sábado, 8 de fevereiro de 2014

Lavínia Severo (Fria Aurora)

Eram quase quatro da manhã. Não preguei os olhos a noite inteira. Já estávamos beirando julho e ela não conseguira realizar seu sonho. A mãe não cumprira sua promessa. Botijão já não se via há semanas e buscávamos o mingau da sobra do vizinho, que chegava já gelado. O frio e o ar seco cortavam-me os lábios e faziam doer os rins. As contrações, cada vez mais penosas, espinhavam na alma o ódio do desfavorecimento. Kayla acabava de padecer nos meus braços e abraços, mas meu calor, que já não dava conta nem de mim, falhou em mantê-la viva. Havia estendido a ela a promessa da mãe e seus olhos brilharam de esperança até o último minuto, inocente que era.

Nós duas éramos as únicas dos cinco irmãos na escola, por sermos meninas. Os meninos iam todas as noites coletar papelões e latinhas. Kayla era a razão da minha permanência naquela casa desgraçada e esquecida por Deus.

O interruptor não respondeu e confirmou o óbvio.

– Que m…., Armando! Não vá dizer que não pagou a conta? - a mãe perguntava por perguntar, em seguida resmungava meia dúzia de palavrões, porque chorar já tinha desaprendido.

O pai, que já abria a segunda garrafa de pinga, nem se deu conta da ausência de luz no casebre. Levantou, derrubando o copo, e agarrou a mãe colocando-a em cima da mesa, erguendo-lhe o vestido e mal conseguindo falar ordenou que calasse a boca. A mãe gemeu de dor. Segundos depois, já gritava de prazer.

Desta vez, não precisei cobrir os olhos e os ouvidos de Kayla.

Os meninos chegaram silenciosos e só então alguém me notou com Kayla nos braços, descolorida, pétrida e fria. Minha vida já não fazia sentido algum. Éramos as caçulas e entre nós quatro anos de distância. Depois de mim, a mãe abortou oito vezes, mas Kayla ela não conseguiu matar. Nasceu esmilinguida e sem movimento nas pernas, mas tinha uma sapiência incomum, ia entrar na quinta série com idade regular e escrevia histórias lindas - duvidei muitas vezes da fidelidade da mãe.

Pedi ao meu irmão mais velho que me ajudasse a carregar o corpo de Kayla pra rua, sem fazer muito barulho pra não levar a garrafada do pai, que ainda bebia pinga no gargalo.

Com a porta já às costas, meu irmão repousou o corpo na carroça de papelões e nos puxou para o centro da cidade. Eram meus últimos momentos com Kayla e prometi à sua memória que realizaria seu sonho.

Abandonamos o corpo na frente do IML, na ainda deserta perimetral. Subi na carroça e duas quadras dali pedi pro Valdir parar. Beijei o rosto dele, nos olhamos por muito tempo, mas ele sabia, desde que viu Kayla nos meus braços, que nunca mais nos encontraríamos. Virei as costas e ele me pegou pelo braço, tirou do bolso uma nota de dois reais e repousou-a sobre minha palma. Sorri timidamente e chorei, chorei por muito tempo depois que ele partiu.

Amanheceu, entrei na padaria e pedi um chocolate quente.

Fonte:
Contos Maringaenses

Machado de Assis (Gazeta de Holanda) N.° 38 – 29 de novembro de 1887

Nascimento cura, cura,
Curandeiro Nascimento;
Curandeiro fura, fura,
Fura-vida e fura-vento;

Pois que tens a liberdade
De curar tantas mazelas
Que devastam a cidade,
Curar e viver por elas;

Tudo isso com quatro passes
De evocação de defuntos,
Que, sem que mostrem as faces,
Todos ali falam juntos;

Espíritos diferentes;
Um cura barriga da água,
Outro arranca um ou dois dentes,
Sem deixar sangue nem mágoa:

E mais que tudo, são grandes
Em ler, como as adivinhas,
Para o que, basta que mandes,
Com tais e tais palavrinhas;

Nascimento (apre! que custa
Desfiar um pensamento
Verso abaixo! Custa e assusta).
Dize-me cá, Nascimento,

Dize o que virá de Minas,
Se queijo, tabaco, ou lombo,
Se cousas mais superfinas,
Quem dá pulo e quem dá tombo.

Antes que tudo nos venha,
Veio muita porcaria,
Muita rixa e muita lenha,
Pulso de gente bravia.

Palavreada sem estilo...
Ao menos, se os escritores
Nos fizessem ler aquilo
Com alguns poucos lavores,

Dariam à pobre gente
Que vive de outros negócios
Um recreio de patente
Para entreter os seus ócios.

Então, padecesse o Veiga,
Calmon, Santa Helena e o resto,
Para uma pessoa leiga
Era um gosto puro e honesto.

Lia em boa e sã linguagem
Que o vizinho era um modelo
De ignorância e parolagem,
Um papagaio e um camelo.

E, vice-versa, diria
O vizinho assim tratado,
Que a maior patifaria
Tinha no outro o grão-mestrado.

Eram certamente afrontas,
Mas rendilhadas, cobertas
De corais e finas contas,
Menos que afrontas, ofertas.

Ah! mas justamente é isso
O que faria à polêmica
Perder o melhor feitiço,
E pô-la inválida e anêmica.

E por que tanto barulho?
Para ter lugar marcado
Na casa, que é nosso orgulho,
E a que chamamos senado.

Que vale a pena, isso vale!
Ponham-me ali já eleito
Pela serra ou pelo vale,
E verão se não aceito.

Aceito, fico e sustento,
Com alma, com heroísmo,
Esse forte monumento,
Flor do parlamentarismo.

Uma só condição, uma,
Para pleitear aquilo
Descompostura nenhuma,
Ou nenhuma, ou com estilo.

Fonte:
Obra Completa de Machado de Assis, Edições Jackson, Rio de Janeiro, 1937.
Publicado originalmente na Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, de 01/11/1886 a 24/02/1888.

André Telucazu Kondo (Crônica do Medo)

 texto vencedor do XII Prêmio FACCAT - Panorama (Categoria Crônica)


– Você não teve medo?

          Essa foi uma das perguntas mais frequentes que me fizeram, quando voltei de minha viagem de volta ao mundo, passando por cinquenta países em oito meses. Depois, repetiram a mesma pergunta, quando voltei de outra viagem, desta vez, apenas pela América do Sul, só que realizada no estilo carona, dormir na praça e passar fome.
  
       Medo?

          Quase fui roubado e detido na Rússia, fui abandonado na fronteira tcheca, enganado no Peru, quase atropelado em uma ilha da Indonésia, quase despenquei de uma montanha na Venezuela, enfrentei uma enchente em Honduras, escalei um vulcão ativo na Guatemala, andei mil quilômetros na Espanha, fui ameaçado em Rondônia, dormi em caverna na Capadócia e em albergues de mendigos no Brasil, passei fome no Caminho da Fé, passei frio no Círculo Polar Ártico e calor na linha do Equador...

          Se eu tive medo?

          Sim. Eu tive medo. Tive medo de uma vida sem sentido, em trabalhar em um emprego em que acordasse com um suspiro de desânimo e retornasse para casa com outro de tédio. Tive medo de enfrentar o trânsito caótico de uma cidade para chegar a lugares em que eu não queria chegar. Tive medo de me enforcar com uma gravata todos os dias. Tive medo de abandonar o meu sonho de conhecer o mundo e de escrever sobre ele. Tive medo de viver cotidianos, de ver o mesmo dia se repetindo todas as semanas e todas as semanas se repetindo em todos os meses e todos os meses finalmente se convertendo em anos e os anos se convertendo em fim. Tive medo de adiar a minha vida.

          Por isso, eu parti. E em cada curva da estrada, em cada momento em que eu não sabia o que ia acontecer lá na frente, eu sorria. E nunca suspirei de tédio ou desânimo, mesmo diante de uma longa e escaldante estrada. Senti o frio ártico em minha pele e me senti mais aquecido do que nunca, pois é melhor sentir o frio na pele do que frio no coração. Senti o calor equatorial e suei todos as minhas frustrações, que se escondiam debaixo dos meus poros. Fui enganado, sim. Mas não perdi a confiança em mim. Fui abandonado, sim. Mas não abandonei a minha fé. Fui ameaçado, sim. Mas não ameacei desistir do meu sonho. Senti fome, sim. Mas nunca deixei de sentir a minha alma alimentada.

          Se eu não tenho medo agora?

          Tenho medo e sempre quero ter medo.

          Agradeço ao medo. Foi ele que me fez ter a coragem de enfrentar outros medos. A verdade é que não há medo maior do que não ter medo de nada. Pois o medo nos desafia a enfrentá-lo. Quem não sente medo, contenta-se com a segurança do cotidiano, dos pratos de mesmos sabores, dos bom-dias sem calor.

          Sinto medo de não ter medo. Medo de ter coragem de viver uma vida sem sobressaltos, sem riscos, sem desafios...

          Quero ter medo!

          Quero, sobretudo, ter medo da morte, para ter coragem de enfrentar... todos os medos da vida.


Fonte:
http://andrekondo.blogspot.com

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Outros Contistas : Luis Marcus da Silva

Luís Marcus (ou Marcos) da Silva nasceu em Fortaleza, 1964. Editou “Noite Empalhada”, no Almanaque de Contos Cearenses. Teve “Ociosidade” classificado (e publicado em coletânea) em 4º. lugar no I Prêmio Literário Cidade de Fortaleza. Estampou contos em jornais. Inédito em livro.

                Os contos de Luís Marcus da Silva, embora apresentem características da narrativa realista urbana, buscam o inusitado, o lado obscuro da realidade. Narrado na primeira pessoa, “Noite empalhada”, apresenta um narrador sem nome explícito, envolto em brumas, a falar para outro e, ao mesmo tempo, para si mesmo. Fala de noite, solidão, loucura e morte: “A loucura, a morte: elas sempre chegam durante a noite”. Como se delirasse: “Será que te matei ou te mataram?” Para quem conhece a cidade de Fortaleza, é fácil perceber por onde se locomove o personagem: “A 24 de Maio nos meus delírios, a saudade da outra cidade que não mais existe e uma forte atração pela morte”. Refere-se a uma rua do centro e a uma cidade que se transformou nos últimos anos numa metrópole caótica.   

                Em “Iniciação”, o mesmo caos interior a se misturar ao caos urbano e do planeta. No entanto, seu narrador se apresenta como um ser mitológico, e não como um personagem de carne e osso. Em vez de um conto realista ou intimista, uma parábola, uma alegoria, em que o narrador seria “o ser humano” e não “um ser humano”. Em “Pedrada” a violência urbana (o caos urbano) e também a violência humana são retratadas num enredo singular, em que meninos na rua atiram pedras uns em outros e terminam por atingir o rosto de uma mulher, “num talho entre os olhos e a boca”. O narrador (escondido em uma mercearia, testemunha ocular dos atos de desordem dos pequenos) não fala de si mesmo, voltado que está para os garotos e suas ações, como um repórter. Para ele, os atiradores de pedras se comportam como seres das cavernas: “A batalha primitiva continua no seu apogeu”.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A Saudade em Sonetos Diversos VI


RAIMUNDO CORREIA
Saudade

Aqui outrora retumbaram hinos;
Muito coche real nestas calçadas
E nestas praças, hoje abandonadas,
Rodou por entre os ouropéis mais finos...

Arcos de flores, fachos purpurinos,
Trons festivais, bandeiras desfraldadas,
Girândolas, clarins, atropeladas
Legiões de povo, bimbalhar de sinos...

Tudo passou! Mas dessas arcarias
Negras, e desses torreões medonhos,
Alguém se assenta sobre as lájeas frias;

Em torno os olhos úmidos, tristonhos,
Espraia, e chora, como Jeremias,
Sobre a Jerusalém de tantos sonhos!...

RAUL DE LEONI
Decadência

Afinal, é o costume de viver
Que nos faz ir vivendo para a frente;
Nenhuma outra intenção, mas simplesmente
O hábito melancólico de ser...

Vai-se vivendo... é o vício de viver...
E se esse vício dá qualquer prazer à gente,
Como todo prazer vicioso é triste e doente,
Porque o Vício é a doença do Prazer...

Vai-se vivendo... vive-se demais,
E um dia chega em que tudo que somos
É apenas a saudade do que fomos...

Vai-se vivendo... e muitas vezes nem sentimos
Que somos sombras, que já não somos mais nada
Do que os sobreviventes de nós mesmos!...

SILVA LOBATO
Crepúsculo

Crepúsculo. Saudade é a dor da ausência. A essa hora
É triste o campo, é triste o rio e é triste a mata.
Pelo espaço, a reboar, a voz de um sino chora;
Chora o seu pranto oculto a alma de uma cascata.

Lento, o orvalho do céu, posto em pingos de prata,
Borda os verdes festões da sorridente flora...
Calam-se as aves. No ar, ao pôr do sol, desata
A alta estridulação a cigarra sonora.

Ó noivos, que povoais a vossa alma de sonhos,
Que nostalgia! Que tristeza, olhos tristonhos,
Não vos trouxe essa luz crepuscular de agosto?!...

E a saudade a pungir vosso peito dorido,
É a lembrança dos que se vão para o sol posto,
É a incontida explosão desse amor incontido!

VESPASIANO RAMOS
Soneto da volta

Desde este instante, sem cessar, maldigo,
Aquele instante de felicidade!
Para que tu vieste ter comigo,
Meu amor! Minha luz! Minha saudade?!

Dês que te foste, foram-se contigo
Todos os sonhos desta mocidade...
A tua vinda — fora-me um castigo;
A tua volta — uma fatalidade!

Dês que te foste, dentro em mim plantaste
A ânsia infinita dos desesperados
Porque voltando, nunca mais voltaste...

Correm-me os dias de aflições, cobertos:
Eu entrei para o amor de olhos fechados
E saí para a dor de olhos abertos!

VINICIUS DE MORAES
Soneto de contrição

Eu te amo, Maria, eu te amo tanto
Que o meu peito me dói como em doença
E quanto mais me seja a dor intensa
Mais cresce na minha alma teu encanto.

Como a criança que vagueia o canto
Ante o mistério da amplidão suspensa
Meu coração é um vago de acalanto
Berçando versos de saudade imensa.

Não é maior o coração que a alma
Nem melhor a presença que a saudade
Só te amar é divino, e sentir calma...

E é uma calma tão feita de humildade
Que tão mais te soubesse pertencida
Menos seria eterno em tua vida.

Fonte:
http://www.elsonfroes.com.br/sonetario/saudoso.htm

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Acruche Collection - Trova 20


Fábio Ramos (Poemas Avulsos)


INCERTEZAS

Corredores escuros
Avenidas desertas, cidade morta
Todos julgam-se amigos, companheiros
E, mesmo assim
Tudo é em vão, tudo é inútil
O tempo é só, incrédulo da própria realidade
O tempo é só...
É só ele em seu silêncio
Sussurrando apenas aos sábios, as almas puras
Tudo o que sente, o que pensa

No vem e vai, nada fica, tudo um dia partirá
A felicidade é por pouco tempo
Ela chega , encanta, e desaparece
Some em meio à sonhos, ilusões...
Pensamentos...

Quem sabe,
O segredo de ser feliz, é desaparecer
Partir junto a ela, sem rumo, sem direção
Mesmo que...
Uma vida toda, um passado por inteiro fique para traz
Mesmo que o destino torne-se incerto
E, o caminho obscuro, surpreso
Mesmo que tudo e todos
Contra o destino reajam, o julguem
Porque tudo vale, tudo se pode
Quando em meio a tantas incertezas
A grande razão de todas as loucuras
Seja um eterno amor...

H I S T Ó R I A S

Histórias.....
Toda história, é uma história de amor
Quisera eu, ter uma linda história à contar
Quisera eu, ter uma história

Histórias.....
O anseio de histórias, me fez te imaginar
Me fez te desejar, te compreender, te precisar
Criei....
Criei muitas histórias, fiz a minha história
Mas, não pude viver nenhuma delas como eu quis

Histórias....
Enquanto eu as tentei viver,
Caíram as lágrimas de meu rosto
Doeu, doeu muito em meu peito
E, até hoje dói muito

Vivo.....
Vivo em mundo que não entendo
Quero viver, para tentar entendê-lo
Não peço a morte, pois...
Não sei se vou amá-la como amo a vida

Então, eu vivo uma vida, procuro...
Uma vida de procura
Louca procura.....
Porque, loucos são, os que não se cansam de procurar
Louca vida, louco vivo....

Procuro......
Mas como procurar?
Se há algo trancado no peito
Se vivo trancado neste quarto
Sozinho, sem motivos......
Como aqui encontrar?
Se já não me encontro na imensidão deste Mundo aberto

Não......
Não há porque esclausurar, esquecer
Porque nas minhas histórias de romance,
Eu já amei
Não sei se às vivi, ou se apenas sonhei
Porque, sempre tento lembrar de mim
Mas, me lembro só
Não que eu estive solitário por todo o tempo
É porque, eu nunca encontrei ninguém
Para dizer comigo um só

Histórias......
Somente páginas que folheiam,
Que envelhecem
Páginas, que ficam no peito, e na memória
São páginas de amor, luta, dor e alegria
São, somente minhas histórias

FRAGMENTOS DA ALMA

Sonhos...
Ilusões do querer
Vida inconsciente
Vive no presente, fazendo sofrer

Sonhos que vem e vão
Pessoas que chegam, outras que partem
Amores que morrem outros que nascem
E no correr deste vai e vem
Entre chegadas e partidas
O que resta são feridas
Migalhas do que se foi

Fragmentos que restam
Restos que movem
Restos que ferem
Restos de momentos e lembranças
Ou, apenas restos de sonhos
Que jamais saíram da ilusão

Restos de um nada
Pairando no ar
Vagando um coração
Molhando um olhar
Fazendo viver
Uma alma que sangrou e partiu

SE FALO DE AMOR

Se falo de amor, não é porque saiba o que ele é
Mas porque o amo, e o amo por isso
Porque, quem ama não sabe o que ama
Nem sabe porque ama,
Muito menos quem é o amor

Talvez seja esquizofrenia
Pois, se o amo sem saber o que é
Como sei que o sinto?
Como saber que é ele?
Não sei,
Apenas o amo, imagino, sonho...
Deixo que em minha alma se alastre
E se faça presente em mim
Único, pleno, dominante

Porque...
Já não vale reagir,
Tão pouco adianta, é forte, muito forte,
É inútil tentar
O coração é frágil, inocente, indefeso
Um dependente deste amor tão distante
Que me persegue, me condena
E, me aprisiona....
Em tua ausência
Em tua falta, longe do seu toque
Do seu beijo, do seu cheiro
Do aconchego dos teus braços

O vazio, o frio e a solidão
Companheiros inseparáveis
São tomados por pensamentos exultantes
Viagens de brando sentimento
Perdido no ar, solitário
Na ilusão de sua própria existência
De suas próprias razões
No seu próprio existir...

Ah!!! Amor,
Se o amo,
Se te sinto, sem saber quem tu és,
Porque não vens ao meu encontro?
E, me revela quem tu és.

AMIZADE ETERNA

Falar de amigos, parece tão fácil falar de amigos.
Algo tão complexo, intenso, profundo
Alegrias e tristezas juntos, instantes eternos
Momentos inesquecíveis
Mão estendida quando falta o chão
Sorrisos e lágrimas compartilhadas em uma grande conquista
Lágrimas na dor, lágrimas na conquista
E sempre ali, mesmo em  silêncio
Acalento vindo do olhar, carinho partindo da alma inundando coração
Em uma energia inexplicável, vivida por você e eu

Amigo, um bem maior
Amigo na fé, amigos na alma
Amigos na eternidade
Amigos na simplicidade e na complexidade de sentir incomparável
Um querer incontrolável, sentimento sem cobrança, sem medida
Almejando a vida, de um laço abstrato, onipotente, viril
Um laço de amor na essência de uma AMIZADE eterna.

Fontes:
http://www.poetasdelmundo.com/detalle-poetas.php?id=6438
http://www.recantodasletras.com.br/autor_textos.php?id=25063&categoria=7

Fábio Ramos (1980)

Fabio Ramos nasceu em Lages, na Serra de Santa Catarina, em 04 de novembro de 1980.

Filho de Carlino dos Santos e Solineti Ramos dos Santos, iniciou sua carreira artística aos oito anos na música na cidade de Rio dos Cedros, no Vale Europeu de Santa Catarina.

Fabio viveu em contato com a arte e a cultura europeia, presente em movimentos sociais, esporte, cultura e lazer na cidade em que cresceu RIO DOS CEDROS - SC, e passando por diversas situações usou papel e caneta para fazer um verdadeiro amigo, um refúgio para suas lamentações, medos, sonhos, desejos. Bastante contraditório por estudar e trabalhar no setor das exatas, Fabio fez da música e da poesia algo muito forte em sua vida.

A princípio seus textos eram apenas rascunhos de papel escondidos, até que amigos e amigas começaram a ler e gostar dos textos, e então começaram a transmitir os mesmos, tornando Fabio conhecido por belos poemas.

Em 1996 conheceu o escritor Pomerano Cícero Pedro de Mello, que incentivou e mostrou os primeiros caminhos para tornar-se um bom escritor. Neste tempo a mídia local do Vale, começou a apoiar seu trabalho e depois de muito tempo utilizando diversos meios para divulgar suas obras, Fabio então foi reconhecido e tem textos espalhados por todo o Brasil e o mundo.

Em 2007 iniciou participações em livros, como a Antologia Coletânea de Poemas, Crônicas e Contos, “ELDORADO”, Volume IV, pelo Celeiro dos Escritores, e logo em seguida participou da Antologia de Poesia e Prosa de Escritores Contemporâneos “Amor & Paixão”, Volume I.

Também pelo Celeiro dos Escritores, em 2009 participou da Antologia “Poesia do Brasil”, e do Congresso Brasileiro de Poesia e encontro internacional de Arte, e hoje com diversas participações mundiais em livros e eventos.

Em 2010 pela primeira vez  tomou  posse como Imortal Acadêmico na Academia Boituvense de Letras e Artes / SP ", e recebeu também o Título de "CHANCELER DAS ARTES".

Recebeu Menção Honrosa, na Câmara Municipal da cidade de Capinzal – SC; pelas raízes familiares nesta cidade.

Menção Honrosa, na Câmara Municipal da cidade de Chapecó – SC.

No ano de 2011, Fabio Ramos, tornou-se Acadêmico da:  *ACLA/MG  – Academia de Ciências  Letras e Artes de  MG,  recebendo o cargo de Delegado de Artes , e em julho deste ano o título Provedor da Paz, todos pela ACLA/MG.

Ainda em julho de 2011 recebeu o título de “Comendador da Ordem do Mérito Tiradentes Protomartir da Independência”,   pela Casa Despotal de Thessalônica, Theocrática de Lagash, que é uma Entidade Cultural de Direito Histórico em Exilio. Recebeu medalha Tiradentes,  A " Ordem do Mérito Tiradentes Protomartir da Independência" é uma Ordem do Mérito que tem por Missão Honrar , Premiar e reconhecer Artistas , Escritores e Personalidades que se destaquem na sociedade onde vivem ,trabalhando em prol da Humanidade como fez o Protomartir da Independência.

Em outubro de 2011, recebeu na Itália a Medalha e Lauda de Honra ao Mérito da “Soberano Nobile e Reale Famiglia Italiani di Taranto”.

Nos anos de 2011, 2012 e 2013, recebeu o Prêmio Destaque da Literatura, pelo Colunista Social Paulista, Raimundo Nonato.

Foi selecionado para o Livro Os 100 Melhores da Poesia no Brasil, sendo eleito um dos melhores poetas Brasileiros.

Recebeu ainda a Lauda de Honra ao Mérito da Casa de Gouvin – Portugal.

Em  2012, a nomeação de Senador Estadual da FEBACLA – Federação Brasileira dos Acadêmicos de Ciências Letras e Artes, onde também passa a responder em nome da Federação para todo o Estado de SC.

Recebeu em julho de 2012 o Prêmio Pena de Ouro – Selo de Ouro da Literatura Brasileira, no Rio de Janeiro.

Membro Honorário da AFLA -  Academia Fraiburguense de Letras.
        
Recebeu a Medalha Poeta Célio G. da Silva, pela ALB - SC -  Academia de Letras do Brasil – SC.

Recebeu a indicação de MEMBRO da ALB - Suiça -  Academia de Letras do Brasil Internacional Sucursal  Suiça.

Recebeu a nomeação de membro vitalício Cadeira 41 como da ALB - SC -  Academia de Letras do Brasil – SC.

Nomeado Presidente da sucursal Rio dos Cedros – SC,  dA ALB - SC -  Academia de Letras do Brasil – SC, posse em novembro de 2013,
Nomeação de Presidente da sucursal Micro Região de Blumenau – SC,  da ALB - SC -  ACADEMIA DE LETRAS DO BRASIL – SC, posse em novembro de 2013,

Nomeação de Vice Presidente Estadual da ALB - SC.

Título de Doutor em Filosofia Univérsica Ph.I. - Filósofo Imortal, em reconhecimento a produção Filosofo/Literária de Repercussões Internacionais.

Recebeu em fevereiro de 2014 a nomeação de Secretário Poetas Del Mundo Para o Brasil.

LIVROS

*Antologia  Coletânea de Poemas, Crônicas e Contos, “ELDORADO” , Volume IV, pelo Celeiro dos Escritores,
*Antologia de Poesia e Prosa de Escritores Contemporâneos “Amor & Paixão”, Volume I, pelo Celeiro dos Escritores
*Antologia “Poesia do Brasil”, no Congresso Brasileiro e encontro internacional de Artes
*Antologia “Poetas Contemporâneos do Brasil", pelo Portal do Poeta Brasileiro
*Antologia “À PAZ”
*Antologia “ALIMENTO DA ALMA” pela Editora All Print – SP
*Agenda Poética, pela Editora All Print - SC
*Antologia “CRISTAL DE TALENTOS II” , pela Editora Scoterci - SP
*Antologia “DESTAQUE DA LITERATURA” , pelo Colunista Social Raimundo Nonato – SP
*Antologia “DEL´SECCHI” , pelo Colunista Social Raimundo Nonato – SP
*Antologia “MELHORES DA POESIA BRASILEIRA”, por Jane Rossi e Mônica Rosemberg
*Antologia “POESIAS” , pela ACHE, Associação Chapecoense de Escritores
* ETERNIDADE NA VOZ DE UM CORAÇÃO,  Livro solo de Poesias
* O CORAÇÃO DE LORENZO, Romance

Fonte:
Dados enviados pelo poeta

Irmãos Grimm (O Casamento da Dona Raposa)

Primeira história

Era uma vez um velho raposo que tinha nove rabos, e que achava que a sua esposa não era fiel à ele, e que estava tentando traí-lo. Ele ficou deitado debaixo do banco, sem se mover, e se comportou como se estivesse morto como uma pedra. A Senhora Raposa foi até o quarto dela, se fechou lá dentro, junto com o seu namorado. A Senhorita Gata, estava sentada ao lado do fogão, e cozinhava. Quando ela ficou sabendo que o velho raposo havia morrido, pretendentes começaram a aparecer. A criada ouviu quando alguém chegou à porta da casa e bateu. Ela foi atender e abriu a porta, e era um jovem raposo, que disse,

"O que você está fazendo agora, Senhorita Gata?
Você está dormindo ou acordada?"

Ela respondeu,

"Eu não estou dormindo, estou acordada,
Queres saber o que estou fazendo?
Estou preparando uma deliciosa cerveja com manteiga,
O cavalheiro quer entrar e beber alguma coisa?"

“Não, obrigado, senhorita,” disse o raposo, “o que a Senhora Raposa está fazendo?”

A criada respondeu,

"Ela está sozinha em casa,
E está se lamentando.
Chorando até os olhos ficarem vermelhos,
Porque o Senhor Raposo morreu."

"Então, diga a ela, senhorita, que um jovem raposo está aqui, e gostaria de cortejá-la." "Certamente, meu jovem."

A gata então, subiu as escadas e ouve-se trip, trap. Ela bateu na porta fazendo tap, tap, tap,

"Dona Raposa, a senhora está aí dentro?"

"Ó sim, minha gatinha," ela exclamou.

"Tem um pretendente lá fora querendo falar com a senhora."

"Diga-me como ele é, minha querida?"

"Ele tem nove rabos belíssimos como o falecido Senhor Raposo?"

"Oh, não," respondeu a gata, "ele tem somente um."

"Então, não quero conhecê-lo."

A Senhorita desceu as escadas e mandou o pretendente embora. Pouco depois, alguém bate à porta, e um outro raposo estava à porta e queria cortejar a Senhora Raposa. Ele tinha dois rabos, mas a sua sorte não foi melhor que a do primeiro. E depois deste, outros também vieram, cada um com um rabo a mais que o anterior, mas todos foram rejeitados, até que finalmente veio um que tinha nove rabos, como o velho Senhor Raposo. Quando a viúva ficou sabendo, ela disse alegremente para a gata,

"Agora podem abrir bem os portões e as portas,
E coloquem o Senhor Raposo que morreu lá pra fora."

Mas quando o casamento estava para ser realizado, o velhor Senhor Raposo se mexeu debaixo do banco, e começou a dar cacetadas no sem vergonha, e expulsou a Senhora Raposa e todos para fora de casa.

Segunda história


Quando o velho Senhor Raposo havia morrido, o lobo apareceu como pretendente, e bateu na porta, e a gata que, era a criada da Senhora Raposa, abriu a porta para ele. O lobo a cumprimentou, e disse,

"Bom dia, Senhorita Gata de Monte Cristo,
Porque você está sentada aí sozinha?
O que você está fazendo de bom?"

A gata respondeu,

"Estou fazendo pudim de pão com leite,
O cavalheiro gostaria de entrar e comer um pouco?"

“Não, obrigado, Senhorita Gata,” respondeu o lobo.
“A Senhora Raposa não está em casa?”

A gata respondeu,

"Ela está no quarto dela lá em cima,
Lamentando seu triste destino,
Chorando dolorosamente suas preocupações,
Porque o Senhor Raposo não vive mais."

O lobo respondeu,

"Se ela estiver precisando de um marido agora,
Então, será que ela poderia descer um pouquinho até aqui embaixo?"

A gata subiu correndo as escadas. Mexendo com o rabo de um lado e de outro, ela então chegou na porta do gabinete com seus cinco aneis de ouro e bate na porta,

"A senhora está aí dentro, minha boa Senhora Raposa?
Se a senhora estiver precisando de um marido agora.
Então, será que a senhoria poderia descer um pouquinho lá embaixo?"

A Senhora Raposa perguntou,

"Pode me dizer se o cavalheiro está usando meias vermelhas e tem uma boca pontuda?"

"Não," respondeu a gata.

"Então ele não serve para mim."

Quando o lobo foi embora, veio um cachorro, um veado, uma lebre, um urso, um leão, e todos os animais da floresta, um após o outro. Mas um dos pontos positivos que o velho Senhor Raposo possuía, estava sempre faltando, e a gata continuava a expulsar os pretendentes. Até que um jovem raposo apareceu.

Então a Senhora Raposa disse:

"Pode me dizer se o cavalheiro está usando meias vermelhas, e possui uma boca pontuda?"

"Sim," respondeu a gata, "ele possui."

"Então, faça com que ele suba até aqui," disse a Senhora Raposa, e mandou que a criada gata preparasse a festa de casamento.

"Varra o quarto e deixe-o o mais limpo que puder,
Abra a janela e jogue o meu ex-marido que morreu lá pra fora!
Porque ele trouxe muitos ratos gordos e deliciosos para casa,
Mas na sua esposa ele nunca pensou.
Mas comia tudo que caçava."

Então, o casamento foi realizado com o jovem Senhor Raposo, e todos se divertiram e dançaram; e se ainda não tivesse sobrado nada, estariam dançando até agora.

Fonte:
Contos de Grimm

A Saudade em Sonetos Diversos V

MENDES MARTINS
À Espera


E vem a primavera. E os prados novamente
Cobriram-se de luz, de flores, de verduras;
Fez-se azul todo o céu, azul e transparente
Como um pálio de gaze aberto nas alturas.

E eu disse assim comigo: "Às minhas desventuras
Aos pesares que eu sofro, e tornam-me descrente,
Vão enfim pôr um termo os beijos e as ternuras
Daquela que eu espero e de quem vivo ausente."

E assentei-me, esperando-a, à beira do caminho...
O cair de uma folha, a música de um ninho
Lembravam-me o seu passo e a sua voz, criança!

E afinal veio o inverno e foi-se a primavera,
E cheio de saudade e sempre à sua espera,
E à força de esperar perdi toda esperança.

NARCISO ARAÚJO
Casa triste


Como está triste aquela casa! Nela,
Meus olhos viam tanta vez, outrora,
Em purpurejos, rútila, a janela
Toda tocada de clarões de aurora.

Ali morou Maria, doce e bela
Conterrânea gentil, mimo de Flora,
Que perfumava, em outro tempo, aquela
Casa que eu vejo tão tristonha, agora.

Como está triste aquela casa! Quando,
Alheio a tudo, longamente a fito,
Uma saudade, dentro em mim chorando,

Recorda o feliz tempo, em que Maria,
Com o rosto alegre, juvenil, bonito,
Era, à janela, um sol que resplendia.

OSCAR D'ALVA
Hora de tédio


Quando a sós na existência meditando
Triste, revivo malogrados dias,
Ao recordar mais dores que alegrias,
O coração se sente miserando.

Punge-me n'alma fundas agonias
De uma vida passada o bem pregando
Em toda a parte, e apenas encontrando
Insolências, insultos, ironias...

Os gozos são efêmeros fulgores
Que minha alma lembrando hoje revive;
O mais são mágoas, lutos, dissabores...

Então sinto — ao pensar que não gozei —
Saudade de prazeres que não tive,
Esperança de bens que não terei!

OSÓRIO DUQUE ESTRADA
Pulvis


Áureos castelos da primeira idade,
Dourada fantasia de outras eras
Cuja luz de uma estranha claridade,
A alma me encheu de sóis e primaveras;

Glória, amor, ilusões da mocidade
Palpitando ao clarão de outras esferas;
Ânsias do afeto, espinhos da saudade,
Sonhos alados, fúlgidas quimeras;

Ideais da velha crença sonhadora;
Poemas tangidos da chorosa lira
(Que mais chorara se ditosa fora);

Por tanta coisa essa alma ainda suspira!
Tanta coisa, que a mente enganadora
Julgava ser verdade e era mentira!

PAULINO DE ANDRADE
Olinda


No alto, a paisagem verde-escura e acidentada.
Em baixo, o ouro da praia e a saudade do mar...
Sugere lendas... reis magos... terra encantada...
Fidalgas castelãs... troveiros a cantar...

É bem de vê-la sob a tragédia sagrada
Do crepúsculo: é grande, heróica, singular!
Eu, quando a vejo assim, tenho a alma amplificada
E uma dilatação de beleza no olhar.

E se, pela alterosa e lendária Palmira
Longa e empolgada, a vista amplamente se estira,
Lembro o Nebo sob a ânsia imortal de Moisés!...

E um ninho azul coroa a epopéica Cidade...
Rumina o coqueiral uma velha saudade,
E a saudade do Mar rumoreja-lhe aos pés...

PAULO DE ARRUDA
Tristezas

 
Há saudades que pungem docemente
Como as lembranças de um feliz passado,
Quando se vive ainda acalentado
Pelos sonhos de gozos do presente.

Mas, se da vida no areal candente
Para o vigor perdido, e abandonado
Volve aos céus da ventura o olhar magoado
Como a saudade, então, é atroz, pungente!

E, ah! feliz do que em meio aos dissabores
Da alma ainda achar nos íntimos refolhos
Um mar de prantos que lhe afogue as dores!

Pois sofre mais quem desolado e exangue,
Não tendo nunca lágrimas nos olhos,
Tem dentro da alma lágrimas de sangue.

PEDRO KILKERRY
Taça 

 
Aquela taça de metal que, um dia,
À Laura, um dia assim, lhe oferecera,
Entre relevos delicados de hera,
"Saudade" em letras de rubis trazia.

E era um riso de amor e de poesia
Em cada riso ou flor da primavera...
E Laura, a um canto, cruel, por que a esquecera,
Laura que soluçou, porque eu partia?

Anos derivam. De remorsos presa
Não é que vai, acaso, à soledade
Da abandonada... Vai por fantasia.

Mas, como um choro, vê, vê com surpresa,
Desmancharem-se as letras da "Saudade"
Que aquela taça de metal trazia.

PEDRO SATURNINO
Açucenas


Minha Mamãe! tu foste mãe-menina,
Pois é filho das tuas mãos pequenas
Aquele pé viçoso de açucenas,
Que plantaste quando eras pequenina.

Carregado de flores (e de penas),
Lá no mesmo local ainda germina;
Do passado jardim resta ele apenas,
Tudo mais, ao redor, é mato ou ruína.

Eu, teu filho de amor que tanto estimas
E irmão dele nos dons, e até nos males,
Ao lembrar-me de ti, floresço em rimas.

— Meu irmão com saudades e entre dores,
Entre espinhos cruéis levanta o cális
E lembra-se de ti chorando flores!

QUINTINO CUNHA
Entre nuvens


Ameaça chuva. O pássaro na rama
Vem de ocultar-se. A fera permanece
À sombra do covil. Tudo parece
Triste como a saudade de quem ama.

Enquanto o céu apenas se recama
De nuvens, não; mas, quando se incandesce
De um relampejar profundo, a chuva desce,
Por fina força a chuva se derrama.

Em nós outros também o tempestivo
Amor é assim como este quadro vivo,
Que, há pouco, a natureza dominava.

Falo por mim, tirando por Maria;
Pois quando na minha alma relampejava,
Nos seus olhos tristíssimos chovia.

Fonte:
http://www.elsonfroes.com.br/sonetario/saudoso.htm

Teófilo Braga (Contos Tradicionais do Povo Português) Maria da Silva

Recolhido no Algarve

Era uma vez um rei, que andava à caça, e perdeu-se no monte, quando se fechou a noite. Foi com o seu pajem pedir agasalho a uma cabaninha de um carvoeiro que vivia na serra. O carvoeiro deu logo a sua cama ao rei, e a mulher, como estava doente, ficou deitada em uma enxerga no adro. De noite ouviu o rei um grande alarido, e choros, e uma voz que dizia:

– Esta, que agora acaba de nascer
Ainda há de ser tua mulher;
E por mais que a sorte lhe seja mesquinha
Sempre contigo virá a ser rainha.

O rei ficou bastante atrapalhado, e tratou de saber que horas eram. Era meia-noite em ponto. Ao outro dia quando falou com o carvoeiro, perguntou-lhe que barulho tinha sido aquele.

– Foi uma filhinha que me nasceu; havia de ser pela meia-noite em ponto, senhor.

O rei disse que queria fazer a fortuna daquela criança, e que lhe daria muito dinheiro se a deixasse ir com ele. O carvoeiro deixou, e o rei partiu. Pelo caminho disse ao pajem que fosse matar aquela criança, porque era preciso fugir a um agouro com que ela tinha nascido. O pajem não teve alma para matar a inocente, e deixou a criança no fundo de um barroco, entre uns silvados, embrulhada no cinto vermelho que ele tirou de si. Tornou para onde estava o rei, e disse:

– Real senhor, não tive ânimo de matar a criança, mas deixei-a num sítio donde se não vê nem monte nem fonte, e lá morrerá com certeza.

Aconteceu que um rachador de lenha veio trabalhar para aquele sítio, ouviu chorar uma criança, desceu ao barroco e tirou-a condoído, e levou-a para casa. A mulher, que não tinha filhos, acolheu-a com satisfação e tratou-a como se fosse seu sangue, e chamavam-lhe Maria da Silva, em lembrança do acontecido.
   
Passados anos o pajem ia com o rei de jornada e viu uma rapariguinha de cinco anos vestida com um capotinho vermelho, que ele conheceu ser feito do seu cinto. Foram ter com os camponeses, souberam a história da rapariga, o rei deu-lhes muito dinheiro, para o deixarem lavá-la para o palácio; assim que o rei partiu, mandou fazer um caixão onde meteu a Maria da Silva, e foi ele mesmo deitá-la ao mar. Um navio encontrou no alto mar o caixão, quiseram ver o que continha, e ficaram pasmados por acharem ainda viva uma criança muito linda. Foram contar tudo à terra a que chegaram, e o rei dali quis ver a rapariguinha, a rainha tomou-lhe amor, e quis que ela se criasse no palácio, para servir de aia à princesa. Quando se fizeram as festas do casamento da princesa, já Maria da Silva era grande; vieram às festas do casamento muitos reis e príncipes e veio também aquele que queria matar Maria da Silva.

O pajem que o acompanhava conheceu logo Maria da Silva, e disse-o ao rei seu amo. O rei, quando foi ao serão, quis dançar com ela, que estava muito asseada, e deu-lhe um anel dizendo:

– Dançando-te dou, dançando-me hás de dar;
E se me não deres, a vida te há de custar.

E ela respondeu-lhe:

– Dançando o recebi, dançando o hei de dar;
Também hei de ser rainha e no seu reino reinar.

Acabado o serão Maria da Silva foi para o seu quarto, e uma criada comprada pelo tal rei, roubou-lhe o anel, e deitou-o ao mar. Maria da Silva ficou muito triste, quando viu que tinha perdido o anel, e que não podia mais dar conta dele; estava à janela quando viu em um quintal uma criada a amanhar um peixe. Correu lá, e viu luzir no bucho do peixe o anel; tirou-o, voltou para o palácio. À noite ao serão o rei tornou a dançar com ela e a repetir as mesmas palavras. Maria da Silva mostrou-lhe o anel e repetiu as palavras que dissera na véspera. Então o rei ficou muito admirado, e disse:

– Já que ninguém pode fugir à sua sorte e tens de ser minha mulher e rainha, já gosto de ti, e hoje mesmo se façam as bodas.

Fonte:
Contos Tradicionais do Povo Português

Machado de Assis (Gazeta de Holanda) N.° 37 – 22 de novembro de 1887

Pessoas há... Por exemplo,
Que vale um desfalque triste
Cuja notícia contemplo?
Acho que já nem existe.

Pois, entrados os cobritos,
Desmancha-se a diferença,
E o que eram terríveis gritos
Chega a pura indiferença.

Pessoas há que detestam
Rimas daquele feitio;
São cadeias que molestam
A inspiração, mais o brio.

Eu cá sendo, necessário
Ir andando, vou andando;
Rimo Corsário e corsário,
E bando com contrabando,

Sem saber se o leitor gosta,
Ou não dessa rima rica.
Se eu quero a obra composta,
Menos que fazer me fica.

Se não sair boa a quadra,
Que saia, ao menos, completa;
Lá, se lhe quadra ou não quadra,
É queixar-se do poeta;

Não do triste gazeteiro,
Que rói o tempo e trabalha
Sem encontrar no tinteiro
Qualquer assunto que calha.

Ninguém me dirá que as notas
Falsas e germanizadas
Valem nunca um par de botas,
Novas ou acalcanhadas.

Pois que já tratara delas
O cronista do costume,
E ora são como panelas
A que não resta chorume.

Nem elas, nem os debates
Do Jockey-Club, e os palpites,
Nem os terríveis combates
De agudas encefalites.

De encefalites agudas,
Das quais não escrevo nada;
As rimas devem ser mudas,
Quando a matéria é pancada.

E brigar por dois cavalos,
Gastar suor, sangue e murros,
Defendê-los, levantá-los,
Para um amador de burros,

É completa maluquice.
Eu amo os burros, capazes,
Sem ardor nem casquilhice,
Maduros desde rapazes.

Barulhos entre campistas?
Cadeira de Torres Homem?
São matérias de altas vistas,
Que aos fracos olhos se somem.

Sobretudo, em medicina,
Basta-me um só documento,
Cousa séria, não mofina,
Obra séria e de momento,

A autópsia de um tal Garrido,
Que foi achado enforcado,
Sem ficar bem definido
Se era ou não um suicidado.

Se sim ou se não — responde
O auto que é impossível
Achar por onde se sonde
Esse problema terrível.

Mas, continuando a pena
Naquele labor ingrato,
De toda a descrita cena
Conclui que houve assassinato.

É por isso que os problemas
Nunca me meteram susto;
São simples estratagemas
Que a gente desfaz sem custo.

Assim desfizesse o dano
E a funda melancolia
De não ser pernambucano!
Teria visto, de dia,

Vênus, o astro, no Recife,
Onde apareceu agora...
Ah! tu rimas com patife,
Tu, Recife de má hora!

Lembra a notícia que Enéias,
Indo da troiana parte,
Viu assim a flor de idéias,
E assim a viu Bonaparte.

Foi o que li e acredito;
Que eu creio em tudo o que leio,
E como sigo um só rito
Só leio aquilo em que creio.

Faça o leitor outro tanto;
Se não crê nesta Gazeta
De Holanda, ponha-a num canto;
E rimará com Gazeta.

Fonte:
Obra Completa de Machado de Assis, Edições Jackson, Rio de Janeiro, 1937.
Publicado originalmente na Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, de 01/11/1886 a 24/02/1888.

Lourdinha Leite Barbosa (Quadros em Movimento)

A mala voltara quase vazia como fora; sua mente, no entanto, estava repleta. Visitara museus, bibliotecas e livrarias.

O pequeno quadro, presente de um amigo, foi acomodado entre os inúmeros que pendiam assimetricamente da parede da sala. Encontrar um espaço ali era quase impossível. Afastou-se para ver o resultado e teve a impressão de que algo se movera. Aproximou-se com medo de que fosse um inseto. Não viu nada.

Os quadros mais antigos se alargaram e forçaram os mais recentes a se comprimirem. Nesse empurra-empurra alguns se inclinaram, Ingrid percebeu o leve rumor e recolocou-os em seus lugares. As cinco mulheres de branco que, no quadro de moldura negra, se dirigiam às suas casinhas assustaram-se com o movimento e apressaram o passo.

A luz atravessou a janela e pousou sobre o quadro em que uma moça caminhava por uma rua ensolarada. Ela estancou o passo, largou a cesta que mantinha encostada ao quadril e rodopiou sobre o calçamento irregular.

Ingrid pôs um CD de Chico Buarque e iniciou uns passos de dança. As pessoas do quadro em tons vermelho e negro, que observavam uma festa popular, voltaram-se e a aplaudiram com entusiasmo. Sem perceber o que se passava na parede de sua casa. Ingrid apanhou as ilustrações que trouxera do Museu Dorsay e estendeu-se no sofá abaixo do quadro em que um pintor fazia seu auto-retrato. O pintor abandonou palhetas e tintas e passou a observar, junto com ela, as reproduções.

Um forte sopro de vento alçou as cortinas e avivou as figuras dos quadros. As três mulheres que conversavam, ao lado de grandes cestos cheios de conchas, despiram suas longas saias, retiraram os panos da cabeça e correram, numa nudez branca, em direção ao mar. Ao mesmo tempo, as pessoas do quadro abaixo, que caminhavam com tranqüilidade ao lado do Sena, puseram-se a correr confusas em todas as direções. Já não se obedecia aos limites impostos pelas molduras. Aprisionadas no tempo, não sabiam para onde ir ou o que fazer. Atônitas descobriam um novo mundo. Uma mulher que parecia ter saído de uma revista de modas da década de cinquenta falou em francês para um enorme galo que se mantinha parado: Por que você não se move? — O galo mexeu a cabeça e respondeu em português: Estou nesta posição desde 1972, não consigo mexer as pernas.

De repente, formou-se um grande círculo e reclamações de toda ordem foram ouvidas em diferentes línguas. Todos se entendiam: “Fui paralisada enquanto caminhava para casa”; “Estou há anos sem tomar banho”, “Não sei o que foi feito da minha família”, “Nem pudemos entrar em casa, depois da festa de Iemanjá”; “Quantos anos se passaram? Estou jovem e minha filha deve estar velha”; “Por que fomos aprisionados?”; “Eu nunca terminei meu auto-retrato. Temos que fazer alguma coisa”.

Durante a confusão uma moldura caiu. Ingrid levantou-se atordoada. Estava mesmo precisando descansar, suas pernas pareciam não lhe pertencer. Apanhou o quadro e, ao colocá-lo de volta, parou perplexa: a tela não tinha qualquer vestígio de tinta.

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Outros Contistas : Lourdinha Leite Barbosa

Lourdinha Leite Barbosa (Maria de Lourdes Dias Leite Barbosa) nasceu em Ipu. Licenciada em Letras pela Universidade Estadual do Ceará e mestre em Literatura pela Universidade Federal do Ceará. Pertence ao Grupo Espiral. Exerceu o cargo de Presidente da Academia de Letras e Artes do Nordeste – Secção Ceará. Tem contos, ensaios e artigos publicados em jornais e revistas especializadas. Participa das antologias O talento cearense em contos – org. Joyce Cavalcante (São Paulo: Maltese, 1996) e Antologia de contos cearenses – org. Túlio Monteiro (Fortaleza: FUNCET, 2004). Tem editados Protagonistas de Rachel de Queiroz: caminhos e descaminhos – ensaio (São Paulo: Pontes, 1999) e A arte de engolir palavras – contos (Recife: Bagaço, 2001).

No ensaio intitulado “Sobre A arte de engolir palavras e outras artes”, aposto ao volume como posfácio, a professora Vicência Maria Freitas Jaguaribe faz minuciosa análise da obra, que poderia deixar os críticos sem mais nada a dizer. Assim, vê na coletânea cinco narrativas fantásticas, sendo as demais “de natureza mimética ou realista, no sentido mais geral desse termo”.

                Algumas histórias da coleção tratam de pequenos dramas pessoais, quase sempre femininos ou na visão feminina (personagem-narradora), em reduzido número de parágrafos curtos, fundados no recurso da narração, com breves diálogos. Como também observa Vicência Jaguaribe, “o narrador de terceira pessoa desse conto, como o de muitos outros, parece um mero recurso da autora para emprestar à narrativa uma ilusão de objetividade, pois quem na realidade acaba filtrando os fatos para o leitor é a própria protagonista, por meio da técnica do discurso indireto livre, que soa quase como um monólogo”.

                A maioria das peças do volume foi construída como narrações em terceira pessoa. Personagens-narradores encontram-se em “Nó cego”, “Poça dágua”, “Flores de papel”, “Medo” e “Encantamento”. Na primeira, uma das mais longas do livro, uma mulher conta a sua desilusão amorosa: flagra o marido com outro homem, em “beijo profundo, prolongado”, sem deixar claro ao leitor a identidade do outro, talvez para dar ao conto um ar de mistério. Na segunda narrativa, de feitio fantástico, outra mulher narra o próprio desespero, como num pesadelo. O leitor, entretanto, só percebe o perfil feminino no desfecho, quando a personagem observa: “Sei que estou ferida, mas não sinto dor”. Na terceira história desse tipo, a protagonista Zefa, a moça doida, desenvolve a narração no presente, em monólogo interior. “Medo” tem como narrador um homem, embora também pudesse ser mulher. Nas primeiras linhas ele se diz desesperado. No último dos contos em primeira pessoa um menino apaixonado pela bailarina do circo conta a história.

                Raríssimas vezes a contista se vale do flagrante, dando o narrador pequenos saltos no tempo, a cada parágrafo. Em “Bumerangue” a protagonista, sem nome explícito, chega a uma fazenda. Em flash-back a narração se volta para a partida da personagem (“Partira escorraçada e humilhada”). Seguem-se breves narrações-descrições do ambiente (“cozinha larga e clara”; “colheita do feijão”; “as chuvas trouxeram à fazenda”). Após meia dúzia de frases, apresenta o segundo ser fictício, “um rapazola franzino, de olhar manso e fala pouca”. E novo conflito se instaura, até o desfecho, quando a mulher, “resignada, partiu em busca de um novo refúgio, como a fechar uma porta sem fim”. Dessa forma, Lourdinha Leite Barbosa consegue pintar a protagonista por dentro, bem como o ambiente onde ela vive e o tempo dos seus embates interiores, tudo em pouco mais de 30 linhas. Em “A Valsa Proibida” esta técnica se repete, com algumas variações: os flashes-backs são mais longos, o tempo narrado se encurta, a personagem tem nome explícito, Mirta, e o desfecho parece feliz.

Às vezes o tempo se dilata, enquanto o espaço da ação se restringe. Em “Vida em três tempos”, como o próprio título indica, Marília se revê em três momentos de sua vida. Pensa, rememora. O conflito é interior; a protagonista se acha em casa, a olhar para “o porta-retrato em cima da mesinha de cabeceira”. Ao final, “enrodilhou-se na velha poltrona”, a dizer ao leitor que dali não saiu, ao longo da narração. Outras vezes o espaço se amplia. Em “Aqui, ali, acolá”, como o título mostra, a ação se dá em diversos lugares: no campo (árvores, pedras, estrada); na cidade (“avenida larga e movimentada”), uma pousada, um hospital. Em “Uma paisagem quase perfeita” as personagens habitam um casarão antigo, com seu porão escuro e o grande quintal cheio de árvores: uma paisagem quase perfeita. Como nos contos de fadas, as moças sonham e sofrem de solidão. “Os dias escorriam tão lentos quanto o rosário que eram obrigadas a rezar todas as noites”. E ocorre a transgressão no tempo e no espaço: a monotonia é suspensa por um acontecimento inesperado – a chegada de um jardineiro. A figura masculina penetra no mundo feminino. “Apenas no quintal e jardim”. Daí por diante tudo se transforma no casarão e nas donzelas, que vão, uma a uma, murchando, amarelando, morrendo.

                Há também histórias folclóricas, que não deslustram o conjunto, como “Flores de papel”, em linguagem regional: cabaça, tomar tenência, indagorinha, mangar de mim, fazer mangoça, pataca. A intertextualização com as cantigas de roda dá à obra um quê de arte literária. Essa localização da trama no espaço rural ou da cidade pequena ocorre em diversas peças do volume. Em “Penitente” o protagonista anda por ruas desertas, pelo átrio da matriz, vai ao açude, embrenha-se no mato, banha-se na cacimba. Não se tratam, porém, de narrativas regionalistas, quer pela manipulação da linguagem, quer pela estruturação do enredo. A contista não cansa o leitor com diálogos intermináveis de matutos e muito menos com descrições enfadonhas de paisagens e topografias.

                Os personagens de Lourdinha Leite Barbosa são apenas os que participam diretamente da trama: o protagonista e o antagonista. Raras vezes aparece terceiro ou quarto ser fictício. Isso faz com que o conto seja curto e não se desdobre em mais de uma história ou apresente um enredo dentro de outro. Mesmo no clássico triângulo amoroso, o terceiro personagem não passa de sutil lembrança. Em “Bumerangue” a protagonista faz breve referência ao ex-marido, sem sequer mencionar o nome: “Até ameaça de morte ele fizera”. Apenas “ele” e nada mais. Em “A Decisão”, Hortência lembra do ex-marido em uma frase capital: “ele confessou que tinha outra”. Essa outra não chega a ser personagem. Em “A Valsa Proibida” pode-se ver uma só ser fictício, Mirta, “mulher idosa, vestida de princesa”. Seu pai e sua mãe são apenas referidos, em fato remoto de sua vida. Os amigos são como bibelôs, objetos: “Mirta recebia os amigos com um largo sorriso”. São apenas “homens e mulheres, em traje de festa”. Com tanta economia de personagens, é natural que os conflitos não aflorem. Pois a trama é quase sempre pessoal, individual, interior. O enredo por pouco não é abolido nas narrativas de Lourdinha.  Veja-se “Vida em três tempos”, que pode ser o exemplo mais claro disso: a protagonista Marília vive com Dirceu, que, no entanto, não passa de personagem morto, passado. “Já não eram um. Calada. Sem nada a dizer. Fingindo não ver, não ouvir. Brigar para quê?” Ou seja, o outro, Dirceu, não passava de um ser apático, sem reação, incapaz de participar de um conflito.

                Vistos os contos em alguns dos fundamentos do gênero, resta-nos avaliar a linguagem da contista. Em primeiro lugar, a concisão e a precisão, presentes na maioria das histórias. Em consequência, a riqueza de sugestões e a economia dos detalhes, tão bem percebidas por Vicência Jaguaribe.  Ou seja, Lourdinha Leite Barbosa consegue realizar a arte de engolir palavras em sua primeira coleção de peças ficcionais, enquanto muitos escritores passam a vida expelindo palavras e terminam sufocados pela própria verborragia.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

José Feldman (Aquarela de Trovas n. 18)



Se acaso seu filho abusa,
diga-lhe um “não”, que faz bem.
Muita vez uma recusa
salva o futuro de alguém.
A. A. DE ASSIS (PR)
.

De uma forma desmedida,
muita gente, a toda hora,
dizendo gozar a vida,
vai jogando a vida afora!…
ALFREDO DE CASTRO (MG)

Que saudade dos brinquedos
do meu tempo de criança,
tendo os risos e folguedos
como arautos da esperança.
ALICE BRANDÃO (RS)

Solidão faz apertado
o coração sofredor,
que desperta, inebriado,
ao toque de um novo amor.
ANA MICHEL (RS)

“Via de regra” – essa é boa! –
não é uma regra geral;
é a via por onde escoa
certo incômodo mensal…
ANTÔNIO DA SERRA (PR)

Quanta gente em devaneios,
buscando instantes risonhos,
vive dos sonhos alheios
e esquece dos próprios sonhos!…
ANTÔNIO JURACI SIQUEIRA (PA)

À noite vou namorar:
- Da lua já nem preciso!…
só quero ver teu olhar
fascinando o meu sorriso.
ARI SANTOS DE CAMPOS (SC)
.

Chegar mais cedo é proeza
que assusta muito marido,
pois quem chega de surpresa
costuma ser surpreendido!
ARLINDO TADEU HAGEN (MG)

Se entre guizos, eu componho
meu disfarce de Arlequim,
há sempre um Pierrô tristonho,
que chora dentro de mim!
CAROLINA RAMOS (SP)

Eu peço que não me iludas,
nem me deixes com infarto
com essas pernas desnudas
na penumbra do teu quarto.
CLÊNIO BORGES (ES)

Da singeleza eu me ufano,
da minha rua escondida,
que tem mais calor humano
que a mais central avenida.
CONCEIÇÃO DE ASSIS (MG)
.

E desde o raiar do dia,
entre rocha, musgo e lua,
vou te fazendo poesia,
morta de saudade sua.
DÁGUIMA VERÔNICA (MG)

Quero entender a magia
do silêncio , que renova ,
e afastar a nostalgia ,
que chora na minha trova!
DELCY CANALLES (RS)

Escrevem tanta besteira!
Parem com isso, de vez!
Pois quem des…fralda bandeira
de… frauda o bom português!…
DIAMANTINO FERREIRA (RJ)

Onde a lei torta vigora
e o povo ao jugo se presta,
o rico só comemora
e o pobre é quem paga a festa.
DIVENEI BOSELI (SP)

Embora sendo poeta,
foi com você que aprendi,
Isadora, minha neta,
que Amor começa com I.
ELIANA PALMA (PR)

Pouco importa que tu venhas
apressado, em teu fulgor,
pois trazes contigo as senhas
para os feitiços do amor!
ELISABETH SOUZA CRUZ (RJ)

Na roça não se complica
a higiene rotineira:
começa na velha bica
e um gamelão é banheira!
FERNANDO VASCONCELOS (PR)

As pedras do meu caminho
vou transpondo-as com ardor
e cada dia um trechinho
vira caminho de amor!
FLÁVIO STEFANI (RS)
.

A dor materializou-se,
nestas lágrimas sem cor.
Meu orgulho evaporou-se…
Rendi-me à força do amor!
FRANCISCO NEVES MACEDO (RN)

Existe amor sem sequelas,
na união de um casal,
nos romances e novelas,
nunca na vida real.
GERALDO AMÂNCIO PEREIRA (CE)

E’ de ternura o momento
em que o Sol sorri no espaço,
se faz vida e sentimento
e lança ao mar seu abraço!
GISLAINE CANALES (SC)

O forte nó da saudade
amarra o tempo num laço,
e aprisiona a mocidade
nas trovas de amor que eu faço.
HÉRON PATRÍCIO (SP)
.

Não adianta querer tanto,
nem amar sem ser amado,
foi assim meu desencanto
ao me sentir desprezado.
IALMAR PIO SCHNEIDER (RS)

Artimanhas de um amor
que nasceu no dia-a-dia
entre a rosa e o beija-flor
no canteiro da poesia.
IEDA LIMA (RN)

Alvo da própria pirraça,
o Zé caiu do cavalo;
em vez de ganhar a taça,
na testa ganhou um galo.
ISTELA MARINA (PR)

Quando chegar, vou sorrir;
sorrirás, quando eu chegar.
Não chores quando eu partir,
para eu partir… sem chorar…
IZO GOLDMAN (SP)
.

Numa espera doce e mansa,
qual zelosa tecelã,
bordo rendas de esperança
pra enfeitar nosso amanhã!
JEANETTE DE CNOP (PR)

Leve a vida sem queixume,
plante amor por onde andar:
– Seja a fé o seu perfume.
– Seja a paz o seu altar!
JOAMIR MEDEIROS (RN)

Por minha culpa partiste;
e o sal do pranto, sem dó,
agora, torna mais triste
o triste viver de um só…
JOSÉ TAVARES DE LIMA (MG)

No brinquedo “Esconde- esconde”,
eu me escondia tão bem,
que, até hoje, não sei onde,
eu me escondi…E de quem?
LISETE JOHNSON (RS)

A imaginação flutua,
dando à vida, mais sabor…
…Que a lua é muito mais lua
nos versos de um trovador!
MARLÊ BEATRIZ ARAÚJO (RS)
.

Embora o dia me açoite
com seus barulhos brutais,
lá no silêncio da noite…
a solidão bate mais!
MARIA MADALENA FERREIRA (RJ)

A saudade é um bem guardado
que nos volta, de repente,
num presente do passado,
quando o passado é presente.
MARIA NASCIMENTO (RJ)

Quando a mágoa nos revolta,
e os dias tinge de breu,
só o Perdão nos traz de volta
a luz que a mágoa escondeu.
MARISA VIEIRA OLIVAES (RS)
.

Um erro sempre é semente
de uma dor que vai nascer.
Perdão é o melhor presente
que alguém pode receber…
MILTON SOUZA (RS)
.

Para ser feliz, na vida,
bem alegre, a todo instante,
sem causar qualquer ferida,
o equilíbrio é importante.
NEI GARCEZ (PR)
.

A criança tem direito:
lar, carinho e educação
pra conduzir com respeito
o futuro da nação.
NEIVA FERNANDES (RJ)

Pra que teu lar seja um templo,
pleno de amor e de paz,
mostra o caminho do exemplo,
que é sempre o mais eficaz.
NEOLY DE OLIVEIRA VARGAS (RS)
.

Na minha dúvida atroz,
pra evitar vexame e enrosco,
não direi “arroz com noz”,
direi sempre “arroz conosco”…
OSVALDO REIS (PR)

Você pode até amar
aos limites do impossível,
mas ao se relacionar,
equilíbrio, imprescindível.
RAYMUNDO SALLES BRASIL (BA)
.

Ser careca, ele detesta.
Não suporta usar peruca.
Então, puxou para testa
o que restava na nuca…
RENATA PACOLLA (SP)

Quando à noite, a solidão
e a saudade trazem dor,
vou dizendo ao coração:
-é o preço por tanto amor.
ROBERTO PINHEIRO ACRUCHE (RJ)

Na vida, em toscos degraus,
entre tropeços a sustos,
mais que a revolta dos maus,
temo a revolta dos justos!
RODOLPHO ABBUD (RJ)

Um coração congelado
pega fogo, de repente,
quando o amor, fósforo alado,
risca faíscas na gente!
ROSA DE OLIVEIRA (PR)

Na fornalha, em que me abraso,
– você finge que não vê )s
eu desprezo não faz caso
do meu amor… por você!
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA (SP)

Ao lento passar da horas,
aumentam as agonias…
Quanto mais tempo demoras,
mais sinto as noites vazias.
VANDA ALVES (PR)

Foi preciso muito brio,
quase a coragem faltou,
para enfrentar o vazio,
que a tua ausência deixou!
WILMA M. CAVALHEIRO (RS )

Irmãos Grimm (Os Três Homenzinhos da Floresta)

Era uma vez um homem cuja esposa havia morrido, e uma mulher cujo marido havia morrido, e o homem tinha uma filha, e a mulher também tinha uma filha. As meninas se davam muito bem uma com a outra, e gostavam de caminhar juntas, e pouco depois chegaram à casa da mulher.

Então disse a mulher para a filha do homem,

"Ouça, diga ao teu pai que eu gostaria de me casar com ele, e então você poderá tomar banho de leite todas as manhãs, e beber vinho, mas a minha própria filha irá se banhar com água e também só poderá beber água."

A garota foi para casa, e contou ao pai dela o que a mulher havia dito. O homem disse,

"O que devo fazer? O casamento é uma felicidade, mas também é um tormento."

Com o passar do tempo ele não conseguia tomar uma decisão, então ele tirou a bota, e disse,

"Pegue esta bota, ela tem um buraco na sola. Suba até o sótão, pendure-o no prego da parede, e depois coloque água dentro dele. Se a água não vazar, então eu me casarei novamente, mas se a água escorrer, não me casarei."

A garota fez o que o pai havia falado, mas a água fez com que o buraco não se abrisse, e a bota ficou cheia até o topo. Ela informou ao pai o que tinha acontecido. Então ele mesmo subiu até o sótão, e quando ele viu que ela tinha razão, ele foi até a casa da viúva para fazer corte a ela, e o casamento foi celebrado.

Na manhã seguinte, quando as duas garotas se levantaram, eis que havia diante da filha do homem, leite para ela se banhar e vinho para ela beber, mas diante da filha da mulher havia água para ela se lavar e água para ela beber.

Na segunda manhã, havia água para se levar e água para beber para a filha do homem bem como para a filha da mulher.

E na manhã do terceiro dia; havia água para se banhar; e água para beber para a filha do homem, e leite para se lavar e vinho para beber, para a filha da mulher, e assim todos os dias.

A mulher havia se tornado amarga e indelicada com a sua enteada, e a medida que os dias se passavam ela se esforçava o máximo para tratá-la ainda pior. Ela também era invejosa porque a enteada dela era linda e adorável, e a sua filha era feia e repulsiva.

Uma vez, durante o inverno, quando tudo congelava como a dureza de uma pedra, e as montanhas e os vales estavam cobertos de neve, a mulher fez um vestido de papel, chamou a sua enteada, e disse,

"Venha aqui, coloque este vestido e vá passear na floresta, e me traga um pequeno cesto cheio de morangos, — Pois estou com vontade de comer alguns."

"Mas como!" disse a garota, "nenhum morango cresce no inverno! O chão está congelado, e além de tudo a neve cobriu toda a plantação. E porque é que eu teria de ir neste vestido de papel? Está tão frio lá fora que até a minha respiração congela! O vento irá soprar o vestido, e os espinhos irão machucar o meu corpo."

"Você está me contrariando novamente?" disse a madrasta, "Trate de ir, e não me mostre a tua cara novamente até que retorne com um cesto cheio de morangos!"

Então ela lhe deu um pedacinho de pão duro, e disse,

"Isto deverá durar o dia todo," e pensou, "Ela irá morrer de frio e fome lá fora, e nunca mais a verei perto de mim novamente."

Mas a garota era obediente, e colocou o vestido de papel, e saiu com o cesto. Em toda parte não havia outra coisa além de neve, e nem sequer se podia ver um pedaço de verde. Quando ela chegou na floresta, ela viu uma casinha onde havia três pequenos anõezinhos[1]. Ela desejou a eles "Bom Dia", e modestamente bateu na porta. Eles gritaram, "Entre," e ela entrou na casa e se sentou no banco perto da lareira, onde ela começou a se aquecer e a fazer a sua refeição.

Os duendes disseram,

"Dá-nos também um pedaço de pão."

"Com prazer," disse ela, e dividiu o seu pedaço de pão em dois, e deu a eles a metade.

Eles perguntaram,

"O que você está fazendo aqui na floresta em pleno inverno, com esse vestido tão fininho?"

"Ah," respondeu ela, "Eu vim buscar um cesto cheio de morangos, e não posso voltar para casa até que eu possa encontrá-los e levá-los comigo."

Quando ela terminou de comer o pão, eles deram a ela uma vassoura e disseram,

"Limpe a neve que está do outro lado da porta dos fundos com a vassoura."

Mas quando ela saiu lá fora, os três homenzinhos disseram um para o outro,

"O que poderemos oferecer a ela porque ela foi tão generosa, a ponto de dividir conosco o único pão que ela tinha?"

Então o primeiro disse,

"O meu primeiro desejo será, que ela fique cada vez mais bela todos os dias."

O segundo disse,

"O meu desejo será, que moedas de ouro saiam de sua boca cada vez que ela falar."

E o terceiro falou,

"O meu presente será, que um rei venha e a leve como sua esposa."

Agarota, todavia, fazia o que os pequenos homenzinhos haviam solicitado a ela, varreu toda a neve que havia atrás da casa com a vassoura, e por ter feito isso ela encontrou nada menos que morangos maduros e verdadeiros, que surgiram de cor vermelho escuro enquanto ela varria a neve! Cheia de alegria ela colheu rapidamente um cesto bem cheio, agradeceu aos anõezinhos, apertou a mão de cada um deles, e correu para casa para levar para a sua madrasta o que a velha estava com vontade de comer há muito tempo.

Quando ela entrou em casa e disse "Boa Noite", uma moeda de ouro imediatamente saiu de sua boca. Então ela contou o que havia acontecido com ela na floresta, mas a cada palavra que ela pronunciava, mais moedas de ouro caíam de sua boca, até que em pouco tempo todo o recinto estava repleto de ouro.

"Veja já como ela é arrogante," exclamou a irmã adotiva, "jogando moedas de ouro dessa maneira!"

Mas intimamente ela sentia inveja da irmã, e queria também ir à floresta para procurar morangos.

A mãe disse,

"Não, minha querida filhinha, está muito frio, você poderia morrer de fome."

Todavia, como a filha não lhe dava sossego, a mãe finalmente concordou, fez para ela um magnífico vestido de pele, que ela foi obrigada a vestir, e deu a ela pão com manteiga e bolo para que ela levasse.

A garota foi para a floresta e caminhou diretamente para a pequena cabana. Os três pequenos elfos deram uma espiada novamente, mas ela não os cumprimentou, e não olhou para eles e nem falou com eles, ela entrou na casa com modos grosseiros, sentou-se perto da lareira, e começou a comer o seu pão com manteiga e o bolo que ela havia trazido.

"Também queremos um pouquinho," exclamaram os pequenos homenzinhos; mas ela respondeu,

"Não há o suficiente nem para mim mesma, então, como é que eu posso dar um pouquinho para as outras pessoas?"

Quando ela terminou de comer, eles disseram,

"Há uma vassoura atrás da porta, deixe tudo limpo para nós do lado de fora da porta dos fundos."

"Credo! Limpem vocês mesmos," respondeu ela, "Eu não sou criada de vocês."

Quando ela viu que eles não iriam lhe dar nada, ela saiu pela porta. Então os três homenzinhos disseram uns para os outros,

"O que nós ofereceremos a ela por ter sido tão desobediente, por ter um coração tão invejoso, e que jamais fará uma boa ação para qualquer pessoa?”

O primeiro disse,

"O meu desejo é que ela fique cada dia mais feia."

O segundo falou,

"Desejo a ela que a cada palavra que ela pronunciar, um sapo irá saltar de sua boca."

O terceiro disse,

"O meu desejo é que ela tenha uma morte miserável."

A garota procurou os morangos do lado de fora da cabana, mas como ela não encontrou nenhum, ela voltou furiosa para casa. E quando ela começou a abrir a boca, e ia contar para a sua mãe o que havia acontecido com ela na floresta, a cada palavra que ela pronunciava, um sapo saltava de sua boca, de modo que todos se afastavam tomados de horror por ela.

Então a madrasta ficou ainda mais brava, e não pensava em outra coisa a não ser causar todo o mal que ela pudesse para a filha do homem, cuja beleza, todavia, aumentava a cada dia que passava.

Finalmente, ela pegou um caldeirão, e o colocou no fogo, e começou a ferver fios de algodão dentro dele. Quando ele entrou em ebulição, ela colocou o caldeirão fervendo sobre os ombros da garota, e deu a ela um machado para que ela pudesse ir até o rio congelado, fizesse um buraco no gelo com o machado, e enxaguasse os fios.

Ela era obediente, foi até lá e cortou um buraco no gelo; e enquanto ela estava fazendo isso com o machado, uma belíssima carruagem veio chegando, e nela estava um rei. A carruagem parou, e o rei perguntou,

"Minha filha, quem é você, e o que você está fazendo aí?"

"Eu sou uma pobre menina, e estou enxaguando estes fios."

Então o rei sentiu pena dela, e quando ele percebeu que ela era uma menina muito bonita, ele disse a ela,

"Não queres ir-te embora comigo?"

"Ah, sim, com todo prazer," respondeu ela, pois ela ficaria feliz em se livrar da sua madrasta e da sua irmã adotiva.

Então, ela entrou na carruagem e partiu para longe com o rei, e quando eles chegaram ao palácio, o casamento foi celebrado com grande pompa, assim como os pequenos homenzinhos haviam desejado à garota.

Depois que um ano havia se passado, a jovem rainha deu a luz à um filho, e assim que a madrasta ouviu falar da grande sorte que ela tivera, ela veio com a sua filha até o palácio e fingiu que desejava fazer-lhe uma visita.

Mas uma vez quando o rei havia saído, e ninguém estava presente, a perversa mulher segurou a rainha pela cabeça, e sua filha a segurou pelos pés, e elas a tiraram da cama, e a jogaram para fora da janela dentro de um riacho que passava por ali. Então a filha feia se deitou na cama, e a velha a cobriu até a cabeça.

Mais tarde, quando o rei voltou para casa, e quis falar com a sua esposa, a velha gritou,

"Silêncio, silêncio, não pode ser agora, ela está dormindo e suando bastante; o senhor precisa deixar que ela descanse hoje."

O rei não desconfiou de nenhuma maldade, e não voltou novamente até a manhã seguinte; e quando ele falava com a sua esposa e ela respondia para ele, a cada palavra que ela dizia um sapo saltava para fora da sua boca, ao passo que antes uma moeda de ouro havia caído.

Então ele quis saber o que havia acontecido, mas a velhinha disse que era por causa de ter suado muito, e que logo ela ficaria boa. Durante a noite, todavia, o ajudante de cozinha viu um pato que vinha nadando até a sarjeta, e o pato dizia:

"Rei, o que estás fazendo agora?
Estás dormindo, ou estás acordado?"

E como ele não lhe respondesse nada ele disse,

"E os meus convidados, O que podem eles fazer?"

A ajudante de cozinha disse,

"Eles estão dormindo profundamente, também."

Então o pato perguntou novamente,

"O que faz agora o bebê camundongo?"

Ele respondeu,

"Está dormindo tranquilamente em seu berço."

Então ela subiu as escadas tomando a forma de rainha, acalentou o bebê, balançou a caminha dele, cobriu-o, e depois foi embora novamente nadando pela sarjeta tomando a forma de um pato. E assim ela veio durante duas noites; e na terceira, ela disse para o cozinheiro,

"Vá e diga ao rei para que pegue a sua espada e faça brandí-la três vezes na entrada da porta."

Então o ajudante de cozinha correu e falou isto ao rei, que veio com a sua espada e fê-la brandir por três vezes sobre o espírito, e na terceira vez, a sua esposa lhe apareceu diante dele forte, vívida, e saudável como sempre fora antes. Então o rei ficou muito feliz, mas ele manteve a rainha escondida em um quarto até o domingo, quando o bebê deveria ser batizado.

E quando ele foi batizado, o rei disse:

"O que merece uma pessoa que arrasta uma outra para fora da cama e a joga dentro da água?"

"A infeliz não merece nada mais," respondeu a velhinha, "do que ser levada e colocada dentro de um barril cheio de pregos, e rolar montanha abaixo até o riacho."

"Então," disse o rei, "Tu declaraste tua própria condenação;"

E ele ordenou que tal barril fosse trazido, e a velha com sua filha fossem colocadas dentro dele, e depois que uma tampa foi pregada, o barril rolou montanha abaixo até que ele chegasse no rio.
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Nota
(1) No original Haulemännerchen—i.e., Höhlen-Waldmäunlein. Eles são assim chamados porque eles vivem em cavernas nas florestas. Eles são pequenos anões de cabeças grandes, e dizem que eles roubam crianças não batizadas.


Fonte:
Contos de Grimm