
Eu não tinha amor ele,
ao depois amor pegou.
Mas então ele enjoado
confessou que só gostava
de mim como eu era dantes,
Me joguei a suas plantas,
fiz toda sorte de dengo,
no chão rocei minha cara,
me puxei pelos cabelos,
me lancei na correnteza,
me cortei de canivete,
me atirei no sumidouro,
bebi fel e gasolina,
rezei duzentas novenas,
dona, de nada valeu:
vosso marido sumiu.
Aqui trago minha roupa
que recorda meu malfeito
de ofender dona casada
pisando no seu orgulho.
Recebei esse vestido
e me dai vosso perdão.
Olhei para a cara dela,
quede os olhos cintilantes?
quede graça de sorriso,
quede colo de camélia?
quede aquela cinturinha
delgada como jeitosa?
quede pezinhos calçados
com sandálias de cetim?
Olhei muito para ela,
boca não disse palavra.
Peguei o vestido, pus
nesse prego da parede.
Ela se foi de mansinho
e já na ponta da estrada
vosso pai aparecia.
Olhou pra mim em silêncio,
mal reparou no vestido
e disse apenas : Mulher,
põe mais um prato na mesa,
Eu fiz, ele se assentou,
comeu, limpou o suor,
era sempre o mesmo homem,
comia meio de lado
e nem estava mais velho.
O barulho da comida
na boca, me acalentava,
me dava uma grande paz,
um sentimento esquisito
de que tudo foi um sonho,
vestido não há... nem nada.
Minhas filhas, eis que ouço
vosso pai subindo a escada.

Simone Athayde (Encontro com o Contador de Histórias)


(trecho do livro O Aprendiz de Tiradentes)

Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar do Ouro Preto, 1782

Ainda não eram sete horas da manhã e a rua já estava movimentada. Havia chovido a noite anterior e, por isso, a cerração que descia dos montes íngremes e do pontiagudo Itacolomi, que rodeavam a cidade de Vila Rica, enchia o ar de uma umidade fria, que estremecia a pele mal coberta do rapazinho.

Como fazia há três dias, ele colocou uma pedra grande que achara ali mesmo, na calçada, abaixo da janela e, subindo na pedra, deixou-se ficar espiando o trabalho do cirurgião. Só o cabelo claro, a testa e os olhos miúdos se alinhavam por cima da janela e, mesmo assim, porque se esforçava para equilibrar-se nas pontas dos pés. Saía dali somente quando as pernas ficavam dormentes ou quando as costas exigiam um descanso.

Às vezes, o garoto notava que o tira-dentes olhava em direção à janela; então, ele escondia-se rapidamente. Porém, naquele dia, olhava desavisado para os detalhes da sala que servia de consultório e demorou a perceber que o homem o encarava com feição dura. Desceu de seu pedestal improvisado e resolveu ir embora.

Quando estava passando à frente da porta do cirurgião, onde algumas pessoas esperavam por falta de espaço dentro da casa, um homem negro, que possuía o lado direito do rosto deformado, o segurou pelo braço. O rapaz já o havia visto antes, mas isso não impediu que levasse um enorme susto. Pensou que o tal homem fosse lhe dar uma bronca ou lhe bater por ordem do cirurgião. Tentou soltar o braço da mão grande e pesada que, sem nenhum esforço, o mantinha preso. O jovem começava a ficar apavorado, ensaiava já pedir ajuda, quando o escravo abriu um sorriso torto, afrouxou um pouco o braço magro e perguntou:

— Você conhece meu patrão?

— O cirurgião?

— Sim, ele mesmo – disse o homem, com toda pompa, enchendo o ar com sua voz forte.

— Escute, eu só vim aqui porque gosto de ver seu patrão trabalhar. Não estava fazendo nada de errado.

Como se o homem não tivesse ouvido o que o garoto dissera, falou, com ar compenetrado, quase encostando o rosto cheio de marcas horríveis perto do dele:

— Você quer que eu conte uma história? Eu gosto de contar histórias.

Já que o escravo não o libertava, o rapazinho soube que a resposta tinha que ser "sim".

"Meu patrão, quando mais jovem, era tropeiro, vivia por essas terras, vendendo mercadorias. Em uma de suas viagens, enquanto atravessava a cidade de Minas Novas, viu um mercador castigando um de seus escravos. O homem era ruim como o demônio: já havia matado muitas pessoas...

O tropeiro não tinha nada a ver com aquilo, porque, segundo a lei, escravo não é gente, mas nem quis saber se teria problemas: parou a cavalgada, desmontou com esperteza, num pulo, e foi para cima do malvado que pisava sem dó a cara do infeliz. Socou a cara do mercador, o deixou prostrado no chão e mandou que não fizesse mais aquilo. Depois foi acudir o ferido. A cara do patrão, quando viu o estado da cara do homem, virou um pavor. Foi até o cavalo, pegou uma água curativa e, com uns trapinhos limpos que levava, começou a cuidar das feridas abertas, arreganhadas. Falou que precisavam costurar aquilo.

O mercador, que tinha o coração duro, conseguiu se levantar e chicoteou as costas do patrão. Eles começaram uma briga de socos. Era capaz de um matar o outro, se os militares não tivessem chegado. O tropeiro, abatido, olhou para o escravo, cheio de piedade, e pediu desculpas por não poder fazer a costura. Patrão não sabia que nessa vida, muitas vezes, não se faz o bem sem se pagar por isso: além de ficar uns dias preso, perdeu os cavalos e as mercadorias, um pouco por causa dos furtos, outro tanto para pagar sua liberdade. Por causa disso, moço, ele ficou falido e teve que se alistar na tropa paga.

Um dia, estava andando pela feira da cidade de Mariana, quando ouviu: "Tropeiro da água santa, tropeiro da água santa!" Mesmo vestido com a roupa de alferes, não foi difícil para o homem saber que estavam chamando por ele, porque a fama de fazedor de remédios milagrosos já havia se espalhado por esse pedaço de Minas. Quando foi procurar quem o chamava, viu um escravo amarrado a muitos outros e reconheceu, pela cara horrível, aquele que ele ajudara meses antes. O prisioneiro não podia conversar com os passantes, mas conseguiu, com esforço, dar um sorriso todo errado, e dizer, com os olhos cheios de lágrima: "obrigado".

O alferes não deu sinal nenhum de importar-se com ele. Indiferente, saiu dali caminhando mais rápido, como se quisesse fugir da figura ridícula. O cativo ficou triste, mas compreendia o homem e compreendia também, àquela altura da vida, que viver arrastado pelo mercador, entre os intervalos de tortura, seria seu destino, porque, com aquela cara e com uma perna manca, não ia conseguir mesmo ser vendido.

Mais tarde, quase na hora do sol se pôr, aparece um frei com sua roupa preta puída e começa a olhar um escravo aqui e outro acolá. Faz o mercador abrir a boca deles para mostrar os dentes, pergunta o preço de vários e acha todos muito caros. Finalmente, vê o homem deformado, aponta para ele e pergunta o preço.

O mercador teria lucro se deixasse o coitado ser levado de graça, pois pouparia a pouca comida que dava para ele. Mas a sede de dinheiro era nele uma doença: pediu uma quantia absurda. Quando viu que o padre ia embora, foi andando atrás dele, abaixando o preço, abaixando mais, até que o religioso fez uma oferta e abriu a mão com as poucas moedas que tinha. Ofereceu também orações pela alma do mercador.

Com muito esforço, o pobre conseguiu seguir o padre que andava rápido e reclamava do atraso para a missa. Quando chegaram à igreja, foram direto a um cômodo que ficava ao lado da sacristia. O lugar, uma espécie de biblioteca, era abafado e mal cheiroso, mas possuía tantas estantes e tantos livros acomodados nelas, que o cativo começou a esquecer sua situação e ficou admirando aquilo. Só depois de um tempo reparou que um homem, sentado perto da porta, esperava por eles. Era o tropeiro da água santa.

— Não sei o que pretende fazer com isso – disse o padre – mas aqui está ele, e você me deve cinco moedas.

O patrão andou até o escravo, tocou os ombros dele, sorriu e disse:

— Seu rosto não precisava ter ficado tão ruim. Dos nossos prejuízos, você ficou com a pior parte.

E virando-se para o padre:

— Cônego Vieira, traga pão e vinho para esse filho de Deus. Deixa este faminto fazer a
comunhão.

— Sacrílego!

E o padre saiu reclamando, mas foi buscar a comida.

O rapazinho, envolvido pela história e pela maneira simpática como o homem de feições medonhas a contava, não havia percebido que seu braço estava livre.

— O escravo da história é você?

— Sim, e aquele lá dentro é o homem que me salvou.

O jovem ficou calado. Tímido e ainda com medo, apesar de estar curioso para saber mais sobre o cirurgião, esperou que o escravo se distraísse e correu para longe dali.

Fonte:
Simone Athayde. O Aprendiz de Tiradentes. Disponível em http://www.simoneathayde.com.br/contemas.asp

Simone Athayde (O Aprendiz de Tiradentes)


O Aprendiz de Tiradentes é um romance histórico. O enredo trata da vida de Hélio, rapaz pobre que vai aprender o ofício de cirurgião com Tiradentes, na Vila Rica de 1782, quando começavam a fervilhar com mais ousadia ideias revolucionárias na Colônia. Sem querer, Hélio começa a testemunhar a vida e os planos de Tiradentes e de outros inconfidentes e mergulha na tragédia que disso resultaria.

A ideia de escrever O aprendiz de Tiradentes começou há muitos anos, quando li, em um jornal da classe odontológica, um artigo sobre Joaquim José da Silva Xavier.

Na minha época de criança, aprendíamos que Tiradentes foi um mártir que tentou libertar o Brasil do jugo português. A sua semelhança com Jesus impressionava, tanto a física, por causa da barba e do cabelo crescidos, quanto por seu martírio suportado com dignidade. Era bom saber que havíamos tido um grande herói.

O mito Tiradentes serviu e serve, até hoje, aos mais diversos interesses, inclusive aos literários. Mesmo que pesquisas históricas sobre a Inconfidência Mineira pretendam desmistificar esse evento e suas personagens, as lacunas produzidas pelo espaço de tempo excessivo e pela escassez de documentação da vida (e não apenas de fragmentos de vida) dos homens e mulheres que participaram desse episódio não poderão ser totalmente preenchidas. Sempre haverá um "se", novas suposições e contradições sobre essa matéria.

É graças às lacunas da História que o ficcionista pode usar a fantasia para criar a sua história, que pode ter, ou não, maior ou menor conexão com a "realidade". João Pinto Furtado, em seu livro Manto de Penélope, história, mito e memória da Inconfidência Mineira de 1788-9, diz: "a representação artística não tem, nem deve ter, os mesmos compromissos com a objetividade da historiografia".

Como já disse antes, neste livro trato da história de Hélio, um personagem fictício que teria conhecido Tiradentes e com ele convivido. Além dele, são fictícios Anna, Joana, Tempestade, Tonho, o pequeno Joaquim e outros personagens secundários. Todos os demais existiram realmente.

Mesmo que a versão que eu apresente dessas personalidades e da Inconfidência Mineira seja romanceada, ou seja, mesmo que eu tenha trabalhado a História com a liberdade que a literatura oferece, devo esclarecer que tentei, a partir de extensa pesquisa em diversos livros e fontes documentais, descobrir e apresentar ao leitor a versão mais coerente que eu conseguisse. Apesar de ter criado personagens e situações fictícios, o pano de fundo histórico dará aos leitores uma ideia de como e por que surgiram as ideias revolucionárias, qual o papel dos inconfidentes considerados líderes e quais as relações entre eles e o governo português.

Desse modo, será comum que o leitor se depare com frases que foram ditas realmente; com cenas inspiradas em outras descritas nas Cartas Chilenas ou em historiografias sobre a Inconfidência; com a transcrição, para o romance, de partes de alguns poemas de Tomás Antônio Gonzaga e de documentos da época. São exemplos disso: a descrição física e psicológica que faço de Tiradentes e de outras personagens, baseadas em pistas históricas, as várias "fanfarronices" do governador Cunha Menezes, também narradas nas Cartas Chilenas; o primeiro encontro, descrito por Lima Jr., de Gonzaga com Maria Dorotéia, que teria acontecido graças a um ferimento no dedo da jovem e que a Lira XX da parte primeira de Marília de Dirceu mostra imagem parecida; a cena da velha que vê a sorte no copo com a clara de ovo, que aparece nesta mesma obra; e o diálogo entre Joaquim da Maia e Thomas Jefferson, que foi elaborado a partir do conteúdo das cartas reais escritas por eles. As datas e o transcorrer de alguns acontecimentos foram modificados para se adequarem melhor ao andamento do enredo.

Termino esta apresentação com a frase de Tobias Monteiro, para reflexão do leitor: "A gente fica a pensar se a História não será em grande parte um romance de historiadores".

Fonte:
http://www.simoneathayde.com.br/

Simone Athayde


Simone Athayde é goiana, casada e mãe de dois filhos. Formada em Odontologia, graduou-se também em Letras para aperfeiçoar-se na arte da escrita. Em sua poesia Dramática podemos perceber o amor dessa escritora pela Literatura:

“Há versos em minha garganta, sufocando-me
há prosa em meu sangue, hemoglobina literária
letras no lugar de células
há sinapses de palavras em meu cérebro
neuro-linguística
sou toda lírica, épica, narrativa
sou dramática.”

Em 2008, Simone lançou seu primeiro romance, Calipso e Ulisses, publicado pela editora Kelps, de Goiânia. Esta obra faz um diálogo com a mitologia grega para contar uma história contemporânea, a qual se desenvolve em forma de uma prosa poética. O reconhecido escritor goiano José Mendonça Teles fez o seguinte comentário sobre este romance:

“Estimada Simone, li seu livro no supetão, não tinha como parar. Cada página me atraia mais e após a leitura, ainda no calor da emoção, tentei passar-lhe um e-mail expondo todos os meus sentimentos. A narrativa envolvendo Calipso, Carlos, Ligia e Ulisses faz com o leitor ame seu livro, que tem lugar garantido na literatura brasileira. Você tem jeito para a coisa. Conte comigo, seu leitor amigo”. José Mendonça Teles. 29/03/09

Além do romance Calipso e Ulisses, atualmente Simone trabalha na finalização de um livro de contos, A ilha triste e outras histórias, e de um romance histórico, além dos livros infantis O espelho amalucado e A pescaria dos sapos, que estão em fase de ilustração.

A ilha triste e outras histórias
Editora R&F - 2010
Contos e Poemas / 97 páginas

A ilha triste e outras histórias é um livro de contos. São nove pequenas histórias que gostei muito de escrever. A minha preferida? Bom, tenho um carinho especial pelo conto O matador de árvores.

Esse conto foi escrito "mentalmente" durante uma viagem a Goiânia. Na estrada, percebi, com enorme tristeza, que uma grande faixa de mata virgem estava sendo destruída para a construção de um lago artificial que abastecerá a capital. Logo que tive uma chance, peguei papel e caneta e fiz meu manuscrito.

O matador de árvores é, portanto, meu singelo protesto contra a destruição das árvores, mas é também, sobretudo, um testamento aos homens, que ainda teimam em não ver a natureza como mãe.

Fonte:
http://www.simoneathayde.com.br/

Clevane Pessoa (A Pocã)


(À mesa, semblantes severos. Tios e tias de luto. O patriarca se fora e mal ousavam falar. Para a morte, alguns eufemismos: partir, passar para, descansar. E lá merecia o velho feroz algum descanso, pensava a adolescente retirada no meio da noite do leito morno e quase surpreendida em sua doce lascívia das mãos curiosas sob os lençóis? Ainda bem que no dia seguinte, deveria apresentar o trabalho de pesquisa sobre a Guerra do Irã (ou seria Iraque?). Quase nada pesquisara, mesmo pela Internet, pois a Pat fizera quinze anos na véspera e batera pé para a festinha na cobertura ser no mesmo dia, não no sábado. A mãe não pudera com a birra, temendo ser catalogada de atrasada, em relação à sua própria, que não ousara proibi-la ao ser comparada à da Pat, tão "in". Combinação de meninas: uma citava a mãe da outra para conseguir qualquer coisa... Cada mãe, temente de ser "out" e perder o amor da filhota mimada.

Levanta os olhos de grandes pestanas douradas, meio desfocados. Avalia os comensais. Um deles faz o mesmo e a apanha na teia de aranha que se instala entre ambos, de imediato. Ele aponta com o queixo, os demais, faz movimentos cômicos, taxando-os de chatos. Ela aquiesce mudamente, sorriso a meio, pronto para desmanchar-se se alguém a surpreendesse no mudo colóquio.

Ele apanha farinha e escreve "fofa", sobre o feijão frio. Ela devagar, lambe os lábios, coração disparado. Pat lhe dissera, com a sabedoria das mocinhas de quinze anos, que os homens ficavam maluquinhos quando viam a ponta da língua. Por isso chamavam as mulheres de gatinhas. Ele arregala mais ainda os olhos sombreados, passa as mãos pelo queixo onde espetam centenas de fios de barba. Também fora acordado no meio da noite para o enterro do avô. O telefone vibrara logo após uma "petit mort". Seqüente a um grande gozo.

Subitamente, deixa o sapato do pé direito cair, sem alarde algum. Mocassim fácil de tirar. Estende a perna e deixa o pé descansar sobre as coxas úmidas da adolescente. Esbarra com calças jeans. Ela estremece. Ele escreve com a farinha: "Tira". A garota o interroga com o olhar. Escreve então, da mesma farinheira: Como?

O moço ri. Apanha uma pokã. Descasca-a sem pressa. Pega dois gomos e mostra-os com calma à quase menina. Entreabre-os. Coloca entre eles, o polegar. A garota estremece de prazer. O coração parece que desceu e pulsa nela, lá em baixo, entre os gomos túmidos.

Tenta, sob a toalha de linho, imensa, fazer o mínimo possível de gestos, muito devagar, vai desabotoando os botões de metal. A calça apenas cobre o púbis. Consegue ir levantando as nádegas. Puxa as pernas da calça. Noite abafada na sala de fazenda, sem ventiladores. Acomoda o pé invasor. Segura-o como se isso bastasse para impedir um abuso maior. Mas tem vontade de acariciar o pé, um mini corpo. Quando se distrai, é tocada, qual uma corda de violão. Estremece e geme. Todos a olham, de súbito. Está vermelha. A mãe pergunta, preocupada:

— O que foi?

Ela fala baixinho, só para a inquisidora ouvir:

— Cólicas...

O pé já se recolhera. A mãe se aproxima e pergunta alto: Onde ela vai dormir? A tia mais velha conversa com outra, decidem logo e ela é convidada a ir tomar banho, antes de deitar-se. As adultas agora estão num canto, falando de absorventes, coisas de mulher. O primo primogênito apanha os gomos do desejo e os põe na boca. Todos se levantam. A empregada, ao recolher a louça, vê sobre o feijão escuro, a frase: Que pena! No quarto da donzela, sob o chuveiro, ela revê esses gomos sumarentos ao fechar os olhos. E com os olhos dos dedos, imita os dedos do sedutor.

Em pé, na varanda, ele pensa na fêmea madura que deixara à sua espera. Enquanto come os últimos gomos da dourada pokã...

(*) Forma como é grafada nas feiras livres e nos mercados do interior do estado de S. Paulo a tangerina poncã.

Fonte:
http://www.clevanepessoa.net/blog.php

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 387)


Uma Trova Nacional

Existe tanta união
entre os teus sonhos e os meus,
que só não és meu irmão
por um descuido de Deus!
–ARLINDO TADEU HAGEN/MG–

Uma Trova Potiguar

Auroras da juventude
o tempo de mim levou;
quis repeti-las, não pude,
a velhice não deixou.
–FRANCISCO MAIA/RN–

Uma Trova Premiada

2007 - São Paulo/SP
Tema: TEMPO - Venc.

Tempo, em meu rosto conjugas
os verbos “ser” e “sonhar”:
um na verdade das rugas;
outro, no brilho do olhar.
–ANTÔNIO DE OLIVEIRA/SP–

Uma Trova de Ademar


...E Suas Trovas Ficaram

Eu ...você ...as confidências...
o amor que intenso cresceu
e o resto são reticências
que a própria vida escreveu...
–LUIZ OTÁVIO/RJ–

Simplesmente Poesia

Vela Branca
–ADELMAR TAVARES/PE–

Vela branca, vela branca,
que vais lá longe... no mar...
quem me dera, vela branca,
que me quisesses levar
para tão longe... tão longe,
que eu não pudesse voltar...

Mas uma vez, vela branca,
que não me queres levar,
para tão longe... tão longe...
que eu não pudesse voltar,
leva-me a saudade dela
para o mais fundo do mar.

Estrofe do Dia

Um leirão de cebola numa horta
onde esterco de gado aduba a terra
uma casa encostada ao pé da serra
construída de barro e vara torta
uma estopa vazia fecha a porta
mas me orgulho em dizer: fui eu que fiz,
uma cruz desenhada com um giz
prá poder espantar assombração
eu não troco um pedaço do sertão
pelo resto das terras do país.
–ONILDO BARBOSA/PB–

Soneto do Dia

A Intrusa
–MIGUEL RUSSOWSKY/SC–

Teimava em me seguir, eu bem que percebia...
Tinha modos gentis. Simpática (não bela).
Não queria assustar-me, andava com cautela,
diferente do andar da grande maioria.

Eu sempre recusei lhe fazer companhia,
embora esta mulher me fosse sentinela
em horas de descanso. Eu não gostava dela
pela insistência atroz com que me perseguia.

Seu nome? Não sabia. Apelidei-a a Intrusa.
Eu lhe fechava a porta, exibindo a recusa
de comigo a reter na partilha do lar.

No espelho, certo dia, atrás de mim postou-se...
Quis irritar-me? Sim. Mas disse com voz doce:
- Eu me chamo Velhice e vim para ficar.

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

J. S. Ferreira (Criança, Não Deixes o Verde da Terra Morrer)


Criança, não deixes o verde
Da terra morrer.
Neste solo de aço.
Há sempre um espaço

Para se plantar e colher.
Quando vires uma árvore desfolhada
Fenecendo à beira do caminho,
Trata-a com amor e carinho,

Porque ela é parte da tua vida,
Da natureza, do teu ser.
Quando uma árvore é decepada

É a natureza que se enluta,
É parte do teu ser que se amputa.
É mais uma vida que deixa de crescer.

Fonte:
Helóisa Crespo (organização e programação visual). Ciranda “Criança em Versos”. Campos dos Goytacazes/RJ: 2011. Livreto enviado pela autora

Júlia Lopes de Almeida (O Último Sonho da Rainha)


"There is no one near me to call me Victoria, now". Em toda a extensa biografia da rainha da Inglaterra, a bem amada, que os jornais do mundo inteiro publicaram na ocasião da sua morte, em lamentosa necrologia, nenhuma frase há talvez que mais justamente revele a mulher, do que esta, com que ela chorou a sua viuvez:

— "Agora já não tenho ninguém a meu lado para me chamar Victória."

O seu nome, isolado de toda a cerimônia, proferido de igual para igual, nunca mais soaria aos seus ouvidos, na intimidade franca do amor.

A morte igualitária e justa selava na boca do príncipe o nome da mulher, ficando só para a Vida o da majestade.

Rainha! Não ser mais que rainha, é pouco. Mãe? Não basta. Filhos e súditos têm pela soberana prestigiosa o mesmo respeito incondicional, a mesma obediência passiva.

Ela sente, na sua viuvez, não só a falta do amigo, mas a da sua própria personalidade humana.

Havia uma voz só, entre tantíssimas vozes, que a tratava como a companheira de jornada; a confidente, a alma irmã, a criatura filha de Deus, sujeita ao erro, domável ao conselho, com as qualidades e os defeitos inerentes aos mais; havia só uma voz que lhe lembrava que ela era uma mulher como as outras mulheres, afetiva, nascida para o gozo e para o sofrimento, e que o seu papel na Vida, saía todo do coração.

Dizer somente: Victória, era o mesmo que significar, aos seus ouvidos aturdidos de honrarias e lisonjas confusas: "Para mim tu és mais do que a soberana, apoderosa Rainha da Inglaterra e Imperatriz de todas as Índias; tu és a Mulher, criada à minha semelhança, para companheira da minha existência, bonança dos meus dias, e benção da minha prole. Nasceste para mim; somos iguais, amemo-nos!"

Percebo a sensação de isolamento que a rainha havia de sentir, quando, olhando em torno, só visse cabeças curvadas diante dos seus olhos interrogativos, e joelhos vergados nos degraus do seu trono.

A única voz que a tratava por tu, extinguira-se; e só então ela percebeu como essa expressão de igualdade e de intimidade é doce...

Todas as suas confidencias se voltam para o seu diário.

É preciso abrir uma válvula ao sentimento, — e escreve. É também a única maneira que ela tem de se fazer lembrar a si mesma que ela é — Victória — a mulher de carne e osso, da mesma espécie, portanto, que as pobres camponesas que andam pelos campos ceifando, e vão à tarde para as pontes e as cercas tagarelar com os noivos. Este livro é como que uma janela aberta numa prisão.

Eu gostaria de lê-lo, certa de que ele será um excelente estudo de uma alma, revelação de uma tortura desconhecida e nobre, cuja interpretação é esta: a ânsia de uma rainha por ser antes, e mais que tudo — a Mulher.

Em toda a sua biografia só entrevi, talvez mal, um traço ligeiro de vaidade. Sua Majestade Britânica, oferecendo o seu jornal ao grande romancista Dickens escreveu:

"Como o dom de um dos mais humildes escritores, ao maior de todos."

Talvez que este livro espontâneo, espelho de uma alma em toda a sua intimidade, dê direito ao titulo que a rainha se arrogou.

Que observações finas e curiosas teriam essas páginas comentadoras de atos e de personagens da Corte, se a mão da soberana, trocando o cetro pela pena, a empunhasse, não como derivativo de saudade amarga, mas como um instrumento que tudo revolve em busca da Verdade!

O livro de uma rainha tem de ser nublado pelos preconceitos e as conveniências. Muitas linhas teriam sido riscadas, quando, deixando de ser álbum íntimo, esse confidente discreto passou a ser livro publicado.

Todavia, o que naturalmente o torna encantador, é a sua essência, a expansão ingênua da felicidade ao alcance de qualquer...

Talvez tivesse sido esse o segredo da popularidade da rainha. O povo ama os simples e reverencia, sobre todas, as qualidades do coração.

Não tardará que essas virtudes decantadas, atravessem contos ingleses e canções idílicas, como embrião de formosas e futuras lendas. O tocante episódio da oferta de um brinquedo a filha de um camponês, anos depois de feita a promessa, interrompida por viagens e altas preocupações de estado, servirá de assunto magnífico para histórias do Natal, em que as crianças que hão de vir, antes de conhecer a rainha da História, comecem a amar a mulher do conto...

Assim, a rainha bem amada, surgirá em várias páginas, conduzida pelas mãos daquele a quem ela se associou, chamando-se escritora.

Eu quisera, sempre a exigência da perfeição! Que, para a apoteose de tão clara e amorosa existência, a velha Rainha da Inglaterra e Imperatriz das Índias, soerguendo-se no leito de morte, com o esforço supremo da sua vontade soberana, tivesse pedido aos seus ministros e ao novo rei, seu filho, a terminação da guerra sul-africana.

Dizem que do mal desta guerra se finou a velha senhora. Quero crê-lo; e só assim concebo a suavidade da sua morte.

A dor, que não pôde ser expressa, por conveniências e por orgulhos de Estado, e que ficou abafada no último suspiro, deve vibrar agora, como um remorso na consciência dos que a provocaram.

Triste, o brilhante destino dos reis, que nem os deixa morrer como os demais cristãos: perdoando!

A alma da rainha-imperatriz muito se mostrara ao seu povo para que ele não a conhecesse. Com a percepção aguda do instinto, ele lê nela como em um livro: por isso afirma que era infinito o desgosto da sua soberana ao fechar os olhos para o último sono.

Era infinito o seu desgosto; mas, se em vez de oitenta anos a Rainha Victoria tivesse quarenta, teria sabido morrer de outra maneira.

Então, o rumor surdo das armas em combate, descansando no solo ainda fumegante da batalha, soaria mais alto que todas as orações e que todos os sinos das abadias e das catedrais. Esse devia ter sido o último sonho da Rainha.

Advinhando-o, todo o seu povo se cobre de luto sincero, os jardins do Reino despojam-se das suas flores, e as viúvas e os órfãos não a amaldiçoam.

As virtudes altíssimas do seu espírito e do seu caráter são mencionadas em todas as línguas da Terra; o telégrafo espalha o seu nome pelo mundo inteiro, e há em todo este movimento um respeito singular e profundo pela mulher cujo conselho, cuja prudência e cujo acerto, desenvolveram, ampararam e enriqueceram a mais poderosa nação do Globo, e que afinal, morre calada e triste, por não poder realizar o seu último sonho!

Fonte:
Júlia Lopes de Almeida. Livro das Donas e Donzelas. Belém/PA: Núcleo de Educação a Distancia da Universidade da Amazonia (UNAMA).

Tarcísio Fernandes (Redação de uma Criança)


I

Sou o sonho e a ansiedade
e o projeto de um casal
que, de um ato sexual,
me tornou realidade,
prova de fertilidade,
o prazer da gestação,
nove meses de tensão,
uma vida despontando,
ou um que vem chegando
numa nova geração..

II

Sou assim como o começo
de uma longa caminhada,
como porta escancarada
ou produto sem ter preço;
como início de endereço
de uma rua em projeção;
como alguém, na multidão,
procurando se encontrar;
como a base ou um pilar
de algum prédio em construção.

III

Tenho um quê de dependência,
apesar de impetuoso.
Vez por outra sou teimoso,
mas me sinto obediência.
Sou um ser que tem carência
e também sou incompleto;
nem ao menos fiz projeto
pra viver o meu futuro;
também sou meio inseguro,
Sonhador e irrequieto.

IV

Não dou bolas para azar,
só viver já me conforta;
e se alguém me "abre uma porta",
aproveito para entrar.
Explorando esse lugar,
centralizo as atenções,
e, me achando com razões,
vou de encontro à disciplina,
pois não gosto de rotina
nem tampouco de padrões.

V

Faço birra se o que eu vejo
para mim, chama a atenção;
não aceito ouvir um não
para aquilo que eu desejo.
Aproveito todo ensejo
para usar a minha idade.
Tudo, em mim, é só verdade;
só o agora me interessa;
pra viver não tenho pressa,
quero, apenas, liberdade.

VI

Nasço, cresço, vivo, morro,
vejo, quero, peço, imploro,
subo, desço, caio e choro,
canto, rio, dou esporro.
Pulo, brinco, jogo, corro,
paro, sento e me levanto.
Meio sonso, meio santo,
entro, saio, vou pro meio,
obedeço ou esperneio
me amuando num recanto.

VII

Tento me virar sozinho
para ver se a vida ensina;
e, se alguém me recrimina,
põe mais pedra em meu caminho.
Se, ao contrário, dá carinho,
ao invés de repressão
e me ajuda, dando a mão,
adquiro confiança
e me sinto a esperança
desse velho mundo cão.

VIII

Quero ser eu de verdade;
quero um não sem lero-lero;
quero ter tudo que eu quero;
quero usar minha vontade.
Quero minha liberdade;
quero dar mais confiança;
quero ser a esperança;
quero ser bem educado;
quero amar e ser amado;
quero, apenas, ser criança.

Fonte:
Helóisa Crespo (organização e programação visual). Ciranda “Criança em Versos”. Campos dos Goytacazes/RJ: 2011. Livreto enviado pela autora

Denise Stucchi (No Caderno de Contar a Vida)


19 de setembro de 1999, Domingo, 11h00.

Acho que gosto dos domingos. Pode-se dormir até tarde, ler um jornal que não acrescenta nada à existência de ninguém, olhar com mais cuidado o grande cachorro negro que dorme sobre o tapete, beber devagar o café. Fumar um cigarro sinceramente. Depois, é o vazio. O telefone não toca, o banco não abre, o carteiro não vem, caminha-se pela casa, sem expectativas. Inventam-se problemas que não podem ser resolvidos, hoje é Domingo, afinal. Chove muito — o sol na cidade é para os dias úteis, como se sabe — e não existe perspectiva nenhuma do lado de fora desta janela.

Então, vem a inevitável introspecção, depois da madrugada com os amigos, muitos passaram pela casa hoje silenciosa. O cão, exausto de tanto movimento, fareja a marca dos pés sobre o assoalho antes encerado. Depois de tanta expansão, o corpo quer de novo a sua concha, conteúdo, não mais continente.

Deve ter sido a leitura do poema de Yeats, o fascínio daquilo que é difícil, chama-se. Perseguem-me os versos finais, juro que puxo a tranca da porteira antes que novo dia tenha início.

E nesse Domingo ainda com resíduos do inverno, o supermercado da semana já feito, nenhum ruído humano em volta — com a chuva nem a pelada dos meninos na rua aconteceu — fica-se assim, pensando em si mesmo sem a costumeira condescendência, aquela que na Sexta-feira nos embriagava absolutamente.

20 de setembro de 1999, Segunda-feira, 23h20.

Dia da consulta com F., o homeopata. Sentei-me à sua frente, escolhendo pela primeira vez a cadeira da esquerda. Como para lhe mostrar, com o meu corpo, que agora eu estava em outro lugar, diferente. Que daquela vez não vinha para me lamentar ou brigar, que ali estava porque dolorosamente as ilusões todas estavam me abandonando. Sentia-me como aquele homem que, no fim de semana, me falara tão triste e docemente sobre a sua finitude. A indignação, companheira de toda uma vida, fora substituída pelo sentimento que tão obstinadamente me recusou até que, sem mais propósito, se foi a indignação, deixando em seu lugar a verdade. Que acabou me colocando neste lugar diferente, num encontro quase insuportável com esse meu eu tão triste, impotente. Débil, dissera sobre mim o homem doce.

Hoje o médico e eu começamos a inventar uma nova língua, criando palavras que conectam reciprocamente o meu mundo ao mundo dele e os dois a uma imagem só: Staphygaria CH30, para celebrar a comunhão das almas que naquele momento se fez.

21 de setembro de 1999, Terça-feira, 0h00.

Veio o meu amigo músico, S.: pontualmente, para o café da hora do Ângelus.

Veio naquele seu carro muito velho, onde tudo é barulho, senti antes sua presença, escutando na rua o tremor do escapamento temerariamente suspenso.

No banco traseiro, o violino embrulhado em uma capa rota e suja e o saxofone — impressionante relíquia — fazendo companhia a uma edição bolsillo de Cortázar. El Perseguidor é a sua história predileta. Meu amigo in blue.

Mais tarde, sozinha, descubro repentinamente que estou pobre. Dentro de mim não repercute saudade por ninguém. Ou vai ver a pobreza se fez pela ausência prolongada de tantos queridos. Não sei mais quem sou gostando dessa que ainda não conheço. Não é tão ruim, afinal. Estando pobre, sempre posso enriquecer.

O poeta estava dizendo das coisas poderosas e permanentes, mas o poeta não falava de gente, falava da água e do vento.

22 de setembro de 1999, Quarta-feira, 16h00.

Dia de folga, hoje, de tomar café toda hora, só comer fruta, ligar e desligar a TV — um horror, uma delícia — conversar com o cão. Larguei num canto o tapete, não agüentava mais tecer tanto azul. Acabei, até que enfim, aquele mural enorme para a parede do escritório, forrei de preto. Coloquei fotos das crianças, afilhados e agregados, escolhendo aquelas de uma época em que não sofriam tanto como sofrem hoje. Tem reprodução do Portinari — O menino morto.

Tem um símbolo quântico que o meu filho leão fez no computador. Tem Clarice, Adélia Prado, Hilda Hilst, Cortázar, Otavio Paz, Calvino, Scorsese, Coppola...Tem Betinho, que nunca morre. Uma reprodução do Kieffer sobre o Holocausto — belíssima alegoria. Cenas no metrô. Um mapa do mundo segundo Carlos Magno e uma paisagem do Hopper. Um recorte do navegador, "o pior tipo de naufrágio é não partir". Família, por Egon Schiele. "Un rifugio nascosto dove il tempo sembra essersi fermato", inscrição gravada sobre uma casa de pedras no interior da Itália. Tem o meu amor na praia usando chapéu panamá...

23 de setembro de 1999, Quinta-feira, 7h00.

Jantei com M., ontem. Já faz quase meio século que nos conhecemos, primas-irmãs, com poucos meses de diferença de idade. Toda vez que nos encontramos — depois de tantos anos de separação — fico nostálgica. Se ela tivesse sido a irmã que nunca tive, talvez, talvez...teríamos ajudado a melhorar um pouco este mundo de merda...ou mandado de volta para o inferno esse ódio ancestral que escurece os corações das mulheres de nossa família...faríamos de nossas mães duas velhinhas orgulhosas de suas filhas, colos imensos e insaciáveis para os seus netos, nossos filhos...teríamos cuidado da imensa dor — esse legado que destruiu a alma da L. — convencendo-a de que, ao contrário do que ela imagina, essa dor veio para fazer dela uma deusa e não uma bruxa...teríamos trocado receitas, confidências sobre amantes e maridos, nos consolaríamos uma a outra pela nossa orfandade paterna...compartilharíamos amigos...eu ensinaria a ela o amor pelo conhecimento, a beleza de um museu, a devoção aos orixás...ela me ensinaria a rir, a beber, a dançar, a confiar sem medo. Quem foi mesmo que disse que a vida é uma série de tentativas fracassadas?

24 de setembro de 1999, Sexta-feira, 8h00.

Já é primavera, mas o dia amanheceu iluminado e frio, como "um perfeito dia de maio". Não sei se tomo banho antes de começar, passo um sal grosso, acendo um incenso, sei lá.

14h30.

A tarde está cinza, de vento gelado, prometendo madrugada de insônia agasalhada por meias e cobertores. Vem a lembrança de um amigo aqui nesta sala lendo em voz alta Virginia Woolf e da palavra OBLÍQUA saindo de sua boca.

20h00.

Estava meio — bem, bastante — reticente, mas aí comecei a escavar, segura de que sobrou para mim um pouco da matéria imaginante, poética, da cota destinada à humanidade. Está tudo indo bem.

A água para o café começa a chiar sobre a chaleira do fogão: hoje, vou bebê-lo sozinha.

25 de setembro, Sábado, 23h20.

Cadê a alegria que estava aqui Segunda, Terça, Quarta, Quinta, Sexta? Cadê o amorosamente tocar a flor amarela, o rosto magro do homem, as cobertas sobre a cama, o corpo amaciado pelo creme? Quero dizer que o amor nunca acabou, não preciso, ele já sabe. Quero dizer que dói, ele sabe, mas não entende. É que ele o amor veio como uma onda imensa e quase me afogou e me deixou exausta. Ontem foi que eu senti a exaustão e perdi o controle sobre aquela coisa mansa e harmoniosa que construímos para viver a semana. Vai ver eu pensei que ele o amor fosse imenso demais para esse homem, vai ver eu me senti desnecessária como diz a Felipa, "mulher é desdobrável, eu sou.". De tanto desdobrar fiquei um lixo, pedaço de papel sem serventia, mulher estranha e incomunicável, eu, a mulher de tantas palavras. Não desisto. Vou acender velas e mais velas, debaixo do chuveiro cantarei todos os mantras, o perfume do incenso entrando nas narinas sândalo jasmim canela derretendo as couraças de uma vida inteira?

26 de setembro, Domingo, 18h00.

Os pássaros já se recolheram. Os cachorros estão alimentados. Alguma coisa acaba para sempre aos domingos. Não sei o quê.
===========
Denise Stucchi
Paulista da Capital, hoje morando em Florianópolis, Santa Catarina. Escrevendo desde sempre, somente a partir da metade da sua vida veio a decisão de compartilhar seus manuscritos. Tem poema — "Memorial" — publicado no primeiro número da revista carioca POESIAS.
Recebeu a primeira colocação no concurso Escritores do Cone Sul da Editora Litteris, em 2000 com este "No caderno de contar a vida".
Escreveu "De conversa com Felipa", livro onde troca impressões com a personagem central da obra de Adélia Prado, "Manuscritos de Felipa".

Fonte:
http://nocadernodecontarvida.blogspot.com/

Cruz e Souza (O Livro Derradeiro) Parte XIII


CAMPESINAS

I

Camponesa, camponesa,
Ah! quem contigo vivesse
Dia e noite e amanhecesse
Ao sol da tua beleza.

Quem livre, na natureza,
Pelos campos se perdesse
E apenas em ti só cresse
E em nada mais, camponesa.

Quem contigo andasse à toa
Nas margens duma lagoa,
Por vergéis e por desertos,

Beijando-te o corpo airoso,
Tão fresco e tão perfumoso,
Cheirando a figos abertos.

II

De cabelos desmanchados,
Tu, teus olhos luminosos
Recordam-me uns saborosos
E raros frutos de prados.

Assim negros e quebrados,
Profundos, grandes, formosos,
Contêm fluidos vaporosos
São como campos mondados.

Quando soltas os cabelos
Repletos de pesadelos
E de perfumes de ervagens;

Teus olhos, flor das violetas,
Lembram certas uvas pretas
Metidas entre folhagens.

III

As papoulas da saúde
Trouxeram-te um ar mais novo,
Ó bela filha do povo,
Rosa aberta de virtude.

Do campo viçoso e rude
Regressas, como um renovo,
E eu ao ver-te, os olhos movo
De um modo que nunca pude.

Bravo ao campo e bravo a seara
Que deram-te a pele clara
São rubores de alvorada.

Que esses teus beijos agora
Tenham sabores de amora
E de romã estalada.

IV

Através das romãzeiras
E dos pomares floridos
Ouvem-se as vezes ruídos
E bater d’asas ligeiras.

São as aves forasteiras
Que dos seus ninhos queridos
Vêm dar ali os gemidos
Das ilusões passageiras.

Vêm sonhar leves quimeras,
Idílios de primaveras,
Contar os risos e os males.

Vêm chorar um seio de ave
Perdida pela suave
Carícia verde dos vales.

V

De manhã tu vais ao gado
A cantar entre as giestas,
Com tuas graças modestas,
Correndo e saltando o prado.

E a veiga e o rio e o valado
Que todos dormem as sestas
Acordam-se ante as honestas
Canções desse peito amado.

As aves nos ares gozam,
Entre abraços se desposam,
No mais amoroso enlace.

E as abelhas matutinas
Que regressam das boninas
Voam, te em torno da face.

VI

As uvas pretas em- cachos
Dão agora nas latadas...
Que lindo tom de alvoradas
Na vinha, junto aos riachos.

Este ano arados e sachos
Deixaram terras lavradas,
À espera das inflamadas
Ondas do sol, como fachos.

Veio o sol e fecundou-as,
Deu-lhes vigor, enseivou-as,
Tornou-as férteis de amor.

Eis que as vinhas rebentaram
E as uvas amaduraram,
Sanguíneas, com sol na cor.

VII

Engrinaldada de rosas,
Surge a manhã pitoresca...
Que linda aquarela fresca
Nas veigas deliciosas!

Que bom gosto e perfumosas
Frutas traz, madrigalesca
A rapariga tudesca
Que vem das searas cheirosas!

Como os rios vão cantando,
Em sons de prata, ondulando,
Abaixo pelos marnéis!

Que carícia nas verduras,
Que vigor pelas culturas,
Que de ouro pelos vergéis!

VIII

Orgulho das raparigas,
Encanto ideal dos rapazes,
Acendes crenças vivazes
Com tuas belas cantigas.

No louro ondear das espigas,
Boca cheirosa a lilazes,
Carne em polpa de ananases
Lembras baladas antigas.

Tens uns tons enevoados
De castelos apagados
Nas eras medievais.

Falta-te o pajem na ameia
Dedilhando, a lua cheia,
O bandolim dos seus ais!

IX

No campo santo
Morreste no campo um dia,
Como uma flor desprezada.
Clareava a madrugada

Azul, vaporosa e fria.
Sobre a agreste serrania,
Numa ermida branqueada
Por uma manhã doirada
Um sino repercutia.

Teu caixão, de camponesas
E camponeses seguido,
Desceu abaixo às devesas.

Ganhou o atalho comprido
De casas em correntezas
E entrou num campo florido.

NA VILA

Nos ervaçais vibrou o sol agora,
Nas fitas verdes dos canaviais...
Como rompesse loura e fresca a aurora
Agora o sol vibrou nos ervaçais.

Murmurejam de alegres os caminhos
Que até parecem, límpidos, cantar
Na música melódica dos ninhos
Que vai nos ares se cristalizar.

Floresce tudo, em toda parte flores
Neste maio feliz, e tão feliz
Que as plantas exuberam de vigores
Desde a profunda, pródiga raiz.

Noivam as aves junto dos riachos
No seu alado alvorecer de amor;
E o coqueiral, com os amarelos cachos,
Pompeia de riquíssimo verdor.

Fluem na sombra meigas fontes claras
Sob o frondente e vasto laranjal
E para além magníficas searas
Se estendem como um leito virginal.

Na serena paz vegetativa
Faz docemente tudo adormecer
Mas num sono de luz doirada e viva,
Quase a dormência de quem vai morrer...

Ah! que o silêncio, a solidão dos ermos,
Das agrestes paragens do sertão
Se dão saúdes a espíritos enfermos
Também supremas nostalgias dão!

A volúpia letal do meio-dia,
Nas horas encalmadas, sob a luz,
Dá duma campa a atroz melancolia
Assinalada numa simples cruz.

Depois o campo na mudez da vila,
Aquela eterna e soberana paz
Da imensa vastidão sempre tranqüila
Como que punge e que entristece mais!

Fonte:
Cruz e Sousa, Poesia Completa, org. de Zahidé Muzart, Florianópolis: Fundação Catarinense de Cultura / Fundação Banco do Brasil, 1993.

Monteiro Lobato (Reinações de Narizinho) O Sítio do Picapau Amarelo IV – As formigas ruivas

IV
As formigas ruivas

Só depois de comer o peixe frito é que Narizinho se lembrou da pobre boneca, encharcada pelo banho no rio.

— A coitada!... É bem capaz de apanhar pneumonia...

E foi correndo cuidar dela. Despiu-a e pô-la num lugar de bastante sol. Dum lado estendeu suas roupinhas molhadas e do outro, a pobre Emília nua em pêlo. E já ia retirar-se quando a boneca fez cara de choro.

— Eu aqui não fico sozinha!...

— Por que, sua enjoada? Tem medo que o leitão venha espiar esses cambitos magros?

— Espiar não é nada, mas ele é capaz de me comer. Tia Nastácia diz que Rabicó devora tudo o que encontra.

— Nesse caso, penduro você na árvore.

— Isso também não! — protestou Emília. — Alguma vespa pode me ferrar.

— Boba! Não sabe que vespa não ferra pano?

— Mas se eu cair com o vento?

— Grande coisa! Boneca de pano quando cai não se machuca. Eu é que não posso ficar neste sol tirano à espera de que a excelentíssima senhora condessa de Três Estrelinhas seque! Quem mandou molhar-se?

— Mal agradecida! Se não fosse a minha molhadela você não comia a traíra.

— Está pensando que era uma grande coisa a tal traíra? Só espinho...

— É, mas você comeu-a com espinho e tudo. e até lambeu os beiços.

— Lábios, aliás. Beiço é de boi. Comi porque quis, sabe? Não tenho que dar satisfações a ninguém, ahn! — e Narizinho pôs-lhe a língua.

Emburraram ambas. Narizinho, porém, ficou, porque lá no íntimo estava com receio de deixar a boneca sozinha.

Fazia um sol quente e parado. Nas árvores, um ou outro tico-tico só; e no chão, só formiguinhas ruivas.

Para matar o tempo a menina pôs-se a observar o corre-corre delas, esquecendo a briga com a boneca.

— Já reparou, Emília, como as formigas conversam? Que pena a gente não entender o que dizem...

— A gente é modo de dizer — replicou Emília — porque eu entendo muito bem o que dizem.

— Sério, Emília?

— Sério, sim, Narizinho. Entendo muito bem e, se você ficar aqui comigo, contarei todas as historinhas que elas conversam. Repare. Vem vindo aquela de lá e esta de cá. Assim que se encontrarem, vão parar e conversar.

Dito e feito. As formiguinhas encontraram-se, pararam e começaram a trocar sinais de entendimento.

— Fiquei na mesma! — disse a menina.

— Pois eu entendi tudo, — declarou a boneca. -A que veio de lá disse: “Encontrou o cadáver do grilinho verde”? A que veio de cá respondeu: “Não”! A de lá: “Pois volte e procure perto daquela pedra onde mora o besouro manco.” Esta formiga que dá ordens deve ser alguma dona-de-casa lá do formigueiro. E repare seus modos de mandona; está sempre a entrar e sair do buraquinho, como quem dirige um serviço. A outra com certeza é uma simples carregadeira.

Havia de ser isso mesmo, porque logo depois chegou uma terceira, muito apressada, que cochichou com a mandona e lá se foi mais apressada ainda.

— Que é que disse esta? — perguntou Narizinho.

— Disse que haviam descoberto uma bela minhoca perto da porteira, mas que precisavam de ajutório para conduzi-la.

— Emília, você esta me bobeando! — exclamou a menina desconfiada. — Vou ver, e se não for verdade você me paga. Espere aí...

E disparou em direção da porteira. Procura que procura, logo achou em certo ponto uma pobre minhoca corcoveando com várias formiguinhas ferradas no seu lombo.

Teve vontade de libertar a prisioneira, mas a curiosidade de ver o que aconteceria foi maior — e deixou a triste minhoca entregue ao seu trágico destino.

Novas formiguinhas foram chegando, que de um bote — zás!... ferravam a minhoca sem dó. Não demorou muito e já eram mais de vinte. A minhoca bem que espinoteou; por fim, exausta, foi moleando o corpo até que morreu bem morrida. As formiguinhas então principiaram a arrastá-la para o formigueiro.

Que custo! A minhoca era das mais gordas, pesando umas sete arrobas — arrobinhas de formiga, e além disso ia enganchando pelo caminho em quanto pedregulho ou capim havia; mas as carregadeiras sabiam dar volta a todos os embaraços.

Depois de meia hora de trabalheira deram com a minhoca na boca do formigueiro. Aí, nova atrapalhação. Por mais que experimentassem, não houve jeito de recolhê-la inteira. Nisto apareceu a formiga mandona. Examinou o caso e deu ordem para que a picassem em vários roletes.

Aquilo foi zás-trás! Em três tempos fez-se o serviço e os roletes de carne foram levados para dentro.

— Sim, senhora! — exclamou a menina depois de terminada a festa. — É o que se pode chamar um trabalho limpo! O demo queira ser minhoca neste pomar...

— Bem feito! — disse Emília. — Quem a mandou ser abelhuda?

Se estivesse com as outras lá dentro da terra, que é o lugar das minhocas, nada lhe aconteceria. Macaco que muito mexe quer chumbo, como diz tia Nastácia.

Isso, foi de dia. De noite a história das formigas continuou.

Narizinho e Emília dormiam juntas na mesma cama. A rede armada entre pés de cadeira fora abandonada desde que a boneca aprendeu a falar. Dormiam juntas para conversar até que o sono viesse.

— Mas, Emília, como é que você entende a linguagem das formigas? — perguntou Narizinho logo que se deitou.

A boneca refletiu um bocado e respondeu:

— Entendo porque sou de pano.

Narizinho deu uma gargalhada.

— Isso não é resposta duma senhora inteligente. O meu vestido também é de pano e não entende coisa nenhuma.

A boneca pensou outra vez.

— Então é porque sou de macela — disse.

Nova risada de Narizinho.

— Isso Também não é resposta. Este travesseiro é de macela e entende as formigas tanto quanto eu.

— Então... então... engasgou Emília, com o dedinho na testa. Então não sei.

Era a primeira vez que Emília se embaraçava numa resposta. Primeira e última. Nunca mais houve pergunta que a atrapalhasse.

— Pois se não sabe, durma — disse a menina, virando-se para a parede.

Dormiram ambas.

Altas horas, estavam no mais gostoso do sono quando bateram — toc, toc, toc...

— Quem é? — perguntou Narizinho sentando-se na cama.

— Sou eu, Rabicó! — grunhiu o leitão entreabrindo a porta com o focinho. — Está aqui uma senhora ruiva que quer entrar.

— Pois que entre! — ordenou a menina. Rabicó escancarou a porta para dar passagem a uma formiga ruiva, de saiote vermelho e avental de renda. Trazia na cabeça uma salva de prata, coberta com guardanapo de papel.

— Que é que deseja? — indagou a menina cheia de curiosidade.

— Quero entregar à senhora Condessa este presente mandado pela rainha das formigas.

— Condessa? — repetiu Narizinho franzindo a testa. – Que condessa, minha senhora?

— Condessa de Três Estrelinhas — explicou a formiga.

— Hum! — fez a menina, lembrando-se de que ela mesma havia “condessado” a boneca.

Voltou-se para Emília e deu-lhe uma cotovelada.

— Acorde, pedra! É com Vossa Excelência o negócio.

Emília sentou-se na cama. Espreguiçou-se, tonta de sono. E julgando que ainda estivessem a conversar sobre a linguagem das formigas, disse, num bocejo:

— Então é... é porque sou...

— Não se trata mais disso, idiota! Está aí à procura duma tal condessa a criada duma tal rainha. Vamos! Acorde duma vez!

Só então Emília acordou de verdade. Viu a formiga com a salva e espichou os braços para receber o presente. Eram croquetes, lindos croquetes tostadinhos.

A boneca sorriu de gosto e orgulho. A rainha só se lembrara dela!

— Diga a Sua Majestade que a condessa de Três Estrelinhas muito agradece o presente. Diga que os croquetes estão lindos e que ela é uma grande cozinheira.

Narizinho disparou a rir gostosamente.

— Que idéia, condessa! Uma rainha lá pode ser cozinheira?

Caindo em si, Emília viu que tinha cometido uma coisa muito grave entre as pessoas de alta sociedade, chamada “gafe”. E procurou corrigir-se.

— Isto é... diga que a cozinheira dela é muito boa, entendeu? E diga também que os croquetes estão muito gostosos, isto é... devem estar muito gostosos. Pode ir.

A criada fez um cumprimento de cabeça antes de retirar-se, mas foi detida por um gesto da menina.

— Não vá ainda — disse ela. E voltando-se para a Emília: — Presente, senhora condessa, paga-se com presente. Mande à tal rainha uma perna daquele pernilongo que queimei com a vela antes de deitar.

— É verdade! — exclamou a boneca. — Não me custa nada e ela vai ficar contentíssima.

E pôs-se de gatinhas a procurar o pernilongo assado. Achou-o, tirou-lhe uma perninha, enfeitou-a com um laço de fita e, depois de embrulhá-la em papel de seda, colocou-a na salva, com um cartão que dizia assim:

“À Sua Majestade a Rainha da Cintura Fina, a humilde criada Condessa de Três Estrelinhas oferece este humilde presente.”

— Leve este presente à rainha, sim? E você, para distrair-se pelo caminho vá comendo este mocotó de pernilongo – concluiu Emília, dando à criada um cambito de inseto.

A mensageira agradeceu, retirando-se muito satisfeita da vida, com a salva na cabeça e o mocotó no ferrão.

Emília fechou a porta e veio examinar os croquetes. Cheirou-os.

— Hum! Estão de fazer vir água à boca. Quer provar um, Narizinho?

A menina torceu o nariz desdenhosamente.

— Deus me livre! Juro que é croquete de minhoca.

Percebendo que ela falava assim por despeito, a boneca disse, para moê-la:

— Quem desdenha quer comprar...

— Só? Engraçadinha!... replicou a menina com um grande ar de pouco caso. E vendo a boneca morder um dos croquetes, com os maiores exageros do mundo, como se aquilo fosse um manjar do céu, fez muxoxo de nojo.

— Está boa mesmo para casar com Rabicó! Comer croquete de minhoca!

— Que seja de minhoca, que tem isso? — retrucou Emília. Tanto faz carne de minhoca como de porco, vaca ou frango — tudo é carne. E muito me admira que uma senhora que comeu ontem no jantar tripa de porco, mostre essa cara de nojo por causa dum simples croquete de minhoca.

— Alto lá, senhora condessa Minhoqueira! Porco é porco e minhoca é minhoca.

— É “por isso mesmo” que eu como minhoca e não como porco! — replicou a boneca vitoriosa. — Não sou porcalhona.

A discussão foi por aí além. Enquanto isso o senhor Rabicó farejou os croquetes, chegou-se de mansinho e, vendo-as distraídas com a disputa, comeu-os todos de uma engolida só. Terminada a discussão, quando a boneca, espichou o braço a fim de pegar um segundo croquete...

— Que é dos croquetes? — gritou ela.

Nem sinal! Emília esperneou de ódio, ao passo que Narizinho batia palmas de contentamento.

— Bem feito! Estava muito ganjenta, não é? Pois tome!

— Quero os meus croquetes! Quero os meus croquetes! — berrava Emília, batendo o pé num grande desespero.

— Se quer os seus croquetes, peça contas a quem os tirou.

— Quem foi?

— Quem mais se não Rabicó? Vai ver que está aqui pelo quarto, escondido debaixo da cama.

Emília deu busca e logo descobriu o ladrão num canto, ressonando de papo cheio.

— Espere que te curo! — gritou ela, passando a mão na vassoura. E pá! pá! pá!... desceu a lenha no lombo do gatuno, enquanto Narizinho se rebolava na cama de tanto rir, pensando consigo: “Se antes de casar é assim, imagine-se depois!”

Isso porque ela andava alimentando o projeto de casar Emília com Rabicó.
–––––––––
Continua... Pedrinho

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

57a. Feira de Livros de Porto Alegre (Programação de 7 de novembro, segunda-feira)


O Autor no Palco
07/11/2011 - 09:00
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

Mostra do Programa de Leitura Adote um Escritor
07/11/2011 - 09:00

Encontro com autor
07/11/2011 - 10:30

O Autor no Palco
07/11/2011 - 10:30
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

A Arte Levada a Sério
07/11/2011 - 10:30
Apresentação dos alunos do município de Caraá

Oficina: Crítica Literária
07/11/2011 - 14:00
Apresentação expositiva, leitura e discussão de textos e prática de crítica literária. Módulo 1/3

Encontro com autor
07/11/2011 - 14:00

Sessão de Autógrafos
07/11/2011 - 14:00
Apresentação do projeto comunitário "Comunicar, desenvolver, crescer"

O Autor no Palco
07/11/2011 - 14:00
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

A Arte Levada a Sério
07/11/2011 - 14:00
Pequenos e Grandes Escritores - Escola Salvador Jesus Cristo do município de Alvorada

Oralidade e escrita e o papel da ancestralidade
07/11/2011 - 14:30
Caminhos da cidadania cultural

Tenda.doc: Vozes de Moçambique, um paralelo com o Brasil
07/11/2011 - 14:30
O documentario constrói uma ponte afetivo-literária entre os dois países. Depoimentos de Mia Couto,Domi Chirongo,Paulina Chiziane,Sangare Okapi,Ruy Guerra. Direção de Yanna Campos

A menina do farol - Um pedaço de pão
07/11/2011 - 15:00

Menina Bonita do Laço de Fita, de Ana Maria Machado
07/11/2011 - 15:30
Contação de Histórias

Encontro com autor
07/11/2011 - 15:30

Cine SESC
Exibição do filme Azur e Asmar
07/11/2011 - 15:30

O Autor no Palco
07/11/2011 - 15:30
Encontro de escritores e ilustradores com alunos do ensino fundamental

A Arte Levada a Sério
07/11/2011 - 15:30
João e o Misterio da Mansão - Grupo Cemiterium Iniciante

Belladonna
07/11/2011 - 15:30

Afrodescendência e ensino
07/11/2011 - 16:00
Seminário sobre a Lei 10639/03, que torna obrigatório o ensino da história da África e dos afrodescendentes no currículo escolar

Oficina: Introdução à arte de escrever
07/11/2011 - 16:00

Iniciação à arte da escrita, visando despertar o processo criativo e transmitir técnicas de aperfeiçoamento. Módulo 1/3

Poeta maior de Moçambique
07/11/2011 - 16:00
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II Seminário Nacional de Crítica e Literatura - Literatura em Trânsito: Brasil / África
07/11/2011 - 16:30
Viagem pelo nosso mútuo conhecimento

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07/11/2011 - 17:30
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07/11/2011 - 17:30

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Ao infinito e além: A Midiateca como um Novo Cenceito de Leitura
07/11/2011 - 18:00

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Um trem para a Suíça
07/11/2011 - 18:30

O Tatu
07/11/2011 - 18:30

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Concursos: Faça sem medo
07/11/2011 - 18:30

Oficina: do livro - o livro passo a passo
07/11/2011 - 19:00
Dicas e orientações para produção de um livro. Módulo 1/3

Cine Santander Cultural
07/11/2011 - 19:00
Sessão Comentada

Encontro na cidade de pedra
07/11/2011 - 19:30

No último minuto/Vida do jogador Escurinho
07/11/2011 - 19:30

Entre Brasil e África
07/11/2011 - 19:30

Antologia de Poesia Afro-Brasileira
07/11/2011 - 19:30

Cordão da Saideira: Sarau Bem Black
07/11/2011 - 20:00
Edição do sarau que acontece semanalmente há dois anos no Pelourinho, onde a poesia produzida pela juventude negra das periferias de Salvador ganha voz

Encontro com Cleiton Amorim
07/11/2011 - 20:00

Fonte:
http://www.feiradolivro-poa.com.br/