Resumo
O ato de ler é um processo de compreender o mundo, por isso requer mais atenção por parte dos professores de língua portuguesa que, de certa forma, ainda privilegiam a gramática e a interpretação textual puramente literal e descontextualizada. Este trabalho tem por objetivo mostrar como ocorre o processo de leitura, apresentando algumas estratégias que podem ser utilizadas pelo leitor no ato de ler e discutir alguns fatores de relevância para que a leitura seja eficiente e, consequentemente, o leitor seja maduro.
1 – O ato de ler
O ato de ler é um processo de compreender o mundo. A leitura deve ser geradora de novas experiências para o indivíduo, já que facilita o surgimento da reflexão e da tomada de posição, como sugere SILVA ( 1991).
A leitura pressupõe recriação do significado e, através desta reflexão, o indivíduo toma sua posição perante o texto.
“A leitura não se configura como um processo passivo (...) Por exigir descoberta e re-criação, a leitura coloca-se como produção e sempre supõe trabalho do sujeito-leitor (...), então o leitor, além de partilhar e re-criar referenciais de mundo, transforma-se num produtor de acontecimentos, em função do aguçamento da compreensão e de sua consciência crítica”. (SILVA, 1991: 25)
A leitura deve, então, ser funcional, pois o leitor constrói um sentido para o texto.
Como sugere SMITH (1989 – apud Fulgêncio & Liberato, 1992:13), “a leitura não é uma atividade meramente visual (...) é o resultado da interação entre o que o leitor já sabe e o que ele retira do texto”.
O leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o conhecimento prévio ou informação não-visual, adquirido ao longo de sua vida. A leitura é, portanto, o resultado da informação visual ( IV) e informação não-visual ( InV).
LER = IV + InV
É mediante a interação de diversos níveis de conhecimento ( lingüístico, textual e de mundo), que o leitor alcança um sentido para o texto. E porque o leitor utiliza diversos níveis de conhecimento que interagem entre si, a leitura é considerada um processo interativo.
O ato de ler pode ser considerado, então, um jogo que se processa entre autor/texto/leitor; através destes elementos é que se atribui um significado ao texto.
O texto, neste sentido, faz a mediação para a comunicação entre dois contextos: o do autor e o do leitor. Sendo o texto o ponto de partida para o processo da construção do significado, cabe a ele o papel de atuar sobre os esquemas cognitivos do leitor, ativando uma série de ações na mente deste.
Como afirma KLEIMAN (1989:28): “a leitura é uma atividade cognitiva, tem caráter multifacetado, multidimensionado sendo um processo que envolve percepção, processamento, memória, dedução, inferência”.
Num texto há muito mais de implícito, de modo que ao leitor cabe o papel de captar as intenções do autor. É exatamente neste ponto que as inferências suprem as lacunas de um texto tornando-o mais significativo e compreensível.
Por inferência compreende-se, então, “uma operação cognitiva que permite ao leitor construir novas proposições a partir de outras já dadas”. ( MARCUSCHI, 1984)
Veja um exemplo de exercício de inferência:
a) Leia o texto abaixo e descubra onde Karen está passando o Natal.
Querida mamãe:
Aqui é muito bonito. O clima está agradável e temos passeado muito.
Ontem visitei o Coliseu. Feliz Natal! Logo estarei com vocês.
Karen
Após a leitura sugere-se que os alunos (leitores) discutam entre si sobre as inferências de cada um. Em seguida chega-se à resposta adequada.
Onde Karen está? Uma única palavra é a pista deixada pelo autor: Coliseu.
Supõe-se que ela esteja na Itália, mais especificamente em Roma. Esta inferência será feita a partir do momento em que o leitor partilhar este conhecimento de mundo com o autor.
2 – Processamento de texto
Muitas teorias tentam explicar de que forma um leitor apreende informações de um texto escrito embora, basicamente, todas elas possam ser classificadas em três grupos: o modelo de processamento ascendente ( bottom-up ), o modelo descendente ( top-down ) e o modelo interacionista de leitura. ( CORTE, 1991:5)
No modelo ascendente, a ênfase se dá sobre o estímulo visual. O leitor, durante a leitura, aborda o texto com visão “bottom-up”, exclusivamente, em que somente o texto leva conhecimento e informação a ele, e este, por sua vez, não utiliza seu conhecimento prévio.
Tal leitor é incapaz de ler nas entrelinhas visto que é vagaroso, pouco fluente e tem dificuldade em sintetizar as principais idéias do texto.
Por outro lado, o modelo descendente “ top-down”, é aquele em que o leitor leva para o texto todo o conhecimento prévio de que dispõe. O modelo descendente enfatiza o papel do processo cognitivo que gera hipóteses de significado, baseado, primeiramente, na informação contextual.
Dessa forma, o leitor, quando está em processo de leitura, busca diretamente o significado através de estratégias de predição e inferência. É um leitor fluente e veloz, capaz de ler nas entrelinhas do texto e alcançar o significado deste.
Por fim, o modelo interacionista descreve a leitura como um processo em que o leitor utiliza ambos processamentos (top-down e bottom-up) no ato da leitura.
“ (...) o leitor usa e integra tanto informações gráficas como contextuais para extrair o significado do texto escrito”. ( CORTE, 1991: 6 ).
Sendo a leitura um processo interativo em que o leitor e autor interagem entre si, ambos com suas cargas de conhecimentos, parece que este último modelo é o mais utilizado pelos leitores maduros e eficientes, tendo em vista que tais leitores sabem monitorar sua leitura e são capazes de escolher o tipo de processamento adequado à solução de seus problemas.
3 – Sugestões para viabilizar a compreensão da leitura
a) Os professores devem ensinar leitura aos seus alunos, ou seja, ensiná-los estratégias de leitura que viabilizem a compreensão textual;
b) Os alunos devem buscar um aprimoramento de seus conhecimentos prévios, lendo e questionando;
c) Deve-se elaborar materiais de leitura que facilitem a aquisição de estratégias de leitura por parte dos alunos;
d) O leitor deve utilizar-se das pistas fornecidas pelo texto de forma adequada e satisfatória;
e) O leitor deve conhecer seu objetivo de leitura ( antes de fazê-la ) e saber aplicar adequadamente as técnicas de leitura para obter um resultado satisfatório.
São inúmeras as sugestões que cabem aqui para que não haja a tão famosa frase: “ os alunos não sabem ler”. Os alunos estão caminhando lentamente rumo à criticidade; estão deixando de ser passivos e neutros. Os professores lentamente estão alterando suas metodologias e práticas de ensino. Não há “culpado” neste processo, visto que ambas as partes têm suas deficiências e dificuldades. O importante é começar a construir um conceito novo diante do processo de leitura.
Ler não é decodificar e exige que haja interação entre leitor/texto/emissor, para que ocorra a compreensão por parte de quem lê. Uma vez que o conceito começa a ser questionado e, principalmente, transformado, não resta dúvida de que possa existir, um dia, 100% de alunos-leitores preparados, críticos e aptos a discutir, dialogar, debater, criticar e transformar a sociedade em que vivem.
Fonte:
BONNICI, Thomas (org.). Anais do XIII Seminário do CELLIP (Centro de Estudos Linguísticos e Literários dos Paraná). Campo Mourão: 21 a 23 outubro de 1999. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2000. CD-Rom.
O ato de ler é um processo de compreender o mundo, por isso requer mais atenção por parte dos professores de língua portuguesa que, de certa forma, ainda privilegiam a gramática e a interpretação textual puramente literal e descontextualizada. Este trabalho tem por objetivo mostrar como ocorre o processo de leitura, apresentando algumas estratégias que podem ser utilizadas pelo leitor no ato de ler e discutir alguns fatores de relevância para que a leitura seja eficiente e, consequentemente, o leitor seja maduro.
1 – O ato de ler
O ato de ler é um processo de compreender o mundo. A leitura deve ser geradora de novas experiências para o indivíduo, já que facilita o surgimento da reflexão e da tomada de posição, como sugere SILVA ( 1991).
A leitura pressupõe recriação do significado e, através desta reflexão, o indivíduo toma sua posição perante o texto.
“A leitura não se configura como um processo passivo (...) Por exigir descoberta e re-criação, a leitura coloca-se como produção e sempre supõe trabalho do sujeito-leitor (...), então o leitor, além de partilhar e re-criar referenciais de mundo, transforma-se num produtor de acontecimentos, em função do aguçamento da compreensão e de sua consciência crítica”. (SILVA, 1991: 25)
A leitura deve, então, ser funcional, pois o leitor constrói um sentido para o texto.
Como sugere SMITH (1989 – apud Fulgêncio & Liberato, 1992:13), “a leitura não é uma atividade meramente visual (...) é o resultado da interação entre o que o leitor já sabe e o que ele retira do texto”.
O leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o conhecimento prévio ou informação não-visual, adquirido ao longo de sua vida. A leitura é, portanto, o resultado da informação visual ( IV) e informação não-visual ( InV).
LER = IV + InV
É mediante a interação de diversos níveis de conhecimento ( lingüístico, textual e de mundo), que o leitor alcança um sentido para o texto. E porque o leitor utiliza diversos níveis de conhecimento que interagem entre si, a leitura é considerada um processo interativo.
O ato de ler pode ser considerado, então, um jogo que se processa entre autor/texto/leitor; através destes elementos é que se atribui um significado ao texto.
O texto, neste sentido, faz a mediação para a comunicação entre dois contextos: o do autor e o do leitor. Sendo o texto o ponto de partida para o processo da construção do significado, cabe a ele o papel de atuar sobre os esquemas cognitivos do leitor, ativando uma série de ações na mente deste.
Como afirma KLEIMAN (1989:28): “a leitura é uma atividade cognitiva, tem caráter multifacetado, multidimensionado sendo um processo que envolve percepção, processamento, memória, dedução, inferência”.
Num texto há muito mais de implícito, de modo que ao leitor cabe o papel de captar as intenções do autor. É exatamente neste ponto que as inferências suprem as lacunas de um texto tornando-o mais significativo e compreensível.
Por inferência compreende-se, então, “uma operação cognitiva que permite ao leitor construir novas proposições a partir de outras já dadas”. ( MARCUSCHI, 1984)
Veja um exemplo de exercício de inferência:
a) Leia o texto abaixo e descubra onde Karen está passando o Natal.
Querida mamãe:
Aqui é muito bonito. O clima está agradável e temos passeado muito.
Ontem visitei o Coliseu. Feliz Natal! Logo estarei com vocês.
Karen
Após a leitura sugere-se que os alunos (leitores) discutam entre si sobre as inferências de cada um. Em seguida chega-se à resposta adequada.
Onde Karen está? Uma única palavra é a pista deixada pelo autor: Coliseu.
Supõe-se que ela esteja na Itália, mais especificamente em Roma. Esta inferência será feita a partir do momento em que o leitor partilhar este conhecimento de mundo com o autor.
2 – Processamento de texto
Muitas teorias tentam explicar de que forma um leitor apreende informações de um texto escrito embora, basicamente, todas elas possam ser classificadas em três grupos: o modelo de processamento ascendente ( bottom-up ), o modelo descendente ( top-down ) e o modelo interacionista de leitura. ( CORTE, 1991:5)
No modelo ascendente, a ênfase se dá sobre o estímulo visual. O leitor, durante a leitura, aborda o texto com visão “bottom-up”, exclusivamente, em que somente o texto leva conhecimento e informação a ele, e este, por sua vez, não utiliza seu conhecimento prévio.
Tal leitor é incapaz de ler nas entrelinhas visto que é vagaroso, pouco fluente e tem dificuldade em sintetizar as principais idéias do texto.
Por outro lado, o modelo descendente “ top-down”, é aquele em que o leitor leva para o texto todo o conhecimento prévio de que dispõe. O modelo descendente enfatiza o papel do processo cognitivo que gera hipóteses de significado, baseado, primeiramente, na informação contextual.
Dessa forma, o leitor, quando está em processo de leitura, busca diretamente o significado através de estratégias de predição e inferência. É um leitor fluente e veloz, capaz de ler nas entrelinhas do texto e alcançar o significado deste.
Por fim, o modelo interacionista descreve a leitura como um processo em que o leitor utiliza ambos processamentos (top-down e bottom-up) no ato da leitura.
“ (...) o leitor usa e integra tanto informações gráficas como contextuais para extrair o significado do texto escrito”. ( CORTE, 1991: 6 ).
Sendo a leitura um processo interativo em que o leitor e autor interagem entre si, ambos com suas cargas de conhecimentos, parece que este último modelo é o mais utilizado pelos leitores maduros e eficientes, tendo em vista que tais leitores sabem monitorar sua leitura e são capazes de escolher o tipo de processamento adequado à solução de seus problemas.
3 – Sugestões para viabilizar a compreensão da leitura
a) Os professores devem ensinar leitura aos seus alunos, ou seja, ensiná-los estratégias de leitura que viabilizem a compreensão textual;
b) Os alunos devem buscar um aprimoramento de seus conhecimentos prévios, lendo e questionando;
c) Deve-se elaborar materiais de leitura que facilitem a aquisição de estratégias de leitura por parte dos alunos;
d) O leitor deve utilizar-se das pistas fornecidas pelo texto de forma adequada e satisfatória;
e) O leitor deve conhecer seu objetivo de leitura ( antes de fazê-la ) e saber aplicar adequadamente as técnicas de leitura para obter um resultado satisfatório.
São inúmeras as sugestões que cabem aqui para que não haja a tão famosa frase: “ os alunos não sabem ler”. Os alunos estão caminhando lentamente rumo à criticidade; estão deixando de ser passivos e neutros. Os professores lentamente estão alterando suas metodologias e práticas de ensino. Não há “culpado” neste processo, visto que ambas as partes têm suas deficiências e dificuldades. O importante é começar a construir um conceito novo diante do processo de leitura.
Ler não é decodificar e exige que haja interação entre leitor/texto/emissor, para que ocorra a compreensão por parte de quem lê. Uma vez que o conceito começa a ser questionado e, principalmente, transformado, não resta dúvida de que possa existir, um dia, 100% de alunos-leitores preparados, críticos e aptos a discutir, dialogar, debater, criticar e transformar a sociedade em que vivem.
Fonte:
BONNICI, Thomas (org.). Anais do XIII Seminário do CELLIP (Centro de Estudos Linguísticos e Literários dos Paraná). Campo Mourão: 21 a 23 outubro de 1999. Maringá: Universidade Estadual de Maringá, 2000. CD-Rom.