quarta-feira, 24 de abril de 2024

Irmãos Grimm (O violino maravilhoso)


Era uma vez um homem muito rico, mas muito avarento, que tinha como criado um rapaz honesto e ativo, como não haverá muitos. Todas as manhãs, o moço se levantava ao romper da aurora e só se deitava ao último cantar do galo.

Quando havia algum trabalho mais penoso, ante o qual todos recuavam, o rapaz fazia-o, contente, satisfeito e sem sombra de azedume.

Logo que acabou o primeiro ano de permanência na casa do avarento, que não estipulara soldo, não recebeu um ceitil (tipo de moeda) de paga, pensando de si para si que o moço, não tendo dinheiro, não tentaria outra colocação. O rapaz calou-se e continuou a trabalhar como antes, e ao cabo de dois anos, o avarento nada deu, o rapaz permaneceu no seu mutismo.

Ao fim do terceiro ano, o rico, espicaçado pela consciência, meteu a mão no bolso para remunerar o criado fiel, mas, raciocinando, arrependeu-se e tirou a mão vazia. O rapaz exclamou então:

— Patrão servi-o três anos o melhor que me foi possível; agora quero ver mundo e por isso peço que me pague as moedas que me deve.

— Tens razão! — respondeu o rico avarento — Fiquei sempre muito satisfeito com o teu trabalho e a tua boa-vontade, e por isso vou remunerar-te como mereces. Aqui tens três escudos novos; é um por cada ano que me serviste.

O rapaz, que andava sempre alegre e que era de uma grande simplicidade no que respeitava a dinheiro, julgou ter recebido uma fortuna que lhe permitiria viver vida folgada por largos anos.

Disse adeus ao antigo patrão e foi-se embora, atravessando montes e vales, cantando, saltando e alegre que nem um passarinho.

Ao acercar-se de um monte, viu sair um velhinho muito curvado que lhe gritou:

— Olá, companheiro, não pareces levar em conta os pesares à tua vida?!

— Que ganho eu em me apoquentar? — retorquiu o moço — Tenho na algibeira o soldo de três anos de trabalho.

— E a quanto monta essa fortuna?

— A três escudos novinhos, muito luzidios. Olha, sinto-os tilintar, quando lhes toco com as mãos.

— Ora ouve cá — tornou o gnomo, de bom coração como se vai ver. – Eu estou muito velhinho, e forças para trabalhar já não tenho; tu, que és novo e forte, estás ainda em bom tempo de ganhares a vida.

O rapaz, que era de boa índole, apiedou-se do velho gnomo e fez-lhe presente dos três preciosos escudos que tanto prazer lhe davam.

— Como és generoso — expressou-se então o gênio bom em figura de gnomo — dou-te licença para que me peças três coisas que são a paga dos teus três escudos.

— Então, pois sim! — fez o rapaz incredulamente — Isto que tu queres fazer é só do domínio das fantasias para entreter crianças. Mas, enfim, sempre quero experimentar. Desejo então: uma espingarda que acerte logo no que eu mire; um violino que tenha a virtude de forçar a todos bailar, quantos me ouçam e, finalmente, que toda e qualquer pessoa me conceda, sem mais nem menos, a graça que eu pedir.

— És modesto no pedir — retrucou o gnomo que, curvando-se, tirou do monte uma espingarda, e um bonito violino que se podia meter na algibeira. Aqui tens — continuou o gnomo ao os dar-lhe — e fica ciente de que serás servido sempre na primeira graça que solicitares.

O rapaz, jovialíssimo, continuou a sua rota. Depois de caminhar um bocado deparou-se-lhe um judeu, muito feio, com barbas de bode muito compridas e que estava absorto a ouvir o canto de uma avezinha.

— É extraordinário que um animal de tão pequeno talho, possua um trinado tão cheio. Quanto não daria eu para o ter engaiolado!

— Posso satisfazer o teu desejo — disse o rapaz que tinha ouvido as últimas palavras, e apontando a espingarda ao passarinho, este caiu atordoado em cima dos espinhos.

— Vá lá, seu maroto, vá lá buscar o passarinho.

— Tratas-me com crueldade — respondeu o judeu — mas não deixo de agradecer-te e vou apanhar a avezinha.

Em seguida meteu-se pelos espinhos custando-lhe a abrir caminho. De súbito o rapaz teve uma estupenda lembrança: principiou a tocar o violino. Logo o judeu ergueu as pernas e começou a saltar, a pular, a contorcer-se todo, ficando preso nos espinhos dos ramos, em que se achava e que lhe espicaçavam a cara, arrancando-lhe as barbas; ficou com o vestuário todo rasgado e a cara a escorrer sangue.

— Ai, ai! — lastimava-se o infeliz judeu — Sossega, aquieta-te, não toques mais nesse amaldiçoado instrumento, aqui não é lugar próprio para baile!

O azougado moço não fazia caso do pedido pensando com os seus botões:

— Este rabino esfolou tanto infeliz enquanto pôde, que é justo que seja esfolado agora!

E de novo tomou o violino tirando acordes mais ligeiros. O pobre judeu, forçado a acompanhar o compasso, pulava e saltava; a cara cada vez estava mais ensanguentada, o fato desfazia-se em farrapos e o pobre velho gemia de dor. De súbito gritou:

— Apieda-te de mim, pelas barbas de Abraão, que em paga te darei uma bolsa cheia de dinheiro que trago comigo.

— Alegras-me tanto com essa boa-nova que vou guardar o dinheiro. Antes, porém, quero dar-te os meus parabéns pela maneira graciosa e original por que danças! É uma perfeição!

O judeu então, entregando-lhe a bolsa que prometera, suspirou imenso, enquanto que o alegre moço continuou a andar, cantando. Quando já o não avistou, o rabino, não podendo conter o seu rancor, exclamou:

— Músico das dúzias, estás a dever comigo. Grande espertalhão! Hás de pagar-me a partida mais cara do que ossos!

Tendo com essa fala dado vazão ao seu ódio, seguiu por atalhos e alcançou a cidade mais próxima antes que o rapaz aparecesse. Uma vez lá, foi queixar-se ao juiz nestes termos:

— Venho aqui pedir justiça, senhor, para um maroto que me atacou, maltratou e roubou o que eu trazia. A prova de que não minto é olhar-me a maneira porque vem o fato e a minha cara. Forçou-me a dar-lhe a bolsa que trazia, cem moedas de ouro, que eram todo o meu pecúlio, as economias que consegui com o meu trabalho, o único bem que possuía. Faça todo o possível para que esse tesouro me seja restituído.

— Foi com alguma arma que o gatuno te pôs assim? — perguntou a autoridade.

— Nada, não senhor. Agarrou-me e arranhou-me. É ainda moço, e traz uma espingarda e um violino; com estes dados facilmente se identifica.

O magistrado pôs em campo os guardas, que depressa viram o indicado espertalhão, que muito tranquilamente se encaminhou para essa localidade. Deram-lhe voz de prisão e trouxeram-no ante o magistrado e o judeu, que repetiu a acusação.

— Não toquei nessa criatura nem com um dedo — defendeu-se o rapaz — assim como não lhe tirei à força o dinheiro que ele trazia; ofereceu-me da melhor vontade para que eu não tocasse mais no violino, cujos acordes o faziam nervoso!

— É mentira! — exclamou o rabino — Está a mentir impunemente!

— Está resolvida a questão? — ajuntou o magistrado — Pois é caso extraordinário um judeu dar de mão beijada uma bolsa com ouro, só por não ouvir um bocado de música. Pois senhor: a sentença do seu mau ato está lavrada: vai ser enforcado imediatamente!

O verdugo — que se havia ido chamar, segurou o inocente moço, conduziu-o à forca, que já estava erguida na praça principal onde acorreu toda a cidade em peso, e o rabino fora o primeiro a mostrar-se fazendo menção de socar o pobre condenado, vociferando:

— Espertalhão, vais ter a recompensa que te é devida!

O moço conservou-se muito tranquilo; subiu sozinho a escada apoiada à forca; ao chegar ao topo, virou-se para o juiz já togado, que viera vistoriar o patíbulo e solicitou-lhe:

— Antes de ter o nó na garganta, concede-me um derradeiro favor?

— Concedo — respondeu o magistrado — desde o momento em que não seja o perdão!

— Nada disso é, pois não sou tão exigente... desejava apenas tirar uns ligeiros acordes do violino!

Ao ouvir tais palavras, o rabino deu um estridente grito de susto e pediu encarecidamente ao juiz que não consentisse!

— Qual a razão porque não hei de conceder a graça que este homem me pediu, se é a única alegria que por instantes posso dar-lhe? Tragam-lhe o violino.

— Ai, meu Deus! — lamentou o rabino ao querer fugir, mas sem que lhe fosse possível abrir caminho pela compacta massa de povo que enchia a praça.

— Dou-lhe uma peça de ouro, — prometeu ele no auge da aflição — se me amarrar com força ao pau da forca!

Nesse instante, porém, o rapaz deu o primeiro toque no violino. O magistrado, o escrivão, o agente, os guardas, enfim tudo o que compunha o corpo da magistratura da terra, os circunstantes, o próprio judeu, tiveram um estremecimento; ao segundo toque, todos ergueram as pernas, o próprio verdugo desceu a escada e colocou-se em pé de dança.

O moço então — ao vê-los naquela pouco parlamentar atitude — tocou o mais possível, e agora os vereis: o povo fazia cabriolas; o juiz e o judeu saltavam como que movidos por molas; rapazinhos, velhos, magros, gordos, tudo dançava; se até os cães se erguiam nas patas de trás e dançavam como todos! O condenado deu uns acordes mais fortes e nessa ocasião era inexplicável o movimento: pareciam possessos de algum espírito ruim, batendo com as cabeças umas nas outras, pisando-se, acotovelando-se, atropelando-se. Gemiam com dores, e o magistrado, aflito, fatigadíssimo, pediu:

— Não toques mais que eu perdoo-te! Foi o que o moço quis ouvir, visto que, concordando que o gracejo fora longo, parou e guardou o violino no bolso, desceu os degraus e veio postar-se em frente do rabino que, fatigado, extenuado, exausto, se sentara na rua, respirando a custo.

— Agora és tu quem vais confessar a proveniência da bolsa que me deste, com peças de ouro. Não mintas, do contrário pego novamente no violino e tornas a dançar! — Tais as palavras que o rapaz dirigiu ao judeu, que confessou terrificado:

— Roubei-a, roubei-a, tu tiveste jus a ela pela tua honestidade; dei-a para que não tocasses mais no violino!

Aparecendo o juiz, já um pouco refeito do cansaço, inquiriu do que se havia passado e provando-se à evidência que tinha havido roubo, mandou enforcar o rabino.

Fonte: Contos de Grimm. Publicados de 1812 a 1819. Disponível em Domínio Público.

Recordando Velhas Canções (Construção)


Composição: Chico Buarque

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido

Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima

Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música

E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão, atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho seu como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado

Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego

Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo

E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contramão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir
Deus lhe pague

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça, desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair
Deus lhe pague

Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir
Deus lhe pague
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A Crítica Social em 'Construção' de Chico Buarque
A música 'Construção', composta por Chico Buarque em 1971, é uma das obras mais emblemáticas da música popular brasileira, conhecida por sua crítica social aguda e pela complexidade de sua estrutura lírica. A canção narra a história de um operário da construção civil que, ao longo de um dia de trabalho, acaba por encontrar a morte de forma trágica e aparentemente banal. A repetição de ações 'como se fosse' a última vez, seguida pela morte do trabalhador, sugere a precariedade da vida e a rotina desgastante a que muitos trabalhadores estão submetidos.

A estrutura da música é notável por seu rigor formal, com versos que terminam sempre com palavras paroxítonas, e pela repetição de frases que vão se alterando sutilmente ao longo da canção, refletindo a mudança de perspectiva do protagonista diante da vida e da morte. A repetição de ações cotidianas, como beijar a esposa e comer feijão com arroz, contrasta com a fatalidade do acidente, evidenciando a fragilidade humana diante das estruturas sociais e econômicas.

Além disso, a música termina com uma série de agradecimentos irônicos, 'Deus lhe pague', que podem ser interpretados como uma crítica à sociedade que explora o trabalhador e o submete a condições de vida e trabalho indignas. Chico Buarque, conhecido por suas letras engajadas e por sua oposição à ditadura militar brasileira, utiliza a música como um meio de denunciar as injustiças sociais e a desumanização do indivíduo pelo sistema capitalista. 'Construção' permanece relevante como um poderoso comentário sobre as condições de trabalho e a desigualdade social no Brasil e no mundo.
https://www.letras.mus.br/chico-buarque/45124/

Estante de Livros (“O sonho de um homem ridículo”, de Dostoiévski)


texto enviado por Jaqueline Machado (Cachoeira do Sul/RS)

E... Assim começa a narrativa em primeira pessoa: 

“Eu sou um homem ridículo.”

Estou me referindo a uma pequena história escrita por Fiódor Dostoiévski.

Pequena no físico, mas grande em sua alma. Essa é uma das obras mais lindas que já tive o prazer de ler. 

Conta a triste e ao mesmo tempo feliz história de um personagem sem nome, solitário, que residia numa pensão. Ele era desgarrado da família e do mundo. E tinha uma visão gélida sobre o mundo. 

“Eu senti, de repente que, para mim, dava na mesma se o mundo existisse ou se não houvesse nada em lugar nenhum. Comecei a perceber e a sentir, com todo o meu ser, que não havia nada ao meu redor.”

Ele sempre foi indiferente à vida. E decidiu se matar. Mas numa certa noite nervosa, em suas andanças pela cidade de Petersburgo, encontrou uma menina de mais ou menos oito anos, maltrapilha, chorando, desesperada. Ela pediu ajuda ao Homem Ridículo, porque sua mãe estava morrendo. E ele, amargurado e indiferente ao caso, enxotou a criança. Mas ao retornar para casa, com a arma do seu lado, se vê acometido por lembranças do encontro com a menina. Apesar da atitude cruel, sim, ele estava incomodado com o sofrimento da pobre criança desesperada em busca de ajuda para socorrer sua mãe. E esse sentimento inusitado, milagre noturno pareceu libertá-lo da fria inércia provocada pela ausência de sensações que o desumanizava. Com isso, decidiu deixar o suicídio para depois. Se deixa levar por novas reflexões. E caiu num sono profundo. 

Ele se viu morto, enterrado. E depois sendo levado a um outro mundo, por um ser desconhecido. Um mundo de sol igual ao nosso, de homens belos. Era um mundo sem pecados.       

Lá, as árvores conversavam com os homens, ninguém brigava por suas supostas diferenças, toda a natureza era tratada de igual para igual de forma genuína.  Viviam de maneira abundante, simples e amável.  Os filhos dos outros, eram também seus filhos. Suas atividades se concentravam em como amar mais uns aos outros. 

Ao acordar, estava transformado, entusiasmado, amando tudo e a todos. Decidido a dividir com o mundo inteiro as mensagens vistas e vividas no sonho. Mas os seres humanos o consideraram um perfeito ridículo. 

“Os homens podem se tornar belos e felizes sem que para isso tenham que deixar de viver na Terra. Eu não quero, e não posso crer que a maldade seja o estado normal do homem. Mas todos riem da minha crença.” Disse ele, lamentando a desatenção das pessoas para com o mundo e seus irmãos. Pois sabia que, bastava um instante de boa vontade da humanidade para converter a Terra manchada por pecados, num Paraíso. 

Fonte: Texto enviado pela autora 

terça-feira, 23 de abril de 2024

Concurso Poetizar o Mundo 2024 (Prazo: 17 de maio)


CONCURSO SÓ PARA MORADORES DE CURITIBA E REGIÃO METROPOLITANA

Modalidade: Poesia até 10 versos 

Organizadora: Escritora e poetisa Isabel F. Furini, autora do livro “Dançando entre as estrelas”, da Nogue Editora.

1) O Concurso de Poemas tem como objetivo estimular a produção literária e é destinado a todas as pessoas maiores de 18 anos que apresentem um poema inédito e escrito em português, com máximo de 10 versos (linhas).

2) O tema é livre, a inscrição é gratuita e poderá ser feita até 17 de maio de 2024. Só serão aceitos poemas de moradores de Curitiba e região Metropolitana.

3) Cada concorrente poderá participar com apenas um poema inédito (ou seja, ainda não impresso em papel, nem publicado na internet), e que não tenha sido premiado em outro concurso.

4) Consideram-se inscritas as obras enviadas para o e-mail: 

isabelfurini@hotmail.com

Em "assunto": Concurso Poetizar o Mundo 2024.

Enviar o poema diretamente no e-mail, sem anexo, escrito em língua portuguesa, digitado em espaço 2 (dois), com fonte Arial, tamanho 12 (doze).

6) Deverá constar no final: o título do poema, nome completo do autor, seu endereço, e-mail, telefone, RG, e 4 ou 5 linhas de currículo.

7) A comissão julgadora será composta por Isabel Furini, José Feldman e Daniel Maurício.

8) Premiação: o primeiro lugar receberá Medalha e Certificado, o segundo e terceiro lugares receberão Certificados, em 16 de junho, 11 horas, na Feira do Poeta de Curitiba. 

9) Os ganhadores serão informados pelo e-mail.

O resultado do concurso será divulgado em sites literários da Internet e nos blogs: http://www.isabelfurini.blogspot.com/ e Falando de Literatura, do Bonde News.

10) O resultado será divulgado em 16 de junho de 2024. Na ocasião, também serão homenageados com medalhas de honra duas personalidades que trabalham em prol da cultura, a poeta Edra Moraes e a artista Cili Nandes.

11º) O encaminhamento dos trabalhos na forma prevista neste regulamento implica concordância com as disposições nele consignadas.

Fonte: Isabel Furini

segunda-feira, 22 de abril de 2024

Isabel Furini (Poema) 58: Latejar

 

Contos e Lendas da Espanha (O Galego e o cavalo do rei)

Certa vez aconteceu um fato curioso com um galego que era criado de um rei.

Esse rei tinha um belíssimo cavalo branco. E o prezava mais que a todas as riquezas que possuía. Gostava tanto do animal, que anunciou, que seria capaz de mandar para a forca o homem que lhe trouxesse a notícia mais triste do mundo. E quando lhe perguntaram que notícia seria essa, o rei respondeu sem hesitação:

— A morte do meu cavalo, oras. O que mais poderia ser?

Algum tempo depois, um soldado andaluz estava cuidando do cavalo, como fazia todas as manhãs. De repente, o animal se assustou. Relinchando, deu um coice no ar com tanta força, que escorregou e quebrou uma pata. Sem outra alternativa, o soldado teve de sacrificá-lo ali mesmo. Depois, começou a tremer de medo, pois conhecia muito bem a ameaça do rei. E não duvidava que ele fosse capaz de mandar enforcá-lo. 

Apavorado, o soldado chegou a molhar a camisa, de tanto que transpirava e tremia. O galego, que naquele momento entrava na cocheira, deparou-se com um triste quadro: o cavalo sem vida e o soldado pálido como um fantasma, a ponto de sofrer um ataque e cair ali mesmo, ao lado do animal.

— O que aconteceu? — perguntou o galego.

O soldado contou, mas sua voz soava tão trêmula, que o galego o interrompeu:

– Espere um. pouco enquanto vou buscar um copo de água. Você precisa se acalmar, homem.

O galego voltou rapidamente;

– Pronto, aqui está. Trate de beber a água em pequenos goles e tome cuidado para não se afogar.

O soldado obedeceu, E com um olhar de gratidão, devolveu o copo ao galego:

— Obrigado, amigo.

— Sente-se melhor?

_ Não muito... Pois minha vida está por um fio.

– Calma — o galego recomendou. — Conte-me o que aconteceu.

O soldado assim o fez. No final, disse:

– Você estava presente quando o rei deu aquela declaração?

– Sim. Ele jurou que mandaria enforcar... O homem que lhe levasse a notícia da morte de seu cavalo — o soldado completou, voltando a tremer como uma vara verde no meio da ventania.

— Sabe de uma coisa? — disse o galego. Acho que vou livrá-lo dessa encrenca.

— Mas como?

– Encarregando-me de levar a notícia ao rei.

– Agradeço, mas isso não é justo. Não quero que você seja morto em meu lugar.

– Acontece, meu amigo, que não pretendo morrer tão cedo.

— E o que você tenciona fazer?

– Isso é comigo. Agora, trate de levar o cavalo para o pasto. 

E o galego se afastou, muito tranquilo e confiante. Com um suspiro de alívio, o soldado andaluz apressou-se a cumprir a ordem do galego. Pediu a outros criados que o ajudassem, colocou o cavalo numa carroça e deixou-o no pasto.

O galego entrou no palácio do rei e disse aos guardas que tinha uma notícia importante. O rei, que tratava com deferência os empregados responsáveis por seu belo cavalo, não tardou a recebê-lo.

— E então? — perguntou. — O que há?

Saiba Vossa Majestade que o cavalo branco está jogado lá no pasto, com moscas entrando-lhe pela boca e saindo-lhe pelo rabo.

O rei, assustado, exclamou:

– Mas, homem, isso quer dizer que ele morreu!

— Ah, eu não sei, majestade, pois não sou veterinário.

Assim, o galego escapou da forca, pois não tinha sido ele, e sim o rei, quem havia dito que o cavalo estava morto.

Fonte> Yara Maria Camillo (seleção). Contos populares espanhóis. SP: Landy, 2005.

Lino Vitti (Asas da poesia) = 1


A BANDEIRA DO SONHO E DA ESPERANÇA

Vede a nave que vai. É a vida que navega,
às vezes calmaria, às vezes sol bonito.
Pelos mares boreais agora nos carrega,
por oceano feliz, estival e bendito.

Esta nau é latina, esta outra é vela grega,
qual vem de Gibraltar, qual vem do velho Egito.
Hoje o Mediterrâneo em torno a si as congrega,
amanhã já não sei em que quadrante as fito...

E quem sabe, Senhor o rumo dessas naves,
ora ao Norte, ora ao Sul, tempestades, bonanças,
furor de vendavais, quiçá rotas suaves!

O que vejo, porém, em toda a nau que avança,
vencendo furacões, à voz de roucas aves,
é a bandeira do Sonho e o mastro da Esperança.
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ANTES QUE AS ESTRELAS BRILHEM

Antes que brilhem as estrelas no alto,
num estranho chegar do lusco-fusco;
antes que a noite com seu negro assalto
me tire a santa luz que tanto busco;

antes que as trevas - esse horrendo asfalto
do céu - onde de dor a alma chamusco,
os meus ideais a poetar ressalto,
vejo perto um crepúsculo velhusco.

O sol já não quer ver-me com carinho,
sem águas vou, aos passos, no caminho,
vão as flores e as aves debandadas.

Restam somente as rimas por conforto,
eu já alcancei o derradeiro porto,
brilhem pois as estrelas namoradas.
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LUZES DO OCASO

Quando o céu se colore e como um pálio
se desdobram luzores no horizonte,
dou por findo o meu rústico trabalho,
do versejar selou-se a minha fonte.

É preciso parar ânsias do atalho,
é preciso deter o afã do monte.
É preciso secar o doce orvalho
antes que o sol, no céu, fulvo tramonte.

Toda a vida me foi um belo acaso,
quanto pude galguei o meu Parnaso
dispersando poesia estremecida.

Tudo finda na vida, tudo finda,
mesmo assim vejo sempre muito linda
a aventura enigmática da vida,
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POESIA MODERNA

Minha cara Poesia alegre e modernista,
inestética, irreal, síntese, paradoxo.
Desrimada, a mancar qual manca altivo coxo
mas sincera, jovial, enigmática, artista.

Protestante, genial, lírica arte golpista,
bela como o Brasil, ou feia como um mocho,
ora clara manhã, ora poente roxo,
revolução feliz, a se perder de vista.

Sem métrica, sem rima, e sem qualquer estrofe
és. Poesia moderna, um grande regabofe,
artística, revolta, amada e sem vergonha.

Assim mesmo sem rima ou métrica que a cantem,
não importa porém que os outros mais se espantem,
enquanto teu cantor divinamente sonha.
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"PORTAL DOS SONHOS"

(Ao seu autor Esio Pezato)

Poeta peregrino, após tantas andanças
à procura do Belo, em busca de um tesouro
erguendo o olhar ao céu das doces esperanças.
feitas de imenso azul, feitas de estrelas de ouro;

poeta caminheiro, afinal, quando alcanças
do teu longo viajar feliz ancoradouro?
Quando te acolherâo aquelas terras mansas
do encantado país, dos sonhos sorvedouro?

Responda-me, poeta, até quando essa busca,
E esse louco viver que a incompreensão ofusca,
muitas vezes sem sol, muitos dias tristonhos!?

Eis a tua resposta, aloucado poeta:
ter a glória imortal do um telúrico esteta
e a pérola nos dar desse “PORTAL DE SONHOS".
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TERRA NATAL
(Santanense com orgulho)

Nesse chão, onde guarda a santa natureza
as minhas ancestrais, genéticas raízes,
vi florir-me da vida os sonhos de beleza,
desfrutei do viver, os dias mais felizes.

Deram-me as fontes a água pura posta à mesa,
da sede refrescando as fundas cicatrizes.
O céu - cúpula azul - de enorme azul-turquesa,
se enfeitava de sol e de nuvens atrizes.

Pássaros musicais, saudando a manhã nobre,
a escola, as plantações, as estrelas em penca,
as estradas que vão, de um sino o triste dobre...

Uma terra não há como a minha Santana:
Tem o terno verdor de um vasinho de avenca,
e o gosto sazonal de um cacho de banana.
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Fonte> Lino Vitti. Antes que as estrelas brilhem. Piracicaba, 2001.

Eliana Palma (Microcontos) – 1

Sempre se sacrificara para dar presentes, que parentes e amigos desdenhavam. Fez diferente: cantou um "Parabéns pra você" para o aniversariante e usou a grana para renovar o próprio guarda-roupa.
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Levou o filhinho ao circo. Enquanto isso, a esposa acamada ria das gracinhas, e fazia mil acrobacias com o palhaço do vizinho.
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Era ótima cozinheira. Em transe, perfurava o pernil profundamente com a enorme faca. Foi sacudida pela patroa; o porco era o patrão abusador.
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Não sabia descansar. Não podia perder qualquer oportunidade. Driblava o cansaço e a idade com novas empresas. Foi interditado pelos herdeiros, que se cansaram de esperar o tempo de gastar!
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Só redigia textos de grande violência. Um dia foi encontrado morto: as letras agressivas o asfixiaram.
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Cismava. Olhos baixos nos pés rachados, e o filho do patrão a fazer dele o alvo de intermináveis chacotas... Quando o fazendeiro aflito perguntou pela mimada cria, respondeu: 
—"Sei não," com olhar distante no turbulento rio.
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Chorava na cobertura. Via aviões passarem e queria voar. Um dia, o salto, o sorriso e o baque. Hoje voa, leve, em outra dimensão.
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Não queria engordar. Muitas fórmulas e drogas depois come, hoje, feliz, grama pela raiz!
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Sua solidão tinha a halitose por companhia. Quando o último dente se perdeu viu-se obrigado a encarar o dentista. O sorriso voltou, e com ele, amigos e amores.
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Sabia que o pitbull era temperamental, mas insistia em manter o animal. Um dia, o ataque e a desfiguração do rosto: o sacrifício do cão e um novo relacionamento, com o cirurgião plástico.
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Habituado a projetar arranha-céus, construiu castelos nas nuvens. Por falta de alicerce, todos os sonhos ruíram.
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Estava apaixonada. A futura sogra exigiu o fim do noivado: "filho meu não se casa com doméstica". Foi à luta! Fez faculdade de moda e tomou-se renomada estilista. Rica, famosa e feliz, inverteu as letras e trocou o amor por Roma!
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Era muito rica. Criava um filhote de leão apenas para ser exótica. Anos depois, o animal foi encontrado ao lado da jaula arrebentada, tendo ainda na boca um osso do qual pendia valioso solitário.
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Parabenizava-se! Olhava as mãos bem feitas: parara de roer as unhas; o cinzeiro limpo: parara de fumar; o barzinho transformado em biblioteca; parara de beber; o calo no dedo: finalmente acabara de escrever seu primeiro "best seller"!
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Era Natal, e cadê dinheiro para presentes? Cortou cartões em cartolina verde, marcou-os com beijos em batom vermelho e escreveu uma trova para cada presenteado. Foi o ano que proporcionou as maiores alegrias aos amados!
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Ano Novo chegando. Queria novidades, mudança de panorama. Encheu-se de coragem e virou a cama para a janela!
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Separou-se do noivo marginal. O que vertia não era choro por amor despedaçado, mas chorume do lixo emocional acumulado.
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Encontrou lagarta na salada. Rodou a baiana! Chega! Vegetariana nunca mais!!! 
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Depois de trinta chopes, um bom mergulho para desaguar na piscina do cunhado esnobe. A mulher, afogando-se na cama, acordou-o aos berros!
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Fonte> Maria Eliana Palma. Momentos em prosa e verso. Maringá, 2016. Entregue pela autora.

Recordando Velhas Canções (Aquarela)


Composição: Vinícius de Moraes / Toquinho / Guido Morra / Maurizio Fabrizio.

Numa folha qualquer
Eu desenho um Sol amarelo
E, com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo

Corro o lápis em torno da mão
E me dou uma luva
E, se faço chover, com dois riscos
Tenho um guarda-chuva

Se um pinguinho de tinta
Cai num pedacinho azul do papel
Num instante, imagino
Uma linda gaivota a voar no céu

Vai voando, contornando
A imensa curva norte-sul
Vou com ela viajando
Havaí, Pequim ou Istambul

Pinto um barco à vela
Branco navegando
É tanto céu e mar
Num beijo azul

Entre as nuvens vem surgindo
Um lindo avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo
Com suas luzes a piscar

Basta imaginar, e ele está partindo
Sereno e lindo
E, se a gente quiser
Ele vai pousar

Numa folha qualquer
Eu desenho um navio de partida
Com alguns bons amigos
Bebendo, de bem com a vida

De uma América a outra
Eu consigo passar num segundo
Giro um simples compasso
E, num círculo, eu faço o mundo

Um menino caminha
E caminhando chega no muro
E ali logo em frente
A esperar pela gente, o futuro está

E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo, nem piedade
Nem tem hora de chegar

Sem pedir licença
Muda nossa vida
E depois, convida
A rir ou chorar

Nessa estrada, não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela, ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar

Vamos todos
Numa linda passarela
De uma aquarela que, um dia, enfim
Descolorirá

Numa folha qualquer
Eu desenho um Sol amarelo (que descolorirá)
E, com cinco ou seis retas
É fácil fazer um castelo (que descolorirá)

Giro um simples compasso
E, num círculo, eu faço o mundo (que descolorirá)
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Aquarela: Uma Viagem Pela Imaginação e Pela Vida
A música 'Aquarela', composta por Toquinho, é uma verdadeira viagem pela imaginação e pelas diversas fases da vida. A letra começa com a simplicidade de um desenho infantil, onde um Sol amarelo e um castelo são criados com poucos traços. Essa simplicidade é um convite à liberdade criativa, onde tudo é possível a partir de elementos básicos, como um lápis e uma folha de papel. A música evoca a pureza da infância, onde a imaginação não tem limites e qualquer mancha de tinta pode se transformar em uma nova criação, como uma gaivota voando no céu.

À medida que a canção avança, os desenhos ganham vida e se transformam em viagens por lugares distantes e sonhos de liberdade. O barco à vela, o avião e o navio de partida são metáforas para as aventuras e as descobertas que fazemos ao longo da vida. Toquinho utiliza essas imagens para falar sobre a capacidade de sonhar e a vontade de explorar o mundo, destacando a beleza e a coragem de se lançar ao desconhecido. A música também reflete sobre a passagem do tempo e a inevitabilidade da mudança, como quando menciona a 'astronave' do futuro que não podemos controlar.

Por fim, 'Aquarela' nos lembra da efemeridade da vida e dos momentos que vivemos. A passarela de aquarela que um dia descolorirá simboliza a transitoriedade de nossas experiências e a importância de aproveitá-las ao máximo. A repetição do verso 'que descolorirá' ao final da música reforça a ideia de que tudo é passageiro e que devemos valorizar cada momento. Toquinho, com sua melodia suave e suas letras poéticas, nos convida a refletir sobre a vida, a arte e a beleza das pequenas coisas que, juntas, compõem o grande quadro de nossas existências.